Gestao Vigilancia em Saude GS Miolo Online 2ed

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Ministério da Educação – MEC Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES Diretoria de Educação a Distância – DED Universidade Aberta do Brasil – UAB Programa Nacional de Formação em Administração Pública – PNAP Especialização em Gestão em Saúde

GESTÃO DA VIGILÂNCIA À SAÚDE

Marismary Horsth De Seta Lenice Gnocchi da Costa Reis Elizabete Vianna Delamarque

2012 2ª edição

© 2012. Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Todos os direitos reservados. A responsabilidade pelo conteúdo e imagens desta obra é do(s) respectivo(s) autor(es). O conteúdo desta obra foi licenciado temporária e gratuitamente para utilização no âmbito do Sistema Universidade Aberta do Brasil, através da UFSC. O leitor se compromete a utilizar o conteúdo desta obra para aprendizado pessoal, sendo que a reprodução e distribuição ficarão limitadas ao âmbito interno dos cursos. A citação desta obra em trabalhos acadêmicos e/ou profissionais poderá ser feita com indicação da fonte. A cópia desta obra sem autorização expressa ou com intuito de lucro constitui crime contra a propriedade intelectual, com sanções previstas no Código Penal, artigo 184, Parágrafos 1º ao 3º, sem prejuízo das sanções cíveis cabíveis à espécie. 1ª edição – 2010

D278g

De Seta, Marismary Horsth Gestão da vigilância à saúde / Marismary Horsth De Seta, Lenice Gnocchi da Costa Reis, Elizabete Vianna Delamarque. – 2. ed. reimp. – Florianópolis : Departamento de Ciências da Administração / UFSC; [Brasília] : CAPES : UAB, 2012. 148p. Inclui bibliografia Especialização em Gestão em Saúde ISBN: 978-85-7988-051-3 1. Vigilância epidemiológica. 2. Saúde pública – Administração. 3. Saúde e trabalho. 4. Promoção da saúde. 5. Vigilância sanitária. 6. Vigilância ambiental. 7. Educação a distância. I. Reis, Lenice Gnocchi da Costa. II. Delamarque, Elizabete Vianna. III. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Brasil). IV. Universidade Aberta do Brasil. V. Título. CDU: 616-036.22

Catalogação na publicação por: Onélia Silva Guimarães CRB-14/071

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR – CAPES DIRETORIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS DIDÁTICOS Universidade Federal de Santa Catarina METODOLOGIA PARA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Universidade Federal de Mato Grosso AUTORAS DO CONTEÚDO Marismary Horsth De Seta Lenice Gnocchi da Costa Reis Elizabete Vianna Delamarque

EQUIPE TÉCNICA Coordenador do Projeto – Alexandre Marino Costa Coordenação de Produção de Recursos Didáticos – Denise Aparecida Bunn Capa – Alexandre Noronha Projeto Gráfico e Editoração – Annye Cristiny Tessaro Revisão Textual – Patrícia Regina da Costa

Créditos da imagem da capa: extraída do banco de imagens Stock.xchng sob direitos livres para uso de imagem.

SUMÁRIO Apresentação.................................................................................................... 7 Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde Introdução............................................................................................... 11 Os diferentes significados de “vigilância da/na/à/em saúde”............................. 13 Uma síntese................................................................................... 19 O desigual desenvolvimento dos componentes da “vigilância da/na/à/em saúde”..... 21 As definições das vigilância(S) em saúde e os seus conteúdos comuns............... 25 O conceito de risco e sua operacionalização pelas vigilâncias..................... 30 A relação com a promoção da saúde: saúde como direito e intersetorialidade... 39 O processo de trabalho das vigilâncias do campo da saúde................................ 49 As atividades e as finalidades do processo de trabalho.................................. 50 Os objetos e os sujeitos do trabalho............................................................. 52 Os meios de trabalho............................................................................... 54 O processo investigativo......................................................................... 55

Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias Introdução........................................................................................ 63 A estruturação das vigilâncias no plano nacional......................................... 64 Coerência com o que ocorre no plano internacional.................................... 64 Coerência com a organização federativa e com o SUS................................. 66 Por que estruturação dos sistemas das vigilâncias e não das redes?............. 68

Gestão da Vigilância à Saúde

O Sistema Nacional de Vigilância em Saúde................................................. 72 O Subsistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE).................... 73 Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental (SINVSA).............. 76 O Financiamento do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde................... 88 Planejamento, monitoramento e avaliação......................................... 91 O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS).......................................... 92 A estruturação do SNVS e a descentralização da política............................ 93 Planejamento, monitoramento e avaliação................................................... 102 Uma síntese: a vigilância sanitária no SUS................................................... 104

Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: Desafios para as Vigilâncias Introdução........................................................................................ 113 Das contribuições, só para ficar nas vigilâncias.................................................. 115 Dos desafios e perspectivas................................................................................. 118 Os potenciais conflitos decorrentes do que fazem e com o que lidam........... 118 Transformar as práticas das vigilâncias: articulação e controle social........... 121 A tomada de decisão com base na informação....................................... 123 Monitoramento e vigilância ativa para melhoria de produtos e serviços....... 125 A pesquisa e a produção de conhecimento....................................... 127 O financiamento em busca da equidade............................................. 128 A implantação de rede de laboratório para qualificar as ações.................... 129 Estruturação e qualificação das equipes....................................... 131 Compartilhar responsabilidades para produzir mudança............................... 132

Considerações finais.......................................................................................... 135 Referências.................................................................................................... 137 Minicurrículo.................................................................................................... 148

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Especialização em Gestão em Saúde

Apresentação

APRESENTAÇÃO Olá, caro estudante. Seja bem-vindo! A partir de agora você irá iniciar a disciplina Gestã o da Vigilância à Saúde no curso de Especialização em Gestão em Saúde, na modalidade a distância. No contexto do curso essa disciplina objetiva enfrentar lacunas. De um lado, é frequente que a discussão sobre gestão da saúde seja centrada no componente da assistência e nos serviços assistenciais. Entretanto, ao gestor de um sistema local ou regional de saúde cabe responder também pelas ações de caráter coletivo, preventivas, de proteção e de promoção da saúde e, dentre essas, aquelas denominadas como “vigilâncias”. De outro, uma lacuna que é do próprio campo. Há alguns anos, parecia impensável que os coordenadores de vigilância atuassem como gestores. Sem o repasse regular e automático de recursos federais para estados e municípios e com a gestão de recursos humanos centralizada, como planejar o futuro e o que gerenciar? Nesta disciplina se apresentam, reunidas sob a denominação “vigilâncias do campo da saúde”, quatro práticas que, integrando a saúde como responsabilidade setorial ou compartilhada com outros setores, contribuem para dar concretude ao componente setorial da Promoção da Saúde. Na disciplina dividida em três unidades, são também abordados os principais conceitos e os aspectos comuns às

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

vigilâncias, mas também suas especificidades e os aspectos institucionais, bem como os desafios para sua gestão descentralizada. Para muitos desses desafios as respostas ainda estão sendo construídas. Bons estudos! Professoras Marismary Horsth De Seta, Lenice Gnocchi da Costa Reis e Elizabete Vianna Delamarque

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Especialização em Gestão em Saúde

Apresentação

UNIDADE 1 AS VIGILÂNCIAS DO CAMPO DA SAÚDE

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM Ao finalizar esta Unidade, você deverá ser capaz de: 

Definir e discriminar (distinguir) as vigilâncias do campo da saúde;



Compreender a historicidade das vigilâncias do campo da saúde, correlacionando recentes políticas de saúde e fatos sanitários com a organização das vigilâncias;



Identificar a relação entre as vigilâncias e a Promoção da Saúde;



Caracterizar a organização das vigilâncias, no nível nacional, e compreender a necessidade de ação cooperativa; e



Dominar os conceitos comuns a todas as vigilâncias (risco, intersetorialidade e territorio) e as formas de operacionalização desses conceitos. Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

INTRODUÇÃO Caro estudante, Nesta Unidade abordaremos as vigilâncias epidemiológica, sanitária, em saúde do trabalhador e ambiental, a partir do ponto de vista das suas definições legais – já que, pelo menos, três delas figuram na Constituição Federal de 1988 como competências do Sistema Único de Saúde (SUS) – veremos o que elas têm em comum – inclusive o risco como conceito fundamental a ser operacionalizado – o que as diferenciam e a caracterização e os componentes dos seus processos de trabalho. Essas vigilâncias serão tratadas assim, plurais, ao mesmo tempo em que apontaremos as tendências para sua organização no SUS. A ênfase não será nas suas estruturas, mas no conteúdo das práticas de algumas ações necessárias – também porque elas são um direito da cidadania – e da natureza do trabalho a realizar. Para facilitar seus estudos, recomendamos que suas reflexões e conclusões sejam registradas, pois elas poderão orientá-lo na realização das atividades, nos contatos com o tutor e nos debates com seus colegas nos fóruns. Enfim, reiteramos o desejo de que você tenha força de vontade, disciplina e organização para aproveitar ao máximo esta oportunidade. Em caso de dúvidas, não hesite em perguntar. Boa leitura!

Fique atento(a): Em 22 de dezembro de 2009, o Ministério da Saúde (MS) publicou a Portaria GM 3.252 que define os componentes da vigilância em saúde como sendo:

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

I – vigilância epidemiológica; II – promoção da saúde; III – vigilância da situação de saúde: IV – vigilância em saúde ambiental; V – vigilância da saúde do trabalhador; VI – vigilância sanitária. O conteúdo dessa Portaria informa a organização da próxima Unidade de Aprendizagem (UA), que trata dos sistemas nacionais das vigilâncias. Mas, é preciso atentar que não se pode tomar a Política de Promoção da Saúde do Ministério da Saúde como sendo o Enfoque da Promoção da Saúde. A Promoção da Saúde, como enfoque, é efetivada por vários setores governamentais, além da Saúde. Por exemplo, o Ministério se preocupa com mortes e acidentes graves de trânsito e propõe a Lei Seca, mas a repressão ao ato de dirigir tendo ingerido bebida alcoólica não cabe à Saúde. Outro exemplo poderia ser a análise da situação da saúde, uma das aplicações da Epidemiologia, ser reduzida à "vigilância da situação de saúde", termo que parece ter sido criado com essa Portaria.

Qual das vigilâncias você mais conhece? Por que neste texto usamos o termo “vigilâncias do campo da saúde” ou “vigilância(S) em saúde”, assim, no plural? Não poderia ser só no singular?

Para denominarmos o conjunto de práticas discutidas nesta disciplina não serão utilizadas as expressões “vigilância em saúde”, “vigilância da saúde” ou mesmo “vigilância à saúde”, embora esse seja o título da nossa disciplina. Vamos tratá-las no plural. Essa

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

opção, que adotamos para alcançar maior clareza, baseia-se no reconhecimento da existência de diferentes significados para “vigilância da/na/à/em saúde” e da ocorrência de desenvolvimento desigual de cada uma das vigilâncias do campo da saúde, que serão abordadas a seguir.

OS DIFERENTES SIGNIFICADOS DE DA/NA/À/EM SAÚDE

VIGILÂNCIA

Esses diferentes significados podem se apresentar de maneira diversa na realidade concreta do SUS, em suas práticas e em seu arcabouço institucional. Neste último, inclusive, dependendo da esfera de governo de que estamos falando, a diversidade pode ser ainda maior... Há uma polêmica sobre o significado de “vigilância da/na/à/em saúde”, que se evidencia na leitura de vários autores. Albuquerque, Carvalho e Lima (2002) afirmam que os termos “vigilância à saúde”, “vigilância em saúde” e “vigilância da saúde” vêm sendo amplamente citados na literatura no país sem que haja uma definição “instituída” dos seus objetos ou uma conceituação que seja remetida à prática. Nesse mesmo sentido, Teixeira e Pinto (1993, p. 6) já chamavam a atenção de que o termo “vigilância à saúde” representa um “imenso guarda-chuva” que busca articular “práticas dispersas e heterogêneas em saúde coletiva”, desde as assistenciais até as dirigidas para a prevenção. Com a ampliação da vigilância epidemiológica abarcando, além das doenças transmissíveis, as não transmissíveis e os fatores de risco, o termo “vigilância em saúde” ou “vigilância em saúde pública” tem enfatizado o trabalho com os sistemas de informação. Mas, para Mendes (1993), a vigilância à saúde não se resume em ação de produção de informação; é principalmente intervenção sobre os fatores que determinam e condicionam problemas de

Vigilância em saúde pública é o nome proposto para a vigilância epidemiológica no final dos anos de 1980. Sobre isso, Waldman (1998a)

v

afirma que essa mudança de denominação não

implicou nova abordagem ou grandes modificações conceituais ou

operacionais da

vigilância no Brasil,

porque a mudança se

dera em anos anteriores.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Saiba mais

Vigilância em saúde pública

enfrentamento contínuo, que incorpora, também, ações de caráter individual.

Teixeira, Paim e Vilasboas (1998) reconhecem especificidades nas vigilâncias análise de informação para tuberculose”, de epidemiológica e sanitária que justificam a Natal e Elias (2000); “Usos da vigilância e da existência de cada uma delas do ponto de vista monitorização em saúde pública”, de técnico-operacional e afirmam que a Waldman (1998a). Esses textos estão dispoepidemiológica obedece a “uma racionalidade níveis em . técnico-sanitária fundada na clínica e na epidemiologia”, enquanto que a vigilância sanitária obedece a “uma racionalidade político-jurídica, fundada nas normas que regulamentam a produção, distribuição e consumo de bens e serviços”. Apesar dos autores não considerarem a diversidade de portes, problemas, realidades e de riscos à saúde que os Municípios apresentam, Teixeira, Paim e Vilasboas (1998) defendem que, no âmbito municipal, não se justifica a institucionalização em separado dessas duas vigilâncias. Vale ressaltar que as definições de vigilância sanitária e de vigilância epidemiológica serão abordadas na seção As definições das vigilância(S) em saúde e os seus conteúdos comuns desta Unidade de aprendizagem. Quer saber mais sobre vigilância em saúde pública? Leia os seguintes textos “Projeto de

Em sua opinião, uma Metrópole e um pequeno Município podem ter o mesmo modelo organizacional e funcional para as vigilâncias do campo da saúde?

Teixeira, Paim e Vilasboas (1998) sistematizam em três vertentes o que chamam de “vigilância da saúde”, descritas a seguir.

 Vigilância da saúde equivalendo à “análise de situações de saúde”: caracterizada pela ampliação dos objetos da vigilância epidemiológica tradicional (doenças transmissíveis), essa vigilância contribui para um planejamento de saúde mais abrangente. A ampliação dos objetos abarca as investigações;

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

montagem de bases de dados sobre outros agravos (mortalidade infantil e materna, doenças crônicas, acidentes e violência etc.); e aspectos relativos à organização e produção dos serviços de saúde.

Alguns autores situam a análise de situação de saúde como uma das quatro áreas de aplicação da epidemiologia nos serviços de saúde, sendo as demais a identificação de perfis e fatores de risco, a avaliação epidemiológica de serviços de saúde e a chamada “vigilância em saúde pública” (WALDMAN, 1998b). Barcellos et al. (2002, p. 130), entretanto, afirmam que “a análise de situações de saúde corresponde a uma vertente da vigilância da saúde que prioriza a análise da saúde de grupos populacionais definidos em função de suas condições de vida”, condições que abrangem também as condições de saúde e de acesso aos serviços de saúde.

 Vigilância da saúde como proposta de integração institucional entre a vigilância epidemiológica e a vigilância sanitária: concretizou-se mediante reformas administrativas, com a criação de Departamentos de Vigilância da Saúde ou órgãos similares, inicialmente nas secretarias estaduais de saúde, na primeira metade da década de 1990.

 Vigilância da saúde como uma proposta de redefinição das práticas sanitárias: é um novo modelo assistencial dotado de algumas características básicas: intervenção sobre problemas de saúde; ênfase em problemas que requerem atenção e acompanhamento contínuos; articulação entre ações preventivas e de

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Gestão da Vigilância à Saúde

promoção; atuação intersetorial e sobre o território; intervenção sob a forma de operações. Em resumo, nesta concepção a vigilância representa a possibilidade, ainda não concretizada, de organizar processos de trabalho em saúde em um território delimitado para enfrentar problemas por meio de operações montadas em diferentes períodos do processo saúde-doença. Além disso, essa vertente aponta a necessidade de mudança do processo de trabalho com a incorporação de outros sujeitos, gerentes de serviços, técnicos e representantes de grupos organizados da população.

A existência dessas três diferentes vertentes, como resultado de diversas formulações e de experiências práticas também diversas, faz com que, ao falarmos em “vigilância da saúde”, seja necessário perguntarmos: “Mas, de que vertente da vigilância da/na/à/em saúde você está falando?” Ou então “de que conjunto de ações você está falando?”

No senso comum, o termo “vigilância da saúde” é algumas vezes substituído mecanicamente por “vigilância em saúde”, como se fossem sinônimos. Mesmo com essa relativa confusão, é importante realçar que, nesse sentido corrente, os dois termos carregam uma conotação positiva de possibilidade de ação mais articulada das vigilâncias.

Você considera que mudanças no nome do serviço ou no organograma podem resultar em renovação de práticas e tornar as ações menos fragmentadas? Por quê?

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

Outro ingrediente dessa polêmica é a diversidade das formas de divisão de atribuições entre as vigilâncias nos estados e nos municípios. Vejamos três pontos.

1. Na esfera federal de governo existe uma separação mais ou menos clara de atribuições e, mais clara ainda, de instituições em relação à vigilância sanitária – Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – e à vigilância epidemiológica e ambiental em saúde que, desde 2007, passou a incorporar também a saúde do trabalhador – Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). A gestão e a coordenação das ações relativas à Saúde do Trabalhador, na esfera federal, passaram para o âmbito da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), por meio da Portaria MS/GM n. 1.956, de 14 de agosto de 2007 (BRASIL, 2007b). Com a mudança, o que era uma área técnica de Saúde do Trabalhador saiu do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas da Secretaria de Atenção à Saúde. Além das atribuições da coordenação dos sistemas nacionais e de alguns programas, a esfera federal tem algumas responsabilidades privativas, no caso das vigilâncias, como o registro de produtos ou de medicamentos*. Cabe à Anvisa, em caráter jurídico-administrativo e técnico-científico, avaliar o cumprimento de critérios relacionados à eficácia, à segurança e à qualidade dos medicamentos. Outros exemplos de atribuições privativas da esfera federal são: o controle sanitário em portos, aeroportos e recintos alfandegados, no caso da vigilância sanitária; a elaboração de normas sobre: ações de prevenção e controle de fatores relacionados ao meio ambiente com repercussão na saúde humana; os limites de exposição humana a riscos químicos e físicos com repercussão na saúde humana, no caso da vigilância ambiental em saúde.

*Registro de medicamento – é a inscrição obrigatória do produto, no órgão ou entidade competente,

previa-

mente à sua introdução no mercado, comercialização e uso. Fonte: Adaptado de Anvisa [s.d.].

2. Se, como dissemos no item anterior, há uma separação de atribuições entre a Anvisa e a SVS, isso parece ser diferente nos estados e, mais ainda, nos Municípios. Em grande parte deles, notadamente nos pequenos municípios, não existe separação de

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Gestão da Vigilância à Saúde

funções e de equipes para o trabalho nas vigilâncias, independentemente do nome do serviço. Muitos têm uma só equipe ou mesmo apenas um profissional, que costuma ser responsável por todas as ações referentes às vigilâncias. Nesses Municípios, geralmente não são realizadas todas as ações das vigilâncias que poderiam caber a essa esfera de governo. Para isso concorrem: o predomínio de Municípios pequenos e muito pequenos, que sofrem com a escassez de profissionais disponíveis nas localidades; o início relativamente tardio do processo de descentralização das ações – em relação às ações assistenciais e ao cuidado – e a própria natureza do trabalho a realizar.

Até o final dos anos de 1990, muitos Municípios não tinham Secretaria de Saúde individualizada na estrutura da gestão municipal. Até recentemente, quando existia um serviço de vigilância organizado no município, ele era designado majoritariamente como de “vigilância sanitária”. Atualmente, com muita frequência, esse mesmo serviço tem sido denominado como “vigilância em saúde” ou “da vigilância da saúde”. Essa estruturação dos serviços das esferas de governo subnacionais à semelhança da esfera federal já fora apontada por Medeiros (1986 apud ABRUCIO, 1998), quando ele afirmou que a organização da esfera estadual mimetiza a da federal para facilitar o recebimento dos recursos financeiros e da cooperação técnica.

3. Outro fator é que as práticas e os respectivos subsistemas têm sido designados pelos mesmos nomes atribuídos aos serviços ou lugares institucionais organizados na esfera federal. Assim, as vigilâncias epidemiológica e ambiental crescentemente são designadas como “vigilância em saúde”, tomando por base a designação adotada para a Secretaria do Ministério da Saúde. De modo semelhante, já havia correspondência entre a prática

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

chamada de vigilância sanitária e o serviço da esfera federal, fosse ele a antiga Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária ou a atual Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Os Estados brasileiros são diferentes uns dos outros, mas os Municípios são ainda muito mais heterogêneos entre si. E não é apenas em relação ao tamanho. O porte populacional é somente um aspecto da heterogeneidade municipal; a ele se acrescentam os aspectos que decorrem das acentuadas desigualdades regionais, de tal maneira que dois municípios de mesmo porte situados em diferentes regiões podem apresentar características, estruturas, capacidades e infraestrutura diversas.

Como se organizam as vigilâncias em seu Município? Procure saber quantos profissionais estão envolvidos com as atividades dessas áreas. Anote o resultado de sua reflexão para, se for o caso, compartilhar com seu tutor.

UMA SÍNTESE Para tratar da distribuição das atribuições e da organização das vigilâncias, no nível deste curso, é necessário remeter as discussões para o conteúdo das práticas, das ações necessárias e da natureza do trabalho a realizar. Mesmo considerando que dada estrutura contribui para certo desempenho, devemos tentar ser menos prescritivos sobre que formato de estrutura organizacional é desejável, e menos afirmativos sobre o potencial de transformação das práticas em função da adoção de uma estrutura organizacional ou de sua denominação. Recorremos, assim, ao estágio atual das

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Gestão da Vigilância à Saúde

abordagens administrativas que recomendam que não haja uma única melhor maneira de se organizar e que “tudo depende...” Neste texto, o uso do termo “vigilâncias do campo da saúde”, ou “vigilância(S) em saúde” respalda-se no reconhecimento de que todas as vigilâncias se valem de métodos e de aportes de diversas disciplinas científicas, e não de um único método. As vigilâncias também usam conceitos comuns, no entanto, fazem deles um uso diferenciado. Assim, reforça-se a necessidade de diálogo e de construção de pontes entre as vigilâncias, se o que se quer é a melhoria da qualidade de vida e saúde da população.

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

O DESIGUAL DESENVOLVIMENTO DOS COMPONENTES DA

“VIGILÂNCIA DA/NA/À/EM SAÚDE” As vigilâncias do campo da saúde, no Brasil, não se constituíram de forma linear no sistema de saúde, pois seu desenvolvimento foi desigual no tempo e em cada contexto.

Você sabia que as bases para a construção das vigilâncias do campo da saúde encontram-se no artigo 200 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2000) e na Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990 (BRASIL, 1990)? E que dos oito incisos do artigo 200, apenas dois não se encontram compreendidos no escopo de atuação das vigilâncias do campo da saúde? Vamos a eles!

A Constituição Federal (BRASIL, 2000) define que, sem prejuízo dos “serviços assistenciais”, deve ser conferida prioridade às atividades preventivas (inciso II, art. 198, CF de 1988), em cujo escopo estão incluídas as vigilâncias. O artigo 200 estabelece as competências para o Sistema Único de Saúde, tal como transcrito a seguir: I – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção

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Gestão da Vigilância à Saúde

de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; III – ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; IV – participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico; V – incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; VI – fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano; VII – participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho. (BRASIL, 2000, art. 200).

Com a leitura desse artigo você percebeu uma gradação de responsabilidades entre ações a serem diretamente executadas e outras para as quais o SUS deve participar e/ou colaborar? Em que isso implica no desenvolvimento do SUS?

Essa gradação significa o reconhecimento, em último caso, de corresponsabilidade pelo setor saúde em atribuições que, na estrutura do Estado brasileiro, encontram-se sob a responsabilidade de outros órgãos governamentais.

