1 - Cirurgia Plastica Volume Um - Principios - 3 ed

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Cirurgia Plástica – Princípios TERCEIRA EDIÇÃO

Editor-chefe Peter C. Neligan, MB, FRCS(I), FRCSC, FACS Professor of Surgery Department of Surgery, Division of Plastic Surgery University of Washington Seattle, WA, EUA

Editor do volume Geoffrey C. Gurtner, MD, FACS Professor and Associate Chairman Stanford University Department of Surgery Stanford, CA, EUA

Sumário Capa Folha de rosto Copyright Revisão Científica e Tradução Introdução Prefácio Lista de Colaboradores Agradecimentos Dedicatória

Volume 1: Princípios Capítulo 1: Cirurgia plástica e inovação na medicina Introdução Inovação e pesquisa Inovação e cirurgia plástica Alotransplante de tecido composto Colaboração Efetuadores da inovação Princípios da inovação Influências externas e inovação Documentação, coleta de dados e regulação

Capítulo 2: História da cirurgia reconstrutiva e estética Origem da cirurgia plástica Cirurgia plástica após o declínio do Império Romano

O século XIX O século XX Cirurgia estética

Capítulo 3: Aspectos psicológicos da cirurgia plástica Imagem corporal e cirurgia plástica Formação da personalidade e do caráter Reações psicológicas perioperatórias A relação médico-paciente Estilos e distúrbios da personalidade Estratégias para o tratamento do paciente difícil Procedimentos cirúrgicos e aspectos psicológicos associados Cirurgia plástica na infância Seleção dos pacientes: perigos e armadilhas Estratégias para o manejo do paciente insatisfeito Conclusão

Capítulo 4: O papel da ética na cirurgia plástica A ética como vista por associações profissionais Relações éticas com os pacientes A ética da publicidade O papel da ética no consultório ambulatorial Ética na sala de cirurgia Relações éticas com outros provedores e terceiros pagadores A ética do depoimento de uma testemunha especialista Resumo

Capítulo 5: Princípios de negócios para cirurgiões plásticos Introdução Estratégias Contabilidade Finanças Economia Marketing Operações Inovação Empreendedorismo Empresa sustentável Gestão de recursos humanos Considerações legais e regulatórias

Negociação Ética Liderança

Capítulo 6: Aspectos médico-legais na cirurgia plástica Introdução Interações com advogados e o sistema legal Áreas da lei Responsabilidade pelo produto Fraude e abuso Lei dos contratos Aspectos regulatórios dentro da lei Lei da difamação pela internet e blogs Ações básicas de um processo judicial de má prática (um guia) Responsabilidade da clínica de estética Responsabilidades relacionadas com os planos de saúde Aspectos relacionados com a responsabilidade da seguradora Aspectos legais nos casos societários Seleção do paciente Resumo

Capítulo 7: Fotografia na cirurgia plástica Objetivo Padrões de captura de imagens Arquivamento e gerenciamento de imagens Processamento de imagem digital O futuro

Capítulo 8: Segurança do paciente na cirurgia plástica O risco de ser submetido à cirurgia Pacientes obesos/Pacientes com apneia do sono submetidos à cirurgia plástica Manejo intraoperatório do paciente de cirurgia plástica Trombose venosa profunda/Embolia pulmonar no paciente submetido à lipoaspiração Cuidados com o paciente durante a cirurgia de lipoaspiração Cirurgia estética facial Complicações de cirurgia de mama Incêndio na sala de cirurgia Sistemas baseados em protocolo para redução da incidência de paciente errado e cirurgia do lado errado A sociologia da sala de cirurgia na cirurgia plástica A melhor das intenções, não o melhor resultado

Capítulo 9: Anestesia local em cirurgia plástica Introdução A seleção dos pacientes Escolha de sedação Pré-medicação Sedação Seleção de anestésicos locais Seleção da técnica Problemas ou complicações Discussão Conclusões

Capítulo 10: Medicina baseada em evidências e pesquisa em cirurgia plástica nas organizações de saúde A melhor evidência – onde encontrar? Desenhos de estudo e níveis de evidência Análise de grandes bancos de dados Pesquisa de resultados relatados pelos pacientes Análise comparativa de efetividade Tendências futuras O que fazer com os resultados? Conclusões

Capítulo 11: Genética e diagnóstico pré-natal Introdução Genoma humano Hereditariedade Causas genéticas para o desenvolvimento de doenças O gene como foco para a terapia Questões éticas das descobertas genéticas e da terapia gênica Doença genética e o diagnóstico Anomalias congênitas Diagnóstico pré-natal Desenvolvimentos futuros

Capítulo 12: Princípios do tratamento de câncer Histórico História do tratamento do câncer Patobiologia Tratamento

Conclusão

Capítulo 13: Células-tronco e medicina regenerativa Introdução Células-tronco embrionárias humanas Células-tronco pós-natais e somáticas Futuras aplicações clínicas da terapia com células-tronco

Capítulo 14: Cicatrização de feridas Introdução Feridas agudas O processo de cicatrização da ferida Hemostasia Inflamação Infecção Vascularização Fechamento da ferida Feridas crônicas Isquemia e oxigenação tecidual MicroRNAs Células-tronco

Capítulo 15: Cicatrização de feridas cutâneas: biologia do reparo, ferida e tratamento da cicatriz Biologia de reparo da ferida Reparo da ferida no adulto Regulação Biologia do reparo da ferida fetal Patologia da ferida do adulto Manejo clínico da ferida Perspectivas futuras

Capítulo 16: Prevenção de cicatriz, tratamento e correção A importância da cicatriz no aspecto social e pessoal História e exame físico Avaliação de cicatrizes Biologia da cicatrização Situações de cicatrização excessiva Prevenção Tratamento Correção de cicatriz

Cuidados pós-operatórios e acompanhamentos

Capítulo 17: Enxerto de pele Anatomia e fisiologia Ciência Aplicação clínica Complicações Futuro

Capítulo 18: Enxerto de tecidos, reparação de tecidos e regeneração Introdução Enxerto dérmico e reparação Enxertos de gordura e reparação Enxerto de fáscia e reparação Enxerto de tendão e reparação Enxerto de músculo esquelético e reparação Enxerto de tecido composto

Capítulo 19: Engenharia de tecidos Introdução Componentes da engenharia de tecidos Teste e caracterização de abordagens da engenharia de tecidos Gerenciamento do risco, regulação e ética Estudos de casos e estado da engenharia de tecidos para tecidos específicos

Capítulo 20: Reparação, enxertia e engenharia de cartilagem Introdução Enxertos de cartilagem autóloga e suas aplicações6 Enxerto de pericôndrio autólogo Engenharia de cartilagem Perspectivas futuras

Capítulo 21: Reparação e enxerto ósseo Microanatomia e histoquímica Princípios da homeostase e renovação óssea Consolidação de fraturas Remodelação óssea A aplicação clínica da transferência de osso

Capítulo 22: Reparo e enxerto do nervo periférico

Introdução Tipos de lesão do nervo Avaliação das lesões do nervo Reparo do nervo Estímulo intraoperatório do nervo Fatores que afetam o desfecho União do espaço: técnicas atuais Transferência de nervo: alternativa aos conduítes Bioengenharia: o futuro? Tratamento pós-operatório Resumo

Capítulo 23: Os territórios vasculares Introdução A pesquisa anatômica vascular Aplicações do conceito de angiossomas

Capítulo 24: Classificação de retalhos e aplicações Classificação de retalhos Modificações dos retalhos Aplicação do retalho Seleção de retalhos musculares e musculocutâneos específicos Seleção de retalhos específicos da fáscia Aplicação regional de retalhos musculocutâneos e musculares

Capítulo 25: Fisiopatologia e farmacologia do retalho Introdução Fisiopatologia da falha de sobrevivência dos retalhos Manipulação cirúrgica para o aprimoramento da viabilidade do retalho pediculado Farmacologia terapêutica para o aprimoramento da viabilidade do retalho pediculado Farmacologia terapêutica para o aprimoramento da viabilidade do retalho livre Conclusão e futuras direções

Capítulo 26: Princípios e técnicas da cirurgia microvascular Introdução Instrumentos Princípios gerais da cirurgia microvascular Técnicas de anastomose microvascular Aspectos gerais da cirurgia livre de retalho Técnicas especiais e alterações no retalho

Controle pós-operatório, complicações e resultados Futuro da microcirurgia

Capítulo 27: Princípios e aplicações da expansão de tecido Introdução A biologia da expansão de tecidos Tipos de implantes Princípios básicos Expansão de tecidos em casos especiais A reconstrução da cabeça e pescoço A reconstrução da mama, do tórax, do tronco e das extremidades Complicações e seu gerenciamento

Capítulo 28: Radiação terapêutica: princípios, efeitos e complicações Introdução Tecnologia das radiações Terapia de partículas Braquiterapia Física Radiobiologia Aplicações Toxicidades específicas e complicações Conclusões e tendências futuras

Capítulo 29: Anomalias vasculares Introdução Tumores vasculares Malformações vasculares Conclusão

Capítulo 30: Tumores não melanocíticos benignos e malignos da pele e de partes moles Introdução Diagnóstico Tratamento Tumores cutâneos e de partes moles benignos Tumores cutâneos e de partes moles malignos

Capítulo 31: Melanoma Introdução Avaliação clínica

Classificação/estadiamento da doença Avaliação da doença sistêmica Considerações cirúrgicas e tratamento Linfadenectomia Tratamento adjuvante para o melanoma Tratamento do melanoma metastático Seguimento Resumo

Capítulo 32: Implantes e biomateriais Metais Polímeros Cerâmicas Adesivos e colas Substitutos de pele Malha bioprotética Materiais do futuro

Capítulo 33: Próteses faciais em cirurgia plástica Vantagens da osseointegração craniofacial Indicações para osseointegração facial Importantes fatores para obter a osseointegração13,37 Planejamento do tratamento Técnica cirúrgica Construção protética Programa de manutenção Procedimentos autógenos auxiliares Resultados da osseointegração craniofacial Conclusão

Capítulo 34: Transplante em cirurgia plástica Nomenclatura Imunologia dos transplantes Corticosteroides Agentes antiproliferativos Inibidores da calcineurina Preparações antilinfócitas Deleção clonal Anergia Regulação imunológica por células reguladoras

Transplante na cirurgia plástica Transplante de mão Futuro do transplante na cirurgia plástica

Capítulo 35: Inovação tecnológica em cirurgia plástica: um guia prático para o cirurgião inovador Introdução A ideia Determinando o valor Financiamento Propriedade intelectual Transferência de tecnologia institucional Processo regulamentar de aprovação da FDA Conflito de interesse Inovações em cirurgia plástica Terapia de feridas por pressão negativa Matriz dérmica acelular Contorno corporal não invasivo

Capítulo 36: Robótica, simulação e telemedicina na cirurgia plástica Introdução Robótica Simulação Telemedicina Conclusão

Índice

Copyright © 2015 Elsevier Editora Ltda. Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Saunders – um selo editorial Elsevier Inc. Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610, de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. ISBN: 978-85-352-7786-9 ISBN (versãoeletrônica): 978-85-352-8308-2 Copyright © 2013 by Saunders, an imprint of Elsevier Inc. First Edition 1990 Second Edition 2006 Third Edition 2013 This book and the individual contributions contained in it are protected under copyright by the Publisher (other than as may be noted herein). The following authors retain copyright of the following content: All photographs in Volume 2, Chapter 3 Botulinum toxin (BoNT-A) © Michael A. C. Kane. Volume 2, Video clip 8.01 Periorbital Rejuvenation © Julius Few Jr. Volume 2, Video clip 11.07.01 The High SMAS Technique with Septal Reset © Fritz E. Barton Jr. Volume 2, Video clip 15.01 Skeletal augmentation © Michael J. Yaremchuk. Volume 2, Video clip 30.01 Post Bariatric Reconstruction-Bodylift © J. Peter Rubin Volume 5, Video clip 23.1.01 Congenital anomalies of the breast: An Example of Tuberous Breast Type 1 Corrected with Glandular Flap Type 1 © Mr. Nicodemo Magiulli All photographs in Volume 6, Chapter 6 Nail and fingertip reconstruction © Southern Illinois University School of Medicine. This edition of Plastic Surgery, third edition, edited by Peter C. Neligan and Geoffrey C. Gurtner is published by arrangement with Elsevier Inc. ISBN: 978-1-4557-1052-2 Capa Mello & Mayer Design Editoração Eletrônica Thomson Digital Elsevier Editora Ltda. Conhecimento sem Fronteiras Rua Sete de Setembro, n° 111 – 16° andar 20050-006 – Centro – Rio de Janeiro – RJ Rua Quintana, n° 753 – 8° andar 04569-011 – Brooklin – São Paulo – SP Serviço de Atendimento ao Cliente 0800 026 53 40 [email protected] Consulte nosso catálogo completo, os últimos lançamentos e os serviços exclusivos no site www.elsevier.com.br Nota

Como as novas pesquisas e a experiência ampliam o nosso conhecimento, pode haver necessidade de alteração dos métodos de pesquisa, das práticas profissionais ou do tratamento médico. Tanto médicos quanto pesquisadores devem sempre basear-se em sua própria experiência e conhecimento para avaliar e empregar quaisquer informações, métodos, substâncias ou experimentos descritos neste texto. Ao utilizar qualquer informação ou método, devem ser criteriosos com relação à sua própria segurança ou à segurança de outras pessoas, incluindo aquelas sobre as quais tenham responsabilidade profissional. Com relação a qualquer fármaco ou produto farmacêutico especificado, aconselha-se o leitor a cercar-se da mais atual informação fornecida (i) a respeito dos procedimentos descritos, ou (ii) pelo fabricante de cada produto a ser administrado, de modo a certificar-se sobre a dose recomendada ou a fórmula, o método e a duração da administração, e as contraindicações. É responsabilidade do médico, com base em sua experiência pessoal e no conhecimento de seus pacientes, determinar as posologias e o melhor tratamento para cada paciente individualmente e adotar todas as precauções de segurança apropriadas. Para todos os efeitos legais, nem a Editora, nem autores, nem editores, nem tradutores, nem revisores ou colaboradores assumem qualquer responsabilidade por qualquer efeito danoso e/ou malefício a pessoas ou propriedades envolvendo responsabilidade, negligência etc. de produtos, ou advindos de qualquer uso ou emprego de quaisquer métodos, produtos, instruções ou ideias contidos no material aqui publicado. O Editor CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ N345c 3. ed. Neligan, Peter C. Cirurgia plástica : princípios, volume um / Peter C. Neligan, Geoffrey C. Gurtner ; tradução Taís Facina, Douglas Futuro, et al. - 3. ed. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2015. 1077 p. : il. ; 27 cm. (Cirurgia plástica) Tradução de: Plastic surgery, volume 1 Inclui índice ISBN 978-85-352-7786-9 1. Cirurgia plástica. 2. Estética. I. Gurtner, Geoffrey C. II. Título. III. Série. 15-19382 CDD: 617.95 CDU: 616-089.844

Revisão Científica e Tradução Supervisão da revisão científica Osvaldo Saldanha Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) (2006-2007) Doutorado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Divisão de Cirurgia Plástica da Faculdade de Medicina da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES) Regente do Serviço de Cirurgia Plástica “Dr. Ewaldo BS Pinto”– Universidade Santa Cecília (UNISANTA)

Coordenação do volume 1 Carlos Alberto Komatsu Mestre em Cirurgia Plástica pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Médico Assistente do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo

Revisão científica Benjamin de Souza Gomes Filho (Caps. 7 e 9) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC) Membro do International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS) Membro da Associação dos Ex-alunos do Professor Pitanguy (AEXPI) Bianca Ohana (Caps. 14 e 15) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Chefe do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) do Hospital Municipal Pedro II (HMPII) Carlos Alberto Komatsu (Caps. 1, 27 e 28) Mestre em Cirurgia Plástica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Médico Assistente do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Cristianna Bonetto Saldanha (Índice) Residente R1 de Cirurgia-Geral da Santa Casa de Misericórdia de Santos – São Paulo Eduard René Brechtbühl (Caps. 30 e 31) Membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Regente do Capítulo de Oncologia da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Membro Titular do Núcleo de Cancer de Pele do AC Camargo Cancer Center-Mestre em Oncologia pela Fundação Antonio Prudente Francis Llaverias (Caps. 2 e 32) Pós-graduado em Cirurgia Geral pelo MEC na Santa Casa do Rio de Janeiro Cirurgião Plástico pela Residência “Serviço de Cirurgia Plástica Dr. Ewaldo Bolívar de Souza Pinto” – Regente Osvaldo Saldanha pela Universidade Santa Cecília (UNISANTA) Johnny Leandro Conduta Aldunate (Caps. 11, 16, 17, 21, 22, 24 e 25) Cirurgião Plástico pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) Jorge Antônio Menezes (Caps. 4, 5 e 6) Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Regional Minas Gerais (SBCP-MG) no biênio 2008/2009 Regente do Centro de Formação e Treinamento em Cirurgia Plástica do Hospital Mater Dei, em Belo

Horizonte/MG Diretor Nacional do Departamento de Defesa Profissional (DEPRO) de julho/2011 a dezembro de 2012. José Carlos Marques de Faria (Cap. 26) Professor Associado do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Regente do Serviço de Cirurgia Plástica da PUC Campinas Presidente da Sociedade Brasileira de Microcirurgia Reconstrutiva (2004/2005). José Hermílio Curado (Caps. 23 e 29) Presidente Executivo do Hospital AC Camargo (São Paulo) Diretor Clínico e Executivo da Clínica Médica Ibirapuera Criador e Fundador do Departamento de Cirurgia Plástica do Hospital AC Camargo Membro do Conselho Fiscal da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Lydia Masako Ferreira (Caps. 13, 35 e 36) Pós-doutorado pela University of California – San Francisco Doutora em Cirurgia Plástica Reparadora pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Professora Titular da Disciplina Cirurgia Plástica na pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Membro da Comissão Avaliação-Medicina (CA-Med) Membro da International da Society Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS) Membro da International da Confederation for Plastic, Reconstructive and Aesthetic Surgery (IPRAS) Nelson Piccolo (Caps. 18, 19 e 20) General Secretary for International Confederation for Plastic, Reconstructive and Aesthetic Surgery (IPRAS) Diretor do Hospital Nelson Piccolo, Brasília, DF Diretor do Instituto Nelson Piccolo, Goiânia, GO Chefe da Divisão de Cirurgia Plástica do Pronto-socorro para Queimaduras Osvaldo Saldanha (Cap. 8) Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) (2006-2007) Doutorado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Divisão de Cirurgia Plástica da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES) Regente do Serviço de Cirurgia Plástica “Dr. Ewaldo BS Pinto”– Universidade Santa Cecília (UNISANTA) Osvaldo Saldanha Filho (Cap. 34) Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Rodrigo de Faria Valle Dornelles (Cap. 33) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Craniomaxilofacial Mestre em Cirurgia Plástica pela Universidade de São Paulo (USP) Sérgio Fernando Dantas de Azevedo (Caps. 3 e 12) Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) Viviane de Andrade Figueira Pinto Coelho (Cap. 10) Cirurgiã Plástica pela pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP)

Tradução Adriano Lara Zuza (Cap. 32) Cirurgião e Traumatologista Bucomaxilofacial pela Associação Brasileira de Odontologia (ABO) Mestre em Biologias Celular e Estrutural Aplicadas pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Graduando em Medicina pela Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC) Alcir Costa Fernandes Filho (Caps. 7, 8 e 30) Tradutor pela Universidade Estácio de Sá (UNESA) Certificado de Proficiência em Inglês pela University of Michigan, EUA Graduado pelo Instituto Brasil-Estados Unidos AnaJulia Perroti-Garcia (Cap. 5) Cirurgiã-dentista formada pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP) Tradutora Intérprete graduada pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (UniFMU)

Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pela Metodista (Rudge Ramos, SP) Especialista em Tradução pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) Mestre em Linguística Aplicada pelo Programa de Estudos Pós-graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (LAEL/PUCSP) Doutora em Língua Inglesa pelo Departamento de Letras Modernas (DLM) da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) Andréa Favano (Cap. 9) Cirurgiã-dentista graduada pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP) Certificado de Proficiência em Inglês pela Cambridge University, Reino Unido Tradutora-intérprete pelo Centro Universitário Ibero-americano – UNIBERO Denise C. Rodrigues (Caps. 4 e 15) Pós-graduada em Tradução pela Universidade de Franca (UNIFRAN) Bacharel em Tradução pela Universidade de Brasília (UnB) Licenciada em Letras (Língua e Literatura Inglesas) pela Universidade de Brasília (UnB) Douglas Arthur Omena Futuro (Caps. 1 a 3, 6 e 19) Médico Ortopedista Fernanda Araújo Freire (Cap. 20) Especialista em Alergia e Imunologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Especialista em Pediatria pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Isabela Bazzo da Costa (Cap. 28) Pós-doutoranda em Genética Humana pela Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) Doutora em Medicina Veterinária e Mestra em Farmacologia pela Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) Joana Barros Frota (Cap. 10) Médica Veterinária pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia pela Universidade Estadual de São Paulo (FMVZ/UNESP) Especialização em Patologia Clínica Veterinária pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP) José de Assis Silva Júnior (Cap. 11) Especialista em Estomatologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mestre e Doutor em Patologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF) Leda Shizuka Yogi (Cap. 16) Mestra em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Lidianne Narducci Monteiro (Cap. 31) Médica Veterinária Patologista pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual de São Paulo (FMVZ/UNESP) Mestra em Patologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (FMB/UNESP) Doutoranda em Patologia pelo Laboratório de Patologia Comparada do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Maria Eugênia Laurito Summa (Cap. 17) Médica Veterinária pela Universidade de São Paulo (USP) Maria Luísa de Lima Landman (Cap. 18) Graduada em Medicina Veterinária pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) Especialista em Medicina Farmacêutica na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Mestra em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) MBA em Gestão Executiva em Saúde pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) Miriam Yoshie Tamaoki (Cap. 33) Odontóloga pela Faculdade de Odontologia da Universidade São Paulo (USP) Soraya Imon (Caps. 12 a 14) Biomédica pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) Especialista em Imunopatologia e Sorodiagnóstico pela Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (UNESP)

Doutora em Imunologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB/USP) Taís Facina (Caps. 21 a 23, 25 a 27, 29, 34 a 36) Letra Certa Comunicação e Produção Editorial Serviços de revisão, tradução e elaboração de textos www.letracerta.com.br Tatiana Ferreira Robaina (Índice) Doutora em Ciências pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mestra em Patologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF) Especialista em Estomatologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Cirurgiã-dentista pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel)

Introdução Joseph G. McCarthy, MD 2012 Um livro define de muitas maneiras uma disciplina específica. Essa afirmação é especialmente verdadeira na evolução da cirurgia plástica moderna. A publicação de Handbuch der Plastischen Chirurgie, de Zeis, em 1838, popularizou o nome da especialidade, mas foi von Graefe, em sua monografia Rhinoplastik, publicada em 1818, que usou pela primeira vez o termo “plástica”. Na virada do século passado, Nélaton e Ombredanne compilaram o que havia disponível na literatura do século XIX e publicaram em Paris um texto de dois volumes, em 1904 e 1907. Um livro fundamental, publicado no outro lado do Atlântico, foi Cirurgia e Doenças dos Maxilares (1912), de Vilray Blair. Entretanto, apesar de limitar-se a uma região anatômica específica do corpo humano, tornou-se um importante manual para os cirurgiões militares da Primeira Guerra Mundial. O clássico de Gillies, Plastic Surgery of the Face (1920), também restringiu-se a uma única região anatômica e recapitulou sua notável e pioneira experiência na Primeira Guerra Mundial com a cirurgia plástica reconstrutiva da face. O livro de Davis, Plastic Surgery. It’s Principles and Practice (1919), foi, provavelmente, a primeira definição abrangente da nova especialidade com ênfase na cirurgia plástica “da cabeça aos pés”. O livro Surgery of Injury and Plastic Repair (1939), de Fomon, revisou todas as técnicas de cirurgia plástica disponíveis na época e também serviu como manual para cirurgiões militares da Segunda Guerra Mundial. O livro Surgical Treatment of Facial Injuries (1949), de Kazanjian e Converse, foi uma revisão da experiência do primeiro autor como cirurgião plásticoe da experiência do coautor obtida na Segunda Guerra Mundial. O abrangente texto de cirurgia plástica intitulado Plastic and Reconstructive Surgery (1948), de Padgett e Stephenson, fundamentava-se mais no texto de Davis, de 1919. A história da obra de Neligan começou com a publicação, em 1964, dos cinco volumes do livro Reconstructive Plastic Surgery de Converse. Ao contrário do que fez em seu livro de coautoria com Kazanjian, 15 anos antes, Converse empreendeu uma visão abrangente da cirurgia plástica como especialidade na metade do século XX. Os capítulos também foram dedicados à anatomia pertinente, à pesquisa e ao papel de especialidades relevantes, como Anestesiologia e Radiologia. O livro imediatamente tornou-se a bíblia da especialidade. Em 1977, foi lançada a segunda edição – da qual fui o editor-assistente –, que foi ampliada de cinco para sete volumes (3.970 páginas) porque a especialidade também havia crescido. Editei a publicação de 1990, que foi aumentada para oito volumes e 5.556 páginas; e a seção sobre mão foi editada por J. William Littler e James W. May. Mudei o título do livro de Reconstructive Surgery para Plastic Surgery por não entender a distinção entre os dois títulos. Para a mãe de uma criança com lábio leporino, a cirurgia é “estética”, e muitos dos procedimentos de ritidectomia naquela época eram, na realidade, reconstrutivos, pois várias camadas dos tecidos moles faciais eram reajustadas. Steve Mathes lançou a edição de 2006 em oito volumes. Ele alterou o formato, e V. R. Hentz foi o editor auxiliar. Naquela época, o texto aumentou para mais de 7.000 páginas. A instrução do cirurgião plástico e o material de referência que lhe é imprescindível não mais se limitam à página impressa ou ao que é descrito na prática atual como “material físico”. A invenção de Gutenberg da tipologia móvel para impressão, por volta de 1439, certamente tornou possível a publicação e a distribuição dos textos clássicos de Vesalius (Fabrica, 1543) e Tagliacozzi (De Curtorum Chirurgia Per Insitionem, 1597), e, por muitos anos, foi o único meio pelo qual os cirurgiões podiam ser educados. No o século XIX, entretanto, com o desenvolvimento de ferrovias confiáveis e viagens ultramarinas, tornou-se mais fácil viajar, e os cirurgiões passaram a visitar diferentes centros cirúrgicos e a organizar encontros. O American College of Surgeons, após a Segunda Guerra Mundial, foi pioneiro na utilização de filmes de cirurgias, que foram sucedidos pelos vídeos. O desenvolvimento da internet, no entanto, colocou quase toda a informação na ponta dos dedos dos cirurgiões com acesso a computador. Atualmente, tem-se a educação virtual de cirurgia, em que o estudante ou o cirurgião, sentado diante de um computador, interage com um programa de software que contém animações, vídeos intraoperatórios com sobreposição de som e acesso à literatura mundial sobre um determinado assunto. Estamos progredindo rapidamente, do livro encadernado da época de Gutenberg para o dispositivo manual ou

tablet hoje onipresente para a disseminação do conhecimento cirúrgico. O texto de Neligan continua esta grande tradição do ensino cirúrgico, fornecendo ao leitor ferramentas de comunicação modernas. Alinhado aos avanços da era eletrônica, foi disponibilizado um conteúdo extra (apenas em inglês) online como perspectiva histórica, lista completa de referência e vídeos. O livro também pode ser lido em e-pub, formato que mereceu dedicação de horas de trabalho do editor e de todos os seus colaboradores. Além de definir a especialidade de cirurgia plástica, o texto assegura que uma nova geração de cirurgiões plásticos tenha acesso a todo o conhecimento da área. Essa geração, por sua vez, não só levará essa informação para o futuro, como também contribuirá para seu crescimento. Parabéns a Peter Neligan e a seus colegas por continuarem a crônica da saga da cirurgia plástica, que vem evoluindo há mais de dois milênios.

Prefácio Sempre adorei livros-texto. Tão logo comecei minha formação, fui apresentado ao Reconstructive Plastic Surgery, de Converse, na época em sua segunda edição. Fiquei perplexo com a amplitude da especialidade e com o conhecimento contido em suas páginas. Sendo um jovem cirurgião plástico em prática, comprei a primeira edição do livro Plastic Surgery, editado pelo Dr. Joseph McCarthy, e encontrei nele uma ferramenta inestimável, que constantemente eu consultava. Foi com orgulho que fui convidado a contribuir com um capítulo para a segunda edição, editada pelo Dr. Stephen Mathes, e nunca imaginei que um dia poderia ser o responsável pela edição posterior do livro. Considero essa obradefinitiva em nossa especialidade, por isso assumi essa tarefa com muita seriedade. O resultado é um livro muito diferente da edição anterior, pois reflete as mudanças na especialidade, nos estilos de apresentação e no modo como os livros-texto são usados. Na preparação para essa tarefa, li a edição anterior do início ao fim e identifiquei onde poderiam ocorrer as principais mudanças. Inevitavelmente, em um texto extenso como este, há alguma repetição e sobreposição. O primeiro trabalho, portanto, foi definir onde a repetição e a sobreposição poderiam ocorrer e tentar eliminá-las. Assim, foi possível condensar o material e, junto com algumas outras mudanças, reduzir o número de volumes de oito para seis. A leitura do livro levou-me a outra descoberta, a de que a abrangência da especialidade, que já era impressionante quando me foi apresentada, é agora, 30 anos depois, ainda mais impressionante, e continua a evoluir. Por essa razão, percebi rapidamente que, para tornar este projeto justo, eu não poderia implementá-lo por conta própria. Minha solução foi recrutar editores de volumes para cada uma das principais áreas de cirurgia plástica, bem como um editor para os vídeos de procedimentos cirúrgicos. Os Drs. Gurtner, Warren, Rodriguez, Losee, Song, Grottinge Van Beek fizeram um excelente trabalho, e este livro realmente representa um esforço de toda a equipe. A publicação é uma encruzilhada. A era digital tornou as informações muito mais imediatas, acessíveis e flexíveis na maneira como são apresentadas. Tentamos refletir isso nesta edição. A primeira grande mudança é a apresentação total em cores. Além disso, todas as ilustrações foram redesenhadas e a maioria das fotografias de pacientes agora é colorida. Os capítulos sobre anatomia foram destacados com a cor vermelha para torná-los mais fáceis de ser localizados entre os capítulos pediátricos, que são destacados em verde. Pensando na maneira como uso os livros-texto, percebi que, embora goste de ter acesso às referências no final de um capítulo, quase nunca as leio. Quando o faço, seleciono, na maioria das vezes, alguns artigos para ler. Portanto, você notará que mantivemos as referências mais importantes no texto impresso, mas passamos o restante (em inglês) para o site. Isso possibilitou aumentar consideravelmente a utilidade das referências. Todas elas têm hiperlinks para o PubMed e Expertconsult em todos os volumes, o que facilita a pesquisa. Além disso, cada capítulo tem uma seção dedicada à história do assunto (outro tópico ao qual gosto de ter acesso, mas raramente tenho tempo para ler), que também foi deslocada para a web. Essa mudança não só aumentou o espaço no texto impresso, como também possibilitou dar aos autores maior liberdade na apresentação da perspectiva histórica do tema. Imagens extras também foram disponibilizadas (em inglês) apenas na internet. A edição web do livro, portanto, é mais completa do que a versão impressa, e a compra do livro automaticamente garante o acesso à internet. O ícone de um mouse foi adicionado ao texto para marcar qual o conteúdo extra (em inglês) que está disponível no site. Nesta era digital, o vídeo tornou-se uma maneira muito importante para transmitir conhecimento. Mais de 160 vídeos de procedimentos cirúrgicos criados pelos principais especialistas da área em todo o mundo acompanham esses volumes. Esses vídeos abrangem todo o escopo da especialidade. Este livro, portanto, é muito diferente de seus antecessores. É o reflexo de uma era de mudança na comunicação. No entanto, será extremamente satisfatório se ele cumprir sua tarefa de definir o o conhecimento atual sobre a especialidade, assim como nas edições anteriores. Peter C. Neligan, MB, FRCS(I), FRCSC, FACS 2012

Lista de Colaboradores Amy K. Alderman, MD, MPH,

Private Practice

Atlanta, GA, USA

Mohammed M. Al Kahtani, MD, FRCSC,

Clinical Fellow

Division of Plastic Surgery Department of Surgery University of Alberta Edmonton, AB, Canada

Louis C. Argenta, MD,

Professor of Plastic and Reconstructive Surgery

Department of Plastic Surgery Wake Forest Medical Center Winston Salem, NC, USA

Stephan Ariyan, MD, MBA,

Clinical Professor of Surgery Plastic Surgery Otolaryngology Yale University School of Medicine Associate Chief Department of Surgery Yale New Haven Hospital Director Yale Cancer Center Melanoma Program New Haven, CT, USA

Tomer Avraham, MD,

Resident, Plastic Surgery Institute of Reconstructive Plastic Surgery NYU Medical Center New York, NY, USA

A. Sina Bari, MD,

Chief Resident Division of Plastic and Reconstructive Surgery Stanford University Hospital and Clinics Stanford, CA, USA

Aaron Berger, MD, PhD,

Resident Division of Plastic Surgery, Department of Surgery Stanford University Medical Center Palo Alto, CA, USA

Kirsty U. Boyd, MD, FRCSC,

Clinical Fellow – Hand Surgery Department of Surgery – Division of Plastic Surgery Washington University School of Medicine St. Louis, MO, USA

Todd E. Burdette, MD,

Staff Plastic Surgeon

Concord Plastic Surgery Concord Hospital Medical Group Concord, NH, USA

Charles E. Butler, MD, FACS,

Professor, Department of Plastic Surgery The University of Texas MD Anderson Cancer Center Houston, TX, USA

Peter E.M. Butler, MD, FRCSI, FRCS, FRCS(Plast),

Consultant Plastic Surgeon

Honorary Senior Lecturer Royal Free Hospital London, UK

Yilin Cao, MD,

Director, Department of Plastic and Reconstructive Surgery Shanghai 9th People’s Hospital Vice-Dean Shanghai Jiao Tong University Medical School Shanghai, The People’s Republic of China

E. Dale Collins Vidal, MD, MS,

Chief

Section of Plastic Surgery Dartmouth-Hitchcock Medical Center Professor of Surgery Dartmouth Medical School Director of the Center for Informed Choice The Dartmouth Institute (TDI) for Health Policy and Clinical Practice Hanover, NH, USA

Erin Donaldson, MS,

Instructor

Department of Otolaryngology New York Medical College Valhalla, NY, USA

Elof Eriksson, MD, PhD,

Chief Department of Plastic Surgery Joseph E. Murray Professor of Plastic and Reconstructive Surgery Brigham and Women’s Hospital Boston, MA, USA

Arin K. Greene, MD, MMSc,

Associate Professor of Surgery

Department of Plastic and Oral Surgery Children’s Hospital Boston Harvard Medical School Boston, MA, USA

Geoffrey C. Gurtner, MD, FACS,

Professor and Associate Chairman

Stanford University Department of Surgery Stanford, CA, USA

Florian Hackl, MD,

Research Fellow Division of Plastic Surgery Brigham and Women’s Hospital Harvard Medical School Boston, MA, USA

Phillip C. Haeck, MD,

Private Practice

Seattle, WA, USA

Bruce Halperin, MD,

Adjunct Associate Clinical Professor of Anesthesia Department of Anesthesia Stanford University School of Medicine Palo Alto, CA, USA

Scott L. Hansen, MD, FACS,

Assistant Professor of Plastic and Reconstructive Surgery

Chief, Hand and Microvascular Surgery University of California, San Francisco Chief, Plastic and Reconstructive Surgery San Francisco General Hospital San Francisco, CA, USA

C. Scott Hultman, MD, MBA, FACS,

Ethel and James Valone Distinguished Professor of Surgery

Division of Plastic Surgery University of North Carolina Chapel Hill, NC, USA

Leila Jazayeri, MD,

Resident Stanford University Plastic and Reconstructive Surgery Stanford, CA, USA

Andreas Jokuszies, MD,

Consultant Plastic, Aesthetic and Hand Surgeon Department of Plastic, Hand and Reconstructive Surgery Hanover Medical School Hanover, Germany

Gabrielle M. Kane, MBBCh, EdD, FRCPC, Department of Radiation Oncology Associate Professor Department of Medical Education and Biomedical Informatics University of Washington School of Medicine Seattle, WA, USA

Lindsay B. Katona, BA, Thayer School of Engineering

Research Associate

Medical Director, Associate Professor

Dartmouth College Hanover, NH, USA

Carolyn L. Kerrigan, MD, MSc,

Professor of Surgery

Section of Plastic Surgery Dartmouth Hitchcock Medical Center Lebanon, NH, USA

Timothy W. King, MD, PhD, MSBE, FACS, FAAP,

Assistant Professor of Surgery and Pediatrics

Director of Research Division of Plastic Surgery, Department of Surgery University of Wisconsin School of Medicine and Public Health Madison, WI, USA

Brian M. Kinney, MD, FACS, MSME,

Clinical Assistant Professor of Plastic Surgery

University of Southern California School of Medicine Los Angeles, CA, USA

Elizabeth Kiwanuka, MD,

Division of Plastic Surgery

Brigham and Women’s Hospital Harvard Medical School Boston, MA, USA

Steven J. Kronowitz, MD, FACS,

Professor, Department of Plastic Surgery

MD Anderson Cancer Center The University of Texas Houston, TX, USA

Patrick Lang, MD,

Plastic Surgery Resident

University of California San Francisco, CA, USA

W. P. Andrew Lee, MD,

The Milton T. Edgerton, MD, Professor and Chairman Department of Plastic and Reconstructive Surgery Johns Hopkins University School of Medicine Baltimore, MD, USA

Valerie Lemaine, MD, MPH, FRCSC,

Assistant Professor of Plastic Surgery

Department of Surgery Division of Plastic Surgery Mayo Clinic Rochester, MN, USA

Benjamin Levi, MD,

Post Doctoral Research Fellow Division of Plastic and Reconstructive Surgery Stanford University Stanford, CA House Officer Division of Plastic and Reconstructive Surgery University of Michigan Ann Arbor, MI, USA

Wei Liu, MD, PhD,

Professor of Plastic Surgery Associate Director of National Tissue Engineering Research Center Department of Plastic and Reconstructive Surgery Shanghai 9th People’s Hospital Shanghai Jiao Tong University School of Medcine Shanghai, The People’s Republic of China

Sarah A. Long, BA,

Research Associate

Thayer School of Engineering Dartmouth College San Mateo, CA, USA

Michael T. Longaker, MD, MBA, FACS,

Deane P. and Louise Mitchell Professor and Vice Chair

Department of Surgery Stanford University Stanford, CA, USA

Peter Lorenz, MD,

Chief of Pediatric Plastic Surgery, Director Craniofacial Surgery Fellowship Department of Surgery, Division of Plastic Surgery Stanford University School of Medicine Stanford, CA, USA

Susan E. Mackinnon, MD,

Sydney M. Shoenberg, Jr. and Robert H. Shoenberg Professor Department of Surgery, Division of Plastic and Reconstructive Surgery Washington University School of Medicine St. Louis, MO, USA

Malcom W. Marks, MD,

Professor and Chairman Department of Plastic Surgery Wake Forest University School of Medicine Winston-Salem, NC, USA

David W. Mathes, MD,

Associate Professor of Surgery Department of Surgery, Division of Plastic and Reconstructive Surgery University of Washington School of Medicine Chief of Plastic Surgery Puget Sound Veterans Affairs Hospital Seattle, WA, USA

Evan Matros, MD,

Assistant Attending Surgeon Department of Surgery Memorial Sloan-Kettering Cancer Center Assistant Professor of Surgery (Plastic) Weill Cornell University Medical Center New York, NY, USA

Isabella C. Mazzola,

Milan, Italy

Riccardo F. Mazzola, MD,

Professor of Plastic Surgery Postgraduate School Plastic Surgery Maxillo-Facial and Otolaryngolog Department of Specialistic Surgical Science School of Medicine University of Milan Milan, Italy

Mary H. McGrath, MD, MPH,

Plastic Surgeon

Division of Plastic Surgery University of California San Francisco San Francisco, CA, USA

Babak J. Mehrara, MD, FACS,

Associate Member, Associate Professor of Surgery (Plastic)

Memorial Sloan-Kettering Cancer Center Weil Cornell University Medical Center New York, NY, USA

Ursula Mirastschijski, MD, PhD,

Assistant Professor Department of Plastic, Hand and Reconstructive Surgery, Burn Center Lower Saxony, Replantation Center Hannover Medical School Hannover, Germany

Steven F. Morris, MD, MSc, FRCS(C),

Professor of Surgery

Professor of Anatomy and Neurobiology Dalhousie University Halifax, NS, Canada

Wayne A. Morrison, MBBS, MD, FRACS,

Director

O’Brien Institute Professorial Fellow Department of Surgery St Vincent’s Hospital University of Melbourne Plastic Surgeon St Vincent’s Hospital Melbourne, Australia

Robyn Mosher, MS,

Medical Editor/Project Manager Thayer School of Engineering (contract) Dartmouth College Norwich, VT, USA

A. Aldo Mottura, MD, PhD, School of Medicine National University of Córdoba Cordoba, Argentina

Associate Professor of Surgery

John B. Mulliken, MD,

Director, Craniofacial Centre Department of Plastic and Oral Surgery Children’s Hospital Boston, MA, USA

Peter C. Neligan, MB, FRCS(I), FRCSC, FACS,

Professor of Surgery

Department of Surgery, Division of Plastic Surgery University of Washington Seattle, WA, USA

Daniel Nowinski, MD, PhD,

Director Department of Plastic and Maxillofacial Surgery Uppsala Craniofacial Center Uppsala University Hospital Uppsala, Sweden

Andrea J. O’Connor, BE(Hons), PhD,

Associate Professor of Chemical and Biomolecular Engineering

Department of Chemical and Biomolecular Engineering University of Melbourne Melbourne, VIC, Australia

Rei Ogawa, MD, PhD,

Associate Professor Department of Plastic Reconstructive and Aesthetic Surgery Nippon Medical School Tokyo, Japan

Dennis P. Orgill, MD, PhD,

Professor of Surgery Division of Plastic Surgery, Brigham and Women’s Hospital Harvard Medical School Boston, MA, USA

Cho Y. Pang, PhD,

Senior Scientist Research Institute The Hospital for Sick Children Professor Departments of Surgery/Physiology University of Toronto Toronto, ON, Canada

Giorgio Pietramaggiori, MD, PhD,

Plastic Surgery Resident

Department of Plastic and Reconstructive Surgery University Hospital of Lausanne Lausanne, Switzerland

Bohdan Pomahac, MD,

Assistant Professor

Harvard Medical School Director Plastic Surgery Transplantation Medical Director Burn Center Division of Plastic Surgery Brigham and Women’s Hospital Boston, MA, USA

Andrea L. Pusic, MD, MHS, FRCSC,

Associate Attending Surgeon

Department of Plastic and Reconstructive Memorial Sloan-Kettering Cancer Center New York, NY, USA

Russell R. Reid, MD, PhD,

Assistant Professor of Surgery, Bernard Sarnat Scholar Section of Plastic and Reconstructive Surgery University of Chicago Chicago, IL, USA

Neal R. Reisman, MD, JD,

Chief of Plastic Surgery, Clinical Professor Plastic Surgery

St. Luke’s Episcopal Hospital Baylor College of Medicine Houston, TX, USA

Joseph M. Rosen, MD,

Professor of Surgery Division of Plastic Surgery, Department of Surgery Dartmouth-Hitchcock Medical Center Lyme, NH, USA

Sashwati Roy, PhD,

Associate Professor of Surgery Department of Surgery The Ohio State University Medical Center Columbus, OH, USA

Hani Sbitany, MD,

Plastic and Reconstructive Surgery

Assistant Professor of Surgery University of California San Francisco, CA, USA

Saja S. Scherer-Pietramaggiori, MD,

Plastic Surgery Resident

Department of Plastic and Reconstructive Surgery University Hospital of Lausanne Lausanne, Switzerland

Iris A. Seitz, MD, PhD,

Director of Research and International Collaboration University Plastic Surgery Rosalind Franklin University Clinical Instructor of Surgery Chicago Medical School University Plastic Surgery, affiliated with Chicago Medical School, Rosalind Franklin University Morton Grove, IL, USA

Chandan K. Sen, PhD, FACSM, FACN,

Professor and Vice Chairman (Research) of Surgery

Department of Surgery The Ohio State University Medical Center Associate Dean Translational and Applied Research College of Medicine Executive Director OSU Comprehensive Wound Center Columbus, OH, USA

Subhro K. Sen, MD,

Clinical Assistant Professor Division of Plastic and Reconstructive Surgery Robert A. Chase Hand and Upper Limb Center, Stanford University Medical Center Palo Alto, CA, USA

Laurie A. Stevens, MD,

Associate Clinical Professor of Psychiatry Columbia University College of Physicians and Surgeons New York, NY, USA

Sherilyn Keng Lin Tay, MBChB, MRCS, MSc,

Microsurgical Fellow

Department of Plastic Surgery Chang Gung Memorial Hospital Taoyuan, Taiwan, The People’s Republic of China Specialist Registrar Department of Reconstructive and Plastic Surgery St George’s Hospital London, UK

G. Ian Taylor, AO, MBBS, MD, MD (HonBrodeaux), FRACS, FRCS (Eng), FRCS (Hon Edinburgh), FRCSI (Hon), FRSC (Hon Canada), FACS (Hon), Professor Deparment of Plastic Surgery Royal Melbourne Hospital Professor Department of Anatomy University of Melbourne Melbourne, Australia

Chad M. Teven, BS,

Research Associate Section of Plastic and Reconstructive Surgery University of Chicago Chicago, IL, USA

Peter M. Vogt, MD, PhD,

Professor and Chairman Department of Plastic Hand and Reconstructive Surgery Hannover Medical School Hannover, Germany

Derrick C. Wan, MD, Department of Surgery

Assistant Professor

Stanford University School of Medicine Stanford, CA, USA

Renata V. Weber, MD,

Assistant Professor Surgery (Plastics) Division of Plastic and Reconstructive Surgery Albert Einstein College of Medicine Bronx, NY, USA

Gordon H. Wilkes, MD,

Clinical Professor and Divisional Director Division of Plastic Surgery University of Alberta Faculty of Medicine Alberta, AB, Canada

Johan F. Wolfaardt, BDS, MDent (Prosthodontics), PhD, Division of Otolaryngology-Head and Neck Surgery Department of Surgery Faculty of Medicine and Dentistry Director of Clinics and International Relations Institute for Reconstructive Sciences in Medicine University of Alberta Covenant Health Group Alberta Health Services Alberta, AB, Canada

Victor W. Wong, MD,

Postdoctoral Research Fellow

Department of Surgery Stanford University Stanford, CA, USA

David M. Young, MD, Department of Surgery University of California San Francisco, CA, USA

Professor of Plastic Surgery

Professor

Agradecimentos Editar um livro como este é um trabalho estimulante, se não intimidador. Somente no final do projeto, mais de quatro anos depois, demo-nos conta do esforço e de quantas pessoas ajudaram em sua realização. Sue Hodgson, nossa editora de comissionamento, confiou-me essa tarefa. Juntos, durante vários fins de semana em Seattle, e por meio de inúmeros e-mails e telefonemas, planejamos o formato desta edição e lançamos as bases para uma reunião de planejamento em Chicago, que incluiu os editores de volume e a equipe da Elsevier com a qual trabalhamos. Agradeço aos Drs. Gurtner, Warren, Rodriguez, Losee, Song, Grotting e Van Beek porterem garantido, incansavelmente, a máxima qualidade de cada volume. Lembro-me das conversas telefônicas semanais com a equipe da Elsevier, bem como das muitas visitas aos escritórios de Londres. Sentirei falta de trabalhar com todos. Louise Cook, Alexandra Mortimer e Poppy Garraway foram profissionais completas e, acima de tudo, ótimas companhias de trabalho. Emma Cole e Sam Crowe ajudaram imensamente com o conteúdo dos vídeos. Infelizmente, Sue Hodgson deixou a Elsevier; no entanto, Belinda Kuhn assumiu habilmente o cargo e garantiu que mantivéssemos o nosso cronograma, que não perdêssemos a nossa dinâmica e que o produto final fosse algo de que pudéssemos nos orgulhar. Muitos residentes nos ajudaram, em grupos de discussão, a definir o formato e o estilo do livro, e também se engajaram no processo de edição. Agradeço a Darren Smith e a Colin Woon pela ajuda como revisores técnicos. Obrigado a James Saunders e a Leigh Jansen por revisarem o conteúdo dos vídeos e também a Donnie Buck por toda sua ajuda com o conteúdo eletrônico. Obviamente, editamos o livro; não o escrevemos. Os escritores foram os nossos autores colaboradores, os quais se envolveram com grande entusiasmo. Agradeço-lhes por definirem o termo “cirurgia plástica”, o livro e a especialidade. Além disso, gostaria de agradecer aos meus residentes e companheiros, que me desafiam e fazem do trabalho uma diversão. Meus colegas da Division of Plastic Surgery, na University of Washington, sob a liderança de Nick Vedder, são uma constante fonte de apoio e encorajamento; sou muito grato a eles. Por fim, minha família, Kate, David, e, sobretudo, minha esposa Gabrielle, inabaláveis no seu amor e apoio; nunca serei capaz de agradecer-lhes o suficiente. Peter C. Neligan, MB, FRCS(I), FRCSC, FACS 2012 Gostaria de agradecer à minha esposa Kathryn por seu infalível bom humor e apoio durante as noites e finais de semana em que trabalhei neste volume. Também gostaria de agradecer aos meus filhos Cole, Pierce e Jack, pela ilimitada curiosidade e energia, que desafiam continuamente minha visão do mundo. Sou grato à minha assistente, Aretha Whitmore, pela habilidade em me ajudar a lidar com tantas coisas. E preciso agradecer à equipe da Elsevier, especialmente Poppy Garraway, pelo modo especial que ela tinha de nunca deixar que nada ficasse atrasado. Geoffrey C. Gurtner, MD, FACS 2012

Dedicatória Dedicado à memória de Stephen J. Mathes

V O L UM E 1

Princípios ESB OÇ O Capítulo 1: Cirurgia plástica e inovação na medicina Capítulo 2: História da cirurgia reconstrutiva e estética Capítulo 3: Aspectos psicológicos da cirurgia plástica Capítulo 4: O papel da ética na cirurgia plástica Capítulo 5: Princípios de negócios para cirurgiões plásticos Capítulo 6: Aspectos médico-legais na cirurgia plástica Capítulo 7: Fotografia na cirurgia plástica Capítulo 8: Segurança do paciente na cirurgia plástica Capítulo 9: Anestesia local em cirurgia plástica Capítulo 10: Medicina baseada em evidências e pesquisa em cirurgia plástica nas organizações de saúde Capítulo 11: Genética e diagnóstico pré-natal Capítulo 12: Princípios do tratamento de câncer Capítulo 13: Células-tronco e medicina regenerativa Capítulo 14: Cicatrização de feridas Capítulo 15: Cicatrização de feridas cutâneas: biologia do reparo, ferida e tratamento da cicatriz Capítulo 16: Prevenção de cicatriz, tratamento e correção Capítulo 17: Enxerto de pele Capítulo 18: Enxerto de tecidos, reparação de tecidos e regeneração Capítulo 19: Engenharia de tecidos Capítulo 20: Reparação, enxertia e engenharia de cartilagem Capítulo 21: Reparação e enxerto ósseo Capítulo 22: Reparo e enxerto do nervo periférico Capítulo 23: Os territórios vasculares Capítulo 24: Classificação de retalhos e aplicações Capítulo 25: Fisiopatologia e farmacologia do retalho Capítulo 26: Princípios e técnicas da cirurgia microvascular Capítulo 27: Princípios e aplicações da expansão de tecido Capítulo 28: Radiação terapêutica: princípios, efeitos e complicações Capítulo 29: Anomalias vasculares Capítulo 30: Tumores não melanocíticos benignos e malignos da pele e de partes moles Capítulo 31: Melanoma Capítulo 32: Implantes e biomateriais Capítulo 33: Próteses faciais em cirurgia plástica

Capítulo 34: Transplante em cirurgia plástica Capítulo 35: Inovação tecnológica em cirurgia plástica: um guia prático para o cirurgião inovador Capítulo 36: Robótica, simulação e telemedicina na cirurgia plástica

1

Cirurgia plástica e inovação na medicina Peter C. Neligan

Resumo Existe uma grande diferença entre pesquisa e inovação, apesar de as duas geralmente estarem interrelacionadas. A maioria dos avanços na cirurgia advém da inovação, em vez da pesquisa básica. A inovação cirúrgica é uma das principais características definidoras da cirurgia plástica. A inovação cirúrgica torna-se segura pelos princípios definidores. Um conhecimento detalhado da anatomia é um fator principal sobre o qual esses princípios se baseiam. Um equilíbrio entre o pensamento fora da caixa e a deliberação conservadora é o meio perfeito para efetuar mudança ainda que se mantenha a perspectiva.

Introdução Geralmente, dizemos aos nossos alunos que o principal atrativo da cirurgia plástica é que, na realidade, somos os últimos cirurgiões gerais. Não somos confinados a uma área corporal ou ligados a uma doença, ao contrário de quase todas as outras especialidades médicas. Similarmente, apesar de existirem algumas cirurgias que são razoavelmente padronizadas, a cirurgia plástica é a única especialidade na qual existem mais exceções do que regras. Geralmente, fazemos cirurgias que nunca foram feitas antes e é provável que, nunca mais faremos exatamente da mesma forma de novo. Quase sempre completamos elementos da cirurgia antes, ou podemos acrescentar elementos de outra esfera da cirurgia para criar uma nova abordagem para um problema. Algumas vezes, isto ocorre pela necessidade, o desafio de solucionar um problema em especial para o qual não existe padrão ou uma solução bem aceita. Algumas vezes, ela nasce pelo desejo de fazer algo melhor, para resolver um problema de um modo melhor do que os meios aceitos para lidar com ele. Pessoas leigas geralmente ficam chocadas ou estarrecidas quando ouvem o que digo. Para os não iniciados pode parecer improviso, quase um perigo. Entretanto, estas inovações se baseiam em princípios que aprendemos em nosso treinamento e aplicamos na nossa prática. Esta é a mágica da cirurgia plástica. É claro que este tipo de inovação cirúrgica desperta discussões éticas e é algo com o que muitas instituições debatem, não meramente no domínio da cirurgia plástica, mas no campo da cirurgia em geral. Muitas instituições ainda possuem processos e protocolos em vez de supervisionar e regular a inovação.1 Quando a inovação em cirurgia é ética e quando não é? Este assunto já foi a fonte de muita discussão na literatura médica.2-4 Qual é o limite? Esta discussão em particular está além dos objetivos deste capítulo. É suficiente dizer que é importante buscar um equilíbrio entre a supervisão necessária das pesquisas práticas e um ambiente de apoio onde a pesquisa possa florescer.

Inovação e pesquisa Qual é a diferença entre inovação e pesquisa? A Wikipédia (http://en.wikipedia.org/wiki/Research) define pesquisa da seguinte forma: “Pesquisa pode ser definida como a busca pelo conhecimento ou qualquer investigação sistemática para estabelecer fatos.” Aqui (http://en.wikipedia/wiki/Innovation) também encontramos a definição para inovação: “Inovação é uma mudança no processo de raciocínio para fazer algo ou

‘algo novo’ que se torna útil.”5 Pode-se referir a uma mudança emergente incremental ou uma mudança radical e revolucionária no pensamento, produtos, processos ou organizações. A inovação pode surgir da pesquisa, mas não está necessariamente ligada a ela. Isto é verdadeiro em outros campos. Por exemplo, inovações na indústria da computação geralmente são mudanças simples, introduzidas para facilitar uma tarefa que, algumas vezes, mudam completamente como as coisas são feitas. A maioria das inovações cirúrgicas que observamos não é resultado da pesquisa. De fato, não raramente, uma inovação subsequentemente é sujeita a um estudo mais rigoroso. Um cirurgião pode projetar uma nova cirurgia ou, por exemplo, um novo retalho. Isto pode ser uma variação de um procedimento antigo ou, algumas vezes, algo completamente novo. Como já mencionamos, pode ser algo que o cirurgião foi forçado a fazer devido às circunstâncias do caso. Pode não haver outro modo de resolver o problema. Quando funciona, o cirurgião decide criar um estudo para explicar porque o procedimento funcionou ou para descrever o suprimento sanguíneo para o retalho. Apesar de podermos ser questionados que este não é o modo ideal de fazer as coisas, isto certamente acontece6,7 e é meramente uma reflexão da natureza dinâmica da inovação cirúrgica. A inovação pode ser planejada ou, no caso deste exemplo provavelmente ocorre de modo mais frequente, acontece no próprio ato cirúrgico. A pesquisa pode ser inovadora. Um pesquisador pode criar um novo experimento para testar uma teoria, uma abordagem para o problema que ainda não foi explorada. Isto também é uma inovação e é o modo de ligação mais comum entre a pesquisa e a inovação. Uma ideia inovadora está sujeita ao método científico que a pesquisa demanda. O que faz uma inovação? É dito que as características que a maioria dos inovadores tem em comum incluem: (1) a capacidade de reconhecer uma ideia; (2) persistência no desenvolvimento da estratégia; e (3) compromisso com o projeto e o término de uma resposta ao problema ou problemas em questão.8

Inovação e cirurgia plástica A história da cirurgia plástica, pelo menos a história da cirurgia plástica moderna, é de desenvolvimento constante. Regularmente pensamos em novos modos de lidar com um problema em particular. Desenvolvemos uma técnica, aperfeiçoamos esta técnica e depois divulgamos para outros grupos ou desistimos. Existem vários exemplos do descrito acima, da cirurgia para a fenda palatina até a microcirurgia, da cirurgia de mão até a cirurgia craniofacial. Apesar de muitos poderem entender esta característica como um grande problema, devemos questionar se esta não é a energia vital da cirurgia plástica. Estamos constantemente desenvolvendo novas soluções para diversos problemas. Alguns destes problemas são gerados de nossa própria prática; alguns são oriundos de nossa interação com outras especialidades. Desenvolvemos soluções e frequentemente permitimos que outras especialidades utilizem nossas inovações enquanto partimos para outros desafios. A facilidade de adaptação é importante em todas as esferas. Por exemplo, esta capacidade de se adaptar, de mudar e incorporar novas ideias é o que tornou o inglês uma linguagem tão dominante. Este é o motivo pelo qual a Apple Computers se tornou a indústria líder. Esta é a essência da inovação. Existem diversos exemplos na biologia que destacam como a força da adaptação é a força para a sobrevivência. Para a cirurgia plástica isto também é verdadeiro e, apesar de alguns temerem a morte da especialidade, consideramos que, enquanto nos adaptamos e desenvolvemos, sempre haverá um lugar para a cirurgia plástica.

Alotransplante de tecido composto Na pesquisa, trabalhamos com modelos – modelos de doença, modelos de um procedimento. Modelos animais fornecem meios pelos quais podemos estudar o processo que estamos interessados de utilizar em nossos pacientes. Ocasionalmente, de modo a resolver um problema, trabalhamos com modelos que talvez sejam menos relevantes para nossa prática clínica do dia a dia. Por exemplo, a maioria das pessoas não sabe que o primeiro transplante de rim foi realizado pelo Dr. Joseph Murray, um cirurgião plástico no Peter Bent Brigham Hospital em Boston9 (Fig. 1.1). As pessoas geralmente ficam intrigadas com esta informação. O que um cirurgião fazia em um transplante de rins? Como pode ser verdade? Sua prática como cirurgião plástico levantou questionamentos em sua mente sobre os transplantes. Sua experiência no tratamento de pacientes queimados desde a Segunda Guerra Mundial deu a ele uma ampla exposição aos enxertos de pele, e despertou questionamentos sobre a rejeição imune que ele depois encontrou modos de evitar. Na tentativa de avaliar a imunologia dos enxertos de pele ele se concentrou em um modelo de órgão único, o rim, de modo a responder a questão que ele originalmente concebeu. Isto culminou no primeiro transplante de rim bem-sucedido realizado entre dois gêmeos pelo Dr. Murray no Peter Bent Brigham Hospital em Boston, 1954. Ajudando a

desenvolver a especialidade dos transplantes, realizou o primeiro aloenxerto bem-sucedido do mundo em 1959 e o primeiro transplante renal cadavérico em 1962. No final, o Dr. Murray retornou às suas raízes, a prática da cirurgia plástica, recebendo o prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina, em 1990, pela sua contribuição para a ciência dos transplantes.

FIG. 1.1 Joseph Murray. (Cortesia da National Kidney Foundation.)

Agora a roda deu uma volta completa, e a cirurgia plástica está novamente na vanguarda da inovação entre os transplantes (Cap. 34). Os transplantes de mão e de face se tornaram realidade e, apesar de não ser a linha principal da prática, é provável que o alotransplante de tecido composto (ATC) se torne mais comum no futuro próximo. De fato, mesmo agora, alguns podem considerar que o transplante de mão é o padrão do tratamento (Volume 6, Cap. 38). O transplante de face certamente evoluirá (Volume 3, Cap. 20). Além disto, é provável que o ATC venha a resolver os problemas das reconstruções que não podemos realizar com as técnicas reconstrutivas convencionais. Estas incluiriam os transplantes de pálpebras, nariz, orelhas, língua e outros órgãos especializados. Apesar da reconstrução nasal total, tomada como exemplo, ter obtido um alto nível de sofisticação, a verdade é que as elegantes reconstruções nasais são executadas somente por um pequeno número de especialistas que utilizam técnicas muito complexas em uma série de cirurgias realizadas em períodos de meses ou anos. O conceito de um cirurgião ser capaz de transplantar um nariz em um único estágio e obter um resultado elegante é muito atraente. Obviamente, muitos obstáculos ainda permanecem antes que possamos ver este avanço na prática. O ATC é um exemplo perfeito de como uma técnica inovadora gera o avanço na atividade de pesquisa. A barreira para o transplante bem-sucedido não técnico é imunológico e o interesse atual no ATC desencadeou uma nova onda da atividade de pesquisas no campo da imunologia. Isto demanda uma abordagem colaborativa e multidisciplinar, algo que, novamente, os cirurgiões plásticos fazem muito bem.

Colaboração Os cirurgiões plásticos não podem-se considerar os únicos inovadores na medicina. A medicina está repleta de inovadores. Apesar disto, é verdade que a natureza do trabalho do cirurgião plástico, mais do que em outras especialidades, demanda inovação. É o que a maioria dos cirurgiões plásticos faz todos os dias da semana. Como grande parte de nosso trabalho, particularmente na cirurgia reconstrutiva, ocorre em colaboração com outras especialidades, as inovações nestas áreas da prática geralmente trazem inovações para o nosso campo. A maioria das inovações que observamos é incremental. Um cirurgião progressivamente muda o modo de sua prática ou como pratica uma cirurgia. A inovação é radical. O desenvolvimento da cirurgia craniofacial é um

exemplo da inovação radical. Paul Tessier (Fig. 1.2) foi o primeiro a descrever uma abordagem intra e extracraniana combinada para a correção do hipertelorismo,10,11 quebrando o tabu prévio de expor o ambiente intracraniano ao trato aerodigestivo superior. Nadar contra a corrente de pensamento cirúrgico demanda uma coragem inimaginável. Dr. Tessier teve a coragem de impor suas convicções levando a prática para além do nível de conforto geral. Além de desenvolver a especialidade da cirurgia craniofacial, os avanços do Dr. Tessier levaram a avanços nos campos relacionados. Um destes exemplos é a cirurgia na base do crânio. Os princípios craniofaciais desenvolvidos pelo Dr. Tessier literalmente abriram o campo da cirurgia na base do crânio. Os tumores que previamente eram considerados inoperáveis e inacessíveis se tornaram tratáveis. Este progresso levou a outras inovações. Desta forma, continuando com o exemplo da cirurgia na base do crânio, as ressecções e abordagens radicais que foram desenvolvidas nas décadas de 1970 e 198012,13 criaram problemas como meningites e abscessos cerebrais e problemas relacionados com o retardo na cicatrização das feridas. Defeitos menores podiam ser fechados com retalhos locais como retalhos pericranianos ou de gálea frontal.14 Entretanto, os defeitos maiores permaneceram como problemas até que os retalhos livres começaram a ser utilizados para fechar estes defeitos.15,16 A seguir, a incidência de todas estas complicações, os abscessos cerebrais, a meningite e os problemas relacionados com a cicatrização das feridas reduziram dramaticamente, e a cirurgia se tornou mais segura. Desta forma, a cirurgia microvascular tornou a cirurgia para a retirada de tumores na base do crânio mais segura.

FIG. 1.2 Paul Tesster. (Cortesia de Barry M. Jones.)

Mais recentemente, neste campo, observamos inovações nas abordagens cirúrgicas para a base do crânio que facilitaram o desenvolvimento da cirurgia endoscópica. Grandes ressecções se tornaram possíveis através de uma abordagem endoscópica. Este desenvolvimento gerou um grande impacto nestes pacientes porque as extensas abordagens abertas com os riscos associados da formação de cicatrizes hipertróficas e deformidades não são mais necessárias. Entretanto, com estas grandes ressecções endoscópicas, estamos observando um ressurgimento de problemas como meningite e abscessos devido à dificuldade de reconstrução dos defeitos por via endoscópica.17 Isto levou ao desenvolvimento de novas técnicas e abordagens reconstrutivas de modo a tratar estas complicações.18-20 Este é um excelente exemplo de como uma abordagem multidisciplinar pode avançar em um campo. Uma

inovação em uma área pode criar um problema em outra, que força uma nova inovação. O progresso na cirurgia, a despeito da especialidade, demanda um equilíbrio entre inovadores e conservadores. Os inovadores estendem os limites e trabalham melhor quando pareados com conservadores que controlam seus avanços. Assim, um equilíbrio entre o pensamento fora da caixa e a deliberação conservadora é o meio perfeito para que se efetue uma mudança, e ainda manter a perspectiva.

Efetuadores da inovação A inovação também é forçada nos tempos de agitações e mudanças. Os exemplos clássicos são as guerras e os desastres naturais. A maioria dos avanços cirúrgicos é feita nos tempos de guerra e não em tempos de paz. Isto ocorre porque problemas específicos são observados em números sem precedentes e demandam uma solução. Neste tipo de ambiente, passa a ser razoável romper as regras. Temos de lidar com isso. Desta necessidade surge uma mudança na prática. A maioria dos avanços no modo que tratamos pequenos traumas surgiu nas arenas de guerra. As unidades MASH do conflito da Coreia nos ensinaram que o início precoce do tratamento, no campo de batalha, salva vidas. O último progresso deste conceito foi o desenvolvimento da cirurgia robótica, que traz o nível mais alto da experiência para o campo, de modo que uma intervenção de alto nível pode ser realizada precocemente. Esta intervenção pode ser realizada com o uso da tecnologia robótica possibilitando que um cirurgião altamente habilitado, localizado em um centro especializado, trate de várias lesões em diversos locais diferentes do mundo. Os tipos de lesões vistos nas guerras também levaram a mudanças na prática. A cirurgia plástica, como é conhecida nos dias de hoje, nasceu durante a Primeira Guerra Mundial. Sir Harold Gillies (Fig. 1.3) desenvolveu as técnicas para a reconstrução facial inicialmente em Aldershot e depois no Queen’s Hospital em Sidcup, Kent, Reino Unido. (Mais tarde este local se tornou o Queen Mary’s Hospital.) Suas soluções inovadoras, para algumas das lesões que vimos, levaram ao desenvolvimento da cirurgia plástica moderna.

FIG. 1.3 Harold Gillies.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a Unidade de Cirurgia Plástica no Queen Victoria Hospital em East Grinstead, Reino Unido, liderada por Sir Archibald Mc’Indoe (primo de Gillies) (Fig. 1.4), se tornou famosa no tratamento de aeronautas severamente queimados. Esta cirurgia era tão experimental que os pacientes de Mc’Indoe formaram um clube conhecido como o “clube das cobaias”. Inicialmente, este clube foi criado como um local para se beber e seus membros eram de aeronautas lesionados no hospital, bem como os cirurgiões e anestesistas que os tratavam. Os pacientes tinham de ter tido no mínimo 10 procedimentos cirúrgicos antes de

serem admitidos no clube. Ao final da guerra, o clube tinha 649 membros. O clube propriamente dito foi socialmente inovador porque Mc’Indoe o criou como um modo de interagir os homens lesionados com a sociedade, convencendo algumas das famílias locais, em East Grinstead, a aceitar seus pacientes como convidados e outros residentes a tratá-los o mais normalmente possível. O processo foi tão bem-sucedido que East Grinstead se tornou a “cidade que não tem preconceito”.

FIG. 1.4 Archibald McIndoe. (Cortesia de Blond McIndoe Research Foundation; número de registro da doação: 1106240.)

Inovação e desenvolvimento em outras esferas também mudaram a face da cirurgia plástica e trouxeram maiores desafios reconstrutivos para os cirurgiões. Por exemplo, o desenvolvimento de coletes a prova de bala levou a um aumento das lesões observadas em áreas não protegidas como os membros, cabeça e pescoço. Isto não quer dizer que estas lesões não ocorriam antes. Simplesmente quer dizer que antes dos militares possuírem coletes efetivos, os soldados morriam em decorrência de suas lesões e não tinham de lidar com as devastadoras lesões faciais ou nas extremidades. As amputações dos membros eram surpreendentemente comuns. Nos EUA, estima-se que existiam 10.000 novas amputações de membros superiores a cada ano. Isso levou ao desenvolvimento de próteses inovadoras, bem como técnicas avançadas para o acionamento destas próteses. O uso da tecnologia mioelétrica levou a inovações na abordagem cirúrgica para as amputações e cotos de amputação.21,22 É provável que o ATC venha a mudar o panorama reconstrutivo para estas lesões devastadoras.

Princípios da inovação Mencionei que as inovações se baseiam nos princípios. O que são estes princípios e sobre o que eles se baseiam? Obviamente os princípios específicos dependerão da área sob estudo. Os princípios sobre os quais a inovação se baseia serão diferentes para os cirurgiões plásticos quando comparados com os cirurgiões gerais, por exemplo. Consciente de todos estes exemplos e o que considero o núcleo da cirurgia plástica é um detalhado conhecimento da anatomia. Como uma especialidade e em geral, os cirurgiões plásticos possuem um conhecimento mais detalhado da anatomia do que qualquer outro especialista. Obviamente, um cirurgião cardíaco conhece o coração melhor do que ninguém, e o ortopedista conhece os ossos melhor do que outro profissional, mas nenhum desses especialistas provavelmente atuará no domínio do outro. Além disso, o cirurgião plástico é frequentemente chamado para cobrir fraturas expostas ou para fornecer uma cobertura vascularizada para uma ferida infectada de esternotomia. Nenhuma dessas tarefas é possível sem um conhecimento detalhado da anatomia da região. A despeito da área de subespecialidade da prática, seja uma cirurgia estética ou cirurgia de mão, um conhecimento detalhado da anatomia é o ponto mais importante para

que o trabalho seja bem feito. Para detalhar e definir o único elemento do conhecimento anatômico que é mais vital a nós, a resposta seria a anatomia vascular. Grande parte do que fazemos envolve o rearranjo de tecidos, seja local, regionalmente ou a distância. Temos de saber o que mantém este tecido vivo e preservar este elemento. É interessante olhar para os avanços que foram feitos na cirurgia plástica nos últimos 50 anos. Muitos deles estão diretamente relacionados com um melhor conhecimento da anatomia vascular. O mais tangível deles é o desenvolvimento da cirurgia dos retalhos. Viemos de uma época em que todos os retalhos eram considerados aleatórios (ao acaso), mas, atualmente, sabemos não só que o vaso sanguíneo supre nosso retalho, mas também o grau de perfusão tecidual fornecida por aquele vaso sanguíneo. Inovações na tecnologia das imagens nos dão o luxo de mapear a anatomia vascular para nossa reconstrução planejada, utilizando a tomografia computadorizada e/ou ressonância magnética.23-25 Ainda melhor, temos um GPS cirúrgico que permite que visualizemos a perfusão em tempo real utilizando o corante verde de indocianina.26 Avanços técnicos nos permitem transferir o tecido e realizar uma anastomose microvascular para restaurar seu suprimento sanguíneo. Entretanto, vamos além disso. Também restauramos a função, algumas vezes utilizando técnicas microcirúrgicas, outras vezes, nosso conhecimento da anatomia, “despindo um santo para vestir outro”. As transferências de tendão, por exemplo, durante muito tempo foram uma tecnologia restauradora para um membro comprometido.27-29 Mais recentemente, as transferências nervosas têm sido utilizadas e estão se mostrando um acréscimo valioso no nosso armamentário da reconstrução.29 Estes são exemplos de inovação, descrevendo uma nova solução para um problema até então insolúvel. Também combinamos nosso conhecimento da anatomia vascular com nosso conhecimento da engenharia genética. A ciência da genética é tratada no Capítulo 11 deste volume. Utilizando a engenharia genética podemos programar células para realizar certas tarefas. Podemos suprimir certas funções e estimular outras: em outras palavras, podemos manipular células. Esta é uma ciência muito poderosa e tem aplicações potenciais em todas as áreas da medicina. O processo da transinfecção (eu traduziria “O processo da engenharia genética”), onde o DNA ou RNA é introduzido nas células para modificar a expressão celular, é amplamente utilizado na pesquisa molecular. Geoff Gurtner, editor deste volume de Cirurgia Plástica, nos introduziu ao conceito da “braquiterapia biológica”.30 Utilizando técnicas da transinfecção viral. Ele foi capaz de criar retalhos que não somente fecham um defeito cirúrgico, mas também introduzem um elemento terapêutico para a reconstrução, fazendo com que o retalho produza peptídeos apropriados para a entidade patológica que está sendo tratada, produzindo probióticos para feridas infectadas, ou peptídeos antiangiogênicos para as reconstruções oncológicas. Esta abordagem inovadora combina o melhor da cirurgia plástica com o melhor da engenharia genética para fornecer uma solução nova e eficaz para um problema clínico existente. A braquiterapia biológica representa a fusão do conhecimento anatômico com os princípios da engenharia de tecidos e é um desenvolvimento muito estimulante. O conceito da pré-fabricação do retalho é outra forma criativa de gerar uma melhor solução para um problema clínico.31 Utilizando estas técnicas, a reconstrução mais apropriada pode ser montada antes da reconstrução definitiva. Apesar de a pré-fabricação de um retalho ser uma abordagem elegante para um problema complexo, ela demanda um alto nível de especialização, imaginação e uma visão inovadora. Ela também demanda múltiplos estágios e um maior tempo para completar a reconstrução. Em alguns estados patológicos, esta demora pode não ser possível. A engenharia das partes corporais nos introduz ao conceito da cirurgia de “partes-estepe” e é outro tipo de abordagem que está em desenvolvimento. Wayne Morrison, trabalhando no Bernard O’Brien Institute, em Melbourne, Austrália, foi capaz de cultivar músculo cardíaco funcionante32 bem como células de ilhotas pancreáticas funcionantes.33 A cirurgia das partes estepe, apesar de ainda não ser uma realidade, não é mais um tópico da ficção científica. O conceito de fabricar novas estruturas teciduais não é novo e é a base, por exemplo, da destração óssea e expansão de tecidos. A expansão de tecidos é utilizada desde a década de 1980. De fato, como muitas coisas na medicina, ela foi descrita originalmente muito tempo antes de começar a ser utilizada,34 mas foi popularizada somente nesta época.35 Esta se tornou uma das formas padrão de reconstruir uma mama após mastectomia e, é claro, possui diversos outros usos. Quando inicialmente lançada por Radovan, foi recebida com grande grau de ceticismo, como muitas inovações. Infelizmente, Radovan não viveu para ver sua ideia se tornar amplamente aceita. A inovação também envolve a aplicação de técnicas estabelecidas em novas áreas. A destração (distração) óssea é um destes exemplos. Criada por Ilizarov para o tratamento dos ossos longos, a técnica foi adaptada para o esqueleto craniofacial. As aplicações da destração óssea na cirurgia plástica são mais recentes. Popularizada

por McCarthy,36 a destração óssea mudou a prática da cirurgia craniofacial, minimizando a extensão da cirurgia necessária para tratar certas condições e, ao mesmo tempo, melhorando os resultados. Estes desenvolvimentos ocorrem a todo o momento e, algumas vezes, há uma desconexão entre o desenvolvimento da ideia original e sua aplicação final. Um exemplo é o sutiã Brava. Ele inicialmente foi desenvolvido como um modo de obter aumento das mamas por meios não cirúrgicos.37 A aplicação de vácuo sobre uma mama causava edema e dilatação. Esta dilatação era transitória, porém, era uma dilatação. Várias outras inovações levaram a uma nova forma de utilizar o sistema Brava e, no final, levava a uma abordagem bastante inovadora para a reconstrução da mama que ainda está no estágio inicial do ceticismo, mas que pode-se tornar uma técnica estabelecida. Esta associação de ideias é como a inovação funciona geralmente. O que foi diferente nestas ideias? Cada uma delas representa uma grande inovação. A primeira inovação é a enxertia de tecido adiposo (pode ser lipoenxertia). Esta é uma ideia antiga e uma ideia que possui uma história conturbada. Os enxertos de tecido adiposo (pode ser chamado também de enxerto dermogorduroso) dérmico há muito tempo são um método aceito para a correção de pequenos defeitos do contorno. Tentativas de enxertia de grandes depósitos de gordura geralmente foram malsucedidas. O conceito da injeção de gordura como um modo de enxertia de tecido adiposo é outra ideia que era recebida com ceticismo até Coleman demonstrar que a técnica funciona quando a gordura é depositada em pequenas alíquotas com o uso de uma fina cânula.38-40 No momento, esta técnica é amplamente utilizada tanto nas arenas estéticas como nas reconstrutivas, tornando-se um aditivo valioso no nosso armamentário. A segunda inovação é a expansão de tecidos, já mencionada anteriormente. Apesar de a expansão de tecidos ser um conceito conhecido há algum tempo, nós a considerávamos em termos de expansão interna, ou seja, expansão produzida pela implantação de um instrumento expansor. O sistema de sucção utilizado pelo sutiã Brava nos traz o conceito da expansão externa, isto é, a expansão causada por forças externas, a aplicação de um vácuo sobre a pele. A terceira inovação é a do fechamento assistido a vácuo, o sistema VAC. Esta é uma ideia tão simples que tudo o que queríamos era ter pensado nela antes. Entretanto, como em muitas coisas simples na medicina, não é tão simples quanto parece. Não somente, parece que o VAC remove mecanicamente detritos e exsudato da ferida, mas também promove a angiogênese e proliferação celular.41-43 Reunindo todos esses conceitos, Khouri e Del Vecchio44 desenvolveram um sistema tanto para reconstrução de mama como para o aumento das mamas. O sistema Brava, junto com o conceito de enxertia estrutural de tecido adiposo, é utilizado na crença de que a expansão externa induzida pelo vácuo Brava produz edema, angiogênese e proliferação celular, permitindo que grandes volumes de tecido adiposo sejam depositados em uma matriz favorável, aumentando a viabilidade do enxerto e a retenção da gordura. Até o momento, os resultados dessa abordagem são notáveis. Apesar de haver várias perguntas ainda não respondidas sobre esse sistema, ele é um exemplo de inovação que já encontrou aplicação clínica, mas que necessita de extensas pesquisas para elucidar o mecanismo do quadro clínico que estamos vendo. A enxertia de tecido adiposo, além de ser uma solução clínica para vários problemas, tanto estéticos como reconstrutivos, também desperta nossa curiosidade em outra área, a da pesquisa de células-tronco. Isto novamente representa uma associação de ideias de campos distintos. Muitas das alterações que vemos como resultado da enxertia de tecido adiposo não são prontamente explicadas somente pela injeção de gordura. Um exemplo, foi publicado que muitas das alterações da pele associadas à radiação parecem ser revertidas quando tecido adiposo é injetado, por exemplo, em um defeito de mama resultante de lumpectomia e irradiação.45 Por que isso acontece? A resposta, células-tronco, pode ser uma solução simplista para explicar algo que não compreendemos. A resposta também pode ser nossa introdução para uma área totalmente nova de desenvolvimento para a cirurgia plástica. É claro, como já vimos antes, não somente esta inovação (enxertia de tecido adiposo) resolve um problema clínico, mas também levanta vários questionamentos e abre a porta para novas áreas de pesquisa e muito provavelmente para inovações ainda mais novas.