Assim, legalmente ao setor saúde cabia a execução das vigilâncias sanitária e epidemiológica, mas apenas para participar ou colaborar em ações de responsabilidade mais direta de outros setores governamentais (saneamento

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

básico, controle das substâncias tóxicas e radioativas, meio ambiente, ambiente de trabalho). Tal gradação provavelmente contribuiu para o desenvolvimento desigual das vigilâncias, tanto no aspecto institucional quanto conceitual no âmbito da saúde.

Nesse ponto, um exemplo focado em um componente mais recentemente introduzido das vigilâncias do campo da saúde, o referente ao ambiente.

O tema ambiente entrou na agenda política e científica global na década de 1990, tendo como marco a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, mais conhecida como Rio-92, que gerou a Agenda 21*. No plano internacional, no final dos anos de 1990, nos países industrializados, consolidaram-se as propostas de “vigilância ambiental em saúde pública” (THACKER et al., 1996) e de “vigilância em saúde pública” (LEVY, 1996). Essas propostas, segundo Freitas e Freitas (2005), continham pelos menos três elementos que deveriam estar integrados, esses elementos são:

*Agenda 21 – contém um roteiro de ações com previsão de metas, recursos e responsabilidades definidas para alcançar o desenvolvimento sustentável no Século XXI. Na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento

Sus-

tentável ("Rio + 10"), realizada em Johanesburgo,

 a vigilância de efeitos sobre a saúde, como agravos e

África do Sul, em 2002,

doenças, tarefa tradicionalmente realizada pela vigilância epidemiológica;

constataram-se poucos avanços ou mesmo retro-

 a vigilância de perigos, como agentes químicos, físicos

Agenda 21. Fonte: Adap-

e biológicos que possam ocasionar doenças e agravos, tarefa tradicionalmente realizada pela vigilância sanitária; e

cessos em relação à tado de Freitas (2005).

 a vigilância de exposições, pelo monitoramento da exposição de indivíduos ou grupos populacionais a um agente ambiental ou seus efeitos clinicamente ainda não aparentes (subclínicos ou pré-clínicos), desafio para a estruturação da vigilância ambiental.

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Gestão da Vigilância à Saúde

No final dos anos de 1990, sob a influência dessas propostas de vigilância ambiental em saúde e de vigilância em saúde pública, com financiamento do Banco Mundial, iniciou-se no Brasil, com o projeto VIGISUS de estruturação do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde a institucionalização do tema ambiente no setor saúde em caráter sistêmico.

*Cenepi

– criado em

1990, na Fundação Nacional de Saúde (Funasa), objetivava

dirigir

as

ações de epidemiologia no âmbito do Ministério da Saúde e articular a

No âmbito do Ministério da Saúde, a Vigilância Ambiental em Saúde foi incorporada ao extinto Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi*) que, em maio de 2000, tornou-se responsável pela gestão do Sistema Nacional de Vigilância Ambiental em Saúde (SINVAS). A partir de 2005, esse Sistema passou a ter a sigla SINVSA (Sistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental).

atuação das secretarias estaduais nesse campo. Em 2003, o Cenepi foi extinto, dando lugar à Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde.

Fonte:

Brasil

(2003).

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

AS DEFINIÇÕES DAS VIGILÂNCIA(S) EM SAÚDE E OS SEUS CONTEÚDOS COMUNS

As definições legais das vigilâncias do campo da saúde são encontradas em dispositivos normativos de naturezas diversas. Um aspecto comum a todas as definições das "vigilâncias" é que elas compreendem um conjunto de ações ou de atividades e que todas realizam investigações.

Saiba mais

Na Lei n. 8.080 (BRASIL, 1990) encontramos as definições de vigilância sanitária, epidemiológica e, em relação à vigilância em saúde do trabalhador, é a própria área de saúde do trabalhador que é definida, abrangendo ações assistenciais, de vigilância epidemiológica e sanitária, desenvolvimento de estudos e revisão normativa. Vamos às definições da Lei n. 8.080/90.

Para conhecer a lista de laboratórios de saúde pública que realizam análises de interesses das

vigilâncias

siga

o

link

e leia o artigo de Santos, Pereira e Silva (2008) “Gestão da qualidade nos Laboratórios Centrais de Saúde Pública e o modelo de controle de qualidade analítica da malária”, disponível também em: .

v

Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo: I – o controle de bens de consumo que direta ou indiretamente se relacionem com a saúde, compreendidas todas as etapas

Módulo Específico

Sobre a enumeração

contida na definição da área de saúde do

trabalhador consulte os incisos de I a VII do

parágrafo 3º, art. 6º, da Lei n. 8.080/90.

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Gestão da Vigilância à Saúde

e processos, da produção ao consumo; e II – o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde (BRASIL, 1990, art. 6º, § 1º). Entende-se por vigilância epidemiológica um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos (BRASIL, 1990, art. 6º, § 2º). Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei, um conjunto de atividades que se destina, através das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho [...] (BRASIL, 1990, art. 6º, § 3º).

A Vigilância em Saúde do Trabalhador (Visat) é definida na Portaria MS/GM 3.120/98 como: [...] uma atuação contínua e sistemática, ao longo do tempo, no sentido de detectar, conhecer, pesquisar e analisar os fatores determinantes e condicionantes dos agravos à saúde relacionados aos processos e ambientes de trabalho, em seus aspectos tecnológico, social, organizacional e epidemiológico, com a finalidade de planejar, executar e avaliar intervenções sobre esses aspectos, de forma a eliminá-los e controlá-los. (BRASIL, 1998a).

A Vigilância em Saúde Ambiental, de constituição recente, é definida em documentos do Ministério da Saúde como [...] um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento e a detecção de mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio ambiente que interferem na saúde humana, com a finalidade de identificar as medidas de

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

prevenção e controle dos fatores de risco ambientais relacionados às doenças ou a outros agravos à saúde (BRASIL, 2001; BRASIL, 2005c).

Veja agora aspectos comuns nas definições das vigilâncias que destacamos:

 Assim como a saúde, devem ser pensadas mais amplamente dentro do contexto de desenvolvimento social, nas formas de organização do Estado e da sociedade para dar sustentabilidade aos modelos de desenvolvimento adotados, levando em consideração a complexidade do processo saúde-doença e a busca da melhoria das condições de vida das pessoas.

 São conjuntos de ações ou de atividades e lidam com riscos ou fatores determinantes e condicionantes de doenças e agravos.

 Na sua operacionalização, as quatro vigilâncias se referem a territórios delimitados.

 Assim como a saúde, em termos de política pública as vigilâncias têm um caráter intersetorial. Para três delas – as vigilâncias sanitária, ambiental e em saúde do trabalhador – além do conceito de risco, comum às quatro vigilâncias, a intersetorialidade representa um dos pilares indispensáveis à efetividade de suas ações.

v

Nesta mesma Unidade, mais adiante,

O fato de terem aspectos comuns não significa que as quatro vigilâncias trabalhem da mesma forma:

abordaremos a questão da intersetorialidade.

 Nas definições anteriores há diferenças importantes quanto à forma de atuação, ou melhor, à possibilidade explícita de intervenção sobre a realidade ou de produção e utilização do conhecimento sobre essa realidade para instrumentalizar a intervenção.

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

 Na definição de vigilância sanitária está claro que o

*Poder de polícia administrativa – é uma atividade exclusiva da Administração Pública, que representa uma capacidade e também o dever de restringir ou condicionar as liberdades ou a propriedade individual, ajustando-as aos interesses da coletividade. Seu princípio básico é a supremacia do interesse público sobre o individual e sua atuação se expressa em regulamentar, fiscalizar e, quando cabível, punir. Fonte: Elaborado pelas autoras deste livro.

conjunto de ações deve ser capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários, podendo restringir direitos individuais para o bem da coletividade e defesa do interesse público. Essa capacidade de intervenção precisa ser potente, não é? E essa potência é decorrente do fato da vigilância sanitária ter poder de polícia administrativa*. Na vigilância sanitária, que detém poder de polícia administrativa no campo da saúde, esse poder incide sobre estabelecimentos (pessoas jurídicas), e não sobre as pessoas físicas. Pode ser exercido de forma preventiva, por exemplo, mediante a emissão de normas e de atividades de inspeção/fiscalização sanitária. Nas atividades de inspeção é necessário, se for alto o risco à saúde, interditar total ou parcialmente o estabelecimento, inutilizar o produto e, até aplicar multas, que se revertem em lucros para os cofres públicos.

 Na definição de vigilância epidemiológica, são privilegiados o conhecimento e a detecção de mudanças nos fatores determinantes ou condicionantes da saúde individual e coletiva. Nesse sentido, Teixeira, Paim e Vilasboas (1998, p. 12) sustentam que a tradução operacional da vigilância epidemiológica [...] pretende ser uma ampla rede de unidades geradoras de dados que permitam a adoção de decisões e a execução de ações de investigação e controle.

A capacidade das vigilâncias é condicionada pelo conceito de risco com o qual cada uma trabalha; pela capacidade do serviço e seu grau de institucionalidade; pela sua articulação com as demais ações e instâncias do sistema de saúde, mas também fora dele. Nas

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

atividades sob responsabilidade de outros setores governamentais, ou seja, naquelas em que o poder de polícia administrativa está colocado em outros órgãos, particularmente nas questões relacionadas ao meio ambiente e à saúde do trabalhador, é fundamental a articulação com outros parceiros de outros setores, ou com a vigilância sanitária (articulação intrassetorial).

Por fim, deve ser observada a natureza diferenciada das vigilâncias em relação a outras atividades do campo da saúde, principalmente as voltadas para a assistência à saúde das pessoas. Sobre isso, De Seta (2007) afirma sobre a vigilância sanitária – e depois estende para a vigilância epidemiológica – que ela é um bem público dotado de alta externalidade*. Isso significa que: seu consumo por parte do cidadão não gera custos adicionais e que todos podem dela se beneficiar; não deve ser exercida por particulares; e pela sua atuação ou omissão, existem efeitos – prejuízos ou benefícios – para outros que não os diretamente envolvidos. Se todas as vigilâncias têm em comum o caráter de bem público, duas coisas diferenciam a sanitária das demais: seu poder de polícia administrativa no campo da saúde e o efeito econômico direto que sua regulação no campo da saúde acarreta. Embora não atue todo o tempo exclusivamente com base no poder de polícia, é esse poder que assegura a efetiva capacidade de intervenção da vigilância sobre os problemas sanitários e possibilita uma atuação mais ampla sobre os interesses privados em benefício do interesse público. Para isso, seus modos de atuação compreendem atividades autorizativas (registro de produtos, licenciamento de estabelecimentos, autorização de funcionamento), normativas, de educação em saúde e de comunicação com a sociedade. Dos dois primeiros modos de atuação decorre seu caráter regulatório, de regulação social (e econômica) no campo da saúde (DE SETA, 2007).

Módulo Específico

*Externalidade – conceito que tem origem na teoria econômica e representa uma das falhas de mercado, que torna necessária a regulação e pode ser positiva ou negativa, ocorre quando uma pessoa física ou jurídica

sofre

consequências

as dessas

falhas, sem ter participado da decisão que as causaram. Fonte: Elaborado pelas autoras deste livro.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Você já viveu ou presenciou situações em que a vigilância sanitária exerceu esse seu poder de Estado, de polícia administrativa no campo da saúde? Ou situações em que ele deveria ter sido exercido e não foi (omissão)? Ou foi usado com exagero, indevidamente (abuso de poder)? Na condição de administrador, se possível, analise essas situações e registre suas reflexões.

O CONCEITO DE RISCO E SUA OPERACIONALIZAÇÃO PELAS VIGILÂNCIAS

Como você verá a seguir, poderíamos falar aqui no plural, o(s) conceito(s) de risco, na medida em que ele provém de diferentes campos do conhecimento, então, podemos dizer que ele é “polissêmico” e é disso que vamos tratar na próxima seção.

Risco, segundo Guilam e Castiel (2006, p. 16), “é uma palavra com diferentes sentidos que nem sempre convivem em harmonia [...]”. Palavra oriunda do espanhol risco – grande penhasco –, possivelmente se relacionava aos perigos ligados às grandes navegações; assim, indicava tanto a ideia de perigo como a de possibilidade de ocorrência de algum evento. Se, no passado, relacionava-se aos jogos de azar para indicar as chances de ganhar e perder, durante a Segunda Guerra Mundial passou a indicar a estimativa de danos devido ao manuseio de materiais perigosos. Na atualidade, o conceito de risco traduz tanto a probabilidade de ocorrência de um evento danoso quanto se constitui em um termo não técnico, que inclui diversas medidas de probabilidade de desfechos desfavoráveis (GUILAM; CASTIEL, 2006).

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

Para Guilam e Castiel (2006), a ideia de probabilidade pode ser lida de modo intuitivo (incerteza que não se pode medir) ou de modo racional (incerteza capaz de ser medida de forma probabilística). Assim, surgindo junto com a sociedade contemporânea, o conceito de risco, considerado um elemento central de cálculo racional na cultura moderna e base para a tomada de decisão, reflete o desejo de regular o futuro de forma “racional” (CZERESNIA, 2001). A saúde coletiva vem empregando o enfoque de risco de forma crescente após a década de 1970: inicialmente na prática epidemiológica, visando estudar os fatores que condicionam a ocorrência e a evolução de doenças crônicas; atualmente, de forma mais ampla, relacionado a todo o tipo de problema, agudo ou crônico, no estudo dos chamados fatores de risco, de tal forma que seu uso indiscriminado tem sido chamado de “epidemia de riscos” (LIEBER; ROMANO, 1997).

Por que falar em risco?  Porque ele pode ser considerado um conceito fundamental das vigilância(S) em saúde, e, importante porque é a possibilidade de que “algo” aconteça e de que esse “algo” interfira “negativamente” no processo saúde-doença, gerando agravos ou danos à saúde, que devem ser minimizados. A operacionalização do risco é que faz das vigilância(S) em saúde um importante componente da saúde coletiva. Risco é um conceito que se refere à possibilidade/probabilidade de ocorrência de eventos que tenham consequências negativas à saúde de um indivíduo ou grupo populacional ou ao ambiente.

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

São exemplos de situações de risco à saúde: trabalhadores expostos a determinadas condições de trabalho; grupo de pacientes submetidos a procedimentos hospitalares específicos ou que usem um tipo de medicamento/alimento; população residente em um município com uma indústria poluidora; grupo populacional exposto a determinados fatores de risco para doenças transmissíveis, como a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids).

 Porque ele pode ser considerado um conceito unificador, pois é a ação/intervenção para melhorar a qualidade de vida da população que faz com que as diversas “vigilâncias” – do processo de produçãotrabalho (vigilância em saúde do trabalhador), do processo de produção-consumo (vigilância sanitária) e da exposição a situações de risco (vigilância ambiental/epidemiológica) – situem-se no campo da promoção e da proteção da saúde. O objetivo de minimizar o risco, agindo sobre os condicionantes/ determinantes de um agravo/dano é algo comum às vigilâncias do campo da saúde.

 Porque ele é um conceito polêmico, com definições e interpretações que algumas vezes ocorrem de maneira conflitante. Um exemplo claro é a imensa polêmica em torno dos chamados organismos geneticamente modificados (OGM), em que as instituições se expressam de forma diferente, seja na avaliação da segurança dos transgênicos, seja na proposta de ação direcionada a eles. A posição de algumas organizações não governamentais tem sido fortemente contrária aos transgênicos, em oposição à de representantes da agroindústria.

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

 Porque ele é um conceito polissêmico, oriundo de vários campos do saber, que permite diferentes abordagens e diferentes campos de prática, na dependência das disciplinas que o estudam. No dizer de Guilam e Castiel (2006), trata-se de um conceito “indisciplinado”, ou seja, não se subordina, não é regido predominantemente por uma disciplina. Esses autores postulam ainda que:

 Na Epidemiologia, o conceito de risco encontra aplicação na determinação dos fatores e situações de risco à saúde, sendo de especial importância na prática da vigilância epidemiológica e na epidemiologia clínica. São típicos indicadores de risco utilizados no campo da saúde pública: incidência ou risco absoluto; risco relativo e risco atribuível.

 Nas Engenharias, a análise de risco auxilia

Saiba mais

Indicadores de risco

Para saber mais sobre os indicadores de risco, as chamadas medidas do risco, utilizados no campo da saúde pública, leia parte do Capítulo “Risco e Saúde”, de Maria Cristina Guilam e Luis David Castiel no livro “Gestão e Vigilância: modos atuais do pensar e do fazer ”,

ou busque em livro-texto de na tomada de decisão especialmente sobre Epidemiologia. as tecnologias, sendo importante nas vigilâncias ambiental e sanitária e na vigilância da saúde do trabalhador. Sua aplicação nesta área do conhecimento está diretamente ligada à avaliação de risco ambiental, ocupacional e à avaliação de tecnologias em saúde.

 Nas Ciências Econômicas, a abordagem quantitativa do risco objetiva definir custos e possíveis perdas, tendo em vista a probabilidade de ocorrência do agravo/dano, especialmente utilizado nas seguradoras para o cálculo dos valores de seguros de veículos, de vida, de planos de saúde etc.

 Nas Ciências Sociais, em uma abordagem qualitativa, esse conceito busca, mediante análise das representações sociais e da percepção de risco, estabelecer as influências culturais ligadas ao risco (GUILAM; CASTIEL, 2006). Possibilita identificar como

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

as pessoas identificam o risco e como lidam com ele e dá ajuda valiosa nos processos de comunicação e de educação para a saúde.

Disponível em: .

Saiba mais

Assista ao vídeo “Enquanto o gato dorme”, que retrata uma situação ocorrida em uma oficina mecânica, disponível no CD e na biblioteca do curso, no AVEA. Reflita sobre as questões a seguir e, depois, participe da discussão no fórum, respondendo às seguintes questões:

“Enquanto o gato dorme”

O vídeo Enquanto o gato dorme é um produto desenvolvido pelo Centro Colaborador em Vi-

a) Quais os pontos comuns entre a situação retratada no vídeo e os temas discutidos nesta Unidade de Aprendizagem?

gilância Sanitária em parceria com o Departa-

b) Identifique as diferentes posturas e

mento de Comunicação e Saúde/Instituto de

percepções da situação apresentada pelos

Comunicação

personagens.

e

Informação

Científica

e

Tecnológica em Saúde/Fiocruz, Rio de Janei-

c) Como você avalia a atitude do gerente da

ro, 2003; direção de Breno Kuppermann; rotei-

oficina e o gozo do direito à informação por

ro de Joaquim Assis; duração: 17 minutos.

parte do cliente? Por quê?

Enfoque de risco Na abordagem quantitativa do risco, torna-se necessário diferenciar duas importantes palavras que envolvem o risco: a possibilidade e a probabilidade da ocorrência de algum agravo ou dano.

O risco, pensado como possibilidade de ocorrência de agravo ou dano, pode ser considerado inerente à própria vida. V iver é estar, de certa maneira, submetido a variados riscos. A probabilidade é uma medida; é a relação existente entre o número de agravos/danos que poderiam acontecer em uma dada

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

situação e sua real ocorrência. É, portanto, a probabilidade que pode ser avaliada e gerenciada, já que ela admite gradação.

Igualmente importante é definir e caracterizar os chamados fatores de risco*. Eles não são necessariamente as causas do dano: eles são de natureza probabilística e não de natureza determinística. Sua presença pode provocar um efeito ou um evento danoso com maior frequência. Já a causa, quando presente, provoca o efeito e quando é retirada, esse efeito não aparece (GUILAM; CASTIEL, 2006).

*Fatores de risco – designa as características ou circunstâncias cuja presença se associa ao aumento da probabilidade de que o dano venha a ocorrer independentemente do fator de risco ser ou não uma das causas do dano (LIEBER; RO-

No que diz respeito às vigilâncias do campo da saúde, cabe

MANO, 1997), seja este

ainda ressaltar uma questão sobre o enfoque de risco e como

dano relacionado à saú-

ele se relaciona ao processo regulatório das vigilâncias do campo da saúde.

de de uma pessoa, de um grupo de pessoas ou ao ambiente. Fonte: Adaptado de Lieber e Romano (1997).

Existe uma variedade de termos para designar fatores de risco e tipos de risco, sendo possível encontrar as seguintes nomenclaturas: situação de risco, condições de risco, fontes de risco, risco ocupacional, risco ambiental, risco sanitário e risco epidemiológico (BARCELLOS; QUITÉRIO, 2006; BRASIL, 2005a;c; LUCCHESE, 2001). Outro aspecto é a relação entre o enfoque de risco e o processo regulatório das vigilâncias do campo da saúde, chamado de “regulação dos riscos”, que todas as vigilâncias fazem. Essa regulação se consubstancia na elaboração de normas técnicas e recomendações de medidas preventivas e difere da regulação econômica, que só a vigilância sanitária faz. Em outras palavras, o risco mais ou menos elevado se relaciona com a existência ou a ausência de um conjunto de medidas preventivas para reduzi-lo. Isso é a chamada “regulação do risco”, que as vigilância(S) em saúde fazem. Porém, não fazem sozinhas já que outras áreas do Estado também regulam/regulamentam

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Gestão da Vigilância à Saúde

fatores de risco. Por exemplo, na esfera federal: Ministério da Agricultura; Ministério do Meio Ambiente, por meio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama); Ministério da Indústria e Comércio, por meio do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro); Ministério do Trabalho e Emprego; e Ministério da Ciência e Tecnologia, por meio da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). (LUCCHESE, 2001).

A avaliação do risco na dimensão estritamente técnica – identificar e quantificar o risco – não é suficiente. O resultado dessa avaliação, que nem sempre pode ser feita, deve ser integrado a aspectos sociais, econômicos e políticos na hora da decisão e da ação. A comunicação do risco é fundamental, mas também não devemos esquecer quem cria o risco e quem dele se beneficia (LIEBER; ROMANO, 1997). O cálculo matemático puro e o uso apenas dos efeitos biológicos, físicos ou químicos não levam em conta a complexidade dos problemas que afetam a saúde (FREITAS, 2008). E considerar a noção de complexidade faz com que não possamos reduzir a análise dos riscos aos componentes isolados do problema, que precisa ser compreendido em todas as suas dimensões, para não aumentar as incertezas, dificultando as estratégias de prevenção e controle dos riscos. É necessário compreender os problemas de saúde em seus múltiplos aspectos, em suas variadas naturezas e em suas relações sociais, culturais e econômicas, pois as interações entre elas resultarão em diferentes níveis de riscos e danos, seja à população, a grupos específicos (trabalhadores, consumidores) ou ao ambiente.

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

Em síntese, a regulação do risco pode ser vista em dois sentidos:

 no mais restrito, como sinônimo de regulamentação, ato de elaborar regulamentos, normas; e/ou

 no mais amplo, segundo Lucchese (2001), englobando os estudos de análise de risco, as regulamentações por eles geradas e as políticas de gerenciamento de risco empreendidas pelo estado. A norma técnica das vigilância(S) em saúde é também uma construção social que expressa as “medidas preventivas”, considerando-se o risco e as características intrínsecas das tecnologias (condições de trabalho, processo de produção, tipo de alimento/medicamento, equipamento etc). Essa norma relacionase à magnitude do agravo ou do dano e ao desenvolvimento científico-tecnológico existente no momento de sua elaboração, sendo, portanto, mutável. Por falar em caráter mutável da norma técnica, um exemplo da vigilância epidemiológica, para a qual é muito importante a definição de caso*, que está sempre vinculada aos objetivos do sis'tema'de'vigilância e' aos' conhecimentos que'se têm sobre 'a doença. A definição de caso, por tudo isso, é mutável.

*Definição de caso – representa um conjunto de critérios de confirmação da doença (aspectos clínicos,

resultados

laboratoriais e critérios epidemiológicos).

Se

essa definição é sensível e precisa, ela favorece a

Vamos ver o exemplo da gripe suína? Consulte os seguintes

qualidade do sistema de

documentos do Ministério da Saúde, disponíveis na internet e

informação e permite a

na biblioteca do curso:

comparação dos dados entre regiões e em uma

 Informe do dia 27/04/09, às 13h30min, “Emergência de saúde pública de importância internacional (ESPII): Ocorrências de casos humanos na América do Norte”,

mesma região ao longo do tempo. Fonte: Elaborado pelas autoras deste livro.

disponível em: .

Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

 “Protocolo de procedimentos para o manejo de casos e contatos de Influenza A (H1N1)”, versão IV, atualizado em 05/06/2009, disponível em: . Você observou como mudou a definição de caso de gripe pelo vírus A H1N1 (“gripe suína”)? Quais as implicações dessa mudança para a vigilância epidemiológica e a sanitária?

Nas vigilância(S) em saúde, o enfoque de risco apresenta uma característica bem marcante: o risco à saúde não “respeita” território geográfico, divisas ou fronteiras, por exemplo:

 O lixo tóxico de uma indústria situada em Minas Gerais contaminou o Rio Paraíba do Sul e teve efeito nos Municípios que se situavam às suas margens, inclusive naqueles sob jurisdição do Rio de Janeiro.

 O contraste radiológico Celobar®, produzido no Estado do Rio de Janeiro, foi responsável por várias mortes no Estado de Goiás, uma vez que foi esse estado o que mais comprou e utilizou os lotes falsificados. Há, portanto, uma interdependência social entre os Estados e entre Municípios na mesma Unidade Federativa. Ou seja, o “controle” que as vigilâncias dessas Unidades fazem ou deixam de fazer pode ter repercussões nas demais localidades. E, como vimos anteriormente, essa possibilidade de repercussão para terceiros é a externalidade. Além disso, conhecer as condições e os problemas de saúde da população exige observar a desigual distribuição do risco e do adoecer, contextualizando-os por meio de indicadores demográficos, socioeconômicos, ambientais ou de outra ordem.

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

A RELAÇÃO COM A PROMOÇÃO DA SAÚDE: SAÚDE COMO DIREITO E INTERSETORIALIDADE

É fácil notar as diferenças entre os componentes das vigilância(S) em saúde e, também no campo da saúde, da prestação de serviços assistenciais. Também fácil é compreender que as ações que todos os componentes das vigilância(S) em saúde realizam com o intuito de minimizar os riscos as caracterizam como proteção da saúde e prevenção. Estaremos protegendo a saúde da população de agravos e danos quando a ação estiver sendo realizada antes que eles ocorram, embora não possamos dizer que tais ações acabarão com os riscos, uma vez que, como já vimos, há sempre a possibilidade de sua ocorrência, por isso, há sempre uma incerteza... Mas pensar as vigilâncias na relação com a promoção da saúde merece um pouco mais de reflexão...

v

Funtowicz e Ravetz (1993) elencam três níveis de

incertezas: técnicas, que

Com base em seus conhecimentos teóricos e práticos acerca das vigilâncias do campo da saúde e da promoção da saúde, você identifica alguns pontos de convergência entre elas?

se relacionam aos dados existentes e às

possibilidades de análises; metodológicas, relacionadas à baixa

Quais, por exemplo?

confiabilidade dos dados; e epistemológicas,

A promoção da saúde implica uma redefinição da saúde e de seus objetos. A saúde passa a ser compreendida como resultado de vários fatores relacionados à qualidade de vida, ultrapassando

Módulo Específico

oriundas dos limites do conhecimento científico.

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Gestão da Vigilância à Saúde

o enfoque na “doença” e incluindo questões como habitação, alimentação, educação e trabalho. Suas atividades, segundo Buss (2000, p. 67):

*Modelos de atenção – podem ser pensados em três dimensões: gerencial – condutora do processo de reorganização das

[...] estariam, então, mais voltadas ao coletivo de indivíduos e ao ambiente, compreendido num sentido amplo, de ambiente físico, social, político, econômico e cultural, através de políticas públicas e de condições favoráveis ao desenvolvimento da saúde [...] e do reforço (empowerment) da capacidade dos indivíduos e das comunidades [...].

ações e serviços; organizativa – que estabelece as relações no processo de cuidado; e técnico-assistencial, que define as relações entre os sujeitos das práticas e seus objetos de trabalho. Fon-

A promoção da saúde persegue, embora nem sempre encontre, a mudança no modelo assistencial ou modelo de atenção*, composto por combinações de saberes e técnicas direcionadas à resolução dos problemas e ao atendimento das necessidades de saúde.

te: Adaptado de Teixeira (2002).

A promoção da saúde, na superação do modelo assistencial, passa a ter como objeto os problemas de saúde e seus determinantes, e a qualidade de vida pode ser entendida como condições de vida. A promoção da saúde prevê uma combinação de estratégias: ações do Estado, da comunidade, de indivíduos, do sistema de saúde e de parcerias intersetoriais. Trabalha com a ideia de responsabilidade múltipla pelos problemas e pelas soluções (BUSS, 2000).

A promoção, mais do que uma política, representa uma estratégia de articulação transversal que estabelece [...] mecanismos para reduzir as situações de vulnerabilidade, incorporar a participação e o controle so-

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

cial na gestão das políticas públicas e defender a equidade (O’DWYER; TAVARES; DE SETA, 2007, p. 468).

Na promoção da saúde, a saúde é vista como um direito humano fundamental, de responsabilidade múltipla, inclusive do Estado, com a população exercendo seu direito de participação e decisão. Vamos retornar às vigilâncias para ressaltar cinco pontos que as aproximam da promoção da saúde:

 As vigilância(S) em saúde, como integrantes do campo da promoção da saúde, extrapolam (ultrapassam) a visão do risco quando propõem a transformação dos processos de consumo, de trabalho e de produção e a inserção do cidadão e do trabalhador nesses processos, de forma a potencializar suas vidas.

 A contradição capital-trabalho-saúde gera tensões que exigem a ação do Estado para diminuir as desigualdades. A vigilância sanitária, em seu caráter regulatório, precisa ser o fiel de uma balança entre os interesses do setor produtivo e os interesses do cidadão, muitas vezes conflitantes. Como vimos, há o chamado poder de polícia, poder da Administração Pública, em que o Estado, com base no interesse público, pode intervir. A concessão de registro, autorização e licença de funcionamento são permissões do Estado, que podem e devem ser revistas sempre que necessário, sempre que a desigualdade produção-consumo puder ser prejudicial à sociedade. Quando isso ocorre, a vigilância sanitária pode (e deve) agir de forma a minimizar os riscos à saúde. Imaginemos algumas situações.

 Um hospital apresenta altíssimas taxas de infecção hospitalar no berçário; um determinado medicamento causa mortes desnecessárias; uma fábrica que esteja poluindo um manancial ou um rio com seus resíduos ou fazendo adoecer seus trabalhadores. Depois de um

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Gestão da Vigilância à Saúde

processo de investigação, ou como medida de cautela, em casos graves, para limitar o número de mortes ou de incapacidades (se há risco muito alto), a ação da vigilância sanitária pode ser a interdição temporária do berçário, pode chegar à retirada (cassação) da licença sanitária, ou ao cancelamento do registro do medicamento em questão, ou à intervenção de diversos níveis na fábrica. É claro que essas medidas dadas como exemplos de ação não são as primeiras a serem tomadas.

 A vigilância em saúde do trabalhador, ao lidar com a questão do processo de trabalho, e a vigilância ambiental, com o processo de produção/industrialização e o ambiente, são igualmente arenas de conflito entre interesses privado e coletivo que exigem a intervenção do Estado (LUCCHESE, 2001; ALVES, 2003; BRASIL, 2005b;c). Essas vigilâncias muitas vezes se articulam com a vigilância sanitária para intervir em estabelecimentos ou processos de trabalho.

Esses exemplos demonstram que uma vigilância pode e deve recorrer à outra. Muitas vezes, a vigilância sanitária recorre à epidemiológica, à ambiental ou à vigilância em saúde do trabalhador, ou todas recorrem à sanitária. Sabemos que há em todas elas um saber específico... Mas, a questão central nesse ponto é a possibilidade de conflito.

Conflitos podem ocorrer sempre que há uma decisão. Mas, não nos parece que a vigilância epidemiológica seja caracterizada por esse tipo de conflito e enfrentamento. Além disso, de todas as vigilâncias, essa é a mais setorial, a que mais atua nos limites do setor saúde.

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

 As vigilâncias do campo da saúde têm procurado se articular, com maior ou menor grau de sucesso, para aumentar sua capacidade de análise e intervenção nos problemas concretos, ou para melhorar a qualidade da intervenção.

Você notou que os exemplos dados no tópico anterior também se enquadram aqui? É que, na existência de um possível conflito, a necessidade de um reforço mútuo e de uma ação articulada aumentam...

Mas, não é só com as outras vigilâncias – ou mesmo com as unidades prestadoras de cuidado assistencial – que elas se articulam. Sua ação será mais efetiva se for capaz, também, de aumentar a potência de intervenção dos atores envolvidos nos problemas sanitários (CAMPOS; BELISÁRIO, 2001). Assim, na busca da transformação social, as vigilância(S) em saúde reforçam a capacidade dos diferentes grupos sociais envolvidos nos problemas sanitários: consumidores, cidadãos, profissionais e trabalhadores da área da saúde. Isso nada mais é do que o empowerment (empoderamento ou fortalecimento do poder). O conceito de empoderamento apresenta-se como recurso importante para sustentabilidade das ações de educação para a saúde, orientadas, tanto individualmente quanto de forma coletiva, nos grupos sociais e organizações, por meio de processos educativos participativos (O’DWYER; TAVARES; DE SETA, 2007). Foi dito por Lucchese (2001) que a vigilância sanitária exige a mediação de setores da sociedade e produz atitudes éticas na relação entre produção, trabalho e consumo. Para tentar aclarar essa afirmação de

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Gestão da Vigilância à Saúde

Lucchese, acrescentamos que: 1) ela precisa de cidadãos conscientes e exigentes, visto ser impossível o controlar da qualidade e da segurança sanitária de todos os produtos e serviços que podem acarretar prejuízos à saúde; 2) ela pode ser considerada um espaço de exercício da cidadania e controle pela sociedade, se os cidadãos forem conscientes e exigentes. Isso pode ser aplicado também, pelo menos, a mais duas vigilâncias do campo da saúde, notadamente àquelas que têm conflitos potenciais: a dos processos de produção-trabalho (vigilância em saúde do trabalhador); a dos processos de produçãoconsumo (vigilância sanitária); e a da exposição a situações de risco (em especial a vigilância ambiental).

 Entendidas como campos de prática, onde se produzem ações/intervenções, mas também conhecimentos, as vigilância(S) em saúde são de caráter interdisciplinar. No exercício de sua ação e na produção de seu conhecimento, podemos utilizar várias disciplinas. Algumas delas, assim como na saúde como um todo, são comuns a todas as vigilâncias: o planejamento/ gestão/administração, sociologia, política, antropologia e a epidemiologia/método epidemiológico, a ética e o direito. Além disso, podemos elencar algumas especificidades de cada componente das vigilância(S) em saúde. A vigilância sanitária, com seu amplo espectro de ação, é campo de convergência de várias disciplinas, dentre elas: biossegurança, engenharias, arquitetura, física, química, farmacologia, toxicologia, radiologia, odontologia e direito administrativo, sendo esta última um de seus pilares. A vigilância em saúde do trabalhador, além de igualmente utilizar-se de algumas dessas disciplinas, tem na ergonomia uma de suas disciplinas centrais. A vigilância ambiental e a epidemiológica também se utilizam bastante de

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

disciplinas como a ecologia, a biologia e a geografia (COSTA; ROZENFELD, 2000; BARCELLOS; QUITÉRIO, 2006).

Assista ao vídeo “João Pintor”, disponível no CD e na biblioteca do curso. O vídeo retrata uma suposta fiscalização de posturas municipais.

v

Disponível em: .

processo de produção ou comércio de bens, ou de prestação de serviços articulando ações das vigilâncias do campo da saúde? b) Analise o uso (e a qualidade do uso) do poder de polícia no contexto do vídeo. c) Analise a participação popular e das lideranças.

 A Carta de Ottawa (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 1992), um dos marcos da promoção da saúde, elenca um conjunto de valores (qualidade de vida, saúde, solidariedade, equidade, democracia, desenvolvimento, participação) e de estratégias (políticas públicas saudáveis, ambientes favoráveis à saúde, reforço da ação comunitária e desenvolvimento de habilidades pessoais, reorientação do sistema de saúde, parcerias intersetoriais) da promoção da saúde. A Carta já apontava não apenas para a multicausalidade na saúde, mas também para o fato de que, ao pensar a saúde como qualidade de vida, sua promoção transcende o setor saúde: a interinstitucionalidade ou intersetorialidade é, assim, uma de suas principais estratégias.

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Gestão da Vigilância à Saúde

As vigilância(S) em saúde, na requalificação de seus processos de inter venção, têm como princípio operativo a intersetorialidade. Este termo é definido, na Declaração de Santa Fé, como: [...] o processo no qual objetivos, estratégias, atividades e recursos de cada setor são considerados segundo suas repercussões e efeitos nos objetivos, estratégias, atividades e recursos dos demais setores. (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 1992 apud BUSS, 2000, p. 174).

Falamos em intesetorialidade... Pensar a intersetorialidade nos faz perguntar: mas, afinal, que setores são esses? Apenas instituições públicas responsáveis pela formulação e implementação de políticas? De quais setores estamos mesmo falando?

A princípio poderia parecer apenas um novo “arranjo”, uma nova “organização” daquilo que já ocorria no campo da saúde. Os setores não são apenas aqueles diretamente ligados ao poder público ou à administração direta de órgãos estatais. Para além deles, a saúde e as vigilância(S) em saúde necessitam estar se “entrelaçando” com setores da sociedade civil, em um verdadeiro “abraço de cidadania”. Afinal, a saúde é um assunto não apenas do Estado, mas de toda a sociedade. Um exercício de pensamento nos leva, por exemplo:

 À vigilância em saúde do trabalhador: como efetuar ações desconectadas dos sindicatos de trabalhadores ou de outros setores da sociedade, como o Ministério do Trabalho?

 À vigilância ambiental: não são significativas as contribuições oriundas das organizações não governamentais que têm como tema o meio ambiente

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

e sua articulação com outros setores como o Ministério do Meio Ambiente?

 À vigilância epidemiológica: tal como ela se constituiu no Brasil, junto com o controle de doenças, como pensar na vigilância epidemiológica e no avanço da Política Nacional de HIV/Aids sem a participação das organizações não governamentais que com ela lidam, dos grupos de portadores de HIV/Aids (por exemplo, Pela Vida, Gappa) e de setores como o Ministério do Trabalho ou da Previdência?

 À vigilância sanitária: como pensar a efetividade de sua ação sem a participação das organizações não governamentais dos consumidores – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Associação das Donas de Casa, de Portadores de Patologias etc. – e sem outros órgãos específicos que têm atribuições sobre os mesmos objetos da vigilância sanitária, tais como os Ministérios do Meio Ambiente, do Trabalho, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e da Agricultura? As questões da intersetorialidade e do controle social nas vigilância(S) em saúde são de tal importância que a Lei n. 8.080/90 (BRASIL, 1990), em seus artigos 12 e 13, cria comissões intersetoriais de âmbito nacional em alguns dos componentes das vigilância(S) em saúde. Como exemplos: Art. 12 - Serão criadas comissões intersetoriais de âmbito nacional, subordinadas ao Conselho Nacional de Saúde, integradas pelos ministérios e órgãos complementares e por entidades representativas da sociedade civil. Parágrafo único. As comissões intersetoriais terão a finalidade de articular políticas e programas de interesse para a saúde cuja execução envolva áreas não compreendidas no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Art. 13 – A articulação das políticas e programas a cargo das comissões intersetoriais abrangerá, em especial, as seguintes atividades: I – alimentação e nutrição; II – saneamento e meio ambiente; III – vigilância sanitária e farmacoepidemiologia; IV – recursos humanos; V – ciência e tecnologia; e VI – saúde do trabalhador. (BRASIL, 1990, arts. 12 e 13).

Saiba mais Acesse o site do Conselho Nacional de Saúde: , para obter informações sobre o funcionamento

Tendo em vista o que foi discutido até aqui sobre as relações entre vigilância(S) em saúde e promoção da saúde e o conjunto de

e a agenda da Comissão Intersetorial de

valores e estratégias da promoção em saúde

Saúde do Trabalhador (Cist); da Comissão

elencados na Carta de Ottawa, parece

Permanente para Acompanhamento de Do-

pertinente afirmar que as vigilâncias se

enças Sexualmente transmissíveis (DST) e

aproximam do campo da promoção da

Aids (Capda); da Comissão de Vigilância

saúde. Você concorda? Abordaremos a

Sanitária e Farmacoepidemiologia; e da Co-

seguir o processo de trabalho das vigilâncias.

missão Intersetorial de Saneamento e Meio Ambiente (Cisama).

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

O PROCESSO DE TRABALHO DAS VIGILÂNCIAS DO CAMPO DA SAÚDE

Agora que já foram incluídas as vigilância(S) em saúde no campo da promoção da saúde e que foram abordados seus principais conceitos, podemos perguntar: como atuam os componentes das vigilância(S) em saúde? Ou, dito de outra maneira, qual o seu processo de trabalho?

Não pretendemos aqui fazer uma análise exaustiva do processo de trabalho em cada uma das vigilâncias, mas apenas apontar o que há de comum e específico nelas, do ponto de vista da gestão do sistema local de saúde. Ressaltamos que o processo de trabalho em saúde tem sido bastante estudado no que concerne à assistência, mas, no componente das vigilância(S) em saúde, ele não está suficientemente analisado na literatura. Primeiro, é importante falar sobre o que é um processo de trabalho. Qualquer processo de trabalho pode ser definido como um conjunto de ações sequenciadas, que envolvem atividades da força de trabalho e a utilização dos meios de trabalho, visando o alcance de objetivos e metas. Os elementos componentes do processo de trabalho são:

 a atividade adequada a um fim, isto é, o próprio trabalho;

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Gestão da Vigilância à Saúde

 a matéria a que se aplica o trabalho, o objeto de trabalho; e

 os meios de trabalho, o instrumental de trabalho.

Vejamos brevemente cada um dos elementos que compõem o processo de trabalho.

AS ATIVIDADES E AS FINALIDADES DO PROCESSO DE TRABALHO

Qualquer processo de trabalho, inclusive o da saúde, deve ter uma finalidade. A finalidade “mais ampla” do processo de trabalho nas vigilâncias já foi vista: promover e proteger a saúde, atuando sobre os determinantes e riscos. Entretanto, ao pensarmos no Sistema Único de Saúde, em todas as esferas de gestão (Municípios, Estados e União) e nas diferentes formas de organização social das ações de saúde que buscam responder às necessidades e conhecer os problemas de saúde de cada local, é possível citar algumas finalidades específicas. No âmbito local, o que há de comum entre as vigilância(S) em saúde é a finalidade específica de reconhecer os problemas de saúde locais e atender às necessidades de saúde em seu território, sejam elas “sentidas” ou não pela comunidade e identificadas ou não pelos profissionais de saúde. Aqui é preciso ressaltar que, quando tomamos o conceito de território, não se trata apenas de uma divisão no sentido físico, nem se limita igualmente às fronteiras nacionais ou aos limites estaduais ou municipais. Embora qualquer território tenha seus objetos fixos (casas, centro de saúde, escolas etc), existem sempre os fluxos (de pessoas, de informações, de produtos, de dinheiro e também de doenças etc.) que, muitas vezes, ultrapassam a divisão

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

ter ritorial administrativa (país, estado, município, região administrativa, setor censitário). Além disso, os territórios são sempre dinâmicos: neles são estabelecidas relações entre as pessoas no cotidiano de suas vidas; são espaços de poder (administrativo, político, cultural etc.) e, na sua dinamicidade, mudam com maior ou menor rapidez (PEREIRA; BARCELLOS, 2006). O conceito geográfico de território-processo não é incompatível com o de jurisdição, que é passível de conter vários territórios-processos. A base territorial da ação da vigilância sanitária é principalmente a divisão jurídico-administrativa, ou seja, a jurisdição. Essa divisão é necessária pelo componente fiscal de sua ação, que fica circunscrita a um ente federativo responsável, garantindo sua validade jurídica (O’DWYER; TAVARES; DE SETA, 2007).

“O território é sempre um campo de atuação, de expressão do poder público, privado, governamental ou não governamental e, sobretudo, populacional. Cada território tem uma determinada área, uma população e uma instância de poder [...]” (ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO, [s.d.]).

Esse fato é de suma importância para as vigilância(S) em saúde. Um Município que trabalhe para conter a ocorrência de dengue pode ter sua população afetada se o Município vizinho não fizer o mesmo: o Aedes Aegypti não respeita a divisa municipal. Da mesma forma, Rio de Janeiro e São Paulo são Estados que concentram o maior parque produtivo de produtos farmacêuticos, e os medicamentos ali produzidos são transportados e consumidos em todo o país e, algumas vezes, mesmo no exterior. No que se refere ao meio ambiente, basta recordar o recente desastre ambiental do Rio Pomba, em 2003, quando o vazamento de produto químico da fábrica de papel Cataguases, em Minas Gerais, contaminou os rios Muriaé e Paraíba do Sul, atingindo a população ribeirinha de Municípios do Rio de Janeiro, provocando desabastecimento.

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Tendo o conceito de “território” em mente, podemos entender que a resposta às necessidades de saúde e a identificação dos problemas de saúde são igualmente finalidades das esferas de governo no âmbito da saúde, para que possam organizar suas ações. E podemos pensar que esse território será socialmente construído de forma cada vez mais complexa, de acordo com a esfera de Governo que deve “atuar”.

Relacionada à operacionalização do conceito de território para intervenção no campo da saúde, há a perspectiva da regionalização. Recentemente, o Pacto pela Saúde defendeu a regionalização a partir de regiões de saúde. Essas regiões são recortes territoriais inseridos em um espaço geográfico contínuo que contemple uma rede de serviços de saúde compatível com certo grau de resolubilidade para aquele território. Esse recorte territorial não é limitado ao Município, podendo ser parte dele ou um conjunto deles. A ideia de regionalização também é passível de ser incorporada pela vigilância sanitária, que tem nos Municípios diferentes limites e possibilidades de atuação, desde que a questão da jurisdição seja assegurada.

OS OBJETOS E OS SUJEITOS DO TRABALHO As necessidades sociais de saúde e os problemas identificados informam e delimitam os objetos do processo de trabalho. Esses problemas devem ser conhecidos e sobre eles é que se dá a ação das vigilâncias. Mas como são identificados? Sua identificação também é complexa, como são complexos os problemas de saúde. É necessário, para seu conhecimento e análise, a utilização de:

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

 enfoque clínico, que identifica os problemas em sua dimensão biológica e individual;

 enfoque epidemiológico, que identifica os problemas em grupos populacionais; e

 enfoque social, que identifica os problemas na população tendo em vista os processos de desenvolvimento econômico, social e político que constituem os determinantes sociais dos problemas e necessidades de saúde. Considerando esses enfoques, é possível identificar os objetos do processo de trabalho em saúde, que são, portanto, os danos, os agravos, os riscos e os determinantes das condições de vida da população. Por tudo que já foi visto, podemos concluir que não há apenas um objeto, mas vários objetos do processo de trabalho nas vigilância(S) em saúde. Assim como são vários os objetos, são múltiplas as intervenções. Cada um dos enfoques privilegia um modo de intervenção: desde o diagnóstico e tratamento individuais (enfoque clínico); controle sanitário de bens e serviços de saúde, controle de vetores, ações de prevenção, educação sanitária (enfoque epidemiológico); até a intervenção sobre os determinantes sociais que, como já citado, é sempre de caráter intersetorial e multidisciplinar (enfoque social). Ora, se os problemas e intervenções na área de promoção da saúde não se limitam ao setor saúde, o trabalho nas vigilância(S) em saúde também não é realizado apenas pelos profissionais de saúde. O sujeito do processo de trabalho nas vigilâncias do campo da saúde é, portanto, coletivo. Além dos profissionais de saúde, são sujeitos da prática os profissionais de outros setores e a população ou grupos populacionais organizados. Uma especificidade do sujeito da vigilância sanitária em relação ao das outras vigilâncias, de importância para o gestor local, é que ele precisa ser um agente público investido na função. Se ele não o for, seus atos administrativos podem ser anulados administrativa ou judicialmente. Isso decorre do fato de seu trabalho estar submetido aos preceitos da Administração Pública, direcionado por normas jurídicas.