Influências externas e inovação De modo a obter alguns de nossos resultados cirúrgicos não nos baseamos na nossa prática como cirurgiões; também nos baseamos em nossas ferramentas, nossos instrumentos e equipamentos. A microcirurgia não teria se desenvolvido sem o avanço nos microscópios cirúrgicos e na instrumentação apropriada. Uma das maiores barreiras para a microcirurgia moderna foi à incapacidade de forjar um fio de sutura ultrafino em uma agulha suficientemente pequena. Similarmente, a manufatura de implantes de qualquer tipo demanda uma

experiência que nós, como cirurgiões, não a temos. Bioengenheiros, químicos, físicos e todo o tipo de especialistas são necessários para levar nossas ideias até a prática. Nenhum destes desenvolvimentos é possível sem a colaboração da indústria. É claro que esta é uma espada de duplo fio já que introduz outros interesses e possíveis conflitos. Porém, é uma parte vital do desenvolvimento de qualquer especialidade. Já mencionamos como o avanço da microssutura levou ao desenvolvimento da microcirurgia reconstrutiva. Assim que se tornou possível fazer microanastomoses, foi facilitado o reimplante de dedos amputados. A nova tecnologia alavancou o avanço da cirurgia dos retalhos e nosso interesse na anatomia vascular foi renovado. Isto inspirou pessoas como Mathes e Nahai46 a elucidar e classificar o suprimento sanguíneo dos músculos e outros a descrever novos retalhos miocutâneos. Ian Taylor47 iniciou seus clássicos estudos de injeções em cadáveres que levaram ao desenvolvimento da teoria do angiossoma. Mais tarde, Isao Koshima e Soeda48 descreveram retalhos perfurantes cujos desenvolvimento e inovação estão em andamento. A cirurgia craniofacial é outra área de subespecialidade que não teria se desenvolvido sem a ajuda da indústria. Quando Joseph Guss reconheceu a importância da fixação interna para o esqueleto craniofacial no início da década de 1980,49 ele estava utilizando fios para unir fraturas cominutivas. Consequentemente o levou e a outros a reconhecerem o conceito dos contrafortes faciais e ao desenvolvimento de sistemas de placas para a face. Esta abordagem atualmente é o padrão de tratamento, mas não teria acontecido sem a experiência dos engenheiros e dos biólogos de implantes que trabalharam com cirurgiões para desenvolver os sistemas de placas e instrumentais que tornaram seu uso possível. Novamente, este é um processo em evolução. Todos os aspectos da cirurgia plástica sofreram esta mudança e desenvolvimento. Na cirurgia estética, também observamos esta evolução. Em cada área, os cirurgiões desenvolveram uma melhor compreensão da anatomia e da função e desenvolveram, com a indústria, formas de melhorar e desenvolver o campo. As técnicas endoscópicas foram adaptadas de outras áreas da prática e aplicadas na face; técnicas minimamente invasivas levaram ao desenvolvimento de fios de sutura com farpas e aos sistemas de suspensão. A biologia dos implantes criou vários preenchedores injetáveis e ampliaram o escopo da cirurgia estética de uma forma até então inimaginável. Desta forma, a inovação é uma consequência natural da prática. Em cada esfera, as pessoas trabalham visando melhorar as coisas – cirurgiões a fazer cirurgias melhores, anestesistas para melhorar o controle da dor, indústria para fornecer materiais e instrumentos melhores. Estas inovações ocorrem em todas as especialidades e, como observamos, a inovação em uma especialidade pode influenciar como outra se desenvolve. E a inovação propriamente dita? Como podemos assegurar que a inovação é a mais segura possível e conduzida de alguma forma organizada e estruturada: Precisamos deste tipo de organização e estrutura? Como mencionei anteriormente, uma discussão sobre a ética da inovação está além dos objetivos deste capítulo. Entretanto, existem algumas coisas que são úteis a considerar.

Documentação, coleta de dados e regulação É importante documentar as mudanças. Se alguém perguntar a um cirurgião quantos procedimentos ele já fez, a resposta geralmente é uma aproximação exagerada. Similarmente, tentemos subestimar nossas complicações. Não somos bons para lembrar, apesar de pensarmos que somos. É surpreendente quando começamos a manter uma base de dados e como é sóbrio ver os números reais. Também é surpreendente quanta informação pode ser reunida e como esta informação é vital quando desejamos mudar e melhorar. A inovação implica mudança e em tempos de mudança é imperativo documentar os resultados. De que outra forma podemos avaliar os efeitos da inovação? Desta forma a documentação e a coleta de dados são importantes aspectos da inovação. A dificuldade com a inovação surge na zona cinzenta entre a inovação e a pesquisa. Pequenas mudanças são fáceis de fazer, grandes mudanças mais difíceis. A maioria das instituições regula as mudanças através do Institutional Review Board (IRB). A regulação é necessária, apesar de também ser restritiva. O processo IRB varia de instituição para instituição, mas, em geral, está se tornando cada vez mais estrita. Isto pode ter um efeito significante no desenvolvimento da medicina como um todo. É uma crença disseminada, por exemplo, que o motivo do primeiro transplante cardíaco não ter ocorrido nos EUA foi a estrita regra que regia a cirurgia experimental em comparação com as regras da África do Sul, onde o Dr. Christiaan Barnard, um cirurgião cardíaco treinado nos EUA, realizou sua cirurgia. As instituições também lidam com o dilema de permitir algum grau de inovação, ainda que controlando a qualidade e a exposição ao risco. Esta última é uma importante consideração para instituições e indivíduos. Além de proteger indivíduos e instituições, a regulação também introduz e reforça o elemento da objetividade. Quando alguém se envolve no desenvolvimento de uma

teoria, cirurgia ou algum tipo de mudança é muito fácil perder a objetividade e isto é um problema sério. A regulação reforça a objetividade e a dificuldade se encontra no equilíbrio entre criatividade e objetividade. Da mesma forma que podemos ficar obcecados pela criatividade e liberdade de expressão, entretanto, outros podem ficar obcecados pela objetividade e regulação. Encontrar um equilíbrio entre as duas correntes algumas vezes é difícil. Adicionado a este conflito de interesses temos o valor comercial associado à inovação, particularmente quando uma soma significante já foi investida no desenvolvimento. Isto introduz a ética da prática e este assunto é tratado em outro capítulo. Desta forma, vemos que a inovação é uma parte importante da medicina. Ela se separa da pesquisa, apesar de muitas vezes estimular a pesquisa. É difícil regulá-la, bem como é difícil defini-la e, pelo menos em alguns casos, ela pode ser enrijecida pela regulação. Tomando os exemplos que abordei neste capítulo podemos ver que a inovação é vital para o desenvolvimento da medicina em geral e para a evolução da cirurgia plástica em particular. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  1. Neumann, U., Hagen, A., Schönermark, M. Procedures and criteria for the regulation of innovative nonmedicinal technologies into the benefit catalogue of solidly financed health care insurances. GMS Health Technol Assess. 3, 2008 Feb 6. [Doc13]. Em virtude do grande interesse em uma gama de inovações médicas efetivas e eficientes e as conquistas obtidas, muitos países introduziram procedimentos para regular a adoção de tecnologias inovadoras não médicas no catálogo de benefícios de financiamento de empresas de seguros de saúde. Este artigo descreve os procedimentos para a adoção de tecnologias inovadoras não médicas por empresas de seguros de saúde na Alemanha, Inglaterra, Austrália e Suíça.

2. McCulloch, P., Altman, D. G., Campbell, W. B., et al. No surgical innovation without evaluation: the IDEAL recommendations. Lancet. 2009; 374:1105–1112. Este artigo propõe recomendações para a avaliação de cirurgias com bases em uma descrição de cinco estágios do processo de desenvolvimento cirúrgico. A obtenção de melhores projetos, conduções e registros das pesquisas cirúrgicas precisará de uma ação orquestrada de editores, empresas de saúde e pesquisa, corpos regulatórios e sociedades profissionais.

3. Ergina, P. L., Cook, J. A., Blazeby, J. M., et al. Challenges in evaluating surgical innovation. Lancet. 2009; 374:1097–1104. A pesquisa de intervenções cirúrgicas está associada a vários desafios metodológicos e práticos dos quais poucos, se houver algum, se aplicam somente à cirurgia. Este artigo discute os obstáculos relacionados com o projeto de estudo de pesquisas controladas randomizadas e estudos não randomizados que avaliam intervenções cirúrgicas. Ele também descreve assuntos relacionados com a natureza dos procedimentos cirúrgicos. Apesar de difícil, a evolução cirúrgica é possível e necessária. Soluções criadas para uma pesquisa cirúrgica e uma estrutura para a geração de evidência sobre a qual basear a prática cirúrgica são essenciais.

4. Barkun, J. S., Aronson, J. K., Feldman, L. S., et al. Evaluation and stages of surgical innovations. Lancet. 2009; 374:1089–1096. A inovação cirúrgica é uma parte importante da prática cirúrgica. Sua avaliação é complexa devido às idiossincrasias relacionadas com a prática cirúrgica, mas necessária de modo que a introdução e a adoção de inovações cirúrgica podem derivar de princípios com base em evidências em vez da tentativa e erro. Uma estrutura regulatória também é desejável para proteger pacientes contra os potenciais danos de qualquer procedimento novo. Neste primeiro de três artigos sobre inovação e avaliação cirúrgica, propomos um paradigma de cinco estágios para descrever o desenvolvimento de procedimentos cirúrgicos inovadores.

8. Toledo-Pereyra, L. Surgical innovator. J Invest Surg. 2011; 24:4–7. Para ser um inovador cirúrgico é preciso ter a capacidade de modificar conceitos estabelecidos na cirurgia. C. Walton Liellehei, Owen H. Wangesteen, William S. Halsted e Alfred Blalock são alguns dos bons exemplos de cirurgiões americanos inovadores cujas contribuições podem nos ajudar a discernir como eles pensaram sobre a inovação dentro das ciências cirúrgicas. Estes quatro inovadores contemplaram prontamente a essência da inovação, mas principalmente se dedicaram à pesquisa para as respostas apropriadas para tarefas clínicas sérias e difíceis.

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História da cirurgia reconstrutiva e estética Riccardo F. Mazzola e Isabella C. Mazzola

Resumo A história demonstra que quase todo o retalho local possível já foi descrito no passado e que a ingenuidade dos cirurgiões plásticos era ilimitada. A lição tirada da história revela que os também chamados novos retalhos são variações do que já havia sido publicado. Devemos ser humildes e reconhecer que “nada realmente é uma novidade”.

GaspareTagliacozzi (1545-1597), de Bolonha, Itália, definiu a cirurgia plástica como a arte devotada ao reparo de defeitos congênitos ou adquiridos (“para restaurar o que a Natureza deu e a chance tirou”) e que tinha como objetivo primário a meta de corrigir um dano funcional, mas também restabelecer uma aparência mais próxima possível da normalidade (“o principal propósito deste procedimento – ele escreve – não é a restauração da beleza original de uma face, mas sim a reabilitação da parte em questão”).1 O termo “plástica” vem do grego plasticos (moldável).

Origem da cirurgia plástica O passado distante A origem antiga da cirurgia plástica está relacionada com a cicatrização de feridas. O manejo de feridas causadas por pedras, armas, flechas e mordeduras por animais remonta a milhões de anos, quando seres humanos primitivos tinham que enfrentar quatro grandes problemas: (1) a interrupção da perda póstraumática de substância, (2) sangramento, (3) infecção e (4) dor. Tentativas de transformar um defeito que cicatriza lentamente por intenção secundária em uma cicatrização mais rápida, por intenção primária, pode ser o primeiro exemplo de um procedimento reparativo. Entretanto, isso deve ter sido muito mais complexo sem as ferramentas apropriadas, na presença de hemorragia e sem a anestesia. Não há documentação de suturas de feridas entre os povos primitivos.2 Podemos explorar do que foi publicado pela medicina hindu antiga, em que as bordas de feridas eram costuradas com materiais simples como fibras ou faixas de tendão, ou fixadas utilizando mandíbulas de insetos.

No Egito Antigo Temos muitas informações sobre a cirurgia egípcia graças ao papiro de Smyth, o mais antigo texto médico. O papiro é uma transcrição posterior (aproximadamente 1650 a.C.) de um manuscrito original que data do Reino Antigo (entre 3000 e 2500 a. C.). Ele descreve 48 casos cirúrgicos incluindo feridas, fraturas, luxações, úlceras e tumores, e sugere seu potencial tratamento. Feridas recentes eram tratadas conservadoramente com a aplicação de graxa e mel utilizando compressas de linhos. Faixas adesivas de pano, suturas ou uma combinação de grampos e suturas eram as recomendações para unir as margens de uma ferida. Um bisturi cirúrgico nunca foi mencionado, pois as feridas já existiam nos casos apresentados.2 O tratamento das fraturas nasais é explicado

com precisão. Primeiro, os coágulos devem ser removidos de dentro das narinas, depois os fragmentos ósseos reposicionados; dois rolos rígidos de linho eram aplicados externamente “pelos quais o nariz é imobilizado” e finalmente “dois tampões de linho embebido em graxa são colocados nas narinas.”3

Na Mesopotâmia A Mesopotâmia é a região entre os rios Tigre e Eufrates (atualmente conhecida como Iraque), onde a civilização suméria nasceu. A medicina era bem desenvolvida, apesar de fortemente influenciada pela astrologia e pelas divindades. Durante as escavações do palácio de Nineveh, uma grande biblioteca contendo mais de 30.000 blocos de argila com inscrições cuneiformes foi descoberta, sendo que 800 destes blocos eram textos médicos. Eles foram escritos aproximadamente no ano 600 a.C., apesar de alguns textos datarem de 2000 a.C. Os blocos de interesse para a cirurgia plástica são poucos e se concentram na cicatrização de feridas ou em anomalias congênitas. “Se um homem recebe um impacto na bochecha, junte terebintina, tamarisco, margaridas, farinha de Inninnu (...) misture em leite e cerveja em uma pequena panela de cobre; espalhe na pele e o homem deve se recuperar.”4 Outro bloco sugere o uso de um curativo embebido em óleo para o tratamento de feridas. Monstros (malformações congênitas) eram considerados importantes na previsão de eventos futuros e na determinação de seus cursos. “Quando uma mulher dá a luz um bebê (...) cujas narinas estão ausentes, o país passará por tempos ruins, e seu homem conhecerá a ruína; quando a criança não possui língua, seu homem conhecerá a ruína; já aquelas que não possuem lábios causarão a destruição das terras e das posses do homem.”5 O mais interessante é que a cirurgia nunca foi mencionada nos blocos de argila, apesar de elas certamente serem realizadas. No Código do Rei Hammurabi,2 que data de 1700 a.C., a imperícia cirúrgica era punida com leis precisas: “Se um médico realizar uma grande cirurgia em um senhor com uma lanceta de bronze e causar a morte deste senhor ou se abrir o órbita de um senhor, destruindo seu olho, deve ter sua mão cortada fora.” “Se um médico realizar uma grande cirurgia em um escravo com uma lanceta e causar sua morte, ele deve dar outro escravo a seu dono.”

Na Índia O nascimento da cirurgia plástica tem uma relação íntima com a arte da reconstrução dos narizes. Esta origem aparentemente curiosa possui uma explicação óbvia quando se considera a tradição comum de algumas populações antigas de mutilar o nariz de adúlteras, ladrões e prisioneiros de guerra como um sinal de humilhação. Em uma tentativa de melhorar esta terrível desfiguração, os cirurgiões inventaram diferentes soluções durante vários séculos. Na Índia, a amputação do nariz era bastante comum e o reparo era feito pelos Koomas, uma baixa casta de pregadores, ou, de acordo com outros, uma guilda de oleiros (fabricantes de potes de cerâmica). No Áyurvédam, o livro sagrado dos indianos que contém conhecimentos médicos, as porções ausentes do nariz eram reconstruídas com o uso de retalhos locais transpostos da bochecha. Uma descrição precisa dos instrumentos (yantra e sastra) necessários para a realização de cirurgias em geral e a rinoplastia em particular, era encontrada neste livro.6 Não é possível estabelecer a data exata deste livro (considera-se ter sido escrito por volta de 600 a.C.) ou provar que Sushruta, o autor, era um homem. Ao contrário, existem evidências de que durante séculos, vários cirurgiões indianos contribuíram para descrever os procedimentos inclusos no livro. Quando a pele da testa foi utilizada? Não há menção sobre isso. Na segunda metade do século XVII, o aventureiro veneziano Nicolo Manuzzi (1639-1717) escreveu um manuscrito sobre o império Mongol no qual se encontra uma conta para o pagamento de uma rinoplastia com retalho da testa. O manuscrito, que se encontra na Biblioteca Marciana de Veneza, infelizmente não era conhecido até o ano de 1907.7 Informações sobre o uso de retalho da testa nas reconstruções nasais somente chegaram ao mundo ocidental no final do século XVIII, graças à carta assinada por um certo BL, destinada ao Sr. Urban, editor do Gentleman’s Magazine e publicada em outubro de 1794 (Fig. 2.1).8

FIG. 2.1 Reconstrução nasal de um indiano utilizando retalho da testa. (Reproduzida de BL. Lettertothe editor. Gentleman’s Magazine 1794;64:891–892.)

Um amigo transmitiu para mim, das Índias Orientais, uma curiosa cirurgia que acredito ser desconhecida na Europa, mas que é praticada há muito tempo na Índia com sucesso; que é a fixação de um novo nariz na face de um homem. Esta introdução é acompanhada por uma descrição precisa de um procedimento em duas etapas realizado em Cowasjee com um condutor de carroças de bois do exército inglês, que caiu em desgraça com o Sultão de Tippoo e teve seu nariz amputado. Ela demonstra o alto nível que a cirurgia indiana atingiu na realização de uma cirurgia, sem anestesia, que, na realidade, é bastante similar aos procedimentos realizados na atualidade.

Na Grécia A medicina grega foi influenciada por Hipócrates, o maior médico de seu tempo. Os historiadores consideram que Hipócrates nasceu na ilha de Kos, por volta do ano 460 a.C. e, provavelmente, foi treinado em medicina no Asklepieion de Kos. Na Grécia e Roma antigas, o Asklepieion (em latim: aesculapium) era um templo de cura, em homenagem a Asklepios, o Deus grego da medicina. Hipócrates rejeitou a crença de seu tempo de que as doenças eram causadas por uma influência sobrenatural, possessão por espíritos do mal, ou uma punição divina. Ele baseou sua prática médica na observação direta das doenças e na análise do corpo humano, introduzindo os métodos científicos na medicina. Hipócrates ensinou e praticou a medicina durante toda sua vida, viajando por várias regiões da Grécia. Ele criou a Grande Escola de Medicina na ilha de Kos. Ele provavelmente morreu em Larissa (Grécia) entre os 83 e 90 anos de idade.

Aproximadamente 70 tratados médicos, montados durante a era de Alexandre (terceiro século d.C.), foram atribuídos a Hipócrates. Eles formam o também chamado Corpus Hippocraticum. Ainda é assunto de muita controvérsia e debate se foi o próprio Hipócrates o autor do Corpus e se estes trabalhos são autênticos.9 O Corpus contém manuais, palestras, pesquisas, conceitos filosóficos e ensaios sobre diferentes tópicos da medicina, sem nenhuma ordem lógica ou mesmo contradições significantes entre eles. Os trabalhos de Hipócrates foram verdadeiros best-sellers, reimpressos diversas vezes com o passar dos séculos. A primeira edição impressa da Opera omnia (Obra Completa) foi lançada em latim na cidade de Roma em 1525, e em grego na cidade de Veneza em 1526 pela imprensa Aldine. O conhecimento cirúrgico de Hipócrates era vasto. Ele utilizava a cauterização para o tratamento de superfícies abertas, reduzia fraturas desalinhadas, praticou a trepanação craniana para evacuar hematomas.

Em Roma Em Roma, a cirurgia era bem desenvolvida, pelo menos avaliando os instrumentos de bronze bastante sofisticados descobertos em Pompeia e atualmente encontrados no Museu Nacional de Nápoles. Muitos eram armazenados em conjuntos de viagem para ser utilizados por cirurgiões nas emergências ou nos campos de batalha. As duas figuras mais representativas da medicina romana foram Celsus e Galen. Aulus Cornelius Celsus (25 a.C.–50 d.C.) provavelmente não foi um médico, mas um escritor de uma família nobre e o autor, por volta de 30 d.C., do livro De Medicina com oito volumes. No livro sete, capítulo nove, a ligadura de vasos e a litotomia, bem como o fechamento dos lábios (fenda labial ou tumores labiais) por meio de retalhos, foram descritos. Ele explica como “defeitos das orelhas, lábios e nariz podem ser curados” (curta in auribus, labrisque ac naribus, quomodo sacriti et curare possint), seguido por uma descrição de fechamento de feridas através do avanço de retalhos.10 “O defeito deve ser convertido em um quadrado (in quadratum redigere). A seguir, a partir dos ângulos internos incisões transversas são feitas (lineas transversas incidere), de modo que parte de um lado seja totalmente dividido em relação ao outro lado.” “Depois, os tecidos que foram escavados, são unidos” (in unun adducere). “Se isso não for possível, duas outras incisões semilunares são feitas a alguma distância da original (ultra lineas, quas ante fecimus, alias duas lunetas et ad piagam conversas immittere), realizando secção somente da parte externa da pele. [...] Estas últimas incisões permitem que as partes sejam facilmente unidas sem utilizar tração” (Fig. 2.2). Celsus possui um papel-chave na história da cirurgia plástica, já que ele é considerado a primeira pessoa a escrever sobre este tópico. Ele é responsável pela introdução dos quatro sinais cardeais da inflamação aguda: “vermelhidão, edema, calor e dor ” (rubor et tumor, cum calore et dolore). Uma cópia do manuscrito de Celsus foi descoberta em Milão no ano de 1443 e impressa pela primeira vez no ano de 1478 em Florença.11 De Medicina teve mais de 50 edições.

FIG. 2.2 Reparo do lábio de acordo com Celsus. (Reproduzida de Nélaton C, Ombredanne L. Les Autoplasties. Paris, Steinheil, 1907.)

Claudius Galen (c. 129-201 d.C.) nasceu em Pergamon (Turquia), estudou medicina em Asklepieion (ver anteriormente) em sua cidade nativa e se mudou para Roma. Ele escreveu sobre traumas cranianos, técnicas de trepanação para a evacuação de hematomas e vários tipos de bandagens. Excelente anatomista, ele descreveu mais de 300 músculos e sete pares de nervos cranianos, contribuindo para a neurologia, demonstrando que os nervos se originam do cérebro ou da medula espinhal. Ele observou que a secção do nervo laríngeo resultava em disfonia. Para o tratamento de feridas ele utilizava suturas e cauterização. Vários trabalhos de Galen se perderam, mas 82 foram mantidos. Originalmente escritos em grego, muitos foram traduzidos para o árabe e o latim. O livro Opera de Galen, inicialmente, foi impresso em latim em Veneza no ano de 1490 e em grego em Veneza no ano de 1525 pela Aldine Press.

Cirurgia plástica após o declínio do Império Romano Cirurgia Bizantina Oribasius (325-403 d.C) escreveu uma coleção de textos médicos intitulada Synagogae Medicae no qual foram descritos procedimentos reconstrutivos para defeitos na bochecha, nariz, orelhas e sobrancelhas.12 Paulus de Aegina (625-690 d.C.), cirurgião e obstetra, foi o autor de uma enciclopédia médica (Epitome) em sete volumes. No livro 6, que lida com a cirurgia, encontraram descrições de traqueostomia, amidalectomia e reparo de lábios.13,14 “Defeitos [grego, colobomata] dos lábios e orelhas são tratados dessa forma: primeiro a pele é liberada pela porção inferior, a seguir, as bordas da ferida são unidas e a calosidade é removida. Finalmente, suturas mantêm suas posições.” Esta técnica é semelhante à descrita por Celsus.

A Idade Média Cirurgia árabe Os escritores médicos árabes são oriundos de diversas nações como a Pérsia, Síria e Espanha. O único denominador comum entre eles era a linguagem. A figura mais representativa foi Abū-l-Q sim ou Albucasis (c. 936-1013 d.C.), cujo famoso tratado, Al Tarsif (Cirurgia), foi traduzido para o latim e publicado em 1500. Foi o primeiro tratado cirúrgico independente escrito em detalhes, incluía mais de 200 ilustrações sobre instrumentos cirúrgicos, como abaixadores de língua, extratores de dentes, ganchos e cautérios, a maioria inventada pelo próprio Albucasis, com a explicação sobre seus usos.15 Como a maioria dos cirurgiões árabes, Albucasis foi um defensor do cautério, para diferentes aplicações clínicas e para o tratamento de feridas e da fenda labial. Ele foi o primeiro a utilizar uma seringa com um pistão.

O surgimento das universidades A fundação das universidades é um dos eventos mais importantes na Idade Média e um fator-chave no desenvolvimento da cultura moderna. Originalmente, universitas denotava a agregação de mestres (magistri), estudantes, ou ambos, e o objetivo primário era ensinar filosofia e teologia. As lições eram praticadas na casa dos mestres ou em pequenas salas. Os estudantes sentavam no chão, e o professor ficava em uma cadeira. A universidade mais antiga, pelo menos na Europa, foi a de Bolonha, fundada em 1088, seguida pelas de Paris, Oxford e Montpellier. Em Bolonha, a medicina era ensinada e a dissecção dos cadáveres era aceita, contribuindo significativamente para o desenvolvimento da anatomia. Mondino de’ Luzzi (1270-1326) foi o primeiro anatomista a dar aulas utilizando diretamente um cadáver (Fig. 2.3). Como os anatomistas também eram cirurgiões, como Henry de Mondeville (1260-1320) ou Guy de Chauliac (1300-1368), a cirurgia fazia parte do ensino da anatomia.

FIG. 2.3 Mondino na cadeira supervisionando a dissecação de um cadáver. (Reproduzida de Ketham J. Fasciculo de Medicina. Veneza, Gregorio de’ Gregorii, 1493.)

Descoberta da impressão A invenção da impressão, por volta de 1440, por Gutenberg disseminou o conhecimento médico e aumentou consideravelmente as bibliotecas de universidades e monastérios. O primeiro livro-texto impresso foi La Ciroxia (A Cirurgia), por William de Saliceto (1210-1277), lançado em Veneza no ano de 1474. Este texto teve relevância particular na história da cirurgia, porque reintroduziu o uso do bisturi cirúrgico em vez do cautério, fortemente defendido pelos cirurgiões árabes. O primeiro livro-texto de

anatomia impresso foi Anatomia escrito por Mondino de’ Luzzi, lançado em Pádua no ano de 1476, que permaneceu como o livro de referência durante muitos anos. Ele editou trabalhos de Hipócrates, Galen, Celsus e de escritores árabes que serviram para educar estudantes de medicina.

A Renascença Cirurgia da Renascença Uma das principais figuras da cirurgia da Renascença foi o francês Ambroise Paré (1510-1590) (Fig. 2.4). Um cirurgião barbeiro humilde, mas muito talentoso, Paré desenvolveu uma considerável experiência em seu incansável trabalho nos campos de batalha. Ele questionou a crença comum de que as feridas por armas de fogo eram envenenadas e utilizou sua prática como barbeiro na limpeza de feridas utilizando cautério quente ou gotejando de óleo fervente sobre a ferida. Ele aplicava uma pasta de clara de ovos, misturada com óleo de rosas e terebintina, gerando grande alívio para os pacientes. Em 1545, ele publicou um tratado sobre o tratamento de feridas de armas de fogo, demonstrando que o uso de cautério era desnecessário (La méthode de traicter les playes). Ele escreveu extensivamente sobre a cirurgia, e seus trabalhos foram coletados em Les Oeuvres, publicado em 1575.16 Para demonstrar a relação entre a anatomia e a cirurgia, ele utilizou imagens emprestadas de De Humani Corporis Fabrica, lançado alguns anos antes em 1543, por Andreas Vesalius (15141564). Ele suturava a fenda labial, enquanto fechava a fenda do palato com o uso de obturadores (Fig. 2.5). Para aproximar as cicatrizes ele prendia adesivo na face externa das margens das feridas (Fig. 2.6) dando suporte ao trabalho de Tagliacozzi sobre a reconstrução nasal.

FIG. 2.4 Retrato de Ambroise Paré (1510-1590).

FIG. 2.5 Reparo de uma fenda labial. (Reproduzida de Paré A. Les Oeuvres. Paris: Buon, 1575.)

FIG. 2.6 Sutura de uma ferida na face. Um pedaço de linho é suturado à pele para facilitar a aproximação das bordas da ferida. (Reproduzida de Paré A. Les Oeuvres. Paris: Buon,1575.)

Reconstrução nasal no mundo ocidental No mundo ocidental, a primeira tentativa de restaurar a pirâmide nasal, data da primeira metade do século XV, foi realizada por membros da família Branca de Catânia (Sicília). Gustavo (início do século XV) utilizou a pele retirada da bochecha. Seu filho, Antonio, fez consideráveis melhorias na técnica cirúrgica. Ele utilizava a pele do braço como sítio doador, para evitar a criação de novas cicatrizes na face. Aproximadamente em 1460, na morte de Antonio, o método de Branca, que era mantido como um segredo de família e passado de boca a boca, deixou de ser utilizado na Sicília. No final do século XV, a reconstrução nasal foi retomada por Vincenzo Vianeo na Calábria (sul da Itália). Seus filhos Pietro (entre 1510-1571) e Paolo (entre 1505-1560) estabeleceram uma ativa clínica para rinoplastias em Tropea (Calábria). Evidências de seu trabalho reconstrutivo são encontradas nos escritos do cirurgião do exército bolonhês Leonardo Fioravanti (1517-1588) (Fig. 2.7), que assistiu as cirurgias dos irmãos Vianeo e publicou um artigo preciso em Il Tesoro della Vita Humana (Tesouro da Vida Humana), lançado em Veneza no ano de 1570.17

FIG. 2.7 Retrato de Leonardo Fioravanti (1517-1588), que foi o primeiro a descrever o procedimento do retalho de braço para a reconstrução nasal. (Reproduzida de Fioravanti L. Il Tesoro della Vita Humana. Veneza: Sessa, 1570.)

Me mudei para Tropea onde na época havia dois irmãos, Pietro e Paolo, que reconstruíam narizes em qualquer pessoa que tivesse perdido o seu em algum acidente [...]. Fui todos os dias até a casa destes cirurgiões, que tinham cinco narizes agendados para reparo e quando eles foram fazer estas cirurgias me chamaram para ver e eu fingindo que não tinha coragem para olhar, virei minha face, ainda que meus olhos vissem o procedimento perfeitamente. Dessa forma, observei todo o segredo do início ao fim, e aprendi. Após esta introdução temos uma completa descrição do procedimento com a retirada de um retalho do braço. Possivelmente, o livro de Fioravanti foi lido por Gaspare Tagliacozzi (1544-1599) de Bolonha, Professor de Cirurgia da Universidade de Bolonha, que aplicou a técnica de modo bem-sucedido em alguns pacientes. Em 1597, ele publicou em Veneza um livro-texto De Curtorum Chirurgia per Insitionem (Tratamento Cirúrgico das Lesões com uso de Enxertos),1,38 no qual a cirurgia de reconstrução nasal é demonstrada passo a passo e ilustrada de modo detalhado. Os instrumentos necessários para as cirurgias são apresentados primeiro, seguidos pelas indicações, delineamento do retalho no braço, descrição do retalho, as bandagens necessárias para manter o braço posicionado, separação do retalho, aparo do retalho, resultado do reparo nasal, bem como as diferentes aplicações clínicas para os lábios e orelhas (Fig. 2.8). O livro foi bem recebido e reimpresso em uma edição de bolso na cidade de Frankfurt no ano seguinte, direcionado especificamente para cirurgiões militares que geralmente eram confrontados com problemas de reparo nasal nos campos de batalha.

FIG. 2.8 Reconstrução nasal com um retalho de braço. (A) Imagem pré-operatória do paciente. O nariz faltante e o retalho são delineados; (B) o retalho suturado na posição; (C) o resultado final. (Reproduzida de Tagliacozzi G. De Curtorum Chirurgia per Insitionem. Veneza: Bindoni, 1597.)

Apesar de Tagliacozzi não ser o descobridor da rinoplastia, e a cirurgia com uso de retalho do braço ser pouco realizada hoje, ele merece o crédito de ser o primeiro a criar um trabalho artístico sobre uma prática cirúrgica, sistematizando e promulgando a reconstrução nasal. Ele corretamente é considerado o fundador da cirurgia plástica.

O declínio da cirurgia plástica Após a morte de Tagliacozzi, exceto por seu pupilo GB Cortesi (1554-1634), que publicou um livro sobre a reconstrução nasal em 1625,19 a cirurgia, que era difícil de realizar, se tornou obsoleta durante quase dois séculos. Casos esporádicos foram publicados na literatura nos séculos XVII ou XVIII. Em vez de recomendar o uso de tecido autólogo para a restauração do nariz, os cirurgiões como Fallopio (1523-1562), Heister (1683-1758), Camper (1722-1789) e outros defenderam a aplicação de uma epítese, convencidos de que os narizes feitos de madeira ou prata eram muito superiores aos feitos de pele.

Renascimento da cirurgia plástica Uma carta para o editor da Gentleman’s Magazine no ano de 1794 (ver anteriormente) ocupa uma posição-chave no renascimento da cirurgia plástica. O cirurgião inglês Joseph Constantine Carpue (1764-1846) leu a carta e passou a praticar e utilizar seu conteúdo de modo bem- -sucedido. Em 1814, ele fez a primeira rinoplastia com uso de retalho da testa dos tempos modernos no Hospital St. Bartholomew, em Londres, em um oficial do exército de Sua Majestade, que teve seu nariz amputado durante uma batalha. A cirurgia durou 35 minutos, “não foi fácil, extremamente dolorosa – disse o oficial – mas não adiantava reclamar.” No final, ele exclamou: “meu Deus, tenho um nariz!” Em 1816, Carpus publicou um artigo sobre a reconstrução, que marca o prelúdio ao renascimento da cirurgia plástica moderna (Fig. 2.9.20)

FIG. 2.9 Reconstrução nasal com um retalho de testa. (A) Vista pré-operatória; (B) retalho transposto para a posição. (Reproduzida de Carpue J.C. An Account of two Successful Operations for Restoring a Lost Nose from the Integuments of the Forehead, in the Case of two Officers of his Majesty’s Army. Londres: Longman, Hurst, 1816.)

O século XIX A idade de ouro da cirurgia plástica O trabalho de Carpue foi imediatamente traduzido para o alemão e Carl Ferdinand von Gräfe (1787-1840), Professor de Cirurgia da Universidade de Berlim, prontamente iniciou a cirurgia. Em 1818, ele publicou Rhinoplastik oder die Kunst den Verlust der Nase organisch zu ersetzen (Rinoplastia: ou a Arte de Reconstruir o Nariz), no qual ele comparava os procedimentos italiano com indiano.21 Von Gräfe preferia o retalho de braço, já que não estava satisfeito com a morbidade do sítio doador na testa. As publicações de Carpue e von Gräfe estimularam o interesse de cirurgiões europeus para realizar reconstruções nasais e outras reconstruções. Na Alemanha, Johann F. Dieffenbach (1794-1847), chefe de cirurgia do Hospital La Charité em Berlim, realizava rinoplastias, restaurações faciais e reparos de fendas palatinas e labiais. Ele publicou suas contribuições no Chirurgische Ehrfahrungen (Experiências Cirúrgicas), lançado em 1829.22 Na França, Jacques Mathieu Delpech (1777-1832), cirurgião-chefe em Montpellier, escreveu o livro Chirurgie Clinique de Montpellier em 1828, com uma seção detalhada sobre rinoplastia.23 Trabalhos notáveis sobre a arte redescoberta foram apresentados por Pancoast (1805-1822)24 nos EUA, Balassa (1814-1868)25 na Hungria, e Sabatinni (1810-1864)26 na Itália. Uma revisão do estado da arte da reconstrução nasal na Europa no meio do século XIX foi publicado por Nélaton e Ombrédanne em 1904,27 e mais recentemente por McDowell,28 Rogers29 e Mazzola.30 Com o advento da anestesia (1846) e a possibilidade de fechamento primário do sítio doador, deixando uma cicatriz que geralmente não era notada, a rinoplastia com uso de retalhos da testa se tornou o procedimento de escolha em virtude da facilidade, boa combinação de cor e excelentes resultados. A primeira tentativa de fechar uma fenda palatina remonta a segunda década do século XIX. A prioridade é compartilhada entre Carl Ferdinand von Gräfe31 e Philibert Roux (1780-1854) da França.32 Entretanto, o maior avanço foi feito em 1862 por Bernard Von Langenbeck (1810-1887), que delineou dois retalhos mucopericondriais obtendo um fechamento mais confiável.33 Refinamentos no reparo de fenda do lábio foram publicados pelo francês Joseph Malagaigne (1806-1865)34 e pelo alemão Mirault (1796-1879) em 1844.35 Procedimentos reconstrutivos para os lábios36 foram publicados por Pietro Sabattini em 1838, utilizando a técnica de desvio do lábio26,37 (Fig. 2.10) e por Victor von Bruns (1812-1883) em 1857, utilizando retalhos laterais duplos para a restauração do esfíncter oral38 (Fig. 2.11), enquanto o reparo da pálpebra foi publicado por Johann Fricke (1790-1841) em 1829, que descreveu um retalho com pedículo da região temporal ipsilateral ou da bochecha para corrigir defeitos da pálpebra superior ou inferior, respectivamente39 (Fig. 2.12).

FIG. 2.10 A técnica da troca de lábio para o reparo do lábio superior: (A) esboço do retalho; (B) resultado final. (Reproduzida de Sabattini P. Cenno storico dell’origine e progressi della Rinoplastica e Cheiloplastica seguita dalla descrizione di queste operazioni praticamente eseguite sopra un solo individuo. Bolonha: Belle Arti; 1838.)

FIG. 2.11 (A, B) Os retalhos laterais duplos para reparo do lábio inferior. (Reproduzida de von Burns V. Chirurgischer Atlas. Tübingen, Laupp, 1857.)

FIG. 2.12 (A-D) Reparo da pálpebra superior e inferior com um retalho temporal e de bochecha, respectivamente, de acordo com Fricke. (Reproduzida de Fritze HE, Reich OFG. Die plastische Chirurgie. Berlim, Hirschwald, 1845.)

Um dos maiores avanços na cirurgia do século XIX foi a demonstração de que uma peça de pele, totalmente separada de seu sítio original, pode sobreviver quando transplantada para outra parte do corpo para cobrir uma

superfície nua granulada.40 Isso se tornou possível através do trabalho pioneiro de Giuseppe Baronio (17581811) de Milão, que realizou o primeiro enxerto autólogo de pele em uma ovelha no ano de 1804 (Fig. 2.13).41,42 Sessenta e cinco anos depois, Jacques Reverdin (1842-1929) realizou a abertura de uma nova era no tratamento das feridas com o primeiro enxerto epidérmico bem-sucedido em um ser humano no Hospital Necker em Paris.43 A rota para a enxertia de pele estava traçada. Alguns anos depois, Louis Ollier (1830-1900) transferiu um grande pedaço de pele de espessura parcial, que incluía a camada superficial e a derme subjacente.44 Carl Thiersch (1822-1895)45 e John R Wolfe (1824-1904)46 fizeram aprimoramentos no procedimento. No final da década de 1800, a enxertia de pele se tornou a solução preferida para o tratamento de feridas crônicas e em granulação.

FIG. 2.13 Primeiro enxerto de pele autólogo em uma ovelha. (Reproduzida de Baronio G. Degli innesti Animali. Milão: Stamperia del Genio, 1804.)

O século XX A origem da cirurgia plástica moderna As trincheiras desempenharam um papel importante na Primeira Guerra Mundial. Criadas com propósitos de defesa, na realidade só protegiam a região inferior e o tronco dos soldados, enquanto a cabeça e o pescoço permaneciam expostos às armas do inimigo. Ao retornar para casa, soldados com grandes mutilações maxilofaciais consideravam impossível se reinserir na sociedade, constituindo um novo problema social. O tratamento destas devastadoras feridas faciais levou ao desenvolvimento de uma nova disciplina, a cirurgia plástica. Os primeiros cirurgiões plásticos foram oriundos da cirurgia geral, otorrinolaringologia e ortopedia durante os primeiros 20 anos do século XX. Associações foram criadas por todo o mundo no intuito de ajudar estes pobres indivíduos, sendo a mais famosa, a Les geules cassés (os mutilados faciais), fundada na França em 1921 pelo coronel Picot. Além dessas associações, França, Reino Unido, Alemanha, Itália e Tchecoslováquia estabeleceram centros especializados no tratamento destas lesões que nunca haviam sido vistas até então. A chave para o sucesso foi a cooperação entre cirurgiões plásticos, treinados no tratamento dos defeitos dos tecidos moles e cirurgiões orais, especializados na estabilização das fraturas ósseas com o uso de aparelhos dentários. Hippolyte Morestin (1868-1919), que trabalhou com o dentista Charles Auguste Valadier (1873-1931) no Hospital Val-de-Grâce (Paris), foi o primeiro a imaginar esta abordagem por equipes. Por este motivo ele é considerado um pioneiro na cirurgia reconstrutiva da face. Em 1915, o otorrinolaringologista Harold Gillies (1822-1969), nesta época trabalhando na França para a Cruz Vermelha, visitou o hospital Val-de-Grâce. Ele ficou impressionado com o trabalho de Hippolyte Morestin e Valadier e foi estimulado a cuidar dos desfiguramentos faciais. Em 1917, após seu retorno ao Reino Unido, Gillies criou um centro para o tratamento das lesões da face e mandíbula no Queen’s Hospital, Sidcup que se tornou o centro de referência da Europa. O tratamento era fornecido a soldados britânicos e aliados feridos na batalha de Somme (1o de julho de 1916), onde os britânicos sofreram com quase 500.000 vítimas, com um número dramático de mutilações faciais (Fig. 2.14). Gillies operava junto com uma equipe multidisciplinar

formada por William Fry (1889-1963) e Henry Pickerill (1879-1956), como cirurgiões dentários, e um grupo qualificado de anestesistas. Ele sistematizou novos procedimentos reconstrutivos, como o retalho em tubo, descrito pelo russo Vladimir Filatov (1875-1956),47 que permitiu a cobertura de grandes defeitos de pele, mas também retalhos de pele, osso, cartilagem e enxertos de pele (Fig. 2.15). Gillies publicou sua experiência no livro Plastic Surgery of the Face, lançado em 1920.48

FIG. 2.14 Dramáticas mutilações faciais da Primeira Guerra Mundial. (Reproduzida de Pickerill HP. Facial Surgery. Edinburg, Livingstone, 1924.)

FIG. 2.15 Sequela de uma queimadura de face durante a Primeira Guerra Mundial. Reparo utilizando retalho em tubo: (A) vista pré-operatória do paciente; (B) delineamento do retalho em tubo; (C) o retalho posicionado; (D) o resultado final. (Reproduzida de Gillies H. Plastic Surgery of the Face. Londres: Frowde, Hodder e Stoughton, 1920.)

Na Alemanha, Erich Lexer (1867-1937), um dos fundadores da cirurgia maxilofacial, adquiriu uma vasta

experiência no reparo da face, mandíbula e órbita utilizando enxertos de cartilagem, osso, pele e tecido adiposo. Ele publicou um livro sobre cirurgia reconstrutiva em 1920.49 O cirurgião holandês Johannes Esser (1877-1946) atuava no Hospital Tempelhof de Berlim e em Viena. Entre 1916 e 1918, Esser codificou alguns retalhos utilizados na atualidade: a rotação de bochecha50 (Fig. 2.16), retalhos bilobados, em ilha e arterializados, que ele chamou de retalhos biológicos.53 Na Itália, Gustavo Sanvenero Rosselli (1897-1974) foi nomeado o chefe do Padiglione per i Mutilati del Viso (Pavilhão para os mutilados da face) em Milão (Fig. 2.17). Este se tornou um centro de referência europeu para cirurgia reconstrutiva e foi visitado por cirurgiões de todo o mundo.

FIG. 2.16 Transposição de retalho da bochecha para o fechamento de um defeito orbitopalpebral. (Reproduzida de Esser JFS. Die Rotation der Wange. Leipzig: Vogel, 1918.)

FIG. 2.17 Pavilhão dos Mutilados Faciais em Milão, chefiado por G. Sanvenero Rosselli (1897-1974).

Frantisek Burian (1881-1965) foi o chefe de uma importante unidade de cirurgia plástica em Praga, Tchecoslováquia. Nos EUA, a especialidade cresceu somente após a Primeira Guerra Mundial. Vilray Blair (1871-1955), treinado em Sidcup, estabeleceu a primeira unidade independente nos EUA para o tratamento de lesões maxilofaciais complexas no Hospital Walter Reed. Outros renomados cirurgiões reconstrutivos foram Robert Ivy, Truman Brophy, John Staige Davis e o armênio Varaztad Kazanjian.

Os programas de treinamento No final da Primeira Guerra Mundial, as técnicas reconstrutivas atingiam resultados surpreendentes. A transferência de retalhos de pele (em tubo ou pediculados) e o uso de enxertos (pele, cartilagem, osso, tecido adiposo) se tornaram procedimentos rotineiros. Novas unidades foram estabelecidas por todo o mundo. Assim, a necessidade de programas de treinamento, em que jovens médicos podiam se tornar familiarizados com os métodos reparativos, se tornou essencial. O Queen’s Hospital em Sidcup, liderado pelo Sir Harold Gillies, provavelmente foi o mais famoso para o tratamento das lesões faciais. A anestesia melhorou consideravelmente graças a Ivan Magill, que desenvolveu a intubação nasal e a endotraqueal. Outros programas de treinamento foram organizados no Reino Unido por Sir Archibald McIndoe, Rainsford Mowlem e Pomfret Kilner. Em Paris, o otorrinolaringologista Fernand Lemaître (1880-1958) estabeleceu um programa de residência na International Clinic of Oto-Rhino-Laryngology and Facio-Maxillary Surgery, que contava com Eastman Sheehan (1885-1951), Professor de Cirurgia Plástica na Universidade de Columbia de Nova York como diretor do curso (Fig. 2.18). O programa de treinamento de 2 anos incluía um intenso calendário de palestras e demonstrações cirúrgicas práticas. Candidatos de várias partes da Europa e Estados Unidos procuraram por este treinamento. Entre eles estava Gustavo Sanvenero Rosselli, mais tarde nomeado chefe da Clínica de Cirurgia Plástica de Milão. Nos EUA, o primeiro programa de treinamento foi organizado por Vilray Blair na Universidade Washington em St. Louis.

FIG. 2.18 Fernand Lemaitre e Eastman Sheeham na Clínica Internacional em Paris, ano de 1927.

O nascimento das sociedades científicas O objetivo das sociedades científicas foi melhorar o nível científico da especialidade e defender o público dos charlatães. A primeira sociedade foi a “American Association of Oral and Plastic Surgeons”, criada em 1921 por Truman Brophy (1848-1928), que apoiou fortemente a íntima cooperação entre os cirurgiões orais e plásticos. Inicialmente, para ser membro era necessária a graduação MD e DDS. Na Europa, a primeira sociedade foi a Société Française de Chirurgie Repáratrice et Esthétique, fundada em 1930 por Charles Claoué (1897-1957) de Bordeaux e Louis Dartigues (1869-1940) de Paris. Ela durou somente 2 anos. Em 1931, Jacques Maliniak (1889-1976) fundou a American Society of Plastic Surgeons. A primeira sociedade supranacional foi a Societé Européenne de Chirurgie Structive, criada em 1936 pelo belga Maurice Coelst (1894-1963) (Fig. 2.19), com o objetivo de reunir anualmente todos os especialistas interessados na nova disciplina.52 O termo construtiva (structive) foi cunhado por Johannes Esser, que o considerava mais apropriado do que “plástica” para enfatizar o conceito da reparação.

FIG. 2.19 Conselho executivo dos membros da Société Européenne de Chirurgie Structive, Bruxelas, 1936. Da esquerda para a direita: Sir H Gillies, JFS Esser, M Coelst, PKilner, G Sanvenero Rosselli.

Em 1937, Vilray Blair organizou o American Board para certificar os cirurgiões plásticos.

Os jornais científicos Na época da fundação da American Society (1931), o belga Maurice Coelst fundou e editou Revue de Chirurgie Plastique (Fig. 2.20). O jornal, o primeiro sobre este tópico, desempenhou um papel importante na história da cirurgia plástica entre as duas guerras. Graças ao seu corpo internacional de editores, que incluía os mais importantes cirurgiões plásticos, o jornal publicou artigos da mais alta qualidade escritos por Gillies, Maliniak e Rethi, os procedimentos da American Society of Plastic Surgery e aqueles da Societé Française de Chirurgie Réparatrice Plastique et Esthétique.53 Os artigos eram publicados na língua de preferência do autor e resumidos em inglês, francês e alemão.

FIG. 2.20 O primeiro exemplar da Revue de Chirurgie Plastique, fundada por MCoelst in 1931.

Em 1935, a Revue de Chirurgie Plastique mudou seu nome para Revue de Chirurgie Structive, tornando-se o jornal oficial da Société Européenne de Chirurgie Structive. A Revue durou até o final de 1938 (8 anos), quando suspendeu sua publicação com o advento da Segunda Guerra Mundial. Em 1946, o Plastic and Reconstructive Surgery Journal foi criado, e Warren B Davis foi escolhido como editor. As bases para o reconhecimento oficial da cirurgia plástica como uma especialidade independente estavam sedimentadas.

A cirurgia plástica após as guerras A história atual vê um incrível desenvolvimento de novos procedimentos reconstrutivos, iniciado em 1960 com o reconhecimento dos retalhos arterializados, continuando com a definição clínica dos territórios vasculares cutâneos nutridos por um único vaso, previamente identificados por Carl Manchot (1866-1932) em 188954 (Fig. 2.21) culminando com a transferência microvascular. A aplicação na prática cirúrgica dos retalhos musculocutâneos, originalmente descritos pelo italiano Iginio Tansini (1855-1943)55 (Fig. 2.22), a introdução das técnicas craniofaciais, desenvolvidas no final da década de 1960 por Paul Tessier (1917-2008),56 a sistematização da reconstrução da mama, o uso de enxertos de tecido adiposo para diversas indicações estéticas e reconstrutivas e mesmo o mais recente transplante de face, constituem os imensos avanços de nossa fascinante especialidade.

FIG. 2.21 Os territórios vasculares cutâneos nutridos por um único vaso. (Reproduzida de Manchot C. Die Hautarterien des menschlichen Körpers. Leipzig: Vogel, 1889.)

FIG. 2.22 O retalho do latíssimo do dorso de acordo com Tansini. (A) Delineamento do retalho; (B) transposição do retalho; (C) resultado final. (Reproduzida de Tansini I. Sopra ilmio nuovo processo di amputazion e della mammella. GazzMed It 1906;57:141.)

Cirurgia estética A origem O final do século XIX marca o início da cirurgia estética. A correção de orelhas proeminentes, realizada em

1881 pelo cirurgião nova-iorquino Edward Ely (1850-1885), foi considerado o primeiro procedimento puramente estético,57 seguido por modificações da aparência nasal. Em 1887, John Orlando Roe (1848-1915), um otorrinolaringologista de Rochester, demonstrou aos membros da Sociedade Médica de Nova York que era possível a redução de um nariz bulboso ou “arredondado” como ele denominou, sob anestesia local e em ambiente ambulatorial.58 Quatro anos mais tarde, ele apresentou a remoção de gibas utilizando tesouras na mesma sociedade.59 No ano seguinte, Robert Weir (1838-1927), um cirurgião geral de Nova York, descreveu a excisão da base alar, atualmente conhecida pelo epônimo “cirurgia de Weir ”, para abaixar um nariz excessivamente projetado.60 Do outro lado do oceano, na Europa, a rinoplastia estética começava em Berlim, aproximadamente na mesma época, com Jacques Joseph (1865-1934), que codificou as etapas da técnica em uma sequência rigorosa, ainda utilizada hoje após quase 100 anos, com mínimas variações (Fig. 2.23). Durante pelo menos 20 anos, Joseph foi o principal cirurgião europeu na área da rinoplastia, recebendo os pacientes mais famosos de todas as partes do mundo. Sua experiência foi inclusa em um trabalho monumental, Nasenplastik und sonstige Gesichtplastik (Rinoplastia e outras Plastias Faciais) publicado em 1931, que permaneceu como o texto de referência durante várias décadas.61

FIG. 2.23 Jacques Joseph (1865-1934), esculpindo uma peça de marfim, antes de inseri-la no dorso nasal. (Reproduzida de Joseph J. Nasenplastik und sonstige Gesichtsplastik nebst einem Anhang über Mammaplastik. Leipzig: Kabitzsch, 1931.)

Desenvolvimento O problema dos doutores da beleza Entretanto, a real explosão da cirurgia estética ocorreu na Europa e EUA entre as duas guerras mundiais. A importância dada para a aparência pessoal produziu, no início do século XX e especialmente durante o período entre guerras, uma horda de farsantes, charlatães e doutores da beleza geralmente trabalhando em salões de beleza, exclusivamente em uma base comercial. Eles se anunciavam em jornais, revistas femininas e nas páginas amarelas como cirurgiões estéticos. Eles apelaram para a imaginação popular prometendo uma aparência mais atraente com procedimentos simples e rápidos em ambiente ambulatorial, um custo relativamente alto e insistindo em como faces e narizes bonitos eram cruciais em criar uma primeira impressão favorável para conseguir um emprego, ou expandir as relações sociais.62 Por este motivo cirurgiões treinados praticando procedimentos reconstrutivos e estéticos estabeleceram sociedades de cirurgia plástica no período entre guerras (ver anteriormente) em uma tentativa de isolar os cirurgiões puramente estéticos. A ideia era traçar uma linha distinguindo entre os “doutores da beleza” e os

“verdadeiros cirurgiões plásticos”. Entretanto, não foi uma tarefa fácil porque o público, em geral, estava mais interessado no sucesso da cirurgia estética do que no resultado dos procedimentos reconstrutivos. Temos como exemplo Charles C Miller (1880-1950), considerado por alguns como um “charlatão inescrupuloso” ou como o “pai da cirurgia estética moderna” por outros por publicar, em 1907, o artigo “A Correção de Imperfeições Características”, um trabalho pioneiro sobre procedimentos estéticos, no qual cirurgias faciais, como a excisão de queixo duplo e modificação de pregas em pálpebras e nasolabiais, eram ilustradas.63 Miller fazia uso extenso de injeções de parafina, considerada uma panaceia para a melhoria do nariz em sela. Quando a parafina foi abandonada em virtude das devastadoras sequelas locais (parafinomas) e sistêmicas (embolismo pulmonar, flebite), ele substituiu seu uso por uma mistura de borracha com guta-percha e terra moída.68 Outro cirurgião estético borderline foi Henry J Schireson (1881-1949) que teve momentos de fama nos EUA após uma cirurgia bem-sucedida em uma atriz britânica. Exceto a este episódio, ele enfrentou uma série de ações legais por imperícia que culminaram na revogação de sua licença por um período. Em 1944, a revista Time o definiu como o “rei dos charlatães”. Cirurgiões treinados fizeram esforços consideráveis para criar uma visão positiva para a cirurgia plástica. Seus talentos contribuíram para transformar um campo visto com suspeita em um ramo aceito da cirurgia. Eastman Sheehan (1885-1951), Jacques Maliniak (1889-1976), Jerome P Webster (1888-1974), Vilray Blair (18711955), Ferris Smith (1884-1957) e outros desempenharam papéis importantes na formação do profissional em cirurgia plástica e da imagem pública durante os anos de organização da especialidade, como um ramo reconhecido da medicina. Sheehan, diretor do curso na Clínica Internacional de Lemaître em Paris, foi eleito presidente da American Association of Plastic Surgeons, em 1935, a despeito da visão controversa de muitos de seus colegas americanos, que o consideravam um cirurgião habilidoso que buscava publicidade. Maliniak é mais bem lembrado como o membro fundador da American Society of Plastic Surgeons em 1931. Ele era um escritor prolífico, publicando Sculpture in the Living (1934)65 e Rhinoplasty and Restoration of Facial Contour, (1947)66 e teve uma importante prática cirúrgica estética em Nova York, principalmente para narizes e mamas. Webster foi um dos pais fundadores da cirurgia plástica nos EUA e um cirurgião talentoso tanto no campo reconstrutivo como no estético. Smith foi diretor do curso na Clínica Internacional Lamaître em Paris e autor de Reconstrutive Surgery of Head and Neck, lançado em 1928, com uma seção dedicada à rinoplastia estética.67 Em Paris, Suzanne Noël (1878-1954) estabeleceu uma prática “solo” bem-sucedida no exclusivíssimo 16o arrondissement. Suas cirurgias eram simples, mas efetivas, principalmente relacionadas com o rejuvenescimento facial e totalmente realizadas em ambiente ambulatorial (Fig. 2.24). Cirurgias mais duradouras, como abdominoplastia ou mamoplastias, eram realizadas em um hospital particular. Em 1926, ela publicou La Chirurgie Esthétique. Son Rôle Sociale, o primeiro livro-texto sobre este assunto e o primeiro escrito por uma mulher.68 Raymond Passot (1886-1933), um dos principais cirurgiões estéticos de Paris, inovou técnicas para ptose mamária, abdome e rejuvenescimento facial. Seu livro La Chirurgie Esthétique pure, datado de 1931, demonstra uma ampla variedade de cirurgias no campo da estética69 (Fig. 2.25). Julien Bourguet (1876-1952) outro cirurgião estético parisiense, se tornou renomado por ser o primeiro a apresentar a abordagem transconjuntival para a correção de pálpebras, em 1929, em um encontro internacional. A descrição detalhada foi publicada pouco tempo depois.70

FIG. 2.24 Resultado de um levantamento de face realizado por Suzanne Noël (1878-1954), aproximadamente em 1925. (Reproduzida de La Chirurgie Estétique. Son rôle sociale. Paris: Masson, 1926.)

FIG. 2.25 O livro sobre cirurgia estética de Raymon Passot (1886-1933), publicado em 1931.

Em Berlim, além de Joseph, Eugen Holländer (1867-1932) também praticava cirurgias estéticas como ritidoplastia ou a mamoplastia redutora, além de rinoplastia61. Holländer era conhecido por ter sido o primeiro a fazer um levantamento de face no ano de 1901 por solicitação de uma dama da nobreza, que pediu para que ele fizesse uma excisão elíptica de pele na frente de suas orelhas, acreditando que a juventude podia ser recuperada através da cirurgia.71 No mesmo artigo, Holländer apresenta dois casos de atrofia facial que ele tratou com injeção de tecido adiposo, o primeiro a publicar este tipo de procedimento.

Cirurgia estética após a guerra Após a Segunda Guerra Mundial e nos anos mais recentes, a cirurgia estética cresceu de modo significante. O número de cirurgiões plásticos ao redor do mundo aumentou dando suporte para a expansão da especialidade. A qualidade das técnicas estabelecidas para a correção de narizes, faces, pescoços, pálpebras, orelhas, queixos, mamas e abdomens melhorou consideravelmente. Uma série de novas cirurgias estéticas para a solução de diversos problemas foi desenvolvida. Um exemplo típico foi o manejo da mama hipoplásica. Durante os anos ela foi tratada com parafina, implantes de esponjas, enxertos de tecido adiposo, silicone líquido, com resultados ruins ou drásticos. No meio da década de 1960, a prótese mamária de silicone foi oferecida na prática clínica, representando a primeira solução convincente. Lançada no meio da década de 1980, a lipoaspiração, logo se tornou uma das intervenções mais populares. Preenchedores, toxina botulínica, e injeção de tecido adiposo melhoraram favoravelmente uma ampla variedade de problemas estéticos com procedimentos minimamente invasivos. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  2. Majno, G. The Healing Hand. Man and Wound in the ancient World. Cambridge: Harvard University Press; 1982. Escrito por um patologista internacionalmente renomado, que dedicou sua vida ao estudo dos fibroblastos e seu papel na inflamação, The Healing Hand é um dos livros-texto mais extraordinários já publicados sobre como diferentes civilizações enfrentaram o problema do tratamento de feridas e infecções. É uma impressionante jornada sobre as dificuldades encontradas pelas pessoas para tratarem as lesões no passar dos séculos.

5. Ballantyne, J. W. The teratological records of Chaldea. Teratologia. 1894; 1:127–142. 18. Gnudi, M. T., Webster, J. P. The Life and Time of Gaspare Tagliacozzi. New York: Reichner; 1950. Um resumo da vida do cirurgião bolonhês da Renascença GaspareTagliacozzi, que escreveu o primeiro livro-texto sobre cirurgia plástica em 1597. Além de todos os documentos relacionados com Tagliacozzi, sua vida e técnica para reconstrução nasal, o trabalho reúne uma história detalhada da cirurgia plástica das eras remotas até o século XIX.

29. Rogers, B. O. Nasal Reconstruction 150 Years ago: Aesthetic and other Problems. Aesth Plast Surg. 1981; 5:283–327. Blair Rodgers adquiriu uma reputação internacional como um historiador da cirurgia plástica. Ele escreveu inúmeros artigos sobre este tópico durante sua vida. O trabalho atual destaca a história da reconstrução nasal no início do século XI.

30. Mazzola, R. F. Reconstruction of the Nose. A historical Review. Handchir Mikrochir Plast Chir. 2007; 39:181–188. É sabido que a cirurgia plástica iniciou como a arte de reconstruir narizes. O artigo traça a história da reconstrução nasal desde sua origem remota na Índia até o século XIX. O artigo faz uma revisão completa das diferentes técnicas.

56. Tessier P, Guiot G, Rougerie J, et al. Ostéotomies cranio-naso-orbito-faciales. Hypertélorisme Ann Chir Plast, 1912:669–712. 57. Rogers, B. O. A Chronologic History of Cosmetic Surgery. Bull NY Acad Med. 1971; 47:265–302. Tendo origem no final do século XIX, a cirurgia estética se desenvolveu rapidamente nos EUA e na Europa. Blair Rogers descreve o nascimento deste novo ramo da cirurgia com os pioneiros do campo como Miller, Joseph, Passot, Noel e outros, destacando suas contribuições.

62. Haiken, E. Venus Envy. A History of Cosmetic Surgery. Baltimore: Hopkins University Press; 1997. O autor descreve a busca pela perfeição através da cirurgia desde o início do século XX até o momento nos EUA. Supervisionado pelo falecido Robert Goldwyn, o livro oferece uma brilhante revisão sobre a percepção de diferentes procedimentos de cirurgia estética na cultura americana.

65. Maliniak, J. W. Sculpture in the living. New York: Pierson; 1934. 66. Maliniak, J. W. Rhinoplasty and Restoration of facial contour. Philadelphia: Davis; 1947. 67. Smith, F. Reconstructive Surgery of the Head and Neck. New York: Nelson; 1928. 70. Bourguet, J. La véritable Chirurgie Esthétique du visage. Paris: Plon; 1936. [56].

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Aspectos psicológicos da cirurgia plástica Laurie A. Stevens e Mary H. McGrath

Resumo Os cirurgiões plásticos lidam com as necessidades psicológicas e com as reações diárias de seus pacientes. Para determinar se uma pessoa é uma candidata adequada para o procedimento cirúrgico desejado, os cirurgiões plásticos devem ter um olho treinado, boa intuição, saber o que perguntar e ter bons critérios, aprendendo com suas experiências passadas, especialmente aquelas em que cometeu erros. O objetivo deste capítulo é dar ao cirurgião plástico as ferramentas para determinar quando as solicitações do paciente são apropriadas, avaliar sua capacidade de tolerar o procedimento solicitado e prever a probabilidade de satisfação do paciente com os resultados da cirurgia. Para que um cirurgião plástico entenda como os processos psicológicos podem afetar as relações do paciente com a cirurgia plástica, é preciso basear-se na compreensão da psique – como ela é formada e como ela funciona. A estrutura da personalidade afeta a experiência do paciente sobre a cirurgia e suas alterações na imagem corporal; a consciência sobre estas mudanças é essencial para a boa comunicação e o bom relacionamento com um paciente.

Imagem corporal e cirurgia plástica Definindo a imagem corporal Apesar de ser mencionado de modo casual e amplo, o termo imagem corporal, na realidade, descreve uma abstração psicológica complexa. A aparência física real é somente parte dela, e a imagem corporal tem sido definida como a relação mente-corpo, a percepção subjetiva do corpo visto através dos olhos da mente, ou os efeitos psicológicos da aparência de um indivíduo.1 Em 1935, Schilder, um dos primeiros a estudar a imagem corporal, a descreveu como um esquema tridimensional do próprio corpo da pessoa, envolvendo fatores interpessoais, ambientais e temporais.2 Dentro desta estrutura, a imagem corporal é o resultado da aparência de nossos corpos, do que as pessoas dizem sobre ela, nossas reações a estas informações, as circunstâncias e comunidade em que crescemos, e quando eventos-chave da vida ocorrem. Dentro desta estrutura de referência, considere dois exemplos: No primeiro caso, temos uma menina grande e musculosa com seios pequenos. Se ela também possuir um forte saque no jogo de tênis e fizer parte de uma família ativa, próxima e praticante de esportes que celebra seus triunfos, suas sensações sobre seus seios podem ser bastante diferentes do que as de uma menina da mesma idade que se considera o membro menos feminino e atraente de sua família socialmente proeminente e preocupada com a aparência. No segundo exemplo, um indivíduo ouve continuamente que tem o nariz grande e proeminente de seu avô. Isto seria uma notícia bem-vinda se o parente for uma pessoa legendária, conhecida por seu carisma e respeitado por seu sucesso nos negócios ou na política. A sensação pode ser diferente caso ele fosse solitário, com um temperamento instável, não apreciado e evitado pelas crianças. Assim, a posse de certas características físicas é colorida pelos sentimentos sobre seus valores, e a reação da

pessoa para características familiares, etnicamente normativas ou culturalmente populares é influenciada pela percepção desta própria pessoa. Por este motivo, a imagem corporal é necessariamente subjetiva. Não podemos saber o sentimento de uma pessoa sobre seu corpo a partir de uma avaliação externa de sua aparência real. A mudança da aparência de uma pessoa para melhor é um evento positivo somente se esta pessoa considerar uma melhoria.

A imagem corporal determina a resposta emocional e o comportamento As percepções da imagem corporal afetam a resposta emocional e dirigem as mudanças comportamentais. Vamos analisar como esta importante sequência ocorre e depois considerar como esta causa e efeito fazem com que a cirurgia plástica seja um evento profundo e que muda a vida de muitos pacientes. Quando uma pessoa olha e pensa sobre si mesmo, uma imagem corporal se forma. Os indivíduos se avaliam com base nesta imagem, suas capacidades físicas e mentais e seu relativo sucesso no meio em que vivem. Isto produz um efeito psicológico, com graus variáveis de confiança ou ansiedade. Estas sensações de autoconfiança ou inadequação influenciarão suas capacidades de interação. Assim, ao lidar com outras pessoas e com os desafios e problemas da vida, a imagem corporal de uma pessoa influencia o grau de sucesso que pode ser atingido. Com a repetição deste processo diariamente, aprendemos o que pode ser feito e utilizamos esta informação para direcionar nosso comportamento. Padrões orientados para objetivos se desenvolvem conforme aprendemos a evitar situações nas quais não somos efetivos e procurar aquelas que recompensam nossos esforços. Ao fazermos isso, os outros reconhecem nossas forças e fraquezas, e isto determinará suas reações e seu comportamento em relação a nós.3

Os quatro estágios do desenvolvimento da imagem corporal Início da infância Começando nos primeiros meses, as crianças aprendem como pensar sobre si próprias e sobre aqueles ao seu redor. Conforme os pais desta criança demonstram aprovação e amor ou, pelo contrário, demonstram falta de atenção ou desaprovação, a criança aprende sobre sua atratividade e seu valor em relação aos outros. Em um ambiente acolhedor e amoroso, uma criança desenvolverá sensações de autoestima, que se torna a base de uma imagem corporal positiva.

Idade escolar O segundo estágio do desenvolvimento da imagem corporal se inicia entre os 5 ou 6 anos de idade, quando a criança deixa a segurança da família, começa a frequentar a escola e encontra a competição externa com seus pares. Se a criança é atraente para as outras e é capaz de projetar as qualidades desejáveis para outras crianças, ela será bem aceita. Reforçada por um feedback positivo, a criança crescerá com confiança e estará pronta para investir ainda mais em comportamentos recompensadores, e os padrões sobre como ela pensa sobre si mesma começam a se formar.

Adolescência Com a puberdade, a aparência física da criança muda dramaticamente. Existem mudanças na altura; as características faciais aumentam; as características sexuais secundárias se desenvolvem e o adolescente deve lidar com pelos corporais, acne e odor. As alterações não são iguais entre os adolescentes no que diz respeito a quando ocorrem ou quais serão os resultados finais, e, com tudo isso, ocorre grande vulnerabilidade às opiniões alheias. Conforme as mudanças físicas ocorrem, o adolescente responderá às alterações objetivas com impressões que serão repetidamente testadas contra as opiniões de seus pares. Ao analisar as reações de outros, um quadro sobre si mesmo emergirá e produzirá uma resposta emocional geralmente forte neste grupo etário. Assaltada pelas sensações de insegurança, inadequação ou depressão, o adolescente pode responder com alterações comportamentais que prejudicam a interação social e introduzem um padrão negativo sobre o desenvolvimento da imagem corporal.

Envelhecimento Com a passagem do tempo e com as mudanças concomitantes na aparência física, a imagem corporal

novamente submete-se à adaptação. Neste momento, quando uma pessoa parece menos vigorosa e jovem, os competidores respondem reconhecendo menos autoridade para o indivíduo mais velho. Ao enfrentar esta reação, a pessoa fisicamente mais velha começa a demonstrar um enfraquecimento da imagem corporal e evita situações nas quais previamente se sentia confortável.

Como a cirurgia plástica muda a imagem corporal A cirurgia plástica é efetiva e útil para muitos pacientes porque muda a imagem corporal. Desde que esta mudança seja percebida pelo paciente como uma melhoria, haverá mudanças positivas em sua vida emocional e nos padrões comportamentais e, consequentemente, haverá uma melhoria na qualidade de vida. É significante que a cirurgia plástica tende a ser realizada em algum momento dos quatro estágios do desenvolvimento da imagem corporal discutido nesta seção.4-6 A cirurgia plástica pode ser feita em crianças com deformidades congênitas ou defeitos físicos que podem causar recusa emocional ou de contato físico por outras crianças e adultos. Mesmo se a deformidade for de proporções triviais, sua correção eliminará um fator que pode causar rejeição precoce. O segundo momento, quando a criança entra na escola, é o tempo certo para corrigir orelhas de abano, sindactilia, cicatrizes, pequenas pintas com pelos, e outros problemas que mobilizarão a atenção e gerarão comentários e críticas de outras crianças. Os anos da adolescência são a época para a correção de características não atraentes recentemente desenvolvidas, como uma protuberância nasal, ou condições que causam constrangimento, como é o caso da ginecomastia. A pessoa que envelhece, procura a cirurgia plástica para corrigir deficiências associadas à maturação (p. ex., rugas, uma aparência envelhecida e cansada). Como a motivação de ser submetido a uma cirurgia plástica estética e reconstrutiva geralmente pode ser psicológica e envolve a imagem corporal, a chave é obter sucesso na seleção dos pacientes. O valor central da cirurgia não se baseia na beleza objetiva do resultado visível, mas na opinião do paciente e sua resposta à mudança. O reconhecimento e a compreensão dos aspectos psicológicos começam com a identificação dos traços de personalidade que determinam as interações humanas.

Formação da personalidade e do caráter Muito foi escrito sobre como a personalidade ou o caráter se desenvolve em seres humanos. Todos nós temos traços de personalidade que caracterizam quem somos e como interagimos com o mundo. Estes traços administram como percebemos e nos relacionamos com nosso ambiente e entre nós. São consistentes e estáveis, apesar de estímulos e influências externas. O ego é o principal chefe da mente, encarregado de equilibrar as influências internas e externas que o confrontam. Estas influências incluem memórias, vontades, ansiedades, percepções e necessidades externas. Para funcionar de modo tranquilo, o ego precisa ter um conjunto de operações automáticas que lidam com estas influências. Estas operações são chamadas mecanismos de defesa.