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OS MEIOS DE TRABALHO Os sujeitos das vigilâncias utilizam vários meios de trabalho para identificar seu objeto e realizar suas ações. Salientando que o sujeito é coletivo e sua intervenção extrapola o setor saúde, é compreensível que devam lançar mão não apenas de saberes e tecnologias pertencentes ao seu campo de atuação, mas também de outros saberes e tecnologias, como a comunicação e o planejamento. Os sujeitos das vigilâncias alimentam-se de várias disciplinas, métodos e instrumentos para realizar suas intervenções, que não se restringem às ações meramente técnicas, mas abarcam também as ações dirigidas ao fortalecimento da sociedade e da cidadania para alcançar sua finalidade de promoção da saúde e prevenção de danos ou agravos.

Os objetos, sujeitos e meios de trabalho estabelecem uma rede complexa de relações de trabalho e definem a organização do processo de trabalho nas vigilância(S) em saúde, que contempla duas dimensões: a políticogerencial e a técnico-sanitária. A dimensão políticogerencial é a que reconhece os problemas de saúde e cria condições para a intervenção, planeja e programa as ações e fortalece a sociedade. A dimensão técnicosanitária é a que atua no controle dos determinantes, riscos, danos e agravos à saúde.

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

O

PROCESSO INVESTIGATIVO

Uma atividade comum a todas as vigilância(S) em saúde é a atividade de investigação, que busca caracterizar a situação ou o caso e, se possível, estabelecer nexos causais. O processo investigativo é usualmente desencadeado por uma notificação ou denúncia, mas também pela eclosão de um problema e por ações de monitoramento e avaliação. Sendo desencadeado por modos tão variados, não dá para esperar que se baseie em um único método, certo?

As vigilâncias fazem, com frequência, investigação de surtos e análise de erros de processo, nas suas várias vertentes. Waldman (1998b), ao discutir os usos da vigilância e da monitorização (ou monitoramento) como instrumentos de saúde pública, aponta diferenças entre eles: (1) a vigilância analisa o comportamento de "eventos adversos à saúde" na comunidade e é uma das aplicações da epidemiologia nos serviços de saúde; (2) a monitorização acompanha indicadores e tem aplicação em diferentes áreas de atividade, inclusive fora do setor saúde. O autor ressalta uma semelhança entre eles: é que ambos exigem três componentes: a informação, a análise e a ampla disseminação da informação analisada a todos que dela necessitam. A avaliação realizada pelas vigilâncias pode utilizar várias abordagens e métodos, a depender de cada uma das vigilâncias, mas também do que queremos avaliar (avaliação da qualidade dos serviços, avaliação epidemiológica dos serviços, avaliação de tecnologias em saúde etc.). Mas geralmente tem, também, um componente de avaliação analítica laboratorial. O laboratório pode ter também o papel de “instância de perícia”, a exemplo do que ele tem para a vigilância sanitária na chamada “análise fiscal”.

A avaliação analítica laboratorial pode incluir diferentes técnicas para separar, identificar e determinar que substância está presente, e qual a sua

v

concentração ou diluição, em uma mistura

complexa com vários componentes. Como exemplos, a análise

espectrofotométrica e a cromatográfica.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Essa análise é aquela que o laboratório público (oficial) realiza em objetos e materiais sujeitos à vigilância (por exemplo, em medicamentos e insumos farmacêuticos) e que é destinada a comprovar a sua conformidade com a fórmula que deu origem ao registro e/ou a sua condição para uso seguro em seres humanos.

Os componentes das vigilância(S) em saúde possuem algumas semelhanças e algumas especificidades no que diz respeito ao seu processo de trabalho. É bem claro, e já foi explicitado, que o planejamento, a gestão e a comunicação são fundamentais para todos eles. Igualmente importantes para todos os componentes das vigilância(S) em saúde são a produção e a utilização de informações, sem as quais a efetividade de suas ações pode ficar aquém do desejável.

Por exemplo, se a vigilância sanitária em um grande Município pretende inspecionar 100% das maternidades em um ano, como ela deve se planejar? Deve começar pelos serviços que atendem situações de maior risco ou de menor risco? A resposta mais imediata pode ser inspecionar as maternidades de alto risco. Mas, e se houver a informação de que essas maternidades tiveram infecção hospitalar em nível aceitável, poucos nascimentos de baixo peso, baixas taxas de cesariana e poucas reinternações? Essas e muitas outras informações podem ser úteis para planejar, de forma mais eficiente, ações prioritárias de vigilância. Com esse exemplo, você pode vislumbrar a contribuição da vigilância sanitária para a redução de possíveis eventos adversos e para a melhoria da qualidade da atenção ao parto.

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

Fique atento(a): Não são apenas os sistemas de informação do setor saúde que são importantes para as vigilâncias. Há também os que fornecem dados e informações demográficas, socioeconômicas, de produção industrial, sobre o meio ambiente, sobre acidentes de trânsito e outros. Uma novidade! Os sistemas e bases de dados de interesse das vigilâncias ambiental e em saúde do trabalhador podem ser acessados no Painel de Informações em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador (Pisast). No momento, o acesso a esse painel se dá em: .

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Gestão da Vigilância à Saúde

Resumindo Nesta Unidade, optamos por tratar as vigilância(S) em saúde no nível das práticas. Após visitarmos os diversos significados do termo colocado no singular, passamos às suas definições legais, apontamos seus conteúdos comuns e suas especificidades, bem como o desenvolvimento desigual das vigilâncias. Abordamos conceitos considerados fundamentais para todas elas: risco e território/jurisdição, destacando que esses conceitos são operacionalizados de forma diversa por cada uma delas. No contexto da relação com a promoção da saúde, foi abordada a intersetorialidade, em resposta à pergunta: “quais setores?” Caracterizamos em linhas gerais o processo de trabalho: atividades realizadas; sujeitos e objetos do trabalho, meios de trabalho. Vimos que todas realizam investigação, requerem e geram informação, embora com escopo e objeto diversos.

Como base para este trecho da Unidade de Aprendizagem utilizamos a seguinte referência: TEIXEIRA, C. F.; PINTO, L. L.; VILASBOAS, A. L. (Org.). O processo de trabalho da vigilância em saúde. Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, 2004. 60 p. (Série Material Didático do Programa de Formação de Agentes Locais de Vigilância em Saúde, 5).

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Unidade 1 – As Vigilâncias do Campo da Saúde

Atividades de aprendizagem Confira se você teve bom entendimento do que tratamos nesta Unidade realizando as atividades propostas a seguir. Se precisar de auxílio, não hesite em fazer contato com seu tutor.

1. Por que neste texto usamos o termo “vigilâncias do campo da saúde” ou “vigilância(s) em saúde”, assim, no plural? Não poderia ser utilizado apenas no singular? 2. As definições legais das vigilâncias do campo da saúde são encontradas em dispositivos normativos de naturezas diversas e seus processos de trabalho também têm especificidades. Liste as singularidades de cada uma das vigilâncias do campo da saúde em relação às suas definições e aos seus processos de trabalho. 3. Identifique alguns pontos de convergência entre as vigilâncias do campo da saúde e a promoção da saúde, no que concerne aos seus princípios e estratégias.

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UNIDADE 2 ESTRUTURAÇÃO E GESTÃO DOS SISTEMAS NACIONAIS DAS VIGILÂNCIAS

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM Ao finalizar esta Unidade, você deverá ser capaz de: 

Descrever o processo de estruturação dos sistemas nacionais das vigilâncias;



Analisar a estruturação das vigilâncias no plano nacional; e



Debater sobre os componentes do sistema nacional de vigilância em saúde e vigilância sanitária.

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

INTRODUÇÃO Na Unidade de Aprendizagem anterior introduzimos as vigilâncias do campo da saúde, suas semelhanças e especificidades. Agora é hora de ver como essas vigilâncias se estruturam nacionalmente para concretizar sua missão. E isso é muito mais do que identificar como e onde elas se inserem nos organogramas dos níveis Federal, Estadual e Municipal... As vigilâncias do campo da saúde têm vivido nos últimos anos um intenso processo de discussão, de refor mulação institucional, seja no nível federal, na descentralização para estados e municípios e na ampliação de seus objetos e campo de atuação. Nesse processo, elas vêm se construindo como subsistemas no SUS. A vigilância em saúde do trabalhador é a exceção, pelo menos até o momento, no movimento das vigilância(S) em saúde para operar como sistemas nacionais. Antes de sua inserção na Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS), sua organização seguia outra lógica, conforme veremos nesta Unidade de Aprendizagem. Se essa lógica mudará, o tempo dirá...

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A ESTRUTURA DAS VIGILÂNCIAS NO PLANO NACIONAL

Todo processo de mudança se apóia no passado para ser construído. De um lado, existe um caráter histórico, que contribui para que os sistemas nacionais de saúde e seus componentes tenham certas características e funcionem de certo modo, em um dado contexto. De outro, a estruturação de um componente nacional geralmente tem correspondência com o que ocorre no plano internacional. Você já deve ter ouvido falar que o cuidado à saúde tem sido estruturado em redes regionalizadas nos últimos anos. Mas, recentemente, a palavra e a concepção de sistema ressurgem nos debates. Abordaremos brevemente essas três classes de questões nos itens que se seguem deste nosso início de conversa.

COERÊNCIA COM O QUE OCORRE NO PLANO INTERNACIONAL

A cooperação internacional no campo da saúde é bem anterior à criação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Mas, com a criação da OMS, toma corpo certa forma de cooperação centrada na erradicação e controle de doenças. É nesse marco que, em 1951, a Assembleia Mundial da Saúde (AMS) aprovou regulamentos sanitários internacionais. Esses regulamentos foram unificados, dando origem ao Regulamento Sanitário Internacional

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

(RSI) de 1969, que previa medidas de controle e intercâmbio de informações epidemiológicas sobre a propagação internacional da cólera, peste e febre amarela (WORLD HEALTH ASSEMBLY, 1995).

Saiba mais

Regulamento Sanitário Internacional (RSI) de 1969

Foi instituído para conseguir a "máxima segurança contra a propagação internacional de doenças com um mínimo de obstáculos para o tráfego mundial" e determinou a vigilância epidemiológica internacional de algumas doenças transmissíveis. Fonte: World Health Assembly (1995). Regulamento Sanitário Internacional (RSI) de 2005

Em 1995, após as Objetiva a instituição de um sistema global de vigilância, que é pequenas revisões de 1973 e definida como "coleta, compilação e análise contínua e sistemá1981, a AMS ordenou a tica de dados, para fins de saúde pública, e a disseminação oporrevisão do RSI de 1969. Essa tuna de informações de saúde pública, para fins de avaliação e revisão resultou no resposta em saúde pública, conforme necessário". Fonte: World desenvolvimento e na Health Assembly (2005). adoção pelos países do novo Regulamento Sanitário Internacional, de 2005 (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2005), cuja implementação no Brasil requereu o fortalecimento das vigilâncias, em especial da epidemiológica e da sanitária. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é o órgão responsável pelo controle sanitário dos aeroportos internacionais, portos e passagens de fronteiras terrestres para prevenir a propagação internacional de doenças. O ponto focal do país para implementação do RSI é a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). De acordo com o RSI 2005, o Brasil precisa se estruturar para detectar, avaliar, notificar e informar eventos até 15 de junho de 2012.

Essa organização do trabalho pode gerar dificuldades? Sugira alguns mecanismos de coordenação do trabalho para minimizar as possíveis dificuldades.

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Gestão da Vigilância à Saúde

COERÊNCIA COM A ORGANIZAÇÃO FEDERATIVA E COM O SUS Para compreender a organização das vigilâncias no país precisamos abordar alguns aspectos da nossa organização federativa e da discussão que toma corpo desde o final dos anos de 1990 sobre a descentralização das vigilâncias. *Federação – é o estado em que coexistem entes

Da organização federativa

federados (no Brasil são a União, os Estados e os Municípios, além do Distrito Federal) que cooperam, mas que também competem entre si. Eles têm autonomia, mas dependem uns dos outros (interdependência). Fonte: elaborado pelas autoras deste livro. *Ente federativo – é aquele que, designado como tal na Constituição, tem capacidade de legislar; de arrecadar impostos, taxas e contribuições; e de administrar para prover de serviços e bens públicos a sua popula-

A Constituição de 1988 (BRASIL, 2000) manteve para o Estado brasileiro o regime de federação*, e introduziu uma grande novidade: o Município como um dos entes federativos*. Assim, coexistem três entes (a União, os Estados e os Municípios), todos com autonomia, mas dependentes uns dos outros (interdependência). Como em toda Federação, esses entes cooperam, mas também competem entre si. A autonomia dos entes federados, que é relativa por causa da interdependência entre eles, relaciona-se à descentralização, que é uma das diretrizes gerais da nossa Constituição. A descentralização é um conceito que tem muitos significados. Mas, independentemente de ser uma descentralização política, administrativa ou desconcentração, ela tem dois lados, como os dois lados de uma mesma moeda: a realização descentralizada de ações e a transferência de recursos financeiros das esferas mais abrangentes de governo para as mais locais.

ção. Fonte: elaborado pelas autoras deste livro.

As transferências financeiras podem ser voluntárias ou negociadas (por exemplo, os convênios, que dependem das “vontades” e “disponibilidades orçamentárias”); e automáticas e regulares, como a repartição dos fundos de participação de estados e municípios (FPE e FPM, respectivamente) e a maioria dos repasses financeiros do SUS.

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Nos regimes federativos, as transferências financeiras podem servir para:  operar a descentralização;  coordenar a ação dos governos;  reduzir as desigualdades regionais; e  aumentar a cooperação entre os entes. Por isso, elas funcionam como um dos mecanismos que fazem a “coordenação federativa”. Vale lembrar que outro mecanismo dessa coordenação é a emissão de normas de caráter nacional. Na federação brasileira pós-1988, o SUS tem se destacado como um caso exemplar de construção de uma política pública analisado sob o ângulo das normas de caráter nacional e das transferências.

A descentralização das vigilâncias Entre os princípios e diretrizes que norteiam o SUS, tem sido privilegiada – mormente no campo do cuidado – a descentralização dos serviços e de sua gestão para o município. A descentralização das vigilâncias do campo da saúde seguiu processos diferentes em relação à descentralização do cuidado, e esses processos também foram diferentes entre si, inclusive no tempo. A vigilância voltada para os processos de adoecimento – vamos continuar a chamá-la de vigilância epidemiológica, mesmo considerando que ela não se restringe, há muito tempo, às doenças transmissíveis – explicitou a necessidade de se constituir como um “sistema nacional” em meados da década de 1970. A vigilância sanitária (vigilância dos processos de produção-consumo) fez o primeiro movimento de constituição do seu sistema nacional em 1994, em tempos de SUS (DE SETA, 2007). Ambas as vigilâncias – sanitária e epidemiológica – aprofundaram o processo de descentralização apenas quando duas circunstâncias se deram, não ao acaso, mas como decorrência

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Gestão da Vigilância à Saúde

histórica. A primeira circunstância foi a implementação da Norma Operacional Básica do SUS 01/96 (NOB SUS 01/96), que reforçou o papel das instâncias intergestores e introduziu critérios relacionados às vigilâncias para transferências financeiras automáticas para estados e municípios. A segunda, o fortalecimento dos serviços federais das vigilâncias epidemiológica e sanitária (DE SETA, 2007).

Você pode saber mais

v

sobre o Pacto de Gestão consultando os

documentos disponíveis em: .

POR QUE ESTRUTURAÇÃO DOS SISTEMAS DAS VIGILÂNCIAS E NÃO DAS REDES?

Como vimos na Unidade de Aprendizagem anterior, uma função comum a todas as vigilâncias do campo da saúde é a chamada “regulação dos riscos”. Para esse tipo de regulação se faz necessária a constituição de sistemas. Mas por que sistemas? 1. Principalmente porque há a obrigatoriedade legal de que o SUS execute, pelo menos, dois conjuntos de ações correspondentes às vigilâncias sanitária e epidemiológica, e esses conjuntos de ações estão legalmente definidos como sistemas. Ao mesmo tempo, algumas ações dessas áreas exigem elevados requerimentos técnicos e institucionais, difíceis de serem alcançados por todos os componentes de uma federação marcada pela desigualdade, como a brasileira. Como exemplo, as ações de estado, sejam aquelas típicas integrantes do elenco da vigilância sanitária (registro de medicamentos e outras tecnologias), ou outras comuns

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

a todas as vigilâncias, como a elaboração de normas técnicas fundadas na ciência para regulação ou controle dos riscos. Os requerimentos para o sistema nacional de vigilância sanitária são altos e podem ser classificados como exigências de ordem técnica, funcional e política. O vasto campo de atuação da vigilância sanitária – produtos, tecnologias (equipamentos e processos) e serviços – e a diversidade de ações – que vão das fiscais até a comunicação técnica de riscos e a comunicação com a sociedade – contribuem para um componente técnico diversificado e complexo. Por serem ações típicas de estado de defesa e proteção da saúde, precisam ser executadas por “agentes públicos” – profissionais concursados ou comissionados, relativamente protegidos em função do alto potencial de conflitos de interesse, o que implica nos requerimentos de ordem funcional e política (DE SETA, 2007). Os requerimentos técnicos e institucionais para o sistema nacional de vigilância epidemiológica também são elevados, principalmente em relação à análise da situação de saúde e articulação de respostas rápidas. 2. É necessário que haja uma ação abrangente, territorialmente, coordenada e cooperativa para prevenir ou minimizar os prováveis danos e agravos decorrentes da exposição aos riscos, fatores e situações de risco, ou seja, para reduzir a externalidade negativa das vigilâncias do campo da saúde, se faz necessário agir sistemicamente. Isso implica coordenação e cooperação, o que não impede que existam conflitos e até disfunções.

Como seria se:

 A definição de CASO para vigilância epidemiológica não fosse unificada nacionalmente?

 O REGISTRO de medicamentos não fosse unificado nacionalmente?

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Gestão da Vigilância à Saúde

O arranjo sistêmico possibilita a existência de componentes interdependentes, desiguais e complementares, capazes de realizar certas funções. E também, o ajustamento mediante retroalimentação. As trocas regulares incluem a informação, que é também um potente mecanismo para a coordenação do trabalho. A estruturação dos sistemas nacionais das vigilâncias é compatível com a estruturação de redes. Dito de outra forma, sistemas e redes podem e devem coexistir. A organização de redes funciona muito bem quando elas se destinam à troca de informações, produção de conhecimento e prestação de cuidados.

Fique atento(a): Em 22 de dezembro de 2009, o Ministério da Saúde publicou a Portaria GM n. 3.252/09, que substituiu e revogou a Portaria n. 1.172. Como apontado na Unidade anterior, a Portaria GM n. 3.252 definiu os componentes da vigilância em saúde. Ela também instituiu o Sistema Nacional de Vigilância em Saúde, bem como reiterou a existência do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, instituído por lei no final dos anos de 1990.

Com o pacto de Gestão 2006, os recursos financeiros federais a serem repassados automática e regularmente a Estados, Distrito Federal e Municípios foram agrupados em cinco blocos de

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

financiamento, que foram regulamentados pela Portaria MS/GM n. 204/07 (BRASIL, 2007d). Atualmente, a Portaria MS/GM n. 3.252/ 09, que revogou parcialmente a 204/07, é que dispõe sobre o bloco de financiamento Vigilância em Saúde. Os recursos federais que financiam as ações das vigilâncias do campo da saúde integram esse bloco, que apresenta dois componentes: I – Vigilância e Promoção da Saúde; e II – Vigilância Sanitária. Cada componente será discriminado no item correspondente ao financiamento, em cada sistema, nos tópicos seguintes. Vale ressaltar que os recursos de um componente podem ser utilizados em ações de outro componente (BRASIL, 2009a).

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Gestão da Vigilância à Saúde

O SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE

O Sistema Nacional de Vigilância em Saúde foi recentemente definido na Portaria n. 3.252, de 22 de dezembro de 2009. Esse sistema é coordenado nacionalmente pela Secretaria Nacional de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS), e tem como componentes os Subsistemas Nacionais de Vigilância Epidemiológica e em Saúde Ambiental; o Sistema Nacional de Laboratórios de Saúde Pública e os sistemas de informação, nos aspectos pertinentes à epidemiológica e à ambiental; os programas de prevenção e controle de doenças de relevância em saúde pública, incluindo o Programa Nacional de Imunizações; a Política Nacional de Saúde do Trabalhador; e a Política Nacional de Promoção da Saúde. O Subsistema de Vigilância em Saúde Ambiental abrange também a vigilância em saúde do trabalhador, ou seja, também o ambiente de trabalho

A coordenação das ações relativas à Saúde do Trabalhador, no âmbito do Ministério da Saúde, passou a integrar o escopo da SVS/MS com a Portaria MS/GM n. 1.956/07. (BRASIL, 2007b).

Neste tópico serão abordados os dois subsistemas, mas será dado destaque ao Subsistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE), que tem maior tradição na saúde e se

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ampara em norma legal de maior estabilidade e alcance, uma lei nacional (BRASIL, 1975). Ao mesmo tempo, conforme vimos na Unidade anterior, a vigilância ambiental em saúde, no que concerne aos fatores nãobiológicos é de desenvolvimento relativamente recente. E mais recente ainda é a incorporação da saúde do trabalhador à SVS.

O SUBSISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA (SNVE) No desenvolvimento da vigilância epidemiológica no Brasil, consideram-se dois momentos: a Campanha de Erradicação da Varíola (CEV), no final dos anos de 1960 e início de 1970; a criação do SUS, embora ações do campo da vigilância epidemiológica fossem realizadas desde muito antes no país. Após a CEV, que durou de 1966 a 1973, os princípios da vigilância epidemiológica foram aplicados a outras doenças imunopreveníveis. Foram organizadas pela esfera federal, em cooperação com os Estados, as Unidades de Vigilância Epidemiológica (UVE) e, nessa montagem, os Estados também participavam com aporte de recursos (ANAIS DA V CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 1975; RODRIGUES, 1977). Portanto, a CEV consistiu em uma política prévia que resultou na criação das bases estaduais do SNVE.

Saiba mais Quer saber mais sobre a ampliação do escopo das ações de vigilância epidemiológica no final dos anos de 1990, com a incorporação da vigilância das Doenças e Agravos Não Transmissíveis (Dant) e de fatores de risco? Leia o artigo de Malta et al., 2006, “A construção da vigilância e prevenção das doenças crônicas não transmissíveis no contexto do Sistema Único de Saúde”, disponível em: .

Com a criação do SUS, a vigilância epidemiológica, vista como base técnica para planejamento das ações no sistema de saúde, teve grande expansão. Ocorreu também, um movimento acelerado, a partir da década de 1990, de fortalecimento e ascensão na escala hierárquica, do serviço de vigilância epidemiológica da esfera federal (DE SETA, 2007; DE SETA; REIS, 2009) resultando na criação, em 2003, da

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Gestão da Vigilância à Saúde

Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). Essa Secretaria se incumbiu de:

 ações de vigilância, prevenção e controle de doenças;  coordenação nacional de programas de prevenção e controle de doenças;

 Programa Nacional de Imunizações; a investigação e resposta aos surtos de doenças emergentes de relevância nacional;

 coordenação da rede nacional de laboratórios de saúde pública; e

 Coordenação da Saúde do Trabalhador, mais recente*Norma Operacional Básica 01/96 – buscava regular o funcionamento do SUS,

promover

a

descentralização da gestão, dos recursos financeiros e das ações de saúde principalmente para os municípios. Instituiu as transferências regulares e automáticas de recursos financeiros federais,

substituindo

as

transferências negociadas (voluntárias). Parte dos recursos financeiros transferidos automaticamente estavam relacionados à adesão dos governos estaduais e municipais

a

programas

prioritários para o Governo federal e ao estabelecimento da Programação Pactuada e Integrada. Fonte: Elaborado pelas autoras deste livro.

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mente, conforme Portaria MS/GM n. 1.956/07 (BRASIL, 2007b). O Subsistema de Vigilância Epidemiológica, instituído como Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE) pela Lei n. 6.259/75, em função do momento histórico em que se constituiu abrangia apenas os serviços estaduais e o componente federal. Isto é, apenas os estados e a esfera federal participavam formalmente da divisão do trabalho no SNVE. No final dos anos de 1990, quase dez anos depois de ser alçado à condição de ente federativo e de figurar na lei como o executor preferencial das ações de saúde (BRASIL, 1990), o Município entra em cena na descentralização da vigilância epidemiológica. Nesse momento, a esfera estadual se encontrava minimamente estruturada, no que concerne às ações de vigilância epidemiológica, ainda que de maneira desigual, se comparados todos os estados. A partir de 1998, a descentralização também se acentua para os municípios com a implementação da Norma Operacional Básica do SUS 01/96* (BRASIL, 1996), quando são publicadas as Portarias do Ministério da Saúde n. 1.399/99 (PPI) (BRASIL, 1999b) e n. 950/99 (BRASIL, 1999c). Essas Portarias, não mais vigentes atualmente, definiram as responsabilidades das três esferas de governo e a forma de

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

financiamento das ações de epidemiologia* e controle de doenças, estabelecendo o repasse de recursos fundo a fundo para estados e municípios e a Programação Pactuada e Integrada de Epidemiologia e Controle de Doenças (PPI/ECD)*.

*Epidemiologia



as

ações denominadas hoje nas normas como "de vigilância em saúde" originalmente eram chamadas de "ações de epidemiologia e controle de

Ao contrário da sua denominação “ integrada”, a Programação Pactuada e Integrada (PPI) mostrou-se fragmentada: PPI da Epidemiologia e Controle de Doenças (ECD), PPI da Assistência etc.).

doenças". Essa mudança

Foi a PPI/ECD que, em 2003, em correspondência com o lócus institucional que passa a abrigá-la na esfera federal, mudou sua denominação para Programação Pactuada e Integrada da Vigilância em Saúde (PPI/VS). Instituída pela Instrução Normativa n. 1, de 2003, mais tarde foi denominada Programação das Ações Prioritária de Vigilância em Saúde (PAP/VS) e, a partir de 2008, Programação das Ações de Vigilância em Saúde (PAVS). O escopo das ações de vigilância sanitária nessas programações variou bastante ao longo dos anos (DE SETA, 2007).

gou a Portaria 1.399/99.

de denominação foi efetivada por meio da Portaria MS/GM n. 1.172/04 (BRASIL, 2004), que revoFonte: Elaborado pelas autoras deste livro. *Programação Pactuada e Integrada de Epidemiologia e Controle de Doenças (PPI/ECD) – e alterou o nome da Programação Pactuada e Integrada de Epidemiologia e Controle

de

Doenças

(PPI/ECD) para Programação Pactuada e Integrada da Vigilância em Saúde (PPI/VS). Fonte: Brasil (1999b).

Outro impulso na estruturação do Sistema foi a aprovação, em 1998, do Projeto VIGISUS I (Vigilância e Controle de Doenças), e, depois, do Projeto VIGISUS II (Modernização do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde), com financiamento total de US$ 600 milhões, dos quais a metade correspondia à contrapartida das esferas de governo brasileiras e a outra parte, a empréstimo do Banco Mundial.

Uma síntese: a vigilância epidemiológica no SUS A vigilância epidemiológica consiste em atividade interna e típica do setor saúde. Some-se a isso o fato de não haver conflitos

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Gestão da Vigilância à Saúde

sérios no seu campo de atuação entre interesses público e privado. Assim, se torna compreensível o seu grau de implementação comparativamente maior do que o das outras vigilâncias. Contudo, seu funcionamento no âmbito do SUS ainda apresenta certo grau de precariedade, principalmente na esfera Municipal, segundo as análises de Carvalho e Marzochi (1992) e Carvalho et al. (2005). A conclusão de Carvallho et al. (2005) é a de que, em apenas 27% dos municípios pernambucanos estudados, a vigilância epidemiológica estava implantada, e, parcialmente implantada em 46%, sendo que o maior porte dos municípios era fator que influenciava positivamente. Concluíram que as atividades de processamento, análise dos dados e a disseminação das informações ainda não fazem parte da rotina dos serviços. A despeito da distância no tempo e da diferença entre as variáveis utilizadas, os resultados das duas análises citadas guardam coerência entre si e apontam a necessidade de continuidade dos esforços para consolidação e aprimoramento do SNVE.

SUBSISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE AMBIENTAL (SINVSA) Conforme vimos na Unidade de Aprendizagem anterior, o tema ambiente foi incorporado à saúde bem recentemente. O mesmo podemos dizer da saúde do trabalhador, principalmente no que diz respeito ao seu componente de “vigilância”. Sobre essas vigilâncias podemos dizer que elas integram, juntamente com a vigilância sanitária, o trio das “vigilâncias do conflito”. E que o conflito só não é maior do que o atual, na medida em que a atribuição legal de fiscalização é alocada constitucionalmente a outros Ministérios, Meio Ambiente e Trabalho e Emprego. Apontamos ainda, outra característica comum às vigilâncias em saúde do trabalhador e ambental em saúde. É que elas têm, ou

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

podem ter, ancoragem nos movimentos sociais, seja junto aos ambientalistas ou aos trabalhadores sindicalizados. A saúde do trabalhador, das duas, foi a primeira a se constituir no SUS, no processo da Reforma Sanitária Brasileira. Ela se constituiu como uma rede, integrando assistência e vigilância, e tendo sua coordenação nacional, ao longo dos anos, situada em distintas secretarias do MS, nos níveis intermediários da estrutura organizacional. A saúde ambiental, conforme já foi visto, foi incorporada ao Ministério da Saúde como vigilância ambiental em saúde. A gestão do Sistema Nacional de Vigilância Ambiental em Saúde (SINVAS) era responsabilidade do Cenepi. Ele foi redefinido como: [...] o conjunto de ações e serviços prestados por órgãos e entidades públicos e privados, relativos à vigilância em saúde ambiental, visando ao conhecimento e à detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio ambiente que interferem na saúde humana, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de promoção da saúde ambiental, prevenção e controle dos fatores de riscos relacionados às doenças e outros agravos à saúde, em especial: I. água para consumo humano; II. ar; III. solo; I V. contaminantes ambientais e substâncias químicas; V. desastres naturais; VI. acidentes com produtos perigosos; VII. fatores físicos; e VIII. ambiente de trabalho [...] (BRASIL, 2005b, art. 1º).

Atualmente, o Subsistema Nacional de Saúde Ambiental abriga as práticas relacionadas ao ambiente e a saúde do trabalhador. Na nova estrutura regimental da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, a Coordenação Geral de Vigilância Ambiental – CGVAM – transfor mou-se em Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador – DSAST – (BRASIL, 2009b). Esse novo Departamento ocupa-se dos fatores de risco ambientais não biológicos e da saúde do trabalhador.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Fique atento(a) às denominações, pois foram, e, ainda são utilizadas as expressões Vigilância em Saúde Ambiental ou Vigilância Ambiental em Saúde para designar o sistema nacional em construção (SINVSA, SINVAS) e as práticas que ele abriga. No âmbito federal, a instância responsável por esse subsistema é a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS), por meio do Departamento de V igilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador (DSAST), criado em 2009, a partir da Coordenação Geral de Vigilância Ambiental (CGVAM).

O componente ambiental do SINVSA As atividades relacionadas ao componente ambiental, inicialmente desenvolvidas na Funasa, também iniciam seu processo de descentralização para estados e municípios no bojo da implementação da NOB SUS 01/96. Isso se deu mediante a Portaria n. 1.399/99 (BRASIL, 1999b), mais tarde substituída pela Portaria MS/GM n. 1.172/04 (BRASIL, 2004), como já foi visto. Mas, mesmo antes dessas portarias, discutia-se, no processo de descentralização, a cessão de 26.000 agentes de endemias, da rede física e dos equipamentos da Funasa para os entes subnacionais. As coordenações regionais da Funasa eram melhor estruturadas do que os setores de epidemiologia de muitas Secretarias Estaduais (SILVA JÚNIOR, 2004), adicionando-se um atrativo a mais ao processo de incorporação dessas responsabilidades pelos entes subnacionais, além do estabelecimento do Teto Financeiro de Epidemiologia e Controle de Doenças (TFECD), depois denominado Teto Financeiro da Vigilância em Saúde. O Sistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental (SINVSA) foi proposto para “prevenir e controlar os fatores de risco de doenças e de outros agravos à saúde decorrentes do ambiente e das atividades produtivas [...]” (FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE, 2003, p. 12), parecendo antecipar a ligação com a saúde do trabalhador.

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Participam desse sistema, no âmbito do Ministério da Saúde, além da SVS, diversos órgãos e instituições que realizam ações relacionadas ao meio ambiente. Outros órgãos vinculados também participam de ações sobre o ambiente, como exemplos a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), bem como a Assessoria de Assuntos Internacionais (Aisa) do Ministério da Saúde. A articulação com outros setores é igualmente importante para a sua operacionalização. Na esfera federal, podemos citar o Ministério do Meio Ambiente, o Ministério da Agricultura, o Ministério do Trabalho, o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério da Educação e o Ministério do Planejamento.

E nas outras esferas de Governo como se organiza a Saúde Ambiental? Qual o escopo das ações de vigilância ambiental realizadas por cada esfera de Governo? Em alguns estados, houve a criação de departamentos e programas de vigilância ambiental. Mas, as configurações institucionais são diferenciadas em cada nível de governo e, no mesmo nível de governo, variam de uma localidade para outra. Isso significa que não se instituiu, no estado ou município, um formato de organização institucional para essa atividade.

Nas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, a vigilância ambiental tanto pode ser encontrada como um serviço isolado quanto nas mais diversas combinações com as demais vigilâncias (BARCELLOS; QUITÉRIO, 2006). Mas, na esfera Municipal, as ações relacionadas aos fatores de risco biológicos, o chamado controle de vetores e reservatórios, foram – e podemos dizer que ainda são – majoritariamente executadas pelos serviços locais de vigilância sanitária. E para o controle de vetores e reservatórios, a interlocução com os municípios é com outro

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Gestão da Vigilância à Saúde

Departamento da SVS, o Departamento de Vigilância Epidemiológica (DEVEP).

A incorporação do controle dos fatores de risco não biológicos aos serviços da esfera Municipal e Estadual é complexa e, de fato, ainda incipiente. Há mandamentos constitucionais que incluem no campo do SUS a colaboração na proteção ao meio ambiente e algumas ações bem concretas de fiscalização e inspeção de águas para consumo humano; participação no controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos. Algumas dessas ações têm sido exercidas pela vigilância sanitária, mas a complexidade da questão ambiental decorre em grande parte por ela ser uma área de interface entre diversas disciplinas e setores, além da responsabilidade principal em relação ao ambiente ser desenvolvida fora do setor saúde. Cabe ainda ao SINVSA elaborar indicadores e sistemas de informação de vigilância em saúde ambiental para análise e monitoramento, como o Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Siságua) e o Sistema de Informação de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Solo Contaminado (Sissolo); promover intercâmbio de experiências e estudos, ações educativas e orientações, e democratizar o conhecimento na área. Alguns autores comentam que a atuação do SINVSA não se restringe aos fatores não biológicos, mas que age igualmente sobre fatores biológicos, representados por vetores, hospedeiros, reservatórios e animais peçonhentos (BARCELLOS; QUITÉRIO, 2006). Mas isso decorre em maior grau da atuação dos Municípios e Estados, do que da esfera federal. De um outro ângulo, há quem afirme que essa divisão operacional entre fatores biológicos e não biológicos não representa uma dissociação com a vigilância epidemiológica (FRANCO NETTO; CARNEIRO, 2002). Ao contrário, o parágrafo único, art. 1º, Instrução Normativa n. 1, de 2005, afirma que:

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Os procedimentos de vigilância epidemiológica das doenças e agravos à saúde humana associados a contaminantes ambientais, especialmente os relacionados com a exposição a agrotóxicos, amianto, mercúrio, benzeno e chumbo, serão de responsabilidade da Coordenação Geral de Vigilância Ambiental em Saúde, do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b, grifos nossos).

Ações de vigilância ambiental em saúde também têm sido introduzidas nas pactuações de forma a contribuir para a estruturação do SINVSA. Por exemplo, a PPI/VS de 2006 enfatizou o cadastramento de áreas com populações expostas a solo contaminado por substâncias químicas em municípios com população igual ou superior a 100.000 habitantes; e a realização de Vigilância Ambiental em Saúde relacionada à Qualidade da Água para Consumo Humano (Vigiágua) em municípios com população igual ou superior a 100.000 habitantes. O mapeamento das áreas de solo contaminado não pretendeu ser extensivo e, sim, servir de oportunidade para o desenvolvimento da capacidade de identificação dessas áreas.

Do seu ponto de vista, qual seria a justificativa para essa prioridade em relação aos municípios maiores?

Uma síntese: a vigilância ambiental no SUS Dentre as atribuições relacionadas à vigilância ambiental, a que apresenta maior avanço na implementação é a “Vigilância Ambiental em Saúde relacionada à Qualidade da Água para Consumo Humano” (Vigiágua). Para essa atividade de monitoramento, na maior parte dos municípios, a coleta de amostras é realizada pelos serviços de vigilância sanitária. Em 2003, 78% dos Estados e o Distrito Federal alimentavam o Sistema de Informação de Vigilância e Controle da Qualidade da Água de Consumo Humano (Siságua), mas apenas 19% dos

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Gestão da Vigilância à Saúde

Estados avaliavam de forma sistemática as informações com vistas à redução da morbimortalidade por doenças de veiculação hídrica (FREITAS; FREITAS, 2005). Assim, como o conceito ainda se encontra em construção (FRANCO NETTO; CARNEIRO, 2002), podemos dizer que o SINVSA ainda se encontra em estruturação. Silva Júnior (2004) aponta que até 2002 não houve, efetivamente, a realização de qualquer atividade de vigilância ambiental em saúde passível de ser aferida por indicadores e, sim, o início do processo de estruturação dessa área, com um trabalho centrado em atividades normativas e de capacitação de recursos humanos. Barcellos e Quitério (2006, p. 175) consideraram que o SINVSA “[...] ainda não dispõe de informações ou instrumentos técnicos para sua operacionalização [...]” e apontam como dificuldades para a efetivação do SINVSA a necessidade de reestruturação das ações nos âmbitos Estadual e Municipal, a formação de equipe multidisciplinar capaz de integrar-se a outros setores sociais e a inexistência de sistemas de informação para a tomada de decisões. Quanto ao sistema de informações, deu-se a recente instituição do Painel de Informações em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador (Pisast), da Secretaria de Vigilância em Saúde.

O componente do SINVSA relacionado ao trabalhador e sua saúde Se fossemos falar da vigilância em saúde do trabalhador como um Sistema, esse termo subsistema estaria entre aspas. Isso porque, dentre as vigilância(S) em saúde, a que se ocupa da saúde do trabalhador se assemelha pouco a um sistema ou talvez – até o momento, pelo menos – se conforme na atualidade como um “nãosistema”. A coordenação da Saúde do Trabalhador teve inserções diversas na estrutura do MS e foi deslocada em 2007 para a SVS/MS.

Seu município realiza ações de atenção à Saúde do Trabalhador? E faz a vigilância da Saúde do Trabalhador. Em

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

que instâncias do SUS a Saúde do Trabalhador (assistência e vigilância) já esteve alocada na Secretaria de Saúde de seu município? Compartilhe a realidade de seu Município no fórum disponível no Ambiente Virtual de EnsinoAprendizagem (AVEA).

O caminho e o desenho organizacional que tomarão forma com a incorporação da gestão e da coordenação das ações relativas Disponível em: incorporação, que pode ter surpreendido muita gente, pareceu a consumação de algo anunciado. Nesse sentido, cabe ressaltar que a Instrução Normativa n. 1, de 2005, que regulamentava a Portaria MS/GM n. 1.172/04 (BRASIL, 2004), já definia os ambientes de trabalho entre os componentes sob Saiba mais responsabilidade da CGVAM, ao lado da água, solo, ar, dos O movimento da Saúde do Trabalhador é visto, no Brasil, como a configuração de “um novo paradigma que, com a contaminantes ambientais, dos incorporação de alguns referenciais das ciências sociais – desastres naturais e dos acidentes particularmente do pensamento marxista –, amplia a visão com produtos perigosos.

v

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2000) e a Lei n. 8.080/90 (BRASIL, 1990) confirmam a Saúde do Trabalhador como competência do SUS, embora de forma não exclusiva. A área de “exclusividade do SUS” diz respeito apenas à assistência, mas não às atividades relacionadas à fiscalização dos ambientes de trabalho. E é relativamente a essa fiscalização que ocorrem as disputas de poder com Delegacias Regionais

da medicina do trabalho e da saúde ocupacional [...]” (MINAYO-GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1997, p. 25). Segundo Minayo-Gomez e Thedim-Costa (1997), o movimento da saúde do trabalhador surge sob a influência:



da Medicina Social latino-americana dos anos de 1960 e início dos anos de 1970, “que ampliou o quadro interpretativo do processo saúde-doença, inclusive em sua articulação com o trabalho”; e



da experiência italiana com a reforma sanitária daquele país e do Movimento Operário Italiano.

Esse movimento cresceu junto a setores da sociedade que lutavam pela democratização da sociedade, pelo direito de livre organização sindical e que refletiam criticamente sobre a limitação dos modelos vigentes de atenção à saúde.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Saiba mais A Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador teve suas diretrizes publicadas na Portaria MS/GM n. 1.125/05 (BRASIL, 2005d). Todavia, essa Portaria foi suspensa por um mês quando o Ministro Saraiva Felipe assumiu, e revogada totalmente no final de 2005. Um fato digno de nota é que tem constado a recomendação ao Ministério da Saúde para a republicação dessa Portaria.

*Grupo

Executivo

Interinstitucional de Saúde do Trabalhador (Geisat)

do Trabalho e com os auditores fiscais, como as apontadas, por exemplo, por Minayo-Gomez e Thedim-Costa (1997) e Machado (2005). Além do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), também os Ministérios da Previdência Social (MPAS) e do Meio Ambiente (MMA) e a Promotoria Pública têm responsabilidades, cabendo:

 à Previdência Social, o pagamento dos

benefícios enquanto perdure a incapacidade decorrente de acidente do trabalho; os procedimentos de reabilitação profissional e reinserção no mercado; a coleta, consolidação e divulgação de dados sobre ocorrência de acidentes de trabalho.

– Esse grupo foi instituído

 ao Ministério Público, a assistência jurídica às

pela Portaria MS/MTE n.

vítimas de acidentes e doenças do trabalho e/ou a seus dependentes; a fiscalização e o acompanhamento de denúncias de descumprimentos das Normas de Segurança e Medicina do Trabalho; a impetração de ações de reparação de dano.

18/93 (MINISTÉRIO DO TRABALHO/MINISTÉRIO DA SAÚDE/MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL, 1993). Composto por representantes dos Ministérios da Saúde, do Trabalho e Emprego e da Previdência e Assistência Social, seus objetivos eram: definir estratégias de trabalho integrado para a redução da morbimortalidade relacionada ao trabalho e

 ao Grupo Executivo Interinstitucional de Saúde do Trabalhador (Geisat)*, a compatibilização e integração das políticas e práticas de intervenção desenvolvidas pelo estado (SILVA; BARRETO JÚNIOR; SANTANA, 2003). Lacaz, Machado e Porto (2002) apontam três momentos diferenciados na inserção da atenção à saúde do trabalhador no SUS:

promover a melhoria das condições de saúde e segurança do trabalhador. Fonte: Elaborado pelas autoras.

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 De 1978 a 1986: “efervescência de ideias e pressupostos que conformam o campo de práticas e saberes da Saúde do Trabalhador, que inclui a atenção à saúde dos trabalhadores, enquanto uma prática de saúde diferenciada” (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002, p. 3). Destacam-se nessa conjuntura: o ressurgimento do movimento sindical; a criação dos Programas de

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Saúde dos Trabalhadores, datada de 1984, após a posse dos governadores eleitos de forma direta, em 1982; realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde (8ª CNS) e da 1ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador (1ª CNST).

 De 1987 a 1990: “institucionalização das ações de Saúde do Trabalhador na rede básica de serviços de saúde, através das conquistas no âmbito legal e dos avanços ao nível institucional [...]”. Os autores frisam que “[...] a prática acumulada nos Programas de Saúde dos Trabalhadores (PST) no início dos anos 1980 garantiria a inscrição da Saúde do Trabalhador como atribuição do SUS [...]” (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002, p. 4).

 De 1991 e 2001: esta fase foi marcada por “disputas corporativas e pela ausência de mecanismos claros e efetivos de financiamento para as ações do SUS [...]”. Contudo, ampliaram-se os marcos legais e a saúde do trabalhador “adquiriu status de instrumento operacional, contribuindo para uma maior institucionalização do campo” (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002, p. 4). Realizou-se, em 1996, a 2ª CNST, e foram emitidas a Instrução Normativa de Vigilância em Saúde do Trabalhador (Portaria n. 3.120/98) e a Norma Operacional de Saiba mais Portaria MS/GM n. 3.908/08 Saúde do Trabalhador – Nost/SUS – Conhecida como Norma Operacional Portaria MS/GM n. 3.908/98 Básica de Saúde do Trabalhador (Nost/ (BRASIL, 1998c). Para a atenção à saúde do trabalhador criou-se, pela Portaria MS/GM n. 1.679/02 (BRASIL, 2002), a Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (Renast). Constituindo um modelo de atenção integrado, essa rede deve considerar todo o processo saúdedoença do trabalho, no âmbito da promoção, da

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SUS), buscou orientar a realização das ações de saúde do trabalhador no âmbito de Estados e Municípios. Definiu as responsabilidades dos municípios em cada uma das duas condições de gestão (Plena de Atenção Básica e Plena do Sistema) definidas pela NOB SUS 01/96.

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Gestão da Vigilância à Saúde

assistência e da vigilância. E articular todos os dispositivos, equipamentos e serviços do SUS, em uma rede de abrangência nacional, com conexões organizadas nos diferentes níveis de gestão, com produção de informação e a implantação de Centros de Referência em Saúde dos Trabalhadores (CREST) (SILVEIRA; RIBEIRO; LINO, 2005). Essa rede foi ampliada posteriormente, mediante outras normas, e o CREST passou a se chamar Cerest.

v

Os Centros de Referência em Saúde dos

Trabalhadores (Cerest) realizam ações de

prevenção, promoção,

diagnóstico, tratamento, reabilitação e vigilância em saúde dos trabalhadores urbanos e rurais, e fazem parte da Renast.

Dias e Hoefel (2005) consideram que os princípios e diretrizes que norteiam a Renast e a Política Nacional de Saúde do Trabalhador (PNST) podem ser resumidos em: (1) atenção integral à saúde do trabalhador; (2) articulações intra e intersetoriais; (3) informações em saúde do trabalhador; (4) apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas; (5) capacitação permanente; (6) participação da comunidade na gestão das ações em saúde do trabalhador. A responsabilidade pelo financiamento das ações e dos serviços é das três esferas de governo; os repasses federais não devem ser os únicos a ser empregados: a Renast conta com repasses de recursos federais para o financiamento de suas ações, de acordo com a operacionalização de um Plano de Trabalho de Saúde do Trabalhador em estados e municípios, e a sua implementação vem sendo a principal estratégia da Política Nacional de Saúde do Trabalhador (PNST). Podemos dizer que na vigilância em saúde do trabalhador tem ocorrido, como nas demais vigilâncias, um avanço no que diz respeito à produção de conhecimento e no desenho de propostas metodológicas de intervenção. Entretanto, ainda é um processo inacabado, no qual a complexidade da questão produção/trabalho ainda coloca enormes desafios, dentre os quais a retaguarda laboratorial. A despeito da presença, desde a concepção da vigilância em saúde do trabalhador, da perspectiva inovadora de integração, observamos ainda uma “grande dificuldade de inserção institucional e relacionamento intrainstitucional [...]” (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002, p. 8). A PNST e a Renast emergem na busca desse

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“novo modelo” de atenção. Entretanto, apesar dos avanços significativos no campo conceitual, que apontam um novo enfoque e novas práticas para lidar com a relação trabalho-saúde, consubstanciados sob a denominação de Saúde do Trabalhador, nos deparamos, no cotidiano, com a hegemonia da Medicina do Trabalho e da Saúde Ocupacional e com a fragilidade na sua estruturação e articulação intra e intersetorial. Essa fragilidade institucional pode ser agora suplantada mediante sua nova inserção na estrutura do Ministério da Saúde e na centralidade que pode vir a alcançar com essa nova inserção.