Mecanismos de defesa Utilizamos mecanismos de defesa para lidar com os estresses de nossos mundos interno e externo. Estes mecanismos não estão sob nosso controle consciente e se desenvolvem em resposta a nossas experiências precoces. Nosso repertório de defesas contribui para a formação do nosso caráter e permite que esqueçamos experiências dolorosas, minimizemos ou evitemos situações que produzam ansiedade e eliminemos impulsos indesejados (sexuais e agressivos).7 Para compreender os pacientes de cirurgia plástica e suas respostas à cirurgia são discutidos os mecanismos de defesa da regressão, negação, projeção, repressão, distorção, somatização, intelectualização, racionalização e sublimação. A regressão é o retorno a um estágio prévio de funcionamento ou desenvolvimento para evitar ansiedades ou conflitos.7 A regressão pode ser vista em adaptações saudáveis e não saudáveis às doenças. Pacientes precisam passar por certo grau de regressão para permitir que sejam cuidados quando estão doentes, ficando em uma posição dependente. Entretanto, a regressão pode atingir um nível patológico quando o paciente age de modo infantil, sendo incapaz de colaborar com os cuidados médicos. Negação é o não reconhecimento consciente de um aspecto doloroso da realidade. Por meio da negação, os pacientes invalidam pedaços desagradáveis ou indesejados de informações e atuam como se estes não

existissem.7 A negação, assim como a regressão, pode ser adaptativa ou inadequada em situações médicas. Por exemplo, certo grau de negação pode ser útil para que o paciente lide com uma sensação opressiva de desesperança em resposta a um diagnóstico de câncer terminal. A negação se torna inadequada quando interfere na capacidade do paciente de participar nos cuidados médicos. A negação não precisa ser confrontada quando o paciente aceita o tratamento médico apropriado e participa dos cuidados. A negação pode atingir proporções psicóticas em pacientes psiquiátricos. A projeção ocorre quando uma pessoa atribui sentimentos não reconhecidos a outros indivíduos.7 A projeção pode ser demonstrada pela falsa atribuição ou interpretação errônea de atitudes, sensações ou intenções de terceiros (p. ex., “não estou bravo com ela, ela é que está brava comigo.”). A repressão envolve a manutenção de memórias, pensamentos ou sensações indesejáveis longe da consciência.7 O paciente que “esquece” notícias desagradáveis que o médico diz a ele provavelmente está reprimindo os pensamentos ou as sensações perturbadoras. A distorção ocorre quando os pacientes remodelam a realidade externa para que se adapte às suas necessidades internas, incluindo crenças mágicas e pensamento delirante.8 Somatização é quando os pacientes convertem seus conflitos psíquicos e sensações conflitantes em sintomas corporais.8 A apresentação mais comum da somatização é a hipocondria. Intelectualização é quando o paciente controla suas ansiedades e impulsos pensando excessivamente sobre eles ao invés de experimentá-los.8 Estes pensamentos são desprovidos de afeto ou sensação. A racionalização é quando o paciente justifica suas atitudes, crenças ou comportamentos que possam ser inaceitáveis inventando uma mentira convincente.8 A sublimação é a transformação de vontades, sensações e memórias em resultados saudáveis e criativos.8

Reações psicológicas perioperatórias Mesmo quando o cirurgião considera pré-operatoriamente que um paciente é um candidato adequado para a cirurgia, isto não significa que ele deve parar de procurar por sinais de distúrbios psicológicos no paciente no período pós-operatório. Episódios transitórios de ansiedade ou depressão que duram dias ou semanas após a cirurgia foram registrados nos estudos de Edgerton et al.9 e Meyer et al.10 Um paciente pode experimentar efeitos colaterais psiquiátricos a vários medicamentos utilizados antes, durante e após a cirurgia. O início súbito de um novo sintoma psiquiátrico deve sugerir um efeito colateral induzido por medicamentos. Talvez uma das reações mais profundas observadas é o delírio induzido pela lidocaína após uma cirurgia localizada em membros, na qual se utiliza um bloqueio anestésico local. Isto pode ocorrer no caso de injeção intravenosa inadvertida do agente anestésico. A melhora do humor foi observada no pós-operatório de uma variedade de pacientes submetidos a procedimentos estéticos.11-20 Mesmo os pacientes considerados de alto risco, aqueles considerados como os mais prováveis de apresentar um resultado psicológico ruim, podem demonstrar benefícios após cirurgias estéticas.21 Estas observações levaram à conclusão de que a cirurgia estética pode ser psicologicamente benéfica mesmo para pacientes com distúrbios psiquiátricos, considerando que eles sejam acompanhados adequadamente por seus médicos e psiquiatras.22 Na discussão a seguir, diferentes estilos e distúrbios da personalidade são discutidos em relação a como estes respondem à cirurgia e à recuperação.

A relação médico-paciente Os cirurgiões são carregados com fortes emoções pelos pacientes que confiam a eles seus corpos e suas vidas. Os pacientes podem desenvolver sensações especiais por seus cirurgiões, similares àquelas associadas a pessoas de autoridade de seus passados.23 Isto pode contribuir para a idealização do cirurgião como um “trabalhador milagroso” ou um “salvador ”, bem como sensações de agressividade injustificada relacionada com o cirurgião. Este é um fenômeno conhecido como transferência. A natureza da relação médico-paciente é extremamente importante para o sucesso do tratamento do paciente gravemente doente. Apesar de muitos médicos ficarem desconfortáveis com pacientes que desenvolvem sentimentos em relação a eles, é importante reconhecer o fenômeno da transferência, contrarreação e contratransferência. A transferência pode ser descrita como uma recriação, na relação médico-paciente, de uma relação conflituosa com uma figura da infância. A transferência pode ser de natureza paternal ou maternal, mas não é

necessariamente o caso. Também pode haver transferências relacionadas com avós, tios ou outros parentes. Na presença de uma transferência, os pacientes agirão como se o médico fosse a pessoa transferida; em outras palavras, os sentimentos sobre aquela pessoa são “transferidos” para o médico. Se a transferência é positiva, ela geralmente não precisa ser abordada. Entretanto, se a transferência é negativa, ela precisa ser avaliada. Um exemplo de transferência negativa é o paciente que trata o médico como se ele fosse um sádico, indiferente, frio e sem coração, enquanto o profissional se esforça para ser empático, compreensivo e carinhoso. O paciente age de modo excessivamente exagerado e desproporcional em relação à interação real. Geralmente, a transferência não é uma distorção total da relação entre o médico e o paciente; o paciente pode ter capturado algum aspecto da personalidade ou do comportamento do médico que serviu como a base para o desenvolvimento das sensações de transferência. A reação emocional do médico à expressão dos sentimentos de transferência do paciente é denominada contrarreação. Por exemplo, quando o paciente fica irritado com o médico, o médico deseja sair do caso ou pode responder de forma irritada. Ao invés disto, o médico deve imaginar qual é a melhor maneira de responder aos sentimentos e comportamentos do paciente sem personalizá-los. Isto não é fácil, visto que os médicos, assim como seus pacientes, são humanos, são vítimas de seus próprios sentimentos e dos sentimentos dos outros em relação a eles. A contrarreação, que é uma resposta comum ou “normal” às emoções ou comportamentos do paciente, precisa ser diferenciada da contratransferência. Contratransferência é a reação do médico em relação ao paciente baseada em circunstâncias que não são reais, mas em relações ou assuntos conflituosos da vida do próprio médico – ou seja, uma resposta “neurótica” à transferência do paciente. Quando estes sentimentos ocorrem, esta situação pode ficar intensa tanto para o paciente como para o médico. O reconhecimento destes sentimentos e suas origens é importante, além de ser uma boa ferramenta que temos para aprimorar os relacionamentos com pacientes e evitar armadilhas nas relações, incluindo a seleção de intervenções específicas.

Estilos e distúrbios da personalidade Existem diversos tipos ou estilos de personalidade que todos os médicos tratam na prática clínica. Esta seção se concentra nos estilos e distúrbios da personalidade mais comumente encontrados pelo cirurgião plástico, as reações típicas à cirurgia ou às alterações da imagem corporal e o manejo clínico destas alterações. Quando traços da personalidade se tornam inflexíveis e inadequados e causam um dano significativo na função social ou ocupacional ou ainda uma angústia subjetiva, eles constituem um distúrbio da personalidade.24 Os distúrbios da personalidade geralmente são aparentes no final da infância ou na adolescência, continuam durante a maior parte da vida do indivíduo e podem crescer nas idades avançadas. Há quatro características que todos os distúrbios da personalidade compartilham. São elas: (1) uma resposta inflexível e inadequada ao estresse; (2) uma incapacidade no trabalho e no amor que geralmente é mais séria e sempre mais sutil do que a encontrada na neurose; (3) desencadeada por um conflito interpessoal; e (4) uma capacidade peculiar de “se colocar na pele de outros”.25 Os pacientes com distúrbios da personalidade veem o resto do mundo, ao invés de si mesmos, como a causa dos problemas. Eles têm pouca consciência de seu próprio comportamento ou seu impacto sobre as pessoas ao redor.

Personalidade obsessiva-compulsiva e distúrbios da personalidade Muitos indivíduos com personalidade obsessiva- compulsiva são altamente bem-sucedidos e membros produtivos da comunidade. Este estilo da personalidade gera um comportamento eficiente, eficaz e direcionado para objetivos. Estes indivíduos tendem a lidar com seus sentimentos utilizando a intelectualização; são preocupados com detalhes, organização e rotinas; tendem a ser perfeccionistas; são escrupulosos sobre assuntos relacionados com a moralidade e a ética; têm problema em delegar tarefas a outros; e podem ser rígidos, teimosos e mesquinhos.26 Quando um paciente obsessivo-compulsivo se torna ansioso, ele pode descompensar rapidamente e se tornar excessivamente preocupado em rotinas ou informações aparentemente triviais. Estes pacientes podem sufocar o médico com perguntas e ocupar um enorme tempo do médico e de sua equipe, levando à irritação dos cuidadores. É importante acompanhar estes pacientes e tratar de seus receios e ansiedades; algumas vezes, o cirurgião deve tentar determinar o que está deixando seus pacientes ansiosos ou receosos e dar o conforto apropriado. Estes pacientes geralmente não têm consciência de seus sentimentos, e o médico, dando

informações médicas detalhadas, pode ajudá-los. Prescrever tarefas a serem realizadas faz com que eles se sintam um parceiro em seu tratamento terapêutico e na tomada de decisão. Estas tarefas podem ser trocas de curativos, registrar o balanço hídrico, ou cuidar de cicatrizes com hidratantes tópicos. Mesmo se estas medidas não sejam estritamente necessárias, elas ajudarão a lidar com a ansiedade. Exemplo de um paciente A Sra. A é uma executiva bem-sucedida de 43 anos de idade excessivamente elegante que foi submetida a uma blefaroplastia. Após a cirurgia, ela invadiu o consultório do cirurgião com infindáveis perguntas e ocupou a equipe médica durante um tempo excessivo ao telefone. O cirurgião, Dr. B, pediu para a Sra. A comparecer a uma consulta pós-operatória extra e pediu para que ela fizesse um questionário antecipadamente sobre todas as dúvidas que tinha. Após responder suas perguntas, o Dr. B lidou com a ansiedade da paciente sobre o resultado eventual, assegurando que todas eram preocupações normais, e tentou determinar como seria melhor continuar a dar apoio à paciente. Ela recebia uma ligação por dia, de até cinco minutos, durante a qual podia fazer seus questionamentos e receber suporte e orientações.

Personalidade narcisista e distúrbio da personalidade Pacientes narcisistas possuem uma necessidade excessiva de admiração, um senso exagerado de sua própria importância e noções grandiosas de sua beleza e poder. Eles têm um sentimento de direito; podem explorar terceiros para obter seus objetivos; não têm empatia para com outras pessoas; podem ter inveja de outros ou considerar que outras pessoas têm inveja deles, e podem ser arrogantes e altivos em seus comportamentos e atitudes.26 Como estes pacientes valorizam exageradamente suas aparências físicas, a cirurgia estética naturalmente gerará alguma ansiedade. Eles geralmente consideram inaceitáveis os efeitos físicos do envelhecimento sobre suas aparências. Similarmente, eles consideram inaceitável qualquer complicação cirúrgica ou mesmo o edema e as equimoses típicas que são sequelas dos procedimentos cirúrgicos. Estes pacientes precisam ser orientados o máximo possível sobre o processo de cicatrização e recuperação e ter suporte todo o momento durante eventos pós-operatórios comuns. Eles respondem bem se tratados como iguais, independentemente dos parceiros envolvidos em seus cuidados. Os cirurgiões plásticos não devem ser envolvidos pela idealização da imagem dos pacientes narcisistas (p. ex., “Você é o melhor cirurgião plástico do país.”) Estes pacientes podem mudar rapidamente para uma desvalorização profunda do cirurgião se este desagradá- los ou causar desconfortos. Estes pacientes tendem a se tornar exigentes quando estão fisicamente desconfortáveis e ansiosos, e respondem melhor a um suporte empático.

Personalidade dependente e distúrbio da personalidade Estes pacientes exibem um comportamento pegajoso e submisso, precisando de um suporte e apoio interminável. Estes pacientes possuem grande dificuldade de tomar decisões cotidianas sem uma quantidade excessiva de aconselhamento e apoio. Eles querem que outros assumam a responsabilidade por suas grandes decisões. Eles experimentam dificuldades para iniciar ações em virtude da falta de autoconfiança em seus julgamentos e capacidades. Eles geralmente consideram difícil discordar de outros em decorrência do medo de rejeição ou desaprovação. Personalidades dependentes possuem um grande desconforto quando estão sozinhas e receiam que não possam cuidar de si mesmas.26 Isto se traduz na situação cirúrgica tornando o paciente dependente, pegajoso e receoso após a cirurgia, em parte facilitado pela regressão iniciada por estar sendo cuidado durante sua doença. Este comportamento, algumas vezes, pode alienar os profissionais da área de saúde e desencadear tudo o que estes pacientes receiam: solidão e abandono. O médico deve tentar reconhecer estes receios e fornecer apoio para o paciente, assegurando que ele não será abandonado. O suporte com carinho deve ser oferecido, mas limites firmes devem ser estabelecidos para os pacientes manipuladores.

Distúrbio de personalidade paranoide Pacientes paranoides possuem desconfiança e suspeita universal em relação aos outros.26 Eles receiam que os

motivos são mal intencionados e suspeitam, com bases insuficientes sobre o fato, que outros tentam prejudicar, explorar ou feri-los. Eles podem atribuir uma intenção malevolente em relação a pessoas inocentes. Não perdoam e guardam rancores, mesmo para fatos aparentemente benignos. Eles percebem os outros tentando atacar seu caráter ou reputação e podem responder de modo furioso e com sentimento de vingança. Estes pacientes consideram as cirurgias como uma “intrusão” e ataque aos seus corpos. Eles consideram difícil estabelecer uma aliança terapêutica com os profissionais da área de saúde. Suas vidas, algumas vezes, parecem não ter direção, ou seja, são “andarilhos”. Eles têm poucas amizades e poucas interações sociais. Suas opções ocupacionais são mais bem-sucedidas quando escolhem profissões nas quais têm pouco contato com outros e podem trabalhar em relativo isolamento. Sob estresse, indivíduos paranoicos podem desenvolver breves episódios psicóticos. É preferível não realizar uma cirurgia estética eletiva nestes indivíduos. Se o paciente paranoide requer uma cirurgia reconstrutiva ou outra cirurgia estética não eletiva, é importante respeitar a distância do paciente e interagir com ele de modo profissional, não tentando se aproximar ou estabelecer amizades, porque este comportamento pode ser visto com suspeitas. O cirurgião deve ser direto e responder as questões de modo honesto e simples. Quaisquer distorções pelo paciente que sejam observadas pelos cirurgiões devem ser abordadas e discutidas de maneira aberta. Acusações não devem ser questionadas nem confirmadas, mas explicadas como relacionadas com a doença, e não como uma tentativa de ferir o paciente.27

Personalidade histriônica e distúrbio da personalidade Pacientes histriônicos26 tendem a ser excessivamente emocionais e exibem um comportamento que busca a atenção. Apesar de geralmente serem animados, namoradores e dramáticos, eles continuamente demandam ser o centro das atenções. Se sentem que os holofotes se afastam deles, podem fazer algo dramático para que a atenção volte para si (p. ex., fazer escândalo, ligar para o diretor da clínica). Eles são altamente sugestionáveis e facilmente influenciados por outros ou pelas novidades atuais. O cirurgião plástico deve tomar cuidado na avaliação destes pacientes para ter certeza dos reais motivos da busca pela cirurgia. Pessoas histriônicas podem ter uma confiança excessiva, especialmente em médicos, que são vistos como pessoas que podem resolver seus problemas de modo mágico. Elas tendem a ver as relações terapêuticas de modo mais íntimo do que realmente são e podem desenvolver fantasias românticas com seus médicos. Indivíduos com personalidade histriônica estão em risco elevado para tendências suicidas e podem ameaçar suicídio para chamar a atenção e exigir um melhor tratamento. O cirurgião deve adotar uma atitude profissional com estes pacientes e dar a quantidade apropriada de atenção a eles. O médico deve tomar muito cuidado para não se tornar muito amigável ou ser envolvido em seu comportamento sedutor. Certamente, o profissional não deve responder de modo sedutor. É preciso estabelecer limites firmes em relação à natureza da relação terapêutica e o papel do médico na vida do paciente.

Distúrbio de personalidade borderline Pacientes de personalidade borderline26 possuem um padrão de relações interpessoais instáveis. Eles podem apresentar um distúrbio de identidade caracterizado por sensações alternantes sobre eles mesmos, seus objetivos, valores e aspirações. Da mesma forma, os sentimentos ou humores também podem demonstrar violentas mudanças e variações. Pacientes borderline podem ser impulsivos e geralmente têm problemas em controlar sua raiva e sua emoção. O comportamento pode ser autodestrutivo e manipulador. Podem se envolver em jogos, gastos excessivos, alimentação compulsiva, abuso de substâncias, sexo sem proteção, ou direção irresponsável. Em situações extremas, podem chegar à automutilação (queimaduras ou cortes) ou a comportamentos suicidas. Os suicídios ocorrem em 8%-10% destes pacientes. Durante períodos de estresse extremo, ideias paranoides transitórias ou sintomas dissociativos (p. ex., despersonalização) podem ocorrer, mas geralmente não persistem. A lida com estes pacientes é mais fácil estabelecendo limites estritos. O médico deve tentar ser consistente e atencioso, mas não responder ao comportamento manipulador. O paciente deve ser acompanhado regularmente para limitar seus receios de abandono. Estes pacientes geralmente respondem melhor à experiência corretiva de desenvolvimento de relacionamento estáveis e de confiança com os médicos que não retaliem em resposta a seus comportamentos raivosos e inesperados.28 O uso dos recursos de outros profissionais de saúde, como uma consulta psiquiátrica e

terapia psicofármaca ou um profissional de enfermagem para “dividir a transferência”, pode ajudar a fazer estes pacientes a sentir a adequação dos cuidados e fazer ajustes. Entretanto, é importante para o cirurgião continuar a tratar do paciente do modo usual, pois estes outros relacionamentos não substituem a relação do cirurgião com estes pacientes.

Estratégias para o tratamento do paciente difícil O paciente detestável O “paciente detestável” é um termo cunhado por James E. Groves em seu artigo seminal no New England Journal of Medicine.29 São aqueles pacientes que geralmente inspiram pavor em seus médicos quando veem seus nomes na agenda do dia. Estes pacientes geralmente fazem com que o médico se sinta irritado e desanimado, levando a uma possível retaliação ou a um confronto. Quem são estes indivíduos? É útil reconhecer estes pacientes, para compreender porque inspiram sensações negativas e para abordar o tratamento com base em princípios específicos. Não se pode esconder que as sensações negativas não existem porque o não reconhecimento das mesmas pode levar a cuidados médicos abaixo do ideal.

O paciente dependente Pacientes dependentes29 podem ter desde leves necessidades de apoio até demandas intensivas para várias formas diferentes de atenção (como analgésicos, longas explicações, demonstrações de carinho e afeição). Podem ter necessidades intermináveis podendo gerar um comportamento de distanciamento por parte dos médicos. Os sinais de alerta para o paciente dependente são os pacientes excessivamente gratos que idealizam o médico, professam um “amor ” e uma admiração infindável, e se comportam de modo sedutor. O médico se torna uma “mãe incansável” e o paciente se torna uma “criança não planejada, indesejada e rejeitada”.29 Exemplo de paciente A Sra. T, uma mulher de 24 anos de idade que busca uma mamoplastia de aumento, faz várias ligações telefônicas antes de sua cirurgia, pedindo mais informações e necessitando de apoio para a cirurgia que acontecerá. Seu cirurgião plástico dá a ela o tempo que ela parece precisar para que se sinta confortável sobre o procedimento. Vários dias após a cirurgia, ela começa a ligar para o consultório, aumentando a frequência e a urgência. Ela quer marcar consultas, apesar da pouca necessidade objetiva para uma visita fora do acompanhamento pós-operatório usual. Ela também começa a pedir a prescrição de analgésicos e a pedir opiniões sobre o tamanho da mama e seu desconforto. O cirurgião plástico para de responder seus telefonemas e deixa para sua enfermeira esta tarefa. Como a paciente não consegue acessar diretamente o médico, ela começa a passar mensagens durante as noites, dizendo ser uma emergência médica. A melhor abordagem para esta paciente é estabelecer limites firmes em relação às consultas e contatos telefônicos. O médico precisa ser amável, mas declarar claramente para a paciente que existem limites e que ele não pode ser um recurso inesgotável para o paciente, disponível a qualquer hora do dia ou da noite. Consultas regulares devem ser agendadas, durante as quais a paciente pode ver o médico e tirar suas dúvidas. A enfermeira pode também agendar visitas entre as consultas médicas para aumentar a confiança da paciente. Estas ações devem dar à paciente a necessidade de contato sem atrapalhar a rotina do consultório e a vida do médico. O encaminhamento para aconselhamento psiquiátrico pode ser útil para que a paciente tenha um maior suporte e dissipe a transferência.

O negador autodestrutivo Todos os médicos têm pacientes que negam suas doenças.29 A negação é patológica quando interfere na capacidade do paciente em aceitar o tratamento adequado para a doença. Quando este não é o caso, a negação pode ser uma adaptação para que o paciente possa lidar com a doença. Entretanto, há um grupo de pacientes que são negadores autodestrutivos. Ao contrário dos negadores adaptativos, estes pacientes são fundamentalmente dependentes de terceiros e parecem ter prazer com a destruição auto-orquestrada. Para o médico, parece que eles têm um grande prazer em colocar obstáculos e

impedir o fornecimento do tratamento ideal. Exemplo de paciente O Sr. B., um homem de 49 anos de idade, é um usuário de drogas intravenosas. Ele tem uma longa história de problemas médicos e hospitalizações relacionadas com o abuso de drogas. A despeito das diversas tentativas de encaminhar o paciente para o tratamento, ele resiste em aderir aos programas. Foi internado no hospital com uma endocardite bacteriana e recebeu antibióticos intravenosos por 6 semanas. Logo após a alta hospitalar, foi reinternado com infecção secundária em área de recente injeção de heroína. O cirurgião plástico foi chamado para fazer um retalho de pele para cobertura local devido às sequelas da infecção. Após o tratamento e a alta, ele foi reinternado com recorrência da endocardite e necessitou de um novo enxerto de pele em virtude de uma nova infecção dos tecidos moles. Dois meses mais tarde, ele foi internado com quadro de sepse e morreu no hospital. Negadores autodestrutivos fazem com que seus médicos fiquem com raiva, desanimados, sintam-se usados e abusados. Eles engendram fantasias de que podem ser recuperados, especialmente em médicos mais jovens, mas também podem levar seus médicos a sensações negativas sobre eles. Os médicos geralmente se sentem culpados por estas sensações negativas direcionadas a este tipo de paciente. A melhor abordagem é observar o padrão de negação autodestrutiva e estabelecer expectativas realistas em relação à capacidade do paciente melhorar. Pode ser útil pensar que o paciente tem uma doença degenerativa ou terminal, para a qual não existe tratamento médico e ter como objetivo dar o melhor tratamento de suporte e alívio dos sofrimentos.

O paciente exigente Pacientes exigentes29 são fundamentalmente semelhantes aos dependentes em relação à extrema carência; entretanto, a apresentação é bastante diferente. Estes pacientes exigentes desvalorizam e intimidam o médico. Ameaçam com processos legais ou entram em contato com instâncias superiores do hospital quando a equipe médica não satisfaz suas demandas do modo que querem. As questões iniciais destes pacientes são seus “direitos”. Esta, na realidade, é uma defesa contra receios de perda de controle e a sensação de abandono. Entretanto, quando um médico está na outra extremidade lidando com exigências e um comportamento irritado, é fácil compreender como estes pacientes podem gerar uma resposta agressiva. Eles também fazem com que o médico sinta receio de suas ameaças. A reação comum a estes pacientes é deixar com que eles saibam, não de forma clara, o quão injustos são em suas demandas. Esta estratégia geralmente não funciona. Groves29 fala de modo eloquente sobre como lidar com estes pacientes: Eu sei que você está louco com este médico ....e com outros médicos também. Você tem motivo para estar com raiva. Você tem uma doença que faz com que algumas pessoas desistam e você ainda está lutando. Mas você também está lutando contra seus médicos também. Você diz que tem direito a vários testes repetidos, que está sendo prejudicado, que está sofrendo, etc. E você tem direito – direito de receber o melhor tratamento médico que podemos dar. Mas não podemos dar a você o melhor tratamento que merece a menos que você nos ajude. Você merece uma chance de controlar esta doença; você merece conquistar todos os aliados que puder. E você terá ajuda que merece se parar de direcionar sua ira para todas as pessoas que estão tentando ajudar a lhe dar o que você merece – um bom tratamento médico. Esta estratégia permite que o paciente perceba o desejo oculto de receber o “melhor ” tratamento médico, e espera-se que ela consiga alistar o indivíduo como um aliado em seu tratamento. Ela permite que o médico enquadre com cuidado o comportamento exigente de modo construtivo, ao invés de gerar uma resposta de ira ou retaliação.

Reclamantes manipuladores que rejeitam ajuda Não importa o quanto o médico ajude-os, este grupo de pacientes tentará repelir a ajuda.29 Eles expressam sua desesperança de que qualquer médico possa ajudá-los. Retornam ao consultório todas as semanas e afirmam que o tratamento recomendado falhou novamente. Quando um médico “falha”, eles interrompem o tratamento

e procuram por outro. Assim como o paciente dependente e o paciente exigente, estes tipos tendem não ter limites para suas necessidades. Eles não parecem desejar melhorar, parecem necessitar de um “casamento indissolúvel” com seus médicos. Quando um sintoma melhora, outro aparece para substituí-lo. Estes pacientes geralmente sofrem de uma depressão não diagnosticada e não tratada. Exemplo de paciente A Sra. S é uma vendedora de 30 anos de idade com uma dor intratável na mão. Ela já procurou por médicos de todo o país e recebeu inúmeros diagnósticos, incluindo causalgia, distrofia simpaticorreflexa e síndrome do túnel do carpo. Ela já foi submetida a centenas de procedimentos diagnósticos, mas (felizmente) recusou a se submeter a uma cirurgia quando indicada. Ela ficou hospitalizada durante 14 dias em decorrência de dor na mão em um centro especializado no tratamento da dor, período durante o qual a dor diminuiu com uma combinação de antidepressivos, terapias de relaxamento, terapias comportamentais, terapia ocupacional e fisioterapia. Entretanto, após a alta, ela não seguiu nenhuma das recomendações e a dor retornou. Agora ela está irritada porque o centro de tratamento da dor falhou em sua cura e está determinada a encontrar um médico que descubra a “causa real” de sua dor. Este grupo de pacientes deixa os médicos preocupados em ter deixado de diagnosticar uma doença corrigível e causa ansiedade e insegurança nos profissionais sobre suas habilidades clínicas. Geralmente, não é construtivo confrontar este paciente sobre seu comportamento ou suas necessidades. É importante ter em mente que o objetivo final do paciente é nunca ser abandonado e sempre estar conectado ao médico. Entretanto, ele tem receio de uma intimidade real com o médico. Uma boa estratégia para o médico é comunicar a este paciente que ele pode não ser capaz de ajudá-lo e compartilhar o pessimismo de que eles possam “ser curados”. Ao invés da cura, o médico deve sugerir um tratamento que possa gerar algum “alívio” (mas não suficiente para curar o paciente, desta forma diminuindo o receio do paciente em perder seu médico). Esta técnica é utilizada pelo médico da Sra. S, que também tratou sua depressão e ofereceu estratégias comportamentais para aliviar a dor, dizendo a ela que ele não pensa que estas técnicas possam ajudar em mais de 50% do problema. A Sra. S ficou satisfeita com esta abordagem, que permitiu que ela suportasse seus sintomas e a manter o relacionamento com o médico, mas também permitiu uma maior funcionalidade no dia a dia. A avaliação psiquiátrica também pode ser útil, mas não substitutiva para o médico-assistente, ela deve ser apresentada como um tratamento complementar.

Procedimentos cirúrgicos e aspectos psicológicos associados Cirurgia estética facial Nossa sociedade parece valorizar e associar as mudanças físicas do envelhecimento com fraqueza e perda do valor. A cirurgia para rejuvenescer a face pode ser um benefício enorme para a pessoa com uma aparência envelhecida. Pode permitir que a pessoa se sinta melhor e ganhe aceitação, se sinta sexualmente atraente para outros e seja vista como mais vibrante, forte e jovem. Existem claros benefícios econômicos, psicológicos e sociais em ter uma aparência mais jovem. A cirurgia para face envelhecida é feita com o propósito de restaurar uma aparência previamente existente um uma imagem preexistente da face. Este tipo de cirurgia não parece necessitar de um dramático reajuste da imagem corporal30 porque a face envelhecida não parece estar totalmente incorporada com a imagem corporal com o passar do tempo. Esta cirurgia geralmente é bem-sucedida e psicologicamente benéfica para o indivíduo. Procedimentos para rejuvenescer a face geralmente são realizados entre a vida adulta e o início da velhice. Este é um momento de perda potencial – de pessoas queridas, da carreira, amigos ou familiares, menopausa, calvície ou a síndrome do ninho vazio, criada pela emancipação dos filhos. Em estudo feito em pacientes submetidos a procedimentos de facelift com mais de 50 anos, Webb et al.11 concluíram que 90% haviam perdido uma pessoa importante nos cinco anos antes da cirurgia. Dunofsky31 concluiu em um estudo que a população de mulheres que foi submetida à cirurgia estética facial era mais narcisista e com mais problemas com separações-individualizações do que o grupo-controle, mas sem diferenças na autoestima e ansiedade social. Edgerton et al.32 concluíram que 74% dos pacientes submetidos a facelift tinham um diagnóstico de distúrbio psiquiátrico. Sarwer e Crerand33 analisaram vários estudos pré- -operatórios na literatura e concluíram que investigações

baseadas em entrevistas clínicas identificaram uma maior incidência de psicopatologia na população de cirurgias estéticas. Entretanto, quando os estudos pré-operatórios utilizando testes psicométricos padronizados como parte da avaliação foram analisados, poucas psicopatologias foram detectadas. Existem diversos estudos que aludem as maiores dificuldades psicológicas em pacientes do sexo masculino submetidos a procedimentos de facelift do que em pacientes do sexo feminino.32,34 Entretanto, a porcentagem de homens submetidos a este procedimento aumentou durante os últimos 20 anos, sem um aumento claro nas dificuldades psicológicas durante o pós-operatório. No estudo de Goin et al,35 as motivações para a cirurgia de facelift estavam relacionadas com a sensação de envelhecimento em 70% dos pacientes, e a maioria ficou satisfeita com os resultados, mesmo quando tinham expectativas não realistas. Friel et al. também relataram um índice de satisfação similarmente elevado.36 O estudo de Leist et al.37 revela que aproximadamente 13% dos pacientes estavam insatisfeitos com seus resultados cirúrgicos. Após a cirurgia, os pacientes submetidos ao facelift podem experimentar alguma hipoestesia ou parestesia na face e no pescoço. Eles podem experimentar certo distúrbio do sono causado pelo desconforto físico. Aqueles indivíduos que prezam particularmente sua autonomia e independência podem considerar difícil lidar com o período pós-operatório de desconforto físico e incapacidade. Entretanto, reações psicológicas geralmente são de vida curta, e os pacientes normalmente estão satisfeitos com os resultados, experimentando uma sensação de maior atratividade e autoestima. A queixa de envelhecimento facial dos pacientes que buscam a ritidoplastia parece ser motivada pelo desejo de restaurar seu semblante juvenil anterior. Os pacientes de rinoplastias, por outro lado, estão buscando mudar sua aparência básica.

Rinoplastia A literatura está repleta de artigos e estudos sobre pacientes que buscam a rinoplastia. Em geral, os estudos mais antigos sobre este grupo de pacientes sugeria um grande grau de psicopatologia. Em 1975, Gibson e Connolly36 estudaram pacientes de rinoplastia 10 anos após a cirurgia e encontraram alto nível (38%) de psicopatologia, incluindo esquizofrenia. Eles compararam este grupo com um grupo de trauma e doenças diversas, no qual encontraram somente 8% com um distúrbio psicológico. Wright e Wright39 encontraram alto nível de psicopatologia com base em testes de mensuração psicológica (Minnesota Multiphasic Personality Inventory) em seu estudo controlado com pacientes de rinoplastia. Em comparação com o grupo-controle, os pacientes que buscavam a rinoplastia eram mais autocríticos, mais sensíveis à opinião alheia e mais inquietos. O diagnóstico de personalidade mais consistente foi de “personalidade inadequada”, que provavelmente se traduz para “personalidade dependente”, nomenclatura diagnóstica atual. O estudo de Hay e Heather do ano de 197316 com 45 pacientes submetidos à rinoplastia demonstrou distúrbios psicológicos em aproximadamente 58% do grupo estudado. O estudo de Micheli-Pellegrini e Manfrida,40 bem como o estudo de Linn e Goldman,41 também revelou uma alta incidência de psicopatologia. Zahiroddin et al, entretanto, não encontraram diferença significante no índice de distúrbios psiquiátricos e a decisão de se submeter à rinoplastia.42 Existem muitos estudos na literatura da cirurgia plástica que focalizam sobre o também chamado paciente submetido à rinoplastia com mínimo defeito. O estudo de Jacobson et al de 196043 avaliou 20 casos consecutivos de homens que solicitavam uma cirurgia estética para a correção de “defeitos mínimos”. O procedimento mais solicitado era a rinoplastia. Todos, exceto dois pacientes (aqueles que recusaram avaliação psicológica), apresentavam diagnósticos psiquiátricos. Sete foram diagnosticados como psicóticos; quatro como neuróticos; sete com distúrbios de personalidade. A metade dos pacientes foi submetida ao procedimento e mais de 50% destes pacientes cirúrgicos apresentaram problemas psicológicos no pós-operatório, incluindo uma tentativa de suicídio. Entretanto, nem todos os estudos suportaram uma ligação entre a rinoplastia e a psicopatologia, e, na prática atual, a maioria dos pacientes submetidos à rinoplastia parece beneficiar-se da cirurgia. Os pacientes descritos por Linn e Goldman41 reagiram com “exigências” após a cirurgia e logo depois não estavam mais preocupados com seus narizes, estavam satisfeitos com os resultados estéticos. Observaram uma melhoria geral no nível de ajuste social dos pacientes. Eles teorizaram que as alterações anatômicas feitas no nariz e as mudanças subsequentes no comportamento de outros em relação ao paciente levaram a uma liberação da energia psíquica direcionada ao nariz. O estudo de Goin e Goin44 com pacientes de rinoplastia que estavam simultaneamente em psicoterapia sustentou a hipótese de Linn e Goldman. Goin e Goin concluíram que a perda da autoconsciência

obtida após a rinoplastia levou a uma maior autoconfiança, que levou outras pessoas a se comportarem de modo diferente em relação ao paciente, permitindo um crescimento da autoestima do mesmo. Neste grupo, 33% não apresentavam alterações psicológicas demonstráveis após a cirurgia, e a maioria estava feliz com os resultados da operação. Resumindo, um número substancial de estudos parece demonstrar benefícios psicológicos e psicossociais com a cirurgia de rinoplastia. Vários estudos durante a última década demonstraram que os benefícios psicológicos da cirurgia de rinoplastia são maiores nos pacientes femininos do que nos masculinos.45,46 Slator e Harris47 concluíram que homens apresentam mais sintomas de ansiedade e depressão do que suas contrapartes femininas no pósoperatório, mas não encontraram evidências para suportar as sugestões iniciais de que as solicitações por rinoplastias poderiam ter sintomas precoces de severas doenças psiquiátricas. Pacientes submetidos à rinoplastia, especialmente homens, podem experimentar algumas preocupações sobre sua identidade sexual no período pós-operatório. Estas preocupações parecem estar relacionadas com o sentimento sobre o tamanho e o formato de seus narizes. Consequentemente, para evitar distúrbios psicológicos no período pós-operatório, o cirurgião plástico precisa tentar investigar a presença de distúrbios relacionados com a identidade sexual dos pacientes antes de decidir pela cirurgia. Da mesma forma, pacientes psicóticos devem ser identificados e a cirurgia evitada nesta população porque o pensamento psicótico ou as desilusões podem ser exacerbados pela cirurgia.

Mamoplastia de aumento Em geral, as pacientes submetidas a uma mamoplastia de aumento estão felizes com o resultado final. Mesmo na presença de cicatrizes e contraturas capsulares, a maioria das pacientes submetidas à mamoplastia de aumento está satisfeita com a aparência estética e com os benefícios psicológicos derivados da cirurgia.20,49 Os grupos de mulheres que mais comumente procuram a mamoplastia de aumento são: mulheres de seios pequenos que sempre se sentiram infelizes com a aparência de suas mamas e procuram a cirurgia por motivos psicológicos; mulheres cujas mamas sofreram involução após o parto ou com a amamentação e desejam restaurar o tamanho e a aparência anterior; e aquelas que buscam pela cirurgia por motivos ocupacionais (como atrizes, modelos e dançarinas de striptease). Em geral, o primeiro grupo é o menos saudável psicologicamente antes da cirurgia. Nele, parece haver uma incidência acima do normal de distúrbios depressivos,50-52 com um estudo de Edgerton et al.50 demonstrando uma porcentagem de até 60%. Estas pacientes geralmente possuem baixa autoestima e sentimentos de inadequação. Elas podem ter uma sensação reduzida de feminilidade e atratividade sexual. A função sexual pode estar prejudicada pela inibição de não querer mostrar as mamas ou não permitir carícias durante o jogo sexual. Após a mamoplastia de aumento, as pacientes relatam uma maior autoestima, maiores sensações de atratividade sexual e feminilidade, menos inibições durante a atividade sexual e uma melhora no humor. Estudos realizados por Kilman et al.53 e Schlebusch e Mahrt54 demonstraram melhorias na imagem corporal após o aumento das mamas. As pacientes rapidamente integram suas mamas aumentadas em suas imagens corporais. Druss51 explicou esta mudança notável no comportamento, na visão pessoal e na autoestima a partir de uma perspectiva psicoanalítica. Ele declarou que a mulher busca a mamoplastia de aumento em um esforço de reparar conflitos intrapsíquicos crônicos e profundos. Neste grupo de estudo, ele concluiu que as pacientes tinham uma identificação problemática com suas mães, secundariamente à indisponibilidade emocional da mãe. Esta falta de identificação levou a autoimagens malformadas como mulheres e dúvidas sobre a feminilidade. As observações de Druss podem explicar porque nem todas as mulheres com mamas pequenas procuraram a mamoplastia de aumento e muitas parecem estar contentes com seus tamanhos. O mais interessante, à luz da controvérsia e dos litígios relacionados com os implantes de mama na década de 1990, é que muitas mulheres com mamas aumentadas buscaram justificativas para a remoção seus implantes de silicone pelo medo de complicações. Apesar de muitas destas mulheres demonstrarem menos receios após a explantação, muitas também se sentiram deprimidas quando tiveram que retornar ao tamanho original de suas mamas. Algumas optaram pelo reimplante com próteses de solução salina para restaurar as sensações positivas capturadas pelo procedimento de aumento original.

Mamoplastia de redução

Muitas mulheres que buscam a mamoplastia de redução experimentam significante desconforto físico em decorrência de suas mamas pesadas e pendulares e relatam restrições nas atividades, especialmente nos esportes. Achar roupas que se ajustem adequadamente é um problema. Elas descrevem sensações de desconforto quando utilizam roupas de banho. Muitas se sentem constrangidas com o tamanho de suas mamas e declaram que as pessoas, especialmente os homens, olham para seus colos antes de olhar para seus rostos. Elas podem evitar interações sociais e encontros sexuais devido ao desconforto e ao uso de sutiãs e roupas que minimizam o tamanho de suas mamas. Estudos relacionados com os aspectos psicossociais na cirurgia de redução de mama são inúmeros. Goin et at.15 demonstraram evidências pré-operatórias de depressão em uma pequena amostra; Hollyman et al 55 também encontrou uma maior incidência de depressão e ansiedade em comparação com os controles, também em uma pequena amostra. Sarwer et al 56 publicaram que as pacientes submetidas à redução de mama experimentam maior insatisfação com sua imagem corporal geral, se preocupam e ficam embaraçadas com suas mamas em situações públicas e sociais e evitam atividades físicas. Após a cirurgia, este é um grupo satisfeito de pacientes. Elas rapidamente integram suas mamas menores em suas imagens corporais. Elas geralmente estão mais confiantes e se sentem mais femininas e sexualmente atraentes. Em uma ocasião, as pacientes estavam mais satisfeitas com os resultados cirúrgicos do que seus cirurgiões. A despeito dos problemas estéticos visíveis do pós-operatório com cicatrizes, e a frequente perda de sensibilidade no mamilo-aréola, as pacientes geralmente estão satisfeitas. Jones e Bain57 reviram a literatura dos estudos sobre os resultados que demonstraram um alto grau de satisfação das pacientes (78%-95% muito ou moderadamente satisfeitas) e uma melhora na imagem corporal e bem-estar psicológico. Chadbourne et al 58 realizaram uma revisão da literatura e uma metanálise dos estudos publicados e encontraram que, apesar dos parâmetros de qualidade de vida de função física terem melhorado estatisticamente, as medidas da função psicológica, não. Outros estudos documentaram os benefícios psicológicos e emocionais após a mamoplastia de redução.59-63 Entretanto, um estudo feito por Guthrie et al 64 descreveu esta população de pacientes em comparação com um grupo-controle de mulheres de mamas grandes que não buscaram a cirurgia de redução, como um grupo que apresenta maiores dificuldades psicológicas e físicas, com níveis mais elevados de ansiedade e depressão, bem como uma menor autoestima, imagem corporal e função interpessoal. As pacientes ocasionalmente podem experimentar uma sensação de perda e necessitar de um reajuste a seus novos corpos. Pode haver alguns distúrbios sociais e sexuais agora que elas não sentem mais a necessidade de se isolar devido à autoconsciência. Elas podem necessitar de encorajamento para se tornar mais socialmente atraentes e menos retraídas.

Trauma: defeitos adquiridos Transplante de mão Acompanhados por grande interesse da mídia e debate público, os primeiros transplantes de mão ocorreram em 1998 e 1999. Estava claro que o transplante de mãos de cadáveres para cotos de amputação do antebraço em pacientes vivos era tecnicamente possível. O que não estava claro era a questão de ser justo condenar os receptores a uma vida de terapia imunossupressiva para uma condição que não ameaçava a vida do paciente.65 Nas discussões que se seguiram, foi mencionado frequentemente que para o paciente que havia perdido a mão, o transplante oferece o potencial benefício psicológico de restaurar a imagem corporal, bem como de restaurar a função. Esta consideração foi utilizada para defender o alto nível de risco que acompanha o transplante, mas ainda não foi estabelecida. Dos quatro receptores originais de transplantes de mão, três estavam satisfeitos com os resultados após 2 anos e incorporaram a mão transplantada à sua imagem pessoal. O quarto paciente estava entusiasmado no início, mas a mão foi amputada depois por solicitação do próprio.66 Enquanto o estado psicológico dos pacientes ainda está sendo estudado com o passar do tempo, a informação avançou do discurso destes casos sobre a psicologia da tomada de decisão.67 Médicos e pacientes, vendo a possibilidade de realizar um transplante de mão e analisando a relação risco-benefício, podem chegar a conclusões bastante diferentes. O trabalho do campo da análise de tomada de decisão demonstrou que os médicos e pacientes procedem a partir de diferentes quadros de referência e priorizam valores de modo diferente na hora da tomada de decisão. Os pacientes tendem a demonstrar uma maior preferência para uma alternativa arriscada que tenha a chance de apagar uma perda e permitir o retorno ao status quo anterior, e eles

pensam nos riscos imediatos, não nos riscos de longo prazo (p. ex., imunossupressão).68 Estes e outros fatores irracionais, como a negação da possibilidade de sofrerem uma complicação severa, precisam ser esclarecidos no processo de tomada de decisão, particularmente com um procedimento tão incerto como o transplante de mão.

Queimaduras Pacientes com queimaduras devem inicialmente enfrentar os aspectos relacionados com sua sobrevivência, com a dor causada pela queimadura propriamente dita e a necessidade de serem, geralmente, submetidos a múltiplos procedimentos (p. ex., enxertos de pele, trocas de curativos). Depois, eles devem enfrentar problemas relacionados com as cicatrizes causadas pela queimadura e pela natureza deformadora destas marcas. A localização anatômica das cicatrizes é relevante porque aquelas que são mais óbvias para outras pessoas (p. ex., na face) geram desconforto e aumentam a autoconsciência. Geralmente, os procedimentos de cirurgia plástica são realizados em estágios durante um período longo, o que retarda o retorno para o funcionamento pré-lesão. A cronicidade do tratamento pode representar dificuldades psicológicas, assim como em qualquer doença crônica. As dificuldades psicológicas observadas na população que possui queimaduras incluem a depressão, desamparo, frustração, desânimo, diminuição da imagem pessoal, autoconfiança, isolamento social e desesperança. Existe uma maior probabilidade de que os pacientes com queimaduras suspendam o tratamento e percam o contato com seus médicos e outros cuidadores.69 Este comportamento pode ser uma reflexão da ansiedade com repetidas cirurgias, presença de cicatrizes permanentes e perda da esperança de que suas aparências desfiguradas possam mudar. Em geral, uma abordagem multidisciplinar é mais útil na população com queimaduras. A equipe deve incluir o cirurgião, o clínico geral, profissionais da área de saúde mental, a equipe de enfermagem, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e terapia em grupo. Os familiares também podem-se beneficiar da terapia de apoio, individualmente ou em grupo. Deve ser dada muita atenção ao estado mental, ao humor e ao grau de desmoralização do paciente. A equipe médica algumas vezes comete o erro de não admitir uma depressão clínica. O tratamento para a dor é extremamente importante, e estabilizadores de humor e antidepressivos também podem ser úteis. A equipe médica deve tentar olhar além da aparência desfigurada para ver a pessoa. Uma conversa normal com o paciente sobre assuntos do dia a dia, esportes ou eventos atuais será benéfica, pois indica que a pessoa ainda está intacta internamente, pode ser interessante para outras pessoas e ser aceita por elas. A equipe pode enfatizar a autoconsciência do paciente, mas é importante enfatizar as forças e destaques da pessoa e ajudá-la a retornar o mais rapidamente possível para as atividades que, no passado, lhe davam prazer e autoestima.

Câncer e reconstrução Câncer de mama: mamotomia, mastectomia e reconstrução O tratamento do câncer de mama sofreu uma notável evolução durante os últimos 20 anos, tanto pelo ponto de vista médico como pela perspectiva psicológica. O tratamento do câncer foi revolucionado pelos novos agentes quimioterápicos e cirurgias que preservam a mama e o mamilo, aumentando o bem estar psicológico das mulheres com câncer de mama. Os índices de sobrevivência também melhoraram com a detecção precoce e o aprimoramento do tratamento. A reação de uma mulher para a perda de sua mama está ligada a como ela se sente em relação a suas mamas e o papel das mesmas na sua sexualidade e autoestima antes do diagnóstico do câncer. Reações comuns após a mastectomia são depressão,70,71 diminuição da autoestima,72-75 sensação de ser menos feminina e receios relacionados com as recorrências.76,77 Quando a reconstrução pós-mastectomia se tornou aceita, na década de 1970, foi teorizado que a mulher teria que viver por durante um tempo sem a mama e ser feliz com uma mama imperfeita e reconstruída. Entretanto, vários pesquisadores demonstraram que a reconstrução imediata no momento da mastectomia oferece à paciente com câncer de mama uma maior qualidade de vida após a mastectomia76,78 e melhor integração da “nova” mama na imagem corporal.79-81 Além disto, apesar do momento ideal, a reconstrução da mama oferece a oportunidade de minimizar as sensações de desfiguramento, deformidade, mutilação, falta de atratividade sexual e perda da feminilidade. A reconstrução não interfere com o processo de luto iniciado pela mastectomia. As mulheres são capazes de

lamentar a perda de suas mamas ao mesmo tempo em que se sentem “completas”, “simétricas” e femininas após a reconstrução. Elas ainda têm que enfrentar o fato de que tiveram câncer e precisam de acompanhamento e cuidados apropriados. A reconstrução, algumas vezes, dá à mulher que estava previamente insatisfeita com o tamanho de suas mamas a oportunidade de reduzir ou aumentar suas mamas. A reconstrução do mamiloaréola completa o resultado estético. Muitas mulheres com câncer de mama optam pela mamotomia, uma cirurgia que preserva a mama, ao invés da mastectomia por motivos estéticos e psicológicos. Nem todas as pacientes submetidas a mamotomia ficam felizes com seus resultados cirúrgicos, relacionados com a quantidade e a localização do tecido excisado. A mama, algumas vezes, fica com formato estranho, causando incômodo para a paciente e interferindo em seu comportamento com sua sexualidade, evitando ficar sem roupas com seu parceiro sexual ou em banheiros coletivos. Mesmo se o defeito não for prontamente aparente para outros, algumas pacientes solicitarão uma cirurgia reconstrutiva da mama em um segundo momento. Elas desejam restaurar a simetria e o formato de suas mamas de modo a minimizar a sensação de desfiguramento, beneficiando a autoimagem e o funcionamento psicológico e sexual.

Câncer de cabeça e pescoço O câncer de cabeça e pescoço precipita uma perda de função e perda da forma da face e da cavidade oral, que podem ser devastadoras para o paciente e para a família. A expressão facial (controlada pelos músculos da face), a fala e a capacidade de comer e beber de modo socialmente aceitável com amigos e familiares são de importância vital.82 Qualquer desfiguramento da face pode levar a danos sociais, interpessoais e ocupacionais. No período pré-operatório, os pacientes devem se preparar para o desfiguramento provável e para as dramáticas mudanças em suas faces. No período pós- -operatório inicial, o paciente experimenta alto grau de ansiedade. Isto resulta da dificuldade de comunicação e fala, especialmente na presença de uma traqueostomia ou sonda nasogástrica, e a necessidade de demoradas trocas de curativos para os cuidados da ferida e dos cortes.83 Muitos pacientes apresentam uma severa reação depressiva durante este tempo. Geralmente, sentemse amedrontados, abandonados e intensamente sozinhos em virtude da incapacidade de falar ou de dificuldades com a comunicação. O tratamento para a dor é necessário. A combinação de agentes analgésicos e medicamentos antidepressivos geralmente é eficaz. Como o uso excessivo de álcool pode ser um fator nesta população, o cirurgião deve estar atento para os sinais de síndrome de abstinência pelo álcool. Mais adiante, no período de recuperação, o paciente terá de lidar com a mudança na imagem corporal. Simultaneamente, o paciente também está tomando ciência das dificuldades com a deglutição, fala e salivação. Além das mudanças funcionais, existem reatividades e ajustes para o diagnóstico, bem como uma consideração do prognóstico do câncer, que podem incluir a necessidade potencial de tratamento adjuvante para o câncer. Todas estas experiências podem gerar depressão crônica, afastamento social, perda da autoestima, ansiedade e sensações de perda e luto no paciente. As relações familiares podem ser interrompidas, levando a maiores incômodos. Os pacientes podem não ser capazes de retornar às ocupações prévias, e isto pode ser devastador, especialmente se suas carreiras são fatores importantes na autoestima. Quando estão em público, estranhos podem ficar olhando para suas faces desfiguradas, gerando dor e humilhação. O planejamento da alta hospitalar deve incluir o início de importantes serviços de tratamento, como terapias da fala, fisioterapia e terapia ocupacional, bem como orientações relacionadas com os cuidados das feridas e suporte psicológico para o paciente e para os cuidadores.

Cirurgia plástica na infância Defeitos adquiridos e congênitos: considerações gerais Um defeito físico evidente não tem uma relação direta com o grau de resposta da pessoa à deficiência.84 Alguns pacientes lidam bem com uma grande deformidade, enquanto outras descompensam psicologicamente quando têm que lidar com uma pequena cicatriz. Castelnuevo-Tedesco85 destacaram que, “quando um indivíduo adquire um defeito, em contraposição a alguém que nasceu com um, ele sempre tem uma sensação de perda; perda da esperança, perda de seu futuro, perda da normalidade e das ricas experiências oriundas dela”. Entretanto, quando um defeito é perinatal ou congênito, o indivíduo cresce mantendo expectativas menores sobre o que esperar de sua vida, e a sensação de perda raramente representa um problema

psicológico.86 Crianças que nascem com defeitos congênitos tem a ciência de uma experiência extraordinária, diferente das outras.

Anomalias craniofaciais Artigos anedóticos levaram à impressão de que crianças com deformidades craniofaciais são ou rejeitadas ou excessivamente protegidas por suas famílias e outros. Clifford87 descreveu as reações maternais iniciais negativas após o nascimento de uma criança deformada. Entretanto, bons estudos clínicos não confirmaram as impressões iniciais e os artigos anedóticos na literatura. Pertschuk e Whitaker88 estudaram 51 pacientes durante vários meses antes da cirurgia reconstrutiva para deformidades craniofaciais. Eles relataram que, no todo, as crianças mais novas estavam notavelmente bem adaptadas. Elas geralmente saem de casa e possuem amigos regulares. De acordo com as crianças, suas aparências não representam dificuldades na vida cotidiana. Apesar de relatarem provocações na escola, elas parecem lidar adequadamente com o ambiente escolar. Estas crianças procuraram a cirurgia por meio de seus pais, que estavam preocupados com problemas futuros, com objetivos vocacionais e socialização na adolescência. Os problemas mais frequentemente relatados neste grupo mais jovem são comportamentais. Uma pequena minoria era socialmente isolada, inibida ou agressiva. Os autores sugerem que seja qual for o trauma psicológico que estas crianças podem experimentar em decorrência da deformidade, ele se manifesta em problemas comportamentais e não em problemas de personalidade. Em contraste, pacientes mais velhos com deformidades craniofaciais não lidam bem com suas deformidades. Existem problemas com relacionamentos interpessoais e sexuais, apesar de não parecer haver dificuldades substanciais nas amizades entre pessoas do mesmo sexo. A autoestima e a imagem pessoal são afetadas adversamente neste grupo mais velho, que tem consciência de seus defeitos. Como resultado, a população mais jovem parece lidar melhor do que a mais velha, presumivelmente porque utilizam o mecanismo de defesa da negação para lidar com o problema. Também parece que lidar com relacionamentos e situações sexuais produz ansiedade, receios, autoconsciência e dúvidas na criança mais velha. Estes dados levantam a questão sobre o momento ideal para a cirurgia reconstrutiva nesta população de pacientes. Os resultados suportam as controvérsias de haver vantagens psicológicas da realização da cirurgia em um estágio mais precoce da vida, definitivamente antes do início da adolescência. Os resultados pós- operatórios de Pertschuk e Whitaker demonstram que um grupo mais jovem apresenta um melhor comportamento, menor ansiedade e talvez uma melhor socialização, ainda permitindo um melhor ajuste psicossocial no pré-operatório.88 Tanto no grupo mais jovem como no mais velho, a maioria dos pacientes e pais expressam satisfação com os resultados cirúrgicos. Os pacientes satisfeitos experimentam um impacto positivo em seus comportamentos, personalidade e autoestima. Nos pacientes e pais desapontados, observa-se pouca mudança psicossocial no pós-operatório. O trabalho geralmente confirma os achados de Macgregor de que os pacientes com maiores deformidades ficam mais satisfeitos com quaisquer mudanças cirúrgicas, mesmo que sejam pequenas.89 Geralmente, na cirurgia reconstrutiva craniofacial, o procedimento pode somente ter a esperança de transformar uma pessoa com uma grande deformidade em uma pessoa com uma deformidade menor e menos repulsiva. Os pacientes precisam ser cuidadosamente orientados sobre o que esperar após a cirurgia para minimizar o desapontamento. Algumas vezes, é melhor subestimar o ganho potencial para evitar despertar uma expectativa não realista; quando os ganhos são maiores do que o esperado, o paciente e a família provavelmente ficarão mais felizes com os resultados cirúrgicos. A melhor avaliação do sucesso da cirurgia craniofacial é o ajuste psicossocial dos pacientes após a cirurgia. Eles estão menos receosos em situações sociais? Eles se sentem livres para buscar seus objetivos ocupacionais e atividade de lazer? Eles têm prazer em suas amizades e relacionamentos? Eles são capazes de participar das atividades diárias sem inibição significante? O estudo de Allam, com mais de 15 anos de acompanhamento, registra níveis encorajadores de função social em pacientes tratados para a severamente estigmatizante síndrome de Apert.90

Cirurgia estética em adolescentes O desenvolvimento da imagem corporal ocorre em estágios, e a puberdade representa um momento

particularmente sensível, já que o adolescente sofre alterações na sua aparência física e está bastante vulnerável à opinião alheia. As alterações físicas ocorrem em quase todas as áreas do corpo. A boca fica maior, o nariz se torna proeminente e o queixo é o último a aumentar de tamanho. Os pelos corporais surgem e se tornam mais escuros, as mamas se desenvolvem, as glândulas sudoríparas se tornam ativas, a qualidade da voz muda e surgem problemas relacionados com a estatura e a acne. Conforme estas alterações físicas ocorrem, as capacidades cognitivas do adolescente se expandem. O pensamento se torna mais abstrato, multidimensional, complexo e sutil. Os adolescentes adquirem uma maior autoconsciência e desenvolvem a capacidade de autorreflexão e reflexão do pensamento alheio, utilizando outros adolescentes como uma audiência para validar e avaliar sua imagem e personalidade. Eles dependem fortemente do que os outros pensam, são vulneráveis aos seus semelhantes para validação e respondem com complexas reações emocionais.3 Neste contexto, a cirurgia plástica para corrigir uma característica verdadeiramente não atraente pode ser notavelmente bem-sucedida na mudança da imagem corporal do adolescente. Fazendo o que o adolescente e seus semelhantes consideram uma melhora na aparência, a percepção pessoal é alterada e o jovem cresce em conforto e confiança, com uma maior sensação de bem-estar. A cirurgia plástica é notavelmente livre de conflitos nesta população, e os adolescentes sofrem uma rápida reorganização da imagem pessoal após a cirurgia plástica com alterações positivas subsequentes no comportamento e nas interações interpessoais. Em 2002, os adolescentes representaram aproximadamente 3% do número total de pacientes submetidos a procedimentos de cirurgia plástica nos Estados Unidos (Tabela 3.1).91 Para estes pacientes, a cirurgia plástica ocorre no momento em que eles apresentam as maiores preocupações sobre como se tornarem atraentes, competentes e aceitáveis para outras pessoas. Em comparação com outros grupos etários, a cirurgia plástica produz pouca ansiedade e conflito emocional e é diferente da resposta destes adolescentes a outros procedimentos invasivos como a cirurgia intra-abdominal ou o reparo das lacerações faciais. Estudos investigando esta aparente ausência de conflito analisaram a rinoplastia em adolescentes, que é de longe a cirurgia mais frequentemente realizada neste grupo. Foi sugerido que este evento, quando é afirmado pela aceitação dos pais, representa uma área de consenso e pensamento comum entre os pais e a criança em um momento quando quase qualquer assunto se torna fonte de conflito. Parte da afirmação pode fluir do próprio desejo narcisista dos pais por uma criança mais bonita ou por uma sensação de culpa; o adolescente pode sentir-se aliviado, pois suas aspirações narcisistas são compartilhadas. Para o jovem, uma cirurgia plástica é um presente e não requer esforço em um tempo em que ele está sendo desafiado para ter um bom desempenho nos campos acadêmico, atlético e social. Pode haver ainda sugestões de transformações mágicas, como nas histórias infantis nas quais o patinho feio se torna um belo cisne que se destaca em relação aos seus semelhantes – novamente sem que haja nenhum esforço por parte do patinho.10,92 Tabela 3.1 Procedimentos de cirurgia plástica em pacientes com até 18 anos Nome do procedimento a

Pacientes ≤18 anos (n)

Rinoplastia

40.696

Otoplastia

3.919 (13-18 anos somente)

Lipoaspiração

3.002

Redução de mamas masculinas (ginecomastia) 2.008 Aumento da mama

3.095

Mastopexia

497

Aumento do queixo

1.316

a

Os números para mamoplastia de redução não foram incluídos na estatística.

(Dados da American Society of Plastic Surgeons. National Clearinghouse of plastic surgery statistics report. American Society of Plastic Surgeons; 2003. Disponível on-line em: www.plasticsurgery.org)

Pacientes adolescentes parecem sofrer uma rápida reorganização da imagem pessoal após a rinoplastia. A consciência prévia da parte corporal desaparece; eles tendem a esquecer como se pareciam no passado e o fato da cirurgia propriamente dita é lembrado somente de modo casual. Os pacientes abrigam um senso diminuído de invasão e, em geral, tendem a estar mais satisfeitos e agradecidos do que os pacientes mais velhos

submetidos à mesma cirurgia. Sentimentos de inferioridade podem ser substituídos pelos de autoconfiança, e a ansiedade em situações sociais tende a diminuir. Gifford92 comenta sobre as “grandes mudanças no comportamento e identidade corporal” após a rinoplastia. Exemplo de paciente Um menino de 16 anos de idade considerava que seu grande nariz em formato de bico o deixava feio, malvado, deprimido e sem um porte atlético. Sua família repetia que ele tinha boa aparência, mas ele continuava a se sentir inseguro na presença de seus colegas de turma e não se considerava atraente para as meninas. Após muita discussão, ele foi submetido a uma rinoplastia na qual o dorso foi rebaixado e a protuberância eliminada. Ele ficou feliz com o resultado, continuou na escola e progrediu bem. Dez anos mais tarde, ele foi estudado por meio de entrevistas psicológicas profundas e expressou o prazer que ele teve com a cirurgia. Ele reconheceu a cirurgia como positiva e útil e considerou que ela o libertou de uma preocupação com sua aparência, o que deixou espaço para que ele focasse em outros aspectos de sua vida. Para este paciente, assim como a maioria dos pacientes submetidos à cirurgia plástica, a cirurgia foi bemsucedida, não porque o cirurgião fez um bom trabalho no nariz, mas porque a cirurgia foi feita em um paciente que passou a se sentir mais positivo em relação a si próprio. A cirurgia tratou um desconforto da imagem corporal que deixou no coração do jovem homem um sentido de identidade.93 Nem todo adolescente que busca a cirurgia é adequado para uma operação. Maturidade emocional é necessária para a compreensão dos limites da cirurgia plástica e as complicações que podem ocorrer. Além disto, o adolescente precisa ter atingido certos marcos do crescimento ou maturidade física, dependendo do procedimento cirúrgico. A American Society of Plastic Surgeons desenvolveu um posicionamento sobre a cirurgia em adolescentes, e este cita importantes características deste tipo de pacientes.94 • O adolescente deve iniciar e reiterar seu próprio desejo pela melhoria por meio da cirurgia plástica. • Deve haver objetivos realistas e a avaliação dos benefícios e dos riscos. • Deve haver maturidade suficiente para tolerar o desconforto e o desfiguramento temporário de um procedimento cirúrgico. O posicionamento adverte contra a cirurgia plástica em adolescentes propensos a mudanças de humor ou comportamento errático, que sejam usuários de álcool ou drogas, ou que estejam sendo tratados para depressão clínica ou outra doença mental.

Seleção dos pacientes: perigos e armadilhas Fatores de risco gerais Geralmente, é conhecido que pacientes com grandes doenças psiquiátricas ou com expectativas vagas e não realistas sobre os procedimentos de cirurgia plástica apresentam maior probabilidade de insatisfação com seus resultados cirúrgicos. Entretanto, não existem critérios definíveis para a distinção dos pacientes que ficarão satisfeitos com seus resultados cirúrgicos e aqueles que ficarão insatisfeitos. A avaliação cuidadosa durante a avaliação inicial deve ser conduzida para assegurar a viabilidade do paciente como um candidato à cirurgia (Quadro 3.1). Q uadr o 3. 1 Ava lia çã o do pa cie nt e de cirurgia plá st ica Questões importantes para perguntar aos pacientes e informações buscadas pelo cirurgião durante uma avaliação de cirurgia plástica incluem: • A capacidade do paciente de ser realista em relação às expectativas para os resultados da cirurgia: as expectativas não são realistas? A orientação pode torná-las mais realistas? • A avaliação objetiva do defeito identificado e uma avaliação realista da deformidade pelo cirurgião: a queixa do paciente é desproporcional em relação à natureza do defeito (defeito “mínimo”)? • História de procedimentos estéticos prévios e grau de satisfação: como o paciente se sente sobre cirurgias prévias? O paciente é um “usuário excessivo de médicos”? • Se o paciente está satisfeito ou insatisfeito, o foco desviou para uma nova parte do corpo? • O paciente busca um resultado “perfeito”? O paciente tolerará uma cicatriz? • Indicação de motivo oculto, por exemplo, pensar que a cirurgia resultará em uma promoção no trabalho ou

em uma melhoria mágica de um casamento problemático: o paciente relaciona o sucesso da cirurgia à conquista daquele motivo? • História de doenças psiquiátricas prévias ou tratamentos: Existe uma história de depressão, ansiedade, abuso de substâncias, distúrbio obsessivo-compulsivo, fobia social ou descontrole de impulsos? • Existe algum histórico de litígio? • O grau de dano funcional: qual é o funcionamento ocupacional, social e interpessoal e o estado conjugal do paciente? • O paciente tem histórico de lesões autoinfringidas à pele ou cabelos? Quanto tempo é gasto por dia pensando sobre a parte corporal “defeituosa” ou em frente ao espelho? Quanto tempo é gasto por dia em cuidados estéticos pessoais? • Histórico de sintomas de distúrbios alimentares (anorexia, bulimia, alimentação compulsiva e vômito, abuso de laxantes): o paciente apresenta um distúrbio em relação à imagem corporal (como pensar que é muito gordo quando objetivamente não está acima do peso)? • Existe qualquer tipo de comportamento de afastamento? O paciente evita situações que possam expor ou exacerbar o defeito percebido? O paciente costuma sair de casa? • Existe histórico de comportamento suicida ou de automutilação? • O paciente está sendo pressionado por outros para ser submetido à cirurgia solicitada? • Outras pessoas significantes (cônjuge, familiares, amigos íntimos) pensam que a cirurgia solicitada não é necessária ou discordam da decisão? • Há evidências de síndrome de estresse pós-traumático (especialmente na população submetida a procedimentos reconstrutivos)? O paciente experimentou um trauma físico ou psicológico profundo, como uma lesão potencialmente letal (p. ex., queimadura)? Existem populações de pacientes, como aqueles com distúrbio corporal dismórfico, que, após uma cirurgia estética bem-sucedida, podem estar insatisfeitos, desencadear litígios contra o cirurgião, cometer suicídio, ou mesmo representar um perigo para o cirurgião com ideias e impulsos homicidas. Os cirurgiões plásticos e psiquiatras possuem a infeliz distinção de serem vítimas de homicídios e ataques com maior frequência do que médicos de outras especialidades.

Síndromes psiquiátricas preocupantes para os cirurgiões plásticos Depressão Por que é importante obter um histórico dos distúrbios de humor e determinar se o paciente está deprimido ou sofreu depressão? Estudos em psiconeuroimunologia destacaram os efeitos negativos da depressão no curso da cicatrização e recuperação pós-operatória e em seu impacto na morbidade e mortalidade. A atividade das células natural killer, a atividade de células helper (CD4) e supressoras (CD8), o número de linfócitos T e a resposta mitogênica dos linfócitos são afetados negativamente pela depressão.95 Similarmente, estas alterações são encontradas em pacientes submetidos a estresse significante, como o estresse relacionado com trabalho, divórcio, privações ou cuidados de pacientes com doença de Alzheimer.95 Como consequência, o cirurgião plástico deve tentar evitar a realização de um procedimento eletivo em indivíduos com depressão. A prevalência de todos os distúrbios depressivos está entre 9% e 20% da população norte-americana (Quadro 3.2). A incidência de depressão maior é mais elevada em pacientes clinicamente doentes e em indivíduos que experimentam separações ou divórcios quando comparados à população geral.96 Uma depressão maior está presente em até 18% dos pré-adolescentes e em aproximadamente 5% dos adolescentes, apesar de haver registros de sintomas depressivos em até um terço dos adolescentes nos EUA.97 A depressão está associada a um uso elevado dos serviços médicos.98 Q uadr o 3. 2 Episódio de pre ssivo m a ior: crit é rios dia gnóst icos DSM- IV A Cinco (ou mais) dos sintomas a seguir presentes durante o mesmo período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao funcionamento prévio; pelo menos um dos sintomas é (1) humor deprimido ou (2) perda do interesse ou prazer.

Nota: Não inclua sintomas que claramente sejam causados por uma condição clínica geral, ou delírios incongruentes do humor ou alucinações. 1. Humor deprimido durante a maior parte do dia, indicado por um relato subjetivo (p.ex., se sente triste ou vazio) ou observação feita por outros (p. ex., parece triste). Nota: Em crianças e adolescentes, pode ser humor irritável. 2. Interesse ou prazer reduzido em todas, ou quase todas, as atividades do dia, quase todos os dias (indicado por uma observação subjetiva ou observação feita por outros). 3. Perda de peso significante em um indivíduo que não está em dieta ou ganho de peso (p. ex., uma mudança de mais de 5% do peso corporal em 1 mês), ou aumento ou diminuição do apetite quase todos os dias. Nota: Em crianças, considerar falha em obter os ganhos de peso esperados. 4. Insônia ou hipersonia quase todos os dias. 5. Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observável por outros, não meramente sensações subjetivas de inquietação ou desânimo). 6. Fadiga ou perda da energia quase todos os dias. 7. Sensações de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada (que pode ser ilusória) quase todos os dias (não meramente uma autocensura ou culpa por se sentir doente). 8. Capacidade reduzida de pensar ou concentrar, indecisão, quase todos os dias (tanto uma sensação subjetiva como observada por outros). 9. Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideias suicidas recorrentes sem um plano específico ou tentativa de suicídio ou um plano específico para cometer suicídio. B Os sintomas não atingem os critérios para um episódio misto. C Os sintomas causam incômodo clinicamente significante ou prejuízos em áreas de funcionamento sociais, ocupacionais ou outras áreas importantes. D Os sintomas não são causados pelos efeitos psicológicos diretos de uma substância (p. ex., abuso de drogas ou um medicamento), ou uma condição clínica geral (p. ex., hipotireoidismo). E Os sintomas não são causados por luto, ou seja, após a perda de uma pessoa amada, os sintomas persistem por mais de 2 meses ou caracterizados por um dano funcional acentuado, preocupação mórbida com inutilidade, ideias suicidas, sintomas psicóticos ou retardo psicomotor. Reimpresso com permissão de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, © 2000 American Psychiatric Association.

Aproximadamente 50% das depressões podem estar “mascaradas”, ou seja, não óbvias ou facilmente reconhecidas.26 Uma depressão mascarada é suspeitada se o paciente está passando por um nível mais elevado de conflitos conjugais ou familiares, uso aumentado de álcool, problemas no desempenho do trabalho ou absenteísmo excessivo, ociosidade ou desempenho escolar insuficiente, afastamento social ou uma aparente falta de motivação. O aumento da irritabilidade ou exagero dos traços usuais da personalidade algumas vezes podem ser pistas para esta possibilidade. Se o cirurgião suspeita de um distúrbio depressivo, ele deve encaminhar o paciente para uma consulta psiquiátrica, explicando como a cicatrização e a recuperação podem ser afetadas adversamente pela presença de depressão. O paciente é aconselhado de que após o tratamento apropriado e a recuperação da depressão, a cirurgia pode ser reconsiderada.

Ansiedade generalizada e distúrbios do pânico Os distúrbios de ansiedade são as doenças psiquiátricas mais comuns (Quadro 3.3). Na avaliação de um paciente, o cirurgião deve tentar distinguir entre as ansiedades típicas que os pacientes experimentam antes de uma cirurgia e um distúrbio de ansiedade. As ansiedades típicas são preocupações sobre a anestesia, preocupações sobre o grau de dor e receios sobre a perda do controle.99 Q uadr o 3. 3 Dist úrbio de a nsie da de ge ne ra liz a do: crit é rios dia gnóst icos DSM-

IV A Ansiedade e preocupação excessiva (expectativa apreensiva), ocorrendo na maioria dos dias por pelo

menos 6 meses, sobre diversos eventos (como desempenho no trabalho ou na escola). B A pessoa considera difícil controlar a preocupação. C A ansiedade e preocupação estão associadas a três (ou mais) dos seguintes seis sintomas (com pelo menos alguns sintomas presentes na maioria dos dias durante os últimos 6 meses). Nota: Somente um item é necessário em crianças. 1. Inquietação ou sensação de aprisionamento ou de estar no limite. 2. Fadiga. 3. Dificuldade de concentração ou lacunas de pensamento. 4. Irritabilidade. 5. Tensão muscular 6. Distúrbios do sono (dificuldade para dormir ou manter o sono, ou sono inquieto e não satisfatório). D O foco da ansiedade e da preocupação não está confinado às características de um distúrbio clínico (Axis I), por exemplo, a ansiedade ou preocupação não é sobre um ataque de pânico (como em um distúrbio do pânico); ficar embaraçado em público (fobia social); estar contaminado (como em um distúrbio obsessivo-compulsivo); estar longe de casa ou de parentes próximos (como em um distúrbio de ansiedade de separação); ganho de peso (como na anorexia nervosa); queixas físicas múltiplas (como no distúrbio da somatização); ou de ser portador de uma doença séria (como na hipocondria), e a ansiedade e preocupação não ocorrem exclusivamente durante um distúrbio de estresse pós-traumático. E A ansiedade, a preocupação ou sintomas físicos causam incômodo clinicamente significante ou dano em áreas sociais, ocupacionais ou outras áreas importantes do funcionamento. F Os distúrbios não são causados por efeitos psicológicos diretos de uma substância (p. ex., abuso de drogas ou uma medicação) ou uma condição médica geral (p. ex., hipertireoidismo) e não ocorrem exclusivamente durante um distúrbio do humor, distúrbio psicótico ou um distúrbio de desenvolvimento invasivo. Reimpresso com permissão de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, © 2000 American Psychiatric Association.

A ansiedade atinge níveis patológicos quando existe uma preocupação excessiva que o paciente considera difícil controlar. A preocupação pode ser acompanhada por uma fadiga inexplicável, dificuldade de concentração, irritabilidade, distúrbios do sono, inquietação e tensão muscular generalizada.26 A ansiedade ou os sintomas físicos associados podem estar interferindo com o funcionamento ocupacional, social ou interpessoal. Ataques de pânico, uma forma de distúrbio de ansiedade, são descritos como períodos discretos de medo ou desconforto intenso, que se desenvolvem subitamente atingindo seu pico em um período de 10 minutos. Os pacientes relatarão uma ou todas as seguintes sensações físicas: palpitações, sudorese, tremores, sensação de falta de ar, dor ou desconforto torácico, náusea ou incômodo abdominal, tonteiras, desrealização (sentimento irreal) ou despersonalização (sentir-se fora do próprio corpo), medo de perder o controle ou de morrer, torpor e formigamentos, calafrios ou surtos de calor. Se o cirurgião identifica sintomas de ansiedade, é importante tratá-los antes da cirurgia. As ansiedades típicas previamente discutidas geralmente podem ser dissipadas com explicações e suporte. Quando existe um distúrbio de ansiedade, a orientação psiquiátrica deve ser obtida, e o psiquiatra pode colaborar com o cirurgião plástico na tomada de decisão sobre o momento ideal para a cirurgia e observar o paciente após a cirurgia se esta for realizada.

Distúrbios alimentares Distúrbios alimentares são doenças caracterizadas por problemas no comportamento alimentar e percepções sobre os alimentos e a alimentação. A anorexia nervosa é uma doença caracterizada pela recusa de manter um peso corporal minimamente normal e um distúrbio significante na percepção do indivíduo sobre o formato ou tamanho do corpo (Quadro 3.4).26 Estes pacientes geralmente diminuem de peso por meio da redução na ingestão total de alimentos, mas também pode purgar (vômitos autoinduzidos ou uso errôneo de laxativos ou diuréticos) ou se engajar em atividades físicas excessivas. Alguns pacientes anoréticos apresentarão sinais e sintomas físicos de fome, incluindo amenorreia, constipação, dor abdominal, intolerância ao frio, letargia ou excesso de energia, hipotensão, hipotermia, bradicardia e ressecamento da pele. Alguns desenvolverão lanugo,

pelos finos e aveludados no tronco. A bulimia nervosa se caracteriza pela ingestão compulsiva de alimentos e métodos compensatórios inapropriados para prevenir contra o ganho de peso (Quadro 3.5).26 A compulsão geralmente ocorre secretamente e continua até que o indivíduo fique fisicamente desconfortável. Indivíduos com bulimia nervosa podem empregar vômitos autoinduzidos, laxantes e diuréticos para compensar a alimentação excessiva. Pacientes com bulimia nervosa tipicamente estão dentro da variação normal de peso, apesar de poderem estar levemente abaixo ou acima do peso. Em ambas as síndromes, pode haver distúrbios do humor. Naqueles que induzem vômitos, o esmalte dental pode apresentar erosões. Desequilíbrio eletrolítico e anormalidades hematológicas podem ser observados. Q uadr o 3. 4 Anore x ia ne rvosa : crit é rios dia gnóst icos DSM- IV A Recusa em manter o peso corporal em um determinado peso ou acima de um peso minimamente normal para a idade e altura (p. ex., perda de peso levando a uma manutenção do peso corporal de menos de 85% do esperado; ou falha em atingir o ganho de peso esperado durante o período do crescimento, levando a um peso corporal abaixo de 85% do esperado). B Intenso receio de ganhar peso ou de ser obeso, mesmo estando abaixo do peso. C Distúrbio no modo que seu peso ou forma corporal é experimentado, influência indevida no peso ou forma corporal na autoavaliação, ou negação de uma perda de peso atual séria. D Nas mulheres pós-menarca, amenorreia, ou seja, a ausência de pelo menos três ciclos menstruais consecutivos. (Uma mulher é considerada em amenorreia se suas menstruações ocorrem somente após a administração de hormônios, p. ex., estrogênios).

Especificar tipo Tipo restritivo: durante o episódio atual da anorexia nervosa, a pessoa não se engaja regularmente em um comportamento de alimentação compulsiva ou purgação (p. ex., vômitos autoinduzidos ou uso incorreto de laxativos, diuréticos ou clister). Tipo alimentação compulsiva/purgação: durante o episódio atual de anorexia nervosa, a pessoa regularmente se engaja em um comportamento de alimentação compulsiva ou purgação (p. ex., vômitos autoinduzidos ou uso incorreto de laxativos, diuréticos ou clister). Reimpresso com permissão de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, © 2000 American Psychiatric Association.

Q uadr o 3. 5 Bulim ia ne rvosa : crit é rios dia gnóst icos DSM- IV A Episódios recorrentes de alimentação compulsiva. Um episódio de alimentação compulsiva se caracteriza por: 1. Comer, em um período curto de tempo (p. ex., dentro de qualquer período de 2 horas), uma quantidade de alimentos que é definitivamente maior do que a maioria das pessoas comeria durante um período similar de tempo e sob circunstâncias similares. 2. Uma sensação de falta de controle alimentar durante o episódio (p. ex., uma sensação de que não consegue parar de comer ou controlar o quanto está comendo). B Comportamento compensatório inapropriado recorrente de modo a prevenir o ganho de peso, como vômitos autoinduzidos; uso incorreto de laxantes, diuréticos, clisteres ou outros medicamentos; jejuns ou exercícios excessivos. C A alimentação compulsiva e os comportamentos compensatórios inapropriados ocorrem, na média, pelo menos duas vezes por semana durante 3 meses. D A autoavaliação é influenciada excessivamente pela forma e pelo peso corporal. E O distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia nervosa.

Especificar tipo Tipo purgativo: durante o episódio atual de bulimia nervosa, a pessoa se engaja regularmente no uso de vômitos autoinduzidos ou uso incorreto de laxantes, diuréticos ou clisteres. Tipo não purgativo: durante o episódio atual de bulimia nervosa, a pessoa utiliza outros comportamentos compensatórios inapropriados, como jejuns ou exercícios em excesso, mas não se engaja regularmente em atividades de vômitos autoinduzidos ou uso incorreto de laxantes, diuréticos ou clisteres.

Reimpresso com permissão de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, © 2000 American Psychiatric Association.

A esmagadora maioria dos pacientes com distúrbios alimentares é do sexo feminino e, quando buscam a cirurgia plástica, geralmente pedem por uma cirurgia nas mamas ou lipoaspiração. Entretanto, em virtude do distúrbio em suas imagens corporais, os pacientes com distúrbios alimentares não se beneficiam da cirurgia plástica. A cirurgia pode nunca combinar a imagem corporal que os pacientes fantasiam com o resultado estético. Para o bem destes pacientes, é apropriado recusar a cirurgia estética e encaminhá-los para uma consulta psiquiátrica.

Abuso de substância Informações sobre abuso de substâncias não são divulgadas rotineiramente pelos médicos, especialmente quando não existem evidências explícitas para sugerir um problema. Além disto, existem opiniões variáveis sobre o que constitui “abuso”. O almoço com três martínis pode ser alarmante para alguns médicos, mas não para outros. Existem vários bons motivos para que o cirurgião plástico faça um questionamento do paciente sobre o uso de drogas e álcool. Primeiro, o paciente pode desenvolver sinais de abstinência a drogas e álcool no período pós- -operatório; se o médico não tem informações ou suspeitas para considerar uma abstinência, o diagnóstico e o tratamento podem demorar, o que aumenta a morbidade e a mortalidade. Segundo, substâncias como o álcool podem ter um impacto negativo sobre a recuperação e o processo de reabilitação.100-102 Terceiro, a dependência de substâncias, especialmente de drogas como os opiáceos, tem impacto direto no tratamento da dor durante o pós-operatório. Finalmente, a dependência pode ser um sintoma de condição psiquiátrica subjacente, como depressão ou ansiedade.

Distúrbio corporal dismórfico: “feiura imaginada” O distúrbio corporal dismórfico (DCD)103 é um distúrbio psiquiátrico no espectro dos distúrbios obsessivoscompulsivos (Quadro 3.6). Os indivíduos atingidos se consideram feios, a despeito de terem uma aparência normal, e procuram cirurgiões plásticos para cirurgias estéticas sem perceber o quadro psicológico de suas preocupações. Eles se submetem a rotinas compulsivas repetitivas como checagem frequente do espelho, grande tempo gasto com a arrumação e mania de limpeza da pele.104 Pacientes com DCD geralmente têm pouca ou nenhuma ciência de seus distúrbios, e alguns são francamente delirantes, convencidos que o defeito é real.105 Os defeitos corporais imaginados são focados principalmente na face, mas também podem se concentrar nos cabelos, mãos, pés e partes sexuais. Q uadr o 3. 6 Dist úrbio dism órfico corpora l: crit é rios dia gnóst icos DSM- IV 1. Uma preocupação com um defeito leve ou inexistente na aparência. Se uma leve anomalia física está presente, a preocupação da pessoa é acentuadamente excessiva. 2. A preocupação causa um estresse clinicamente significante ou dano em áreas sociais, ocupacionais ou outras áreas importantes do funcionamento. 3. A preocupação não é melhor explicada por outro distúrbio mental (p. ex., insatisfação com o formato ou tamanho corporal caracterizando anorexia nervosa). Reimpresso com permissão de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, © 2000 American Psychiatric Association.

A preocupação, a ansiedade e a autoconsciência conectadas ao DCD podem levar a interferências com o funcionamento do dia a dia (ocupacionais, sociais e interpessoais), e uma porcentagem significante dos pacientes com DCD pode se isolar.106 Estes pacientes podem experimentar preocupação excessiva com seus defeitos físicos imaginados até o nível de pensamento delirante ou psicótico; alguns destes pacientes podem ter tendências suicidas ou tentativas reais de suicídio.107,108 Existem fortes evidências de que pacientes com DCD não se beneficiam da cirurgia estética. Phillips e Diaz109 publicaram em seu estudo que 83% dos procedimentos realizados em pacientes com DCD levaram a uma exacerbação ou não alteração dos sintomas. Um estudo feito por Veale110 revelou que 76% dos pacientes com DCD submetidos a cirurgias estéticas revelaram insatisfação com o resultado pós-operatório.

Com cirurgias estéticas repetidas, pacientes com DCD na realidade podem piorar, geralmente desenvolvendo uma aparência grotesca gerada pela cirurgia. Este resultado desencadeia um círculo vicioso que busca novas operações. Com estimativas de que entre 50% e 80% dos pacientes com DCD foram submetidos a procedimentos estéticos,111 é extremamente importante detectar sinais de DCD. Determinar se um paciente candidato à cirurgia plástica tem DCD não é fácil. Julgamentos sobre a beleza e a feiura e se o defeito pode ser categorizado como “leve” são inerentemente subjetivos. Somente se a preocupação com o defeito leve ou imaginado é excessiva em comparação com a aparência objetiva é que o diagnóstico de DCD é feito com facilidade. Houve alguns trabalhos que tentaram diferenciar o paciente com DCD de outros pacientes submetidos a cirurgias estéticas. Um estudo de Aronowitz et al 112 pesquisou de modo controlado as diferenças entre os pacientes com DCD e outros pacientes de cirurgia plástica. Concluíram que os pacientes com DCD apresentavam maior probabilidade de relatar preocupação por mais de 1 hora por dia; maior ansiedade associada, depressão e obsessão; maior desacordo com outros em relação ao defeito; maior dano funcional associado; maior crença fixa na realidade do defeito. Os pacientes tenderam a buscar várias consultas com cirurgiões plásticos e dermatologistas até encontrarem um que lhes desse o tratamento desejado. Além de considerarem seus defeitos mais sérios, pacientes com DCD se preocupam com um número maior de defeitos corporais do que outros pacientes de cirurgia estética e sentem menor satisfação com as cirurgias anteriores. Após procedimentos estéticos, pacientes com DCD podem mudar a preocupação para outras áreas do corpo ou aspectos de sua aparência ou mesmo aumentar seu nível pré-operatório de insatisfação, já que podem não atingir a imagem idealizada da parte do corpo em questão. Como há uma grande distorção da imagem corporal, uma alteração estética improvavelmente corrigirá esta distorção. Mesmo quando há um resultado objetivamente satisfatório, o paciente com DCD pode processar o médico ou se tornar violento com o cirurgião, ou pode se tornar perigoso em relação a si mesmo. Alguns pacientes com DCD podem cometer automutilações na tentativa de alterar suas aparências. Se o cirurgião, ao avaliar um paciente, suspeitar que possa ser portador de DCD, uma avaliação psiquiátrica deve ser solicitada e fortemente encorajada. O cirurgião pode encontrar grande resistência ao sugerir uma consulta psiquiátrica; o cirurgião não deve realizar a cirurgia solicitada no paciente. Existe tratamento psiquiátrico para o paciente com DCD. Psicoterapia, especialmente com técnicas cognitivas-comportamentais,113 pode ser útil e geralmente é utilizada em conjunção com a psicofarmacologia. Estas técnicas tentam reestruturar o pensamento distorcido. Clomipramina, um potente inibidor da receptação da serotonina, se mostrou efetivo e superior a desipramina, um inibidor seletivo da receptação da norepinefrina na melhora dos sintomas de DCD.114 Além disto, outros inibidores da receptação da serotonina, como a fluoxedina, citalopram, fluvoxamina, sertralina e paroxetina podem ser úteis, mas precisam ser administrados em doses mais elevadas e por maior período de tempo do que o padrão usado no tratamento da depressão. O DCD em homens é um distúrbio sub-reconhecido.115,116 Um estudo feito por Garner117 concluiu que a porcentagem de homens insatisfeitos com sua aparência geral é de 43%, número que triplicou nos últimos 25 anos, e que homens parecem ter níveis de insatisfação com sua aparência semelhantes aos das mulheres. Da mesma forma, o DCD parece afetar tanto homens como mulheres. Mayville et al 118 encontraram que 2,8% das mulheres e 1,7% dos homens em uma amostra da comunidade com 556 adolescentes preencheram os critérios para DCD. Alguns investigadores encontraram uma maior proporção de homens do que de mulheres com DCD, e a maior amostra publicada de pacientes com DCD revelou a presença de 51% de homens.109 A dismorfia muscular é um distúrbio recém-descrito caracterizado pela preocupação com a ideia de que o corpo não é suficientemente condicionado e musculoso.119 Ela envolve um distúrbio da imagem corporal similar ao visto na anorexia. Esta preocupação pode interferir com áreas importantes do funcionamento; os pacientes geralmente têm uma necessidade compulsiva de manter sua rotina de atividade física e dieta, podem utilizar substâncias que melhoram a performance, a despeito do conhecimento de consequências psicológicas ou físicas e geralmente têm receio de mostrar seus corpos em público. Em um estudo de 1997 com 156 fisiculturistas não selecionados, 10% se percebiam menos musculosos do que objetivamente eram.120 Outro estudo em 1997 com 193 homens e mulheres com DCD demonstrou que 9,3% apresentavam dismorfia muscular.121

Comportamento violento A violência é algo que todos os médicos corretamente temem. Não há como prever se um paciente será

violento. O papel da psicopatologia e violência é assunto de longos debates. Existem evidências que certas categorias de pacientes psiquiátricos formam grande parte dos grupos violentos. Pacientes com distúrbios psicóticos, como a esquizofrenia paranoide, representam um maior risco de comportamento violento.122 Entretanto, distúrbios não psicóticos também estão geralmente associados ao comportamento violento,123 particularmente os distúrbios limítrofes e de personalidade antissocial. O álcool e as drogas geralmente estão associados à violência. A violência pode ser propositada: para o propósito de conseguir drogas ou dinheiro. Pode estar relacionada com a diminuição de inibições contra comportamentos violentos ou antissociais causadas por substâncias ou diminuição da atenção cognitiva, resultando em julgamento prejudicado. Por este motivo, o rastreamento para a presença de abuso de substâncias, bem como para severos distúrbios de personalidade e psicóticos, deve ser uma parte essencial da avaliação da cirurgia plástica em um potencial paciente.

Estratégias para o manejo do paciente insatisfeito Existem várias discussões na literatura sobre o porquê de pacientes estarem insatisfeitos com os resultados de suas cirurgias plásticas. Hoopes e Knorr124 concluíram que pacientes cuja preocupação principal é resolver dificuldades nas relações interpessoais e aqueles cuja principal expectativa é que outros mudem seu comportamento em relação a eles têm o maior nível de insatisfação com suas cirurgias e a maior incidência de problemas pós-operatórios. Linn125 afirma que o “principal problema pré-operatório com esses pacientes não é psiquiátrico”, mas sim uma má decisão feita pelo cirurgião sobre a existência de uma deformidade corrigível. Certamente, como a síndrome do transtorno dismórfico corporal tem sido melhor compreendida, é provável que muitos pacientes insatisfeitos possuam esse transtorno, que não foi diagnosticado pelo cirurgião plástico. Gifford92 se questiona “por que existem tantos resultados favoráveis mesmo em pacientes com motivações neuróticas e psicopatologia severa, e por que existem estas reações emocionalmente malignas nas raras falhas.” Ele opina que “todas as sequelas emocionais sérias não podem ser previstas e impedidas sem recusar a cirurgia para muitos pacientes que provavelmente teriam um curso sem intercorrências.” Ele também sugere que o caráter severo da patologia (p. ex., distúrbio da personalidade limítrofe) geralmente está presente no paciente insatisfeito. Reich126 concluiu que a existência de psicopatologia não é uma contraindicação para a cirurgia plástica, mas deve ser vista em relação a dois critérios: (1) se as expectativas para a cirurgia são realistas e (2) a capacidade do paciente de tolerar um resultado imperfeito. Uma das decisões mais significantes que o cirurgião plástico faz é se deve realizar o procedimento cirúrgico solicitado. A satisfação do paciente não é necessariamente previsível, mesmo após um exame psiquiátrico cuidadoso.127 Entretanto, vários fatores psicológicos que geralmente estão presentes na avaliação inicial devem ser considerados contraindicações para a cirurgia plástica (Quadro 3.7). A característica por trás da maior parte das insatisfações na cirurgia plástica é uma falha na comunicação entre o paciente e o cirurgião. Esta falha na comunicação pode levar a um círculo vicioso, descrito por Gorney.128 O desapontamento, raiva ou frustração do paciente gera hostilidade, defesa e arrogância reativa por parte do cirurgião, o que aprofunda a raiva do paciente, levando a eventuais desentendimentos. O paciente insatisfeito deve ser gerenciado cuidadosamente para evitar este processo (Quadro 3.8). Q uadr o 3. 7 C ont ra indica çõe s psicológica s pa ra a cirurgia plá st ica • O paciente está incerto sobre qual aspecto da aparência deseja mudar. • O paciente é incapaz de tolerar um resultado imperfeito. • O paciente possui um distúrbio de personalidade instável ou uma grande doença psiquiátrica não tratada. • O paciente tem expectativas irrealistas sobre a cirurgia que não se modificam após orientações. • O paciente está sob estresse emocional durante a consulta ou no momento da cirurgia planejada. • O paciente se queixa da oposição de outras pessoas de seu trato social, como membros familiares, à cirurgia planejada. • O paciente é motivado a se submeter ao procedimento cirúrgico por pedido ou pressão de outros. • No caso de revisão de uma cirurgia prévia, o cirurgião considera o resultado anterior razoável a despeito

das queixas vocais do paciente e a insatisfação com o resultado. • O paciente é um “usuário excessivo de médicos” e está insatisfeito com os resultados de múltiplos procedimentos prévios. • O paciente baseia o sucesso da cirurgia na realização de um objetivo particular (p. ex., a resolução de problemas conjugais ou uma promoção no trabalho). Q uadr o 3. 8 Ge re ncia m e nt o do pa cie nt e insa t isfe it o • Lembre que a insatisfação do paciente geralmente é transitória e relacionada com as alterações psicológicas pós-operatórias. Dê apoio e compreensão, deixando que o paciente expresse seus sentimentos. • Avalie frequentemente os pacientes insatisfeitos e demonstre preocupação e compaixão. Permita que o paciente sinta que você é um aliado na solução do problema. • Não fique com raiva do paciente. A raiva pode criar uma situação adversa e fazer com que ele se sinta abandonado e isolado. O paciente responderá com uma posição de defesa e raiva, e isto pode aumentar a probabilidade de um questionamento jurídico. • Considere uma oferta de cirurgia de revisão se concordar com as queixas e insatisfação do paciente, mas somente se você considerar que pode melhorar a aparência. • Sugira um “período de espera” antes de realizar qualquer cirurgia adicional para permitir que o paciente viva com a aparência atual e integre-a de modo mais completo à imagem corporal. • Sente-se com o paciente e tenha uma discussão franca sobre as queixas. Responda às queixas, uma a uma e expresse os problemas que está experimentando nos cuidados do paciente, incluindo obstáculos que ele possa estar criando e impedindo o tratamento ideal. Sempre tome um posicionamento aliado e companheiro com o objetivo de obter satisfação do paciente, mas informe-o quando não puder atingir as expectativas. Se você concluir que as expectativas não são realistas, tente orientar pacientemente seu cliente, utilizando fotografias ou quaisquer outros dados que você considere adequados para demonstrar com precisão um resultado cirúrgico razoável. • Se o paciente está irremediavelmente aborrecido com você ou você com ele, e não parece haver nenhum esforço positivo entre vocês, simplesmente diga que a relação não pode ser mais produtiva e encaminhe o paciente a um de seus colegas, oferecendo ajuda durante a transição para o novo cirurgião, assegurando que ela ocorrerá o mais suavemente possível.

Conclusão A necessidade de uma entrevista significativa com o paciente que solicita um procedimento de cirurgia plástica, seja por motivos estéticos ou reconstrutivos, não pode ser desprezada. O cirurgião plástico pode ser guiado a fazer decisões sólidas sobre a oferta da cirurgia solicitada para um paciente sendo atento às motivações psicológicas e preocupações com a imagem corporal, além de estar alerta para distúrbios psiquiátricos e sinais de atenção para um paciente problemático. A falha em reconhecer os riscos potenciais e a intuição sobre um paciente pode resultar em insatisfação. Solicitar uma avaliação psiquiátrica para ajudar na tomada de decisão e o trabalho colaborativo durante o período pré e pós-operatório (se a decisão for pela cirurgia) geralmente são fatores úteis. A apresentação do psiquiatra como um membro da equipe cirúrgica para auxiliar no ajuste da imagem corporal e outros aspectos psicológicos pode encorajar a colaboração e permitir que o paciente se sinta mais confortável com a consulta. Mesmo com a possibilidade de perder o paciente após a sugestão de uma avaliação psiquiátrica, é melhor não operar um paciente que pode não se satisfazer com os resultados. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  17. Moss, T. P., Harris, D. L. Psychological change after aesthetic plastic surgery: a prospective controlled outcome study. Psychol Health Med. 2009; 14:567–572. Apesar de a cirurgia estética ser realizada para solucionar problemas

relacionados com a imagem pessoal, o que está intimamente ligado ao estado emocional do indivíduo, a resposta psicológica a estes procedimentos raramente é avaliada de modo rigoroso. Este estudo prospectivo avalia essa relativa lacuna na literatura.

18. Dayan, S. H., Arkins, J. P., Patel, A. B., et al. A double blind, randomized, placebo-controlled healthoutcomes survey of the effect of botulinum toxin type a injections on quality of life and self-esteem. Dermatol Surg. 2010; 36(Suppl. 4):2088–2097. 19. Murphy, D. K., Beckstrand, M., Sarwer, D. B. A prospective, multi-center study of psychosocial outcomes after augmentation with natrelle silicone-filled breast implants. Ann Plast Surg. 2009; 62:118–121. 20. Sarwer, D. B., Infield, A. L., Baker, J. L., et al. Two-year results of a prospective, multi-site investigation of patient satisfaction and psychosocial status following cosmetic surgery. Aesthet Surg J. 2008; 28:245–250. 36. Friel, M. T., Shaw, R. E., Trovato, M. J., et al. The measure of face-lift patient satisfaction: the Owsley Facelift Satisfaction Survey with a long-term follow-up study. Plast Reconstr Surg. 2010; 126:245–257. 42. Zahiroddin, A. R., Shafiee-Kandjani, A. R., Khalighi-Sigaroodi, E. Do mental health and self-concept associate with rhinoplasty requests? J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2008; 61:1100–1103. 63. Iwuagwu, O. C., Stanley, P. W., Platt, A. J., et al. Effects of bilateral breast reduction on anxiety and depression: results of a prospective randomised trial. Scand J Plast Reconstr Surg Hand Surg. 2006; 40:19– 23. Esta pesquisa prospectiva foi projetada para examinar os benefícios psicológicos da redução de mama em pacientes com hipermastia. Os autores relatam melhorias significantes nos sintomas de depressão.

90. Allam, K. A., Wan, D. C., Khwanngern, K., et al. Treatment of Apert syndrome: a long-term follow-up study. Plast Reconstr Surg. 2011; 127:1601–1611. Aqui é apresentada uma avaliação de longo prazo sobre os resultados após o tratamento cirúrgico da síndrome de Apert. Os autores relatam resultados psicológicos positivos nesta população.

102. Akinbami, F., Askari, R., Steinberg, J., et al. Factors affecting morbidity in emergency general surgery. Am J Surg. 2011; 201:456–462. 108. Bjornsson, A. S., Didie, E. R., Phillips, K. A. Body dysmorphic disorder. Dialogues Clin Neurosci. 2010; 12:221–232.

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O papel da ética na cirurgia plástica Phillip C. Haeck

Resumo A ética vista pelas associações de profissionais. Relações éticas com pacientes. A ética da propaganda. O papel da ética no consultório ambulatorial. Ética na sala de cirurgia Relações éticas com outros provedores e terceiros pagadores. A ética do depoimento de testemunho de especialista. Resumo.

O tema da ética permeia a especialidade da cirurgia plástica. As decisões éticas são altamente prevalentes em seus praticantes, mas poucos percebem que enfrentam essas escolhas regularmente, quase diariamente. Comportar-se de maneira moralmente responsável, manter códigos pessoais de conduta elevados e manter-se competente nas operações é uma função não cognitiva para a maioria dos cirurgiões; está profundamente enraizada na psique. Também é bem útil ao cirurgião na apresentação de sua reputação altamente considerada e merecida entre os colegas e o público. Quem operar e, mais importante ainda, quem não operar, pode, em muitos casos, ser um dilema que exige escolhas morais. Mas, muitas vezes, a lógica funciona no subconsciente do cirurgião, uma decisão a mais dentre dezenas tomadas diariamente, com apenas alguns momentos para avaliar as alternativas. Os cirurgiões plásticos não vão para casa para encontrar seus cônjuges todas as noites e declarar que fizeram inúmeras escolhas altamente éticas hoje. Ainda, na realidade, os efeitos de não fazer as escolhas certas pode criar armadilhas e embaraços. Romper códigos morais não escritos e escritos pode trazer consequências nesta especialidade. O dano pode ser causado aos outros. O efeito adverso em geral é o dilema do cirurgião. Considere este cenário comum. Uma paciente consulta o cirurgião plástico para uma rinoplastia, com queixa de má respiração e uma fratura antiga. Ela também não gosta da forma da ponta do nariz. Ela alega que não tem dinheiro para qualquer pagamento particular das despesas envolvidas. Mas também afirma ter mais de meia dúzia de amigos que querem uma mudança de seus narizes e afirma que vai levá-los ao encontro do cirurgião em cada uma de suas consultas subsequentes. O cirurgião concorda em cobrar da companhia de seguros todo o procedimento, esperando no fim capturar mais negócios do paciente amigável e social, decidindo que é uma prevaricação justificável. Este é um dilema ético? As questões morais desta história tornam-se um emaranhado quando a companhia de seguros suspeita que pagou por uma parte da cirurgia que era estética e não funcional. Poucos meses depois, o paciente recebe uma negação de pagamento da empresa para o que eles determinaram como sendo a parte estética de seus encargos de anestesia, taxa das instalações e honorários do cirurgião. Subitamente, ela é obrigada a pagar uma quantia considerável de dinheiro e, por sua vez, implora ao cirurgião para descontar o saldo, pois ela ainda não consegue arcar com a diferença. O cirurgião cometeu fraude? Sua decisão de promover sua prática cometendo uma trapaça foi imoral? Se ele

se recusa a liberar o paciente financeiramente, isso afetará sua reputação com seus amigos que estão agora assumindo sua própria cirurgia? Mesmo se ele tomou sua primeira decisão que levou a essa situação casualmente ele não pode fazer essa escolha sem algum grau de cálculo moral. Considere outra situação. Um diabético não segurado de 65 anos de idade é atropelado por um ônibus e sofre uma fratura composta de tíbia-fíbula e lesão de desluvamento de um terço da parte inferior da perna. Ele é fumante e insulino-dependente. Após a fratura ser estabilizada consulta-se o cirurgião plástico sobre a cobertura de tecido mole do defeito considerável. Sabendo-se que a zona de esmagamento é extensa e há comprometimento do fluxo sanguíneo para a parte inferior da perna, o cirurgião deve decidir se uma cirurgia longa e cara com uma chance modesta, mas real, de insucesso, vale o esforço e o custo. Com uma amputação abaixo do joelho as chances de que este homem deambule em uma prótese são boas, mas não garantidas. A recuperação prolongada de uma cirurgia valiosa de salvamento de membro será a melhor escolha? O cirurgião sabe que não será reembolsado por seus esforços. Sua decisão, se feita em padrões elevados, é baseada no que é correto para o paciente, e não para o cirurgião. Essas escolhas são encontradas em situações semelhantes diariamente pelos cirurgiões plásticos de todo o país. A maneira como se lida com esses tipos de cenários é multifatorial, complexa e exige várias decisões sofisticadas. Não é imoral ou antiético dizer não nessas situações. Pessoas altamente éticas têm um código moral interno bem desenvolvido. Elas procedem em conformidade e acreditam que fazer qualquer coisa menos seria torná- las culpadas de imoralidade. Compare isso com um sociopata que não tem capacidade para culpa, faz escolhas que ele sabe que irão deliberadamente prejudicar os outros e, em seguida, nega responsabilidade para as consequências. As pessoas que vivem em extremos deste espectro são raras. A maioria encaixa-se em algum lugar no meio disso, o anjo em um ombro e o diabo no outro. Os cirurgiões, eles próprios, não são diferentes, embora tenham todos supostamente feito o juramento de Hipócrates de “acima de tudo, não causar dano.” O treinamento de cirurgiões resulta em um comportamento que é compatível com o caráter moral dos modelos de função com os quais o cirurgião aprendeu, tanto em um efeito positivo quanto negativo, por vezes cheio de admiração, outras vezes cheio de ódio. O resultado comportamental desse treinamento é um híbrido de escolhas, instintos e códigos internos que raramente é monolítico. Mais frequentemente o cirurgião que treinou muito para uma designação de subespecialidade é um indivíduo complexo, com princípios, com grande capacidade para uma variedade de comportamentos mais previsíveis e virtuosos. A especialidade da ética médica compreende uma ampla variedade de assuntos que é considerada valiosa para os médicos refletirem e terem conhecimento. Também leva em conta os efeitos que os cirurgiões podem exercer sobre a sociedade e vice-versa. Isso inclui questões controversas como aquela sobre se a sociedade deve ou não permitir abortos no final da gestação, morte com dignidade ou racionamento de tratamentos caros, para citar alguns. Em geral, a literatura em ética médica contém muito pouco sobre o tema da cirurgia plástica. Na literatura leiga, a ética de ter a aparência de alguém alterada é um assunto um pouco mais comum, mas ainda raro. As feministas opinam com mais frequência sobre esse tema, assim como os que fazem doutorandos nos campos da sociologia e psicologia comportamental.1-3 No entanto, estes diálogos não levam em conta a possibilidade de que o cirurgião tenha grande prestígio moral. Em vez disso, o cirurgião plástico é moldado como um vilão, forçando seus pacientes suscetíveis a pagar mais do que eles podem por razões bastante frívolas. Os pacientes são definidos como vítimas involuntárias da fascinação da sociedade por atratividade que buscam tolamente uma aparência semelhante a um deus, impossível de obter. Outro subtema destas publicações é a especulação de que a alteração generalizada de pessoas comuns em pessoas atraentes irá, em longo prazo, criar um senso comum em nossa sociedade. As revistas especializadas em cirurgia reconstrutiva ou estética raramente, ou nunca, contêm artigos puramente éticos de interesse para o cirurgião plástico.4-6 Por agora, não há cursos de ética que possam ser feitos em simpósios médicos e fóruns sobre o assunto da cirurgia plástica ética são inéditos. No entanto, permanece o fato de que as decisões éticas são bastantes comuns na vida dos cirurgiões plásticos, em alguns casos ocorrendo mesmo em uma base diária.

A ética como vista por associações profissionais A American Society of Plastic Surgeons (ASPS), a maior organização da sociedade na especialidade, foi formada em 1935. A tentativa da associação em um Código de Ética escrito foi publicada pela primeira vez em 1980.

Membros em boa posição devem estar familiarizados com este código e aderir em sua prática diária de cirurgia aos padrões defendidos dentro dele. O não cumprimento das diretrizes pode resultar em medidas disciplinares, inclusive expulsão. As expectativas para o comportamento ético por parte dos membros da associação profissional são fortemente enunciadas e muito específicas. Às vezes, o código foi modificado para enfrentar novos desafios, como os fomentados pela internet, rifas de caridade e depoimentos de testemunhos de especialistas. Todos os domínios da especialidade encontram-se em seus ditames. O código também enuncia claramente como um membro será tratado se percebe-se uma violação das regras do código. Outros membros, pacientes e pessoas leigas podem apresentar uma reclamação escrita ou verbal à Comissão de Ética da ASPS, afirmando o que eles acham que pode ser um comportamento antiético por parte do membro, ações que ficam fora das proibições do código. O membro é então investigado por seus pares e se for decidido que ocorreu uma violação, a informação é, então, repassada para o Conselho Judicial. O Conselho, composto de membros que votaram nessa posição, realiza audiências para determinar se as sanções devem ser aplicadas ao membro. Apresentações em pessoa diante do Conselho são bem-vindas, e as decisões tomadas após uma audiência são vinculativas. Apelações de tais decisões podem ser feitas para o Conselho de Curadores da organização, mas são feitas com pouca frequência. Os cirurgiões plásticos que são membros da American Society of Aesthetic Plastic Surgery (ASAPS) estão sujeitos ao mesmo Código de Ética e disciplina. Os membros em pleno gozo de ambas as organizações podem ser eleitos para os cargos na Comissão de Ética e no Conselho da Magistratura por um período de 2-3 anos. A Tabela 4.1 é uma compilação dos dados disponíveis a partir de uma revisão das atividades do Comitê de Ética da ASPS durante os 4 anos de 2006 a 2009. Tabela 4.1 Atividades da Comissão de Ética da American Society of Plastic Surgeons, 2006-2009 Queixas de ética

2006 2007 2008 2009

Novas reclamações

139

131

114

81

Reclamações descartadas

101

77

54

36

Casos revisados

38

54

60

45

Encaminhados para judicial

10

15

18

15

5

9

8

8

153

129

108

84

Casos disciplinados Reclamações fechadas

Embora menos queixas tenham sido apresentadas ultimamente, de menos de 81 em 2009 a 139 em 2006, o número de queixas que são revisadas após uma investigação do comitê manteve-se estável ao longo deste mesmo período. Também o número de revisões que levaram a uma audiência ficou no mesmo nível, assim como o número de audiências que resultou em uma ação disciplinar. A Tabela 4.2 mostra o número médio de queixas por categoria em relação à média de 4 anos. A publicidade interpretada por violar o Código de Ética manteve-se a queixa com maior frequência ao longo de muitos anos. A segunda maior categoria continua sendo a investigação dos membros que foram sancionados por suas juntas médicas estaduais. A terceira categoria, comportamento antiético durante participação em um concurso em que o prêmio é a cirurgia gratuita, permanece controverso. Alguns membros acham que a promoção de si mesmos em relação a não membros que são cirurgiões plásticos autodesignados é necessária para competir por pacientes potenciais e que esta parte do código é demasiado restritiva. Ainda outros acham que reduz de forma adequada o número de violações do código e reduz o comportamento que mancha a reputação de todos os cirurgiões plásticos. É pouco provável que esta controvérsia acabe em breve.

Tabela 4.2 Média de reclamações por categoria por ano, 2006-2009 Publicidade

50

Disciplina de junta médica

20

Concurso

11

Padrão de atendimento

12

Depoimentos de testemunha especialista

10

Má conduta profissional

6

Cobranças exorbitantes

3

Cobranças criminosas

2

Relato de especialista

2

Total

116

Os cirurgiões plásticos em geral têm uma posição altamente visível na profissão médica. As reações ao comportamento antiético podem, assim, ser intensas e contundentes. Por esta razão os membros da ASPS e ASAPS são lembrados de tempos em tempos a revisar o seu Código de Ética. Embora a maioria dos membros nunca será acusada em suas carreiras de violá-la, alegar que você não tinha ideia de que suas ações eram diretamente opostas ao corpo de regras de conduta no código nunca funciona bem como uma defesa quando confrontado por este sistema.

Relações éticas com os pacientes Em um mundo ideal, os cirurgiões plásticos só encontrariam pacientes para consultas que eram precisamente adequados às suas habilidades, com as indicações perfeitas para apenas as cirurgias que preferiam realizar. O cirurgião compreenderia imediatamente os desejos corretos do paciente, interpretando de maneira infalível a própria habilidade exclusiva dessa pessoa de lidar com uma complicação ou um resultado pior que o desejável. Os resultados cirúrgicos curariam sempre imediatamente, sem complicações. O paciente adorador, então, encaminharia muito mais pacientes exatamente como ele. Na realidade, as coisas raramente são claras e perfeitas. Os pacientes preocupam-se com qual será sua aparência depois da cirurgia plástica; eles se preocupam irremediavelmente antes da cirurgia reconstrutiva com o fato de ainda acabarem parecendo deformados e desfigurados. Eles desperdiçam o tempo do cirurgião com perguntas infinitas sobre se eles devem ou não submeter- se à cirurgia. Em seguida, eles apresentam impedimentos impossíveis para agendamento de cirurgia e são muitas vezes irrealistas sobre sua recuperação, dor pós-operatória e restrições de atividades. Em uma prática ocupada, exigente, a maneira como os cirurgiões tomam controle destas situações, ocasionalmente para sua própria vantagem, às vezes pode levar a tomadas de decisões antiéticas. Adotar a base moral elevada, sempre a melhor escolha, às vezes pode parecer impraticável e intrusivo quando demandas sobre o cirurgião são quase avassaladoras. Quando a remuneração do cirurgião é determinada unicamente pelo número de cirurgias que ele pode realizar em uma semana, um mês e um ano, operar uma pessoa doente adequada para a cirurgia pode possivelmente, talvez, subsequentemente, ocorrer. Alguns cirurgiões afirmam operar apenas pacientes com quem eles se sintam confortáveis. Obviamente eles têm o luxo de dispensar pacientes que não gostam e ter uma prática apenas de procedimentos verdadeiramente eletivos. Sendo financeiramente compensado por realizar a cirurgia em pessoas com expectativas irreais, que podem ser emocionalmente inadequados para o resultado, não é a norma nesta especialidade. No entanto, isso ocorre, talvez com demasiada frequência. As consequências disso, um paciente perturbado que abomina o resultado e ameaça com processos ou relatórios para a mídia, na maioria dos casos vão levar ao arrependimento, com o cirurgião lamentando o dia em que colocou o bisturi na pele dessa pessoa. Mas isso não garante necessariamente que o cirurgião tenha aprendido a ter mais cuidado a partir de tal experiência. No treinamento de cirurgiões plásticos, é comum ser interrogado mais e mais pelo cirurgião mais velho sobre as indicações corretas para a cirurgia. O cirurgião mestre sente que ele está lá para ensinar aos futuros cirurgiões as regras não escritas, as armadilhas de fazer a escolha errada e a integridade necessária para ter sucesso na especialidade. Na prática, no entanto, os novos cirurgiões não precisam mais responder por cada

ação sua. A orientação para tomar a decisão certa, não a errada, cabe somente a eles, e as consequências podem levar a um paciente infeliz, um efeito profundo sobre a sua reputação, ação disciplinar ou, mais infelizmente, ação por má prática. Por isso é que os cirurgiões são, em última análise, julgados pelo “padrão de atendimento,” o que um cirurgião razoavelmente prudente faria com formação semelhante em circunstâncias semelhantes. O comportamento moral e ético é uma faceta do padrão de atendimento. Cirurgiões verdadeiramente éticos escolhem seus pacientes com base em uma avaliação completa que inclui muitos fatores, sendo que a compensação é o menos importante. Pacientes com expectativas irrealistas ou comportamento obsessivo são dispensados apropriadamente. Os pacientes que necessitam de reconstrução são escolhidos de acordo com a habilidade do cirurgião para coordenar a cirurgia correta com o problema. Pacientes com necessidades além das próprias competências específicas do cirurgião são encaminhados para outros que tenham mais experiência nessa área. A sociedade espera que os cirurgiões convencionais e virtuosos gastem um tempo ensinando a seus pacientes quais devem ser suas expectativas, tanto para o resultado menos do que perfeito e para complicações infelizes, mas raras. A opção de dispensar o cirurgião ou procurar outro quando os pacientes sabem os riscos e tratamentos alternativos deve ser sempre permitida. Isto é acompanhado por um esclarecimento de quanta responsabilidade financeira o paciente deve suportar para reoperações quando as coisas não saem como planejado e outra cirurgia é necessária. Na cirurgia reconstrutiva, a capacidade dos pacientes de pagar ou o tipo de cobertura de seguro que eles têm não interfere nas decisões do cirurgião ético para operar. A ausência completa de seguro é equilibrada pela capacidade de encontrar algum tipo de cobertura de pagamento por meio de serviços sociais ou simplesmente aceitar uma taxa muito reduzida em troca. A necessidade da cirurgia não deve ser alterada pela compensação que vai ter, especialmente se for pouca ou nenhuma.

A ética da publicidade A propaganda foi considerada completamente antiética para os cirurgiões plásticos na década de 1980. Os poucos que tentaram fazê-lo eram considerados bandidos e, muitas vezes, expulsos de suas associações nacionais ou estaduais e locais de cirurgia plástica. Muitos sentiram que “banalizaram a especialidade” e que a reputação seria o necessário para atrair mais pacientes. Veio a década de 1990 e as atitudes sociais de especialidade mudaram. A televisão descobriu a cirurgia plástica e programas como, nos EUA, o Extreme Makeover, impulsionaram a cirurgia plástica para as casas de milhões, fazendo com que a “transformação da mamãe” fosse uma expressão doméstica. Mas foi a internet que derrubou o último resquício de relutância em fazer da promoção uma parte importante da prática cotidiana da cirurgia plástica. A publicidade na especialidade, quando feita com bom gosto e sem hipérbole, agora vai estar presente por um longo tempo. Infelizmente a publicidade antiética, feita com mau gosto e autopromoção com entorpecimento mental, também está aqui para ficar (Fig. 4.1).

FIG. 4.1 Propaganda antiética: foto de outdoor: “Compre dois, pague um.”

O Código de Ética ASPS foi modificado várias vezes nos últimos 12 anos para acompanhar o relaxamento em mudança dos costumes sociais para a publicidade médica. Mas as queixas dos membros sobre as promoções antiéticas de outros cirurgiões continuam a ser classificadas como as queixas mais frequentes a cada ano para a Comissão de Ética da ASPS (Tabela 4.2). Não faltam exemplos. A Figura 4.2 é exatamente o que o Código de Ética deveria evitar com uma abordagem bastante deselegante que barateia e macula a especialidade, independentemente da origem. O público agrupa todos os cirurgiões plásticos em uma categoria, sejam eles certificados ou autodesignados.

FIG. 4.2 Propaganda antiética em que uma única imagem é usada tanto para antes quanto para depois através da magia das alterações digitais.

Mostrar fotos de antes e depois enganosas, e depois indicar que este é um resultado típico que pode ser obtido por qualquer paciente, também é considerado antiético (Fig. 4.2). Além disso, pode ser difícil resistir à

tentação de retocar imperfeições ou cicatrizes das fotos quando existem tantos aplicativos de software que tornam esta uma tarefa fácil. Qualquer alteração de antes e depois das fotos é considerada pelo processo de ética da ASPS uma propaganda falsa e enganosa, sujeita a sanções. Outros comportamentos considerados antiéticos incluem a negociação de cirurgia quid pro quo para exposição na mídia em uma pessoa muito conhecida. Infelizmente, existem exemplos de figuras da televisão, como novos repórteres que se submetem a tratamento cirúrgico em troca de depoimentos livres sobre o cirurgião, no ar ou em aparições públicas. Embora a indústria da mídia não considere isso fora do comum, as associações de cirurgia plástica afirmam que ele é de fato antiético.

O papel da ética no consultório ambulatorial Construir e manter relacionamentos com os pacientes e os funcionários pode ocupar uma boa parte do tempo do cirurgião plástico. A tentação de estender essas relações para fora do consultório ou da prática e fora da natureza profissional estará sempre presente. Pacientes agradecidos querem oferecer favores em troca do sucesso de seu cirurgião. Membros da equipe adoradores querem saber mais sobre como seu chefe é fora da clínica. Apenas é natural que ocorram atrações como estas. A maneira como o cirurgião lida com isso pode torná-lo mais bem- -sucedido, mas também pode levar a situações que podem tornar-se não convencionais, complicadas e difíceis. Embora não seja considerado antiético socializar com a equipe de alguém, estabelecer relações sexuais com uma pessoa da equipe e com pacientes viola as normas gerais para conduta profissional e pode terminar com consequências lamentáveis, incluindo acusações de assédio sexual ou outros encargos civis. O comportamento lascivo, os avanços físicos e a criação de um ambiente de assédio sexual são motivos de demissão de organizações profissionais, ações cíveis e pode até, por vezes, ser considerado de natureza criminosa. O comportamento convencional estabelece limites para essas situações. Mas a situação exclusiva na cirurgia plástica, em que o paciente do sexo feminino pode ser tanto física quanto emocionalmente exposto, pode criar forças poderosas que testam os limites da decência, honestidade e virtude em cirurgiões plásticos do sexo masculino. Em menor medida, os papéis do sexo oposto também podem ocorrer, pois as mulheres estão se tornando cirurgiãs plásticas em taxas recordes. Normas de conduta pessoal variam enormemente na especialidade, mas programas de televisão que retratam comportamento desprezível, ilegal e não convencional por cirurgiões plásticos podem ter algum elemento de verdade. A personalidade malevolente, licenciosa e perversa em alguns cirurgiões pode, de fato, ser retratada nestas situações. Há esperança de que isso se torne raro e só no alcance da televisão. O comportamento descarado pode, eventualmente, ser relatado a algum tipo de autoridade. O potencial de danos pessoais que pode ser feito em tais situações pelos e para os cirurgiões deve ser deplorável para todos. Advogados experientes com processos de trabalho sempre recomendam que, se um relacionamento romântico desenvolve-se entre um paciente e um médico solteiro, o paciente deve ter a opção de interromper a relação médico-paciente ou o relacionamento pessoal. Se a primeira escolha for feita, o paciente deve ser dispensado do cuidado do cirurgião e ser atendido por outro médico. Da mesma forma, se um relacionamento romântico surge com os membros da equipe é considerado ético e sábio descontinuar a relação empregadoempregador imediatamente, embora a evidência sugira que isso aconteça com pouca frequência. A prática de cirurgia plástica com vários médicos apresenta a possibilidade de competitividade econômica e comportamentos pouco profissionais entre cirurgiões e equipe. A manipulação da equipe para impedir o sucesso de parcerias ou direcionar mais negócios para si mesmo é considerado antiético. Esconder rendimentos de acordos de compartilhamento de despesa, contribuir para rumores e mentiras sobre outros parceiros, e outros comportamentos indiscretos e malévolos em relação a eles ignoram as regras de decência e virtude.

Ética na sala de cirurgia Os desfechos de qualquer cirurgia dependem da aplicação correta de princípios, decisões e tratamentos, sendo que todos eles requerem escolhas múltiplas informadas e decentes. A maneira como o cirurgião se conduz, resistindo à tentação de culpar os outros e até mesmo os instrumentos quando as coisas não saem como planejado, afeta sua reputação entre a equipe e os colegas. Cada decisão correta ou incorreta tomada durante a cirurgia pode ser uma reflexão do caráter e costumes de cada cirurgião. Cortar arestas por razões econômicas, cobrindo erros e produzindo resultados diferentes do planejado

podem ser indicações fundamentais de um caráter desonesto. A cirurgia não está imune aos efeitos das falhas de personalidade. A analogia do velho conto de fadas de Hans Christian Anderson, “A Roupa Nova do Imperador ”, com o potencial para o comportamento enganoso ocasionalmente exibido por cirurgiões plásticos, pode ser ilustrativa. Na história, o tecelão promete fazer para o imperador um conjunto de roupas invisíveis para os ignorantes ou inadequados para seus cargos, enganando-o completamente a vestir nada. É um caso clássico de “dominação do espírito sobre a matéria.” Na medida em que isso pode ser aplicado à cirurgia plástica, os efeitos limitados de uma cirurgia podem depender da extensão em que o cirurgião construiu as expectativas do paciente, sabendo muito bem que o paciente pagou por algo possivelmente requerendo mais tempo e esforço ou que poderia ter tido um resultado mais claramente eficaz. Embora isso raramente seja tão descarado como no antigo conto de fadas, pode aplicarse a várias partes da cirurgia, especialmente com o uso mais comum de máquinas de tratamento que os pacientes conhecem pouco. A felicidade do paciente depende das expectativas para a beleza tecida na apresentação das vendas pelo cirurgião. Os resultados obviamente irão variar. Determinados tratamentos de pele dependentes de energia, cujos efeitos levam muitos meses para ser apreciados, parecem com essa história. É desonesto prometer menos rugas quando se sabe que os efeitos não serão tão claramente evidentes como outros tratamentos ou como uma cirurgia mais cara? Quando os pagamentos frequentemente caros precisam ser atingidos, a tentação de exagerar pode ser enorme. O dilema ético não é apenas o de convencer pacientes relutantes, mas também, em seguida, de negar que o desfecho foi menos eficaz e não satisfez as suas expectativas. Cirurgiões convencionalmente morais reconhecem essa armadilha e evitam-na, optando por evitar renda para eficácia tradicional. Outros, que ainda podem considerar- se como tendo valores tradicionais, negligenciam de maneira indiferente as questões para manterem-se ocupados, construindo sua reputação e impressionando outros cirurgiões com o tamanho da prática. O engano intencional e malévolo pode não estar exposto; a maioria é oculta, enterrada nesta especialidade atrás de camadas de situações complexas. Mas certamente existe em muitas formas.

Relações éticas com outros provedores e terceiros pagadores O Código de Ética ASPS é muito específico sobre as armadilhas nas relações monetárias que podem existir em redes de encaminhamento. Propinas descaradas para encaminhar um paciente para o qual o cirurgião será recompensado financeiramente são consideradas ilegais na maioria dos estados. Divisão de honorários também o é. Com o Medicare pode tornar-se um crime federal. Alinhamentos mais sutis e quid pro quos com o médico que encaminhou não podem constituir violações a direitos civis, mas ainda assim devem ser considerados com cuidado como uma possível violação ética, antes de ser levada a cabo. Presume-se que a norma seja aplicar corretamente os códigos da Terminologia Procedural Atual que representam com precisão e de forma adequada o procedimento que foi realizado em cirurgia. No entanto, a tensão constante com terceiros pagadores sobre o que pode ser interpretado como a sua redução injustificável de reembolso para procedimentos que requerem altos níveis de habilidades cria uma atitude negativa que pode permear o lado comercial da profissão. Quando se supõe que a companhia de seguros “enganou” o cirurgião sobre o último pagamento, é difícil resistir à tentação de sobretaxar o próximo procedimento. É justificável “desamarrar ” códigos, ultrapassar os códigos e sobretaxar quando se sabe que a empresa de seguros tem o poder de qualquer maneira? Quem é realmente prejudicado por isso? É a ética situacional em jogo: o engano aparentemente aceitável que é justificado porque todos os outros, incluindo os pagadores, estão jogando o mesmo jogo. Muito tem acontecido ao longo dos últimos 5 anos, à medida que várias empresas grandes de seguros têm sido levadas ao tribunal em ações judiciais coletivas para alterações ilegais dos faturamentos de médicos. A resposta delas é que a cobrança fraudulenta da cirurgia é galopante e elas têm que proteger seu lucro final. A verdade pode estar em algum lugar no meio disso. No entanto, o mundo real parece perdoar médicos tentados a abrir novos caminhos de honra e conduta para a atualidade, dadas as intensas realidades fiscais. Os pacientes podem abominar o que ouvem sobre a cobrança hospitalar, mas perdoam seu próprio cirurgião se ele parece honesto e cuidadoso. Quanto mais pessoal isso se torna, menos pacientes consideram cobiça, se parece ser a favor de um cirurgião que realizou neles um procedimento bem-sucedido. Por outro lado, em hospitais universitários, onde se espera que um cirurgião responsável supervisione o

treinamento de muitos residentes, havia, no passado, apresentação de honorários do cirurgião para estar em dois lugares ao mesmo tempo, ou até mesmo não presentes. A explicação era que, como um cirurgião professor, o médico era, em última análise, responsável por todos os resultados e, portanto, justificava-se o recebimento da compensação. Algumas multas recordes bem divulgadas dos Centers for Medicare e Medicaid na última década levaram a regras muito estritas para a supervisão e cobrança. A cobrança antiética é atualmente examinada de maneira mais rigorosa do que nunca e a equipe de cirurgia plástica pode não ser uma exceção. Regras intrusivas podem ter constrangido o sistema e possivelmente ido além da razão. Infelizmente, elas existem atualmente por causa do abuso passado do sistema por alguns poucos.

A ética do depoimento de uma testemunha especialista Como em outras seções deste capítulo, mais uma vez, as questões descritas no Código de Ética da ASPS são aplicáveis aqui também. Normalmente, uma das queixas mais frequentes interpostas contra um cirurgião por outro membro da ASPS é testemunhar na deposição ou no julgamento de uma maneira que possa enganar o júri ou simplesmente ser completamente planejado com falsas declarações de fato. Muitas destas reclamações giram em torno de o especialista declarar que o padrão de atendimento era fazer a cirurgia de maneira específica. Na verdade, no entanto, muitos cirurgiões podem não aderir a esses mesmos princípios e realizar a cirurgia de maneira diferente, mas não necessariamente, do lado fora do padrão. Condenar de um jeito ou de outro como não em alinhamento com os princípios aceitos quando, na verdade, ele pode muito bem estar, pode levar o júri ou juiz a decidir contra o outro membro. Independentemente do resultado o membro que tem uma questão legítima pode submeter o depoimento que ele acha que é falso ou enganoso ao Comitê de Ética da ASPS que examinará a situação e chegará a uma conclusão. O Código de Ética também é muito específico sobre a experiência razoável do especialista com a cirurgia que foi realizada. A frase “experiência recente e substancial” precisava ser mais cuidadosamente definida devido a declarações de cirurgiões aposentados sobre o padrão de atendimento quando, na verdade, eles podem não ter realizado qualquer cirurgia, e muito menos a que está em causa, por mais de uma década. Quando o código escreve agora isso significa nos últimos 3 anos. Testemunhar sobre um procedimento que o cirurgião não realizou na época, em 4 ou mais anos, pode ser considerado um testemunho enganoso. Em geral, estas questões tornaram-se tão frequentes que várias outras modificações das seções do Código sobre testemunhar tiveram de ser feitas. Isso agora inclui uma declaração que todos os especialistas podem ser solicitados a assinar, atestando que vão ser verdadeiros em seus depoimentos. A apresentação da declaração assinada é voluntária, mas pode ser usada como evidência no tribunal, especialmente quando um perito do autor é outro membro da ASPS e é conhecido por ter feito declarações enganosas em outros julgamentos.

Resumo A prática da medicina é complexa, exigindo decisões, discussões e testes constantes. O desenrolar dessa complexidade no cotidiano dos cirurgiões plásticos depende da história, do treinamento, dos costumes pessoais e das habilidades interpessoais de cada um. O comportamento antiético pode abranger desde a inovação na codificação e na cobrança de seguros até toda a forma de fraude, de desvio sexual e do encobrimento de desventuras cirúrgicas. Sempre se comportar eticamente é um problema generalizado que pode ser observado como negócio ou postura moral. É comum à natureza humana jogar com comportamentos éticos, e isso faz parte desta especialidade.

Referências 1. Goering, S. The Ethics of Making the Body Beautiful. Lessons for Cosmetic Surgery For a Future of Cosmetic Genetics. Centre Study Ethics Soc. 2001; 13:20. O autor usa uma discussão de ética da cirurgia estética para abordar o território mesmo familiar dos potenciais dilemas éticos que circundam a “genética estética”. Se uma prática usada para melhorar a própria autoimagem de alguém reforça concepções negativas da normalidade, esta prática é desencorajada.

2. Miller, F. G., Brody, H., Chung, K. C. Cosmetic Surgery and the Internal Mandate. Cambridge Q Health Ethics. 2000; 9:353–364. A “moralidade interna” da medicina é descrita como o dever do médico de aderir a determinadas virtudes clínicas. A ética da cirurgia estética é discutida neste contexto.

3. Scott, K. Cheating Darwin: The Genetic and Ethical Implications of Vanity and Cosmetic Plastic Surgery. J Evol Technol. 2009; 20:1–8. Este trabalho descreve a ética da cirurgia estética no contexto da evolução. O argumento avançado é de que a

cirurgia estética desliga-se do fenótipo e seu papel na atração de um parceiro a partir do genótipo pode, portanto, ter implicações éticas.

4. Constantine, M. The Confusing Ethics of Mismanaged Care. Ann Plast Surg. 1995; 35:222–223. Este ensaio começa com uma vinheta em que o autor, um cirurgião plástico, é solicitado a estabelecer se determinados procedimentos são “estéticos” ou “reconstrutivos”. O que se segue é uma hábil discussão da posição difícil em que os médicos modernos se encontram quando convidados a participar de alocação de recursos.

5. Krizek, T. Surgical Error: Ethical Issues of Adverse Events. Arch Surg. 2000; 135:1359–1366. Este artigo aborda as questões éticas em torno de eventos adversos. Especificamente, as questões que inibem os esforços para reduzir a frequência de tais ocorrências são discutidas.

6. Reisman, N. R. Ethics and Legal Issues of Injectible Treatments. Clin Plast Surg. 2006; 33:505–570.

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Princípios de negócios para cirurgiões plásticos C. Scott Hultman

Resumo Este capítulo fornece uma visão ampla dos princípios essenciais que caracterizam o que uma empresa faz e como ela faz seu trabalho. A capacidade de aplicar conceitos de negócios é de suma importância para definir se os cirurgiões plásticos vão liderar e permanecerem na área da saúde. Os cirurgiões plásticos devem compreender e usar as estratégias, a contabilidade, as finanças, a economia, o marketing e as operações para auxiliá-los a tomarem decisões a respeito de sua prática. Inovação, empreendedorismo e gestão de recursos humanos são três áreas em que os cirurgiões plásticos podem agregar valor à sua prática e distinguirem-se da concorrência.

Introdução O cuidado com a saúde não é só um negócio, é um grande negócio. O complexo industrial de cuidados com a saúde incorpora múltiplos setores para proporcionar saúde e depende de um grupo cada vez maior de equipes interdisciplinares, de serviços e de instituições para alcançar essa proposta de valor. Os setores de atividades envolvidos na prestação de cuidados de saúde incluem não somente profissionais, como médicos, enfermeiras e administradores, mas também hospitais, lares de idosos e grupos de saúde domiciliar; fabricantes e desenvolvedores de medicamentos; fabricantes de equipamentos e de instrumentos médicos; laboratórios de diagnóstico; pesquisa biomédica; e empresários biotecnológicos. As estimativas atuais feitas pelo Escritório de Cooperação Econômica e Desenvolvimento situam as despesas com saúde em 16,0% do produto interno bruto dos EUA, com esse percentual devendo aumentar para 19,5% até 2017.1 De cada dólar gasto nos EUA em cuidados de saúde, 31% vão para serviços hospitalares, 21% para os médicos, 10% para produtos farmacêuticos, 8% para casas de repouso e 30% para outras categorias, como laboratórios de diagnóstico, equipamentos médicos e dispositivos médicos.É interessante notar que 7% da despesa total é atribuída a despesas administrativas. Se os cuidados de saúde prestados por médicos não se tratam de negócios, então os médicos certamente estarão rodeados por negócios. Eles devem navegar em um ambiente complexo, que está cheio de paradoxos, ineficiência e burocracia. Infelizmente, os médicos não recebem educação formal acerca de administração de negócios, devendo aprendê-la na prática, por meio de erros e acertos, muitas vezes com relação a um paciente e a um problema administrativo de cada vez. Embora muitos críticos argumentem que os cuidados de saúde têm sido contaminados por sua interseção com grandes negócios, que invertem as prioridades e comprometem a relação entre médico e fornecedor, muitos outros consideram que os líderes afirmam que a saúde precisa dos negócios para ajudar a resolver problemas de qualidade inconsistente, acesso esporádico e aumento dos custos. De fato, o pensamento administrativo e os processos administrativos são absolutamente necessários para transformar nosso sistema atual, para que os cuidados de saúde estejam disponíveis para todas as pessoas, a preços de mercado justos, para melhorar a saúde de nossa comunidade. Por que os cirurgiões plásticos deveriam se preocupar com a administração dos cuidados de saúde? Do ponto de vista individual, cada cirurgião plástico deve gerir um negócio ou ser parte de um negócio, de maneira que a

prática do cirurgião possa prosperar, crescer e mudar e, ele, continuar a prestar atendimento de alta qualidade. Independentemente se se trata de um profissional autônomo, ou se de um que trabalhe para um hospital ou organização de manutenção de saúde, instituição acadêmica, organização sem fins lucrativos ou não governamental, clínica comunitária de acesso livre, ou equipe de missão de voluntariado no estrangeiro, os cirurgiões plásticos estão envolvidos com organizações que utilizam princípios de negócios e que têm uma interface com entidades empresariais. Em uma perspectiva mais ampla, no entanto, os cirurgiões plásticos estão situados de modo singular como líderes dos sistemas de saúde e das empresas de saúde. Dada a nossa extensa formação, nossa colaboração com várias especialidades, nosso portfólio variado de serviços que prestamos, nossas habilidades de resolução de problemas e nosso espírito empreendedor, os cirurgiões plásticos têm a liderança, as habilidades, a influência e o posicionamento dentro do sistema de saúde para efetuar uma mudança real. Assim como a palavra grega plastikos, que significa “dar forma”, ou “moldar ”, foi escolhida para descrever o que fazemos como cirurgiões, essa palavra pode também comunicar sobre a nossa capacidade de dar forma ou moldar nossos sistemas de fornecimento de saúde. O conhecimento e a aplicação dos princípios de negócios são de suma importância se os cirurgiões plásticos pretendem tornar-se e permanecerem líderes na área da saúde. O objetivo deste capítulo é fornecer uma visão ampla dos princípios essenciais que caracterizam o que uma empresa faz e como ela o faz. Cada seção oferece uma visão muito superficial, e os leitores são fortemente encorajados a explorar em maior profundidade os seguintes componentes do presente capítulo: 1. Estratégias; 2. Contabilidade; 3. Finanças; 4. Economia; 5. Marketing; 6. Operações; 7. Inovação; 8. Empreendedorismo; 9. Sustentabilidade empresarial; 10. Gestão de recursos humanos; 11. Considerações legais e regulatórias; 12. Negociação; 13. Ética; 14. Liderança. No mínimo, os cirurgiões plásticos devem aprender a linguagem dos negócios, para que possamos ter interações significativas com os administradores do hospital, vendedores, seguradoras e empresas de marketing. Espero que, no entanto, os cirurgiões plásticos possam utilizar os princípios de administração para melhorar os cuidados que prestamos e no final, para transformar a indústria em que praticamos nossa ciência e nossa arte.

Estratégias A vantagem competitiva começa e termina com as estratégias. Quase todos os componentes da administração são afetados pelas estratégias, de finanças a operações, de marketing à gestão de capital humano, e, portanto, uma revisão dos princípios de administração deve iniciar com um entendimento de como as estratégias guiam a tomada de decisão dentro da organização. A estratégia pode ser caracterizada como a arte de induzir seu concorrente a fazer outra coisa, enquanto você se concentra em fazer o que você faz bem. Em termos mais acadêmicos, a estratégia é o processo de formação, implementação e avaliação de decisões que permite que uma organização alcance seus objetivos de longo prazo. A estratégia é ditada (e, por sua vez, pode influenciar) pela missão, pela visão e pelos valores da organização, que servem como base para guiar as políticas, projetos e programas. Além disso, a estratégia está relacionada com a competição pela diferenciação – criando uma proposta de valor, na qual uma empresa oferece ao consumidor um produto ou serviço de maior qualidade, ou com menos custos do que seu concorrente, escolhendo deliberadamente um conjunto diferente de atividades para fornecer uma combinação única de resultados.

Antes de examinar os princípios estratégicos específicos, deve-se familiarizar-se com a maneira como o ambiente de negócios afeta o fluxo de entradas e saídas, ao longo da cadeia de abastecimento. Como o valor é adicionado em vários pontos ao longo desse processo, o eixo como um todo, do fornecedor ao consumidor, é chamado de cadeia de valor. Cada uma das principais atividades da empresa, que incluem logística de entrada, operações, logística de saída, marketing e vendas e, finalmente, os serviços ao consumidor, cria valor que se manifesta no produto final. Esses processos são guiados por prioridades estratégicas e são coordenados pelo apoio às atividades, que incluem o desenvolvimento tecnológico, a gestão de recursos humanos e a infraestrutura da empresa. O modelo mais bem estabelecido e respeitado do ambiente empresarial é o modelo de competição de Cinco Forças, de Michael Porter (Fig. 5.1).2 Cada indústria contém: (1) concorrentes previamente estabelecidos; (2) o potencial de novos operadores; (3) a ameaça de rivais substitutos, que muitas vezes competem em termos de preço; (4) fornecedores, que podem ter significativo poder de barganha; e os compradores (5), que criam a demanda para as saídas. As noções básicas sobre o ambiente de um setor específico, como no caso dos cuidados de saúde, podem reforçar a tomada de decisões e ajudar o planejamento estratégico. Por exemplo, como uma prática acadêmica de cirurgia plástica poderia reagir ao influxo dos residentes recém-formados na comunidade? Como o profissional que trabalha sozinho em um consultório particular deveria atrair novos pacientes em um mercado fixo, quando uma prática grupal domina o cenário? Como os cirurgiões devem desafiar seu âmbito de atuação com médicos não cirurgiões e prestadores não médicos? Qual é o portfólio de serviços ideal, especificamente, a combinação de cirurgia reconstrutiva, procedimentos cosméticos e cuidados com a pele, para alcançar os objetivos da organização?

FIG. 5.1 Estratégia: Modelo das cinco forças de Porter. HMOs, organizações de manutenção de saúde; PPOs, organizações de profissional preferido.

Assim que a dinâmica e a paisagem do ambiente empresarial estiverem definidas, podem-se tomar decisões específicas sobre a mudança nas operações, sobre marketing, sobre investimentos em novos ativos, sobre alianças ou sobre cadeias de abastecimento.3–5 A maioria das indústrias mais consolidadas, como a indústria automobilística ou a indústria de computadores pessoais, se estabelece em um cenário competitivo, no qual uma empresa domina 60% do marketshare, enquanto uma segunda tem 30% do marketshare, e os demais concorrentes dividem os 10% restantes. Por causa de barreiras à entrada, novos operadores podem não ser capazes de competir com sucesso, a menos que tecnologias de ponta reduzam os custos de produção ou que o mercado se altere, devido a forças culturais, sociais, econômicas ou políticas. De fato, a vantagem competitiva significativa é conferida às empresas pequenas e ágeis que focam sua linha de produtos ou serviços e que oferecem uma proposta de venda exclusiva para um segmento específico do mercado. Quando executada corretamente, essa atividade, denominada estratégia de judô, tem o poder de minar as empresas dominantes e aumentar substancialmente o marketshare. Uma limitação importante da estratégia competitiva é que a maioria dos esforços relaciona-se com ganhar uma porção maior de um mercado fixo ou atrair novos clientes por meio da “maré alta” de um mercado que

está crescendo lentamente. Se as empresas em busca de um crescimento rentável e sustentável competem com vários rivais, então a diferenciação torna-se difícil, guerras de preços podem decorrer e o lucro total diminui. Em vez disso, as empresas podem levar a cabo uma “estratégia céu de brigadeiro”, na qual o espaço de mercado incontestável, mas relacionado, é descoberto, tornando os rivais obsoletos e gerando nova demanda. “Colonos” anteriores irão “migrar ” para esse novo espaço de mercado e se tornar “pioneiros.” A Apple fez isso várias vezes com o mercado de computadores pessoais, introduzindo novos dispositivos que ampliam a funcionalidade do seu sistema operacional e de seu hardware, evidenciada pela transição do desktop para o laptop, e, deste, para o iPhone, e, deste, para o iPad. A inovação de valor real ocorre quando uma empresa salta de sua indústria e cria um mercado totalmente novo, muitas vezes em um setor diferente.6,7 Essa incursão em território desconhecido, que é denominado “espaço em branco”, normalmente ocorre quando uma empresa desenvolve uma tecnologia de ponta, que permite o uso de competências essenciais para produzir um serviço ou produto radicalmente diferente. A Apple foi bem-sucedida em capturar a posição dominante no mercado de música digital, projetando e oferecendo o iTunes, apesar de ser uma empresa de informática. Inerente a esse sucesso foi o fato de que a Apple também mudou o modelo de negócios para a compra de música. Os consumidores podiam comprar músicas avulsas ou álbuns inteiros, escutar amostras e, claro, navegar no site gratuitamente. Em resumo, a estratégia envolve as seguintes etapas: 1. Análise da indústria – avaliar a rentabilidade da indústria, hoje e amanhã. 2. Posicionamento – identificar fontes de vantagem competitiva. 3. Análise do concorrente – estudo dos concorrentes atuais, futuros operadores e substitutos. 4. Avaliação da estratégia atual – prever a eficácia e a sustentabilidade. 5. Geração de opção – busca por novos clientes, novos segmentos, novos mercados. 6. Desenvolvimento de capacidades – planejar agora para futuras oportunidades. 7. Refinar a estratégia – avaliar a singularidade, o equilíbrio e a compatibilidade com a visão e os valores.

Contabilidade A gestão dos negócios deve basear-se em uma linguagem comum que é usada para comunicar objetivamente informações relacionadas com as métricas quantitativas de uma organização. Essa linguagem é a contabilidade. Esta seção irá rever as ferramentas que os contadores usam para avaliar a saúde financeira de um negócio: demonstração de resultados, balanço patrimonial, resumo dos fluxos de caixa e indicadores financeiros.8-10 As nuances da contabilidade vão além do escopo desta revisão, mas os prestadores de cuidados de saúde devem ter uma compreensão básica desses instrumentos e de como representam a capacidade financeira de sua clínica, hospital e sistema de cuidados de saúde. Além disso, esses instrumentos são utilizados no orçamento para construir previsões pró-forma do desempenho futuro. O campo da contabilidade é regido por princípios de contabilidade geralmente aceitos, também conhecidos como GAAP, que são as regras usadas para preparar, apresentar e relatar demonstrações financeiras para várias entidades, como organizações sem fins lucrativos, empresas de capital aberto e empresas de capital privado. Embora o governo não defina tais normas, a Securities and Exchange Commission dos Estados Unidos exige que as empresas públicas sigam tais regras. A contabilidade gerencial, que é usada para alocar custos e atribuir as despesas gerais (overhead), não segue a GAAP e é dependente da prática e da cultura institucional.

Demonstração de resultados A declaração de resultados, também conhecida como a declaração de lucros/perdas, descreve as operações financeiras dentro de um período definido de tempo, que pode ser trimestral ou anual. A receita refere-se ao rendimento bruto que uma empresa recebe de atividades normais, normalmente as vendas de bens ou serviços, mas também pode incluir aluguel, royalties ou dividendos. Em contabilidade, a receita ocorre no momento da transação, não quando os recibos são passados. O lucro líquido é expresso como lucro ou perda após a dedução de despesas, que incluem geralmente despesas de operação (custo dos produtos vendidos [CPV], despesas gerais variáveis), depreciação de ativos e amortização de locações, gastos fixos (despesas administrativas e de vendas, pesquisa e desenvolvimento), despesas com juros e impostos.

Balanço O balanço é uma amostra do que a empresa possui e deve, em um ponto único no tempo. Por um lado, o balanço resume o impacto cumulativo de todas as transações, mas não fornece muita informação útil sobre o desempenho operacional da empresa. O valor líquido da companhia, conhecido como patrimônio líquido, é definido como a diferença entre os ativos e os passivos. Dito de outra maneira, a seguinte equação sempre deve se equilibrar:

O valor real de uma empresa é difícil de ser determinado, mas um método para calculá-lo é a capitalização de mercado, que é (cotações) × (ações em circulação). Isso representa o consenso público do valor do patrimônio líquido da empresa. Os ativos são definidos como os recursos com prováveis benefícios econômicos futuros, obtidos ou controlados pela entidade, como resultado de transações passadas, que se espera que contribuam para os fluxos de caixa líquidos positivos. Exemplos de ativos incluem investimentos de liquidez imediata (despesas antecipadas, títulos, ações), contas a receber (o dinheiro que é devido, mas não foi recebido), estoque (matériasprimas, trabalho em processo e produtos acabados), propriedade/fábrica e equipamentos (preço de aquisição menos depreciação), ativos intangíveis (valor intangível da marca) e propriedade intelectual. Os passivos referem-se ao que uma empresa deve, ou, de uma perspectiva diferente, a como os bens foram obtidos. Os passivos incluem empréstimos de curto prazo (linhas de crédito), porção atual da dívida de longo prazo, contas a pagar (o dinheiro que uma empresa deve a seus fornecedores) e dívidas de longo prazo. Patrimônio líquido – a diferença entre ativos e passivos – pode ser alocado em várias categorias: ações preferenciais (que costuma receber dividendos periódicos), ações ordinárias e lucros acumulados (lucros acumulados que têm sido reinvestidos no negócio, em vez de serem distribuídos como dividendos).

Resumo dos fluxos de caixa Uma avaliação dos fluxos de caixa da empresa é fundamental na determinação da viabilidade financeira da empresa, porque o lucro não é o mesmo que dinheiro. Essa desconexão é decorrente de várias razões: (1) o dinheiro pode estar chegando de investidores ou de empréstimo; (2) o lucro é registrado no momento da venda, não da coleta; (3) as despesas correspondem à receita, não a quando são de fato pagas; e (4) despesas de capital não contam contra o lucro (porque somente a depreciação é contabilizada contra a receita), mas exigem dinheiro ou débito para pagar os bens. Como resultado dessa discrepância entre quando um bem ou serviço é fornecido e quando o dinheiro é trocado, seguir o fluxo de caixa pode ser muito complicado. Felizmente, temos os contadores. Para as empresas consolidadas, estáveis e bem geridas, o fluxo de caixa aproxima-se do lucro líquido. Mas, para as empresas mais jovens, crescentes e mal administradas, o lucro pode ocorrer sem o ganho

de dinheiro (resultando em falência, porque as contas não podem ser pagas), ou o dinheiro pode se acumular sem ser rentável (que tem prognóstico ruim para o sucesso em longo prazo, se as despesas não puderem ser controladas). Em geral, os fluxos de caixa são subdivididos em três categorias – operações, investimentos e financiamentos – com base no canal para o fluxo. Os fluxos de caixa das atividades operacionais (CFO) indicam o quanto foi gerado de dinheiro a partir das operações: vendas de bens e serviços. Os fluxos de caixa das atividades a investir (CFI) indicam o quanto a empresa gastou (ou recebeu) de dinheiro a partir da compra e venda de empresas, propriedades, fábricas e equipamentos (PPE). Finalmente, fluxos de caixa de financiamento de atividades (CFF) indicam o quanto de dinheiro a empresa emprestou, recebeu da venda de ações ou usou para pagar as dívidas ou recomprar ações. O fluxo de caixa total representa o verdadeiro fluxo de dinheiro através de uma empresa e é um composto das operações, investimentos e financiamentos, representado pela seguinte equação:

Muitos analistas financeiros acreditam que o fluxo de caixa total incide de maneira distorcida sobre o lucro, ignorando o dinheiro “real” que uma empresa gera e mantém para futuros investimentos. Portanto, outra medida da capacidade de uma empresa para criar valor é o fluxo de caixa livre (FCF), que é definido numericamente como:

Em outras palavras, o fluxo de caixa livre representa o total de dinheiro que uma empresa é capaz de gerar depois de eliminar os fundos necessários para manter ou crescer sua base de ativos. O fluxo de caixa livre é muito importante para os investidores, porque permite que uma empresa persiga as oportunidades que aumentam o valor detido pelos acionistas. Essa é a melhor fonte de capital para o desenvolvimento de novos produtos e serviços, aquisição de novas empresas, pagamento de dividendos de ações e redução das dívidas. O dinheiro realmente é quem manda, e é por essa razão.

Indicadores financeiros Como as empresas, mesmo dentro de uma única indústria, podem variar em tamanho e maturidade, instrumentos como a declaração de renda, o balanço e o resumo dos fluxos de caixa podem não permitir uma comparação válida de tais empresas. Em vez disso, indicadores financeiros – a relação numérica entre duas categorias – podem fornecer insights poderosos sobre a saúde financeira de uma empresa. Jonathan Swift observou que “a visão é a arte de ver o que é invisível para os outros”, e os indicadores financeiros fornecem tal visão. Quatro tipos de indicadores ajudam os gestores e as partes interessadas a analisarem o desempenho da empresa: lucratividade, alavancagem, liquidez e eficiência. Essas relações podem ser usadas para acompanhar o desempenho de uma empresa ao longo do tempo ou para comparar várias empresas de vários setores relacionados.

Indicadores de rentabilidade

Indicadores de alavancagem

Indicadores de liquidez

Indicadores de eficiência

As Figuras 5.2-5.4 apresentam a demonstração de resultados, o balanço patrimonial e os fluxos de caixa para uma proposta de um centro de estética e laser que oferece consultas aos pacientes, cuidados com a pele e procedimentos feitos em consultório. Os balanços pró-forma normalmente são estimados por 3-5 anos e incluem muitas suposições sobre fluxos de receitas, custos e crescimento. Tal planejamento é importante para o sucesso do empreendimento, para que o desempenho em tempo real possa ser comparado com os resultados esperados e para que as mudanças possam ser implementadas, se necessário. A Figura 5.5 demonstra o tempo de equilíbrio, quando as receitas excedem as despesas e a renda torna-se positiva.

FIG. 5.2 Contabilidade. Amostra pró-forma: demonstrativo de lucros/perdas.

FIG. 5.3 Contabilidade. Amostra pró-forma Balanço

FIG. 5.4 Contabilidade. Amostra pró-forma: Resumo dos fluxos de caixa

FIG. 5.5 Contabilidade. Amostra proforma: análise de ponto de equilíbrio.