Uma síntese: a saúde do trabalhador no SUS Iniciadas na década de 1980, a Seade Saiba mais partir de meados dos anos de 1990, no âmbito institucional proliferaram as Vinculada à Secretaria de Economia e Planejaexperiências estaduais e o número de mento do Governo do Estado de São Paulo, a programas, centros regionais, núcleos e Fundação Seade é um centro de referência nacional no desenvolvimento, produção e dissemicoordenações de saúde do trabalhador nação de pesquisas, análises e estatísticas aumentaram, ocorrendo um processo de socioeconômicas e demográficas. municipalização das ações de saúde do trabalhador (MACHADO, 2005), no nível nacional, diferentemente do Estado de São Paulo. Lá teria ocorrido uma redução no número de municípios que realizavam ações de saúde do trabalhador após a segunda metade da década de 1990, segundo Pesquisa Municipal Unificada realizada pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) (SILVA; BARRETO JÚNIOR; SANT'ANA, 2003). A vigilância em saúde do trabalhador apresenta, de um lado, diversidade e riqueza de experiências locais. De outro, há heterogeneidade dessas mesmas experiências e certo grau de instabilidade política e institucional em sua implementação e manutenção. Lacaz, Machado e Porto (2002) consideram ser sua prática fugaz e regionalizada, concentrada em poucos estados da Federação, especialmente nas regiões Sudeste e Sul, com destaque

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Gestão da Vigilância à Saúde

para o Estado de São Paulo, pela influência do movimento sindical e de sanitaristas da Secretaria de Estado de Saúde. Fora do eixo Sudeste-Sul, apenas a Bahia se destaca, segundo esses autores, pelo papel estruturante exercido pelo Centro Estadual de Saúde do Trabalhador (Cesat). Mas essa fragilidade não se restringe à esfera municipal. Na esfera federal, a Saúde do Trabalhador teve inserções diversas, antes de sua ida para a SVS/MS. Ela se constituía como uma área técnica que integrava o Departamento de Ações Programáticas Estratégicas (Dape), da Secretaria de Assistência à Saúde, do Ministério da Saúde (SAS/MS). Ao Dape competia articular, além da Saúde do Trabalhador, os programas de Saúde Mental, da Mulher, do Jovem e Adolescente, da Criança, do Idoso, do Penitenciário, dos Portadores de Deficiência e de Trauma e Violência, orientando Estados, Municípios e Distrito Federal na sua execução. Desde sua mudança para a SVS/MS, que é esperada uma progressiva reversão dessa fragilidade. Por fim, como já dissemos, para a Saúde do Trabalhador, são requeridas pactuações. E, embora aparentemente subfinanciada, ainda é muito recente que a vigilância sanitária municipal tenha transferências financeiras regulares.

O FINANCIAMENTO DO SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE O financiamento das ações, hoje compreendidas no Sistema Nacional de Vigilância em Saúde, notadamente as de vigilância epidemiológica, tem sido objeto de mudanças ao longo dos anos. No entanto, podemos afirmar que historicamente elas contam com alocação de recursos pelas três esferas de governo. Estados e municípios financiavam ações rotineiras de imunização, notificação e investigação epidemiológica e programas de controle de doenças. A esfera federal, representada pela Funasa, financiava

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ações sob sua responsabilidade – notadamente o controle das endemias – e repassava recursos para estados e municípios por meio de convênios específicos para uma determinada doença. Recursos federais adicionais eram pleiteados tendo como justificativa a eclosão de doenças, inclusive na forma epidêmica (SILVA JR, 2004). No processo de descentralização no bojo da implementação da NOB SUS 01/96, para a composição e rateio dos recursos federais a serem repassados, os estados foram classificados em três estratos, considerando-se o perfil epidemiológico – principalmente em relação à dengue, malária, leishmaniose e doença de Chagas, em função da necessidade de operações de campo; a área, em km²; e a população residente, pressupondo-se que em uns o custo das ações de campo seria maior que em outros (SILVA JR, 2004). Com isso, o Teto Financeiro de Epidemiologia e Controle de Doenças (TFECD) de cada estado era composto por três parcelas, duas delas com valores per capita diferenciados, a depender do estrato em que o Estado fora classificado. Também eram exigidas contrapartidas dos Estados Saiba mais e Municípios de 20, 30 e 40% para os Para saber em detalhes sobre o financiamento estratos de 1 a 3, além de ser necessária a e o Teto Financeiro para as ações de vigilância sua certificação As fontes de recursos epidemiológica e ambiental anteriormente ao federais colocados à disposição do SNVE Pacto de Gestão 2006, consultar a tese de compreendiam o Tesouro Nacional e os doutoramento do então dirigente da SVS/MS, recursos "novos" do Projeto VIGISUS I e II. Jarbas Barbosa. Fonte: Silva Jr. (2004).

Após o Pacto de Gestão 2006, o Bloco de Financiamento da vigilância em saúde foi regulamentado pela Portaria MS/GM n. 204/07 (BRASIL, 2007d). Esse bloco era formado por dois componentes: vigilância epidemiológica e ambiental em saúde e vigilância sanitária. Com a Portaria GM/MS n. 3.252/09, as regras, a partir de 2010, foram alteradas. As principais alterações foram:

 mudança na denominação do componente do bloco de financiamento "Vigilância em Saúde" destinado às ações compreendidas no Sistema Nacional de

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Vigilância em Saúde: de Vigilância Epidemiológica e Ambiental em Saúde para Vigilância e Promoção da Saúde;

 mudança na composição desse componente, que passou a ter duas partes: uma parte fixa e outra variável, a saber: I – Piso Fixo de Vigilância e Promoção da Saúde (PFVPS); e II – Piso Variável de Vigilância e Promoção da Saúde (PVVPS).

 substituição do processo de certificação para gestão das ações de vigilância em saúde pela adesão ao Pacto. Os valores do Piso Fixo de Vigilância e Promoção da Saúde (PFVPS) devem ser revistos a cada ano, com base na população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, já que se trata de um valor per capita. Esse valor, no entanto, não é o mesmo para todas as Unidades da Federação, que foram divididas em quatro diferentes estratos. O Piso Variável de Vigilância e Promoção da Saúde (PVVPS) tem seu montante constituído por incentivos específicos, por adesão ou aspectos epidemiológicos especiais. Os efeitos dessas mudanças, especialmente o impacto no que diz respeito ao montante e à execução do financiamento do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica e Ambiental, ainda não foram avaliados. É esperada alteração no gasto realizado pelas esferas subnacionais após o Pacto, que, presumidamente, dotouas de maior autonomia na alocação de recursos dentro de cada bloco de financiamento. Também podem ser esperadas mudanças em função da substituição do processo de certificação para a gestão das ações de Vigilância em Saúde pela adesão ao Pacto e a adoção da regionalização como eixo estruturante da descentralização, que pretende reforçar os processos de negociação e pactuação entre os gestores, conforme exposto no art. 3º, da Sessão II, da Portaria n. 3.252, de 2009.

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PLANEJAMENTO, MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO O planejamento das ações compreendidas no Sistema Nacional de Vigilância em Saúde também tem se modificado no processo de descentralização. Pela Portaria n. 1.399/99, já revogada, essas ações de vigilância epidemiológica e ambiental deveriam ser desenvolvidas de acordo com uma Programação Pactuada Integrada de Epidemiologia e Controle de Doenças/PPI-ECD, mais tarde denominada Programação Pactuada e Integrada de Vigilância em Saúde (PPI/VS), a partir da edição da Portaria GM n. 1.172/04, a seguir denominada Programação das Ações Prioritárias de Vigilância em Saúde (PAP/VS), pela Portaria n. 91/07. Em maio de 2008, a Portaria 64 (BRASIL, 2008a), denominou-a como Programação das Ações de Vigilância em Saúde (PAVS), que representa um novo instrumento de planejamento. A partir de 2010, a Portaria n. 3.252/09 determina que as diretrizes, ações e metas de Vigilância em Saúde devem estar inseridas no Plano de Saúde e nas Programações Anuais de Saúde (PAS) das três esferas de gestão. Enfatiza, ainda, que a Vigilância em Saúde deve estar contemplada no Plano Diretor de Regionalização (PDR) e na Programação Pactuada Integrada (PPI), com inclusão da análise das necessidades da população, da definição de agendas de prioridades regionais, de ações intersetoriais e de investimentos.

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O SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (SNVS) Instituído como um sistema nacional apenas no final dos anos de 1990, o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) abriga uma das práticas mais tradicionais do campo da saúde, a vigilância sanitária. Essa vigilância tem sido transformada e redefinida desde o início do Século XX, com duas grandes inflexões: nos anos de 1970 e no final dos anos de 1990. As modificações abrangeram o escopo das ações, os enfoques conceituais e os modos de atuação – da exclusividade da fiscalização normativa à aproximação ao campo da avaliação em saúde – nos objetos e atividades a ela sujeitos e no formato institucional, principalmente na esfera Federal. Atividades normativas e educativas foram Vigilância sanitária Saiba mais inseridas e reforçadas como atribuições, além de manterem as características que são as mais Para conhecer um pouco da história da vigilância sanitária no Brasil até a criação da conhecidas da população. Essas atribuições Agência Nacional de Vigilância Sanitária mais conhecidas são as decorrentes de seu (Anvisa), visite a Linha do Tempo da "Mostra poder de polícia administrativa e se assentam Cultural Vigilância Sanitária e Cidadania". na inspeção, na fiscalização, nas atividades Com charges, fotos, reproduções de Debret autorizativas – licenciamento, autorização e e textos históricos, essa mostra desenvolviregistro de produtos – no julgamento de da pelo Centro Colaborador em Vigilância irregularidades e aplicação de sanções. Sanitária da ENSP/Fiocruz, pode ser visitada

presencialmente na exposição em formato de museu de ciência que percorre o país. Também

encontra-se

em:

.

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O desenvolvimento da vigilância sanitária nos últimos 40 anos tem se dado, por um lado, em consonância com os processos de desenvolvimento econômico, de acumulação de

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capital e de desenvolvimento tecnológico (LUCCHESE, 2001); por outro, com o que é usualmente denominado como “tragédias sanitárias”. Como exemplo, na década de 1960, o episódio da talidomida que ocasionou o nascimento de bebês com máformações congênitas, em decorrência do qual foram criados órgãos nacionais e normas voltadas à segurança dos fármacos e ao monitoramento de suas reações adversas.

Saiba mais Visite a “Mostra Cultural Vigilância Sanitária e Cidadania”. Você poderá conhecer algumas das tragédias na exposição virtual, que tem por objetivo despertar a sociedade para: (1) os efeitos negativos da falta de ação ou da ação insuficiente da vigilância sanitária; (2) a possibilidade de mudar essa história de sucessão de tragédias com a ação esclarecida e organizada da

sociedade.

Fonte:

.

A ESTRUTURAÇÃO DO SNVS E A DESCENTRALIZAÇÃO DA POLÍTICA

Alguns diplomas legais da década de 1970 dispunham sobre o papel dos órgãos de vigilância sanitária das três esferas de Governo, mas apenas em meados dos anos de 1980 a necessidade de descentralização e de maior articulação entre os serviços de vigilância sanitária das três esferas de Governo foi explicitada no Relatório da Conferência Nacional de Saúde do Consumidor*, de 1986.

*Conferência Nacional de Saúde do Consumidor – objetivava “definir o papel do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária enquanto organismo-atividade responsável por observar as con-

Sanitaristas dirigiram durante curto período a Secretaria Nacional de V igilância Sanitária do Ministério da Saúde (SNVS), pela primeira vez nos anos de 1980, o que pode ter contribuído para que a vigilância sanitária integrasse, ainda que não centralmente, a agenda da Reforma Sanitária. Por outro lado, a incorporação da vigilância sanitária a essa agenda deve ter sido facilitada pela eclosão de tragédias sanitárias, dentre as quais a contaminação

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dições, produtos e serviços que podem afetar a saúde do consumidor ”. Fonte: Conferência Nacional de Saúde do Consumidor (1986).

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Gestão da Vigilância à Saúde

por transfusão de sangue em hemofílicos, que suscitou o movimento “Salve o sangue do povo brasileiro”, capitaneado por Herbert de Souza, e o acidente radiológico com o Césio 137, em Goiânia, em 1987. Esses sanitaristas, na impossibilidade política de organizar uma conferência específica, promoveram a Conferência Nacional de Saúde do Consumidor, em 1986: assista ao vídeo Sergio Arouca fala sobre vigilância sanitária, que se encontra disponível em: .

Contudo, a constituição de um sistema aflorou nos documentos legais quase 20 anos depois da instituição do SNVE, com a Portaria n. 1.565/94 (BRASIL, 1994). Essa portaria não chegou a ser implementada nem revogada formalmente e inspirou a estruturação de alguns serviços estaduais. Com ela, de um lado, buscava-se romper a fragmentação das ações de vigilâncias sanitária, epidemiológica e em saúde do trabalhador e se enfatizava a municipalização das ações, incorporando, não à vigilância, mas ao Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), as demais ações de saúde, inclusive as assistenciais. De outro lado, a portaria definia competências das esferas de Governo nas ações de vigilância sanitária, assumia o caráter intersetorial dessas ações e a necessidade de articulação com outras instâncias. Mas, após quatro anos de sua vigência, uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) relacionou as fragilidades do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS): a estrutura da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (SVS/ MS) era insuficiente para o desempenho de suas atividades; 63% dos Estados não detinham pessoal qualificado, 33% enfrentavam carência de equipamentos, veículos, legislação apropriada ou informações sobre as Unidades a serem fiscalizadas e 58% não acompanhavam a atuação da esfera Municipal na área. Em 66%

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dos municípios auditados, o número de agentes era insuficiente (DE SETA, 2007).

Fique atento(a)! Fique atento às datas, pois a sigla SVS pode significar: 1. Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (SVS/MS), criada em 1990, a partir da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (SNVS/MS), e em 1999, substituída pela Anvisa; ou 2. Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS), criada a partir do Cenepi, em 2003.

A Lei n. 9.782/99 criou a Anvisa, que substituiu a antiga Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e com essa lei (BRASIL, 1999a):

 foi definida a coordenação do sistema nacional de vigilância sanitária pela Anvisa;

 foi abolida a grande rotatividade dos postos de direção do órgão federal ao se instituir mandato para os dirigentes da Anvisa (SOUTO, 1996);

 foi disposta sobre a arrecadação das taxas de fiscalização, que foram majoradas, e atribuídas extensas competências à agência; não se dispôs, porém, sobre o financiamento do sistema;

 não foram incorporadas, entre as atribuições e competências da Anvisa, a vigilância em saúde do trabalhador (que apenas na esfera estadual algumas vezes integrou a vigilância sanitária, não sem conflitos) e as atribuições mais gerais em relação ao ambiente. Ou seja, foi no ano de 1999, diante da necessidade de descentralização e de maior articulação entre os serviços de

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vigilância sanitária das três esferas de governo, que a Anvisa foi criada e suas diretrizes definidas.

Componentes e funcionamento do SNVS O SNVS pode ser visto em sentido restrito, tendo por base o que está expresso nas normas legais; em sentido ampliado, com base na resolução de um dado problema, como é explicitado a seguir. Saiba mais sobre o INCQS órgão de referência

Componentes do SNVS em sentido restrito

nacional para as

Em sentido restrito, integram o SNVS, além da Anvisa:

questões tecnológicas e normativas relativas ao

 os órgãos ou serviços de vigilância sanitária dos estados

controle da qualidade de insumos, produtos,

v

ambientes e serviços

vinculados à vigilância

sanitária visitando seu site: .

*Lacen – Laboratórios analíticos que executam exames de interesse das vigilâncias, pertencentes às secretarias de estado de Saúde. Distribuídos

nacionalmente,

pode se dizer que eles têm dois componentes: um, voltado ao Sistema

e municípios;

 o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), da Fundação Oswaldo Cruz;

 os Laboratórios de Saúde Pública (Lacen*).

Nos estados e municípios, os órgãos responsáveis pelas ações de vigilância sanitária se estruturam de variadas maneiras. Alguns assumem o formato institucional de Agência Estadual de Vigilância Sanitária, como na Paraíba; outros combinam em sua estrutura a vigilância ambiental, como no caso da Bahia; em alguns estados e municípios podemos encontrar na mesma estrutura as vigilâncias: sanitária, em saúde do trabalhador e/ou ambiental. Alguns poucos ainda agregam a vigilância epidemiológica. Os serviços Estaduais e Municipais de vigilância sanitária, majoritariamente, são integrantes da Administração Direta, e variam também em relação à autonomia administrativa e financeira do núcleo central de suas respectivas secretarias de saúde (DE SETA; SILVA, 2001).

Nacional de Vigilância Sanitária, e outro, voltado ao Sistema Nacional de Vigilância em Saúde. Fonte: elaborado pelas autoras deste livro.

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É nessa composição restrita que tem sido tomadas decisões no Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, no máximo se expandindo com a participação de representações das comissões intergestoras, em especial o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass); o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems). Saiba mais

Conass

Para saber mais sobre o Conass e o Conasems municipais de saúde são colegiados participativos, e suas resfundamentais para o controle social. A participação pectivas estruturas de assessoria volda população na gestão do Sistema Único de tadas à vigilância sanitária acessando Saúde, estabelecida pela Lei n. 8.142/90, deve seus sites na internet; e a Secretaria de ocorrer de duas maneiras: pelas conferências e Vigilância em Saúde. pelos conselhos de saúde. No tocante à Vigilância Sanitária, a Lei n. 8.080/90 instituiu a Comissão Permanente de Vigilância Sanitária e Farmacoepidemiologia (BRASIL, 1990), que só em 2005 passou a funcionar regularmente. (Em consulta ao site do Conselho em 29 de abril de 2009, não mais foi encontrada a Comissão Permanente de Vigilância Sanitária e Farmacoepidemiologia).

Componentes do SNVS em sentido amplo Em sentido ampliado, ou seja, considerando o funcionamento do SNVS para resolver um problema, outros componentes, além dos já citados no item anterior, integram-se ao sistema. São órgãos da saúde, de outros setores governamentais ou da sociedade civil, como representado na Figura 1.

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Figura 1: Representação gráfica do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária Fonte:

A Figura 1 busca representar a natureza multidisciplinar e intersetorial da vigilância sanitária, que precisa interagir com outros setores governamentais e da sociedade. Algumas ações – como o monitoramento da qualidade da água para consumo humano – e algumas áreas de atuação – como saúde do trabalhador, alimentos, radiações, saúde e meio ambiente – são de competência de mais de um órgão, interno ou externo ao Sistema Único de Saúde. Outro exemplo é o da limpeza urbana e do saneamento básico, em que grande parte das ações é de responsabilidade direta de outros órgãos, dentre eles as companhias de lixo urbano, o Ministério do Meio Ambiente, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e o Conselho Nacional de Energia Nuclear. Mas como eles têm importância para a saúde, são de interesse direto ou indireto da vigilância sanitária. A ela interessa, principalmente, a geração, coleta, armazenamento e disposição final dos resíduos dos serviços de saúde, dos medicamentos vencidos, dos resíduos industriais que são despejados voluntária ou involuntariamente nos rios e mananciais e que são capazes de contaminar o meio ambiente. Pelo caráter do setor produtivo sujeito à vigilância sanitária, a circulação dos chamados “bens de saúde” (medicamentos, alimentos, produtos médicos) tem interfaces com outros ministérios,

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como o de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e o da Ciência e Tecnologia. Agir em prol da cidadania e dos direitos do consumidor é uma das mais arrojadas e consequentes atribuições da vigilância sanitária, e o movimento dos consumidores tem sido importante fator indutor da ação da vigilância sanitária. A vigilância sanitária integra o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, e o trabalho conjunto com esses órgãos, bem como com o Ministério Público e a Promotoria Pública, melhora a efetividade das ações de vigilância sanitária.

Quando a Anvisa foi constituída, estruturou-se um novo campo de atuação, a vigilância sanitária de serviços de saúde, que, mesmo de forma pontual, já integrava a agenda de algumas vigilâncias sanitárias estaduais. Incorporaram-se ao escopo das ações da Agência outras iniciativas que se desenvolveram no âmbito de outras Secretarias do Ministério, tais como o controle de infecção em serviços de saúde e da qualidade e segurança do sangue.

Iniciativas como a constituição de uma rede de hospitais-sentinela para a notificação e a busca ativa de eventos adversos relacionados a produtos e serviços sujeitos à vigilância sanitária, e outras voltadas para os processos de regulamentação e regulação sanitária intern a c i o n a l têm caráter permanente na agenda do S i s t e m a N a c i o n a l d e Vi g i l â n c i a Sanitária e, mais especificamente, na do seu órgão federal.

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Saiba mais

Lei dos Pobres

Conheça um pouco mais sobre a rede de hospitais sentinela, seus objetivos, instrumento e os hospitais que participam dessa iniciativa. Acesse: . Outras iniciativas mais pontuais de assunção de algumas políticas – por exemplo, as voltadas à certificação e acreditação – têm estado na agenda da vigilância sanitária que, para eliminar ou minimizar riscos no consumo de produtos e na prestação de serviços, tem o cerne de seu trabalho no binômio “qualidade e segurança” de produtos, tecnologias e serviços.

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Gestão da Vigilância à Saúde

A descentralização dos recursos federais e das ações Com a criação da Anvisa, houve crescimento na dotação orçamentária e na execução orçamentária da vigilância sanitária federal. Suas receitas provêm do Orçamento Geral da União – 44,9% dos recursos em 2005 e de recursos próprios – principalmente arrecadação de taxas e multas que, no mesmo ano, corresponderam a 55,1% (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2005). Esse aumento da capacidade financeira da Anvisa, no momento da implementação da NOB SUS 01/96, propiciou repasses financeiros regulares e automáticos para estados e municípios. A partir de março de 1998, a título de incentivo, como componente do Piso de Atenção Básica, parte Variável (PAB Variável), os Municípios passaram a receber o Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS, também chamado de PAB VISA); a partir de agosto de 2000, os estados passaram a receber um valor per capita por habitante/ano denominado Média e Alta Complexidade em Vigilância Sanitária (MAC-VISA); depois de outubro de 2001, o repasse ficou conhecido pela sigla TFVS ou como MAC-fato gerador. Esse repasse representa a repartição do produto da arrecadação das Taxas de Fiscalização em Vigilância Sanitária recolhidas à Anvisa.

Fique atento(a): Atenção, a sigla TFVS possui três significados diferentes, que dependem do contexto: Taxa de Fiscalização em Vigilância Sanitária, Teto Financeiro de Vigilância Sanitária e, mais recentemente, Teto Financeiro da Vigilância em Saúde.

De 1998 a 2003, o financiamento federal das ações de vigilância sanitária ocorreu da seguinte maneira:

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 repasses para os municípios com base em um valor per capita de R$ 0,25 por ano, efetivados desde o primeiro semestre de 1998 a título de Incentivo às Ações Básicas de Vigilância Sanitária (PBVS);

 repasses para os estados, compostos de duas parcelas:  repartição das Taxas de Fiscalização em Vigilância Sanitária (TFVS ou MAC-fato gerador), a partir de outubro de 2001; e

 repasse para o financiamento das Ações de Média e Alta Complexidades em Vigilância Sanitária (MACVISA), a partir de agosto de 2000.