Finanças O objetivo das finanças é maximizar o valor corporativo, minimizando os riscos financeiros da empresa.11 Se a contabilidade é a linguagem e a gramática dos negócios, então as finanças são uma combinação de poesia e física teórica, acrescidas de rock ’n’ roll para manter a mistura interessante. A tese central das finanças é a de que o risco pode ser gerenciado com sucesso, de tal forma que a riqueza seja criada, combinando as variáveis de dinheiro, bens, cadeia de suprimentos e capital humano, para produzir um bem ou serviço que seja mais valioso do que o custo de produção. O consumidor, no entanto, é o árbitro final, quem decide se o bem ou

serviço é mais valioso do que o custo das entradas, e se a saída é mais valiosa do que o preço que o consumidor está disposto a pagar. Se assim for, o consumidor troca dinheiro pelo bem ou serviço. O risco pode ser medido estatisticamente e, portanto, leva em conta as suposições que são conhecidas com certeza, o resultado da tomada de decisão pode ser previsto com probabilidade específica. Assim, a decisão de fazer um investimento em um novo equipamento, um novo funcionário, uma nova linha de produtos ou de comprar outra empresa pode ser feita com um certo nível de confiança. No entanto, quando algumas variáveis são desconhecidas (ambiguidade) ou quando não há variáveis conhecidas (incerteza verdadeira), a gestão financeira pode não ser possível, até o ponto em que o acaso pode fornecer mais informações acerca dos resultados. Esta seção irá introduzir ferramentas comuns usadas por gerentes financeiros ao analisar um cenário financeiro, para determinar a decisão de avançar ou de não avançar com relação à aquisição e alocação de ativos. Embora o entendimento da mecânica de tais cálculos não seja essencial, entender a lógica por trás da tomada de decisões é fundamental, bem como compreender o significado dos resultados. Vamos rever os seguintes conceitos: valor temporal do dinheiro, custo de oportunidade, valor presente líquido (VLP), fluxos de caixa descontado (DCF), custo médio ponderado de capital (WACC) e a taxa de obstáculo, retorno sobre o investimento (ROI) e a taxa interna de retorno (TIR).

Valor temporal do dinheiro O dinheiro aumenta de valor ao longo do tempo, e tal apreciação é realmente logarítmica (apesar de demorar um pouco para funcionar!). Mesmo Einstein admitiu que “a força mais poderosa do universo é a dos juros compostos.” Essencialmente, um dólar hoje vale ligeiramente mais amanhã e muito mais em 10 anos. Um dólar investido em uma conta do mercado monetário com um retorno anual de 2% renderá 2 centavos no próximo ano, aumentando o valor desse investimento para US $1,02, que é o valor futuro do dólar de hoje. A fórmula para o valor temporal do dinheiro é:

Por que o dinheiro tem um valor temporal? Os economistas atribuem isso a dois fatores: adiamento do consumo e expectativas de inflação. As taxas de juros são uma proteção contra esse tipo de depreciação. À medida que aumenta o risco de um investimento, então a recompensa para o investidor precisa aumentar, para convencer o investidor a entrar com $1 hoje, na esperança de ter possivelmente US $1,20 no próximo ano (o que seria um retorno de 20%). A taxa real que o dinheiro pode valorizar é determinada por vários fatores, como o risco do investimento específico, o desempenho do mercado acionário, o rendimento dos títulos do tesouro dos EUA e a política monetária estabelecida pelo Federal Reserve, que define as taxas de empréstimos overnight para mercados comerciais. Consequentemente, a obtenção de capital custa dinheiro. Se uma pessoa faz um empréstimo bancário, esse empréstimo cria risco para essa instituição, portanto, o banco precisará coletar mais dinheiro do devedor quando a dívida for paga, em algum momento no futuro. Mas aqui está o problema: os bancos precisam não só cobrar o valor temporal do dinheiro, que é sua taxa esperada de retorno (também chamada de taxa de desconto), como também se proteger contra seu risco como devedor, elevando o custo do capital e aumentando a taxa de juros que a pessoa deve pagar. Na verdade, se o banco puder fazer um investimento mais seguro, com uma taxa de retorno possivelmente maior, então ele não deve dar prosseguimento ao empréstimo.

Custo de oportunidade Ao considerar um novo projeto ou a compra de um equipamento, a pessoa deve fazê-lo apenas se o valor intrínseco do ativo for igual ou maior do que o seu custo. O que se deve também considerar, porém, é o custo de oportunidade de imobilizar tempo precioso, dinheiro e energia nesse projeto ou ativo, quando esses recursos poderiam ser investidos em outros lugares. A definição de custo de oportunidade é o benefício potencial perdido de não seguir o curso financeiramente ideal de ação. Em vez de pensar nos parâmetros de

sim/não, os investidores devem tomar decisões do tipo ou/ou, à procura de outras oportunidades, até que possam comparar o curso proposto de ação com a melhor alternativa. No âmbito da cirurgia, no qual a maior parte da receita do médico é gerada a partir de procedimentos, qualquer atividade que leve o cirurgião a sair da sala de cirurgia deve ser comparada com cuidado com aquilo que o cirurgião poderia realizar se ficasse na sala de cirurgia.

Valor presente líquido e fluxos de caixa descontados A decisão de continuar com um projeto, quando as considerações econômicas são importantes, envolve determinar o VPL dessa oportunidade. O VPL é calculado adicionando-se uma série cronológica dos fluxos de caixa, tanto de entrada quanto de saída, que o projeto deverá produzir, sobre uma série de períodos futuros. Esse cálculo inclui o custo inicial de aquisição do ativo, no DCF0 mais a receita antecipada que gere o ativo, DCF1 até DCFn. Cada fluxo de caixa futuro deve ser descontado do valor presente.

Se o VPL for > 0, então o investimento acrescentaria valor à empresa, e o projeto poderia ser aceito. Se o VPL for < 0, então o investimento subtrairia valor da empresa, e o projeto deveria ser rejeitado. A taxa de desconto selecionada é frequentemente o WACC da empresa, que combina o custo da dívida (empréstimo de dinheiro) com o custo do capital próprio (retornos esperados pelos acionistas em suas ações). Outra abordagem ao selecionar a taxa de desconto apropriada é determinar a taxa que outro investimento renderia se esse capital fosse utilizado em um projeto diferente. Essa taxa de retorno necessária é, muitas vezes, denominada taxa de obstáculo, que é maior para projetos mais arriscados e menor para aqueles mais seguros. A taxa de obstáculo representa a taxa de retorno esperada de projetos livres de risco (vinculados à conta do tesouro dos EUA, por exemplo) e mais a taxa de retorno potencial para projetos arriscados.

Retorno do investimento Depois que a pessoa projetou os fluxos de caixa futuros para determinado investimento, como é possível avaliar esses fluxos de caixa futuros, em termos do valor desse investimento? Várias abordagens são úteis para decidir o valor potencial de empreendimentos futuros e para analisar retrospectivamente o valor real dos empreendimentos passados. Essas metodologias incluem: ROI formal ou rendimento, o método de retorno do investimento (payback), a TIR e o modelo VPL/DCF. A técnica mais rigorosa e poderosa é a análise do VPL/DCF, mas as limitações incluem várias suposições sobre fluxos de caixa futuros, selecionando a taxa de desconto adequada e a complexidade do cálculo. Como resultado, previsões usando VPL tendem a ser conservadoras, mas pelo menos elas incorporam o valor temporal do dinheiro, para que o investidor possa tomar decisões com base no valor atual do dinheiro. Uma abordagem muito mais simples para calcular o ROI é o rendimento, que é representado pela seguinte fórmula:

O rendimento, no entanto, é expresso como uma percentagem e, portanto, dá poucas informações sobre a magnitude do valor do investimento. Além disso, o rendimento pode ser facilmente manipulado usando-se métricas variadas para definir o “ganho” e o “custo.” O rendimento é útil ao comparar produtos ou serviços semelhantes, dentro de um mercado ou indústria. O método de payback, que mede o tempo necessário para o fluxo de caixa do projeto pagar o investimento

inicial, é também muito popular entre os gerentes de níveis médio, que precisam justificar a compra de bens de equipamento e prever o tempo para o ponto de equilíbrio.

O que o período de retorno não leva em conta é a depreciação do equipamento, a expectativa de vida útil do ativo e o valor residual do ativo no final do período. Além disso, os fluxos de caixa para um projeto ou ativo geralmente mudam de um ano para outro, e, portanto, o período de retorno apenas estima quando o projeto ou ativo atingirá ponto de equilíbrio. Se a vida útil do investimento for maior do que o payback, então o investimento deverá ser realizado, pelo menos por razões financeiras. Outra técnica utilizada para avaliar o ROI é IRR. Em vez de assumir uma determinada taxa de desconto para um investimento e calcular o VPL, o método IRR determina qual é o real retorno projetado pelos fluxos de caixa. O IRR é então comparado com a taxa de obstáculo da empresa, que pode variar para diferentes projetos, dependendo do risco, do horizonte de tempo para o retorno e do custo do capital da empresa ou WACC. Outra maneira de entender esse método é que IRR representa a taxa de obstáculo necessária para fazer o VPL = 0. Problemas com o uso do IRR incluem não quantificar o valor total do projeto, bem como em quanto tempo a empresa pode antecipar o tempo de retorno. Não obstante, IRR, o método de payback e o rendimento são úteis quando formos comunicar o ROI potencial para as partes interessadas, devido à sua simplicidade e facilidade de compreensão.

Economia A grande abrangência do campo da economia nos impede de fazermos uma revisão detalhada neste contexto, mas, no entanto, podemos descrever conceitos-chave. A disciplina como um todo vai desde a macroeconomia até a microeconomia, da economia normativa à economia comportamental, desde a economia heterodoxa até a teoria dos jogos. Como outros ramos da economia, a economia da saúde lida com a tomada de decisões no cenário de incerteza, recursos limitados e demanda variável.12-14 No entanto, a economia da saúde é distintamente diferente de outros ramos da economia, porque a saúde é uma indústria que inclui a extensa intervenção e regulamentação do governo; assimetria de informação entre provedor, paciente e contribuinte; falta de métricas precisas no que se refere aos resultados dos pacientes; e consideráveis externalidades, que são os efeitos a jusante em outras entidades, fora do sistema de saúde. A demanda por um bem ou serviço é baseada na vontade de um comprador pagar por ele, que, por sua vez, é influenciada pelos gostos ou necessidades do comprador, a renda ou riqueza do consumidor e a disponibilidade de substitutos e bens complementares. As curvas de demanda, então, podem ser construídas para descrever a vontade de comprar do indivíduo ou da população: conforme os preços aumentam, a demanda diminui. A elasticidade do preço representa a variação na quantidade procurada em função da mudança de preço, e é crucial para a maneira na qual os mercados se ajustam. Bens ou serviços com substitutos próximos, como Botox® e Dysport®, tem uma curva plana, elástica, em que pequenas mudanças no preço produzem grandes mudanças na demanda. Outros bens e serviços podem ter as curvas de demanda inelásticas, íngremes, em que grandes mudanças no preço podem ter efeitos mínimos na demanda. Este é o que acontece com necessidades que tenham poucos substitutos, bem como com alguns itens de luxo. A elasticidade do preço para um determinado bem ou serviço também pode variar, com base no segmento específico do mercado que se tem por meta e pode ser influenciada por forças macroeconômicas. O fornecimento de um bem ou serviço depende dos objetivos estratégicos de curto prazo e de longo prazo da empresa. As decisões sobre o fornecimento baseiam-se, inicialmente, nos custos marginais, que variam de acordo com o nível de produção. Conforme a produção aumenta, os custos marginais também sobem. No entanto, os custos fixos médios diminuem com o aumento do volume. Essas curvas são combinadas para produzir uma curva em forma de U de custo total médio, a partir do qual é o menor preço que a empresa pode cobrar e conseguir o equilíbrio. Uma empresa pode oferecer um bem ou serviço desde que o preço de mercado permaneça acima dos custos médios totais. Uma curva de oferta de mercado agregada demonstra que, com os

aumentos de preços, mais empresas estão dispostas e aptas a produzir os bens ou produtos. O equilíbrio do mercado ocorre quando as forças de oferta e procura adaptam-se a um preço e a uma quantidade que satisfaçam tanto os produtores quanto os consumidores. Os mercados se moverão de maneira previsível, com base nas alterações na oferta e na demanda. O aumento da oferta faz com que o preço de equilíbrio caia e a quantidade de equilíbrio aumente. Por outro lado, a nova demanda por um produto ou serviço fará com que o preço de equilíbrio suba, com um subsequente aumento na quantidade de equilíbrio. Mercados reais, no entanto, são confusos e podem se comportar de maneiras que só se aproximam dessas regras. Para esses modelos econômicos funcionarem, os mercados devem ter concorrência perfeita, na qual os produtos são idênticos, os vendedores e compradores não façam manipulação estratégica de oferta e demanda, os jogadores façam escolhas racionais, as barreiras de entrada e saída sejam inexistentes, e os participantes estejam plenamente informados a respeito desse mecanismos. Esse mercado não existe. Prever as forças econômicas que formam o mercado da saúde é um desafio considerável, já que tal competição está longe de ser perfeita. As empresas podem obter vantagem estratégica, então, explorando as ineficiências do mercado. As abordagens éticas incluem a diferenciação do produto, a segmentação do mercado, respostas a novas mudanças culturais, sociais e políticas e uso da tecnologia e da inovação para criar novas proposições de valor. As táticas antiéticas envolveriam a manutenção de uma assimetria de informação entre consumidores e produtores, aproveitando-se da tomada de decisões irracional, criação artificial de demanda ou limitação do abastecimento, conluio com outros participantes e criação de barreiras intransponíveis de entrada para novos participantes. No setor de saúde, os fornecedores de serviços devem ficar cientes dessas oportunidades – éticas e antiéticas – e manter um nível de responsabilidade que garanta o profissionalismo o tempo todo. Em resumo, os mercados se esforçam para chegar ao equilíbrio, mas ajustes na oferta e na demanda podem não levar à eficiência produtiva, que, por si só, não é uma garantia da distribuição justa da riqueza na sociedade. Um dilema final para refletir: nem todos os custos e benefícios de uma transação revertem para o comprador e o vendedor. Essas externalidades – efeitos a jusante na sociedade – podem ser benéficas (nova tecnologia que prolonga a vida), mas também são, muitas vezes, prejudiciais (produção de resíduos de produtos médicos). Como podemos incorporar essas externalidades em nossa tomada de decisões, para que aumentemos o valor social total das nossas ações?

Marketing Os negócios não poderiam existir sem o consumidor, e o marketing é o processo que permite que os negócios se conectem com o cliente.15,16 A estratégia de marketing identifica, atrai, satisfaz e retém consumidores. Buscando construir mais do que uma simples troca entre o produtor e o consumidor (ou em cuidados de saúde, entre o profissional e o paciente), o marketing é primeiro e acima de tudo impulsionado pelas necessidades e desejos do consumidor. A abordagem ideal em marketing é entender os clientes inicialmente no contexto de seu ambiente, que inclui não só a avaliação da dimensão do mercado, mas também das forças competitivas, barreiras à entrada e estrutura do mercado. Em seguida, o marketing procura desenvolver um produto ou oferecer um serviço específico com base em necessidades previstas para o consumidor, que podem ou não ser satisfeitas adequadamente, ou mesmo não ser apreciadas. Por fim, o marketing se esforça para fornecer valor ao cliente sob a forma de ponto de preço, qualidade e distribuição. Embora a estratégia de marketing seja, muitas vezes, excessivamente simplificada, centrar-se nos “4Ps” – produto, preço, promoção, posição – é um bom ponto de partida para nossa avaliação. O produto refere-se aos aspectos e características definidoras de um bem ou serviço. O preço é determinado levando-se em conta os custos de produção com o valor adicional que pode ser extraído pelo produtor, com base em características de valor agregado e da demanda pelo bem ou serviço. O cálculo do volume do ponto de equilíbrio é importante para se determinar se determinada estratégia de preços é razoável. A fórmula para descobrir quantas unidades uma empresa deve vender, para que seus custos sejam cobertos, é representada como segue:

Para se atingir uma meta de lucro específico, a fórmula pode ser modificada como segue:

A promoção envolve os canais que serão necessários para que a empresa possa comunicar sua mensagem, e eles podem incluir publicidade, uso de força de vendas ou incentivos (preços para grandes volumes, descontos, recompensas e benefícios do comprador frequente, por exemplo). O posicionamento é, sem dúvida, a mais importante dessas variáveis; especialistas em marketing segmentam um mercado geral para determinar que tipos de pessoas (jovens versus velhos, homens versus mulheres, rendimento elevado versus baixa renda) desejam que tipos de produtos. A segmentação permite a melhor alocação dos recursos finitos de uma empresa, permite à empresa atingir grupos específicos de alto rendimento e melhora o posicionamento do produto para maior penetração no mercado. Na verdade, uma empresa pode oferecer produtos relacionados, mas ligeiramente diferentes, se a pesquisa de marketing demonstrar que múltiplos segmentos têm necessidades ligeiramente diferentes. Em vez de perseguir uma filosofia de “tamanho único” e segmentos em falta no mercado, uma empresa pode empregar a análise de mercado para justificar, com confiança, várias ofertas de produtos relacionados. Nas últimas duas décadas, em que os consumidores têm sido fortalecidos pela internet (leilões on-line, disponibilidade de comentários sobre o produto e fácil comparação de preços), o marketing mudou do modelo da oferta para um modelo baseado na demanda, no qual as perspectivas dos consumidores são fatoradas pela abordagem dos 4Ps centrada no fornecedor. Os produtos são agora vistos como soluções para o cliente, a promoção agora inclui a transferência de informações, o preço foi substituído pelo valor do consumidor, e o posicionamento é visto como acesso. Para identificar os segmentos de mercado que podem comprar um produto ou serviço e para determinar quais qualidades esse segmento consideraria mais valiosas, a pesquisa de mercado utiliza ferramentas analíticas complexas, como a análise de regressão, as análises conjuntas, mapas perceptuais e o cenário de planejamento para a tomada de decisões. A Figura 5.6 demonstra a paisagem promissora do rejuvenescimento facial, na qual os pacientes podem escolher entre uma série de intervenções, com base em parâmetros como preço, durabilidade, invasibilidade e tempo de recuperação. O marketing visa identificar quais clientes querem quais procedimentos e foca especificamente nesse grupo como alvo. Ocasionalmente, um espaço de mercado incontestável é descoberto, baseado na alteração das preferências do cliente, ou abre-se, devido aos avanços na tecnologia.

FIG. 5.6 Marketing. Mapa perceptual.

O ato de conectar o consumidor ao produto ou serviço é fundamental para o cargo de marketing e pode prover enormes frutos, em termos de receitas, branding e boa vontade. Como tal, o marketing é visto pela empresa como um investimento, semelhante à pesquisa e ao desenvolvimento, em que o ROI é previsto e cuidadosamente estudado, juntamente com outras métricas, como quota de mercado, atrito do consumidor, satisfação do consumidor, trocas e devoluções e quantidade de contas a receber. Outras ferramentas de pesquisa incluem grupos focais de cliente, dados demográficos e questionários para o consumidor. Além de usar estratégias como a segmentação, o direcionamento e o posicionamento, o marketing também pode utilizar branding como uma poderosa ferramenta para comunicar as qualidades de uma nova oferta de produtos. Em muitos aspectos, uma marca forte serve, embora não legalmente, como uma promessa de que o novo produto ou serviço será semelhante aos oferecidos anteriormente. A branding pode incluir um logotipo, uma frase, uma imagem ou um sentimento que serve como um espaço reservado para a empresa e sua reputação. Uma estratégia que não é particularmente eficaz, mas que deve ser mencionada, para se estar alerta, é a de desvio de percepção. Isso ocorre quando a promoção tenta mudar as necessidades e os desejos de um grupo-alvo, para que eles acreditem que precisam ou desejam o produto ou serviço, ou quando a promoção desloca as qualidades percebidas do produto ofertado, para que esses recursos correspondam mais de perto às necessidades e desejos do grupo-alvo. Tal estratégia produzirá um efeito em muito curto prazo, que temporariamente pode melhorar as vendas, mas terá efeitos desastrosos em longo prazo sobre o relacionamento com o consumidor. Essa estratégia é empregada quando as empresas não desejam repetir transações com seus consumidores ou quando um produto está atingindo sua obsolescência e toda a fabricação está diminuindo. Com o recente declínio na mídia impressa e em outros veículos de comunicação tradicionais, como o rádio e a TV aberta, o marketing voltou-se para a internet, para promover produtos e serviços, fornecer informações para o consumidor e corresponder à oferta adequada com o grupo correto. Muitos economistas indiscutivelmente afirmam que, em nossa nova era digital, o custo de armazenamento de informações está se aproximando a zero, e o valor das informações pode-se mover em direção ao infinito. Apesar de isso poder ou não ser provado, é claro que a informação digital mudou completamente as regras de comercialização. As empresas podem reunir informações específicas sobre os consumidores, com base em seus hábitos de compra na Amazon, nos seus amigos no Facebook, no que eles escrevem em blogs no Huffington Post, e nos artigos que leem na CNN.com. Por uma fração do custo da mídia tradicional, as empresas podem chegar a seus clientes por meio de e-mail direto ou através de motores de busca. Os departamentos de marketing agora focam na otimização das ferramentas de busca e no marketing pelos motores de busca. Assim como algumas empresas experimentam com novos fluxos de receita, tanto on-line quanto offl-ine, alguns produtos podem ser oferecidos gratuitamente, enquanto serviços relacionados podem custar caro.

Operações As operações podem ser definidas por relacionarem a oferta com a demanda.17,18 Embora os economistas possam descrever como os preços mudam com as alterações na oferta e na demanda, os gestores responsáveis pela produção do estoque ou pela coordenação dos serviços têm uma perspectiva totalmente diferente: demanda em excesso é perda de receita, e excesso de oferta é desperdício de recursos. O modo como o gestor equilibra a oferta e a demanda determina não só potenciais receitas de bens e serviços, mas também os custos operacionais, que, juntos, resultam no rendimento operacional da empresa. A eficácia operacional é fundamental para o sucesso da empresa; de fato, ela pode ser uma fonte de vantagem competitiva. As empresas que obtêm mais de suas entradas, ou usam menos fatores de produção, para produzir saídas de mais alta qualidade serão capazes de oferecer bens ou serviços a custos mais reduzidos do que seus concorrentes ou de extrair mais valor financeiro desses bens e serviços. Esse fluxo de entradas para saídas também é chamado de cadeia de abastecimento e, quando bem gerido, agrega valor ao produto final, antes que ele seja repassado para o consumidor. Para otimizar o fluxo dessa cadeia de valor, o campo de operações utiliza elementos da teoria das filas, para prever e controlar a demanda, bem como a teoria das restrições, para prever e controlar os suprimentos. Talvez o maior desafio na determinação da demanda para um bem ou serviço é a variabilidade. Em medicina, por exemplo, a longa fila de espera na clínica para ser atendido por um médico é, em geral, devido à variabilidade nos tempos de chegada dos pacientes, que é agravada por uma variabilidade nos tempos de prestação de serviço pelo profissional. Eis porque os pacientes de um determinado tipo são frequentemente agendados em

lotes, para minimizar a variabilidade em ambos os lados da equação. Na indústria de serviços, métricas principais que devem ser controladas, em um esforço para melhorar a eficácia operacional, incluem:

Os gargalos no processo de produção (de bens) ou processo de entrega (para serviços) ocorrem quando a demanda em um posto específico no processo de fluxo é maior do que as saídas produzidas nessa estação. Em qualquer ponto, um processo tem tecnicamente apenas um gargalo, que é definido como o recurso com menor capacidade. O fluxo ao longo de um estágio pode ser medido para identificar o gargalo, mas esse ponto de restrição é, muitas vezes, evidente pela alta utilização, sem folgas ou alívio, com acúmulo de estoque e queixas dos trabalhadores e dos consumidores. Os princípios usados para fazer a oferta corresponder à demanda incluem: 1. Já que o recurso limitante define a capacidade, foque na melhora da produção no gargalo (isto, é claro, cria um novo gargalo em outro lugar no sistema). 2. Mantenha estoque suficiente e trabalho em processo para manter a linha de produção fluindo, para evitar desabastecimento e prever a variabilidade da demanda, mas não tanto, de forma que o capital seja hiperinvestido em bens ou serviços inacabados ou não utilizados. 3. Sistemas ou estações operando perto de 100% de capacidade não são sustentáveis; 80% de utilização são considerados como um alvo razoável. 4. Planeje cuidadosamente, já que a variabilidade e a incerteza podem se propagar ao longo da cadeia de abastecimento, criando um efeito de chicote de aumento do impacto que gera excesso ou falta de produção. 5. A prevenção custa menos do que a inspeção e a correção. Nunca agregue valor a uma parte que esteja deficiente. 6. Nunca permita que a causa do problema persista por não trabalhar no cerne do problema. 7. A alta qualidade não é gratuita, mas pode ser um grande investimento. 8. As previsões são sempre erradas, às vezes umas mais até do que as outras. 9. As indústrias de serviços enfrentam desafios únicos que envolvem customização da produção e alto grau de interação do trabalho. Em um esforço para melhorar a eficiência operacional, vários métodos foram desenvolvidos para reduzir defeitos, aumentar a produtividade e melhorar a qualidade. Uma manufatura enxuta é um processo de produção no qual qualquer despesa ou recurso que não agregue valor ao cliente está sujeito a ser eliminado. Originalmente desenvolvida pela Toyota, a manufatura enxuta tenta “trabalhar de forma mais inteligente, e não de modo mais difícil”, reduzindo ou eliminando sete fontes de resíduos: superprodução, transportes desnecessários, estoque, movimento, defeitos e espera. Embora essa abordagem produza somente melhoras incrementais nas operações, o sistema em si foi uma inovação que promoveu a vantagem competitiva sobre outras empresas na indústria de produção de automóveis. Outra metodologia que fornece melhoras incrementais por meio de redução de defeitos e melhora da qualidade é a do Seis Sigma, originalmente desenvolvida pela Motorola. Usando o modelo DMAIC de definir, medir, analisar, melhorar e controlar, os especialistas (conhecidos como blackbelts, greenbelts e yellowbelts, dependendo do nível de formação e de responsabilidade) tentam melhorar a qualidade da produção do processo ao minimizar a variabilidade na linha de produção e reduzir defeitos ou erros para menos de três por milhão (seis desvios-padrão do alvo desejado, daí o nome, Seis Sigma). As ferramentas de gestão de qualidade usadas para identificar áreas que necessitam de melhora incluem o mapeamento do processo de negócios, análise de custo – beneficiamento, fundamental para árvores de qualidade, gráficos de Pareto e análise SIPOC

(fornecedores, insumos, processo, produção e clientes). Depois de determinar a causa de origem dos defeitos ou das ineficiências, os especialistas da Seis Sigma aplicam e testam intervenções como planejamento de contingência, processamento paralelo e redesenho de fluxo de trabalho para reduzir defeitos, melhorar a qualidade e maximizar o rendimento. Embora a metodologia dos Seis Sigma forneça melhoras incrementais apenas para sistemas ineficientes e possa, de fato, sufocar a inovação “fora do quadrado”, melhoras na qualidade e na produtividade operacional podem render recompensas financeiras substanciais em termos de redução de custos, boa vontade da empresa, branding e satisfação de clientes e funcionários. Em indústrias de serviços, a cadeia de valor pode ser reforçada ao focar-se não só na qualidade, mas também na felicidade das partes interessadas. No livro Putting the Service-Profit Chain to Work (algo como “Colocando a cadeia de serviço-lucro para trabalhar ”), Heskett e colaboradores descrevem um modelo de satisfação das partes interessadas, no qual a qualidade do serviço interno promove a retenção e a produtividade dos funcionários, que, por sua vez, geram valor do serviço externo, garantindo a fidelização e a retenção, que tem um impacto direto no crescimento das receitas e na rentabilidade.19 Funcionários e consumidores podem se mover de uma zona de indiferença às zonas de afeição ou deserção, dependendo do seu nível de satisfação. Na verdade, Jones e Sasser argumentam no texto Why Satisfied Customers Defect (em uma tradução livre, Porque os clientes satisfeitos se vão), que a completa satisfação do cliente é a chave para assegurar a lealdade – intenção de recompra – e gerar um desempenho financeiro superior em longo prazo.20 Diferentes indústrias têm diferentes curvas de lealdade/satisfação, criando uma mistura de consumidores que inclui apóstolos, fiéis, mercenários, desertores, reféns e os terroristas. As empresas devem dirigir os esforços para alcançar a satisfação completa, para reter os fiéis e atrair os mercenários (os apóstolos vão ficar), enquanto os terroristas não devem ser seu objetivo e devem liberar os reféns. Na área da saúde, os pacientes que não estão completamente satisfeitos ou especialmente satisfeitos irão buscar outros profissionais.

Est udo de ca so 5 .1 Na Universidade da Carolina do Norte, formulamos a hipótese de que a implementação de um programa Seis Sigma na reconstrução de mama com retalho da perfurante poderia melhorar os resultados operacionais, financeiros e clínicos, reduzindo a variação, melhorando a qualidade e a eficiência e otimizando o rendimento. Um programa bem-sucedido em microcirurgia exige a coordenação complexa de diversas equipes, recursos e processos e, dessa forma, melhoras na eficiência e no desempenho podem ser difíceis. Usando o modelo DMAIC (definir, medir, analisar, melhorar, controlar) de melhoria de processos, utilizamos a análise SIPOC (fornecedores, insumos, processo, produção, clientes), questionários VOC (voz do cliente) e grupos focais, árvores de causa/efeito e análise de fluxo de trabalho/caminho crítico para identificar as ineficiências no processo. Com o objetivo principal de diminuir os tempos operatórios (pré-operatório até a chegada na sala de cirurgia, chegada até incisão e incisão até sutura), implementamos as seguintes intervenções: reduzir etapas redundantes dos passos anestésicos e cirúrgicos, eliminando tarefas não essenciais de enfermagem, tendo pessoal consistente com formação adequada, microscópio e dispositivos de monitoramento do retalho frequentes e operantes, rearranjo do leito e equipamento na sala de cirurgia e a criação de um carrinho de microcirurgia. Comparamos os pacientes do Seis Sigma (n = 27) com um grupocontrole de pacientes antes do Seis Sigma (n = 39), com foco em medidas de resultados operacionais, financeiros e clínicos. De 2006 a 2009, 66 pacientes (idade mediana de 48,4, índice de massa corporal de 29,3) submeteram-se a 98 reconstruções de mama com retalhos da perfurante da artéria epigástrica inferior profunda (DIEP) e/ou perfurante da artéria epigástrica inferior superficial com microcirurgiões treinados academicamente. O tempo total de sala de cirurgia diminuiu de 714 para 652 minutos (P = 0,08), com o tempo de pré-operatório até a incisão caindo de 73 para 65 minutos (P = 0,03). A maior queda no tempo total de sala de cirurgia veio nos casos unilaterais (672 para 498 minutos, P = 0,001), com ganhos menos substanciais observados nos casos bilaterais, imediatos ou tardios. A duração da permanência no hospital diminuiu de 6,3 para 5,6 dias (P = 0,05). As taxas de complicação e de devolução não foram alteradas, com apenas uma perda de retalho total e três perdas de retalho parcial. A renda do médico aumentou modestamente de $4.490 para $4.949 por caso. Mais impressionante, a renda médica por minuto saltou de US $6,28 para US $7,59 (P = 0,02). As receitas do hospital aumentaram minimamente de US$14.676 para US $15.418 por caso, mas a receita hospitalar por minuto teve ganhos mais impressionantes, de US $21,84 para US $25,11. A margem de contribuição (receita menos custos variáveis) aumentou em US $1.264 por caso, devido à redução do tempo de sala de cirurgia e da duração da permanência hospitalar.

Podemos concluir que uma iniciativa Seis Sigma na reconstrução de mama com retalho da perfurante melhora os resultados operacionais, financeiros e clínicos, evidenciados pela diminuição do tempo operatório, pela redução da permanência hospitalar, pela redução de custos variáveis, pela melhor renda do médico e pela margem de contribuição maior para o sistema de saúde. Manter esses ganhos em eficiência, a redução de defeitos e a qualidade será fundamental e pode vir a ser bastante desafiador.

Inovação Considerando que o campo de operações agrega valor por meio da melhora incremental, a inovação produz mudanças radicais ou revolucionárias no pensamento, no design, nos produtos, nos processos e até mesmo nas organizações.21-24 As operações servem para explorar as ineficiências existentes, com o objetivo de diminuir custos e ter uma produção mais rápida e de qualidade superior, por meio de intervenções como políticas de defeito zero, técnicas de fabricação enxuta e coordenação da cadeia de abastecimento mais apertada. A inovação, por outro lado, interrompe o paradigma atual e não apenas expande o mercado existente, mas também pode criar mercados inteiramente novos. Thomas Krummel, cirurgião pediátrico que dirige o programa de Biodesign em Stanford, descreve uma sequência de descoberta, invenção, inovação e empreendedorismo, que é a marca registrada da medicina translacional.23 Mais importante, ele pergunta, “por que a inovação deveria ser deixada ao acaso?” e fornece um argumento convincente para estudar, compreender e ensinar a inovação. O conhecimento médico pode ser utilizado diretamente na assistência ao paciente, mas o treinamento de outros médicos, o desenvolvimento de novas soluções e a aplicação de novas tecnologias podem aumentar exponencialmente o impacto dos cirurgiões. Uma pergunta razoável, que tem uma resposta surpreendente, é “por que precisamos inovar?” Peter Drucker, aliás, escreveu que as duas funções essenciais da empresa são inovação e marketing, porque estas criam valor real; todos os outros processos são custos.21 Como o ambiente de negócios está sempre em mudança, a posição de uma empresa em relação à sua concorrência, novos concorrentes, substitutos, fornecedores e consumidores, também está em fluxo. Uma empresa que goza de quota de mercado dominante hoje poderia tornar-se facilmente deslocada amanhã. Além da inovação, a única vantagem competitiva que uma empresa pode manter baseia-se nas melhoras incrementais em preço, qualidade e acesso – até que uma nova empresa introduza uma inovação que afete drasticamente essas qualidades, expanda significativamente o tamanho do mercado ou, na verdade, mude as necessidades e as preferências do cliente. A inovação é realmente mais eficaz e necessária durante os períodos de estabilidade, enquanto a melhora dos processos é mais valiosa para uma empresa durante os períodos de crescimento. A inovação bem-sucedida requer disciplina e trabalho árduo, além de criatividade. As empresas que dominam o processo de inovação, como a Apple, a MayoClinic e a empresa de design Ideo, seguem um roteiro que consiste em quatro fases: avanço ou descoberta, plataforma de desenvolvimento, mudanças de derivativos e manutenção. Por meio de um plano orquestrado cuidadosamente, no qual essas fases se sobrepõem, os gerentes de projeto alocam recursos (tempo, dinheiro e pessoas) baseados na importância de cada fase, no nível de incerteza e na localização no processo fundamental. A Apple pode introduzir um novo produto, como o iPod, iPhone e iPad, todos os anos, mas cada um desses dispositivos sofre um processo iterativo de melhora e atualização de valor agregado em tecnologia. Por ter uma carteira diversificada de novos produtos, a Apple está garantindo o sucesso da sua empresa, semelhantemente a um fundo mútuo com vários investimentos. Ocasionalmente, tal inovação é perturbadora, deslocando alguns produtos, aumentando a concorrência com produtos da própria empresa e criando novos mercados para os outros operadores. Tal é o caso com a música digital: a Apple mudou de uma empresa de informática para uma empresa de informação e comunicação, no período de uma década. A Apple foi capaz de aplicar tecnologia de ponta para criar novos produtos. Se a Apple tivesse focado em melhorias incrementais em seu sistema operacional ou software, como fez a Microsoft, então tais aplicações de spin-off, como e-books, jornais on-line e, claro, iTunes poderiam ainda não existir. O verdadeiro desafio virá do Google, que começou como um motor de busca, mas agora pretende dominar a paisagem da nuvem cibernética. Três motivadores da inovação bem-sucedida são entender o consumidor, “cruzar o abismo” e gerenciar o fracasso. Para ter sucesso em longo prazo, as empresas precisam servir e reter seus clientes de agora e adquirir novos, aplicando tecnologias de ponta e incrementais. O foco de qualquer empreendimento comercial deve começar com a voz do cliente – ao ouvir o que o cliente quer – e deve terminar com o que o cliente precisa. O bom marketing pode ser capaz de identificar as necessidades que ainda não existem, ou segmentos da

população que não tenham sido identificados. Em segundo lugar, antecipar quem irá precisar do produto ou serviço e quando. Os protótipos e as primeiras versões (pense no iPhone versão 1.0) são fundamentais para atrair os inovadores (nossos alunos de graduação) e aqueles que irão testar a primeira versão do produto (nossos residentes), que irão demonstrar a viabilidade do produto e criar um movimento inicial. ROI, no entanto, não irá ocorrer até que a maioria precoce (eu) e a maioria tardia (meu chefe) adotem essa tecnologia. Mesmo retardatários, que geralmente resistem às novas tecnologias, podem ser um grupo atraente para o alvo, já que podem se tornar os primeiros a adotarem a próxima tecnologia. Atravessar esse abismo, de adoção precoce para apenetração no mercado, é onde a maioria das empresas fracassa. O terceiro componente da inovação bem-sucedida, então, é aprender com o fracasso e com a falha de gestão. Assim como a manufatura enxuta e o Seis Sigma permitem a melhora incremental dos sistemas de produção, a experimentação controlada aumenta o rendimento dos esforços de inovação. Medidas para minimizar o risco incluem diferenciar a invenção da execução, a manutenção de uma linha de produção diversa e profunda de ideias e projetos e colaborar com pessoas fora da sua área de especialização técnica ou “zona de conforto.”

Est udo de ca so 5 .2 A principal competência da cirurgia plástica é a inovação. Como cirurgiões, no momento em que paramos de inovar, nos tornamos irrelevantes. Outros fornecedores podem replicar quase tudo o que fazemos, de procedimentos de reconstrução até procedimentos estéticos. Os cirurgiões plásticos têm procurado soluções para problemas cirúrgicos e foram os pioneiros no desenvolvimento de novos campos, como a cirurgia da mão, os transplantes e a microcirurgia, mas outras disciplinas têm se apropriado dessas técnicas e as integrado em seu âmbito de prática médica. Se os cirurgiões plásticos não podem competir pela diferenciação, então devem competir por alguma combinação de qualidade, preço ou serviço. Isso é razoável para a maioria dos profissionais de saúde, cujas práticas dependem da redução da variabilidade e da melhora da produtividade, mas nossa herança foi definida por nossa vontade de enfrentar novos problemas, melhorar os padrões de cuidados e abraçar a incerteza a respeito do que nosso próximo paciente vai precisar. Tal é o caso com a reconstrução da mama. Até o final da década de 1970, as mulheres com defeitos de mastectomia tinham poucas opções que não fosse a reconstrução tardia com implantes, produzindo resultados que eram imprevisíveis, altamente variáveis e de qualidade marginal. Com a introdução do tecido vascularizado, autólogo, no entanto, o paradigma para reconstrução mudou rapidamente para reconstrução imediata com retalhos pediculados. Uma nota interessante é que o omento foi proposto como uma fonte precoce de tecido para resolver o problema de durabilidade e qualidade, antes da introdução dos retalhos miocutâneos com reto transversal abdominal (TRAM) ou retalhos com latíssimo do dorso. Os cirurgiões reconheceram um mercado que precisava de reconstrução da mama sem materiais protéticos, mas ainda não identificavam uma solução. Com o advento da microcirurgia, na década de 1980, foram feitas previsões de que o campo mudaria novamente paraTRAMs “livres”, mas isso não aconteceu até muito mais tarde. O que ocorreu, na década de 1990, foi a convergência das forças econômicas e tecnológicas que deslocaram o pêndulo de volta em direção à reconstrução baseada em implantes. Um reembolso mais favorável e os resultados melhorados com a dissecção de linfonodos sentinelas, as mastectomias conservadoras de pele e a reintrodução dos implantes com gel de silicone pela Food e Drug Administration (FDA) guiaram essa mudança, apesar de a reconstrução com tecidos vivos ser uma tecnologia superior. Durante a primeira década deste século, assistimos novamente uma mudança para retalhos autólogos, nomeadamente os retalhos da perfurante, que poupam os músculos, reduzem a morbidade do sítio doador e podem melhorar o resultado final. O mote para essa alteração mais recente chegou indiscutivelmente não de um refinamento na técnica, que certamente já ocorreu, mas do mercado. Mulheres com defeitos de mastectomia, com o gene do câncer de mama e com complicações da cirurgia de mama estética anterior identificaram o retalho DIEP como o padrão de atendimento e criaram uma demanda sem precedentes e imprevisível para esse procedimento. Curiosamente, essa segmentação do mercado não era o produto de esforços direcionados por cirurgiões, mas foi largamente uma autogeração, conforme mais mulheres usavam a internet para obter informações, sob a forma de blogs, acesso às bases de dados de medicina e outros meios eletrônicos. Novas tecnologias, como o enxerto de gordura e a engenharia de tecidos, certamente irão novamente mudar o campo de reconstrução de mama.

Empreendedorismo Considerando que a tecnologia é a maneira como você faz as coisas e a inovação é a maneira de você fazer coisas novas, o empreendedorismo é o caminho pelo qual você aumenta o valor do que faz.25 O empreendedorismo é uma maneira de pensar, bem como um processo, que aumenta o impacto da inovação. Um empreendedor articula uma visão e desenvolve um sistema que monta entradas, cria um produto, serviço ou informação e captura o novo valor de produção. Os líderes empresariais agem para fazer existir uma possibilidade de negócios futuros, com um senso de urgência, não restrita por limitações no capital, pessoal ou produções. Em vez disso, o empreendedor utiliza sua imaginação, força, paixão e rede de contatos, a fim de obter o apoio de investidores, fornecedores e clientes. Talvez o recurso mais importante para um empreendedor, porém, seja uma assimetria de conhecimento. Os empresários podem estar cientes de: (1) forças macroeconômicas produzindo mudança nas normas demográficas, sociais e culturais; (2) novas tecnologias sem aplicações ainda definidas; e (3) as ineficiências existentes incorporadas dentro das indústrias atuais. Tais incongruências, no contexto da nova tecnologia e dos mercados em constante mudança, representam oportunidades tentadoras para os empresários. Os bons empresários encontram oportunidades; os grandes empresários criam as oportunidades. Qual é o processo, então, para transformar um desafio em uma oportunidade? O primeiro e único ato mais importante é estabelecer uma proposição de valor, que possa ser definida como o núcleo de competência que faz seu produto ou serviço ser único e valioso. A proposição de valor apresenta um problema e uma solução, descreve o que fazer e como fazer isso e serve para diferenciá-lo da concorrência – em uma só frase. Dessa proposição de valor, o empresário, a seguir, desenvolve um modelo de negócio, que deve ser traduzido em um plano de negócios. Com detalhes cuidadosamente ponderados e disponíveis aos potenciais interessados, o empreendedor deve procurar apoio para esse plano por meio de diferentes tipos de comunicação. O “pitch de elevador ”, que é uma apresentação de 30 segundos do novo empreendimento, é projetado para atrair o interesse e despertar a curiosidade do ouvinte. O sumário executivo é um resumo de uma página do plano de negócios, no qual o plano de negócios é um documento altamente detalhado, que varia de 20 a 60 páginas, concebidas para abordar questões específicas, para que os investidores analisem o empreendimento mais aprofundadamente. Uma visão geral de 10 minutos, normalmente apresentada em PowerPoint, também é necessária para fazer os investidores realmente lerem o plano de negócios. Em cada estágio, o empresário visa aumentar o interesse das potenciais partes interessadas e escuta ativamente o feedback, para que o plano de negócios possa ser revisado, reescrito e reorientado sempre que necessário. Se o empresário puder ganhar o compromisso das partes interessadas, então começa o processo de mobilização de capitais, gerindo cuidadosamente o dinheiro e a coordenação logística. Os empresários normalmente fazem o bootstrap enquanto podem, utilizando o capital humano, intelectual e social, em vez de pedir dinheiro emprestado ou buscar financiamento externo. Os empresários sabem que a pior hora para arrecadar dinheiro é quando ele é absolutamente necessário, porque eles devem ceder o controle e a propriedade da empresa cada vez que os investidores são trazidos a bordo com um afluxo de capital. O capital de risco é particularmente difícil de aceitar, porque esses investidores exigem de cinco a sete vezes de retorno sobre seu investimento, dentro de um horizonte de tempo de vários anos, e sua estratégia de saída é, em última análise, sobre a venda da empresa, não necessariamente sobre o crescimento da companhia. Investidores anjo, amigos e família, filantropia e doações, bolsas acadêmicas e comunitárias, empréstimos de pequenos negócios e até mesmo cartões de crédito são fontes de capital mais atraentes (mas limitadas), permitindo que o empresário possa manter o controle enquanto for possível. Por fim, o custo do capital é mais elevado no início do empreendimento, porque o risco é maior, e existe uma diminuição dos custos dos empréstimos conforme o empreendimento torna-se mais bem-sucedido. Escrever um plano de negócios é uma arte que os empresários precisam dominar. A Figura 5.7 mostra um modelo que pode ser usado ao criar os elementos de um novo empreendimento. Assim como ao escrever resumos e artigos de revistas científicas, a repetição melhora a qualidade do produto. Mas, ao contrário dos trabalhos científicos, que são publicados uma vez e não mudam, os planos de negócios são documentos vivos, que estão constantemente em fluxo e é obrigatória a atualização frequente. No entanto, um plano de negócios típico segue um modelo estabelecido e contém os seguintes componentes:

FIG. 5.7 Empreendedorismo: modelo do novo empreendimento.

1. Sumário executivo 2. Proposta de valor 3. Visão, missão, declaração de valores 4. Análise de marketing a. Análise da situação i. Ambiente ii. Tendências iii. Análise da empresa iv. Concorrência v. Alianças b. Mercado alvo e segmentação c. Posicionamento e diferenciação d. Canais e. Branding f. Ferramentas de vendas g. Orçamento de marketing 5. Modelo de negócio h. Descrição do produto ou serviço i. Fluxos de receitas j. Custos variáveis k. Despesas gerais e custos fixos 6. Estratégia l. Segmento beachhead m. Cadeia de valor n. Crescimento o. Resposta para concorrentes, novos operadores, substitutos 7. Governança e equipes de gestão 8. Pró-formas financeiras p. Demonstração de resultados q. Balanço r. Fluxos de caixa: operações, financiamento, investimentos 9. Estruturas de dívida e capital próprio 10. Operações s. Planejamento – gráfico de Gantt t. Implementação

u. Avaliação de produtividade v. Planos de melhoria contínua 11. Questões legais e regulatórias 12. Práticas de sustentabilidade (tripé de sustentabilidade de pessoas, planeta, lucro) 13. Barreiras e bloqueios das estradas 14. Planos de contingência 15. Estratégia de saída. Por fim, o empresário diretor executivo (CEO), tendo construído uma empresa bem-sucedida, deve tomar algumas decisões principais, além da alocação de recursos e gestão dos fluxos de receitas. No curto prazo, será necessário o líder delegar as decisões operacionais, enquanto se concentra na definição de estratégia, construção da equipe, estabelecimento da cultura e reforço da visão e valores. Finalmente, entretanto, o empreendedor pode reconhecer um chamado interno para ceder o controle, a fim de começar outra vez o processo, com uma ideia nova, talvez em uma indústria nova, com um mercado novo. Outros, no entanto, permanecem na empresa como um consultor técnico ou podem servir no conselho de administração, contentes com o conhecimento de que, apesar das grandes chances, eles criaram algo de valor. Parafraseando Steve Jobs, eles “colocaram um grão de areia no universo.”

Empresa sustentável A empresa sustentável é um conceito bem estabelecido que recentemente chamou a atenção dos acadêmicos no campo de comportamento organizacional, executivos, gerentes da cadeia de abastecimento, acionistas e até mesmo consumidores.26-33 A importância da empresa sustentável é tão grande que empresas específicas, bem como indústrias inteiras, estão reavaliando sua visão e valores, para que as organizações possam satisfazer um novo tripé de sustentabilidade de “pessoas, planeta e lucro”. O green business, ou uma empresa sustentável, produz pouco ou nenhum impacto negativo nos ambientes globais ou locais, na comunidade, na sociedade ou na economia, com especial atenção às políticas progressivas de direitos humanos e ambientais. Esforços anteriores em direção a “reduzir, reutilizar, reciclar, reparar e redistribuir ” foram substituídos por tentativas mais agressivas de minimizar a marca de carbono de um negócio, de buscar fontes de energia renovável e de diminuir o impacto dos resíduos no ambiente, com o objetivo de estabelecer um negócio que atenda às necessidades do presente, sem comprometer a capacidade de atender às necessidades do futuro. Exemplos específicos de práticas de negócios sustentáveis incluem teletrabalho, ter um escritório sem papel, minimizar o material de transporte e embalagem, a locação de equipamentos que podem ser retornados e remodelados, métodos de produção enxutos, que utilizam menos matéria-prima e produzem menos estoque, processos de melhora contínua na cadeia de abastecimento e realização de negócios em edifícios certificados pela LEED (Leadership in Energy and Environmental Design, ou seja, liderança em energia e design ambiental), que têm requisitos de energia mais baixos e são feitos de materiais reciclados. Os produtos de serviço são bens duráveis que o fabricante planeja reprocessar (assim o termo “do berço ao berço”, quando descrevemos a responsabilidade do fabricante), e os produtos de consumo são materiais de curta duração que não são tóxicos e são biodegradáveis. Essas práticas de negócios sustentáveis se uniram em um princípio mais formal da responsabilidade social corporativa, no qual a autorregulação é integrada ao modelo global de negócios de uma empresa ou indústria. As empresas descobriram que as práticas sustentáveis podem gerar valor duradouro para os acionistas e as partes interessadas, em termos de qualidade, acesso e custo de bens e serviços. Líderes como Ikea, Nike, Ford e até mesmo Walmart têm sido capazes de reduzir as despesas, minimizando o risco, aumentando as receitas e criando marcas mais fortes, edificando o pensamento ambiental e social em suas estratégias de negócios. A maioria das grandes empresas agora tem um agente diretor de sustentabilidade e publica um relatório anual de sustentabilidade que corresponde ao relatório financeiro anual. O que podemos fazer em cuidados de saúde e especificamente na área de cirurgia plástica, para aproveitar as práticas sustentáveis e melhorar nosso tripé da sustentabilidade? Curiosamente, a cirurgia plástica tem sido uma líder em justiça social há décadas. Viagens missionárias para países em desenvolvimento, nas quais são prestados serviços especializados e equipamentos reutilizáveis são doados, têm sido o foco de muitos cirurgiões plásticos, que poderiam ter passado mais tempo em seus consultórios particulares e gerado mais dinheiro para seus negócios. O que é especialmente admirável, em termos de sustentabilidade, é o esforço para ensinar essas técnicas cirúrgicas para provedores de nações em desenvolvimento, para que a infraestrutura seja

desenvolvida e a continuidade de cuidados seja estabelecida, entre visitas de grupos e comunidades locais. Para os cirurgiões que não viajam para fora dos EUA, as múltiplas oportunidades existem dentro das fronteiras dos Estados Unidos, para estabelecer intercâmbios semelhantes, que podem incluir o trabalho feito em reservas indígenas, em áreas carentes como Appalachia, ou em uma clínica comunitária. Mesmo mantendo privilégios do departamento de emergência de plantão, realizando cirurgias reconstrutivas com baixos valores de reembolso e realizando alguns cuidados em indigentes são medidas que contam como esforços sustentáveis, o cirurgião está contribuindo para um tripé de sustentabilidade que não negligencia as necessidades de sua comunidade local. Tal voluntariado é a empresa sustentável e deve ser uma meta para todos que praticam esse ofício. Os cuidados de saúde, em geral, já deixaram para trás outras indústrias, em termos de práticas de negócios sustentáveis. Uma definição para medicina sustentável é a melhora da saúde no âmbito do ciclo de vida natural, que visa evitar a pressão sobre os sistemas sociais, ambientais e econômicos, para que as novas tecnologias possam beneficiar todas as pessoas dentro de uma comunidade, não apenas aqueles que podem pagar. Estendendo-se essa definição para toda a população do nosso planeta, temos a obrigação moral de fornecer cuidados básicos de saúde para todos, sob a forma de água limpa, alimentos, vacinas e medicina preventiva. Jeffrey Sachs, um economista progressista na Universidade de Columbia, e Muhammad Yunus, vencedor do Nobel da Paz por seu trabalho sobre microfinanças na Índia, afirmam que temos os recursos e a tecnologia para acabar com a pobreza extrema durante nossa vida. Parte da resposta para erradicar a pobreza extrema é melhorar a saúde desses 2,5 bilhões de pessoas que existem na “base da pirâmide” (indivíduos que vivem com menos de US $ 2,50/dia). Otimizar a saúde global é possível com melhores sistemas de purificação de água, com alianças agrícolas para melhorar o abastecimento da cadeia logística, com a regulação dos mercados para eliminar intermediários corruptos nos mercados locais, com o acesso a medicamentos como antibióticos e antirretrovirais e com o estabelecimento de microcrédito e microempréstimos. Mais uma vez, empreendimentos sustentáveis de saúde não são apenas desejáveis do ponto de vista ético, mas tais empreendimentos podem abrir novos mercados e novas oportunidades de investimento.

Gestão de recursos humanos Talvez um dos mais importantes, menos apreciados e frequentemente negligenciados componentes da administração de empresas é a gestão de recursos humanos (GRH), que pode ser definida como o componente de uma organização que gerencia estrategicamente a cadeia de valor do capital humano.34 Embora os empregados não possam ser considerados como um ativo de uma empresa, os trabalhadores em todos os níveis fornecem as etapas fundamentais para agregar valor ao produto ou serviço, conforme as entradas são convertidas em produção. Além disso, os funcionários, bem como os clientes, podem ser um reservatório incrível de inovação, se esse recurso for gerenciado adequadamente, em termos de recrutamento, de desenvolvimento, de retenção e de promoção de talentos. O GRH é tão essencial para o sucesso de uma organização que as práticas de RH muitas vezes ditam a cultura desse negócio e fornecem vantagem competitiva, por si só, atraindo pessoas de alta qualidade e melhor adaptação. Na Google, por exemplo, os funcionários são encorajados a gastar 20% do seu tempo em projetos fora de sua linha de responsabilidade; tal ambiente promove a experimentação controlada e é diretamente responsável pela subida rápida da empresa no mundo da tecnologia da informação. A gestão de pessoas é uma responsabilidade imensa e, quando feita corretamente, parece fácil, mas quando não bem feita, cria um ambiente de trabalho que sufoca a criatividade, prejudica a qualidade e trai a proposta de valor da empresa. Embora seja tão complexa, a gestão de capital humano tem uma história de várias práticas recomendadas, que podem ser compartilhadas: 1. A liderança começa com a consciência de si. 2. A comunicação com os empregados é um papel central do gestor. 3. Os gestores eficazes podem articular seus próprios valores e visão. 4. Os gestores eficazes promovem um ambiente que traz à tona o melhor dos outros. 5. Os gestores eficazes estão dispostos a travar conversas difíceis sobre a diferença. 6. Os gestores eficazes entendem como os grupos trabalham e focam na criação de uma cultura de desempenho, com métricas definidas, que melhora a colaboração e o trabalho em equipe. 7. Os gestores eficazes são líderes de mudança. 8. Os gestores eficazes aprendem, refletem e renovam.

Na área da saúde, o GRH é muitas vezes focado no “desenvolvimento da força de trabalho,” que se refere à educação continuada e ao treinamento de funcionários para as mudanças atuais e para os novos postos de trabalho. O que um enfermeiro faz hoje pode ser muito diferente do que ele vai fazer no futuro, e os funcionários devem ser capazes de se adaptar aos modelos de mudança da entrega de saúde. Não só prestadores de cuidados de saúde têm que lidar com a tecnologia em mudança e a evolução dos sistemas de cuidados de saúde, mas também esses funcionários devem ser capazes de trabalhar bem com pessoas de diferentes formações educacionais, diferentes gerações (tradicionalistas, baby boomers, geração X e geração Y) e diferentes proporções de equilíbrio entre trabalho/vida. A diversidade no local de trabalho já não se refere a pessoas de diferentes culturas, mas reconhece diferentes valores, estilos de trabalho e necessidades. O que os líderes de GRH descobriram na área da saúde é que investir nas pessoas da organização tem um ROI muito maior do que tentar recrutar candidatos superestrelas para trabalhos específicos. Além disso, tratar os funcionários como clientes, bem como os clientes como funcionários, é a chave para reter tantos os prestadores quanto os pacientes. A satisfação do prestador e do paciente é muito importante, não só no ranking de sistemas de saúde, mas também no futuro fluxo de receita. Pacientes muito satisfeitos continuarão a procurar cuidados médicos com seus mesmos prestadores e farão indicações a seus amigos e familiares. Tal marketing é impagável. Essa prática de satisfação das partes interessadas não é só um bom negócio, mas também um ótimo remédio.

Est udo de ca so 5 .3 Como muitas outras instituições públicas, a satisfação dos empregados e sua retenção no sistema de saúde da Universidade da Carolina do Norte são particularmente difíceis, uma vez que muitos trabalhadores de alto potencial e alto desempenho muitas vezes são recrutados para práticas médicas em consultórios particulares menores, nos quais os salários são mais elevados e os benefícios mais extensos. Reconhecendo que o desenvolvimento da força de trabalho seria fundamental para aumentar a satisfação de trabalho dos empregados, que, por sua vez, está ligada à satisfação do paciente, os líderes sêniores em GRH criaram o equivalente a uma universidade corporativa. Empresas como IBM, Cisco e Disney oferecem recursos educacionais para os funcionários que precisam ou desejam novos conjuntos de habilidades, que querem adquirir novos conhecimentos e que desejam progredir em suas carreiras. Esses programas educacionais variam de sessões didáticas de uma hora até cursos e projetos que duram anos, durante os quais os empregados têm flexibilidade para realizar este treinamento, resolver desafios em tempo real e aplicar tal aprendizado para futuros trabalhos dentro da empresa. Em 2008, com o apoio do diretor e do CEO do Hospital, o Sistema de Cuidados de Saúde da UNC criou o Instituto de Aprendizagem, que consiste em quatro componentes: a Faculdade de Excelência em Liderança, a Faculdade de Qualidade e Serviço, a Faculdade de Desenvolvimento da Força de Trabalho e a Faculdade de Excelência Clínica. A Faculdade de Excelência em Liderança, por sua vez, contém quatro academias: Líderes Emergentes, Novos Líderes, Líderes Operacionais e Líderes Estratégicos. Recursos e programas para os participantes incluem a aprendizagem on-line através de podcasts e videocasts, um clube do livro trimestral sobre cuidados de saúde, participação em iniciativas de qualidade e eficiência do Seis Sigma, acesso aos mentores e professores na Escoçla de Saúde Pública e Negócios e um desafio formal do CEO, no qual os participantes aprendem sobre como resolver problemas operacionais e estratégicos reais, conforme identificados por administradores seniores. Desde que o programa foi iniciado, a satisfação dos empregados em relação à satisfação profissional aumentou de 33% para 72%, o desgaste do voluntário dentro do primeiro ano caiu de 22,1% para 11,8%, e, mais importante, muito poucos empregados que deixam o programa o fazem após o período de experiência de seis meses. O Sistema de Cuidados de Saúde da UNC estima que esses esforços em direção à retenção e ao desenvolvimento dos colaboradores pouparam à instituição US $13 milhões, reduzindo a rotatividade dos empregados abaixo dos padrões da indústria. Tal economia de custos obviamente deixa a liderança sênior feliz, mas um efeito de longo alcance é a melhoria dos níveis de satisfação dos pacientes, medida pelo PressGainey.

Considerações legais e regulatórias Como seria de esperar, os componentes legais e regulatórios dos cuidados de saúde são tão labirínticos que

essas considerações poderiam facilmente ocupar o conteúdo de uma enciclopédia. Não obstante, os cirurgiões plásticos devem estar cientes das amplas categorias que afetam a sua prática, e o mais importante, ter um baixo limiar para procurar assistência jurídica, quando necessária. Além de saber sobre a legislação de erros médicos, os provedores de saúde devem ter alguma familiaridade com a legislação dos contratos, relações trabalhistas, estrutura societária e responsabilidade, regras de tratamento médico de emergência, âmbito da prática por fornecedores não médicos, certificado de necessidade e acreditação das instalações de ambulatório e proteção da confidencialidade do paciente. Uma compreensão dessas questões não é apenas recomendável, mas necessária, uma vez que os provedores devem cumprir com as leis do Estado e as legislações federais ou enfrentarão investigações, despesas legais, multas, tempo nos tribunais ou prisão, dependendo do grau de culpabilidade, intenção e envolvimento. O efeito dessa seção, no entanto, é examinar como as mudanças legais e normativas do mundo dos negócios recentemente têm impactado na saúde como negócio.35-37 A compreensão da macroeconomia e das mudanças do mercado na área da saúde, como resultado da intervenção do governo, irá ajudar o médico a tomar decisões mais informadas quando do fornecimento de cuidados de saúde. Esta seção não irá discutir os benefícios ou efeitos prejudiciais da regulamentação, mas, em vez disso, apresentará as mudanças que ocorreram, tão objetivamente quanto for possível. Antes de discutir como a recente regulamentação afetou os negócios dos cuidados de saúde, é importante rever as formas básicas de propriedade das empresas. Uma sociedade unipessoal é uma entidade de propriedade de uma pessoa, que assume a responsabilidade pessoal por dívidas contraídas pelo negócio. Uma parceria é um tipo de negócio em que dois ou mais indivíduos concordam em compartilhar os lucros, mas também as responsabilidades; a vantagem dessa estrutura, como a de uma propriedade exclusiva, é que o lucro líquido é tributado apenas uma vez. Uma corporação é uma empresa com uma identidade distinta e separada de seus membros; as corporações com fins lucrativos e sem fins lucrativos devem ser possuídas por vários acionistas e são supervisionadas por um Conselho de Administração, que gerencia a equipe executiva. A maioria dos hospitais segue esse modelo, enquanto muitos médicos em consultórios particulares podem funcionar como titular ou como chefe de corporação S. Por fim, uma cooperativa é um tipo de corporação com responsabilidade limitada, cujos membros, em contraste com os acionistas, compartilham recursos de tomada de decisão. Uma desvantagem das corporações e das cooperativas nos Estados Unidos é que o lucro está sujeito à dupla tributação: a primeira sobre o lucro líquido da entidade, depois são deduzidas despesas operacionais e indiretas, e a segunda, sobre a rentabilidade para as partes interessadas, sob a forma de renda pessoal, dividendos e outros ganhos de capital, como o estoque que é vendido pela primeira vez.

Lei Sarbanes-Oxley, 2002 Em resposta aos escândalos corporativos e contábeis, como Enron, WorldCom e Tyco, bem como a bolha “dotcom” que estourou e custou aos investidores bilhões de dólares, tanto a câmara quanto o senado dos EUA apoiaram esmagadoramente e aprovaram a lei Sarbanes- Oxley (SOX).38 A confiança do público nos mercados de valores mobiliários daquele país tinha sido grandemente prejudicada, e essa legislação tentou restaurar a estabilidade desses mercados, por meio de supervisão e controle. Além de criar um Public Company Accounting Oversight Board, a SOX determinou que: (1) os auditores não poderiam fornecer serviços de consultoria para os mesmos clientes; (2) os executivos devem assumir a responsabilidade individual pela exatidão e integridade de seus relatórios financeiros corporativos; e (3) as divulgações financeiras de empresas públicas devem incluir relatórios de transações de fora do balanço, pressupostos para pró-formas e ações dos agentes corporativos. Embora a SOX não tenha feito disposições que lidem diretamente com os cuidados de saúde, essa lei afetou o setor de saúde, já que todas as companhias abertas envolvidas com cuidados de saúde teriam que passar por uma reestruturação significativa de suas práticas contábeis. Os proponentes afirmam que tal legislação foi essencial para reforçar os controles contabilísticos e restaurar a confiança dos investidores, enquanto os opositores citam a supervisão excessivamente complexa necessária para o cumprimento, levando à redução da competitividade com as empresas estrangeiras.

Lei de Recuperação e Reinvestimento, 2009 Conforme os Estados Unidos caminhavam para a pior recessão desde a grande depressão, o Congresso aprovou a lei de recuperação e reinvestimento, na tentativa de criar postos de trabalho, promover o investimento e

induzir os gastos dos consumidores.39 Como o Federal Reserve já tinha diminuído as taxas de juros a zero, com pouco efeito sobre os mercados de crédito, a política fiscal foi escolhida sobre a política monetária, como plano para estimular a economia, e, portanto, uma injeção de capital do governo – US $787 bilhões – foi utilizada para unir o vazio de produção criado pela queda nos gastos do consumidor. Embora a maioria do capital tenha sido utilizada para financiar projetos e programas de energia, comunicações, educação e transporte, os cuidados de saúde receberam US $151 bilhões, com a grande maioria do dinheiro usado para dar apoio ao Medicare. Na sequência desse pacote de estímulo, a economia nacional manteve-se volátil, mas parece ter estabilizado, e a demanda por serviços de saúde não diminuiu, como muitos economistas previram.

Lei de Proteção do Paciente e Tratamento Acessível, 2010 Em uma luta partidária amarga e altamente divulgada, o Congresso aprovou, por fim, a lei de proteção do paciente e tratamento acessível nos EUA, que, em resumo, é um projeto de lei de reforma da saúde que enfoca na reforma do seguro de saúde.40 Cerca de 32 milhões de pessoas que atualmente não têm seguro de saúde serão capazes de obter cobertura. Os benefícios dessa legislação incluem a expansão da elegibilidade do Medicaid, os prêmios de seguros subsidiados, incentivos para as pequenas empresas fornecerem cobertura de saúde, a proibição de recusas por companhias de seguros, que estabelecem um mercado de seguro de saúde com “trocas”, e o apoio financeiro da tecnologia de pesquisa e informação médica, como o registro médico eletrônico. Os críticos insistem que a redução proposta do défict de US $143 bilhões, na primeira década, não será realizável nem passível de manutenção. O custo desse plano é compensado pelas taxas sobre as empresas farmacêuticas e sobre os dispositivos médicos, novos impostos sobre as empresas de alta renda, maior eficiência da tecnologia da informação e redução das despesas administrativas.

Reforma Dodd-Frank Wall Street e Lei de Proteção ao Consumidor, 2010 Já considerada a mudança mais abrangente da reforma financeira desde a grande depressão, a reforma DoddFrank Wall Street e a Lei de Proteção ao Consumidor destinam-se a corrigir permanentemente os problemas econômicos que a lei de estímulo ajudou a estabilizar.41 O objetivo do projeto é o seguinte: “Promover a estabilidade financeira dos Estados Unidos, melhorando a prestação de contas e a transparência no sistema financeiro, para acabar com “o fracasso tão grande”, para proteger o contribuinte estadunidense, acabando com os planos de ajuda, [e] protegendo os consumidores contra práticas abusivas de serviços financeiros“. O impacto sobre o sistema de regulamentação financeira certamente será abrangente, com reestruturação significativa do fluxo de capital dentro da economia dos EUA. Os objetivos específicos da reforma incluem os fundos multimercado e outros instrumentos de bancos de investimento, o Federal Reserve, transparência e responsabilização dos mercados de ações de Wall Street, instituições de hipoteca e empréstimos comerciais e programas de proteção aos consumidores e investidores. A questão para o setor de saúde não é se a LeiDoddFrank afetará o serviço de saúde, mas como ela o afetará.

Negociação A negociação pode ser definida como “um diálogo destinado a resolver as disputas, para produzir um acordo sobre cursos de ação, negociar uma vantagem individual ou coletiva, ou gerar produção para satisfazer interesses diversos”.42 Sempre que uma decisão é tomada, ocorre uma negociação. Se um cirurgião decide começar uma clínica de laser, ele deve examinar o custo de oportunidade na realização desse serviço e deve negociar com as partes interessadas de clínica – recepcionistas, pessoal de enfermagem, pacientes – como essa alteração causará impacto na prática. Se um sócio minoritário quer desenvolver uma prática de reconstrução microcirúrgica da mama, ele deve negociar com o hospital para ter mais tempo no centro cirúrgico, negociar com as companhias de seguros um plano de reembolso mais favorável e ganhar a anuência dos sócios majoritários, que terão que atender esses pacientes quando o cirurgião principal não estiver disponível e absorver esses casos de baixa margem de lucro em seu fluxo de receita. Se uma prática acadêmica de cirurgia plástica pretende desenvolver e construir um centro ambulatorial de estética com quartos para procedimentos, o chefe do setor deve realizar uma negociação complexa com várias partes (o diretor, chefes, os administradores do hospital), ao longo de várias iterações, sobre várias questões. Embora alguns indivíduos sejam abençoados com excelentes habilidades de comunicação e empatia e

possam negociar com êxito, a negociação é uma disciplina que pode ser aprendida. A prática e a preparação são as chaves para o sucesso. O campo da negociação, como disciplina acadêmica, é um rico corpo de trabalho, que incorpora a teoria dos jogos, as estratégias de leilão, a psicologia e a economia comportamental. Talvez o trabalho seminal nesse campo seja Getting a Yes: Negociating Agreement without Giving In (em uma tradução livre, algo como “Conseguindo um Sim: como negociar um acordo sem desistir ”, de Fisher e colaboradores.43 Os dois princípios sobrepostos são: (1) saber o que você quer versus querer o que você precisa; e (2) saber o que o seu oponente quer e precisa. A negociação começa com uma preparação considerável, não apenas prever o que seu oponente vai fazer, como se estivesse em uma partida de xadrez, mas o que seu oponente exige para melhorar sua posição. Na verdade, ambos os oponentes em uma negociação de dois lados podem nem mesmo saber qual é a sua melhor posição ou por que uma determinada solução pode ser favorável para ambos. A criatividade e a comunicação são essenciais para o sucesso. A negociação, então, começa por desenvolver e articular sua melhor alternativa a um acordo negociado. Essa é a posição mais próxima, se não puder ser alcançado um acordo, ou “o mais baixo que você chega”, que deve ser determinada antes de começar a negociação. Depois de decidir que você não vai negociar sobre essas posições, utilize os quatro princípios a seguir: (1) separar as pessoas do problema; (2) concentrar-se nos interesses, e não nas posições; (3) inventar opções para ganho mútuo; e (4) insistir em usar critérios objetivos.4448

Esses conceitos de negociação “em princípios” funcionam na maioria das vezes. Ocasionalmente, no entanto, a negociação chega a um impasse, e um avanço pode ser conseguido reformulando-se o problema. Especificamente, evite a exaltação dos ânimos não reagindo, discutindo, rejeitando ou pressionando. Saia da situação, ajude o outro lado a ver o problema objetivamente e reformule o problema de sua perspectiva. Determine que opções fornecerão ganho mútuo, ou pelo menos, minimizarão as perdas. Em outras palavras, escolha suas batalhas com sabedoria. A concessão não representa fracasso, mas, muitas vezes, redefine os parâmetros do problema, para que as iterações futuras do “jogo” possam produzir um resultado a seu favor. As negociações particularmente difíceis envolvem aqueles indivíduos ou grupos que não terão compromisso com suas demandas, que têm uma assimetria de informação, que não estão dispostos a ver o problema de sua perspectiva, ou que ameaçam usar o poder para impor sua solução. Pessoas que se enquadram nessa categoria são o valentão do pátio da escola, um médico prejudicado, os sociopatas, os terroristas e, às vezes, o paciente “difícil”, que pode ter um transtorno dismórfico subjacente. Uma opção é não negociar – afaste-se da situação – e utilize outros meios para resolver um litígio, como a ação legal. No entanto, negociadores hábeis podem ainda lidar com essas situações desafiadoras eficazmente, usando caos, incerteza e ambiguidade para desarmar os adversários e neutralizar a sua posição. Os negociadores de sucesso podem traduzir pequenos ganhos em uma dinâmica positiva, com foco em futuras rodadas de negociação e definindo as posições mais eficazes para o futuro.

Ética Na área da saúde, deparamo-nos com vários desafios que testam nosso posicionamento ético. Os prestadores de cuidados de saúde devem tomar inúmeras decisões sobre o atendimento ao paciente todos os dias, e a sociedade legitimamente espera que esses provedores se comportem eticamente. A competência no atendimento ao paciente e o conhecimento médico são necessários, mas não são suficientes. Os provedores também devem demonstrar competência interpessoal e habilidades de comunicação, práticas baseadas em sistemas, aprendizagem baseada na prática e profissionalismo, que envolvem um compromisso firme em direção à conduta ética. Essas competências são tão importantes que a educação médica, os programas de treinamento de residência, o licenciamento pelo governo do Estado, a certificação pela associação médica, a manutenção da certificação e o credenciamento do hospital incorporam esses elementos na avaliação dos prestadores de cuidados de saúde. John Canady, ex-presidente da Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos e ex-presidente da Comissão de Ética, observou: “Os cirurgiões plásticos que estão conscientes dos interesses dos concorrentes que influenciam seus processos de tomada de decisão têm uma chance maior de conseguir resultados éticos. No entanto, com o volume crescente de tratamentos não cobertos por reembolso e expectativas de resultados perfeitos, alcançar decisões éticas uniformemente, sem sacrifícios pessoais onerosos, é difícil, na melhor das hipóteses.”49 Os fatores concorrentes que influenciam a tomada de decisões para cirurgiões plásticos incluem finanças pessoais (posse dos centros cirúrgicos, seleção de procedimentos, políticas de preços), forças regulatórias (Lei de

Tratamento Médico de Emergência e de Trabalho Ativo [EMTALA], Comissão conjunta de acreditação das organizações de saúde (JCAHO), Associação Americana para a Acreditação de instalações de cirurgia ambulatorial (AAAASF)/Associação de acreditação de cuidados de saúde ambulatoriais (AAAHC), Administração de segurança ocupacional e saúde (OSHA), a Lei de portabilidade de responsabilidade dos seguros de saúde (HIPPA) – apenas para citar alguns) e o dever profissional (consentimento informado, discussão de erro). Quando confrontados com um dilema, os prestadores de cuidados de saúde devem incorporar a intuição e o raciocínio ao tomar uma decisão. A resolução de uma questão ética, muitas vezes, requer uma consideração cuidadosa da cultura, da infraestrutura, da liderança/governança e da integridade pessoal. A inteligência ética pode ser desenvolvida. Em seu livro Strengthening Ethical Wisdom (em uma tradução livre, Fortalecendo a sabedoria ética), Jack Gilbert argumenta que as intenções, manifestas pela visão, missão, valores, estratégia e objetivos, afetam diretamente o desempenho.50 Em cuidados de saúde, isso se traduz em segurança do paciente, qualidade de atendimento, produtividade e rendimento, satisfação dos pacientes e funcionários, reputação e saúde financeira. A ética médica é prática, baseada em casos e relativa ao contexto da situação. Assim como a ética ajuda a orientar a tomada de decisões na área da saúde, então também a ética deve desempenhar um papel importante nas escolhas feitas por entidades empresariais. A história da ética e do capitalismo é muito fascinante. Adam Smith, que publicou A Riqueza das Nações, em 1776, argumentou que os mercados foram guiados pela “mão invisível” para produzir a quantidade certa de bens para a sociedade, mas que tal força estava intimamente ligada às nossas obrigações éticas uns com os outros.51 Andrew Carnegie e outros industriais do século XIX articularam a necessidade de os negócios adotarem a caridade e o patrocínio, ambas as formas da filantropia social, porque, com o poder, vem a responsabilidade. Até mesmo Milton Friedman, o economista premiado com o Nobel da Universidade de Chicago que acreditava que a única obrigação ética de negócios era maximizar os lucros, enfatizou que o negócio cria eficientemente e aloca a riqueza na sociedade se as partes interessadas forem honestas, transparentes e justas. Atualmente, a ética empresarial é um bom negócio. Um novo paradigma para o fornecimento de valor aos interessados substituiu o modelo anterior de maximizar o retorno do acionista. Como os fornecedores, clientes, funcionários, concorrentes e comunidades são todos afetados pelas decisões de uma empresa, uma abordagem das partes interessadas para a estrutura organizacional mapeia esses relacionamentos e tenta alinhar interesses concorrentes, para maximizar a criação de valor das redes, produtos, serviços e informações. A maioria dos líderes de negócios está ciente de que valores, direitos, deveres e responsabilidades devem informar a tomada de decisão, tanto quanto esses princípios afetam a ética médica. As consequências podem não só ter ramificações legais, mas também podem afetar o tripé de sustentabilidade. O capitalismo baseado em valores esforça-se para maximizar a riqueza dos interessados por tentar humanizar a instituição do negócio e incentivar as partes interessadas a executar o seu melhor, e não o seu pior. Os princípios-chave do capitalismo fundamentado em valores incluem: cooperação das partes interessadas, responsabilidade partilhada, reconhecimento da complexidade, criação contínua e concorrência emergente. Em resposta aos recentes escândalos de negócios altamente divulgados, envolvendo contabilidade fraudulenta, esquemas de Ponzi, remuneração excessiva de executivos, conivência do governo/empresas e negociação ilegal derivada, os líderes acadêmicos em gestão de negócios tomaram a frente para desenvolver o juramento do MBA (Quadro 5.1).52 Semelhante ao juramento de Hipócrates para os médicos, essa promessa reconhece que a gestão é uma profissão que deve respeitar os princípios éticos. Q uadr o 5. 1 Jura m e nt o do MBA

Como um líder de negócios, reconheço o meu papel na sociedade • Meu propósito é liderar pessoas e gerenciar recursos para criar valor que nenhum indivíduo pode criar sozinho. • Minhas decisões afetam o bem-estar dos indivíduos dentro e fora da minha empresa, hoje e amanhã.

Portanto, prometo que • Vou gerir a minha empresa com lealdade e cuidado e não avançarei meus interesses pessoais em detrimento da minha empresa ou sociedade. • Entendo e respeito, no conteúdo ou na forma, as leis e contratos que regem minha conduta e de minha

empresa. • Vou abster-me de corrupção, concorrência desleal ou práticas comerciais prejudiciais para a sociedade. • Vou proteger os direitos humanos e a dignidade de todas as pessoas afetadas pela minha empresa e me oporei à discriminação e à exploração. • Vou proteger o direito das gerações futuras para fazer avançar o seu padrão de vida e poder desfrutar de um planeta saudável. • Vou informar o desempenho e os riscos da minha empresa com precisão e honestamente. • Vou investir no desenvolvimento dos outros e no meu desenvolvimento, ajudando a profissão de gestor a continuar a avançar e a criar prosperidade sustentável e inclusiva. No exercício do meu dever profissional, de acordo com estes princípios, reconheço que meu comportamento deve dar o exemplo de integridade, suscitar a confiança e a estima daqueles a quem sirvo. Ficarei responsável por meus colegas e pela sociedade por minhas ações e para defender estas normas. Faço este juramento livremente e pela minha honra.

Liderança A resposta mais concisa à pergunta “O que define um líder?” é “alguém que tem seguidores”. A verdadeira questão, porém, deve ser enquadrada como segue: “o que define um grande líder?” Essa resposta é bastante evasiva, dependendo do líder, do contexto e dos constituintes.53 Nos negócios, os líderes devem primeiro e acima de tudo ser gestores eficazes (Fig. 5.8). “O gestor é o elemento dinâmico, dando vida a todos os negócios. Sem liderança, os ‘recursos de produção’ permanecem recursos e nunca se tornarão a produção. Em uma economia competitiva, acima de tudo, a qualidade e o desempenho de seus gestores determinam o sucesso dos negócios; na verdade, eles determinam sua sobrevivência, porque a qualidade e o desempenho de seus gestores é a única vantagem eficaz que uma empresa pode ter em um ambiente competitivo.” Assim começa o livro Prática de Gestão, publicado em 1954 por Peter Drucker, considerado o trabalho seminal e decisivo na teoria e prática de gestão moderna.54,55

FIG. 5.8 Liderança: integrar os componentes.

Embora os gerentes difiram dos líderes ao longo de muitos parâmetros, os conjuntos de habilidades de ambos são complementares e, quando combinados, proporcionam sinergia que aumenta a força de uma organização56-61:

Gestores administram

Líderes inovam

Gestores perguntam como e quando

Líderes perguntam o quê e porquê

Gestores imitam

Líderes originam

Gestores enfocam os sistemas

Líderes focam nas pessoas

Gestores mantêm

Líderes desenvolvem

Gestores dependem de controle

Líderes dependem da confiança

Gestores aceitam o status quo

Líderes desafiam o status quo

Gestores olham a linha básica

Líderes olham na direção e além do horizonte

Gestores fazem coisas certas

Líderes fazem a coisa certa

Gestores operam

Líderes agem com estratégia

Mas os gestores muitas vezes lideram Líderes muitas vezes gerenciam

Drucker continua: “Para ter sucesso neste novo mundo, teremos de aprender, em primeiro lugar, quem somos. O sucesso na economia do conhecimento vem para aqueles que conhecem a si mesmos – seus pontos fortes, seus valores e como eles desempenham melhor.” Os indivíduos devem determinar seu lugar e com o que podem contribuir. Nesta era de descontinuidade, quando a informação se tornou tão valiosa quanto o capital e a comunicação é fundamental para o fluxo de agregação de valor, os indivíduos devem gerenciar suas carreiras, esculpindo nichos independentes, mantendo-se comprometidos e sabendo quando mudar de rumo. Para que a liderança seja eficaz, o indivíduo usa a influência social para ganhar o apoio dos seguidores, por meio do poder posicional, pessoal e relacional, para atingir um objetivo comum. Muitas teorias têm sido propostas para descrever exatamente como a liderança funciona, mas, em última análise, os líderes devem ser responsáveis por um número de funções, como delegação, empoderamento, negociação, resolução de conflitos, inovação, inspiração e orientação para a mudança. Por meio de uma variedade de estilos de liderança – forçando, evitando, comprometendo, acomodando e colaborando, os líderes devem também aprender a “gerir a partir do meio”. Servindo como um canal para a transferência de informações, os trabalhadores do conhecimento de hoje devem gerenciar acima e abaixo, tanto seus supervisores quanto seus subalternos diretos. Aqueles que podem efetuar a mudança de tal ambiente são incrivelmente eficazes e influentes, agregando valor ao capital humano de uma organização. Talvez a função mais importante de um líder seja a construção de equipes de alto funcionamento, alto desempenho. O trabalho em equipe tornou-se cada vez mais importante nos negócios, devido a vários fatores: complexidade ambiental e ritmo, a dependência de parceiros internos e externos, a necessidade de múltiplas fontes de informação e o desejo de ter perspectivas variadas e pensamento diverso. O mais inteligente de nós não é tão inteligente quanto todos nós juntos. As equipes, no entanto, não se formam automaticamente nem funcionam sem problemas. Um líder eficaz cria equipes colaborativas que fornecem resultados, estabelecendo as seguintes características: compatibilidade de meta, confiança e compromisso, interdependência e responsabilidade, comunicação aberta e aceitação de ideias e conflitos se convertendo em criatividade. O líder também serve como defensor da equipe, ganhando o apoio de altos executivos, fornecendo os recursos necessários para resolver os problemas e manter as partes interessadas informadas. Ser líder de uma equipe eficaz tem menos a ver com o conhecimento técnico, e muito mais a ver com a inteligência emocional e as habilidades de comunicação.60 Kouzes e Posner oferecem um modelo simples, mas extremamente útil, de liderança em que a credibilidade serve como base para todo o sucesso futuro. Tendo estudado centenas de líderes por meio de muitos tipos de disciplinas, eles fornecem estas recomendações para se tornar um grande líder: (1) modele o caminho – esclareça os valores e dê o exemplo; (2) inspire uma visão compartilhada – vislumbre o futuro e acrescente outros; (3) desafie o processo – busque as oportunidades, a experiência e corra riscos; (4) permita que outros ajam – promova a colaboração e reforce os outros; e (5) incentive o coração – reconheça as contribuições e celebre os valores e as vitórias.59 Esse modelo dissipa o mito de que “o topo é solitário”, porque o objetivo da liderança deve ser trazer todos para o topo. A liderança no topo – CEOs de grandes e complexas organizações – requer, sem dúvida, influência social para alcançar objetivos, mas esse tipo de liderança também contém desafios únicos, que exigem habilidades únicas, para fornecer direção eficaz e estratégia, estrutura organizacional, seleção de pessoas e incentivos adequados. Nohria e Khurana examinaram 110 CEOs recém-nomeados, principalmente de empresas públicas com um faturamento médio de US $3,7 bilhões.53 A idade média na consulta era de 49,7 anos e o tempo médio com a

empresa era de 14,1 anos. Setenta e cinco por cento destes CEOs tinham sido candidatos internos, e 64% tinham um título de pós-graduação. Os resultados foram surpreendentes. Os desafios específicos para seu novo papel como CEO incluíam o escopo mais amplo do que o previsto, apaziguar o Conselho de Administração, restrições no poder, dificuldade de obtenção de informações confiáveis, manutenção da visibilidade, tendo de produzir dentro de um horizonte de tempo limitado e atingindo as expectativas de mudança pelas partes interessadas. Esses CEOs descobriram, no entanto, que as alavancas indiretas podem ser muito poderosas, por moldar o contexto para que os membros da organização possam tomar boas decisões, tomar as medidas adequadas e avançar na missão da empresa. Outros achados interessantes incluíram: • Tempo gasto trabalhando em questões internas da empresa: 69% • Tempo atribuído a itens da agenda principal: 52% • Tempo gasto na comunicação face a face: 81% • Tempo gasto com componentes que não sejam subordinados diretos: 42% • Tempo gasto comunicando-se com grupos: 63%. Com base nessas constatações, especificamente que as alavancas indiretas de influência podem ser mais importantes do que as alavancas diretas, Porter e Nohria recomendam atenção especial para alocar seus recursos mais limitados, mas cruciais dos CEOs: sua presença. Os CEOs – e talvez todos os líderes – podem gerenciar sua presença, definindo uma agenda pessoal clara, comunicando-se incansavelmente, recolhendo informações continuamente, aproveitando o simbolismo e o poder de uma forte equipe de gestão. Estabelecendo a legitimidade, por meio de competência, imparcialidade, resultados e integridade, instilando a confiança nas partes interessadas, que são, então, empoderadas a fazer o seu melhor. O maior desafio de todos os líderes é levar a sua organização de “boa a excelente”. Jim Collins identificou 11 empresas estáveis, com capital aberto, que experimentaram crescimento substancial sustentado, conforme definido pelo desempenho financeiro múltiplo várias vezes melhor do que o dos concorrentes em sua área de atuação.57 Collins identificou fatores específicos responsáveis por ajudar a transição do “bom para excelente”: ter o foco nas competências essenciais, forjar uma cultura de disciplina, encontrar as pessoas certas para entender onde elas vão chegar, confrontar os fatos brutais, mas, ao mesmo tempo, manter a esperança, usando aceleradores de tecnologia e criando a dinâmica do efeito aditivo das pequenas iniciativas. O que todas essas empresas tinham em comum, no entanto, foi a liderança nível 5: os CEOs tinham humildade pessoal e vontade profissional. Os líderes mais eficazes não eram extrovertidos nem carismáticos, mas indivíduos bastante humildes, abnegados, que exibiam uma resolutividade feroz em desenvolver a proposta de valor da empresa. A integridade e a visão são importantes. Essas qualidades dão ao líder a capacidade de transformar uma organização de boa para ótima.

Agradecimentos Este trabalho foi financiado, em parte, pelo Fundo de Pesquisa em Cirurgia Plástica Ethel B e James A Valone, da Universidade da Carolina do Norte – em Chapel Hill. Como autor, quero agradecer à minha esposa, Suzanne, por seu apoio interminável, pelas sugestões e pela inspiração. Ela é um anjo, a luz da minha vida. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  7. Kim, C., Mauborgne, R. Blue Ocean Strategy. Boston, MA: Harvard Business Press; 2005. [238 pages]. Este trabalho altamente original descreve por que pensar fora do quadrado e criar espaço fora do quadrado são preferíveis para competir nas águas turbulentas de um mercado fixo.

8. Berman, K., Knight, J., Case, J. Financial Intelligence: A Manager’s Guide to Knowing What the Numbers Really Mean. Boston, MA: Harvard Business Press; 2006. Na minha opinião, este é o texto mais conciso, legível e aplicável em contabilidade e finanças. Encontrei este livro depois de receber o meu MBA. Se você quer entender os números do negócio, leia este livro agora!

36. Christensen, C., Grossman, J. H., Hwang, J. The Innovator’s Prescription: A Disruptive Solution for Healthcare. NY, NY: McGraw Hill; 2009. Estes especialistas em inovação abordam os cuidados de saúde como uma indústria que deve ser modificada e reconstruída. Resultados pendentes.

37. Porter, M. E., Teisberg, E. O. Redefining Healthcare: Creating Values-Based Competition on Results. Boston, MA: Harvard Business Press; 2006. Os cuidados de saúde são um negócio que existe em um ambiente altamente competitivo. A reforma

que precisamos atualmente pode vir de reestruturação de nossos modelos concorrentes para criar novo valor, para os pacientes e profissionais de saúde.

43. Fisher, R., Ury, W., Patton, B. Getting to yes: Negotiating agreement without giving in, 2nd ed. NY, NY: Penguin Books; 1991. Quase tudo o que realizamos requer negociação. Este trabalho continua a ser o melhor livro sobre negociação, mesmo décadas após sua publicação.

53. Nohria, N., Khurana, R. Handbook of Leadership Theory and Practice. Boston, MA: Harvard Business Press; 2010. Este gigantesco “manual” sobre liderança abrange quase tudo que você precisa saber: quem são os líderes, o que eles fazem e por que são importantes.

57. Collins, J. Good to Great: Why Some Companies Make the Leap … and Others Don’t. NY, NY: Harper Business; 2001. Superpopular, excessivamente citado e muito referenciado, este livro não é apenas bom, ele é ótimo. 61. Seuss, Dr. Oh! The Places You’ll Go. Random House; 1990. [56 pages]. Nível de leitura: 4-8 anos de idade; aplicabilidade: todas as idades. Pouquíssimos autores têm a criatividade, a inovação e a visão do Dr. Seuss. A genialidade deste livro é que o contador de histórias combina a inevitabilidade da mudança com a necessidade de adotá-la. “Você estará a caminho das alturas!/Verá coisas maravilhosas!/Se unirá aos grandes voadores/que alçam grandes alturas”. Tem muita coisa agradável a ser feita, realmente. (tradução livre)

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Aspectos médico-legais na cirurgia plástica Neal R. Reisman

Resumo Cirurgiões plásticos terão significante interação com advogados, já que estes profissionais defendem pacientes lesionados, abusados e possivelmente tratados de modo negligente. O consentimento informado é um processo, não um mero documento assinado. Uma garantia expressa pode ser estabelecida pela inclusão no prontuário de uma foto que o paciente acredite que demonstre o resultado pretendido com a cirurgia. Queixas de fraude e abuso NÃO possuem limitações estatutárias e não são cobertas pelos seguros de proteção profissional. O Health Insurance Portability and Accontability Act (HIPAA) foi criado para proteger a privacidade do paciente e conter os registros e fotografias médicos. A legislação responsabiliza o empregador nos casos de negligência do empregado em suas atividades laborais. A divulgação de informações do paciente em um blog ou mídias sociais é uma violação HIPAA. É importante notificar o mais rapidamente seu corretor de seguro profissional se receber uma notificação legal. Médicos que compartilham consultórios podem ser responsabilizados pelos cuidados dos pacientes. A seleção do paciente, quando feita de modo adequado e apropriado, é o melhor método para se evitar uma queixa de negligência.

Introdução Os cirurgiões plásticos têm muita interação com o sistema legal. Apesar de a medicina ter várias nuances e inferências, a lei se baseia na doutrina legal e na palavra escrita. Uma impressão que causa grande preocupação é a de que, se determinada situação não está registrada e escrita, ela nunca ocorreu. A prática da medicina está repleta de ações usuais que podem não ser especificamente documentadas, levando a grandes conflitos entre a medicina e a lei. Este capítulo focalizará nas interações entre os cirurgiões plásticos no sistema legal e também nos métodos para reduzir o risco médico-legal e para aumentar a segurança para o paciente. Serão apresentadas áreas do direito e serão enfatizados seus impactos na clínica de cirurgia plástica.

Interações com advogados e o sistema legal Os cirurgiões plásticos podem ter uma interação significante com o sistema legal por meio dos cuidados de seus pacientes, que, nos casos de lesões e doenças, podem dar entrada em uma ação judicial. Lesões relacionadas com trabalho, acidentes automobilísticos, mordeduras de animais e abuso doméstico geralmente desencadeiam uma ação judicial. O médico participará na documentação da lesão, na projeção dos gastos médicos e na emissão de laudos sobre incapacidade ou deformidades geralmente por meio de um depoimento e, ocasionalmente, de um testemunho presencial, em um julgamento. Existem médicos que abominam qualquer interação com advogados, mas, na realidade, muitos consideram apropriado participar do sistema legal e certamente representam e assistem a seus pacientes. Existem certas diretrizes e regras a seguir. O

HIPAA, ou seja, a Lei de Portabilidade de Seguros de Saúde e Responsabilidade dos Estados Unidos, atualmente requer o consentimento por escrito antes que você possa discutir quaisquer informações sobre seu paciente com qualquer pessoa fora da área de tratamento médico. Um advogado que atue dentro das diretrizes éticas lhe dará uma autorização assinada pelo cliente/paciente para discutir sobre seus cuidados e tratamento. Você é proibido de discutir sobre qualquer informação médica desse paciente sem esta autorização. Não seja enganado por documentos aparentemente legais ou por determinações judiciais que pareçam ter maior valor legal do que a autorização feita pelo paciente. Peça ao advogado a autorização e confirme com seu paciente, se necessário. Se um depoimento for necessário, assegure-se de ter a autorização apropriada por escrito. Também sugere-se que, se você for contratado como especialista, solicite pagamento adiantado pelo seu tempo e estabeleça um acordo por escrito de que, se o seu depoimento for cancelado com um prazo superior a 2 semanas da data agendada, você reembolsará o pagamento. Se o depoimento for cancelado dentro de duas semanas, a metade do pagamento será reembolsada e, se for cancelado em um prazo mais próximo da data agendada, o pagamento não será devolvido. Estabeleça seus honorários por hora e peça um adiantamento de 2 horas. Também é aconselhável agendar o depoimento para o final do dia, e não no meio, o que pode interferir significativamente com a agenda de consultas de seus pacientes.

Interações legais: depoimentos e narrativas Grande parte da correspondência entre a clínica de cirurgia plástica e um advogado pode ocorrer por meio da solicitação de uma narrativa oficial delineando os cuidados, os tratamentos anteriores, as preocupações futuras e as questões específicas que o advogado pode fazer. O médico deve ser honesto na descrição sobre suas preocupações passadas e futuras e não ser exagerado ou inadequado em sua descrição. É comum citar que suas opiniões se baseiam na revisão de certos documentos, discussões com o paciente e que as conclusões se baseiam em seu treinamento e experiência. Dependendo da lei local, geralmente há necessidade de pagamento de uma taxa para que seja solicitada essa narrativa, que deve ser paga antecipadamente a qualquer inclusão aos registros. É importante citar referências quando forem utilizadas, pois não é raro que certos documentos ajudem a influenciar a sua opinião. Quando todos esses documentos forem subsequentemente revistos, as opiniões podem diferir da narrativa original, que agora podem ser explicadas pelas listas específicas das informações revistas.

Áreas da lei Várias áreas da lei têm impacto sobre a clínica de cirurgia plástica. A maioria incluirá queixas de negligência, que acionam seu seguro profissional. Outras queixas fortalecem a queixa por má prática ou acrescentam queixas adicionais que não são cobertas pelo seu seguro; todas se destinam a aumentar a pressão pela a decisão da ação.

Direito legal: negligência, má prática O direito legal é a área básica da lei que cobre a negligência e a má prática. Existem quatro premissas para uma ação de negligência. A primeira área é o dever de prestar cuidados e os atos em questão. A segunda é que o dever é violado, geralmente com a prestação do serviço abaixo dos padrões. A terceira premissa é a de que a violação é a responsável direta pelos danos ocorridos. Isto é chamado de causa próxima. E a quarta premissa é que existem danos resultantes das três premissas anteriores. A prova e os argumentos que circundam esses quatro elementos compreendem a queixa da má prática. Outras interações legais também envolverão seu testemunho para o estabelecimento desses quatro elementos. Um exemplo seria uma mordedura por cão que resulta em um processo legal. Você reparou cirurgicamente a laceração e agora deve testemunhar que a lesão foi causada pelo cão e que os danos descritos por você resultam diretamente da mordedura. Apesar de parecer ridículo quando você é questionado, agora você pode compreender que os três elementos desse caso legal podem ser estabelecidos. O primeiro elemento seria o dever de proteger as pessoas dos ataques do cão.

Consentimento informado A doutrina do consentimento informado é uma parte necessária tanto das interações legais como do tratamento

do paciente. Alguns locais utilizam o “padrão médico” razoável, que declara que as informações que um médico razoável pensa ser importantes devem ser apresentadas ao paciente em seu consentimento informado. Na maioria dos casos, um “padrão para o paciente sensato” é utilizado. O padrão determina que toda informação que um paciente sensato poderia querer e precisar saber deve ser apresentado no momento de fazer sua opção informada. Existe muita confusão sobre a quantidade de informação e de que modo ela deve ser transmitida. Existem aqueles que acreditam que o processo do consentimento informado deve ser registrado em vídeo, já que sempre há um questionamento após um fato ocorrido sobre o que realmente foi discutido ou apresentado. Isso geralmente é desnecessário, já que a documentação deve incluir o processo de informação apresentado, as questões feitas e respondidas e, por fim, a compreensão do que o médico pode ou não fazer. Existem vários estilos de aprendizado, e o pensamento atual é incluir três estilos durante o processo de consentimento informado. Existem as pessoas que compreendem melhor pela via visual, outras, pela via auditiva e outras, ainda, pela via cinestésica. Aquele que compreende pela via visual deve querer ver uma fotografia, um desenho ou algum exemplo demonstrativo do que está sendo proposto. O que compreende pela via auditiva quer ouvir cuidadosamente as recomendações, o procedimento cirúrgico, as instruções pré e pósoperatórias, as expectativas razoáveis, alternativas ao tratamento, além dos riscos e preocupações inerentes. E o que compreende pela via cinestésica está buscando entender como todo o processo o afeta pessoalmente. O objetivo do consentimento informado é atingir altos níveis de compreensão, que podem ser atingidos pela combinação de todos os três estilos de entendimento durante todo o processo de consentimento informado. Não é somente um documento assinado, mas o processo de compreensão documentado pelo consentimento. Acredito que o cirurgião tem a responsabilidade de delinear os riscos e os perigos do procedimento proposto. Também sugerimos que o profissional envolva sua equipe cirúrgica, de enfermagem e outros no processo para a obtenção dos melhores resultados. Existem alguns pacientes que nunca entendem completamente o processo de consentimento informado e recomenda-se que, nesses casos, a cirurgia não seja realizada. Também recomenda-se que várias visitas e discussões sejam utilizadas para que o paciente possa discutir com seus familiares e amigos, refletir sobre os objetivos e formular as questões adequadas a serem respondidas antes de se avançar com um procedimento eletivo.

Lei da privacidade A lei da privacidade se destina a proteger as informações sobre o paciente. Ela inclui as informações médicas, fotografias, resultados de exames laboratoriais e as correspondências. O HIPAA garante vários tipos de proteção para o paciente. A prática tem a obrigação de explicar e documentar a compreensão e a aceitação do paciente. Tem-se o dever de manter as informações do paciente em segurança e mesmo denunciar aqueles que violam essas proteções. A prática terá uma obrigação de acordo com as novas “regras red flag” segundo às quais as organizações são obrigadas a desenvolver um processo de identificação, detecção e prevenção contra o roubo de identidade. O consultório do cirurgião plástico deve ser cuidadoso durante a utilização das informações ou fotografias de pacientes de modo comercial em sites da internet, publicidade ou informativos sobre resultados de cirurgias, apresentados para futuros pacientes. Uma violação na privacidade não é coberta pelos seguros profissionais, e qualquer tipo de reparação resultante dessa violação terá que ser feita exclusivamente por você. Não é raro que, junto com queixas de negligência, haja queixas de violação de privacidade. Isso geralmente aumenta a pressão sobre o processo legal e pode aumentar o valor reclamado pelo cliente na ação. Se você tiver a permissão do paciente para fornecer esse tipo de informação, um consentimento informado por escrito para uso comercial deve ser assinado pelo paciente. Você pode utilizar as regras da HIPAA1 identificando um dos empregados do consultório “red flag” como o responsável pela salvaguarda da identidade do paciente e também pela obtenção dos consentimentos informados para tratamento, liberação de informações, uso comercial específico e consentimentos fotográficos. Áreas de preocupações seriam blogs e as redes sociais, como o Facebook e o Twitter. Há o risco de o cirurgião ou seus assistentes descreverem “um dia na vida de um cirurgião plástico” em um blog, e o paciente reconhecer que “aquele dia” se referia ao seu tratamento, mesmo que seu nome não tenha sido mencionado.

Lei das garantias A lei das garantias envolve dois tipos específicos de aspectos da garantia; “garantia expressa” e “garantia implícita”. Você deve ter ciência que assuntos ligados à garantia não são cobertos por apólices de seguro

profissional. Uma garantia expressa utiliza uma parte demonstrativa do prontuário médico para criar uma garantia relacionada com um resultado. Isso pode ser feito pela inclusão de uma fotografia que o paciente traz apresentando o resultado que busca, ou pode alterar resultados criados e se torna uma parte permanente do contrato firmado entre você e seu cliente. Entre médicos, aceita-se que não existem garantias em relação a um resultado, já que o processo de cicatrização é muito específico e fora do controle do médico. Apesar de imagens serem bastante úteis na orientação dos pacientes sobre os procedimentos e as expectativas, a prática deve ser muito cuidadosa para não estabelecer uma garantia de um determinado resultado. Os pacientes também podem ter expectativas irreais, e a mídia e outros fatores retratam certas aparências sociais. Utilize todas as ferramentas educacionais, incluindo imagens, para ajudar o paciente a compreender o procedimento e os resultados, mas assegure-se de informar e documentar as discussões relacionadas com expectativas realistas. A garantia implícita pode ser mais difícil. Ela não se baseia em algo acrescentado ao prontuário que seja tangível, mas em uma compreensão do que o paciente solicita a você que deve ser considerado e abordado. Exemplos poderiam ser que 2 semanas após uma grande cirurgia, o paciente espera poder viajar com a família ou resolver assuntos de trabalho. Existe a possibilidade de o paciente estar capacitado a fazer essa viagem, mas você deseja garantir que ele estará realmente liberado para tal? Esse pode ser o tema central nas garantias implícitas. O paciente informa direta ou indiretamente um desejo. Você deve ser cuidadoso em informar e documentar os vários motivos que podem interferir com tal desejo. A possibilidade de mudança da data da cirurgia ou outras considerações devem ser abordadas. Se nada for discutido ou documentado, e o paciente perder seu evento importante, a omissão pode ser julgada como falta e você pode ser responsável pelas perdas financeiras que ocorrerem. Isso está se tornando mais comum, já que os pacientes buscam e demandam recuperações mais rápidas, acrescentando procedimentos no último minuto, todos dentro de um período de tempo de recuperação encurtado. As garantias implícitas podem surgir por assuntos relacionados com tempo, estimativas e custos financeiros, cuidados e tratamentos futuros e aspectos relacionados com os resultados e expectativas. Assegure-se de que toda a equipe de seu consultório discuta os comentários e as interações do paciente, pois não é raro que um paciente converse com um recepcionista ou coordenador sem nunca mencionar o assunto com o cirurgião. Inclua um parágrafo em seu documento de consentimento informado de que não existem garantias expressas ou implícitas e de que o paciente compreende e concorda com isso.

Responsabilidade pelo produto Assuntos relacionados com a responsabilidade pelo produto cobrem o crescente número de produtos que distribuímos, utilizamos ou prescrevemos. Existem várias áreas dentro da responsabilidade pelo produto que se aplicam na prática. Aquelas que se originam do uso negligente de um produto podem estar cobertas pela sua apólice de seguro profissional. Outros tipos de uso incorreto de um produto ou alteração de um produto com a colocação de seu selo privado podem desencadear processos adicionais não cobertos pela sua apólice. Qualquer material, produto ou prescrição fornecido a um paciente deve incluir instruções completas, bem como informações a respeito dos riscos, danos e alternativas. Um fator-chave nessa área é que a responsabilidade é criada no fluxo previsível do comércio. Isso ocorre, por exemplo, quando você dá uma amostra de um produto para a pele para seu paciente; é previsível que ele compartilhe seu uso com parentes e amigos. Portanto, é importante fornecer boas instruções de segurança sobre seu uso, precauções sobre alergias e aspectos relacionados com o tratamento e documentar essas informações no prontuário do paciente. Quando os amigos do paciente utilizam o produto e têm uma reação, você pode ser responsabilizado, mesmo que nunca tenha tratado desse amigo como paciente. O acréscimo de etiquetas pessoais ao produto pode esconder importantes informações sobre os ingredientes e as instruções. Você deve ter o cuidado de manter visíveis essas informações importantes. A alteração do produto, mesmo com a simples colocação de seu nome nele, pode eliminar a responsabilidade do fabricante contra o uso inapropriado. Tenha cuidado de investigar se o FDA (no Brasil, a ANVISA) aprovou o produto e/ou material. Tenha cuidado quando representantes da indústria sugerem um uso diferente sem fornecer uma aprovação por escrito. O médico tem a capacidade de prescrever de modo off-label, mas são necessárias algumas precauções. Existem três elementos necessários para uso offlabel: (1) que o produto seja aprovado pelo FDA (no Brasil, a ANVISA) para uso; (2) que o uso proposto não seja experimental, e (3) que haja uma confirmação por escrito do paciente aceitando e compreendendo o uso offlabel.

Fraude e abuso Fraude e abuso definitivamente pode tornar um caso favorável de má prática em um caso com necessidade de acordo, ou mesmo de perda da ação. A fraude é definida como a intenção de enganar, e o abuso, como a intenção de confundir. Existem várias formas nas quais a fraude e o abuso podem fazer parte da clínica de cirurgia plástica. Não somente a fraude e o abuso podem ter efeito negativo sobre o resultado de um caso de má prática, mas, em muitos locais, uma condenação por fraude pode colocar em risco sua licença para atuar profissionalmente e envolvê-lo em atividade criminal. Um modo de evitar a percepção de fraude é assegurar-se que suas cobranças médicas e codificações estejam de acordo com seus registros cirúrgicos e anotações sobre o tratamento. Em geral, compreende-se que os códigos utilizados para cobrança podem ser mudados, como em um processo evolutivo. Você deve ter consistência quando ajusta seus códigos de cobrança para refletir eticamente os procedimentos e os tratamentos realizados. Outra área de exposição à fraude é o prontuário médico. A alteração de um prontuário médico pode expor você a penalidades civis e criminais. Existem várias formas de descobrir quando um prontuário foi alterado. Uma técnica envolve um teste de detecção com aparato eletrostático, um equipamento comumente utilizado em exames de questionamento de documentos, que revelam impressões removidas de papéis que, em outras situações, passariam despercebidas. É uma técnica não destrutiva (não danificará a evidência em questão), permitindo que outros testes sejam realizados. É uma técnica sensível e detecta a presença de impressões digitais recentes. Quando a escrita é feita em uma folha de papel sobre outras páginas, as marcas produzidas são passadas para as páginas abaixo. Essas marcas são detectadas com o uso do aparato eletrostático, permitindo uma combinação entre o documento original e sua fonte (como um pedido de resgate ou ameaça de extorsão) no bloco de notas do agressor. Nos casos em que dois ou mais estilos de escrita podem ser encontrados misturados em um único documento, e características de um estilo de escrita diferem das características da outra, o teste de detecção eletrostática pode ajudar a revelar as diferenças de pressão empregadas entre os indivíduos responsáveis pela amostra escrita. Uma endentação na página abaixo pode ser avaliada para demonstrar correções, acréscimos e outras informações sobre a escrita. Um prontuário hospitalar tem a cronologia mais recente em cima, com os registros anteriores embaixo. Quando o paciente recebe alta, a cronologia é invertida, com as datas anteriores em cima e as mais recentes em baixo. Consequentemente, se for observada uma endentação por pressão na página da última data, aquela entrada foi feita após a alta do paciente, o que significa uma alteração de prontuário. Outro método de documentação de uma alteração de prontuário é a análise da tinta utilizada. Cada tinta é datada e é possível confirmar suspeitas por meio do teste da data de uma entrada questionável em prontuário. Os registros são alterados apropriadamente com base em correções informadas. O método adequado para a correção de um prontuário médico é traçando uma fina linha sobre o erro, permitindo sua leitura, além de fazer uma entrada contemporânea à data de correção do erro no prontuário. Ambas as entradas devem ser intituladas com a confirmação da data e do horário. Outro exemplo de preocupação em potencial ocorre quando múltiplos procedimentos são realizados com a necessidade de dois relatos cirúrgicos. Uma paciente tem síndrome do túnel do carpo e também quer fazer uma lipoaspiração. Ela tem um seguro saúde financiado pela sua empresa, e o contato desse seguro gosta de fofocas, de modo que ela pede que a empresa não tome conhecimento da lipoaspiração. O curso apropriado seria fazer dois relatos cirúrgicos e fazer referências sobre o outro procedimento dentro de cada relato cirúrgico. O relato cirúrgico da cirurgia de mão deve fazer referência a uma cirurgia adicional, que será descrita separadamente. O relato cirúrgico da lipoaspiração confirma que a cirurgia de mão prévia ocorreu e que esse procedimento veio em seguida. Um questionamento de fraude ou abuso que seria enganador ou confuso poderia ocorrer se não houvesse referência a ambos os procedimentos, possivelmente sugerindo que o tempo cirúrgico total foi gasto somente na cirurgia de mão. Dissimulação fraudulenta é outro tipo de fraude que pode colocar a prática em risco. Se uma informação falsa ou enganadora é dada a um paciente que se baseia nessa informação, uma queixa de dissimulação fraudulenta pode ser gerada. O significado dessa dissimulação é que ainda é uma fraude, sem cobertura pela sua apólice de seguro profissional, e pode dobrar ou estender o estatuto das limitações. Isso quer dizer que, nos casos em que uma queixa não pode ser apresentada após um período de 2 anos, quando uma dissimulação fraudulenta é provada, esta remove a limitação anterior e a queixa ainda pode ser considerada válida. Um exemplo em que isso pode ocorrer é em uma lesão excisada no dorso com cortes congelados demonstrando a

remoção de um câncer de células escamosas com margens livres de doença. Entretanto, o corte permanente, e o relato final da patologia demonstram tumor na margem superior. Essa informação não é dada ao paciente, que desenvolve uma recorrência; entra com uma ação 1 ano após a expiração do prazo para abrir um processo. Uma queixa por dissimulação fraudulenta permite que o processo prossiga. “Qui Tam”, parte da Lei das Falsas Alegações,2 prevê recompensas governamentais para aqueles que denunciam fraudes. Basicamente, um empregado descontente entra com uma queixa falsa contra você, seu empregador, citando ações fraudulentas, e o governo norte-americano acolhe a queixa, permitindo que o denunciante receba uma percentagem dos valores determinados em sentenças ou acordos judiciais. Isso enfatiza a necessidade de cobranças e codificações éticas, bem como a eliminação de empregados insatisfeitos de seu local de trabalho.

Lei dos contratos A lei dos contratos deve ter um papel limitado na clínica de cirurgia plástica. É sugerido ter um contrato de trabalho com contratantes independentes, médicos e esteticistas vinculados à sua clínica. Esse tipo de acordo deve cobrir as exigências trabalhistas, seguindo padrões éticos e legais, exigências de confidencialidade e do HIPAA e outras salvaguardas do local de trabalho. Não é raro que um esteticista empregado da clínica se demita e leve todas as informações confidenciais de um paciente para o próximo local de trabalho. Essa é uma violação direta do HIPAA, e a clínica tem o dever de recuperar e proteger tais informações. A inclusão de uma cláusula de proteção em seu contrato de trabalho proibindo essa prática é uma salvaguarda que pode ser utilizada. Alguns locais, como a Califórnia e o Colorado, permitem cláusulas de arbitragem que foram inclusas em suas reformas das leis de responsabilidade civil. Pode ser válido estabelecer um consenso de necessidade de arbitragem antecipadamente à cirurgia, mas não seria legalmente válido remover o direito do paciente em entrar com uma ação. Pode-se alegar que, quanto mais contratos são feitos com o paciente, maior a probabilidade de ações por quebra de contrato quando os resultados não correspondem às expectativas do paciente. A lei dos contratos deve representar um maior problema nos resultados e cuidados descendentes do que nas ações por ato ilício ou negligência. O paciente meramente tem que provar que o contrato foi violado e que os resultados esperados não foram correspondidos para requerer reparação financeira, enquanto, em uma ação por negligência, o paciente tem que provar que o médico agiu de modo negligente, o que geralmente é mais difícil de se estabelecer. Uma violação no contrato meramente requer que haja um contrato e que se tenha parcialmente falhado em preencher o objetivo do acordo. Os danos são pagos para compensar as perdas. Uma ação por negligência, entretanto, requer que haja um indivíduo considerado negligente em relação a um dever de cuidar, e os danos são pagos para compensar o ato negligente. Desenvolva um manual de políticas de sua clínica delineando os cuidados apropriados e esperados, bem como as ações restritas e proibidas. Utilize um contrato de trabalho atualizado para sua equipe delineando, de modo semelhante, os comportamentos necessários e os proibidos. Estamos observando um aumento na quantidade de profissionais “terceirizados”, geralmente na forma de esteticistas ou funcionários, etc. A clínica deve ser cuidadosa no estabelecimento das diretrizes para esses indivíduos. Tais diretrizes devem constar do manual de políticas do consultório. Profissionais terceirizados não são empregados e devem ter sua própria responsabilidade, não sendo cobertos pela lei do agenciamento (na qual há relação empregador-empregado, sendo o empregador responsável pelos atos do empregado). Isso significa que não se pode gerenciar totalmente a atividade diária desses profissionais, ou estender a cobertura de seu seguro a esses profissionais, como no caso de seus empregados. O aspecto do “controle” sobre o produto do trabalho desses profissionais é um fator importante ao diferenciá-los como profissionais terceirizados ou empregados; não a linguagem utilizada no contrato. Você deve verificar continuamente suas permissões para trabalhar, história de má prática e qualidade do trabalho. Você pode dar as ferramentas para que eles realizem suas tarefas, mas não controlar suas atividades como faria com um empregado. O problema é se você será responsabilizado caso este profissional seja acionado por negligência. O profissional terceirizado é responsável pela sua própria negligência, enquanto que o seu funcionário é sua responsabilidade.

Aspectos regulatórios dentro da lei Existem várias agências regulatórias supervisionando uma clínica de cirurgia plástica. O HIPAA foi criado para proteger a privacidade do paciente e a informação médica. O paciente deve assinar um termo de ciência sobre a

proteção de sua privacidade, o qual é mantido no prontuário do paciente. Não existem obrigações ou salvaguardas contra roubo de identidade, conhecidos como as “regras red flag.3 A clínica deve identificar um prontuário individual para cada paciente e inspecionar procedimentos, cobranças e envio de correspondência para seguradoras, de modo a assegurar que o processo é totalmente correto e seguro. Isso pode incluir a cópia de uma identidade do paciente, como a carteira de motorista ou o passaporte, a inclusão de uma fotografia do paciente e a checagem dos documentos mencionados, de modo que os cuidados e tratamentos oferecidos sejam os que foram documentados. A Occupational Safety and Health Administration (OSHA)4 regula os aspectos de segurança no local de trabalho. Todos os equipamentos e materiais devem ser rotulados com as recomendações de uso e precauções, bem como uma etiqueta com as condutas de emergência, caso ocorra um acidente. O FDA controla fabricantes de equipamentos e produtos e, apesar de não supervisionar diretamente os médicos, existem requisitos necessários para uso off-label. O uso off-label envolve o uso não experimental de um equipamento ou produto aprovado pelo FDA, de modo não aprovado. Essa utilização deve ter um consentimento documentado específico do uso off-label e da aceitação pelo paciente. A clínica deve ser muito cuidadosa para somente adquirir equipamentos e suprimentos aprovados pelo FDA e evitar as frequentes tentações dos frequentes anúncios veiculados pela Internet ou correio de produtos que são “similares” aos aprovados. Essa compra pode ser ilegal e pode sujeitar o comprador e a clínica a penas civis e criminais. Órgãos regulatórios médicos e de enfermagem locais e outras agências regulatórias delineiam as linhas de tratamento apropriado no consultório. É de competência da clínica questionar sobre novos padrões e diretrizes aplicáveis. Diretrizes lançadas pelos órgãos regulatórios médicos locais descrevem quem pode fazer o quê em um ambiente de consultório e com qual grau de supervisão. É muito importante para toda a equipe e para os médicos da clínica compreender e aderir a essas regras. Não é aconselhável orientar um empregado a cuidar de um paciente quando esse ato viola as leis locais. Um exemplo seria pedir para um esteticista aplicar Botox® quando as regulações locais determinam que ninguém exceto médicos ou enfermeiros possam aplicar injeções. Outro exemplo é pedir para seu técnico de laser tratar pacientes fora da clínica quando os regulamentos locais determinam que esses tratamentos necessitam de supervisão médica direta. Se houver um resultado inadequado após o tratamento, ou qualquer coisa que possa iniciar uma investigação; isso pode prejudicar severamente sua defesa e pode anular a sua cobertura pelo seguro profissional. A clínica deve-se manter atualizada com relação às regras e regulamentos locais e às decisões que afetam a prática médica, de enfermagem e de outros que participam do âmbito de uma cirurgia plástica.

Lei do agenciamento A lei do agenciamento inclui todos os profissionais em seu local de trabalho e suas interações. É uma doutrina que o empregador é o responsável pelos atos de negligência de seus empregados durante o escopo do emprego ou na promoção do negócio. Qualquer ato de negligência de um empregado é atribuível ao empregador. Portanto, é importante que o empregador determine, geralmente em um “manual de políticas da clínica”, o que é um comportamento aceitável e o que é um comportamento inaceitável. A supervisão se torna importante, já que a alegação de não ter ciência de um comportamento arriscado ou negligente não é aceitável e não diminuirá sua culpa. Você deve estar atento com relação a atividades arriscadas ou negligentes. Entretanto, a violação de um manual de políticas da clínica que claramente defina o que não deve ocorrer pode ajudar a proteger a clínica contra uma ação de responsabilidade. A clínica deve tentar evitar perseguições no local de trabalho e, ao mesmo tempo, desenvolver uma boa equipe de comunicação com os pacientes. Empregados problemáticos devem ser abordados prontamente seguindo-se o manual de políticas da clínica com uma advertência, ação disciplinar e término da relação de trabalho. Deve haver a documentação dessas abordagens, para, nos casos em que os ex-empregados questionarem suas demissões, a clínica poder suportar sua decisão. Existem vários aspectos relacionados com os empregados, como peculato, empregados desagregadores, empregados que “roubam” informações de pacientes e que não concordam sobre horas trabalhadas, férias e rotinas diárias. Todos esses assuntos devem estar contidos no manual. O peculato pode ser evitado com o uso de um sistema duplo de checagem, com a conferência das contas a pagar e a receber com os estratos bancários. Um empregado responsável pelos dois lados do processo pode ser um caminho aberto para o roubo. Desenvolva uma política por escrito para horas de descanso, uso de telefone, política em relação ao tabagismo, dias de férias e interações com pacientes que todos concordem e assinem, com a manutenção de uma cópia para cada funcionário. Inclua uma cláusula de confidencialidade que proíba o roubo de informações do

paciente descrevendo as penalidades do HIPAA e as punições que a clínica estabelecerá para aqueles que violem essa cláusula. Um exemplo comum é o esteticista que troca de emprego e leva os dados de seus pacientes para a nova clínica. O HIPAA exige que você proteja esses dados e tente recuperá-los.

Lei da difamação pela internet e blogs A internet influenciou drasticamente as clínicas de cirurgia plástica. Recebemos e-mails de pacientes de vários estados buscando informações sobre tratamentos. Pacientes compartilham suas experiências em várias redes sociais. Em geral, a internet nos traz exposição e pacientes, apesar de também criar riscos significativos e problemas em potencial. Algumas diretrizes básicas relacionadas com os e-mails são: não responder questionamentos oriundos de outros estados sem que haja uma especificidade da perspectiva em que o paciente possa se basear. Uma falha em seguir essa diretriz pode expô-lo à prática em um estado onde você não tem licença para atuar – um crime. Isso somente se aplica a pacientes em potencial com os quais ainda não foi estabelecida uma relação médico-paciente. A clínica deve desenvolver respostas genéricas relacionadas com informações básicas para responder aos residentes de outros estados. Em geral, recomenda-se incluir um anúncio, por exemplo, se seus sintomas e a condição clínica piorarem, você deve buscar ajuda imediata em sua cidade. A correspondência existente entre a clínica e o paciente deve ser copiada e incluída no prontuário do paciente. Conversas telefônicas devem ter uma documentação similar. Grande parte da comunicação atual envolve o uso de mensagens pela internet, e é dever da clínica estabelecer políticas que façam com que esse tipo de comunicação se torne uma parte necessária do prontuário médico. Muitas clínicas desejam entrar em comunidades de redes sociais como o Facebook ou Twitter, estabelecendo blogs e atualizações de cirurgias plásticas. Deve-se tomar muito cuidado para não violar a confidencialidade do paciente por meio do fornecimento de informações sobre procedimentos. A clínica deve ter o cuidado de não divulgar que tipo de procedimento o médico está realizando em determinado dia, já que amigos do paciente em quem você está realizando o procedimento podem não estar cientes do tipo de procedimento que será realizado, o que se constitui em uma violação. Um modo de utilizar bem essa ferramenta é divulgar eventos genéricos não ligados a um dia específico, informar sobre aspectos de segurança do paciente, fornecer instruções gerais para os pacientes e apresentar as tendências atuais na cirurgia plástica. A clínica deve manter um alto nível de profissionalismo, aderindo às normas do HIPAA e de outros assuntos ligados à privacidade. O uso de fotografias em propagandas e em sites da internet requer um consentimento específico por escrito. Esse é um termo de consentimento separado do consentimento utilizado para fotografias em geral consideradas como parte do diagnóstico e do tratamento. As mesmas considerações são feitas para fotografias do consultório, informativos e referências apresentadas a outros pacientes. Uma recente tendência preocupante são os blogs de pacientes com informações contra a clínica. Um paciente pode perceber um problema e começar a escrever em um site da internet ou blog sua interpretação do fato negativo. Essa claramente é uma posição unilateral e, na realidade, pode não ser acurada. Apesar disso, a clínica não pode responder, devido às regras do HIPAA, sem que haja uma autorização por escrito por parte do paciente. Esse ataque unilateral representa uma grande preocupação. Existem tentativas de controlar a expressão do paciente por meio da lei dos direitos autorais, mas muitos acreditam que essa abordagem não seria ética. Pode ser válido desenvolver um blog da clínica específico que informe sobre complicações, problemas relacionados com a não aderência aos tratamentos orientados e aos procedimentos de alto risco, de modo a contrabalançar esses ataques. A primeira reação seria acionar legalmente o blog, entretanto, a Primeira Emenda da Constituição Norte-americana permite esse tipo de opiniões. Quem criar um site falso da internet simulando o da clínica com o objetivo de confundir e enganar o público está sujeito a um processo, se você conseguir identificá-lo e localizá-lo. Outra sugestão é utilizar ferramentas de pesquisa na internet para colocar estas páginas de blogs na segunda ou terceira página da internet, reduzindo a sua visibilidade. Isso geralmente leva a uma situação em que um tenta manipular o outro, resultando em uma demanda de extorsão monetária para remover o blog. Essas ações geradas por pacientes insatisfeitos têm prejudicado várias clínicas e ameaçado outras. Existem tentativas no intuito de um melhor controle das fontes dos blogs em um esforço para tornar essa ferramenta mais justa e equilibrada.

Ações básicas de um processo judicial de má prática (um guia) Existem vários estágios em um processo de má prática. Eles incluem a citação, a descoberta, as moções pré-

julgamento, o julgamento e os recursos. A citação de intenção de entrar com um processo é controlada por cada estado com um tempo determinado de resposta pelo médico ou pela clínica. A citação geralmente é enviada por um serviço de entrega certificado e deve ser levada a sério. Assim que receber uma citação, reúna os prontuários médicos e notifique a empresa que fez sua apólice de seguro profissional. Resista contra a tentação de acrescentar ou alterar dados do prontuário médico. Obtenha cópias dos prontuários médicos de hospitais, bem como os de seu consultório. É aconselhável, neste ponto, coletar depoimentos de seus funcionários e fazer um depoimento de próprio punho sobre os cuidados e tratamento do paciente com o uso de palavras-chave, de acordo com a orientação de seu advogado para uma preparação para um julgamento. A duração de um processo judicial pode levar até cinco anos, e a memória pode falhar ou seus funcionários podem não ser mais os mesmos. Portanto, é válido colher os depoimentos de cada funcionário e médico que entrou em contato com o autor da queixa registrando tudo aquilo que eles se lembram, e manter esses depoimentos escritos separados do prontuário médico. Mantenha esses depoimentos acessíveis somente ao seu advogado, vedando seu acesso à outra parte da ação. Mantenha esses registros separados dos prontuários, sob sua segurança. Haverá solicitações de acesso ao prontuário do paciente pelo reclamante e pela seguradora que fez sua apólice. Você pode ter encontros com representantes da seguradora e seu advogado. Em geral, as citações não são um processo propriamente dito, mas uma intenção de iniciar um processo, caso não se chegue a um acordo prévio. Sua seguradora e seu advogado discutirão o caso avaliando os fatos, o padrão de tratamento e a defensibilidade. Assim que um processo é aberto, sua equipe desenvolverá uma resposta dentro do tempo estabelecido, e o processo irá começar. Fique sempre em contato com o departamento jurídico do hospital ou da clínica à qual está vinculado, que podem receber a notificação de um processo. O próximo estágio é a investigação. A investigação inclui a resposta aos interrogatórios e os depoimentos para registrar testemunhos para uso futuro. Esse processo pode levar vários anos. Você deve lembrar de nunca responder uma solicitação sem a orientação de seu advogado. Você fará sua consulta com o advogado com bastante antecedência e utilizará essa estratégia para se preparar. Todas as partes da investigação, como os depoimentos, necessitam de registros de datas e locais. Isso permite que sua equipe de defesa se prepare, colete informações dos prontuários e busque orientação legal antes de realmente prestar seu depoimento. Eu recomendaria que você utilizasse um advogado sênior em vez de um advogado menos experiente. Ao mesmo tempo em que você se sente confortável na sala de cirurgia, o advogado fica mais confortável coletando depoimentos. Você deve se preparar para responder certas perguntas, apresentar todas as suas preocupações para o advogado e entender todo o processo do depoimento. Assim que todos os fatos forem reunidos e a data do julgamento for marcada, assegure-se de bloquear seu calendário e devotar o tempo necessário para sua preparação. O estágio pré-julgamento inclui demandas de ambos os lados para exclusões, testemunhos de especialistas e outros aspectos relacionados com o caso. Com frequência a arbitragem ou mediação é recomendada pela corte. Uma falha em obter um acordo leva à marcação do julgamento. O julgamento propriamente dito pode levar 1-2 semanas, dependendo da complexidade do caso e da agenda da corte. Você deve comparecer todos os dias, seguindo a orientação de seu advogado, sendo muito respeitoso durante todo o processo e visivelmente preocupado e gentil. A defesa tem dois especialistas, enquanto, geralmente, o autor do processo possui somente um. Você é o seu melhor advogado de defesa, e outro advogado é contratado por você. Trabalhe com os especialistas e com o seu advogado para ganhar o caso. Pode ser válido acompanhar seu advogado durante a coleta do depoimento de seu adversário, já que você pode fornecer valiosas informações para auxiliar no depoimento. Você não será reembolsado por esse tempo perdido, mas seu esforço pode ser recompensado. O último estágio pode envolver apelações e outras manobras judiciais e legais, adiando a decisão final do julgamento.

Responsabilidade da clínica de estética As clínicas de cirurgia plástica estética possuem riscos específicos inerentes à área. As expectativas do paciente são primordiais para a obtenção dos objetivos desejados e para a limitação dos riscos. Uma tendência perturbadora é a ausência de responsabilidade do paciente combinada com um conjunto de objetivos não realistas. Parece que qualquer risco inerente ou complicação gera uma preocupação legal mesmo se totalmente apresentada em um documento de consentimento informado. Mais do que nunca, a seleção do paciente e a indicação precisa do procedimento são fatos importantes. Os pacientes geralmente solicitam certos procedimentos, e a clínica deve ter o cuidado de assegurar que o procedimento proposto é adequado para esse paciente. Muitos acreditam que é mais seguro criar um documento de consentimento informado mais

específico, listando os riscos adicionais decorrentes das demandas do paciente. O problema é que você pode criar riscos adicionais ao delinear essas complicações em potencial em um documento de consentimento. A responsabilidade final sobre a aceitação do paciente é sua, e nenhum documento o protegerá contra uma decisão inapropriada. O tabagismo continua a ser uma das principais fontes de risco, já que afeta a cura, aumenta o risco de formação de cicatrizes e prejudica a recuperação em geral. Acrescentar riscos adicionais ao consentimento é um bom exemplo de não evitar a responsabilidade nos casos em que uma melhor opção de tratamento não for aceita pelo paciente. As tendências para procedimentos minimamente invasivos, apesar de serem desejáveis pelos pacientes, podem não atingir os objetivos desejados. A cirurgia de mama continua a ser a principal causa de queixas contra má prática, com a mastopexia de ampliação da mama sendo a líder. Outras tendências preocupantes são contra o local da cirurgia, nos casos de cirurgias mais demoradas realizadas em ambiente não hospitalar. O equilíbrio entre a realização de procedimentos apropriados para o paciente, o local e o aparato anestésico adequados versus custo permanece sendo primordial. A medicina estética assumiu a liderança no número de procedimentos realizados e deve seguir diretrizes gerais para a prevenção de riscos. Para cada tratamento de pele, injeção de toxina, preenchimento, deve haver um consentimento documentado. Preocupações adicionais sobre quem executa o tratamento devem seguir as leis locais, quer sejam elas órgãos reguladores médicos, órgãos reguladores da enfermagem ou o conselho de tratamento de pele do local em questão. Estabeleça diretrizes para o tratamento de seus pacientes e siga-as durante todo o tempo. Um exemplo poderia ser: um paciente para tratamento IPL (luz pulsada intensa) que, apesar de ter sido orientado para não utilizar bronzeador durante o tratamento, chega à clínica utilizando tal produto. É aconselhável não realizar o tratamento, a despeito da reação do paciente. Sugerimos que você avalie seus pacientes em potencial pelo menos duas vezes antes do procedimento cirúrgico, para que todas as questões sejam respondidas. Inclua discussões sobre os custos do procedimento proposto, bem como futuras despesas, especialmente se ocorrerem complicações. Tenha uma equipe para orientar seus pacientes e discutir sobre os procedimentos apropriados e os planos de tratamento. Reconheça a existência das pressões sociais atuais e a influência da mídia sobre o paciente e estabeleça objetivos realistas para seu paciente. Evite truques e não ofereça opções que não correspondam à realidade no intuito de manter sua clínica cheia.

Responsabilidades relacionadas com os planos de saúde A distância entre a cirurgia plástica e os planos de saúde/cirurgia reconstrutiva está diminuindo. Pacientes têm tantas demandas e expectativas irreais para a cirurgia reconstrutiva quanto podem exibir na cirurgia estética. A clínica deve apresentar opções e procedimentos realistas para o paciente e, após uma clara compreensão e aceitação, prosseguir com o tratamento. Preocupações adicionais podem surgir com a cobertura dos planos de saúde, e estas devem ser resolvidas com o paciente com o uso de boa documentação. Sua carta de solicitação de autorização deve ser honesta, completa e representar os fatos e o motivo do tratamento médico. Como você sabe, não é raro receber uma negativa, mas permaneça sendo um advogado de seu paciente e apele do modo apropriado e necessário. A clínica deve ser cuidadosa em não discutir seus honorários com concorrentes, já que isso pode violar as leis antitruste. Se você realizar um serviço em uma sala de emergência e não for credenciado do plano de saúde, tente acompanhar o paciente após a cirurgia sem cobrar e documente seu progresso satisfatório.

Aspectos relacionados com a responsabilidade da seguradora A opção pela empresa que fará sua apólice de seguro profissional é importante. Questione sobre a estabilidade financeira, registros, inclusões de coberturas, queixas feitas ou tipos de ocorrência, oportunidades de compra de um plano e decisões contratuais sobre acordos. Observa-se um aumento nas queixas, pergunte se a representação está inclusa em sua apólice. Verifique quais firmas de advogados representam os médicos com apólices nessa seguradora e como se relacionam com esses médicos. Não é somente o valor da apólice que deve afetar sua escolha. Muitos médicos pagaram um valor muito baixo para depois descobrir que a empresa estava falida e que não tinham cobertura alguma. Existem seguradoras especializadas em cirurgia plástica ativas em nossas sociedades que compreendem as nuances de uma clínica de cirurgia plástica. Determine seus limites de cobertura baseados em sua clínica, privilégio hospitalar, riscos e exposições. O nível deve ser adequado para manter seus privilégios hospitalares e na clínica, ainda que não excessivo, ajudando a torná-lo um alvo. Avalie as companhias que encorajem a discussão de pacientes problemáticos ainda que não considerem cada

questionamento um processo. Avalie a classificação da seguradora e os registros passados na área da cirurgia plástica.

Aspectos legais nos casos societários

Uma maior percentagem de médicos está se associando a parceiros do que no passado. É importante compreender as implicações legais dessas associações. Existem vários tipos de associações, desde sociedade total, acordos para compartilhamento de consultórios, sociedades de responsabilidade limitada, grupos de especialidade única e grupos de várias especialidades. Ao considerar esse tipo de associação deve-se avaliar a contabilidade dos sócios, conversar com seus advogados, verificar dívidas habitacionais, problemas familiares e aderência a um plano de responsabilidade financeira conjunto. Conheça bem o indivíduo a quem deseja se associar. É impressionante como é comum que algo que começou como uma grande ideia entre pessoas com o mesmo pensamento termine com exasperação por serem tão diferentes nos objetivos e estilos. Assegure-se que vocês se complementam como sócios, podendo manter sua autonomia e individualismo, importante para a prática da cirurgia plástica. Seja qual o formato que você escolher, estabeleça um mecanismo de comunicação, bem como um formato de solução de conflitos. As melhores intenções podem cair por terra. Obtenha um aconselhamento legal para seu plano de negócios de modo a torná-lo possível e, ao mesmo tempo, seguro para todos os envolvidos. Todos os aspectos do acordo devem ser considerados, especialmente os aspectos financeiros e os assuntos relacionados com o término da sociedade. O acordo é um contrato de união e deve refletir todas as considerações acertadas. Não deve haver acordos verbais ou tácitos que não sejam inclusos nas páginas do acordo contratual. Os aspectos a serem considerados e resolvidos são: 1. Os direitos de propriedade – consultório, equipamentos e outros investimentos e o direito de tomada de decisões sobre gastos novos e passados. 2. A duração do acordo, incluindo renovações, término e ajustes. 3. Os deveres e as expectativas de cada uma das partes devem ser cuidadosamente definidos e descritos. 4. A alocação financeira das despesas – fixas (aluguéis, empregados, empréstimos, gastos pessoais, por exemplo, pager), variáveis baseadas em grupos (suprimentos médicos, suprimentos de escritório, etc.) 5. Ética – definição dos padrões (ASPS, ACS, regulamentos estaduais e federais), queixas de má prática. 6. O processo de término da sociedade – quem fica com o que, assuntos ligados à equipe de trabalho, custos envolvidos, por exemplo, para cópia dos prontuários, etc. 7. Manter uma cláusula de isenção: acrescentando decisões ligadas à equipe de trabalho e médicos, gerenciamento do consultório. 8. A contabilidade dos recebíveis (sempre difícil) – possivelmente um crédito estabelecido pelo sócio majoritário, mantendo os fundos produzidos pelo sócio minoritário, mas em nome desse sócio minoritário, somente liberado quando o acordo e as responsabilidades foram resolvidos. 9. Considerações financeiras – bônus, salários, adiantamentos etc. 10. Cláusula de confidencialidade. 11. Marketing: publicidade. 12. A propriedade do número de telefone, nome da firma, etc. 13. Cláusulas restritivas – podem e serão aceitas desde que sejam “razoáveis” em relação ao tempo, descrição e distância. Dessa forma, uma restrição para a prática da medicina por um período de 5 anos em toda a cidade provavelmente não será aceita. Entretanto, uma restrição para a prática da cirurgia plástica durante 1 ano dentro de um perímetro de 5 quilômetros ao redor de cada filial da clínica provavelmente será aceita. Outra opção é considerar uma “cláusula de liquidação dos danos”. Essa cláusula reconhece a dificuldade de aceitar cláusulas restritivas e estabelece um acordo monetário (p. ex., R$ 300.000,00) que o médico que deixa a sociedade deve pagar aos demais sócios por ter violado as cláusulas restritivas. Essa quantia pode ser retirada dos honorários a serem recebidos pelo médico que deixa a sociedade ou de outros acordos que venham a ser fechados. Existem muitas outras considerações necessárias para o estabelecimento de uma sociedade bem-sucedida, a despeito da estrutura legal. A mais importante é a equidade percebida e tentativas constantes de manter o acordo positivo, eficiente e flexível com relação às várias mudanças e desafios que afetam uma clínica de cirurgia plástica.

Seleção do paciente A seleção do paciente se tornou a parte mais importante da proteção contra riscos. Observa-se uma tendência perturbadora de uma menor responsabilidade do paciente e de uma expectativa de que os resultados da clínica “devem ser perfeitos”. Processos legais foram feitos por pacientes que desenvolvem um risco inerente conhecido para o procedimento, a despeito de a clínica documentar prévia e adequadamente os riscos da intervenção. Processos têm sido acionados mesmo nos casos em que os pacientes não seguem as recomendações médicas, mesmo quando a importância dessas recomendações foi orientada em detalhes antes dos procedimentos. É como se houvesse uma mentalidade de que qualquer risco inerente ou complicação deve ser o resultado de “algo feito errado”. A chave para limitar esse risco é escolher pacientes nos quais você sente que pode confiar e aqueles com os quais você realmente pode atingir suas expectativas. É aconselhável ver o paciente mais de uma vez antes da cirurgia para avaliar seus objetivos e expectativas, bem como para observar como ele interage com você e sua equipe. Em momentos econômicos difíceis, é difícil dizer “não” para um paciente, mas dizer “não” é muito melhor do que se defender contra um processo de má prática. Seja realista na abordagem de suas opções de procedimentos. Os pacientes estão se tornando mais específicos em suas solicitações, pedindo por procedimentos, não por uma solução de seu problema. Eles podem pedir por um facelift quando outras opções seriam mais benéficas e adequadas. Devemos orientar os pacientes e compreender que somos os responsáveis pelas opções feitas, não o paciente. Nós somos os especialistas, e nosso papel é proteger e orientar o paciente, algumas vezes protegendo-os de si mesmos. Não é apropriado satisfazer os desejos do paciente, a menos que eles sejam apropriados e tangíveis. Há uma maior dificuldade de defesa nos casos de má prática quando o médico declara que “o paciente quis este procedimento e assinou todos os documentos de consentimento informado indicando um maior risco”. O médico tem o dever de aprovar os procedimentos, não o paciente. O paciente não pode consentir apropriadamente sobre um procedimento inapropriado. O cirurgião não deveria ter tratado do paciente ou sugerido um procedimento apropriado. Existe uma responsabilidade distinta ao não seguir esse princípio. O Dr. Mark Gorney desenvolve um gráfico que ajuda médicos a avaliar os objetivos realistas do paciente (Fig. 6.1). Ele equilibra a deformidade contra o efeito dessa deformidade sobre o paciente. Por exemplo, o Quasimodo, o corcunda de Notre Dame, busca por uma cirurgia corretiva. Ele diz que qualquer melhora que você conseguir será ótima. O Quasimodo estaria na região inferior do gráfico; um bom lugar para estar. Outro paciente possui uma diminuta cicatriz de 1 cm na região inferior da bochecha, sequela de uma varíola, e não consegue sair de casa sem tentar disfarçar essa cicatriz. Esse paciente está na área superior esquerda do gráfico; o lugar mais perigoso. Provavelmente, nada que você fizer ajudará o paciente a atingir seu nível aceitável. Deve haver uma avaliação de todos os pacientes para verificar onde eles se enquadram nessa escala. Algumas áreas mudarão com o tempo, mas é impressionante a precisão desse gráfico na definição de quais pacientes são melhores candidatos para seus cuidados.

FIG. 6.1 Dr. Mark Gorney desenvolveu um gráfico que ajuda os médicos a avaliar os objetivos realistas dos pacientes.

Resumo Existem diversas interações e riscos legais dentro de uma clínica de cirurgia plástica. Sempre deve se estar atento para esses riscos e desenvolver um padrão de proteção do paciente, da clínica e do médico. Eu sugiro tentar manter-se atualizado com o mutante ambiente médico-legal, conhecendo os riscos; explorar as regras dos órgãos reguladores locais e os painéis da sociedade de cirurgia plástica. Estabeleça relações dentro da comunidade legal conforme sua área de atuação crescer. Essas relações se tornarão uma fonte útil para questionamentos que surgirem e terão um impacto positivo sobre o âmbito da má prática médica. A compreensão de todos os temas apresentados é importante, mas a mais importante proteção contra o risco é a seleção apropriada do paciente. Escolha pacientes em quem possa confiar e desenvolva uma relação com eles. Combine os procedimentos escolhidos com as expectativas dos pacientes e atue como se você fosse o paciente. Forme uma equipe que reflita sua atitude nos cuidados de seus pacientes.

Referências 1. The Health Insurance Portability and Accountability Act (HIPAA) of 1996 (Public Law 104-191). Privacy and Security Rules. 2. The Federal False Claims Act (31 USC ss. 3729-3733). False Claims. 3. The Fair and Accurate Credit Transactions Act of 2003. Identity Theft Red Flags and Address Discrepancies. Federal Register. 72:217 (9 November 2007) p. 63718. 4. Occupational Safety and Health Administration. Online. Available at: http://www.osha.gov.

Leituras adicionais Federal Food, Drug, and Cosmetic Act (FD&C Act). Medical device safety business associate contracts. Sample business associate contract provisions. FR 67 No.157; 2002:53182, 53264. Gorney, M. Ten years’ experience in aesthetic surgery malpractice claims. Aesthet Surg J. 2001; 21(6):569–571. Nora P.F., ed. Professional liability/risk management: a manual for surgeons, ed 2., Chicago, Ill: The Professional Liability Committee, American College of Surgeons, 1997. Uma atualização sobre assuntos da área da responsabilidade profissional e do gerenciamento de risco que mudaram desde a primeira edição publicada em 1991.

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Fotografia na cirurgia plástica Brian M. Kinney

Resumo A fotografia não é simplesmente uma ferramenta útil de pesquisa ou mesmo promocional, documentativa, auxiliar, didática ou médico-legal – ela constitui um padrão para o atendimento sine qua non na prática adequada da cirurgia plástica. Nossa especialidade é altamente visual e depende da representação precisa da forma e da função, para diagnosticar, planejar, tratar, avaliar e acompanhar os desfechos cirúrgicos dos pacientes. O registro fotográfico contém muito mais informações do que pode ser facilmente documentado em palavras, incluindo cor, tonalidade, textura, forma, vascularidade, volume, relações espaciais de estruturas anatômicas, estética global, envelhecimento e alterações históricas, para citar somente algumas. O valor das imagens cresce com o tempo. É difícil imaginar nossa especialidade sem a incrível utilidade da fotografia, pois ela é intrínseca à natureza visual daquilo que fazemos.

Objetivo O primeiro princípio da fotografia como registro médico é documentar a condição pré e pós-operatória do paciente, servindo como um acompanhamento e função análogos à radiografia, tomografias computadorizadas, exames de imagens nucleares ou ressonância magnética. No pré-operatório, o registro é um guia para avaliar a condição do paciente, para realçar as relações anatômicas e demonstrar os aspectos da função fisiológica de tecidos como o nariz, os olhos e a mão. No pós-operatório, as imagens registram alterações para o ensinamento, autoavaliação e avaliação dos resultados pelo paciente em comparação com o desfecho planejado. As imagens intraoperatórias podem apresentar aspectos essenciais do procedimento cirúrgico. Muito da cirurgia plástica se baseia em um contexto pouco usual na medicina. Sua alma e história são reparadoras por natureza, decorrente de esforços para reconstruir lesões apresentadas por soldados da 1a guerra mundial. Seja reparadora ou estética, sua essência é restaurar forma e função e, atualmente, uma grande parte não é urgente nem tampouco crítica para a saúde imediata. Em vez disso, grande parte dela é eletiva e concentrada em qualidade de vida, principalmente na área estética. A análise de fotografias com o paciente pode transformar o planejamento pré-operatório a partir de uma interação partindo do médico para o paciente. Em vez disso, o esforço pode ser de colaboração e de consulta, uma interação entre o médico e o paciente.1,2 Vários cenários podem ser examinados e avaliados com imagens digitais, modelagem e computação gráfica. Deve-se tomar cuidado ao mostrar resultados pós-operatórios potenciais, para evitar que se deduza um resultado sugerido ou garantido.3 Um popular aplicativo (Mirror Image)4 contém uma importante declaração de isenção de responsabilidade na parte inferior da tela, indicando “Somente simulação: Os resultados reais podem ser diferentes”. A natureza didática da fotografia médica não pode ser subestimada. Há algumas décadas, eram usados desenhos, seguidos de fotografia em preto e branco, transparências coloridas e filmes, com a progressão moderna para imagens digitais nos últimos 15-20 anos. Para todos os objetivos práticos, a fotografia analógica é um nicho de mercado, e as imagens digitais têm a supremacia. Entre a consulta e o procedimento cirúrgico, o

planejamento exige boa memória e representação da anatomia. A imagem serve para refrescar a memória do cirurgião. Além disso, é fundamental que os pacientes entendam os excessos ou deficiências de tecidos e problemas de simetria.3 Os aspectos de sua anatomia podem facilitar ou atrapalhar o planejamento cirúrgico, influenciar escolhas na abordagem cirúrgica, afetar os riscos de complicações, comprometer ou aumentar a satisfação do paciente. As orientações ao paciente requerem a representação fotográfica adequada da condição pré-operatória e a explicação das alterações obtidas com a intervenção cirúrgica. A evolução de uma prática cirúrgica pode ser acompanhada mais facilmente por um período de vários anos por meio da inspeção sistemática das imagens da situação dos pacientes durante a evolução de suas doenças ou afecções. Um fenômeno particularmente comum é o paciente não se lembrar de sua aparência antes da cirurgia ao analisar criticamente o resultado pós-operatório. Ocasionalmente, em procedimentos reparadores e, mais frequentemente, em procedimentos estéticos, o “ponto de ajuste” psicológico do paciente é restabelecido em sua condição atual e o desejo de uma melhora adicional faz com que ele acredite que não foi obtido progresso suficiente como resultado da cirurgia. As fotografias são indispensáveis nesse contexto e podem fornecer a garantia de que as metas foram atingidas. A manutenção das imagens adequadas e a avaliação consistente das mesmas no pós-operatório de forma sistemática pode melhorar a conscientização das escolhas e resultados cirúrgicos. Imagens analógicas adequadamente preservadas podem durar várias décadas com fidelidade original e mais de 100 anos, com leve degradação. A tecnologia tem evoluído rapidamente, com as imagens digitais suplantando amplamente o armazenamento de imagens fotográficas e transparências coloridas. As imagens digitais podem não durar por muito mais tempo. Os desafios na evolução da tecnologia acarretam problemas de visualização (incompatibilidades de hardware), problemas de execução (alterações nos algoritmos de compressão), limites de inter-relação (páginas da internet ou hiperlinks expirados), problemas de custódia (onde os dados residem), problemas de leitura (como ler antigos arquivos armazenados com nova tecnologia), para mencionar alguns. Se os problemas digitais forem solucionados, as imagens poderão durar séculos ou mais.5 A construção de um banco de dados digital e a adoção de prospecção de dados periódica é um componente crítico no autoaperfeiçoamento dos cuidados médicos. O advento da fotografia digital elimina ou atenua as preocupações sobre falta de espaço, dificuldades de armazenamento quanto à degradação da qualidade das imagens, capacidade de comparar resultados anteriores com os atuais em grandes séries e os problemas relacionados. Entretanto, a fotografia digital está sujeita a seus próprios caprichos. Tecnologias antigas (disquetes, CDs etc.) poderão ser de difícil obtenção no futuro próximo. Estão sujeitas a um fracasso catastrófico. Por exemplo, um arranhão em uma transparência pode degradar ligeiramente a qualidade da imagem, enquanto o mesmo acontecimento em uma imagem digital poderá torná-la ilegível. As imagens digitais exigem a existência de cópias de reserva e as metodologias mudam rapidamente, necessitando de aperfeiçoamentos contínuos nos equipamentos. Os melhores métodos de armazenamento mudaram 5-10 vezes nos últimos 20 anos, desde disquetes a discos magneto-ópticos, fita magnética, CDs, DVDs, discos de DVD RAM, unidades USB, HDs externos, unidades de armazenamento de rede e, mais recentemente a “nuvem”, ou seja, on-line em um centro remoto de armazenamento de dados na internet. De maneira semelhante à evolução dos padrões de negócios e das pesquisas sobre armazenamento de e-mails e documentos digitais para casos jurídicos em potencial, nossos padrões reais determinam que as fotografias precisam ser preservadas, organizadas, adequadamente referenciadas e identificadas e, ao mesmo tempo, ser facilmente recuperáveis. O consentimento informado é uma parte fundamental da manutenção dos registros médicos, e a fotografia é essencial para os registros médicos adequados. Quase todo paciente entende que as fotografias são parte dos registros médicos. De fato, muitos insistem em ver os “antes e depois” em sua consulta inicial, a melhor ocasião para estabelecer a necessidade de documentação precisa. Alguns pacientes têm uma forte necessidade de privacidade; entretanto, a maioria dos cirurgiões se recusa a operar um paciente que não permite a fotografia médica. Os pacientes entendem que eles têm o controle e as escolhas de como suas fotografias serão usadas. Algumas práticas só permitem registros internos em seu quadro particular, outras podem permitir o compartilhamento com outros pacientes sem a identificação dos dados, e algumas são confortáveis com o uso irrestrito de propaganda impressa, pela televisão e pela internet. Um formulário de consentimento completo e detalhado, especificamente para o uso das imagens, é necessário para um registro jurídico médico adequado.1 Formulários de consentimento da American Society of Plastic Surgeons (Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos) estão disponíveis para os cirurgiões membros.6 Um método adicional desenvolvido em nossa clínica permite a granulosidade em atribuir permissões ao uso de caixas de verificação e de uma grade para suplementar o texto do formulário assinado.7

A utilidade da fotografia como ferramenta de pesquisa e interpretação em nosso campo é inquestionável.8 A comparação de como nossos registros têm progredido desde a primeira década do século XX até o século XXI mostra que eles evoluíram de fotografias em preto e branco para fotografias coloridas, para imagens digitais online de baixa e alta resolução e para vídeo on-line. Simulações tridimensionais que permitem uma visualização completa da anatomia têm estado disponíveis nos anos recentes. A densidade de informações nas imagens é uma ordem de magnitude superior à palavra escrita. Com a diminuição dos custos na era digital, o aumento do uso das imagens aperfeiçoa o aprendizado e a documentação. Nos próximos anos e, talvez, antes do final desta década, o uso disseminado de inteligência artificial para processamento de imagens provavelmente permitirá a prospecção dos dados do próprio conteúdo da imagem. Isso seria um avanço importante além da designação de atributos de bancos de dados para arquivos digitais, como idade, datas das fotografias pré e pós-operatórias, tipo de procedimento etc. Em vez disso, podemos começar a ver a referência da qualidade digital para resultados, condições de anatomia em escalas de graduação validadas etc. Mesmo atualmente, as câmeras digitais do mercado possuem “achadores de rostos”, redução automática de olhos vermelhos e recursos similares. Os sistemas profissionais possuem capacidades como avaliação automática de porosidade da pele e contadores de células para trabalho microscópico. Podemos imaginar muitas futuras aplicações potenciais, como detecção automática de cor, avaliação de vascularidade cutânea, perfusão de retalhos e outras. Desde a “migração” em massa para a internet pela população geral, o público tem se voltado para a pesquisa on-line sobre cirurgia plástica, comparando resultados, investigando complicações, criando grupos especiais de interesse e procedimentos e engajando-se em promoção e marketing. Existem muitos exemplos notórios de manipulação e fraude; entretanto, existem ainda mais oportunidades vantajosas para a orientação ao paciente, para o marketing, defesa e projeção de saúde pública da especialidade. Além disso, os cirurgiões frequentemente desconsideram os padrões de segurança da documentação fotográfica.9

Padrões de captura de imagens Pouco tem mudado no enquadramento e composição de imagens desde que Morello et al.10 e Zarem11 e muitos, antes deles, especificassem esses aspectos de padrões de fotografia na cirurgia plástica. Entretanto, muitos outros fatores têm evoluído na transição para o mundo digital.12 Devem ser seguidos os princípios fundamentais (ver anteriormente).13 A consistência nos resultados é afetada por numerosos fatores.8,10,11,13 As fotografias do rosto são tiradas com o equivalente à câmera de 35 mm com lente de 100 mm, ao passo que as imagens corporais são obtidas com o equivalente à lente de 50 mm.14 Devem ser evitadas sombras. A cor deve ser natural. A iluminação deve ser discreta e consistente. Os padrões devem ser obedecidos.15,16

Princípios funda m e nt a is • Deve ser usada a mesma câmera. A mudança da câmera digital (e, consequentemente, o balanço de cores e de branco) essencialmente altera a resolução de pixels, a sensibilidade fotônica e o processamento de imagem do equipamento. • A velocidade e a abertura do obturador devem permanecer as mesmas. O posicionamento do paciente e do fotógrafo na sala não deve variar. • Guias de marcação no assoalho podem ser necessárias; o equipamento de flash e de iluminação não deve variar. • A iluminação adequada é essencial. A velocidade do obturador deve ser 1/60 de segundo ou mais rápida. • Em câmeras digitais, mantenha o fator de ampliação igual ao comparável com uma câmera de 35 mm com lente de 100 mm essencialmente para todas as imagens, exceto as de corpo inteiro, quando deve ser usada uma visão comparável à lente de 50 mm. • Ajuste o foco movimentando a câmera para mais perto ou mais longe do paciente e observe a posição do cilindro mecânico da lente de zoom com relação ao corpo da câmera. • Não altere o balanço de branco e mantenha-o sincronizado com a iluminação usada (geralmente flash ou lâmpada fluorescente) em um fundo de azul médio. • Embora as câmeras modernas contenham 10 megapixels ou mais, geralmente não são necessários mais do que cinco pixels. • Espaço para imagens digitais não é problema na era dos discos rígidos com tamanho de terabytes e a

velocidade é facilmente adequada para o acesso rápido dos dados. • Mais imagens do que provavelmente serão usadas em toda a carreira podem ser armazenadas em unidades leves e portáteis.