A partir de dezembro de 2003, parte das ações básicas de vigilância sanitária – inspeções em estabelecimentos do comércio de alimentos; drogarias/ervanarias e postos de medicamentos; creches; estabelecimentos de ensino fundamental; estações rodoviárias e ferroviárias – passou a integrar a Programação Pactuada Integrada da Vigilância em Saúde (PPI/VS), ou as programações que sucederam a PPI/VS. Outra importante modificação, também em 2003, foi a entrada dos Municípios e de suas representações no processo de negociação da descentralização das ações e dos repasses financeiros federais. As transferências para os estados eram condicionadas à adesão ao Termo de Ajustes e Metas (TAM), que compreendia a execução de certas atividades pactuadas. Essa indução resultou na estruturação e modernização de quase todos os serviços estaduais de vigilância sanitária. Eles ficariam com a responsabilidade de promover a Saiba mais descentralização das ações de vigilância sanitária no âmbito de seu território. Após 2003, a esfera Se for do seu interesse saber mais somunicipal passou a tomar parte do processo de bre o financiamento federal das ações pactuação. Rompeu-se a regra até então de vigilância sanitária até 2006 ver De Seta e Silva (2006). Após 2006, com o Pacestabelecida da interlocução privilegiada (quase to de Gestão, as regras foram novamenexclusiva) da Anvisa com a esfera Estadual, sendo te alteradas, caracterizando uma que para os Municípios, não houve vinculação instabi-lidade no financiamento. das transferências financeiras para a realização

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Gestão da Vigilância à Saúde

de ações, nem mesmo as classificadas como de baixa complexidade (ou básicas). A coordenação do processo de descentralização das ações de vigilância sanitária, no final dos anos de 1990 e início de 2000, encontrou um contexto federativo diverso daquele dos anos de 1970. Tal como sucedeu na construção do SNVE, a construção do SNVS se iniciou pelo componente estadual. Mas, em curto espaço de tempo (três a cinco anos), passou a incorporar também as demandas municipais em um contexto democrático (DE SETA, 2007), o que representa um processo mais difícil do que sob um governo autoritário (ARRETCHE, 1999). De todo modo, a coordenação federativa que, mediante o TAM contribuiu para a estruturação dos serviços estaduais, não chegou a se efetivar para a esfera Municipal. Até 2004, os Municípios recebiam os repasses federais sem ter o compromisso da realização de ações e sem que houvesse exigência de certificação, como aconteceu na vigilância epidemiológica. A incorporação de algumas ações de vigilância sanitária à PPI/VS e seus efeitos ainda não foram suficientemente analisadas.

PLANEJAMENTO,

MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO

De 2005 a 2007 tomou corpo um movimento que congregou os serviços de vigilância sanitária das três esferas de Governo, chegando à elaboração e à aprovação do Plano Diretor de Vigilância Sanitária (PDVISA). O PDVISA, que foi identificado como uma necessidade nas recomendações da 1ª Conferência Nacional de Vigilância Sanitária, nasceu de uma deliberação do Comitê Consultivo Tripartite de Vigilância Sanitária e se desenvolveu em um processo de mobilização dos serviços de vigilância sanitária, com participação de algumas instituições acadêmicas. Esse plano contém um elenco de diretrizes, organizadas em cinco eixos, observe:

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 organização e gestão do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, no âmbito do SUS;

 ação regulatória: vigilância de produtos, de serviços e de ambientes;

 a Vigilância Sanitária no contexto da atenção integral à saúde;

 produção do conhecimento, pesquisa e desenvolvimento tecnológico; e

 construção da consciência sanitária: mobilização, participação e controle social. Submetido e aprovado à CIT e ao Plenário do Conselho Nacional de Saúde (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 2007), o PDVISA foi publicado como Portaria MS/GM n. 1.052/07 (BRASIL, 2007a). O mais importante é que, enquanto se desenvolvia o PDVISA, no âmbito mais geral da gestão seestava sendo processada a revisão normativa do SUS, que culminou no Pacto 2006 e na retomada de alguns instrumentos de planejamento, de avaliação e o relatório de gestão, no bojo do PlanejaSUS.

Você já ouviu falar do Sistema de Planejamento do SUS (PlanejaSUS)? É que o SUS, no contexto do Pacto de Gestão, buscou rever e sistematizar seus processos de planejamento. O intento foi promover a articulação desses processos nas três esferas de Governo, e em cada uma delas, com os instrumentos do planejamento da ação governamental. Esses instrumentos,

Os instrumentos, a legislação, as

previstos na Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2000),

experiências e os

são o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes

Cadernos do PlanejaSUS

Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária anual (LOA). Os instrumentos do PlanejaSUS são: (1) o plano de saúde de cada esfera de gestão, que apresenta as intenções e os resultados a serem buscados no período de quatro anos,

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estão disponíveis em: .

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Gestão da Vigilância à Saúde

expressos em objetivos, diretrizes e metas. Ele é a base para a execução, o acompanhamento, a avaliação e a gestão do sistema de saúde; (2) a programação anual de saúde, em que são detalhadas as ações, as metas e os recursos financeiros que operacionalizam o respectivo plano; (3) o relatório anual de gestão, que apresenta os resultados alcançados com base no conjunto de indicadores da programação.

Saiba mais Caso você queira saber mais sobre o PDVISA, acesse o “Guia de orientações para a elaboração do plano de ação em vigilância sanitária” (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2007), disponível em: .

Disso tudo resultou que os planos de ação da vigilância sanitária tivessem consonância com o que se discutia naquele momento, que eles se articulassem com os instrumentos mais gerais de planejamento governamental instituídos mediante a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2000) e que a Agência pudesse apoiar estados e municípios na elaboração desses planos de ação.

Para isso, desenvolveram-se instrumentos que foram publicados no site da Anvisa para garantir o cumprimento do estabelecido na Programação de Ações Prioritárias da Vigilância em Saúde (PAP/VS) de 2007. A meta era 100% dos Estados com planos de ação e 30% do total de Municípios.

UMA SÍNTESE: A VIGILÂNCIA SANITÁRIA NO SUS Depois do Pacto de Gestão, dois incentivos foram acrescidos ao componente de Vigilância Sanitária do Bloco de Financiamento da Vigilância em Saúde, regulamentado pela Portaria MS/GM n. 204/07 (BRASIL, 2007d), utilizando o volume de recursos não repassados aos Municípios: um destinado ao componente dos Lacen que realiza análises de interesse da vigilância sanitária – Portaria n. 3.202/07 (BRASIL, 2007e), e o incentivo para gestão de pessoas – Portaria n. 3.080/08 (BRASIL, 2008b).

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Saiba mais A sistemática da pactuação com os Municípios incluiu um “elenco norteador das ações de vigilância”, composto por ações classificadas como estruturantes (para organização e estruturação dos serviços municipais) e estratégicas (para controle e gerenciamento dos riscos sanitários).

Saiba mais Busque o Elenco Norteador das Ações de Vigilância Sanitária (publicado no Anexo IV da Portaria n. 1.998/ 07 (BRASIL, 2007c) e analise seu conteúdo. Você considera que as ações propostas pelo elenco norteador são capazes de estruturar essa área? À

E para que serve o Elenco norteador, além de seu objetivo de contribuir para estruturar o SNVS?

luz dos conhecimentos sobre o planejamento estratégico situacional (PES), o que você proporia para conferir maior potência aos planos?

Serve para o rateio dos recursos federais, que se dá com base em dois componentes, denominados “piso estruturante e piso estratégico”, cuja contrapartida é a realização de alguma ação do elenco norteador nos seus dois componentes, conforme já especificado. De fato, são dois valores per capita diferentes, unificados nacionalmente. Para o piso estruturante, partimos da avaliação segundo a qual o serviço estadual de vigilância sanitária está estruturado. Então, só os Municípios o recebem, no valor de R$ 0,36 por habitante por ano, exceto para Municípios com até 20 mil habitantes (aproximadamente 75% do total de Municípios existentes), que recebem R$ 7.200,00 por ano. O piso estratégico corresponde a um valor per capita de R$ 0,21 por habitante/ano e pode ser destinado a estados e municípios. Em resumo, as regras estabelecidas para os repasses federais no processo de descentralização das ações de vigilância sanitária variaram bastante ao longo do período, mas permaneceram sem alterações em relação a não exigência de certificação pela esfera de Governo mais abrangente, e por ser utilizado para o cálculo dos montantes apenas um único valor per capita para todo o país. Com a Portaria n. 3.252/09, alterações foram introduzidas no componente vigilância Sanitária, do bloco de financiamento da Vigilância em Saúde. Esse componente se divide em:

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 Piso Fixo de Vigilância Sanitária – PFVisa, que manteve a concepção de piso estruturante e piso estratégico, acrescido dos valores referentes ao incentivo financeiros dos Lacen (FINLACEN-Visa); e

 Piso Variável de Vigilância Sanitária – PVVisa, constituído por incentivos específicos, por adesão ou indicação epidemiológica, conforme normatização específica. Os valores do PFVisa devem ser ajustados, a cada ano, de acordo com a população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O repasse dos recursos deve ser realizado em três parcelas anuais, nos meses de janeiro, maio e setembro, em conta específica. Em resumo, as regras estabelecidas para os repasses federais no processo de descentralização das ações de vigilância sanitária variaram bastante ao longo do período, mas permanece sendo utilizado para o cálculo dos montantes apenas um único valor per capita para todo o país.

Algumas ações da vigilância sanitária podem gerar recursos fiscais pela fixação de taxas públicas ou pela cobrança de multas, em função de seu caráter de ação típica de Estado. Todavia, ela não deve ser vista como autossustentável financeiramente, pois isso gera um desvio potencialmente grave de sua finalidade de proteger a saúde. Por outro lado, a cobrança de taxa tem legitimidade, pois não cabe à sociedade em geral financiar a montagem de uma empresa ou zelar pelos seus interesses.

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

A imposição de taxas é uma prerrogativa do poder público, mas a taxa é captada contraprestação. Isso significa que ela é um valor recolhido previamente em função de uma ação a ser efetivamente realizada pelo Estado. Taxar não implica que a resposta final seja positiva para quem demanda (ou seja, a concessão de um registro ou de uma licença sanitária é demandada e a taxa é cobrada. Se a licença será concedida ou não, dependerá do resultado da avaliação realizada).

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Gestão da Vigilância à Saúde

Resumindo Nesta Unidade, tratamos da estruturação dos sistemas nacionais das vigilâncias do campo da saúde, que balizamos pelo contexto federativo e da saúde e pelo plano internacional, e delineamos o contexto de seu desenvolvimento. Demarcamos para os sistemas nacionais das vigilâncias em saúde e sanitária: alguns marcos iniciais, os processos de descentralização, aspectos do financiamento federal e seu estágio de desenvolvimento no SUS. Para a vigilância ambiental e para a vigilância em saúde do trabalhador, de introdução mais recente no sistema de saúde brasileiro. Demarcamos o seu surgimento e a localização do seu poder de polícia em outros setores da Administração Pública, que não o da saúde. Ressaltamos que a vigilância em saúde do trabalhador até o momento não buscou se conformar em um sistema, e sim uma rede que tem como objetivo a execução de uma atenção integral ao trabalhador (assistência, vigilância e promoção).

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Unidade 2 – Estruturação e Gestão dos Sistemas Nacionais das Vigilâncias

Atividades de aprendizagem Vamos verificar como foi seu entendimento até aqui? Uma forma simples de verificar isso é você realizar as atividades propostas a seguir.

1. Do seu ponto de vista, qual seria a justificativa para a prioridade atribuída pela vigilância ambiental aos Municípios maiores para mapeamento de áreas de solo contaminado? 2. Uma função comum a todas as vigilâncias do campo da saúde é a chamada "regulação dos riscos". Para esse tipo de regulação se faz necessária a constituição de sistemas. Por quê? 3. Falamos bastante sobre a PAVS, agora, visite o site da SVS/MS e busque identificar seus eixos e o conteúdo de suas ações. Verifique se é possível comparar o que foi pactuado para o seu Estado com o estabelecido nacionalmente. 4. De acordo com a Unidade de Aprendizagem cite duas finalidades do elenco norteador. Busque-as na internet e discrimine o seu conteúdo por tipo de ação. 5. Escolha um Município que tenha em torno de 50.000 habitantes. Suponha que ele tenha elaborado seu plano de ação da vigilância sanitária. Comente a relação entre os recursos federais a receber frente ao volume de atividades que podem ser pactuadas à luz do elenco norteador.

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UNIDADE 3 CUIDADO EM SAÚDE E QUALIDADE DE VIDA: DESAFIOS PARA AS VIGILÂNCIAS

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM Ao finalizar esta Unidade, você deverá ser capaz de: 

Identificar as contribuições da epidemiologia para as quatro vigilâncias e para o sistema de saúde;



Apontar os diversos desafios para as vigilâncias do campo da saúde; e



Debater sobre possíveis oportunidades geradas a partir dos desafios.

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

INTRODUÇÃO Nesta Unidade de Aprendizagem buscamos discutir as contribuições, desafios e perspectivas das vigilâncias do campo da saúde. Já vimos que as vigilâncias e seus sistemas têm uma nova regulamentação, a Portaria MS/GM n. 3.252, de 22 de dezembro de 2009. Mas nem tudo se resolve mediante uma norma, e ainda mais uma norma complexa como essa. Assumimos que as quatro vigilâncias apresentamse em diferentes estágios de desenvolvimento e de implementação no SUS quando observamos:  todas as vigilâncias na mesma esfera de Governo, seja na esfera Federal, Estadual ou Municipal;  cada uma das vigilâncias nas três esferas de Governo. De um jeito ou de outro, a constatação é a mesma: todas as vigilâncias requerem esforços para seu aprimoramento. Como estamos em um curso de gestão, e de gestão na saúde, devemos renovar o cuidado de não chegar a uma conclusão definitiva, segundo a qual existiria um modelo institucional e de organização de práticas para as vigilâncias que seja “o melhor modelo”.

Abordar as contribuições das vigilâncias para as diversas áreas de prática do sistema de saúde brasileiro é tarefa delicada. É que são tantas as possíveis contribuições das vigilâncias que, mal concluída a versão preliminar, os acréscimos já têm de ser feitos... Assumimos assim que o apontamento das contribuições gera um resultado que tende a ser sempre parcial e provisório, por isso, optamos por apresentar seus desafios e perspectivas. Mas uma coisa é clara: as vigilâncias e a Promoção da Saúde estão

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Gestão da Vigilância à Saúde

submetidas aos mesmos desafios, em um contexto em que predominam demandas sociais por melhorias no acesso e na qualidade do cuidado.

 Por que apresentamos desafios e perspectivas? É que eles têm um caráter positivo. Quando falamos, por exemplo, que a vigilância em saúde do trabalhador é permeada de conflitos, isso não é um problema e sim uma característica, um desafio. No campo do Trabalho e da Saúde existem interesses diferentes, mas eles são sempre contrários, antagônicos?

 E onde está o caráter positivo? Os desafios e os conflitos precisam ser encarados de forma mais estratégica. As posições dos diferentes atores nem sempre são antagônicas. Em determinados momentos, frente a certas situações, pode haver convergência de interesses. E aí está a possibilidade de maiores ganhos, além dos salariais, na redução dos riscos referentes ao trabalho. Ou você não concorda que muitas vezes as soluções podem nascer das crises? Dos desafios e dos conflitos, também...

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

DAS CONTRIBUIÇÕES, SÓ PARA FICAR NAS VIGILÂNCIAS... Em 2001, Sergio Arouca (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2006), naquele registro em vídeo sugerido na Unidade de Aprendizagem 2 como complementar a seus estudos, relembrou o processo de construção dos postulados da Reforma Sanitária e apontou algumas questões carentes de adequado enfrentamento desde a 8ª Conferência Nacional de Saúde: vigilância sanitária, saúde do trabalhador, meio ambiente, ciência e tecnologia. Ou seja, a maioria das vigilâncias – e, quando não, áreas que com elas têm interfaces – carece de maior atenção. Pois discutir Ciência e Tecnologia do ponto de vista da saúde sem considerar as quatro vigilâncias empobrece e limita suas perspectivas. Cada uma delas é capaz de contribuir com aportes relevantes:

 a epidemiológica, por se preocupar com os processos de adoecimento e com os agravos;

 a ambiental e a em saúde do trabalhador, porque a ciência e a tecnologia e seus desenvolvimentos/ experimentos, dizem muito ao ambiente e aos ambientes de trabalho, como proteção ou como danação;

 a sanitária, pela sua contribuição para que produtos e serviços sejam mais seguros e tenham melhor qualidade, no próprio SUS e fora dele. E aí, a vigilância sanitária é imprescindível, pois sua atuação não pode discriminar entre serviços públicos e privados. Ela tem que atuar em todos.

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Essa contribuição da vigilância sanitária se dá tanto pela avaliação da qualidade que realiza quanto pelo que ela faz no processo de desenvolvimento, incorporação e de controle do uso das tecnologias, que inclui o monitoramento de eventos adversos. E, em caso de ocorrência desses eventos, ela busca minimizar seus efeitos na sociedade, determinando o cancelamento de registro, a retirada do mercado ou a limitação do uso a determinados grupos e sob algumas condições etc. Por tudo isso, Arouca (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2006), no mencionado registro em vídeo, afirma que a vigilância sanitária contribui para a estruturação e qualificação do SUS. E pode contribuir para a melhoria da gestão na medida em que o gestor, atento à qualidade dos serviços que oferece à população, exerce seu papel. E todas as vigilâncias podem contribuir, e muito, em especial a sanitária e a epidemiológica. Afinal, boa parte do controle de infecção nos serviços de saúde se vale do sistema de vigilância existente (ativo ou passivo) e da investigação realizada nos moldes da vigilância epidemiológica.

Tipos de sistemas de vigilância Vigilância passiva – tem como fonte de informação a notificação espontânea. É de menor custo e maior simplicidade, sendo mais vulnerável à subnotificação, que pode superar os 50%. Vigilância ativa – caracteriza-se pelo estabelecimento de um contato direto, a intervalos regulares, entre a equipe da vigilância e as fontes de informação, geralmente constituídas por clínicas públicas e privadas, laboratórios e hospitais. Sistema passivo “parcialmente ativado” – é o sistema passivo ativado em parte pelo contato direto e regular com uma fonte ou com um número reduzido de fontes de informação que centralizam o atendimento de grande número de casos do agravo objeto do sistema. Fonte: Waldman (1998a).

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

A taxa de infecção hospitalar pode ser utilizada como uma aproximação da qualidade do serviço de saúde. Caso seja necessário contratar leitos em um hospital, é importante saber como é o desempenho desse serviço em relação ao controle da infecção hospitalar. Pesquise e responda:

 Qual serviço, na esfera federal, responde pelo controle de infecção em serviços de saúde e pela qualidade e segurança transfusional?

 E no seu Estado e no seu Município, quem responde por essas ações?

 Como obter o dado sobre infecção hospitalar dos hospitais do seu Município? Registre os resultados de sua pesquisa. É importante lembrar que a vigilância sanitária regula boa parte das tecnologias em saúde. Medicamentos e grande parte dos equipamentos, aparelhos, materiais, artigos de uso ou aplicação médica, odontológica ou laboratorial requerem, para sua produção e entrada no mercado, de registro no órgão de vigilância sanitária federal. Além disso, estão sujeitos a um conjunto de regulamentos e normas, sendo responsabilidade da vigilância sanitária monitorar sua utilização para identificar eventos inesperados ou adversos (PEPE et al., 2006).

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DOS DESAFIOS E PERSPECTIVAS A recente proposta de estruturação dos Subsistemas de Vigilância em Saúde e de Vigilância Sanitária contida na Portaria n. 3.252/09, ainda dará o que falar. Esses subsistemas padecem de problemas comuns às demais áreas do SUS e de problemas específicos de seu campo de atuação. Alguns deles, como os de vigilância sanitária, epidemiológica e ambiental, embora formalmente instituídos, ainda carecem de uma estruturação que os torne mais efetivos em suas ações. No caso da Saúde do Trabalhador, há um forte conteúdo de assistência e de pesquisa, e até recentemente encontrava-se em construção uma rede na qual também se assiste, e não um sistema. A seguir são apresentados alguns dos grandes desafios que permeiam as vigilâncias e que ainda precisam ser adequadamente enfrentados.

OS POTENCIAIS CONFLITOS DECORRENTES DO QUE FAZEM E COM O QUE LIDAM

Algumas vigilâncias lidam com os processos de produção e seus efeitos na saúde, sendo áreas cuja a contradição capitaltrabalho-saúde exige maior capacidade de intervenção do Estado para reduzir desigualdades, melhorar a qualidade de vida e construir a cidadania. Embora a capacidade de intervenção seja diferenciada entre as vigilâncias, a sanitária, a ambiental e a de saúde do trabalhador relacionam-se mais estreitamente aos processos de

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

produção e de desenvolvimento. Permeiam as grandes questões dessas três vigilâncias:

 contradições nas relações entre capital e trabalho; produção e consumo; e produção e meio ambiente e entre as diversas concepções sobre os modelos de desenvolvimento;

 relações de força que se estabelecem entre quem produz ou presta serviço (cuida) e quem regula;

 necessidade de enfrentar monopólios e oligopólios* e suas estratégias, em um contexto de desenvolvimento desigual entre países.

*Monopólios

e

oligopólios – são termos que se referem a situações de domínio de mercado e de sistemas de concorrência entre empresas

nesse

mesmo

mercado. O monopólio é uma situação em que a oferta é dominada por uma única empresa. Uma situação de monopólio pode ser criada, por exemplo, no caso das patentes de medicamentos. O oligopólio é uma

Um exemplo em que o desenvolvimento desigual entre países gera questões a serem enfrentadas pelas vigilâncias, no caso pela sanitária junto com a ambiental, é o envio por via marítima de carregamentos de lixo tóxico (certos resíduos industriais, principalmente) de países desenvolvidos para outros menos desenvolvidos.

situação em que um pequeno número de empresas domina um mercado e cada uma delas tem capacidade para influenciálo. Fonte: Buss (2000).

Essas três vigilâncias, além de terem que considerar os determinantes e condicionantes biológicos, físicos, químicos, mecânicos ou ergonômicos, têm que lidar com determinantes socioambientais, com a organização do Estado e a implementação de suas Políticas Públicas, especialmente as políticas sociais, no mundo globalizado. Especificamente sobre a vigilância em saúde do trabalhador, diz-se que ela não é uma prática puramente técnica e padronizada, mas sim política de saúde, complexa, ampla, permeada por interesses conflituosos e profundamente inserida na sociedade. E mais: que é perigoso equiparar a vigilância em saúde do trabalhador às concepções restritas de vigilância da saúde, de vigilância das doenças e agravos e à vigilância epidemiológica.

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Saiba mais Para saber mais sobre o tema, consulte sites da internet e documentos que tratem da Convenção da Basiléia (assinada em 1989 para impedir que países ricos exportassem seu lixo tóxico para os mais pobres); da Convenção de Roterdã (sobre substâncias químicas); da Convenção de Estocolmo (sobre poluentes orgânicos persistentes). Visite o site: e utilize a ferramenta de busca.

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Gestão da Vigilância à Saúde

Se essa vigilância for assim reduzida, perde-se a competência para intervir nos ambientes de trabalho (PINHEIRO et al., 2005).

Em relação às características que estão grifadas no parágrafo anterior, perguntamos: elas só caracterizam a vigilância em saúde do trabalhador? Nas atividades de vigilância epidemiológica no seu Município você vislumbra conflitos? Por quê?

Esses preceitos podem ser extrapolados para o conjunto das vigilâncias. Como integrantes do campo da Promoção da Saúde, elas são idealmente voltadas a fortalecer direitos e participação... E isso não é fortalecimento do poder (empowerment) dos consumidores/cidadãos/trabalhadores na luta pela preservação de sua saúde? A vigilância epidemiológica tem um nível mais baixo de conflitos e seu maior desafio é sua própria constituição.

É preciso chamar a atenção para a oportunidade de olhar os conflitos de forma mais estratégica. As posições dos diferentes atores nem sempre são antagônicas. Em determinados momentos, frente a certas situações, pode haver convergência de interesses. Quanto a isso, veja agora um exemplo da vigilância sanitária. Ao retirar produtos de baixa qualidade de circulação ou aumentar exigências sanitárias para a prestação de serviços ou para a produção de bens de consumo que afetam a saúde, a vigilância sanitária pode ter um efeito saneador do mercado, o que fortalece aqueles produtores que trabalham corretamente e contribui para proteger a saúde da população. Ademais, se é um produto usado nos serviços de saúde, a vigilância sanitária contribui para qualificar a atenção prestada nesses serviços.

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

TRANSFORMAR AS PRÁTICAS

DAS VIGILÂNCIAS:

ARTICULAÇÃO E CONTROLE SOCIAL

Esse é um desafio de grande monta, uma vez que as vigilâncias se inserem nas práticas de um estado que é modificado pela correlação de forças históricas e sociais e, muitas vezes, quanto maior e melhor sua ação, maiores os conflitos que são gerados. A vigilância sanitária, conforme foi visto, por seu poder de polícia administrativa, é, dentre as vigilâncias, a que mais diretamente se defronta com os interesses econômicos. Com a breve abordagem do processo de trabalho realizada na Unidade de Aprendizagem 1, podemos perceber o desafio que é incluir nesse processo de mudança de práticas os demais atores sociais: cidadãos, consumidores e trabalhadores. Ao pensar as vigilâncias como práticas sociais, torna-se necessário que esses atores atuem como sujeitos. Isso ainda não é uma realidade para nenhuma das vigilâncias, embora a Saúde do Trabalhador tenha buscado incluir as representações de trabalhadores. Mas, mesmo nela, a participação do trabalhador não é uma questão fácil, e é grande o desafio para a inclusão de representantes do setor informal, público e rural (PINHEIRO et al., 2005). Na vigilância sanitária também é frágil a participação da sociedade, e esse tema quase não faz parte das pautas de discussão nos conselhos de saúde nas diferentes esferas (LUCCHESE, 2001). Precisam ser fortalecidas as iniciativas de alguns conselheiros no sentido de promover a discussão sobre outras questões que não as da assistência à saúde. A gestão participativa na vigilância da qualidade da água é, segundo Freitas e Freitas (2005), um desafio. De acordo com esses autores, o entendimento de participação muitas vezes é visto, por gestores e trabalhadores da saúde, como informação à população e aos conselhos de saúde e do meio ambiente sobre a qualidade da água. Essa informação é fornecida por meio de relatórios mensais, em tempo posterior, sendo insuficiente para a prevenção das doenças.

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Gestão da Vigilância à Saúde

A proposta de Vigilância da Saúde, já abordada na Unidade de Aprendizagem 1 tem como pressuposto, em uma de suas vertentes, a modificação nas práticas sanitárias. Não pretendemos aqui discutir amplamente o conceito de Vigilância da Saúde e suas vertentes, que podem ser aprofundadas em alguns textos (MENDES, 1993; PAIM, 1993; TEIXEIRA; PAIM; VIL ASBOAS, 1998; TEIXEIRA, 2002; TEIXEIRA; COSTA, 2003). Essa discussão também precisaria ser reforçada à luz da questão federativa, nesta federação desigual. Cabe, entretanto, ressaltar que a discussão sobre o modelo de práticas das vigilâncias vem se dando em variados fóruns, entre os atores políticos, com um conjunto heterogêneo de propostas sobre o encaminhamento do processo de reorganização dessas práticas das vigilâncias. Ainda não há consenso do ponto de vista teóricoconceitual, nem do ponto de vista político-organizacional. Os rearranjos institucionais nas diferentes esferas de Governo têm sido avaliados mais frequentemente como uma mudança de organograma do que como uma real mudança de práticas (TEIXEIRA; COSTA, 2003).

v

A Anvisa é um caso

peculiar na saúde, pois, diferentemente da

Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), é fruto de um

processo de reforma institucional. E, também, diferentemente das agências estaduais e municipais, tem autonomia administrativa e financeira e seus dirigentes gozam de estabilidade, conforme vimos na Unidade de Aprendizagem 2.

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De fato, ainda não temos uma avaliação dos poucos processos de reorganização das estruturas das vigilâncias ocorridas em alguns estados e municípios objetivando uma desejada ação mais integral – em vez de mais articulada – das vigilâncias do campo da saúde. Mas já despontam resultados por vezes paradoxais. Concretamente, ou estão sendo criadas agências estaduais e municipais de formatos e denominações diversas, com um único traço em comum: a ausência do conjunto de características que tornou a construção da Anvisa um caso peculiar na saúde. Ou o resultado da reforma tem sido o rebaixamento dos serviços na estrutura decisória das secretarias, com interposição de mais níveis hierárquicos, o que dificulta o processo decisório em qualquer organização, tornando-o mais centralizado, por isso mais lento e, potencialmente, ainda menos permeável ao controle social (ainda mais que três das vigilâncias têm potenciais conflitos a enfrentar). Se a organização institucional é frágil, os resultados e as articulações intra e intersetorial também tendem a ser precários e frágeis.

Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

Evitamos usar o termo integralidade, pois é uma expressão imprecisa em função de seus múltiplos significados, do valor positivo que carrega e da dificuldade em avaliar seu efetivo alcance. Preferimos o uso da expressão articulação. Entretanto, concordamos com Mattos (2001) quando ele afirma que a integralidade é uma bandeira de luta, um conjunto de valores pelo qual vale a pena lutar.

Como você avalia o modelo atual das práticas em vigilâncias adotado em seu Município/Estado, do ponto de vista dos avanços alcançados, dos desafios que enfrenta e de suas fragilidades? Faça um registro de suas reflexões.

A TOMADA DE DECISÃO COM BASE NA INFORMAÇÃO A limitação e a falta de integração dos Sistemas de Informação das Vigilâncias Sanitária em Saúde do Trabalhador e Ambiental que possam ser articulados aos demais sistemas já existentes dificultam a tomada de decisões e o monitoramento da situação de saúde, no que diz respeito aos seus objetos de atuação por meio de indicadores. No caso da vigilância ambiental em saúde e da saúde do trabalhador, há uma avanço representado pela elaboração do painel de indicadores (Pisast), apontado na Unidade de Aprendizagem 1, ao falar nos sistemas de informação. Mas, Santana e Nobre (2005), sobre a construção de sistemas de informação de saúde do trabalhador, referem: que a comunicação obrigatória por parte das empresas dos acidentes e/ou doenças do trabalho restringe-se aos segurados; que a notificação é obrigatória, por meio do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan), apenas em alguns

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Gestão da Vigilância à Saúde

estados e municípios; e que o diagnóstico correto de acidentes e/ ou doenças do trabalho é raro. Além disso, como fatores operacionais que dificultam a construção de bons sistemas de infor mação em saúde do trabalhador, há imprecisão na padronização e codificação do registro da ocupação e cobertura limitada aos empregados do mercado formal, em regime de Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT) – da Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT). A Conferência Nacional de Vigilância Sanitária (2001) apontou a inexistência de um sistema de informação em vigilância sanitária articulado com os diversos sistemas de informação em saúde (CONFERÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2001). O Sistema de Informações de Vigilância Sanitária (SINAVISA), proposto há algum tempo, e a elaboração de cadastros municipais e estaduais de estabelecimentos sujeitos à vigilância têm sido uma das prioridades para o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. A vigilância sanitária, como prática avaliativa, que pretende agir como uma "inteligência", necessita de sistemas de informação fidedignos, que indiquem o universo de sua atuação e informem os efeitos na saúde decorrentes do uso de tecnologias e insumos.

Com ou sem sistema de informação informatizado, o gestor deveria saber quais serviços de saúde estão devidamente licenciados pela vigilância sanitária e cumprem as normas que asseguram um padrão mínimo aceitável de qualidade. Essa informação pode facilitar a decisão sobre credenciamentos (ou descredenciamentos), contratação de leitos e de serviços e sobre investimentos que qualifiquem a rede de serviços colocados à disposição do cidadão.

Podemos dizer, de maneira mais ampla, que o debate sobre a questão das Informações em Saúde tem sido intenso no campo da Saúde Coletiva, mas que a vigilância epidemiológica é a que

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Especialização em Gestão em Saúde

Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

mais se beneficia dos sistemas nacionais de informação existentes e mais voltados à sua prática. Ainda assim, o aperfeiçoamento dos sistemas de informação existentes, o relacionamento e compatibilidade entre as bases e o desenvolvimento de alguns sistemas específicos que informem sobre os objetos das vigilâncias constituem-se num importante desafio para a gestão das vigilância(s) em saúde no seu processo de tomada de decisões.

MONITORAMENTO

E VIGILÂNCIA ATIVA PARA MELHORIA

DE PRODUTOS E SERVIÇOS

De acordo com o que é definido no artigo 200 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2000), como já foi visto, cabe ao SUS o controle e a fiscalização de procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde. Esse controle deve incluir o monitoramento, isto é, a observação de maneira contínua do comportamento desses elementos na vida cotidiana, sob as condições normais de uso. O monitoramento deve servir de base para o aprimoramento do registro de produtos, das normas técnicas e das orientações. Vale lembrar que para o registro de um produto são realizados ensaios clínicos* sob condições controladas, com número reduzido de indivíduos, estando sempre excluídos os idosos, as gestantes, as crianças e os portadores de algumas enfermidades. Assim, alguns efeitos desses produtos/procedimentos só aparecem quando utilizados em larga escala e, muitas vezes, combinados com outras intervenções. É em função do extremo dinamismo da tecnologia na área da saúde que hoje a chamada vigilância póscomercialização ganha relevância e torna-se elemento imprescindível no processo regulatório, na perspectiva da proteção à saúde.

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*Ensaio clínico – qualquer pesquisa que, individual ou coletivamente, envolva o ser humano, de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou partes dela, incluindo o manejo de informações ou materiais. Fone: Brasil (1998b).

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Gestão da Vigilância à Saúde

*Farmacovigilância – ciência relativa à detecção, avaliação, compreensão e prevenção dos efeitos adversos ou quaisquer problemas relacionados a medicamentos. Embora haja previsão desse tipo de vigilância na Lei n. 6.360/76 (BRASIL, 1976),

A esfera federal e alguns estados vêm, ao longo dos últimos anos, trabalhando para desenhar e implementar os programas de monitoramento. Na atualidade, assim como nos países mais desenvolvidos, a Anvisa vem desenvolvendo, com a colaboração de alguns estados, municípios e unidades hospitalares, os programas, por exemplo, de farmacovigilância*, hemovigilância e tecnovigilância, considerados prioritários para a vigilância póscomercialização.

apenas nos últimos anos ela tem sido implantada como

programa.

De

modo análogo, desenvolveram-se os conceitos de

hemovigilância

e

tecnovigilância para os eventos adversos relacionados à utilização de sangue e hemocomponentes e aos equipamentos médicos, respectivamente. Fonte: Elaborado pelas autoras deste livro.

Vigilância pós-comercialização é um estudo do uso e dos efeitos – principalmente dos efeitos adversos – dos medicamentos após a liberação para comercialização. Este termo é, às vezes, usado como sinônimo de farmacoepidemiologia, mas este último pode ser relevante também para os estudos “précomercialização”. Hoje seu uso incorpora outros produtos e tecnologias de interesse da saúde. Uma das estratégias para viabilizar esse tipo de vigilância é a Rede de Hospitais Sentinela, que objetiva obter informações qualificadas a respeito da qualidade dos produtos e do seu perfil de risco/ benefício. Além de servir como subsídio nas ações de regulação de mercado, o projeto contribui para a melhoria da qualidade da atenção à saúde por meio da busca ativa e da investigação de eventos adversos, bem como de medidas para redução e controle de riscos relacionados a tecnologias em saúde. Essas atividades, quando necessário, geram alertas sanitários para todo o sistema de saúde ou de vigilância ou para áreas específicas do SUS.

Uma estratégia importante – tanto na vigilância sanitária quanto na ambiental – tem sido o monitoramento de alguns produtos

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Unidade 3 – Cuidado em Saúde e Qualidade de Vida: desafios para as vigilâncias

e ambientes visando à identificação, mediante metodologias analíticas laboratoriais, de desvios de qualidade e de contaminantes. Por fim, podemos dizer que, sendo o monitoramento geralmente o acompanhamento sistemático de indicadores construídos com o apoio de sistemas de informação, a vigilância epidemiológica é a que mais se beneficia por ter sistemas nacionais de informação voltados à sua prática.

A PESQUISA E A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO A cooperação entre serviços, universidades e institutos de pesquisa no desenvolvimento de pesquisas e na formação de recursos humanos para as vigilância(S) em saúde constitui ainda um desafio e tem se colocado como uma perspectiva ainda bastante tímida, principalmente para a vigilância sanitária. Mas, para todas as vigilâncias, a prática interdisciplinar e multiprofissional pode contribuir para a construção do conhecimento e do desenvolvimento de indicadores e para a identificação de fatores, sejam eles biológicos ou não, interferindo na saúde dos cidadãos, consumidores e trabalhadores e comprometendo o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida. A pesquisa em saúde mobiliza muitos atores, de origens diversas, com visões, interesses e linguagens distintas. Construir uma agenda de prioridades para pesquisa na área da saúde tem sido uma tarefa árdua; pressupõe estabelecer consensos e compartilhar recursos. O investimento em pesquisa e desenvolvimento tecnológico no campo das vigilância(S) em saúde, especialmente nas vigilâncias sanitária, em saúde do trabalhador e ambiental, ainda está aquém das necessidades; isso compromete o desenvolvimento de métodos para avaliação e gerenciamento dos riscos à saúde e estruturação dos sistemas de vigilância. A situação em relação a esse ponto é muito melhor para a vigilância epidemiológica, conforme pudemos

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ver no desenvolvimento do SNVE, devido à cooperação com as instituições e especialmente com a Associação Brasileira de PósGraduação em Saúde Coletiva (ABRASCO). A SVS conta com uma rede acadêmica de centros colaboradores, mas também de profissionais da área da pesquisa.

O FINANCIAMENTO EM BUSCA DA EQUIDADE Embora tenha crescido bastante, ainda é baixo o financiamento para o campo das vigilâncias, especialmente se comparado ao volume de recursos consumidos, por exemplo, pela assistência. A Vigilância Epidemiológica ainda é a que percebe maiores recursos, seja por meio de repasses regulares e automáticos, seja por meio do Projeto VIGISUS. A implementação da Renast tem contado com recursos financeiros extrateto transferidos pelo Fundo Nacional de Saúde a Estados e Municípios, que permitiram a habilitação de 11 Cerests até agosto de 2005 (DIAS; HOEFEL, 2005), perfazendo agora cerca de 180 centros. É importante implementar sistemas nacionais cooperativos dos quais as esferas de Governo participem de forma integrada e que estejam organizados e distribuídos equitativamente no país, negociando por meio das instâncias de pactuação constituídas. Tais sistemas devem contemplar alguns princípios: da transparência na ação regulatória; da transversalidade e intersetorialidade; da ética e da precaução; e da complementaridade das ações (ABRASCO, 2004). A realidade já demonstrada é a de desintegração e desarticulações intrassetoriais na esfera da saúde, com arranjos institucionais de maior ou menor facilidade de estruturação dos serviços estaduais e municipais, dependentes das características político-administrativas e socioculturais de cada localidade. Há, portanto, variações locais que dependem do porte do município ou estado, da forma organizacional e da estrutura de cada Secretaria de Saúde, da importância que a promoção ou proteção da saúde

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tem na cultura local, da organização da sociedade civil e da participação social nas definições das políticas de saúde, por intermédio dos conselhos de saúde. Em 2004, o estado-da-arte do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária era assim caracterizado: [...] vem se conformando como um arranjo restrito aos serviços de vigilância sanitária, com baixo grau de coesão entre os componentes federal e estadual, incipiência do componente municipal e precário controle social. Além de um serviço federal robusto, torna-se necessário prosseguir na estruturação de órgãos que aumentem a cobertura e a efetividade do sistema pela ação colaborativa entre seus componentes, respeitando o princípio da interdependência sistêmica [...] (ABRASCO, 2004, p. 2).

Podemos extrapolar esse diagnóstico para as demais vigilâncias, especialmente as vigilâncias de saúde do trabalhador e ambiental. A vigilância epidemiológica, por sua história e por não interferir diretamente nas contradições capital-trabalho-saúde, encontra-se em estágio mais avançado do que as demais.

Você já pensou que os benefícios gerados pelas ações das vigilâncias são usufruídos mesmo por aqueles que não demandam diretamente os serviços de saúde, alcançando a totalidade da população?

A IMPLANTAÇÃO DE REDE DE LABORATÓRIO PARA QUALIFICAR AS AÇÕES

Cabe ressaltar a importância e o desafio de estruturar e implementar a Rede de Laboratórios Oficiais de Saúde Pública

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(Lacen) para que possam atuar nos vários componentes das vigilância(S) em saúde. Lucchese (2001) considera a fragilidade da Rede de Laboratórios de Controle de Qualidade em Saúde como um dos nós críticos do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, uma vez que, sendo de fundamental importância para a finalização das ações fiscalizadoras da Visa, os Lacen têm dificuldades para a realização das ações laboratoriais: falta de padrões, de métodos analíticos, de equipamentos e de pessoal. Da mesma maneira, Lacaz, Machado e Porto (2002) consideram que a existência de estrutura de referência laboratorial específica é um fator de estabilidade e de crescimento das experiências em saúde dos trabalhadores. Segundo esses autores, [...] na região Sudeste a existência de estrutura institucional relativamente bem desenvolvida não se traduz em retaguarda laboratorial ampla, dada a sua fragmentação e subaproveitamento decorrentes da inexistência de uma efetiva rede de laboratórios de toxicologia e avaliação ambiental, bem como de mecanismos claros de financiamento destas estruturas e das ações dos serviços. (LACAZ; MACHADO; PORTO, 2002, p. 29).

De todo modo, já enunciamos na Unidade de Aprendizagem anterior que se conta com algum recurso para os Lacen e para o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) se eles forem estruturados para melhor atender às vigilâncias. Todavia, é necessário remarcar a diferença entre um procedimento analítico laboratorial para cada uma das áreas dos sistemas das vigilâncias.

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ESTRUTURAÇÃO E QUALIFICAÇÃO DAS EQUIPES A operação desses sistemas nacionais exige uma equipe multiprofissional, com pessoal em quantidade suficiente e com a qualificação necessária ao desenvolvimento das ações. Essa ainda não é a realidade na maioria das vigilâncias. Assim é que Pinheiro (1996) refere a existência de um número restrito e insuficiente de profissionais de saúde para atuar na saúde do trabalhador. No campo da Vigilância Sanitária, o Censo Nacional dos Trabalhadores de Vigilância Sanitária, realizado em 2004, registrou que, dos municípios pesquisados, 13,4% não possuíam nenhum profissional de vigilância sanitária. Além disso, demonstrou disparidades regionais importantes, um maior contingente de pessoal de nível médio ou elementar (67,2%), com 59,2% com até cinco anos de trabalho na vigilância sanitária. De fato, apenas mais recentemente, especialmente a partir do ano 2000, é que os serviços de vigilância sanitária nas diversas esferas de Governo têm realizado concurso público para a (re)composição de suas equipes. Pela natureza da ação da vigilância sanitária, já discutida aqui, podemos compreender que a existência de uma equipe multidisciplinar, com investidura pública, consciente do seu papel na sociedade e qualificada para o exercício de sua função é condição importante para a melhor efetividade do SNVS e do Sistema Único de Saúde como um todo. Constitui-se, portanto, em um enorme desafio a formulação de uma política de recursos humanos que contemple o aumento, a diversificação e a qualificação da força de trabalho e a estabilidade nas três esferas de Governo. E integra esse desafio a superação de um fosso entre os profissionais das quatro vigilâncias e entre os profissionais da Anvisa e os de estados e municípios. As diferenças abarcam a existência de carreira e o patamar salarial dos profissionais que trabalham com vigilância na esfera federal. Os servidores da Anvisa integram uma carreira específica, de regulação, comum a todas as outras agências.

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COMPARTILHAR

RESPONSABILIDADES PARA PRODUZIR MUDANÇAS

Um desafio de monta é fortalecer a articulação das vigilância(S) em saúde, construindo, de fato, a desejada e necessária interação com órgãos de outros campos organizacionais externos à saúde. (Articulação intersetorial). No final dos anos de 1990 se falava sobre o baixo envolvimento da Previdência Social com a saúde do trabalhador, a existência de pontos de atrito com o Ministério do Trabalho e a resistência do grande empresariado às ações do SUS. Embora essa tensão tenha diminuído em alguns estados, se considera ser ainda incipiente e pontual o envolvimento de outros setores – Meio Ambiente, Educação e Agricultura – com o uso de agrotóxicos e a saúde do trabalhador (PINHEIRO, 1996; PINHEIRO et al., 2005). Alguma fragilidade na articulação intersetorial também pode ser notada nas vigilâncias epidemiológica e sanitária quando observamos seus processos de trabalho e o escopo das intervenções. Por exemplo, ações de controle de vetores raramente são desenvolvidas em conjunto com o setor de meio ambiente.

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Resumindo Nesta Unidade de Aprendizagem foram abordadas as contribuições da epidemiologia para as quatro vigilâncias, e também delas para o sistema de saúde, e apontados modelos de sistemas de vigilância (ativa, passiva ou passiva parcialmente ativada). Mas, o ponto central da Unidade de Aprendizagem são os diversos desafios para as vigilâncias do campo da saúde, inclusive os decorrentes dos conflitos de interesse que permeiam pelo menos três delas. Ressalta-se que os desafios também podem representar oportunidades de desenvolvimento.

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Atividades de aprendizagem Com base no que foi visto até agora procure responder às questões a seguir. Em caso de dúvida, não hesite em consultar seu tutor, ele está à sua disposição para lhe auxiliar no que for necessário.

1. Comente como profissional da administração, o desafio de transformar as práticas das vigilâncias. 2. Com base no que foi visto até agora, comente dois desafios elencados nesta Unidade de Aprendizagem e proponha alternativas para superação. 3. Um dos desafios comuns a todas as vigilâncias é a incorporação do controle social do SUS e da participação popular. Na sua opinião, isso é ou não relevante? Por quê?

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Considerações Finais

CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme pudemos observar, a Unidade de Aprendizagem 1 abordou as vigilâncias epidemiológica, sanitária, em saúde do trabalhador e a ambiental, ressaltando o que elas têm em comum e o que as diferenciam. Vimos, também, o desenvolvimento desigual de cada uma das vigilâncias, os conceitos comuns (risco, intersetorialidade e território) e as formas de operacionalização desses conceitos e, por último, os seus processos de trabalho (meios, instrumentos, agentes). Uma maior ênfase foi dada à epidemiológica e à sanitária; dentre outros motivos, pelos seus aspectos institucionais e de tradição no campo da saúde. Na Unidade de Aprendizagem 2, tratamos do processo de estruturação dos sistemas nacionais das vigilâncias do campo da saúde. Ressaltamos que com a promulgação da Portaria GM n. 3.252 foi instituído o Sistema Nacional de Vigilância em Saúde, o qual englobou os Sistemas Nacionais de Vigilância Epidemiológica e o de Vigilância em Saúde ambiental, transformando-os em subsistemas. Tal Portaria também reiterou a existência do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, constituído desde o final da década de 1990. É importante assinalar que a saúde do trabalhador, à exceção das demais vigilâncias, se conforma como rede e insere-se no Subsistema de Vigilância em Saúde Ambiental. Por fim, na Unidade de Aprendizagem 3, vimos que a contribuição das vigilâncias do campo da saúde para as diversas áreas de prática em saúde é diferente (e muito mais ampla) da contribuição das disciplinas que embasam as vigilâncias (aqui falamos sobre o campo da ciência e não só da saúde...).

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Buscamos trazer os conceitos mais relevantes e apresentamos a trajetória das vigilâncias no campo da saúde. Essa é uma base importante para conhecer uma parte do Sistema Único de Saúde e acompanhar o seu processo de estruturação, que é dinâmico e a todo o momento sofre alterações, sobretudo, em algumas Portarias que objetivam organizar e adequar o Sistema em função das diversas mudanças que ocorrem na sociedade. Esperamos que o estudo tenha sido prazeroso e saibam que isso é apenas o começo...

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Referências Bibliográficas

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Gestão da Vigilância à Saúde

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Especialização em Gestão em Saúde

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Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

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Especialização em Gestão em Saúde

Referências Bibliográficas

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Módulo Específico

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Gestão da Vigilância à Saúde

M INICURRÍCULO Marismary Horsth De Seta Enfermeira e doutora em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/ UERJ). Atua na área de saúde coletiva, principalmente em gestão de serviços e sistemas de saúde; vigilância sanitária; federalismo. Professora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde da ENSP/Fiocruz. Curadora da Mostra Cultural Vigilância Sanitária e Cidadania.

Lenice Gnocchi da Costa Reis Médica sanitarista e mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz. Atua na área de saúde coletiva, principalmente em vigilância sanitária e avaliação em saúde. Pesquisadora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde da ENSP/Fiocruz.

Elizabete Vianna Delamarque Historiadora, Museóloga; mestranda do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde, da Casa de Oswaldo Cruz (Coc/ Fiocruz). Membro do Centro Colaborador em Vigilância Sanitária, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Cecovisa/ENSP/Fiocruz).

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Especialização em Gestão em Saúde
Gestao Vigilancia em Saude GS Miolo Online 2ed

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