Características das imagens digitais Muitas variáveis afetam as imagens e muitas estão no controle do cirurgião plástico. Parker et al.8 documentaram quatro vias básicas pelas quais são introduzidas inconsistências na fotografia: (1) fotógrafo; (2) editor; (3) combinados; e (4) paciente. A categoria 1 inclui a vista (composição), fundo e zoom, sendo geralmente consistentes em uma variedade de registros. Critério do editor, tamanho e rotulagem da imagem são menos problemáticos. Critérios combinados, cor, brilho, contraste e resolução variam em registros publicados. Critério 4: vestimentas, acessórios, maquiagem, expressão facial e penteado são variáveis atribuídas ao paciente, mas estão substancialmente sob o controle do fotógrafo. Pode ser usado um tecido de cor escura sobre os ombros para fotografias faciais. Acessórios devem ser removidos, pois maquiagem, cílios postiços e adereços similares podem interferir. O efeito do penteado pode ser suavizado com o uso de elásticos ou faixas para o cabelo. Galdino classifica os fatores em diretos e indiretos.12,13 As variáveis diretas incluem a lente, o visor, o chip digital, a resolução, compressão e algoritmos do software da câmera. Os indiretos são iluminação, distância, profundidade do campo, temperatura da cor de iluminação e método de saída. Ambas as categorias são facilmente controladas mantendo técnicas consistentes de consulta em consulta.

Fundo Fundos em azul médio ou com 18% de cinza proporcionam os melhores tons de pele e afetam menos a exposição. Fundos brancos ou pretos afetam a exposição nas câmeras mais comumente usadas (medição por matriz), portanto o modo deverá ser alterado para medição de ponto na pele do centro do campo. Entretanto, o forte contraste não criará uma cor natural da pele. Toalhas azuis normais de cirurgia são quase ideais para o uso sem problemas, o que não ocorre com as toalhas verdes.

Balanço de branco A reprodução de cores vivas depende da neutralidade, uma distribuição igual das cores no branco, no cinza e no preto da imagem para garantir a precisão da matiz. Uma imagem com balanço de branco contém todas as matizes em igual proporção de luz branca luminosa. Infelizmente, diferentes tipos de pontos brancos de referência existem em vários ambientes. Cenas internas iluminadas por lâmpadas incandescentes são totalmente diferentes da iluminação da luz do dia. Lâmpadas fluorescentes são fornecidas em várias tonalidades de azul. A iluminação da sala de cirurgia varia em cor, temperatura, ângulo e distância com relação ao paciente. O ajuste de balanço de branco tenta capturar as cores neutras através da compensação dessas alterações. As modernas câmeras digitais possuem diversos ajustes, como luz do dia, fluorescente 1 ou 2 (ou alta e baixa) e balanço de branco automático, dentre outros. O ajuste de balanço de branco automático frequentemente é prejudicado pela pulsação das lâmpadas fluorescentes suspensas e pode produzir variações de imagem para imagem. O ideal é que um sistema de flashes múltiplos em uma sala de fotografia dedicada seja utilizado para eliminar esses problemas. O flash único montado na câmera é inadequado, devido aos efeitos de sombra em todos os fundos, exceto no preto.

Composição e posicionamento Rosto inteiro Na incidência anteroposterior (AP), a borda superior da cabeça deve estar enquadrada por uma pequena quantidade de fundo, cerca de 10% da altura vertical da imagem. A borda inferior da imagem deve terminar próximo ao nível da incisura supraesternal. Na incidência lateral, o corpo e a cabeça do paciente devem estar virados em um ângulo de 90° do plano focal da câmera. Embora seja aceitável que se corte uma pequena parte da região occipital, as incidências laterais devem ser completas. As incidências oblíquas devem ser tomadas a 45° e, nessa incidência, a ponta do nariz deve se projetar ligeiramente para frente ou repousar exatamente sobre o contorno da eminência malar distal. São tiradas cinco incidências padrão, uma AP, duas oblíquas e duas

laterais, direita e esquerda, para cada uma das duas últimas (Fig. 7.1). Quando for indicado, a eminência malar pode aparecer. Geralmente a vista superior é preferida com relação à vista inferior, a menos que uma característica particular da anatomia seja envolvida.

FIG. 7.1 Rosto inteiro. Cinco incidências padrão: (A) anteroposterior; (B) oblíqua direita; (C) lateral direita; (D) oblíqua esquerda; e (E) lateral esquerda.

A musculatura deve estar relaxada em todas as fotografias, a menos que seja especificado de outra forma.

Olhos As mesmas cinco incidências (anterior, duas laterais e duas oblíquas) fazem parte do conjunto básico para os olhos. As imagens de perto dos olhos incluem uma pequena borda da pele da testa anteriormente às sobrancelhas e se estendem para baixo até o lábio superior, na espinha nasal. Para as incidências laterais e oblíquas, o posicionamento é similar às incidências da cabeça, respeitando as bordas superior e inferior descritas. Incidências adicionais são essenciais e incluem, pelo menos, o seguinte: (1) incidência com os olhos fechados para destacar o sulco e a dobra tarsal superior e (2) com o olhar para cima para destacar as bolsas de gordura orbitais inferiores e a margem palpebral inferior. Uma incidência com os olhos parcialmente fechados, com a contração dos músculos orbiculares superiores e inferiores dos olhos, para mostrar o impacto da ação do músculo sobre o formato e a função da pálpebra. Ocasionalmente, é necessária uma incidência com as pálpebras firmemente fechadas para realçar os músculos orbiculares, zigomáticos e outros que são exigidos em certos procedimentos cirúrgicos (Fig. 7.2).

FIG. 7.2 Olhos. Incidências padrão: (A) incidência anteroposterior; (B) incidência anteroposterior com olhar para cima; (C) incidência anteroposterior com olhos suavemente fechados; (D) anteroposterior com olhos firmemente fechados; (E) oblíqua direita em olhar para frente; (F) lateral direita em olhar para frente; (G) oblíqua esquerda em olhar para frente; e (H) lateral esquerda em olhar para frente.

Glabela Imagens dos músculos corrugadores podem ser tomadas em repouso e em contração total para documentar o franzimento na escala validada de rugas glabelares de quatro pontos (Fig. 7.3). Imagens do rosto inteiro frequentemente são usadas; entretanto, a borda superior deve ter seu limite no local da linha capilar anterior (ou no local em que ela existia, em caso de calvície) e a borda inferior frequentemente é posicionada no meio da distância entre a raiz e a ponta do nariz em uma linha horizontal através da margem inferior da eminência malar. A incidência mais próxima fornece mais detalhes do tamanho dos poros, da posição da sobrancelha e da textura da pele. Incidências oblíquas e laterais geralmente não são necessárias.

FIG. 7.3 Glabela. (A) Glabela relaxada; (B) glabela contraída; (C) glabela pós-relaxada; (D) glabela pós-contraída.

Nariz

A margem superior da incidência nasal é essencialmente a mesma que a dos olhos – anteriormente às sobrancelhas. Contudo, a margem inferior se localiza no lábio superior ou entre os lábios fechados. Além das cinco incidências básicas, é incluída uma vista inferior ou com o queixo para cima (Fig. 7.4). As bordas superior e inferior são a linha do couro cabeludo e o mento, respectivamente. Quando ocorre o afrouxamento muscular no dorso ou na espinha nasal, imagens dinâmicas de contração devem ser incluídas.

FIG. 7.4 Nariz. Incidências padrão: (A) anteroposterior; (B) oblíqua direita; (C) lateral direita; (D) oblíqua esquerda; (E) lateral esquerda; e (F) incidência com a cabeça inclinada.

Lábios, sulcos nasolabiais e mento A borda superior se situa em uma linha anteriormente à ponta do nariz e inclui a base das asas do nariz, ao passo que a borda inferior permite a exibição de um pouco da imagem de fundo a seguir do queixo (Fig. 7.5). Os lábios devem estar ligeiramente separados para detectar aspectos na superfície das mucosas próximo à interseção das bordas superior e inferior. Quando são aplicadas injeções nas linhas labiais verticais, a imagem do lábio enrugado ou do músculo orbicular contraído é adicionada. Outras Imagens podem incluir a contração do mento quando toxinas ou materiais de preenchimento estético fizerem parte da intervenção terapêutica.

FIG. 7.5 Lábios, sulcos nasolabiais e mento. Incidência anteroposterior (A) pré e (B) pós-procedimento; oblíqua direita (C) pré e (D) pós-procedimento; lateral direita (E) pré e (F) pós-procedimento; oblíqua esquerda (G) pré e (H) pós-procedimento; lateral esquerda (I) pré e (J) pós-procedimento.

Imagens de oclusão dentária Quando é considerada a realização de cirurgia intraoral ou dos maxilares, as imagens de oclusão dentária são necessárias, devendo ser usados retratores de bochecha.

Orelhas A visualização adequada das orelhas exige que o cabelo seja afastado. As incidências anterior e posterior devem incluir imagens da cabeça inteira e imagens suplementares da faixa intermediária a partir da parte superior do pescoço para anteriormente à crista occipital, para fazer com que a orelha apareça por completo na imagem. As imagens laterais devem incluir a composição de imagens aproximadas, com a altura vertical igual a aproximadamente duas vezes a altura da própria orelha.

Tórax e mamas Variações na configuração do tronco determinam que o princípio de limitar a imagem com base na anatomia regional é fundamental nessas imagens (Fig. 7.6). As bordas verticais devem abranger desde anteriormente à incisura supraesternal no terço inferior do pescoço até a seguir das margens costais médias. Existem três variações básicas no posicionamento dos braços na incidência lateral da mama: (1) braços ao lado; (2) braços nos quadris; e (3) braços atrás da coluna lombar. A mais comum, com base na experiência do autor, é a última. As imagens oblíquas podem ser tomadas nas posições um e dois indicadas acima, ao passo que as incidências AP são ocasionalmente obtidas com os braços posicionados acima da cabeça.

FIG. 7.6 Tórax e mamas. Incidência AP (A) pré e (B) pós-procedimento; oblíqua direita (C) pré e (D) pós-procedimento; lateral

direita (E) pré e (F) pós-procedimento; oblíqua esquerda (G) pré e (H) pós-procedimento; lateral esquerda (I) pré e (J) pósprocedimento.

Parte inferior do tronco, abdome e nádegas As cinco incidências padrão são suplementadas por uma incidência posterior (Figs. 7.7, 7.8). Quando as nádegas forem o foco da imagem, não deve ser usada a calcinha. É essencial usar calcinhas de papel azuis descartáveis para padronizar a vestimenta, o balanço de cores e de branco. Caso fosse feito de outra maneira, a paciente invariavelmente viria para a consulta seguinte com roupas de baixo de cor, textura e contorno diferentes. Além disso, as pacientes às vezes comparecem à consulta apresentando uma linha de bronzeado, no verão. As pernas devem se posicionar ligeiramente separadas para permitir a visualização da virilha contra o fundo claro.

FIG. 7.7 Parte inferior do tronco, abdome e nádegas. Incidências padrão: (A) anteroposterior; (B) oblíqua direita; (C) lateral direita; (D) oblíqua esquerda; (E) lateral esquerda; e (F) incidência posterior.

FIG. 7.8 Parte inferior do tronco, abdome e nádegas. Incidências padrão: (A) anteroposterior; (B) oblíqua direita; (C) lateral direita; (D) oblíqua esquerda; (E) lateral esquerda; e (F) incidência posterior.

As cinco incidências padrão também deverão ser suplementadas por uma incidência posterior (Fig. 7.9). Para uma imagem inteira, a margem superior deve se localizar ao nível do umbigo e a margem inferior, nos dedos dos pés ou no calcanhar, dependendo da incidência. Para a incidência mostrando a metade superior ou inferior, a margem superior ou a inferior deve estar a seguir do joelho ao nível da fossa poplítea inferior ou anteriormente à patela. O fundo fotográfico deve se prolongar para o assoalho, dentro do enquadramento, para a incidência inferior.

FIG. 7.9 (A–D) Membros inferiores. Incidências padrão: (A) anteroposterior; (B) lateral direita; (C) lateral esquerda; e (D) posterior.

Mãos e pés São necessárias incidências completas dorsal e volar. Em alguns pacientes, incidências oblíquas são necessárias, também. Incidências dinâmicas em flexão e extensão constituem um componente essencial do registro médico completo (Fig. 7.10).

FIG. 7.10 (A–G) Mãos.

Incidências especiais Outras regiões da anatomia seguem os mesmos princípios: (1) margens claras de fundo ou anatomia adjacente; (2) incidências AP, lateral e oblíqua; (3) incidências dinâmicas, conforme indicado; e (4) vistas macroscópicas, quando for necessário mostrar aspectos da anatomia.

No hospital e na sala de cirurgia A câmera compacta digital superou amplamente a câmera de filme de 35 mm no setor de emergência ou em trânsito. Os resultados são excelentes e a conveniência é alta. Entretanto, quando o custo não é um problema, muitos cirurgiões preferem câmeras digitais do tipo SLR de enquadramento completo (diagonal de 35 mm) na sala de cirurgia. As luzes da sala de cirurgia variam para cada hospital e até mesmo de uma sala para outra. Os flashes para montagem sobre câmeras de formato grande apresentam qualidade muito superior aos flashes embutidos nas câmeras compactas. Isso permite consistência no balanço de cores, pois a luz ambiente não proporciona a iluminação para a exposição. O uso padronizado do balanço de branco automático sem flash em uma câmera compacta é quase tão bom. O modo de foco macro ou close-up pode pôr a esterilização do campo cirúrgico em risco e é mais problemático. A confiabilidade da exposição automática cria uma imagem com iluminação adequada na sala de cirurgia. A necessidade de uma composição adequada da imagem permanece no ambiente cirúrgico ou no setor de emergência e pode ser desconsiderada entre outras prioridades. Os princípios de enquadramento já discutidos devem ser seguidos até os limites permitidos pelo campo cirúrgico. Marcas anatômicas devem ser incluídas nas bordas do enquadramento. Instrumentos brilhantes, panos cirúrgicos manchados, gaze ou o brilho dos focos

cirúrgicos devem ser eliminados ou tapados. Em geral, a iluminação é forte e deve ser removida do campo para evitar a saturação da imagem.

Arquivamento e gerenciamento de imagens Câmeras Existem muitas fontes excelentes na literatura para discussões sobre fotografia com filme. A era de compostos de prata suspensos em uma emulsão gelatinosa nos filmes fotográficos está encerrada e sobrevive em alguns nichos de mercado, essencialmente fora do campo da cirurgia plástica.17 A fotografia com filme ou analógica teve uma incrível utilização de 160 anos, desde a década de 1840 até ser suplantada pela tecnologia digital, em torno do novo milênio.18 Uma vez que a maioria esmagadora das câmeras são digitais hoje em dia, nós iremos nos concentrar no uso das câmeras digitais. Como nos filmes, as imagens digitais geralmente consistem em filtros vermelhos, verdes e azuis. O filme apresenta emulsões continuamente empilhadas ou películas de cores, ao passo que a tecnologia digital usa variações em um padrão de células em tabuleiro de damas para filtrar a luz. No padrão da Bayer, mais comumente encontrado nas câmeras digitais, cada dois pixels verdes são separados por um pixel vermelho ou azul, enquanto um em cada quatro pixels é vermelho ou azul. Algumas câmeras, como as fabricadas pela Canon, usam um sensor de semicondutor de óxido metálico complementar (CMOS), mas a maioria usa dispositivos de acoplamento carregados (CCDs). No primeiro deles, cada elemento contém seu próprio transistor e circuitos que proporcionam a leitura independente dos dados. Quando os fótons se chocam com um CCD, as cargas se propagam em cada linha do padrão em tabuleiro de xadrez, o que limita a velocidade de propagação. Os CCDs mais recentes apresentam sensores de empilhamento triplo (vermelho, verde e azul, RGB) que diminuem a resolução, mas aumentam a sensibilidade. As câmeras bem projetadas de ambos os tipos são capazes de capturar excelentes imagens. A escolha da câmera digital pode ser assustadora, devido à grande variedade de opções disponíveis. Até mesmo uma simples câmera do tipo apontar e disparar pode tirar boas fotos, em virtude da competição comercial impiedosa entre os fabricantes e à diminuição do custo dos componentes. Contudo, o cirurgião plástico exigirá algo com maior capacidade, se bem que uma câmera digital de 35 mm de grande formato, na realidade, não seja essencial para as fotografias pré e pós-operatórias adequadas no ambiente apropriado. Câmeras de celulares são inadequadas, pois são dispositivos compactos básicos. Câmeras para uso cotidiano ou para moda não são adequadas. Ocorreram “guerras de resolução” nas vendas de câmeras há 10 anos, mas, felizmente isso acabou. A resolução é mais frequentemente usada para descrever quantos pixels estão em um arranjo. Os tamanhos mínimos atualmente são > 3000 × 2000 ou 6 megapixels. Na realidade, a maioria das câmeras têm capacidade ≥10 megapixels. O número de pixels estabelece o limite superior da qualidade da imagem, mas não o limite inferior. Outro padrão importante da resolução é o nível de nitidez de uma imagem, em termos de detalhes finos, geralmente expressos por linhas extremamente pequenas e finas. Essa é uma definição mais funcional, embora menos comumente usada. A categoria das câmeras compactas amadoras geralmente é adequada ao uso diário pelos cirurgiões plásticos, se o gasto adicional com uma câmera digital de padrão semiprofissional ou profissional não estiver dentro de seu orçamento. Diversos recursos estão disponíveis: contagem elevada de pixels, algoritmo avançado para interpretação da imagem que atinge os chips, função de zoom e vídeo são altamente apreciados. Talvez o recurso mais importante seja a qualidade do vidro e o desenho óptico da própria lente. Recursos como velocidade rápida de disparo, geoetiquetas ou abertura muito grande não são tão essenciais no ambiente de tratamento de um paciente. Entretanto, as câmeras compactas são capazes de capturar imagens quase indistinguíveis das obtidas com câmeras de qualidade superior, em um ambiente controlado, como a sala de fotografia de um cirurgião plástico ou a sala de cirurgia. Câmeras de nível semiprofissional possuem muitos recursos de uma câmera digital de reflexo por lente única (dSLR), mas geralmente não têm lentes intercambiáveis, que são um elemento do modelo profissional. Em essência, um cirurgião plástico só precisa de um jogo de lentes equivalentes a 50 mm e 100 mm. O projeto computadorizado avançado das lentes das câmeras tem permitido excelentes características de disparo em câmeras compactas na faixa dos 50 mm e na dos 100 mm, com degradação mínima na qualidade da imagem. Em outras palavras, é possível lidar com câmeras compactas amadoras ou semiprofissionais na maioria das situações. As câmeras dSLR profissionais são maiores, mais pesadas, fabricadas de acordo com especificações precisas,

são resistentes à umidade, ao impacto e são robustas, com sensores de enquadramento completo de 36 × 24 mm que podem, potencialmente, capturar até 25 megapixels em uma imagem. Câmeras de formato médio com 60 megapixels raramente são encontradas ou necessárias em nossa especialidade. Embora muitas câmeras profissionais não tenham recurso de vídeo, quase todas as câmeras amadoras permitem a gravação de vídeos de 30 segundos a 1 minuto. Isso é inteiramente adequado para a documentação das etapas essenciais repetitivas em um procedimento cirúrgico, embora não atinja um padrão cinematográfico.

Formato Armazenamento Cartões digitais de memória são fornecidos em diversos tipos. Os mais comuns são do tipo compact flash, que são grandes, resistentes e encontrados em modelos maiores ou profissionais. Eles são capazes de transferir dados em até 30 Mb/s para vídeo de alta resolução ou HDTV. A resolução pode ser 720p, linhas horizontais com varredura progressiva sem entrelaçamento, 1080i ou 1080p, que contêm 1920 pixels de largura por 1080 de altura, entrelaçados (i) ou com varredura progressiva (p). A varredura progressiva nessa resolução ainda não é comumente encontrada ou tampouco exigida na maioria das situações que não envolve um fotógrafo profissional. Os cartões SD (secure digital cards) são fornecidos em formato regular ou de alta capacidade (SD ou SDHC). Recentemente, modelos de 64 GB e até mesmo de 128 GB foram disponibilizados, com velocidade adequada à captura de vídeo em alta resolução. Os cartões micro-SD geralmente são relegados para câmeras de telefones celulares e armazenamento de dados. Leitores de cartão de memória são facilmente encontrados e são muito baratos, como os cartões de memória. Os dados podem ser carregados para um computador através de um cabo acoplado à câmera, geralmente USB. Contudo, é muito comum remover o cartão, inserir um sobressalente na câmera e ler os dados através do leitor. Com o advento de discos rígidos de múltiplos terabytes, o armazenamento de milhares ou dezenas de milhares de imagens em um computador desktop ou portátil não constitui mais um problema. Contudo, é essencial manter uma programação regular disciplinada de back-ups, de forma similar à adotada em qualquer manutenção de registros, na prática. Pelo menos duas cópias devem ser mantidas no local e outra remotamente para evitar riscos de perda por inundação, incêndio ou terremoto.

Formatos de arquivo Existem dezenas de estruturas ou arquiteturas de dados, também conhecidas como formatos de arquivo. Nós nos concentraremos somente em alguns dos mais comumente usados: tiff, jpg (ou jpeg – de joint photographic experts group), Photoshop, gif e raw. Felizmente, quase todos os aplicativos podem converter um tipo de imagem em outro. Entretanto, é importante entender as vantagens e desvantagens de cada um. TIFF é melhor usado em reprodução por impressão, pois é um formato mapeado por bits (como uma impressora) ou Tag Image File Format. Ele suporta uma profundidade de cor de 24 bits por pixel, com as dimensões e as tabelas de cores “etiquetadas” no cabeçalho do arquivo de dados. A forma pela qual a especificação na etiqueta é escrita gera várias versões de um arquivo TIFF. A compressão sem perda com algoritmo LZW torna a compressão segura para a qualidade dos dados. JPEG (jpg) talvez seja o tipo de arquivo mais comum, mas causa algumas “perdas”. A compressão pode ser escolhida a partir de uma escala de 12 partes desde 0% a 90%, enquanto a qualidade dos dados diminui de acordo. Para a rápida troca de imagens por e-mail, é o formato ideal. A compressão mínima mantém quase a fidelidade da imagem original. Quase todo software é capaz de ler facilmente esse formato e, devido à grande extensão em termos de armazenamento, ele traz grande flexibilidade. Photoshop é um formato patenteado da Adobe Systems Corporation, de San Jose, Califórnia, mas é tão comumente usado que quase se tornou um padrão. Gerenciamento de cores, cores e camadas de 48 bits são suportados. O sufixo do arquivo é “.psd”. O formato raw varia de câmera para câmera, pois ele depende da interface do equipamento com o chip de captura de luz (CCD ou CMOS) no interior da câmera. Essa é a imagem mais real, pois não ocorre equilíbrio de branco, processamento de cores, compressão, compensação de perda de nitidez ou outra manipulação de dados. Uma vez que os dados não sofrem processamento, as velocidades de captura podem ser muito mais rápidas, com maior rendimento.

O vídeo, infelizmente, está infestado de numerosos padrões incompatíveis. Até mesmo formatos de arquivo com sufixos idênticos podem ser ilegíveis por outro software ou equipamento; por exemplo, os formatos de arquivos mp3 ou mp4 frequentemente não são legíveis, a menos que o software original que criou o arquivo esteja disponível. É necessário um codec (codificador-decodificador) de software e, frequentemente, não há plataforma cruzada para computadores PC ou Mac. Essa discussão rigorosa aguarda outro contexto. O formato “.mov” (QuickTime) da Apple para vídeo é muito popular, assim como o “.wmv” (Windows Media Video), da Microsoft. Outros tipos de arquivos avançados podem ser usados. Na internet, o formato “.flv” (Adobe Flash Video) da Adobe é muito usado, principalmente no YouTube, onde milhões de vídeos são publicados.

Atributos de imagem, metadados e recuperação À medida que as imagens são transferidas com segurança para as mídias de armazenamento, novas informações essenciais devem ser vinculadas aos dados. As câmeras atuais usam um formato denominado EXIF para registrar o tipo de câmera, lente, data, hora, obturador, abertura e muitos outros itens. Ainda mais fundamental para a cirurgia plástica são informações como idade, sexo e peso do paciente, códigos de diagnóstico ICD9, códigos cirúrgicos CPT, tipo de implante usado, condição pré ou pós-operatória, data da cirurgia original e outros dados médicos essenciais. Essas informações são patenteadas por cada pacote de software e dificultam a mudança de plataforma após poucos meses ou um ano de uso. Os campos dos dados geralmente são armazenados no formato padrão Microsoft Access ou SQL Server. O que em uma época era um exercício trabalhoso e difícil agora é algo transparente e fácil, por meio de projetos aperfeiçoados de interface de software. Existem várias empresas em nossa especialidade (NexTech, em Tampa, na Flórida; Canfield Imaging Systems, em Fairfield, Nova Jérsei; Crisalix, em Lausanne, na Suíça) especializadas na criação e armazenamento de dados de imagem, simulação de resultados cirúrgicos e manejo do paciente. O Health Insurance Portability and Accountability Act of 1996 (PL 104–91) (Decreto de portabilidade e responsabilidade de segurança de saúde de 1996) foi aprovado em 1996, acarretando uma maior ênfase na privacidade do paciente, dentre outras preocupações. No Título II, uma das cinco regras é conhecida como a Regra de privacidade, em vigor desde 14 de abril de 2003, perante o Decreto principal. Uma de suas principais funções é regulamentar o uso e a revelação das informações de saúde protegidas (PHI). A ampla interpretação dessa lei inclui qualquer parte do registro médico. O American Recovery and Reinvestment Act de 2009 estendeu a privacidade e a cláusula de segurança da HIPAA para os sócios das entidades cobertas e fornece duras penalidades civis e criminais por violação. Cláusulas adicionais cobrem registros eletrônicos de saúde (EHR) e a conformidade no mais tardar em 1 de janeiro de 2013. A perda ou disseminação de imagens digitais pode ser muito mais séria que a de filmes fotográficos, com o risco dos dados eletrônicos se espalharem pela internet como um vírus para milhares ou até mesmo milhões de pessoas.

Processamento de imagem digital Medição e análise A cirurgia ortognática tem se baseado nos princípios da medição e análise de imagem desde os primeiros dias da fotografia com filme. As medições eram feitas diretamente em fotografias ou transparências e levadas à sala de cirurgia para orientar as osteotomias. Atualmente, essas medições podem ser feitas diretamente na imagem digital. Um modelo bem desenvolvido de reparo de fissura labial foi incorporado ao programa de treinamento em uma grande organização de caridade internacional antes que os cirurgiões viajassem ao exterior em trabalho missionário. A identificação e o realce das marcas anatômicas para o registro médico na cirurgia de aumento de mamas cada vez mais tem feito parte da consulta pré-operatória.19 É o primeiro passo para a construção de um modelo preditivo para o planejamento de dissecção da bolsa, da escolha do tamanho do implante, da avaliação do tamanho pós-operatório e pode acarretar, com o tempo, índices de reoperação reduzidos.

Planejamento e simulação O termo simulação cirúrgica tem sido amplamente definido para incluir qualquer coisa, desde tutoriais orientados por computador até aprendizado interativo em simulações de cirurgia com feedback háptico e para

eliminar complicações inesperadas.20 O planejamento cirúrgico é mais fácil de ser realizado, exige menos uso do computador e de complexidade em pré-programação. A medicina organizada foi desafiada pelo Institute of Medicine Report (Instituto de Relatórios Médicos), Errar é Humano: Construir um Sistema de Saúde mais Seguro, em 2000.21 Estima-se que 44.000 mortes ocorram anualmente em decorrência de erros médicos, o que constitui a sétima causa de morte. Muitas dessas mortes ocorrem durante a cirurgia, como resultado do planejamento cirúrgico ou dos cuidados pós-operatórios. O planejamento da cirurgia por computador geralmente está disponível na cirurgia plástica, fornecido por empresas comerciais (NexTech, Canfield, and Crisalix); contudo, os sistemas mais elaborados usando manequins são raros.

O futuro Imagens tridimensionais A tecnologia 3D começou quase ao mesmo tempo em que a própria fotografia, quando David Brewster inventou o Estereoscópio, em 1844. Ele foi refinado por Louis Jules Duboscq ao tirar uma fotografia da Rainha Vitória e exibi-la na Grande Exposição de 1851, tornando-se bastante conhecida no mundo inteiro. As câmeras estereoscópicas começaram a se constituir ferramentas mais comuns, mesmo para uso pessoal, até a Segunda Guerra Mundial. Várias técnicas comerciais para a visualização 3D em filmes foram desenvolvidas posteriormente, desde “Natural Vision”, na década de 1950; “Space-vision”, na década de 1960; “Stereovision”, nos anos 1970; óculos polarizados na década de 1980, e, na década de 1990, a tecnologia 3D IMAX, até o mais recente crescimento de filmes 3D, que culminou com o lançamento do filme Avatar, em 2010. O raio X, descoberto pelo Dr. Roentgen em 1895, causou uma sensação no mundo médico, ao permitir que os médicos vissem através do corpo humano sem cirurgia. O aperfeiçoamento impactante seguinte na área de imagens médicas ocorreu em 1972, com o desenvolvimento da tomografia computadorizada (TC) em 3D, que emprega tomografia criada por processamento computadorizado. A tecnologia de imagens 3D aumenta tremendamente a precisão cirúrgica. Antigamente, os médicos tinham de imaginar a imagem 3D do corpo humano enquanto estudavam delineamentos planos ou imagens 2D. Graças à visualização volumétrica das imagens, os médicos podem, atualmente, visualizar as estruturas internas e aperfeiçoar o diagnóstico. Nos procedimentos médicos tradicionais, o diagnóstico, o tratamento e o resultado são normalmente julgados por critérios objetivos. Os sentimentos subjetivos do paciente são relevantes, mas de natureza secundária. Na cirurgia plástica, por outro lado, o modelo de assistência médica geralmente se baseia em bemestar e melhora, o paciente não está doente e, portanto, o diagnóstico, o tratamento e o resultado podem ser orientados pela avaliação subjetiva do paciente de um procedimento cirúrgico eletivo. Consequentemente, até mesmo o procedimento cirúrgico mais tecnicamente perfeito pode causar insatisfação ao paciente, caso o resultado não atenda às expectativas estéticas e psicológicas. O não cumprimento dessas expectativas pode ocasionar a necessidade de uma nova cirurgia, aumento do risco médico-legal e custos adicionais diretamente ao cirurgião. Além disso, a dinâmica de mercado da cirurgia cosmética é fortemente orientada por indicações dos pacientes, que, uma vez mais, são baseadas na satisfação dos mesmos. Por exemplo, na cirurgia de aumento das mamas, pode ser vantajoso que a paciente esteja envolvida de forma cooperativa no processo da seleção do implante, com o suporte da equipe cirúrgica e que ela concorde com o processo de seleção com entusiasmo, confiança e convicção. Um dos principais motivos da realização de uma cirurgia plástica é mudar a aparência externa do paciente; uma pergunta central que todos os pacientes têm em comum é “qual será minha aparência depois da operação”? Uma maneira de responder é através das imagens em 3D.22 Atualmente, a tecnologia 3D de análise de elementos finitos (AEF), baseada na física, pode fornecer aos pacientes uma imagem simulada de sua anatomia em uma condição pós-operatória. Embora outros métodos mostrem ao paciente um provável resultado como : sutiãs especiais e enchimentos, exibição de slides por computador de várias fotografias antes/depois de casos anteriores, fotografias de revistas e de software de computação gráfica com base em fotografias, todos têm limitações. Todos esses métodos requerem uma imaginação realista por parte do paciente. A tecnologia mais atual permite que os pacientes vejam a si mesmos de vários ângulos em 3D antes da operação, aumentando a comunicação com o cirurgião ao interagirem de forma colaborativa com a imagem e simulando o resultado do procedimento cirúrgico. As técnicas para modelagem 3D incluem, de um lado, equipamentos de escaneamento com limitação de

espaço e sensibilidade obsoleta e, de outro lado, equipamentos baseados na reconstrução física do corpo a partir de fotografias 2D. Os primeiros exigem um grande investimento antecipado, amortizado com o passar do tempo. Os segundos funcionam com base em gastos realizados no momento do uso e têm a vantagem de serem de fácil utilização, com interferência mínima na maneira pela qual o cirurgião realiza a consulta. Quando não é necessário nenhum equipamento especial, as fotografias são acopladas a medições anatômicas e a processamento e simulação de dados com base fisiológica. Qualquer que seja a técnica empregada, 3D e realidade virtual são o futuro.23-26

Vídeo Muito do que tem sido comentado sobre a tecnologia 3D pode abordar registros médicos de vídeo, além dos aspectos de simulação. Os filmes têm feito parte da medicina por várias décadas para educação cirúrgica, ao passo que vídeos digitais como parte de um registro médico constituem uma inovação muito recente e em evolução, não sendo, ainda, um padrão de atendimento. Quase toda câmera digital moderna possui o recurso de captura de vídeo em clipes de curta duração. Entretanto, as lentes não são especificamente projetadas para proporcionar qualidade profissional em casos nos quais é exigido equipamento sofisticado e caro e muito mais potência e capacidade computacional são obrigatórias. A criação e o uso de rotina de um vídeo detalhado estão além do escopo da maioria dos cirurgiões plásticos atarefados, exceto em circunstâncias especiais, com consultores externos. Esse uso obriga um compromisso com valores de produção, edição, composição e muitas outras habilidades possuídas pelo videógrafo médico profissional. Vídeos de curta duração (menos de 1 minuto) podem documentar características como amplitude de movimento, força e tônus, elasticidade e mesmo contornos em movimento. Entretanto, longas composições exigem direção, videografia e edição por especialistas. O futuro certamente incorporará cada vez mais os vídeos digitais na prática da cirurgia plástica. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  1. Reed, M. E., Feingold, S. G. Ethical consideration. In: Nelson G.D., Krause J.L., eds. Clinical photography in plastic surgery. Boston: Little, Brown; 1988:129–153. 3. Chávez, A. E., Dagum, P., Koch, R. J., et al. Legal issues of computer imaging in plastic surgery: a primer. Plast Reconstr Surg.. 1997; 100(6):1601–1608. A simulação clínica adiciona uma nova dimensão à consulta do paciente. Embora preocupações jurídicas acompanhem esta tecnologia (como o potencial de se entrar em um “contrato deduzido”), o médico astuto pode responsabilizar o emprego desta tecnologia e minimizar o risco jurídico.

4. Mirror Image Software Suite, Canfield Imaging Systems, 253 Passaic Avenue, Fairfield, NJ 07004-02524 USA. “Mirror” é um aplicativo de imagens médicas poderoso e de fácil utilização. Capaz de realizar tarefas, desde manipulação de imagem até a funcionalidade de banco de dados. 8. Parker, W. L., Czerwinski, M., Sinno, H., et al. Objective interpretation of surgical outcomes: is there a need for standardizing digital images in the plastic surgery literature? Plast Reconstr Surg. 2007; 120(5):1419–1423. 11. Zarem, H. A. Standards of Photography. Plast Reconstr Surg. 1984; 74:137–144. 13. Galdino, G. M., Vogel, J. E., Vander Kolk, C. A. Standardizing digital photography: it’s not all in the eye of the beholder. Plast Reconstr Surg. 2001; 108(5):1334–1344. São consideradas as complicações para selecionar uma câmera digital ideal para fotografias de pacientes.

14. DiBernardo, B. E., Adams, R. L., Krause, J., et al. Photographic standards in plastic surgery. Plast Reconstr Surg. 1998; 102(2):559–568. 15. Plastic Surgery Educational Foundation/Clinical Photography Committee. Photographic standards in plastic surgery. Arlington Heights: Plastic Surgery Educational Foundation, Clinical Photography Committee; 1991. É apresentado um guia muito prático para a obtenção de fotografias de pacientes de alta qualidade e padronizadas. Um arquivo compacto em PDF é disponibilizado para download. 23. Smith, D. M., Oliker, A., Carter, C. R., et al. A virtual reality atlas of craniofacial anatomy. Plast Reconstr Surg. 2007; 120(6):1641–1646. É descrito um modelo de computação em 3D interativo da anatomia craniofacial. São discutidos métodos de criação e aplicações futuras.

26. Smith, D. M., Aston, S. J., Cutting, C. B., et al. Applications of virtual reality in aesthetic surgery. Plast

Reconstr Surg. 2005; 116(3):898–906.

8

Segurança do paciente na cirurgia plástica Bruce Halperin

Resumo A medicina moderna tem reduzido drasticamente o risco de cirurgia. A identificação de quais pacientes apresentam maior risco na cirurgia inicia o processo de redução de risco. A identificação de fatores médicos que acarretam complicações auxilia na prevenção de resultados desfavoráveis. Cuidados especiais para o paciente de lipoaspiração. Cuidados especiais com o paciente submetido à cirurgia estética facial. Evitando incêndio na sala de cirurgia. Sistemas com base em protocolo para redução de risco. Redução do risco do paciente através da otimização dos cuidados ao paciente. Faça melhor, faça com mais segurança.

O risco de ser submetido à cirurgia A decisão de realizar uma cirurgia para a correção de um defeito ou de uma condição clínica dá origem a uma série de tomadas de decisões e, por necessidade, uma série de compromissos. É o desejo subjacente do profissional médico de prolongar e melhorar a vida dos pacientes que procuram atenção. Desde o início da prática da medicina, sabe-se que resultados indesejáveis podem ocorrer. A aceitação pelo paciente de um resultado indesejado foi mudando através do curso da história médica. Com o progresso da ciência médica, as expectativas dos pacientes e dos profissionais de medicina foram crescendo. Como a ciência médica entende os níveis cada vez mais crescentes da complexidade biológica humana, o resultado esperado das intervenções médicas pode mudar novamente. Ainda não está clara para o médico e para o público a causa fundamental de resultados médicos indesejáveis. É claro que muitos dos resultados indesejáveis que vemos atualmente são resultantes de falha na implementação do conhecimento que já possuímos. Devemos questionar ainda mais se é o nosso sistema de saúde de fato o responsável por muitos resultados indesejáveis com que nossos pacientes se deparam. Quando decidimos realizar um procedimento cirúrgico, aceitamos o risco da ocorrência de resultados indesejáveis. Utilizando o conhecimento de estudos científicos, selecionamos o que acreditamos ser o “melhor ” caminho para a resolução das condições do paciente. A pergunta em nossas mentes deve sempre ser: Qual é o “melhor ” caminho neste caso cirúrgico em particular? Antes da introdução da anestesia, a experiência cirúrgica era decididamente desagradável para o paciente. O sucesso de um procedimento cirúrgico (leia-se: sobrevida) se baseava na velocidade de execução do procedimento. Pelo menos, a introdução de técnicas anestésicas trouxe a capacidade da equipe cirúrgica em levar mais tempo para a realização do procedimento. A introdução de uma intervenção médica adicional (anestesia) ao paciente trouxe efeitos indesejáveis adicionais e morte perioperatória.1,2 Desde a introdução da anestesia geral e regional como parte da prática cirúrgica normal, a frequência de complicações cirúrgicas e anestésicas foi analisada por meio de uma variedade de critérios clínicos. Esta ampla variedade de critérios

acarretou confusão na literatura médica e na mente dos clínicos acerca do risco real atribuível aos cuidados anestésicos durante uma intervenção cirúrgica. Devemos considerar nosso índice de complicações apenas eventos que ocorram durante o procedimento cirúrgico real? Devemos considerar apenas eventos atribuídos à aplicação da anestesia ou devemos considerar a contribuição da cirurgia ao resultado desfavorável?3 O período de tempo para a avaliação de complicações cirúrgicas e anestésicas permanece controverso e quase certamente está relacionado com a natureza do procedimento cirúrgico e do tipo de anestesia, caso esta tenha sido utilizada durante a cirurgia. A ampla variedade de índices de tempo que são usados na literatura médica para o estudo de complicações perioperatórias torna a comparação dos estudos muito difícil. As definições de períodos de tempo para o estudo da mortalidade perioperatória variam de 48 horas, como definido pela Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations, até 30 dias, conforme definido pela American College of Surgeons. De forma semelhante, a incapacidade de comparar estudos clínicos se soma à confusão em definir o risco clínico para o paciente a partir de uma dada técnica cirúrgica ou anestésica. Para o risco anestésico, necessitamos considerar não apenas os casos onde a anestesia é considerada a única causa de complicação e mortalidade, mas também casos onde a anestesia é um fator de contribuição significativa de complicações e mortalidade. Torna-se extremamente difícil, mesmo com a revisão do extenso corpo de literatura médica, prever com precisão o risco para um dado paciente que está prestes a ser submetido a qualquer procedimento cirúrgico. Podemos, com segurança, afirmar que complicações da anestesia têm sido bastante reduzidas desde a aceitação disseminada de técnicas anestésicas. Beecher e Todd publicaram em 1954 que, se por um lado a anestesia era um fator de contribuição muito importante, o índice de mortalidade foi de 1:1.560 cirurgias.4 Hoje em dia, os pacientes querem conhecer a atual tecnologia de ponta da ciência médica em relação ao risco e à complicação perioperatória. Uma das maneiras mais úteis e populares para avaliar o risco na população de pacientes cirúrgicos é pelo estado físico da American Society of Anesthesiologists (ASA). Esse sistema de classificação foi originalmente idealizado no início da década de 1940 e atualizado em 1961 (Tabela 8.1). Tabela 8.1 Classificação da ASA ASA I

Paciente saudável sem doença ativa

ASA II

Paciente com doença sistêmica leve (p. ex., hipertensão sob controle médico)

ASA III

Paciente com doença sistêmica grave

ASA IV

Paciente com doença sistêmica grave que constitui constante ameaça à vida

ASA V

Paciente moribundo e ausência de expectativa de sobrevivência sem a cirurgia

ASA VI

Paciente declarado com morte cerebral para doação de órgãos

ASA, American Society of Anesthesiologists.

Tem sido demonstrado que o sistema de classificação ASA está correlacionado com o resultado cirúrgico e anestésico.5 O estudo de Lagasse5 concluiu que a incidência de mortalidade relacionada com a anestesia, em até 48 horas após a cirurgia, foi de 1:13.000 procedimentos, quando avaliados todos os pacientes que se submeteram a um procedimento cirúrgico. De grande interesse, mas de pouca surpresa para o anestesiologista, foi o fato que as mortes relacionadas com a anestesia aumentaram com o aumento da classificação ASA. Outros relatórios datados de 1987 relatam taxas de mortalidade relacionadas com a anestesia de 1:185.000.6 O estudo realizado por Buck et al.6 foi realizado antes da aceitação disseminada dos sistemas de monitoramento com nova tecnologia (oxímetro de pulso e capnografia) que servem como sistemas de aviso precoce para o comprometimento respiratório. Estudos mais recentes têm mostrado resultados de segurança ainda melhores para os pacientes submetidos à cirurgia. Um estudo de 2004 realizado na França mostrou novamente que índices de mortalidade aumentaram com o aumento do estado ASA do paciente, a uma taxa de quatro mortes por milhão de cirurgias em pacientes ASA categoria I e com 554 mortes por milhão em pacientes ASA categoria IV.7 O efeito do progresso médico no resultado clínico melhorado é frequentemente difícil de detectar quando a incidência de ocorrência adversa é infrequente. Alterações significativas na prática diária da anestesia começaram em meados da década de 1980, com a introdução do padrão de prática de Harvard I (Harvard Standards of Practice I) – monitoramento mínimo. Esses padrões de anestesia exigiram o uso de dispositivos de monitoramento para detectar e prevenir desastres iminentes durante a cirurgia.8 Os padrões ASA de 1986 para

monitoramento intraoperatório básico encorajam a capnografia e o oxímetro de pulso durante a conduta anestésica e cirúrgica. A incidência dos índices de acidentes e morte em pacientes ASA estado I e II foi estudado antes e depois da adoção dos novos padrões de monitoramento em hospitais de Harvard (Tabela 8.2). A implementação desses padrões, juntamente com a introdução de novas técnicas de monitoramento, tem reduzido acentuadamente a incidência de hipoventilação e hipoxemia não reconhecidas que acarretam complicações intraoperatórias e morte.9-11 Tabela 8.2 Incidência de complicações anestésicas intraoperatórias Datas

Pacientes com status ASA I e II (n) Acidentes intraoperatórios (n)/ incidência Morte (n)/incidência

1/1976-6/1985 757.000

10

1/75.700

5

1/151.400

7/1988-6/1988 244.000

1

1/244.000

0

0/244.000

Padrões de monitoramento instituídos em 07/1985, ASA, American Society of Anesthesiologists.

As implicações desses achados para a prática clínica atual na sala de cirurgia são claras. Equipamentos de monitoramento para eletrocardiograma, pressão arterial, oxímetro de pulso, capnografia, concentração de oxigênio inspirado em máquinas de anestesia e temperatura devem estar disponíveis na sala de cirurgia, funcionando e sendo usados em todas as situações apropriadas. O uso adequado de dispositivos de monitoramento durante a cirurgia melhora a segurança. O não funcionamento do equipamento de monitoramento adia a cirurgia. A experiência obtida a partir da cirurgia hospitalar e os avanços nos cuidados médicos têm permitido o desenvolvimento da cirurgia ambulatorial. Dados recentes mostram que mais de 60% das cirurgias em hospitais de comunidade em 2005 foram realizadas em ambulatório.12 É quase certo que a percentagem de pacientes submetidos à cirurgia cosmética e de reconstrução em base ambulatorial é ainda maior. Em meados da década de 1970 havia dois centros de cirurgia ambulatoriais independentes nos EUA. Atualmente, existem mais de 5.000. O sucesso de cirurgias ambulatoriais realizadas fora de uma sala de cirurgia hospitalar se baseia no menor custo desses centros para cumprir com segurança as necessidades médicas do paciente e da equipe médica. Tem sido mostrado repetidamente que a cirurgia ambulatorial pode ser realizada com um padrão de segurança equivalente ou superior ao disponível em um ambiente hospitalar. A variedade de ambientes para a realização de cirurgias continua a se expandir com o desenvolvimento das instalações cirúrgicas em consultórios.13 A American Society of Plastic Surgery, através do comitê de segurança do paciente, publicou uma série extraordinária de artigos resumindo os princípios para segurança em cirurgia ambulatorial.14 Esses relatórios, baseados na literatura médica e em combinação com os princípios gerais descritos acima, estabeleceram uma diretriz educacional para a conduta da cirurgia plástica ambulatorial. Uma área importante de preocupação para o cirurgião plástico é a seleção do paciente para cirurgia e se a cirurgia será realizada ou não em ambiente ambulatorial. Descrevemos anteriormente os dados que demonstram que as complicações aumentam com o aumento no estado ASA do paciente. A estratificação prospectiva de 17.638 pacientes por idade constatou que pacientes acima de 65 anos de idade apresentavam uma probabilidade 1,4 vezes maior de sofrer um evento intraoperatório adverso e o dobro da probabilidade de apresentar um evento cardiovascular intraoperatório que pacientes abaixo de 65 anos de idade.15

Pacientes obesos/Pacientes com apneia do sono submetidos à cirurgia plástica Múltiplos estudos têm demonstrado um aumento no risco perioperatório associado à obesidade. As complicações durante a cirurgia associadas à obesidade do paciente incluem taxas elevadas de falha na anestesia regional, internações hospitalares não planejadas e um aumento na incidência de trombose venosa profunda.16 É também irracional esperar que os profissionais de saúde sejam capazes de tratar o paciente obeso fisicamente sem a assistência de outros cuidadores de saúde. A menos que um centro ambulatorial esteja preparado para dar a ajuda que o paciente obeso irá necessitar, o paciente deverá ser operado em uma instituição com equipe necessária disponível. O estabelecimento de um limite de peso para o paciente baseado

na capacidade da equipe para tratar o paciente evita situações desconfortáveis quando o paciente chega para a cirurgia e a instituição é incapaz de cuidar dele. O planejamento adequado das instalações cirúrgicas reduz os cancelamentos cirúrgicos. Os pacientes obesos apresentam uma maior incidência de apneia do sono que pacientes de compleição corporal normal. As características físicas que predispõem os pacientes a apresentarem apneia do sono obstrutiva incluem índice de massa corporal superior a 35, a circunferência do pescoço de 17 polegadas (43 cm) em homens ou 16 polegadas (41 cm) em mulheres, anormalidades craniofaciais afetando as vias aéreas, obstrução nasal e hipertrofia da amígdala.17 O relatório de 2006 da força-tarefa da ASA sobre o manejo perioperatório de pacientes com apneia do sono obstrutiva é uma referência valiosa para a conduta de cuidados dessa classificação de pacientes.17 A gravidade da apneia do sono, conforme determinada por um estudo formal do sono, é observada na Tabela 8.3. A intensidade da depressão da saturação do oxigênio durante eventos de apneia e o número de eventos apneicos por hora devem ser considerados na avaliação do paciente para cirurgia. Tabela 8.3 Critérios para determinação da gravidade da apneia do sono após estudo do sono Gravidade da apneia do sono obstrutiva Índice de apneia-hipopneia do adulto Índice de apneia-hipopneia pediátrica Nenhuma

0-5

0

Leve

6-20

1-5

Moderada

21-40

6-10

Grave

> 40

>10

O tratamento clínico perioperatório adequado de pacientes com apneia do sono é de importância fundamental. O tratamento das vias aéreas do paciente obeso, com ou sem apneia do sono, pode ser difícil. A avaliação cuidadosa das vias aéreas no período pré-operatório com observação da abertura da boca, distância mento-hióidea, complacência submandibular, amplitude de movimento da coluna cervical e a escala de Mallampati podem indicar dificuldades potenciais à manutenção das vias aéreas e intubação.18 A atual conduta anestésica para pacientes que apresentem apneia do sono e submetidos à cirurgia plástica depende de muitos fatores. Certamente, o tipo de cirurgia, a gravidade da doença das vias aéreas e o desejo do paciente são os principais componentes no processo da tomada de decisão. A necessidade de intubação ou manipulação das vias aéreas durante a cirurgia não deve ser um critério de exclusão automático para a cirurgia em ambulatório em um paciente com história de apneia do sono. Os pacientes selecionados adequadamente com uma história de apneia do sono que são observados e monitorados por períodos de tempo prolongados após a cirurgia podem ser bem-sucedidos em ambiente ambulatorial. Pacientes com apneia do sono necessitando de grandes volumes de narcóticos ou sedativos pós-operatórios e aqueles que notadamente apresentam diminuição dos níveis de saturação de oxigênio no ar ambiente ou ventilação inadequada necessitarão de internação e monitoramento contínuo em um ambiente de tratamento intensivo. O monitoramento do paciente de apneia do sono após a cirurgia e após a internação hospitalar inclui a saturação contínua de oxigênio. O monitoramento dos níveis de saturação de oxigênio a cada 4-6 horas não faz sentido, pois eventos de apneia obstrutiva são mais prováveis após a cirurgia, podendo ocorrer lesão cerebral hipóxica em questão de minutos. Além disso, pode não ser aconselhável tentar completar um procedimento cirúrgico em um paciente com apneia do sono utilizando anestesia local com níveis profundos de sedação. Medicamentos comumente utilizados para sedação durante a cirurgia, incluindo narcóticos e benzodiazepínicos, podem exacerbar episódios apneicos acarretando hipóxia e hipoventilação. A realização de procedimentos em um paciente com apneia do sono, estando o paciente em posição pronada e com acesso limitado às vias aéreas, pode ser particularmente arriscado. Frequentemente, é difícil monitorar com precisão a ventilação em um paciente não intubado. Novas tecnologias para detectar hipoventilação precisam ser desenvolvidas para monitorar a ventilação com precisão em pacientes com as vias aéreas não controladas. O desenvolvimento do CO2 arterial contínuo utilizando um formato não invasivo melhorará ainda mais a segurança do paciente durante a cirurgia.19 Pacientes utilizando a pressão positiva contínua das vias aéreas (CPAP) como modalidade terapêutica para apneia do sono devem ser instruídos a trazer o equipamento CPAP para o centro cirúrgico. O centro deve ter um profissional capacitado para o uso do equipamento de CPAP disponível para dar assistência nos cuidados respiratórios do paciente. De forma similar, pacientes que utilizam o CPAP em casa devem usar seus

CPAPs enquanto estiverem em repouso ou dormindo no hospital. Apesar da atenção cuidadosa à avaliação das vias aéreas, a experiência clínica e estudos prospectivos têm demonstrado uma capacidade relativamente pequena do médico em prever quais pacientes terão vias aéreas difíceis. Mais de 3% dos pacientes considerados como tendo vias aéreas normais podem apresentar dificuldade com a intubação. As implicações de nossa incapacidade em prever quais pacientes apresentarão vias aéreas difíceis incluem a necessidade de fazer uma seleção extensa das ferramentas de manejo de vias aéreas disponíveis no ambiente cirúrgico, onde as complicações das vias aéreas podem surgir. Em adição ao arranjo tradicional do laringoscópio e lâminas, vias aéreas e tubos endotraqueais de vários tamanhos, surge a necessidade de laringoscópios de fibra óptica, vias aéreas de máscara laríngea e de profissionais que possam prontamente utilizar essas ferramentas. Tecnologias mais recentes, incluindo videolaringoscópios, devem estar disponíveis para esses profissionais treinados nessas técnicas. Não é uma questão de quanto equipamento você pode comprar, mas que equipamento você está capacitado a usar durante uma emergência para estabelecer uma via aérea. Cada instalação cirúrgica deve ser capaz de realizar uma cirurgia de vias aéreas (traqueostomia) no caso raro de falha no manejo da via aérea. A análise de grandes bancos de dados avaliando a segurança da cirurgia mostrou que a cirurgia e a anestesia são muito seguras. O risco de anestesia como causa de morte em pacientes na categoria ASA I e ASA II está na faixa de 1:150.000 - 1:300.000 pacientes.20,21 Portanto, não deve ser surpresa quando publicações médicas forem apresentadas com uma pequena série de pacientes submetidos à cirurgia ambulatorial em um centro cirúrgico de um consultório mostrando que os índices de complicação e morte relatados são muito baixos.22 Em um estudo sobre cirurgias em consultório, 84,3% dos pacientes eram ASA classe I, 15,6% ASA classe II e apenas 0,1% ASA classe III. Seria necessária uma coleta de dados muito grande de pacientes ASA I e II para fornecer evidências de risco elevado ou um resultado melhor em uma instalação cirúrgica em particular ou utilizando uma técnica anestésica específica neste subgrupo de pacientes. Publicações similares têm documentado os níveis de segurança mais elevados no ambiente cirúrgico de consultório utilizando anestesia geral. Hoefflin et al. publicaram uma série de 23.000 pacientes cirúrgicos consecutivos por um período de 18 anos. As vantagens da anestesia geral com controle de vias aéreas durante a cirurgia também são apresentadas.23 Além disso, devido à incidência relativamente baixa de complicações nessa população de pacientes e ao pequeno número de pacientes estudados, será difícil mostrar alterações estatisticamente significativas nos índices de complicações clínicas. O estudo da American Association for Accreditation of Ambulatory Surgery Facilities englobando 400.675 pacientes concluiu que a segurança do paciente em instalações cirúrgicas em consultório credenciado foi equivalente ou superior ao nível de segurança de cirurgia hospitalar.24 Como esses artigos propõem, existem benefícios tangíveis nas cirurgias em consultório, incluindo a contenção de custo, conveniência e facilidade de agendamento. Há poucas dúvidas de que os pacientes prefiram o ambiente mais silencioso e agradável do centro cirúrgico do consultório/ambulatório que o agitado ambiente hospitalar. O ambiente cirúrgico de consultório/ambulatório pode fornecer um ambiente cirúrgico excelente para o paciente, para o médico e para a equipe, contanto que a qualidade dos cuidados iguale ou supere a de um hospital de serviços completos, em todos os aspectos.

Manejo intraoperatório do paciente de cirurgia plástica A literatura médica e as publicações não revisadas por pares exaltam as virtudes de várias técnicas anestésicas para cirurgia plástica, particularmente a cirurgia estética. O público em geral gostaria de acreditar que uma técnica anestésica menos invasiva e aparentemente mais simples será mais segura. Médicos que não tenham conhecimento da literatura médica podem contribuir para essa concepção errônea. Como temos observado em caso de pacientes com apneia do sono, a anestesia local com níveis profundos de sedação pode não ser uma escolha anestésica adequada e pode colocar o paciente em risco substancial de comprometimento das vias aéreas. Tanto a anestesia local como a anestesia geral produzem uma incidência similar de complicações em pacientes submetidos a cirurgia oral ambulatorial.25,26 A análise de queixas judiciais sigilosas de 2006 do banco de dados da ASA Closed Claims demonstrou que, com relação à incidência da técnica anestésica, a morte durante os cuidados anestésicos e anestesia geral monitorados foi duas vezes maior que em pacientes submetidos a anestesia regional.27 A principal complicação acarretando a morte nesse estudo foi a oxigenação e ventilação inadequadas. Nesse estudo das queixas judiciais sigilosas, descobriu-se que ocorreu insuficiência respiratória em 15% dos pacientes que tiveram cuidados anestésicos monitorados em comparação com 7% de pacientes submetidos à anestesia geral. Outros fatores nesse grupo, como a idade do paciente e a classificação

ASA, podem ter contribuído para os achados. Estudos randomizados comparando técnicas anestésicas para um procedimento cirúrgico específico devem ser realizados antes que se declare um vencedor na categoria de técnica anestésica para a segurança do paciente. Populações muito grandes de pacientes precisarão ser avaliadas para que sejam tiradas conclusões adequadas. Algumas técnicas anestésicas utilizadas durante a cirurgia parecem ter sido pouco avaliadas quanto a possíveis complicações. A anestesia epidural em pacientes submetidos à lipoaspiração parece expor o paciente a grandes doses de anestésico local quando utilizados, tanto no fornecimento do anestésico epidural quanto como um componente da solução tumescente. A vasodilatação pelo bloqueio anestésico regional do sistema nervoso simpático parece conflitar com a aplicação de soluções diluídas de epinefrina para vasoconstrição durante a lipoaspiração. Além disso, a sedação intensa de um paciente em posição pronada com um nível elevado de dermátomos de anestésicos regionais parece desaconselhável para pacientes submetidos à lipoaspiração, devido às preocupações com o comprometimento das vias aéreas e com insuficiência respiratória. Apesar dessas considerações, numerosas publicações têm defendido o uso da anestesia regional nessa situação. Um esquema anestésico bem planejado, coordenado com o cirurgião e a equipe da sala de cirurgia, se somará à segurança do paciente. Os avanços na tecnologia e na prática médica têm permitido o desenvolvimento da realização de cirurgias ambulatoriais tanto em um centro cirúrgico independente quanto em um ambiente cirúrgico de um consultório médico. A American Society of Plastic Surgery criou uma força-tarefa sobre segurança do paciente em instalações cirúrgicas em consultórios e publicou um manifesto da força-tarefa.28 Esse manifesto fornece julgamentos conservadores sobre a natureza de procedimentos cirúrgicos adequados em consultórios e a magnitude adequada dessas mesmas cirurgias. De interesse particular para o médico foi a recomendação de limitar o volume da lipoaspiração para 5.000 cm3 do volume total aspirado (gordura e líquido). Um grande estudo observando o resultado clínico de 631 pacientes de lipoaspiração de grande volume mostrou um grau elevado de segurança e índices de complicação extremamente baixos com volume total de aspirado muito maior.29 Nossa política clínica atual limita o volume do aspirado em 5.000 cm3 de gordura sobrenadante em ambulatório e permite a aspiração de um volume adicional de 1.000 cm3 de gordura para pacientes hospitalizados após a cirurgia para monitoramento contínuo. A literatura médica fornece uma base muito pequena para as recomendações da força-tarefa e a literatura médica e a experiência clínica sugerem que volumes maiores de aspirados podem ser seguramente realizados por uma única operação. A lesão fisiológica da lipoaspiração depende da técnica cirúrgica empregada e da área de superfície corpórea do paciente. A remoção de 5.000 cm3 de gordura de um paciente de 100 lb (45 kg) acarretará consequências fisiológicas muito diferentes que o mesmo tipo de cirurgia realizado em um paciente muito maior. As recomendações para os limites de aspirados nas lipoaspirações devem ser baseadas em considerações médicas e fisiológicas adequadas. Têm sido feitas sugestões para limitar a duração do procedimento da cirurgia plástica como um método de estabelecer uma prática médica segura. O risco clínico perioperatório aumenta com a duração cirúrgica mais longa. O retorno do paciente para a sala de cirurgia para uma segunda cirurgia também o expõe a um risco adicional. A decisão de realizar uma cirurgia mais longa ou duas cirurgias mais curtas envolve muitos fatores. O American Society of Plastic Surgery Patient Safety Committee publicou Evidence-Based Patient Safety Advisory: Liposuction em 2009.14 O uso de lidocaína como um componente da solução úmida injetada na gordura antes da aspiração tem sido discutido na literatura médica. O anestésico local na solução úmida é utilizado com dois objetivos. O primeiro é reduzir o nível de anestesia adicional (geral ou sedação) que é necessário para completar o procedimento e manter o paciente confortável durante a cirurgia. O segundo objetivo é fornecer analgesia pós-cirúrgica em áreas do corpo onde foi realizada a cirurgia. Tem ocorrido morte por overdose do anestésico local durante a lipoaspiração. Têm sido cometidos erros na composição da solução úmida utilizada durante a cirurgia de lipoaspiração. Frascos de lidocaína a 2% têm sido adicionados à solução úmida quando foi prescrita lidocaína a 1% para a composição. Bupivacaína a 0,5% tem sido adicionada a soluções úmidas quando havia sido prescrita lidocaína a 0,5% para a composição. Resultados catastróficos têm ocorrido em decorrência desses erros. A composição da solução úmida deve ser confirmada por duas pessoas para assegurar a precisão e prevenir erro. A limitação da dose de lidocaína deve ser conservadora devido aos níveis séricos imprevisíveis e erráticos da anestesia local proveniente de qualquer administração de solução úmida.30,31 Múltiplos estudos têm documentado que os níveis de lidocaína plasmática atingem o pico 10-12 horas após a solução úmida contendo concentrações diluídas de epinefrina ter sido injetada no tecido adiposo antes da lipoaspiração. Para pacientes submetidos à lipoaspiração em ambulatório, os níveis de pico da lidocaína ocorrerão após a alta da instalação

cirúrgica. Após a injeção tumescente em áreas altamente vascularizadas do corpo, como o pescoço, os níveis de pico da lidocaína ocorrem mais rapidamente (6 horas) e em níveis séricos mais elevados.32 Na cirurgia de lipoaspiração com grandes volumes de injeção tumescente, fontes de administração de anestésicos locais adicionais, como anestésicos laringo-traqueais, devem ser evitadas pelo anestesista. Os níveis de epinefrina atingem o pico aproximadamente 3 horas após a injeção tumescente.30 Tem sido postulado que níveis elevados de epinefrina após a injeção tumescente podem contribuir para alterações no fluxo sanguíneo renal, acarretando diminuição no débito urinário durante lipoaspirações de volume maior.29 O controle de líquido perioperatório para o paciente submetido à lipoaspiração tem sido um tópico de grandes debates. Estudos clínicos e a experiência clínica têm mostrado que aproximadamente 30% de solução úmida injetada são aspirados durante a lipoaspiração, com 70% do volume tumescente injetado permanecendo no tecido adiposo sendo, subsequentemente, absorvido para a circulação central.33,34

Trombose venosa profunda/Embolia pulmonar no paciente submetido à lipoaspiração A prevenção do tromboembolismo venoso no período perioperatório deve ser parte da estratégia cirúrgica para cada paciente. O uso de terapia profilática para a prevenção do tromboembolismo venoso durante a cirurgia tem sido bem estabelecido na literatura médica.35 Entretanto, a determinação de um programa terapêutico apropriado para a prevenção do tromboembolismo venoso permanece controversa para muitos cirurgiões, especialmente quando o procedimento cirúrgico é considerado “menor ”, a duração da cirurgia é considerada curta e o paciente tem alta após se recuperar da cirurgia e da anestesia. A preocupação principal com a quimioprofilaxia na prevenção do tromboembolismo venoso é o sangramento pós-operatório, particularmente após a cirurgia cosmética facial, cirurgia que pode afetar a patência das vias aéreas e a lipoaspiração onde grandes áreas teciduais sofrem rompimento, e os acúmulos sanguíneos podem ser extensos. Como resultado dessas preocupações, a terapia profilática para cirurgias plásticas ambulatoriais tem se concentrado no uso de cintas de compressão graduadas e no uso de dispositivos de compressão pneumáticos intermitentes ajustados aos pés ou pernas. Foi mostrado que o uso dessas técnicas reduz a incidência de tromboembolismo venoso.36 Ainda deve ser demonstrado se essas técnicas não farmacológicas evitam a embolia pulmonar ou morte após a cirurgia plástica ambulatorial. As cintas de compressão devem ser adequadamente ajustadas para serem eficazes, sendo que cintas mal-ajustadas podem acarretar oclusão venosa ou comprometimento arterial de membros inferiores. O uso de dispositivos compressivos pneumáticos intermitentes para as pernas ou pés aumenta o fluxo venoso e considera-se que reduz o acúmulo de sangue nas veias. Além disso, o ajuste adequado do dispositivo é obrigatório e seu uso deve ser iniciado antes do começo da anestesia e prosseguir através do período de recuperação na unidade de cuidados pós-anestésicos. O desenvolvimento do tromboembolismo venoso pode se estender no período pós-operatório após a alta da instalação médica. Em casos selecionados, pode ser aconselhável continuar a profilaxia mecânica em casa, após a alta cirúrgica, para pacientes de alto risco. Pacientes que tenham sido submetidos à lipoaspiração circunferencial da coxa ou panturrilha, onde o fluxo venoso dos membros inferiores pode estar comprometido, podem se beneficiar da extensão da duração da profilaxia mecânica. A profilaxia mecânica é contraindicada em pacientes com edema de membro inferior, com histórico de doença vascular periférica dos membros inferiores ou com feridas ou úlceras dos pés ou pernas. Os pacientes com alto risco de tromboembolismo venoso incluem aqueles que apresentam história de doença venosa prévia, obesidade (índice de massa corporal > 30), imobilidade pós-operatória, diabetes, história de tabagismo, história de câncer, idade avançada, cirurgia de longa duração e uso de anestesia geral.37 Esse subgrupo de pacientes de alto risco pode se beneficiar de uma combinação de medidas profiláticas mecânicas e farmacológicas para reduzir a incidência de tromboembolismo venoso. Pacientes que são hipercoaguláveis (p. ex., deficiência da proteína S ou fator V Leiden) também podem necessitar de terapia mecânica e farmacológica para tromboprofilaxia durante cirurgia ambulatorial.38 A profilaxia farmacológica é contraindicada em pacientes com sangramento ativo, anestesia regional recente ou antecipada (epidural ou raquianestesia), endocardite infecciosa, retinopatia proliferativa e em pacientes com trombocitopenia. Pacientes submetidos a cirurgia com anestésicos epidurais e ao uso de cateter epidural de demora devem ter o cateter removido antes do início da terapia anticoagulante. Em pacientes com cateter de demora nos quais a terapia anticoagulante foi instituída, o cateter deve ser removido para um ponto inferior de eficácia clínica da terapia anticoagulante, ou seja, logo

antes da administração da próxima dose de medicamento. O índice de normalização internacional deve ser < 1,5 no instante da remoção do cateter. O uso de heparina e heparina de baixo peso molecular é contraindicado em pacientes com uma história de trombocitopenia induzida por heparina. O fondaparinux pode constituir uma terapia profilática adequada para pacientes com trombocitopenia induzida por heparina. A aspirina como única modalidade de profilaxia para trombose venosa geralmente não é recomendada. A aspirina pode ser indicada em um pequeno subgrupo de pacientes de alto risco para trombose venosa e com contraindicações específicas para outras terapias mecânicas e farmacológicas. Dispositivos compressivos pneumáticos intermitentes são rotineiramente utilizados em todos os pacientes submetidos à lipoaspiração devido à preocupação com estase venosa, lesão vascular endotelial e/ou ativação das vias de coagulação secundárias ao trauma tecidual durante a cirurgia. Terapias anticoagulantes iniciadas antes ou imediatamente após a cirurgia de lipoaspiração impõem um risco substancial de sangramento para o paciente. Durante a lipoaspiração, grandes áreas de tecido são rompidas, e a visualização de locais de sangramento pode ser difícil. Pacientes que desenvolvem tromboembolismo pulmonar no período do pósoperatório imediato e que recebem terapia anticoagulante agressiva apresentam grandes volumes de sangramento nas áreas do corpo submetidas à lipoaspiração. Pacientes de lipoaspiração anticoagulados apresentarão sangramento intenso, mesmo com uma agressiva terapia de compressão nas regiões de cirurgia recente. Filtros de veia cava têm sido colocados com sucesso em pacientes pós-lipoaspiração apresentando embolia pulmonar. É obrigatória a consulta com especialistas em medicina intensiva e cirurgia vascular em caso de pacientes pós-lipoaspiração que apresentem essas complicações potencialmente fatais.

Cuidados com o paciente durante a cirurgia de lipoaspiração É obrigatória a coordenação dos cuidados ao paciente durante a lipoaspiração pela equipe cirúrgica. Estratégias para dosagem de solução tumescente, controle de líquidos, posicionamento do paciente e manutenção da temperatura corporal do paciente durante a cirurgia devem ser planejadas antes do início do procedimento cirúrgico. O paciente submetido à lipoaspiração geralmente tem grandes porções de sua superfície corporal expostas a temperaturas frias da sala de cirurgia. A manutenção da temperatura corporal do paciente durante a cirurgia pode se tornar um problema complexo para a equipe cirúrgica. Os anestésicos rotineiramente causam redistribuição do fluxo sanguíneo, antagonizando os mecanismos corporais normais para a regulação da temperatura. Fluidos intravenosos aquecidos e soluções tumescentes para lipoaspiração auxiliarão a preservação da temperatura. Foi mostrado que compressas/almofadas de aquecimento à base de água na mesa cirúrgica apresentam pouco benefício para a preservação da temperatura. O uso rotineiro de dois cobertores de aquecimento por ar forçado, um sobre a parte superior do corpo e outro sobre a parte inferior, praticamente eliminou a preocupação quanto à ocorrência de hipotermia durante a lipoaspiração. As mudanças no posicionamento do corpo durante a cirurgia de lipoaspiração devem ser realizadas com rapidez, com a reaplicação dos cobertores aquecidos o quanto antes para manter a temperatura do corpo. A complicação pós-operatória mais comum após a lipoaspiração é a irregularidade do contorno cutâneo e corporal. Naturalmente, o resultado mais sério após a lipoaspiração é a morte. Relatou-se que a perfuração da parede abdominal e órgãos vitais ocorre em 14,6% de 95 casos fatais após 496.245 procedimentos de lipoaspiração.39 Pacientes com cirurgia abdominal prévia ou reconhecidamente apresentando hérnia ventral parecem apresentar risco elevado de perfuração da parede abdominal. Um cuidadoso exame abdominal préoperatório identificará muitos pacientes com hérnia de parede abdominal. Exames de imagens por tomografia computadorizada podem ser necessários para auxiliar a identificar pacientes com defeitos na parede abdominal que podem acarretar complicações graves após a lipoaspiração abdominal. Uma técnica cirúrgica meticulosa é necessária para reduzir a incidência de lesão em órgão vital. Tem sido relatada durante a lipoaspiração a perfuração do flanco posterior, acarretando lesão retroperitoneal, perfuração torácica e lesão medular. O atraso no diagnóstico de uma perfuração da parede abdominal pode acarretar derramamento peritoneal, fasciite necrosante, sepse e morte.40 A única coisa pior que esta complicação catastrófica é a falha em diagnosticar essa condição. A negação do médico de que ocorreu uma complicação é um forte componente do caminho que leva a um resultado clínico devastador após a cirurgia.

Cirurgia estética facial A formação de hematoma após a cirurgia de rejuvenescimento facial pode acarretar consequências graves.

Pequenos hematomas podem ser tratados com técnicas conservadoras, como pressão externa sobre as áreas afetadas ou exigir aspiração percutânea com uma agulha e uma seringa. Grandes hematomas, hematomas em expansão ou coleções de sangue causando pressão sobre as vias aéreas do paciente apresentam mais probabilidade de precisar de intervenção cirúrgica. Estudos cirúrgicos têm identificado hipertensão perioperatória com pressão arterial sistólica maior que 150 mmHg e pressão arterial diastólica maior que 90 mmHg como um marcador principal da formação do hematoma pós-operatório após a cirurgia facial. As recomendações para o controle agressivo da pressão arterial durante o tempo da ritidectomia planejada foram propostas por muitos autores. Ainda não se sabe se a prescrição pré-operatória de medicamentos antihipertensivos como a clonidina deve ser usada para reduzir a incidência de hematoma facial pós- -operatório, em oposição à titulação de medicamentos anti-hipertensivos intraoperatórios. Como em qualquer questão crítica, será necessária a realização de estudos randomizados. A administração de medicamentos orais ou intramusculares próximo do momento da cirurgia deve ser cuidadosamente avaliada. O uso perioperatório de torazina para controle da pressão arterial intraoperatória e pós-operatória durante ritidectomia necessita ser questionada. A torazina apresenta meia-vida e duração de ação clínica longas. Isso acarreta numerosas interações medicamentosas indesejáveis, incluindo a potencialização de analgésicos narcóticos e uma variedade de efeitos colaterais. Uma vez que agora temos medicamentos anti-hipertensivos melhores e tituláveis, antieméticos mais potentes e medicamentos sedativos perioperatórios melhores, a torazina no ambiente cirúrgico se tornou uma droga relegada ao passado. O manejo das vias aéreas de pacientes com um hematoma facial pós-operatório pode ser amedrontador. Os hematomas de face e pescoço podem distorcer significativamente as vias aéreas, impossibilitando a laringoscopia direta e a intubação. A avaliação cuidadosa das vias aéreas e da distorção anatômica do paciente deve ser realizada antes da administração de medicamentos sedativos ou da indução de anestesia geral em paciente com hematoma de face ou pescoço. O desvio da traqueia por um hematoma ou por edema da base da língua ou da faringe pode causar obstrução das vias aéreas. Técnicas tradicionais de resgate das vias aéreas, como a máscara laríngea de vias aéreas podem não ser eficazes, devido às distorções anatômicas causadas pelo hematoma. Assegurar as vias aéreas com tubo endotraqueal com o paciente acordado e respirando espontaneamente pode ser a técnica mais segura antes da indução de anestesia geral em pacientes com distorção anatômica oriunda de um hematoma pós-operatório. A abertura de uma linha de sutura linear com evacuação de uma pequena área do hematoma pode aliviar a pressão nas vias aéreas e restaurar uma anatomia mais normal às vias aéreas. Nesse ambiente clínico, devem ser feitos preparativos para a realização de uma via aérea cirúrgica antes de tentativas de intubação por fibra óptica ou por intubação com o paciente acordado. A preparação para uma crise ajudará a evitar um desastre clínico, caso se desenvolvam complicações das vias aéreas. O edema maciço do pescoço pode também dificultar a execução de uma via aérea cirúrgica ou tireoidectomia cricoide. A evacuação de um pequeno hematoma facial pós- -operatório após ritidectomia pode ser um procedimento adequado para um centro cirúrgico em consultório ou em um centro cirúrgico independente. Em um caso com possível comprometimento das vias aéreas após a cirurgia facial, uma instalação cirúrgica hospitalar pode fornecer níveis maiores de segurança para o paciente. Pode ser necessário para o paciente permanecer intubado após a evacuação do hematoma devido ao edema contínuo do pescoço, faringe e base da língua. Além disso, é obrigatória a preparação para a rápida deterioração das vias aéreas do paciente.

Complicações de cirurgia de mama A incidência de pneumotórax após cirurgia de aumento da mama e de reconstrução da mama é muito baixa – menos que 1% dos casos. A incidência de um pneumotórax após o aumento primário da mama é felizmente muito rara, mas deve ser considerada em uma paciente com complicações respiratórias pós-cirúrgicas inexplicáveis. O pneumotórax após a cirurgia de mama secundária e reconstrução da mama tem sido relatado com uma incidência maior, mas permanece pouco frequente. O desconforto respiratório pós-operatório grave após a cirurgia de mama pode necessitar de assistência respiratória por pressão positiva e intubação, juntamente com aspiração do tórax por agulha para a evacuação de um pneumotórax. A inserção do tubo torácico para tratamento contínuo de um pneumotórax é raro, mas pode ser necessária, para um escape de ar persistente. Ao manter em mente estas complicações potenciais, será possível o reconhecimento do distúrbio quando ele se apresentar clinicamente.

Incêndio na sala de cirurgia O desenvolvimento de lesões térmicas secundárias a um incêndio no campo cirúrgico pode acarretar consequências devastadoras. Aproximadamente 200 incêndios em salas de cirurgia envolvendo pacientes submetidos à cirurgia podem ocorrer a cada ano. O conceito da tríade do fogo ajuda a explicar o desenvolvimento de um incêndio durante a cirurgia. A tríade do fogo inclui: (1) um oxidante, que nas instalações da sala de cirurgia inclui o oxigênio e o óxido nitroso; (2) uma fonte de ignição, que pode ser um dispositivo do tipo eletrocautério ou laser; e (3) uma fonte de combustível, como panos cirúrgicos, gaze, soluções de preparação ou um tecido corporal do paciente. A prevenção de incêndios na sala de cirurgia durante o ato cirúrgico começa com a conscientização do médico e da equipe quanto a possíveis fatores de contribuição para o incêndio. A Força Tarefa da ASA sobre Incêndios na Sala de Cirurgia tem desenvolvido recomendações específicas para reduzir a incidência desses eventos.41 Os ambientes enriquecidos por oxigênio promovem prontamente a ignição de um material combustível. O contorno dos panos cirúrgicos em torno da face do paciente pode permitir o acúmulo de oxigênio e promover a combustão. Permitir o fluxo livre de ar em torno da área cirúrgica pode reduzir a incidência de ignição do material combustível. Minimizar o fornecimento de oxigênio suplementar (cânula nasal ou máscara facial) para a região cirúrgica pode reduzir a incidência de combustão. É obrigatório para os pacientes receberem oxigênio suplementar através de cânula nasal ou máscara facial, durante cirurgia facial, minimizando a concentração de oxigênio no campo cirúrgico. Isso pode ser obtido pelo uso do menor fluxo de oxigênio possível para o paciente que produza níveis satisfatórios de saturação de oxigênio e pela sucção no campo cirúrgico para reduzir o acúmulo de oxigênio na área cirúrgica. Pode ser necessário assegurar a via aérea para uma alta concentração de oxigênio ao paciente para reduzir o risco de queimadura da face ou vias aéreas. As esponjas cirúrgicas devem ser umedecidas quando usadas próximo a uma fonte de ignição. Soluções inflamáveis de preparação para a pele devem secar antes do estabelecimento do campo cirúrgico, para reduzir o risco do acúmulo de gases potencialmente inflamáveis. Devem ser utilizadas as configurações mais baixas possíveis de cautério e laser para limitar o potencial de ignição. O tratamento da queimadura da face ou da via aérea inclui a interrupção do fluxo de gases fornecidos ao paciente, a remoção do material em combustão o quanto antes, incluindo o tubo endotraqueal e a extinção das chamas com soluções salinas tão rápido quanto possível. As preocupações com as lesões térmicas das vias aéreas devem ser avaliadas por completo com laringoscópio e broncoscópio, se necessário. O tratamento das vias aéreas após a queimadura facial ou lesão térmica das vias aéreas necessitará de uma consulta médica adicional e monitoramento do paciente na unidade de tratamento intensivo.

Sistemas baseados em protocolo para redução da incidência de paciente errado e cirurgia do lado errado Grande parte deste capítulo tem discutido técnicas para a melhora da segurança do paciente durante a cirurgia com base em nosso conhecimento de farmacologia e fisiologia da cirurgia que está sendo realizada. Outras partes do capítulo têm procurado instruir o médico, através da revisão da literatura médica, sobre risco cirúrgico e anestésico. Outras partes deste livro procuram educar o médico sobre técnicas cirúrgicas e melhorar os resultados clínicos obtidos através das cirurgias. A maioria dos médicos procura melhorar os resultados clínicos pelo aprimoramento do seu conhecimento sobre a literatura científica, que é a base da prática médica. Entretanto, o resultado desfavorável durante a cirurgia é geralmente decorrente de falha do sistema médico em cumprir as necessidades do paciente. As instituições médicas devem ter mecanismos em vigor para garantir que os pacientes recebam o procedimento cirúrgico correto. Seguindo esse conceito, a Joint Commission under the National Patient Safety Goals adotou o Protocolo Universal para Prevenção da Cirurgia no Local Errado, com o Procedimento Errado e na Pessoa Errada.42 O Protocolo Universal se baseia no conceito de que a realização da cirurgia errada deve ser evitada e que estratégias agressivas devem ser implementadas para proteger o paciente com sucesso. A verificação da identidade do paciente é realizada múltiplas vezes por diversos indivíduos envolvidos nos processos de atendimento médico e cirúrgico. Esse processo de verificação começa com a avaliação e confirmação pré-operatória das condições clínicas do paciente. Essa verificação pré- operatória inclui a identificação do paciente confirmada verbalmente com o paciente e com a verificação da etiqueta presa a seu braço. É realizada a confirmação do local cirúrgico e do procedimento cirúrgico juntamente com a marca do local cirúrgico adequado, pelo médico ou seu assistente. A verificação da documentação da

permissão cirúrgica, da história apropriada e do exame físico juntamente com os estudos laboratoriais e planos para transfusão sanguínea está incluída nessa revisão pré-operatória. Ainda permanece controverso na comunidade médica quais membros da equipe cirúrgica devem ter permissão para realizar a marcação do local cirúrgico. Esses debates continuarão, mas é seguro afirmar que o local cirúrgico deve ser marcado no período pré-operatório cumprindo as metas nacionais de segurança para o paciente (National Patient Safety Goals) e o bom julgamento clínico perioperatório. A Organização Mundial de Saúde adotou uma lista de verificação de segurança do paciente cirúrgico para reduzir a incidência de erros médicos.43 Essa lista de verificação inclui procedimentos para serem realizados antes da indução anestésica (Quadros 8.1 e 8.2). Q uadr o 8- 1 C onfirm a r a s se guint e s inform a çõe s com o pa cie nt e a nt e s da

induçã o a ne st é sica Identificação do paciente Local marcado pelo cirurgião Consentimento cirúrgico História atual e física Banda alérgica Necessidades especiais ou instrumentação, ou seja, máquina de pressão positiva contínua das vias aéreas no pós-operatório do paciente com apneia do sono Q uadr o 8- 2 C onfirm a r com o a ne st e siologist a Verificação da segurança da anestesia concluída Oxímetro de pulso instalado e em funcionamento Risco antecipado de vias aéreas difíceis ou de aspiração pulmonar Risco de perda de sangue superior a 500 cm3 em adultos ou superior a 7 mL/kg em crianças Necessidade de tipagem sanguínea e prova cruzada Necessidades especiais do equipamento anestésico

A execução do procedimento “time-out” (pausa) garante que o paciente correto está prestes a se submeter à cirurgia correta no local cirúrgico correto. O procedimento “time-out” exige que toda a equipe cirúrgica se concentre no processo de identificação e participe da realização do “time-out”. A equipe cirúrgica inclui o cirurgião e os assistentes cirúrgicos, o anestesiologista, o enfermeiro da sala de cirurgia, o técnico cirúrgico e outros indivíduos na sala de cirurgia que estarão participando do procedimento cirúrgico (ou seja, a equipe de radiologia). Quando mais de um procedimento é realizado no mesmo paciente por diferentes cirurgiões, um “time-out” é realizado antes do início de cada fase da cirurgia. O procedimento de “time-out” deve confirmar: 1. Se a identificação do paciente está correta. 2. Se o local cirúrgico está correto. 3. O procedimento cirúrgico que está planejado. 4. Se o consentimento cirúrgico está completo e preciso. 5. Se o local cirúrgico foi marcado adequadamente e é visível no campo cirúrgico. 6. Se os estudos de imagem e equipamentos implantados estão disponíveis (caso indicado). 7. Se os antibióticos profiláticos (caso indicados) foram ministrados. 8. Se a profilaxia da trombose venosa profunda foi instituída (caso indicada). 9. Se a implantação de técnicas de assepsia foi revisada. 10. Se a duração do procedimento e a perda de sangue prevista são verificadas. 11. Se outras áreas de preocupação durante a cirurgia por qualquer membro da equipe cirúrgica são registradas. Após a finalização do procedimento, uma avaliação pós-cirúrgica é realizada pela equipe cirúrgica. Essa fase da lista de verificação da segurança cirúrgica inclui: 1. Se a quantidade de esponjas cirúrgicas e agulhas está correta. 2. Se a análise do consentimento cirúrgico confirma a realização de todos os procedimentos planejados. 3. Se as amostras patológicas serão enviadas adequadamente ao laboratório. 4. Se os planos para a recuperação pós-anestésica foram realizados e a equipe foi notificada sobre a chegada do

paciente. Todos os membros da equipe devem participar integralmente do procedimento de “time-out”. A não realização desses procedimentos bem estabelecidos coloca o paciente em risco por erro grave e questiona a qualidade dos cuidados que estão sendo fornecidos.

A sociologia da sala de cirurgia na cirurgia plástica A American Society of Plastic Surgery e a American Society for Aesthetic Plastic Surgery promoveram uma iniciativa “paciente em primeiro lugar ” para defender a segurança na sala de cirurgia. Avanços na técnica cirúrgica e no tratamento médico perioperatório têm permitido a melhora dos resultados clínicos. À medida que nosso conhecimento médico aumenta, sentimos uma enorme decepção quando o resultado clínico não é tão bom quanto o esperado. Tentativas de regulamentação do ambiente cirúrgico, com o credenciamento das instalações cirúrgicas, têm certamente aumentado a qualidade da documentação durante a cirurgia, mas elas têm apresentado melhores resultados? O credenciamento de uma instalação cirúrgica inclui a revisão de processos e sistemas, mas pode, na realidade, não observar a realização de uma única cirurgia sequer. O processo de credenciamento em 1, 2 ou 3 dias avalia uma instalação cirúrgica em um instante no tempo. A conduta real dessa instalação pode não ser reavaliada em 1-3 anos. A conformidade aos padrões por um médico ou pela instalação cirúrgica pode ocorrer lentamente e ainda estar abaixo do padrão, de modo a colocar o paciente em risco desnecessário. No final, a decisão de realizar a cirurgia plástica com segurança ficará por conta do médico. O padrão de prática clínica em um centro cirúrgico ou em instalação cirúrgica no consultório deve cumprir ou superar o de um hospital credenciado. Uma série de 10 princípios essenciais foi publicada em 2004 defendendo os fundamentos da prática da cirurgia estética.44 Esses mesmos princípios são tão válidos hoje, quanto quando foram primeiramente publicados e devem ser aplicados a todos os médicos e a todos os especialistas cirúrgicos. Pacientes devem ser selecionados para a cirurgia com base nos critérios estabelecidos apresentados pelo sistema de classificação ASA. Médicos realizando cirurgias em consultório devem ter privilégios para a internação em um hospital próximo e um acordo de transferência com esse hospital, facilitando a transferência e a internação desse paciente, quando necessário. Médicos que realizam a cirurgia em consultório devem mostrar competência para manter os privilégios cirúrgicos em um hospital licenciado ou credenciado ou em centro cirúrgico ambulatorial para o mesmo procedimento que está sendo realizado em consultório. Para o benefício do paciente, deve ser obrigatória uma séria revisão por pares quanto à realização da cirurgia e ao tratamento médico em um centro cirúrgico ambulatorial ou em uma instalação cirúrgica privada. É adequado que um médico que tenha seus privilégios negados em um hospital para realizar cirurgias tenha o direito de abrir uma instalação privada sem a revisão por pares e realizar os mesmos procedimentos? Deve uma instalação cirúrgica privada funcionar como esconderijo para o médico fugir da revisão por pares? As mesmas regras que se aplicam a um cirurgião também devem se aplicar a um anestesista. Nenhum médico deverá estar acima de seus pares clínicos durante uma revisão clínica. Devemos começar a questionar a condução da prática clínica na sala de operações durante a cirurgia. O paciente pode esperar razoavelmente que o foco da equipe cirúrgica esteja dedicado a realizar seus trabalhos para proporcionar o melhor resultado cirúrgico possível. Os membros da equipe cirúrgica (enfermeiros, técnicos) que se esforçaram para melhorar a qualidade e a segurança dos resultados cirúrgicos não são intercambiáveis por outros indivíduos que não estejam familiarizados com os fatos médicos do caso. O risco de erro aumenta e a qualidade dos cuidados aos pacientes diminui quando os membros da equipe cirúrgica mudam durante a cirurgia. Não importa até que ponto “a passagem do bastão” de um membro da equipe para outro é completa, nada pode ser tão completo quanto estar no caso desde o começo. Ter vários profissionais de enfermagem diferentes na sala de cirurgia aumenta o risco de erros, o que deve ser desencorajado. A continuidade dos cuidados pela equipe de anestesia também melhora a segurança do paciente. Os casos de cirurgia plástica podem tomar muito tempo e muitas alterações no pessoal podem ser necessárias durante o procedimento, mas devem ser minimizadas. Não deve ser necessário dizer, mas a cirurgia deve ser realizada pelo cirurgião atendente e pelos assistentes designados, e não por indivíduos não licenciados minimamente treinados considerados “qualificados” pelo cirurgião. A falta de supervisão na sala de cirurgia pode acarretar uma má qualidade que pode não ser detectada por uma análise com gráficos e documentação por uma agência certificadora.

A melhor das intenções, não o melhor resultado Apesar das melhores intenções por parte dos médicos e do sistema de saúde, os erros que ocorrem durante a hospitalização podem causar mais de 98.000 mortes por ano e mais de 1 milhão de lesões significativas. Publicações recentes de um estudo mostrando uma falha da nova política e de procedimentos hospitalares para melhorar a segurança do paciente em um ambiente hospitalar são decepcionantes. Foi realizada uma análise gráfica em 2.341 internações hospitalares selecionadas aleatoriamente em 10 hospitais também selecionados aleatoriamente entre 2002 e 2007.45 Nessa análise, considerou-se que os pacientes foram prejudicados durante suas hospitalizações em 588 ocasiões, aproximadamente 1 em cada 4 pacientes. Em 50 desses casos, o dano foi considerado ameaça à vida, 17 casos resultaram em lesão permanente e 14 mortes foram consideradas, em parte, decorrentes de erro médico. Apesar da implantação, durante o período de estudo, de políticas e procedimentos para redução de erro médico, a frequência de erro permaneceu constante em 25 casos para cada 100 internações hospitalares.46 Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  5. Lagasse, R. S. Anesthesia safety: model or myth? A review of the published literature and analysis of current original data. Anesthesiology. 2002; 97:1609. Este trabalho apresenta uma excelente revisão da literatura comparando uma variedade de indicadores que medem a segurança do paciente durante a anestesia. Técnicas diferentes de medidas ilustram várias perspectivas no estado atual da segurança cirúrgica. Pelo entendimento da literatura, podemos aconselhar melhor os pacientes quanto ao risco relativo do seu procedimento cirúrgico planejado.

8. Eichhorn, J. H. Prevention of intraoperative anesthesia accidents and related severe injury through safety monitoring. Anesthesiology. 1989; 70:572–577. Este trabalho descreve a estatística baseada nas queixas da melhoria da segurança durante a anestesia com o uso de técnicas monitoradas inovadoras. A experiência de Harvard antes e após a introdução de padrões de monitoramento.

13. Iverson, R. E., the ASPS Task Force on Patient Safety in Office-based Surgery Facilities. Patient safety in office-based surgery facilities: procedures in the office-based surgery setting. Plast Reconstr Surg. 2002; 110:1337–1344. Este trabalho apresenta a cirurgia em consultório médico realizada com segurança. O relatório da força-tarefa da ASPS sobre a segurança do paciente. Diretrizes e processos elaborados para a segurança da cirurgia ambulatorial, incluindo recomendações para o tratamento intraoperatório do paciente e a necessidade do credenciamento da instalação cirúrgica em consultório médico.

17. American Society of Anesthesiologists. Task force on perioperative management of patients with obstructive sleep apnea. Anesthesiology. 104(No. 5), 2006. Este trabalho permanece uma referência para o tratamento perioperatório dos pacientes com história de apneia do sono e que são submetidos a anestesia e cirurgia. Um conjunto de recomendações baseadas em evidências para o tratamento perioperatório do paciente de apneia do sono. Um conjunto mais específico de recomendações publicadas na literatura será útil após a experiência clínica adicional com esse subgrupo de pacientes.

22. Bitar, G., Mullis, W., Jacobs, W., et al. Safety and efficacy of office-based surgery with monitored anesthesia care/ sedation in 4778 consecutive plastic surgery procedures. Plast Reconstr Surg. 2003; 111:150–156. Este trabalho descreve uma grande série de pacientes submetidos à cirurgia plástica utilizando cuidados de anestesia monitorados como o anestésico de escolha. Entretanto, a baixa incidência de complicações neste subgrupo de pacientes não permite que o documento conclua que uma técnica anestésica é mais segura que outra.

23. Hoefflin, S. M., Bornstein, J. B., Gordon, M. General anesthesia in an office based plastic surgical facility: a report on more than 23000 consecutive office based procedures under general anesthesia with no significant anesthetic complications. Plast Reconstr Surg. 2001; 107:243. Este trabalho descreve uma ampla experiência clínica de pacientes submetidos à cirurgia plástica utilizando anestesia geral em um consultório médico. Além disso, devido à baixa incidência de complicações nesta população de pacientes, não se pode concluir a superioridade desta técnica em comparação com outras.

29. Commons, G. W., Halperin, B. D., Chang, C. C. Large volume liposuction: a review of 631 consecutive cases over 12 years. Plast Reconstr Surg. 2001; 108:1753. Este trabalho descreve uma série de pacientes que foram submetidos à lipoaspiração de grande volume e a taxa de complicações muito baixa associada ao procedimento. É apresentada uma descrição da técnica cirúrgica, da farmacologia e fisiologia por trás da abordagem médica do paciente. Uma demonstração que volumes mais elevados de aspirados de gordura podem ser realizados com um alto grau de segurança para o paciente.

34. Kenkel, J. M., Lipschitz, A. H., Luby, M., et al. Hemodynamic physiology and thermoregulation in liposuction. Plast Reconstr Surg. 2004; 114:503–513. Este trabalho apresenta os resultados de estudos de monitoramento hemodinâmico invasivo realizados durante lipoaspiração. Os resultados são particularmente úteis para entender os efeitos fisiológicos da solução úmida utilizada para lipoaspiração. O entendimento das alterações fisiológicas durante a cirurgia é obrigatório para o manejo apropriado do paciente lipoaspirado. A importância da manutenção da normotermia durante a lipoaspiração é também descrita, e os fatores que acarretam a perda intraoperatória de calor são resumidos para o benefício do médico.

41. Caplan, R. A., Barker, S. J., Connis, R. T., et al. Practice advisory for the prevention and management of operating room fires. Anesthesiology. 2008; 108(5):786–801. Este trabalho é a publicação mais abrangente sobre o tema de incêndio na sala de operação durante a cirurgia. Uma explicação sobre a causa do incêndio na sala de cirurgia auxilia o médico a entender as recomendações para reduzir a incidência dessa terrível complicação. Caso os padrões estabelecidos neste documento não sejam seguidos, o paciente correrá o risco adicional de um incêndio intraoperatório.

45. Landrigan, C. P. Temporal trends in rates of patient harm resulting from medical care. N Engl J Med. 2010; 363:2124–2134.

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Anestesia local em cirurgia plástica A. Aldo Mottura

Resumo A anestesia local é amplamente utilizada em pequenas cirurgias. O uso de anestesia local pode ser ampliado para abranger cirurgias maiores. O benefício para o paciente é evitar anestesia geral enquanto respira espontaneamente. O uso da bupivacaína na solução anestésica, em cirurgias de 4-6 horas, também é viável, e a bupivacaína fornece algumas horas de alívio da dor pós-operatória. Em cada região, uma técnica de anestesia por infiltração inteligente é preferível à técnica tumescente. Para procedimentos de grande porte, a assistência do anestesista proporciona melhor sedação, bem como o benefício da responsabilidade compartilhada.

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Introdução Para cirurgia estética e operações pequenas ou superficiais, como rino-otoplastias ou ritidectomias, alguns cirurgiões utilizam a anestesia local com grande sucesso. Ultimamente, cirurgias estéticas maiores estão sendo realizadas com anestesia local sob sedação superficial ou profunda. Apesar de a anestesia geral eximir o cirurgião da responsabilidade de cuidar de um paciente que está dormindo, alguns preferem utilizar sedação e anestesia local por causa de suas vantagens: a utilização de gases, os relaxantes musculares e a intubação traqueal são evitados, a sedação pode ser regulada, há menos sangramento durante a cirurgia e a analgesia pós- -operatória pode ser mais fácil de tratar. Além disso, uma recuperação regular e fácil, com alta precoce, ajuda a diminuir os custos e a melhorar a eficiência, assim como a segurança. Quando o cirurgião decide utilizar anestesia local e sedação, quatro passos devem ser considerados: (1) a seleção do paciente, (2) a seleção da sedoanalgesia, (3) a seleção de medicações anestésicas e (4) a seleção de técnicas de infiltração.

A seleção dos pacientes Há pacientes que são mais indicados para anestesia geral, epidural e local. Caso não se selecione corretamente a anestesia ideal para o paciente, podem surgir problemas durante a cirurgia. A avaliação pré-operatória do paciente deve requerer atenção especial a questões como idade, condição física geral, personalidade, preferência por anestesia local, histórico de medicações e a extensão da cirurgia. Uma vez consideradas estas questões, o cirurgião pode decidir se o paciente é ou não um candidato adequado para o tipo de anestesia escolhido. Um fator que também deve ser considerado é o custo. De um modo geral, realizar um procedimento sob anestesia local é mais barato do que fazer o mesmo procedimento

sob anestesia geral. Por esta razão, o cirurgião pode ficar tentado a tratar um paciente sob anestesia local quando a anestesia geral seria uma escolha melhor para este paciente. Este caso “limítrofe” é repleto de problemas potenciais e, portanto, tomar a decisão por razões puramente econômicas deve ser evitado. O paciente limítrofe pode ser chamado assim porque geralmente tem medos anormais e, possivelmente, uma personalidade instável. Outro fator muito importante é a confiança do cirurgião em sua capacidade de realizar esta operação em particular sob anestesia local. Na minha experiência, o medo é um dos obstáculos mais importantes para este tipo de anestesia, pois é uma reação que aparece quando a pessoa pensa que algo a está ameaçando, e as suas respostas tornam-se exageradas e um tanto imprevisíveis. A idade é importante. Em geral, os adolescentes, algumas vezes, podem ser difíceis, pois não têm maturidade nem experiência e podem, em outras vezes, como uma consequência, se comportar de forma imprevisível. Pacientes que sejam ignorantes quanto ao procedimento também podem temer o desconhecido e ser candidatos menos adequados. Às vezes, apesar de exaustiva explicação, os pacientes não são capazes de captar a essência do procedimento e podem, portanto, ser candidatos menos ideais para a anestesia local. Algumas vezes, esses medos e respostas exageradas podem estar relacionados com questões tão diversas como etnia, experiências de vida e personalidade. Pacientes com temores anormais ou exagerados não devem ser selecionados para a anestesia local, mas outros que têm medo em relação a apenas alguns aspectos da cirurgia podem ser considerados adequados e colocados no grupo de candidatos ideais, recebendo uma explicação clara e adequada de como a cirurgia é realizada. Esta explicação deve incluir uma descrição do nível de anestesia e, talvez, uma visita à sala de cirurgia antes do procedimento com alguém que possa responder a perguntas do paciente e ajudar a aliviar a ansiedade e o nervosismo.15

Escolha de sedação Sedação significa consciência deprimida e, indiretamente, diminuição do desconforto durante a cirurgia. Em geral, isso permite que o paciente tolere um procedimento pelo alívio de ansiedade, desconforto e dor. Existem várias maneiras de sedar um paciente. Há também diferentes níveis de sedação. Alguns cirurgiões utilizam apenas um sedativo leve, optando por realizar as operações com o paciente acordado. Outros mantêm o paciente sob sedação moderada mas preservando o contato verbal, enquanto outros preferem que o paciente esteja completamente adormecido, ou seja, em sedação profunda que pode ser acompanhada por uma perda parcial ou completa de reflexos protetores e pode incluir a incapacidade de manter uma via aérea patente. A sedação profunda planejada deve ser administrada preferencialmente por um anestesista ou enfermeiro anestesista certificado sob a orientação de um anestesista ou um cirurgião.16

Pré-medicação A sedoanalgesia começa com a pré-medicação. Pacientes muito ansiosos devem ser medicados alguns dias antes da cirurgia; caso contrário, pode ser muito difícil acalmá-los no momento em que estiverem na sala de cirurgia. O lorazepam demonstrou ser uma medicação muito eficaz. É geralmente administrado na noite antes da cirurgia e novamente quando o paciente acorda na manhã da cirurgia. Desta forma, a ansiedade, bem como as secreções gástricas, são reduzidas.17 A pré-medicação deve também variar de acordo com cada paciente.

Sedação A situação ideal é receber um paciente sedado na sala de cirurgia. O midazolam é a medicação mais comum administrada na sala de cirurgia. Ele pode ser administrado por via intramuscular (IM) ou por via intravenosa (IV), 15-30 minutos antes da cirurgia. Para procedimentos mais extensos, uma combinação de narcóticos e anticolinérgicos, como escopolamina ou atropina, pode ser usada para cada paciente dependendo do grau de nervosismo, da pressão arterial e de outros indicadores fisiológicos. Para procedimentos de curta duração e para o início dos mais longos, a combinação mais comum é midazolam e fentanil. Trinta minutos depois dessa injeção, o paciente chega à sala de cirurgia muito calmo, relaxado ou sonolento, de modo que não está muito ciente do que ocorre durante os preparativos pré-operatórios. Por vezes esta pré-medicação é suficiente, mas se

o paciente necessitar de medicação mais profunda, o cirurgião tem várias opções. As medicações utilizadas para sedação incluem diazepam, midazolam ou propofol, enquanto para analgesia podem ser utilizados cetamina e fentanil. Alguns cirurgiões como Thomas Baker18 ou Charles Vinnik19-22 usam uma combinação de midazolam e cetamina. Esta é chamada de anestesia dissociativa. A cetamina é uma medicação de ação curta que fornece uma anestesia dissociativa rápida que dura 45 minutos por via IM e de 1015 minutos por via IV. Ela tem um curto tempo de recuperação e é especialmente indicada para pacientes hipotensos. De acordo com Ersek,23,24 ela também diminui a agregação de plaquetas. A decisão inicial é se o paciente necessita de sedação, analgesia ou ambos. Para a sedação, os efeitos do diazepam e do midazolam são semelhantes, mas a sua duração é diferente: 3-4 horas ou algumas vezes menos para midazolam e 6-12 horas para o diazepam. Para a analgesia, a cetamina é uma medicação neuroléptica muito segura que não deprime o sistema nervoso central (SNC), pelo contrário, o estimula (não recomendada para pacientes nervosos ou hipertensos), enquanto o fentanil é um narcótico que deprime o sistema nervoso central (não recomendado para pacientes com hipotireoidismo ou hipotensos). A administração intraoperatória de medicações deve ser intravenosa e em pequenas doses com intervalos curtos de alguns minutos, a fim de titular as doses mínimas e não administrar doses excessivas desnecessárias. O efeito de cetamina e do fentanil duram de 10-20 minutos, mas toda medicação é eliminada rapidamente quando o paciente está nervoso ou tem taquicardia, porque o metabolismo dos medicamentos é acelerado. Na sala de operação, se o cirurgião estiver sozinho, uma enfermeira ou outra pessoa deve monitorar os sinais vitais do paciente, apesar dos alarmes convenientes dos monitores do oxímetro de pulso ou cardioscópio. Se a anestesia local foi corretamente infiltrada e o paciente acordar durante a cirurgia, o anestesista ou o cirurgião tem que avaliar se é necessária mais sedação, analgesia intravenosa ou anestesia local complementar. O propofol é uma medicação hipnótica com um efeito muito curto que precisa de administração repetitiva ou uma infusão contínua que deve ser monitorada por um anestesista. Para sedação e analgesia, o cirurgião tem de estudar o efeito de algumas drogas que vai usar e combinar, juntamente com as doses ótimas, o metabolismo e os efeitos colaterais. Sob sedação superficial, o paciente pode acordar e secretar epinefrina, que ativa o metabolismo hepático e renal, eleva a pressão arterial e aumenta o metabolismo de medicamentos anestésicos e sedativos. Por esta razão, alguns cirurgiões preferem a sedação profunda. Se o cirurgião desejar operar sob sedação profunda, é preferível ter um anestesista monitorando o paciente. Esta responsabilidade partilhada alivia o estresse do procedimento e contribui para um ambiente mais seguro para o paciente.

Seleção de anestésicos locais O efeito da anestesia local é conseguido por quatro mecanismos: (1) bloqueio nervoso químico, (2) compressão dos nervos, (3) distensão dos nervos e (4) isquemia dos nervos produzida pelos vasoconstritores. O efeito do anestésico depende da concentração da medicação, do uso de epinefrina, do suprimento sanguíneo da área injetada e da espessura dos nervos. Existem várias substâncias anestésicas diferentes, mas cada uma deve ser considerada de acordo com a duração do seu efeito. A experiência do autor em anestesia infiltrativa é com lidocaína e bupivacaína.

Drogas anestésicas A lidocaína é um anestésico muito antigo e seguro que permite 90 minutos de entorpecimento. A sua dosepadrão é de 500 mg para uma pessoa de 70 kg, ou 7 g/kg, ou 25 mL de lidocaína a 2%, mas sabe-se que estas doses podem ser aumentadas muitas vezes (alguns trabalhos mencionam até cinco vezes a dose máxima recomendada) (Fig. 9.1).

FIG. 9.1 Solução anestésica com 25 mL de lidocaína a 2%, 25 mL de bupivacaína a 0,5%, epinefrina (adrenalina) 1/1.000 1 mL e solução salina até 500 mL.

A bupivacaína é um anestésico local de longa duração que é largamente utilizado em bloqueio anestésico e em cirurgia plástica é usado principalmente para o alívio da dor pós-operatória. A sua dose é de 1,25 mg/kg, 25 mL de bupivacaína a 0,50% para uma pessoa de 70 kg sem epinefrina. Na experiência do autor, 3,3 mg/kg podem ser usados com segurança quando ela é muito diluída e com a adição de epinefrina. Esta droga tem um início de 15-30 minutos e bloqueio de condução profundo, que dura cerca de 6-12 horas.

Agentes vasoconstritores A vasoconstrição pode ser obtida por diferentes maneiras. A principal e mais popular medicação é a epinefrina. A concentração-padrão de epinefrina é 1:1.000 e pode ser diluída em 100/500/1.000 mL, obtendo-se uma diluição de 1:100.000, 1:500.000 ou 1:1.000.000. A ação vasoconstritora desta medicação dura de 1-6 horas e provoca efeitos centrais, como taquicardia e hipertensão. A ornipressina é um agente vasoconstritor sem ação central (ela não aumenta a pressão sanguínea nem altera o ritmo cardíaco). O seu efeito vasoconstritor dura de 4-6 horas. Um mililitro pode ser diluído em 250, 500 ou 1.000 mL de solução salina e ser combinado com qualquer anestésico. Todos os vasoconstritores têm a capacidade de produzir isquemia nos nervos periféricos que bloqueia a condução do estímulo. Enquanto a vasoconstrição durar, o mesmo acontece com a anestesia. O nome comercial da ornipressina era Por-8® (Sandoz), mas, no momento, não está sendo comercializada.25

Anestesia carbonatada O pH do anestésico é geralmente de 6,4, o que proporciona algum tipo de dor no momento da infiltração. Para evitar isto, vem sendo defendida a adição de bicarbonato de sódio para elevar o pH para 7,4. A duração da anestesia local quando se usa bupivacaína e anestesia carbonatada é desconhecida. Existem muitas fórmulas que combinam diferentes anestésicos e vasoconstritores. Para grandes cirurgias estéticas, a fórmula de Mottura26-33 é combinar 20 mL de lidocaína a 2% (7 mg/kg), 20 mL de bupivacaína (1,5 mg/kg) e 1 mL de epinefrina 1:1.000. Estas medicações podem ser diluídas em 400-1.000 mL de solução salina ou solução de Ringer lactato (Fig. 9.1).

Seleção da técnica A infiltração de grandes quantidades de anestésicos locais para lipoaspiração é chamada de infiltração tumescente. Isto implica a inflação de grande quantidade de líquido na célula gordurosa, proporcionando um efeito de balão com uma superfície palpável dura. Para realizar a anestesia local adequada, a solução anestésica

deve ser infiltrada por todo o campo cirúrgico de maneira constante, bloqueando todos os ramos nervosos. A infiltração deve começar do lado que o cirurgião acredita ser menos doloroso. Ele deve prosseguir com uma agulha muito fina, injetando lentamente, porque a distensão rápida dos tecidos é dolorosa. Uma vez que a pele esteja anestesiada, a agulha fina é trocada por uma mais longa ou por uma cânula. O lado interno de um Abbocath no 16 ou uma agulha espinal é muito útil.

Para ritidectomia Utilizando-se 400 mL da mesma solução, o couro cabeludo é infiltrado primeiro com uma agulha longa na subderme, debaixo da linha de incisão e 2 cm atrás da linha marcada, para assegurar um melhor efeito de vasoconstrição. Então, a testa é infiltrada sempre profundamente, até a borda orbital e o dorso nasal, continuando depois com as bochechas e o pescoço. Em geral, a infiltração estende-se 2 cm além de toda a área marcada da face e do pescoço, porque a dissecção pode atravessar os limites pré-marcados (Fig. 9.2).

FIG. 9.2 Distribuição de infiltração na face.

A parte média do pescoço, incluindo a pele, bem como os tecidos mais profundos para incorporar o aspecto posterior da gordura central, também é infiltrada para facilitar a dissecção. Quando a infiltração termina, 15 minutos já se passaram e a cirurgia pode começar no couro cabeludo que foi infiltrado primeiro. Em seguida, a face é dissecada e, por fim, o pescoço. Antes da dissecção do plano musculoaponeurótico superficial, esta camada é infiltrada por vasoconstrição e para dissecção hidráulica e separação dos planos. Durante a cirurgia, que pode incluir blefaroplastia, o anestésico geralmente não tem de ser injetado novamente. Alguns cirurgiões usam uma infiltração progressiva. Isto significa que eles injetam o anestésico de modo incremental em diferentes áreas conforme a cirurgia progride. Esta também é uma técnica útil.

Para redução de mama

A quantidade total de solução anestésica utilizada varia de acordo com o volume da mama. Assim, para hipertrofias menores são utilizados 400 mL, para hipertrofias grandes, de 400-500 mL e, para gigantomastias, mais de 600 mL. A infiltração começa na prega submamária com 20-40 mL da solução. Toda a mama é, então, segurada firmemente com uma mão e afastada da parede torácica para apresentar o espaço retroglandular para a infiltração. Esta manobra reduz as superfícies a serem anestesiadas (Fig. 9.3).

FIG. 9.3 Infiltração no plano retroglandular.

Usando um movimento para frente e para trás e uma agulha de 8 cm de comprimento, procura-se a ponta do dedo médio da mão esquerda que está segurando a glândula, infiltrando com a mão direita em forma de leque da prega submamária para cima. A pele é perfurada em três pontos: (1) o lado medial, para bloquear os ramos anteriores do nervo intercostal, (2) o lado lateral, para bloquear o perfurante lateral e (3) o espaço retroglandular medial, para bloquear os perfuradores anteriores que estão sempre nos espaços condroesternais. O espaço retroglandular é fácil de encontrar, pois a agulha desliza para dentro dele sem esforço. Quando a glândula é penetrada, isso pode ser avaliado por causa da resistência do parênquima. Nesta manobra, 60-80 mL da solução são utilizados (Fig. 9.4).

FIG. 9.4 Na prega submamária, três pontos para a distribuição irradiada da anestesia.

O espaço subcuticular seguindo as linhas de incisão e o local onde a aréola será posicionada são preenchidos com anestesia utilizando-se 20-60 mL da solução. Não é utilizada epinefrina debaixo da aréola, especialmente quando um pedículo é planejado. O parênquima é infiltrado transversalmente à pele de uma forma progressiva, onde a lâmina fria irá passar (Fig. 9.5).

FIG. 9.5 Na linha de ressecção, o parênquima é infiltrado para evitar sangramento.

A anestesia restante é mantida no recipiente para posterior infiltração durante a cirurgia, caso seja necessário. Para hipertrofia mamária que necessita de até 1.000 g de ressecção de cada lado, os dois seios são anestesiados simultaneamente, usando menos de 500 mL para cada um. Depois disso, a primeira mama é operada, e os principais pontos de sutura são colocados em pontos-chave para a reconstrução da glândula. Quando a primeira ressecção for concluída, uma quantidade considerável da anestesia já deixou de fazer efeito, então, a cirurgia é realizada na outra mama, utilizando o mesmo método. Após a ressecção, uma quantidade similar de anestesia também já deixou de fazer efeito. Portanto, permanece uma dose menor do que a dose máxima. Após a ressecção e a reconstrução de ambas as mamas, o cirurgião e o assistente completam simultaneamente a sutura da camada subcutânea, a aréola e a pele. Quando a hipertrofia é de mais de 1.000 g por lado, um lado pode ser anestesiado, a cirurgia realizada e, subsequentemente, todo o procedimento repetido do outro lado. Isto evita a possibilidade de absorção maciça e superdosagem. A fáscia pré-peitoral não deve ser lesionada, pois nenhuma anestesia é aplicada sob ela. Como o sangramento é mínimo, o tempo necessário para garantir a hemostasia é pequeno. A hemorragia mínima é decorrente da ampla infiltração de anestesia, assim como do uso de vasoconstritores que constringem os vasos antes de entrar na glândula. O monitoramento intraoperatório (pulso, pressão arterial, eletrocardiograma, monitoramento de Po2) é semelhante ao de outras cirurgias de grande porte. Por causa da perda mínima de sangue, a recuperação é muito rápida e, em geral, a paciente pode receber alta algumas horas depois. Este procedimento pode ser aplicado em diferentes técnicas de redução, modificando-se a infiltração superficial de acordo com a área que irá receber a incisão e a ressecção (Fig. 9.6).

FIG. 9.6 Para a técnica não vertical, o plano subcutâneo profundo é infiltrado abundantemente.

Para o aumento da mama Quando o implante é colocado no espaço pré-peitoral, a solução anestésica e a técnica de infiltração são semelhantes às que são aplicadas na redução de mama. Em caso de aumento subpeitoral ou no aumento transaxilar, deve-se dar especial atenção para a axila de modo a anestesiar o espaço subpeitoral. Para a abordagem axilar, o local da incisão na pele é infiltrado primeiro. Em seguida, com uma agulha de 1012 cm, a região em torno da área subcutânea e o sulco submamário são infiltrados. Então, a ponta da agulha é

direcionada para a superfície anterior da sexta costela, onde começa a tocar e a infiltrar em forma de leque, progredindo medialmente ao esterno e lateralmente à linha axilar anterior. O mesmo é feito na quinta e quarta costelas. A partir da prega submamária e na borda lateral do esterno, a ponta da agulha é movimentada horizontalmente sobre as superfícies anteriores da quarta, quinta e sexta costelas. No lado lateral, segurando-se o músculo peitoral com a mão esquerda, a agulha é dirigida a partir da linha axilar anterior até a superfície anterior da sexta à segunda costela em direção à parte medial da mama. Toda a área das duas mamas a ser dissecada é agora anestesiada (com efeitos vasoconstritores). Os 2-3 cm circundantes fora das linhas pré-marcadas também devem ser infiltrados, uma vez que às vezes o instrumento para dissecar cruza a linha de demarcação. A dissecção hídrica do anestésico também facilita o rompimento das inserções musculares (Fig. 9.7). Deve haver atenção especial para não penetrar o interior do tórax. Isto é especialmente importante em mulheres muito magras, onde os músculos intercostais são finos e especialmente quando há irregularidades nas costelas da parede torácica.

FIG. 9.7 Para o aumento das mamas, toda a área de dissecção é infiltrada. Esta infiltração pode ser subglandular ou subpeitoral.

Para a abordagem submamária, sem infiltração da axila, a técnica de infiltração é a mesma. Para a abordagem subareolar, a aréola e o parênquima são infiltrados em conjunto com o espaço submamário. Em pacientes pequenas, 500 mL de solução anestésica preparada normalmente são utilizados, enquanto em pacientes maiores ou em pacientes que serão submetidos a adenomastectomias e reconstrução da mama, onde os diferentes espaços (subcutâneo, retroglandular e retropeitoral) são infiltrados, 600-800 mL são administrados.

Para abdominoplastias Em torno de 600-800 mL de solução anestésica são preparados. Com o paciente na mesa de cirurgia, a anestesia é injetada profundamente sobre a fáscia (não no tecido adiposo). Com a mão esquerda a adiposidade é pinçada, tentando separar a gordura da fáscia, onde a anestesia tem de ser injetada. Uma agulha fina é usada para perfurar a pele em pontos estratégicos de modo que a anestesia irradia-se a partir deles para cobrir uma área maior. Isso evita ter de infiltrar duas vezes no mesmo lugar ou deixar áreas sem anestesia. Uma agulha maior ou uma cânula também podem ser usadas. Deve-se dar especial atenção às cicatrizes abdominais prévias onde a fibrose residual da fáscia poderia ter envolvido alguns nervos, mostrando, portanto, ser necessário maior cuidado. Durante a operação e dissecção do retalho, o assistente é aconselhado a manipulá-lo com cuidado, porque a tração excessiva poderia produzir alongamento e dor no nervo. Em alguns casos, a anestesia complementar é injetada em torno dos grandes nervos perfurantes sob a fáscia, uma vez que a anestesia muito diluída nem sempre afeta grandes nervos. A fáscia pode ser infiltrada ao longo do músculo reto abdominal

antes ou depois da sutura com uma solução composta por 20 mL de bupivacaína e 100 mL de solução salina que permitirá de 6-8 horas de alívio da dor pós-operatória. Embora diferentes tipos de abdômen possam ser tratados utilizando-se esta técnica, ela é especialmente indicada para abdominoplastias pequenas, limitadas ou padrão (Fig. 9.8). Outros autores relataram sucessos similares.34,35

FIG. 9.8 Para lipoaspiração, o abdome infiltrado.

Para lipoaspirações Preparo a anestesia mais diluída, uma vez que quase toda a gordura precisa ser injetada. Usando esta técnica, as medicações são as mesmas, mas a diluição é maior. Como as regiões infiltradas são aspiradas, então outras áreas são infiltradas com mais solução anestésica. Usando esta técnica, infiltra-se até 3.000 mL de solução anestésica sem complicações intraoperatórias. Faz-se necessário prestar atenção na quantidade de epinefrina usada, pois a injeção de epinefrina em excesso pode causar problemas no SNC. As áreas de extensão semelhante foram anestesiadas como descrito anteriormente, por exemplo, duas áreas trocantéricas com uma adiposidade infraumbilical e várias regiões pequenas, combinadas de maneiras diferentes. A infiltração da área teve que ser feita profundamente sobre a fáscia e na camada subcutânea, mas também teve de superar os limites de adiposidade pré-marcados porque a cânula com frequência ultrapassa a demarcação. Existem áreas, como joelhos, trocanteres ou flancos, em que os anestésicos espalham-se facilmente, enquanto há outras com tecidos mais fibrosos ou trabeculares, como a área supraumbilical, onde os anestésicos permanecem dentro de cada compartimento trabecular e, portanto, a infiltração deve ser realizada com mais precisão. Para lipoaspirações ultrassônica e a laser, todas as camadas de gordura devem ser infiltradas. Às vezes, durante a lipoaspiração, essas regiões precisam de cetamina ou fentanil intravenoso suplementar. Este procedimento é especialmente indicado para adiposidades menores ou moderadas ou lipoaspiração secundária, quando há alguma gordura residual a ser tratada (Fig. 9.9).36-41

FIG. 9.9 Para lipoaspirações ultrassônicas e a laser, todas as camadas de gordura devem ser infiltradas.

Problemas ou complicações Respiração Durante a cirurgia, uma cânula intranasal ajuda a garantir uma boa oxigenação. A principal vantagem do oxímetro de pulso é o alarme que alerta para a queda na percentagem de oxigenação, permitindo a correção a tempo. Se o paciente estiver consciente, diz-se a ele para respirar profundamente. Em pacientes muito sedados, a causa mais comum de obstrução das vias aéreas é o deslocamento posterior da língua. Para corrigir isso, a mandíbula é empurrada para a frente e a cabeça é inclinada para trás, o que avança a língua e abre as vias aéreas. Se a abertura da boca não melhorar a respiração, uma cânula plástica das vias respiratórias laríngea ou traqueal é inserida na boca. Se o paciente ainda não estiver respirando sozinho, uma máscara ligada a um Ambu com reservatório de oxigênio é colocada firmemente sobre o nariz e a boca e, em seguida, o paciente recebe quatro respirações em rápida sucessão, permitindo uma exalação. Isso, felizmente, é uma ocorrência rara.

Hipertensão Algumas vezes, a causa da hipertensão arterial é a medicação intraoperatória com epinefrina, cetamina ou ambas. Nestes casos, a sedação é recomendada com os sedativos habituais, mas, em casos de hipertensão grave, pode ser administrada hidralazina 5 mg ou clorpromazina IV.

Hipotensão

A hipotensão pode ocorrer quando o paciente está sob sedação profunda. Se a pressão arterial sistólica for menor que 70 mmHg, ela está abaixo de um limite seguro. A injeção de solução salina ou de Ringer lactato é infundida rapidamente e em intervalos. Os vasoconstritores ou a atropina são os medicamentos indicados para uso.

Bradicardia Courtiss e Kanter42 afirmaram que um pulso abaixo de 50 batimentos/minuto pode ser observado em atletas. A atropina deve ser suficiente para aumentar este nível. Os casos de bradicardia são raramente observados porque a administração de epinefrina e cetamina produz o efeito oposto: taquicardia.

Taquicardia A taquicardia geralmente ocorre após a administração de cetamina e epinefrina; a frequência cardíaca é acelerada, mas a condução é normal. O tratamento com betabloqueadores usando propranolol é indicado para neutralizar este efeito. A taquicardia não sinusal é dividida em supraventricular e ventricular. A taquicardia supraventricular é controlada por estimulação vagal, como a massagem do seio carotídeo. Se isso não funcionar, verapamil (Isoptin®) deve ser administrado. Se o paciente tiver taquicardia ventricular e a condição geral for satisfatória, lidocaína é administrada. Se a condição geral for ruim, o tratamento consiste em cardioversão elétrica. Em pacientes com certas doenças cardiovasculares, recomenda-se que cardiologistas estejam presentes na sala de cirurgia.

Efeito reverso de sedação excessiva O flumazenil é o antagonista que reverte os efeitos do diazepam e do midazolam, enquanto a naloxona reverte a depressão respiratória e a hipotensão provocada pelos opioides. No entanto, é raramente necessária. Em alguns pacientes sensíveis, os efeitos de sedação duram mais tempo do que o esperado. Para aumentar o metabolismo dos medicamentos, é aconselhável dar pequenas doses de atropina e solução de glicose IV com vitamina C. Esta medicação possui um efeito rápido, e o paciente pode receber alta 1 hora depois.

Interações medicamentosas adversas Certas interações de medicamentos podem ser seriamente prejudiciais aos pacientes. Agentes hipotensores como betabloqueadores, cimetidina, antidepressivos tricíclicos e inibidores da monoamina oxidase não devem ser administrados com epinefrina. Os inibidores da monoamina oxidase interagem com os narcóticos. Para evitar problemas, a medicação de base deve ser interrompida dois dias antes da cirurgia ou a epinefrina deve ser substituída por ornipressina.

Náuseas e vômitos Ambos os sintomas podem ser consequência de: (1) efeitos colaterais dos opioides, (2) um problema digestivo ou (3) uma combinação destes dois. Os opioides causam duas reações: no SNC estimulando o centro do vômito e um efeito espasmogênico no abdome. Os pacientes com patologias gástricas ou biliares são mais sensíveis a estes efeitos colaterais. O objetivo é evitá-los. A acidez gástrica tem de ser neutralizada antes da cirurgia com hidróxido de alumínio, ranitidina ou glicopirrolato; reações espasmogênicas com medicação antiespasmódica (escopolamina) e a ação central podem ser tratadas com metoclopramida ou ondansetrona antes de terminar a cirurgia.

Reação alérgica a anestésicos locais As reações alérgicas a estes anestésicos locais raramente são observadas. O metilparabeno é usado como um composto conservante que é adicionado à solução de anestésico local. Se um paciente tem uma história alérgica relacionada com anestésicos locais (p. ex., no dentista), alguns testes são realizados, e, por fim, os anestésicos puros, sem conservantes, são usados.

Dois órgãos podem ser afetados por doses excessivas de absorção de anestésicos locais: o cérebro e o coração. As doses elevadas de anestésicos concentrados podem ser acidentalmente injetadas por via intravenosa ou intra-arterial. O cérebro é mais suscetível do que o miocárdio, consequentemente os primeiros sintomas de toxicidade estão relacionados com o SNC e mais tarde com a disfunção miocárdica.

Toxicidade no sistema nervoso central Os sinais e os sintomas variam de leves a severos. Em ordem crescente de gravidade, a seguinte sequência de sinais e sintomas pode ocorrer: entorpecimento da boca e da língua, zumbidos, vertigens, distúrbios visuais, fala arrastada, espasmos musculares, inconsciência, convulsões generalizadas, apneia e coma. A toxicidade para o SNC é intensificada por acidose e hipóxia por causa de um rápido consumo de oxigênio após as convulsões.

Toxicidade cardiovascular A toxicidade cardiovascular é decorrente de desaceleração da condução no miocárdio, depressão do miocárdio e vasodilatação periférica. Ela pode ser observada após 2-4 doses de anestésicos locais com efeitos convulsivantes terem sido injetadas. A toxicidade desta medicação é rara e está relacionada com a absorção de dosagem excessiva em massa ou injeção intravascular. A reação à toxicidade por bupivacaína no SNC é semelhante à reação experimental descrita para a lidocaína mas, após a administração intra-arterial, os efeitos cardiovasculares de arritmias ventriculares ou fibrilação podem levar a um resultado fatal. Deve-se ter cuidado especial ao escolher esta medicação para pacientes com insuficiências cardíacas graves. Ela não deve ser utilizada em associação com tocainida, um antiarrítmico, já que os efeitos tóxicos são adicionados. A dose letal desta medicação foi testada em cães. Procurando-se o limite da dose, os cães recebiam uma injeção intraarterial de uma dose letal. Quando a parada cardíaca aparecia, ela não podia ser revertida como quando a lidocaína era utilizada. Desde então, este conceito é repetido ao longo do tempo. No caso de injeção intraarterial ou intravenosa de bupivacaína concentrada pura, a parada cardíaca pode ocorrer, como é o caso relatado por Ersek.43

Tratamento de toxicidade Caso se deseje um tratamento eficaz, o diagnóstico precoce deve ser estabelecido (Quadro 9.1). Q uadr o 9. 1 Dia gnóst ico pre coce de t ox icida de 1. Oxigenação com reservatório de oxigênio, máscara ou intubação 2. Anticonvulsivantes: diazepam 10-20 mg IV ou tiopental 100-150 mg IV 3. Se a hipotensão ocorrer: epinefrina 15-30 mg IV 4. Se há parada cardiorrespiratória: • Ressuscitação cardiopulmonar enérgica • Epinefrina 1 mg IV ou intercardíaca • Fibrilação ventricular por alta conversão de energia • Bretílio 80 mg como antiarrítmico Como Baker e Gordon uma vez declararam: “dê oxigênio, pare as convulsões.”18

Discussão Diferentes ações da anestesia local Utilizando-se uma grande infiltração de solução com medicação anestésica, a anestesia é conseguida por meio de diferentes mecanismos fisiopatológicos. O mais antigo foi descrito por Halstead2 em 1885. Ele sugeriu que, mesmo após a injeção de água, a distensão da membrana celular dos nervos produz uma alteração na transmissão nervosa, obtendo algum tipo de anestesia. Esta foi uma observação brilhante, 100 anos antes do advento da tumescência. Então, Vishnevsky44,45, descrevendo uma infiltração de 1-2 litros de solução de novocaína muito diluída a 0,25% cunhou a frase “infiltração gradual em massa”.

O quanto dura a ação da anestesia depende não só do componente químico da substância como também da adição e da concentração de epinefrina. Se o paciente estiver adormecido durante a cirurgia, a pressão arterial permanece baixa e a vasoconstrição dura mais tempo. Quando o paciente está acordado, a pressão sanguínea aumenta, os capilares e as artérias abrem, a absorção do anestésico local acelera e, então, o fígado acelera o metabolismo hepático dos medicamentos.

Absorção de anestésicos locais Nem todos os tecidos têm a mesma taxa de absorção de anestésicos. De acordo com um estudo experimental em suínos, publicado em 2001,33 três áreas foram estudadas: (1) o abdome, (2) a face e pescoço e (3) as áreas peitorais. Na primeira parte do estudo, demonstrou-se que durante uma abdominoplastia, uma quantidade considerável de anestésico é perdida (aproximadamente 50%) na incisão, dissecção e remoção dos tecidos. Isso está de acordo com nossa experiência clínica pessoal. Na segunda parte do estudo, em que três áreas diferentes foram injetadas, os níveis mais elevados de absorção foram encontrados no estudo torácico, em que o músculo peitoral foi infiltrado. Isso ocorreu muito possivelmente por causa da distribuição do anestésico nas fibras musculares e na axila, onde há um suprimento sanguíneo muito rico. A absorção menor foi encontrada no estudo abdominal, em que a infiltração foi executada na camada subcutânea. Os níveis de absorção na face e pescoço estavam no meio, mais do que no abdome e menos do que no tórax, talvez porque o tecido envolvido tinha um suprimento de sangue maior do que o tecido abdominal, mas menor do que o músculo peitoral. De acordo com Kenkel et al.,46 todas as análises de pacientes lipoaspirados mostraram que 9,1%-10,8% (média de 9,7%) da dose infiltrada foram removidos durante a lipoaspiração. Níveis teciduais de lidocaína abaixo de 5 µg/mL foram demonstrados em um estudo de microdiálise de 4-8 horas.

Efeito vasoconstritor da epinefrina Em pequenos capilares, após 15 minutos de vasoconstrição, ocorre a coagulação intravascular. Os vasos grandes sangram, mas pouco, então a hemostasia é mais fácil e mais rápida. O sangramento rebote não é observado. De acordo com minha observação pessoal, a vasoconstrição da pele dura de 2-6 horas, dependendo da pressão sanguínea do paciente.

Toxicidade de anestésicos A toxicidade do anestésico local está relacionada com a dosagem excessiva e com a administração intravascular. A lidocaína pode ser usada em doses cinco vezes maiores do que 7 mg/kg, recomendada pelo fabricante quando é utilizada em grandes diluições. Uma solução consistindo de 20 mL de lidocaína a 2% em 800 mL de solução salina tem uma concentração de lidocaína de 0,04%. No sangue testado durante as cirurgias de redução de mama, o pico mais alto foi de 0,67 µg/mL29 porque a grande diluição do medicamento e o efeito vasoconstritor da epinefrina atrasam a absorção. O pico de concentração da lidocaína variou entre 0,9 e 3,6 µ/mL e ocorreu entre 6 e 12 horas do pós-operatório.47 A epinefrina (1:1.000.000) atrasa significativamente a absorção da lidocaína administrada pela técnica de tumescência.48 Como uma alternativa para o conceito da técnica de tumescência, Fodor49 descreveu a técnica superúmida que consiste na infiltração de 1 mL de solução de anestésico por 1 mL de gordura aspirada, diminuindo, assim, a quantidade total de infiltração. Na cirurgia plástica, usamos bupivacaína normalmente no espaço subcutâneo, diluída principalmente e com a adição de epinefrina. Portanto, a absorção de bupivacaína diluída nesta situação é lenta. Também argumentou-se que, usando-se a sedação, os sintomas de toxicidade do anestésico não aparecem. Em uma tentativa de testar a bupivacaína no sangue durante cirurgias estéticas de grande porte, enviei amostras de sangue para serem analisadas. O laboratório fez várias tentativas de encontrar essa medicação no sangue, mas, embora o método utilizado possa testar níveis de bupivacaína acima de 35 mg/mL, eles não foram capazes de encontrar qualquer vestígio da medicação em meus pacientes. Isto é mais provável porque a grande diluição da medicação e o efeito vasoconstritor da epinefrina atrasam a absorção. Farley et al.50 também relataram que o uso de bupivacaína na solução úmida para a lipoaspiração é seguro. Frushstorfer et al.51 e Tolbet Wilkingson (comunicação pessoal) relataram uma mistura de lidocaína e bupivacaína utilizando 50% da dose máxima de cada fármaco, evitando, desse modo, a dosagem excessiva. Tolbet Wilkingson relatou ter

experiências em ritidectomias, aumento de mama e redução de mama com 6-12 horas de conforto do paciente sem qualquer sinal de toxicidade da medicação. Em 1997, Joseph Hunstadt52 relatou sua experiência em injetar a parede abdominal antes da cirurgia em uma técnica tumescente com uma solução de Marcaína® muito diluída. Pouco antes da sutura final do retalho, ele injetou no tecido areolar e subfacial, na periferia de toda a dissecção, observando que esta forma é mais efetiva do que quando injetada lateralmente na plicatura das fáscias. No aumento subpeitoral de mama, após a conclusão do procedimento, através de um cateter vermelho de Robinson, ele administrou uma solução de Marcaína® e epinefrina diluída que permeia a loja dissecada e literalmente atua como um bloqueio regional. Ele usa uma solução de 30 mL de bupivacaína a 0,25% e 100 mL de solução salina, utilizando a metade da solução na loja de cada mama. Outros cirurgiões relataram experiências e resultados semelhantes. Também foi relatado por Jim Carraway (comunicação pessoal) que, na abdominoplastia, injetar Marcaína® lateralmente à plicatura fascial medial oferece muitas horas de alívio da dor após a cirurgia. A bupivacaína também foi usada para algumas outras cirurgias como cirurgia pediátrica e neurocirurgia.53 Na minha experiência de mais de 4.000 casos de procedimentos estéticos de grande porte utilizando bupivacaína e lidocaína em grandes diluições, não observei um único caso de toxicidade dessas medicações. Quando se utiliza a anestesia geral, infiltro da mesma maneira. A vasoconstrição facilita o prolongamento do efeito anestésico. Não acredito que depositar a bupivacaína na loja cirúrgica tenha o mesmo efeito analgésico pós-operatório do que quando todos os tecidos são infiltrados com este fármaco.

Epinefrina A epinefrina 1:1.000 é adicionada a quase todas as soluções anestésicas. É sempre usada muito diluída e infiltrada na camada subcutânea. Na lipoaspiração, utiliza-se 1/1.000.000. Parece que na lipoaspiração 7,5 mg54 ou 10 mg55 podem ser usados com segurança. O pico mais alto de absorção é de 1-4 horas após a infiltração. Como os sinais de toxicidade de epinefrina são taquicardia, hipertensão e arritmias cardíacas, os pacientes com história de taquicardia, hipertensão ou arritmias cardíacas não devem ser infiltrados com esta solução anestésica. Os picos de epinefrina são comparáveis a estresse fisiológico maior ou cirurgia abdominal de grande porte. Em um estudo realizado por Brown et al.,54 a infiltração média de epinefrina foi de 7,5 mg, e o pico de absorção foi de 1-4 horas após a infiltração local, e a vasoconstrição prolongou o tempo de absorção.

Anestesia carbonatada O pH do anestésico é geralmente 6,4, o que faz com que ocorra alguma dor no momento da infiltração. Para se evitar isto, é defendida a adição de bicarbonato de sódio para elevar o pH para 7,4. A solução alcalina de anestésico foi descrita no início do século passado quando Läwen5,6 e Grös4 determinaram que a adição de bicarbonato prolongava os efeitos da anestesia por um fator de 2. Caso se deseje prolongar o efeito anestésico, uma solução anestésica alcalina pode ser utilizada. O efeito da adição de bicarbonato à bupivacaína é desconhecido.

O efeito preemptivo dos anestésicos locais Este conceito significa que a dor pode ser prevenida antes de começar. A antecipação do reflexo da dor reduz a medicação analgésica pós-operatória. Quando o reflexo espinal de dor começar, mesmo quando o paciente estiver sob anestesia geral, a incisão inicia o reflexo de dor. A infiltração de anestésicos locais sob as linhas de incisão evita o início deste reflexo. Bourget et al.,56 em um estudo com 200 pacientes consecutivos submetidos à laparotomia eletiva, não foram capazes de corroborar esta teoria e concluíram que não se conseguia controlar melhor a dor com infiltração pré-incisional do que com infiltração pós-incisional de bupivacaína. Isso levanta a questão do benefício da anestesia preemptiva no nível local no pós-operatório de longo prazo. Deixar a bupivacaína na área de dissecção também parece ter sucesso no controle da dor pós-operatória. A ação anestésica pode ser produzida como consequência de uma única administração de bupivacaína no final do procedimento, conforme defendido por Hunstadt52 e Mahabir et al.57 ou por uma bomba de infusão, como descrito por Losken et al.,58 Baroody et al.,59 Lu,60 Pacik et al.,61 Azmier et al.62 e McCarthy et al.63 A infiltração no pré-operatório e a administração no pós-operatório de bupivacaína são efetivas no controle da dor pós-

operatória, mas não é claro qual destes três procedimentos proporciona alívio/controle mais eficaz da dor e melhor satisfação dos pacientes com a relação custo-benefício. O efeito do anestésico local é consequência de vários mecanismos de ação: (1) a ação química no axônio de transmissão, (2) a distensão hidrolítica dos nervos quando algum tipo de tumescência é injetada e (3) o efeito vasoconstritor da epinefrina que produz a isquemia nos nervos e, consequentemente, a anestesia, bem como retarda a absorção dos anestésicos injetados. A capacidade de realizar cirurgia plástica abdominal em dependências ambulatoriais proporciona um ambiente mais confortável para o paciente, facilita o agendamento para o médico e diminui os custos. Evitar o uso de anestesia geral permite uma recuperação mais rápida, menor tempo de permanência no hospital e menor taxa de complicações pós-operatórias.

Conclusões Para as operações que usam sedação e anestesia local, a seleção do paciente e da sedação adequada, a fórmula do anestésico e a técnica de administração, bem como a toxicidade da dose usual de cada fármaco, devem ser cuidadosamente consideradas. Os principais conceitos utilizados na administração de anestesia local são a grande diluição de fármacos, metade da anestesia é perdida durante a cirurgia, a infiltração profusa facilita a cirurgia e traz algumas horas de analgesia pós-operatória. Talvez leve tempo para aprender, mas é altamente conveniente quando o cirurgião pode evitar o uso de miorrelaxantes, opioides e os gases de anestesia geral. Com a infiltração de anestésico local, as cirurgias são menos desgastantes, há menos sangramento e o período pós-operatório imediato é indolor, o que é muito gratificante. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  16. Iverson, R. Sedation and analgesia in ambulatory settings. Plast Reconstr Surg. 1999; 104:1559–1564. Esta é uma diretriz prática clínica para anestesia no estabelecimento de procedimentos de cirurgia plástica de paciente não internado. Uma base elementar prática é fornecida abrangendo tópicos que variam de farmacologia a tratamento pós-operatório.

17. Colon, G. A., Gubert, N. Lorazepam (Ativan) and fentanyl (Sublimaze) for outpatient office plastic surgical anesthesia. Plast Reconstr Surg. 1986; 78:4. Esta é uma diretriz prática clínica para anestesia no estabelecimento de procedimentos de cirurgia plástica de pacientes não internados. Uma base primordial prática é fornecida abrangendo tópicos que variam de farmacologia a tratamento pós-operatório.

21. Vinnik, C. A. Is there a place for the use of ketamine in plastic and reconstructive surgery? Ann Plast Surg. 1980; 4:85–87. Uma breve série de correspondências é apresentada descrevendo os argumentos a favor e contra o uso de cetamina em procedimentos de cirurgia plástica em pacientes não internados. Estas peças ressaltam os pontos principais que um profissional deve considerar ao decidir se emprega ou não este potente agente.

30. Mottura, A. A. Local infiltrative anesthesia for transaxillary subpectoral breast implants. Aesth Plast Surg. 1995; 19:37–39. Uma série de casos é apresentada para ilustrar a efetividade da anestesia local para aumento de mama e procedimentos de reconstrução de mama selecionados. Os detalhes técnicos de bloqueio são fornecidos, seguidos por um resumo dos resultados.

32. Mottura, A. A. Local anesthesia for abdominoplasty, liposuction and combined operations. Aesth Plast Surg. 1993; 17:117–124. Este relato detalha uma técnica para anestesia local em abdominoplastia e lipoaspiração. Como a maioria da anestesia infiltrada foi removida, e as soluções estavam bastante diluídas, doses totais mais altas poderiam ser administradas seguramente.

52. Hunstadt, J. Marcaine induces clinically beneficial analgesia in the inmediate postoperative period. Aesth Surg J. 1997; 17:269–270. Este é um ensaio sobre a adequabilidade da Marcaína para uso em procedimentos de cirurgia plástica em ®

pacientes não internados. Encontrou-se que o agente é muito efetivo quando utilizado sob circunstâncias cuidadosamente controladas, mas as possíveis complicações de um bolus IV são bastante sombrias.

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Medicina baseada em evidências e pesquisa em cirurgia plástica nas organizações de saúde Carolyn L. Kerrigan, E. Dale Collins Vidal, Andrea L. Pusic, Amy K. Alderman e Valerie Lemaine

Resumo Os pontos-chave deste capítulo abordam sobre como: Reunir evidências existentes nos resultados. Analisar as evidências sobre os desfechos clínicos. Traçar novos estudos para acrescentar evidências aos resultados terapêuticos. Identificar e analisar fontes de dados existentes para criar novas evidências baseadas em desfechos clínicos. Captar a perspectiva dos pacientes baseada nos resultados. Reconhecer a importância da dimensão de uma evidência: a perspectiva dos pacientes. Considerar a magnitude dos custos na aquisição dos resultados de pesquisas. Entender os desafios e abordagens na tradução da boa evidência na prática clínica diária.

Os médicos precisam tomar decisões complexas em situações de incerteza – frequentemente dispondo de informações incompletas, incertas ou desatualizadas. O objetivo da pesquisa baseada em resultados é melhorar a informação disponível no momento dessas decisões complexas. É importante entender que essa avaliação não é simplesmente sobre o resultado final de nossas intervenções. Mais importante do que isso é o meio pelo qual reunimos evidências para melhorar a tomada de decisões, os processos dos cuidados e os sistemas nos quais trabalhamos. O aprimoramento dos cuidados com o pacientes, e dos resultados cirúrgicos depende de esforços contínuos para identificar a informação necessária e para produzir a melhor evidência que satisfaça tais necessidades.

A melhor evidência – onde encontrar? Há duas maneiras de obter as melhores evidências no momento da tomada de decisão a fim de melhorar a qualidade dos cuidados (Fig. 10.1). A primeira é avaliar dados existentes e identificar informações convincentes baseadas em modelo de estudo adequado e em resultados clinicamente significativos. Quando não há evidência adequada, a segunda opção é produzir uma nova evidência confiável. Esta seção vai abordar uma estrutura para avaliar as evidências existentes e, em seguida, introduzir métodos para produzir evidências melhores.

FIG. 10.1 A melhora na assistência está vinculada à melhor evidência.

Avaliação da literatura existente São necessários três fatores para obter a melhor evidência: (1) um desenho do estudo adequado; (2) uma análise estatística apropriada; e (3) resultados clinicamente significativos. Em uma revisão minuciosa, Offer e Perks1 enumeraram os desafios que os cirurgiões plásticos enfrentam ao tentarem praticar medicina baseada em evidências. Segundo os autores, o fator principal é a falta de evidências de qualidade em nossa literatura. Fazendo uma análise superficial desta, temos uma grande proporção de artigos abordando descrições de procedimentos e resultados pessoais de cada cirurgião individualmente, e os “resultados” desses procedimentos nas mãos daquele cirurgião. Esses estudos, conhecidos como relatos de casos ou série de casos, têm uma aplicabilidade limitada e não são estruturados, não comparativos, nem randomizados. Isso não é apenas uma evidência fraca para a tomada de decisões médicas, mas não é uma forma aceitável para tomar tais decisões, visto que atualmente alguns países como Reino Unido e EUA passam por uma reforma do sistema de saúde em que os prestadores de serviço são remunerados pela qualidade do serviço prestado pay for performance (P4P).2 Assim como ilustrado na Figura 10.1, quanto mais forte a evidência, melhor o atendimento ao paciente.

Estratégias de pesquisa na literatura A prática da medicina baseada em evidências envolve a busca dos melhores estudos disponíveis, avaliando os estudos relevantes pela validade e então traduzindo a evidência para otimizar os cuidados com o paciente.3 Muitas questões clínicas permanecem sem resposta em razão dos problemas na formulação de perguntas relevantes, falta de acesso às fontes de informação e falta de habilidade em pesquisar.4 Atualmente, há uma variedade de estratégias e recursos na internet que permitem pesquisas da literatura relevante para responder a muitas questões clínicas.4 Alguns exemplos serão descritos em seguida.

PubMed A US National Library of Medicine permite acesso a mais de 16 milhões de citações por meio do PubMed, com acesso às referências do MEDLINE e diretamente às dos periódicos.4 A informação das pesquisas no PubMed tem trazido significativa melhora tanto nos cuidados com o paciente quanto em resultados na saúde.4

Clinical Queries O Clinical Queries é uma ferramenta do PubMed que pode ajudar a identificar citações em pesquisas do assunto

de interesse. É possível vincular um tipo de questão (p. ex., intervenção, diagnóstico, história natural e resultados) a uma estratégia de pesquisa específica para um desenho de estudo desejado que especifica a proposta de estudo desejada.4

PICO* O primeiro passo crítico na busca da medicina baseada em evidências é fazer uma questão bem formulada.4 Sem foco suficiente e específico, uma questão clínica importante pode ser baseada em evidência irrelevante.4 Quando a regra mnemônica PICO é utilizada com o Clinical Queries do PubMed (ver anteriormente), ocorre uma melhora na eficiência da pesquisa na literatura.4 A regra mnemônica PICO é aplicável a problemas com pacientes, intervenção, comparação e resultados, e é uma estratégia para apresentar uma questão bem formulada.4 Em uma busca de evidências em cirurgia plástica na literatura, por exemplo, a questão formulada utilizando a regra mnêmonica PICO pode ser expressa da seguinte maneira: em pacientes submetidos à redução de mamas (P), profilaxia pré-operatória com antibióticos (I) versus ausência de profilaxia (C), qual é a taxa de infecções pós-operatórias (O)?

Metanálise Conceitualmente, uma metanálise é a soma e a análise dos resultados procedentes de múltiplos estudos primários realizados em locais e momentos diferentes por grupos de pesquisa independentes com o objetivo de aumentar o tamanho da amostra, desse modo consolidando as conclusões que podem ser obtidas de um artigo individual. Essa análise permite que os pesquisadores obtenham uma conclusão mais confiável quando há resultados conflitantes em diferentes estudos.5 A metanálise é conduzida preferencialmente utilizando-se do mais alto nível de evidência, como os ensaios clínicos randomizados controlados. Embora possa ser também conduzida em estudos de coorte e até mesmo em relatos de casos, a qualidade da evidência e, portanto, as conclusões são mais fracas. A metanálise tem algumas desvantagens. Primeiramente, tem sido criticada pelos critérios de inclusão excessivamente amplos e, em contrapartida, por critérios de inclusão demasiadamente rígidos. Ambos podem resultar na degradação dos resultados. Os critérios de inclusões excessivamente amplos podem levar à inclusão de estudos de menor qualidade ou com resultados menos confiáveis. Critérios de inclusão demasiadamente rígidos podem significar que os estudos incluídos apresentam limitada generalização. Outra desvantagem é que as metanálises são caras e requerem um período significativo de comprometimento da equipe de pesquisa. A técnica da metanálise pode apresentar limitada aplicabilidade em cirurgia plástica, pois há poucos ensaios randomizados, além de as medidas de um estudo para outro variarem consideravelmente. Um exemplo de metanálise pode ser observado na Figura 10.2.6 Essa figura demonstra uma análise de ensaios que avaliam o impacto do tamoxifeno na sobrevida de pacientes com câncer de mama precoce. Como o leitor pode observar, há múltiplos estudos, com os achados de cada um deles representados em um eixo central. A análise dos resultados, que incorpora dados de cada estudo, aparece na parte inferior do eixo vertical e sugere um benefício ao uso do tamoxifeno em câncer de mama precoce. Observa-se um intervalo de confiança de 95% para as medidas desse estudo, considerado bastante pequeno. Isso implica uma melhor estimativa da questão do benefício real do tamoxifeno. Note também que a qualidade intrínseca de cada estudo é utilizada para determinar seu impacto no escore dos estudos.

FIG. 10.2 Metanálise de ensaios controlados randomizados avaliando o impacto do tamoxifeno adjuvante na sobrevida entre mulheres com câncer de mama precoce.6 Múltiplos estudos foram incluídos, com os achados de cada um plotados no eixo central. Os dados são representados como uma razão de chances (a razão de chances, similar ao risco relativo, relata a proporção entre uma ocorrência e uma não ocorrência). A análise resumida, que incorpora dados desses estudos, aparece na parte inferior do eixo vertical e sugere um benefício para o uso do tamoxifeno adjuvante no câncer de mama precoce.

Mais recentemente, pesquisadores conduziram uma metanálise de ensaios controlados randomizados comparando taxas de contratura capsular utilizando implantes lisos e texturizados. Esses autores identificaram sete ensaios controlados randomizados relacionados com essa questão. Individualmente, quatro dos sete estudos não apresentaram uma diminuição estatisticamente significante na taxa de contratura nos implantes texturizados. Entretanto, quando os resultados dos estudos foram coletados, a metanálise sugeriu que os implantes texturizados apresentaram menores taxas de contratura.7 Para ver outros exemplos de metanálises de boa qualidade, o leitor deve consultar as revisões on-line de Cochrane.8

Revisões sistemáticas Revisões sistemáticas são avaliações da literatura conduzidas de acordo com métodos de pesquisa científica claramente especificados, criados para minimizar o risco de tendências e os erros associados às tradicionais revisões de literatura. O processo de revisão inclui uma pesquisa detalhada baseada em critérios definidos e uma minuciosa avaliação da qualidade e validade dos estudos identificados no processo de pesquisa.9 A fonte mais conhecida para revisões sistemáticas é a base de dados de revisão sistemática do Cochrane Database of Systematic Reviews, que contém mais de 3.600 revisões completas.8 O grupo Cochrane também fornece um manual para revisões sistemáticas em intervenções que prescreve sete passos para o preparo de uma revisão: 1. Estruturação da questão. 2. Identificação de possíveis estudos para inclusão. 3. Avaliação dos estudos selecionados. 4. Coleta de dados e síntese. 5. Análise dos resultados. 6. Discussão dos achados. 7. Atualização das revisões. Revisões sistemáticas são ferramentas influentes no apoio da prática baseada em evidências, e alguns as consideram fornecedoras de evidências mais fortes em relação aos ensaios controlados randomizados. Além disso, são essenciais para sintetizar os dados existentes, evitando esforços desnecessários resultantes da duplicação de estudos prévios.9 Para ver outros exemplos de revisões sistemáticas, o leitor deve consultar as revisões on-line de Cochrane.8

Desenhos de estudo e níveis de evidência De modo geral, os desenhos de estudo podem ser divididos em estudos experimentais e observacionais. Estudos experimentais, que incluem ensaios clínicos controlados randomizados, ensaios preferenciais de pacientes e estudos maiores, ensaios multicêntricos, testam uma hipótese analisando o impacto de uma intervenção sobre seu desfecho clínico. Contrariamente, estudos observacionais, que incluem estudos de coorte, estudos de caso-controle, séries de casos e relatos de casos descrevem a história natural ou a incidência da doença ou analisam associações entre fatores de risco e resultados de interesse. Como se pode esperar, geralmente há uma correlação direta entre a complexidade do desenho de um estudo e a qualidade dos dados resultantes (Tabela 10.1). Tabela 10.1 Níveis de evidência Nível de evidência

Tipo de estudo

Características

Nível I

Ensaio controlado randomizado

Dois grupos aleatoriamente selecionados, um funcionando como controle, com uma comparação cega de resultados de uma intervenção

Nível II

Estudos de coorte prospectivos e retrospectivos

Um único grupo acompanhado ao longo do tempo e avaliado para fatores de risco relativos aos resultados ou incidência de doença

Nível III

Estudo de caso-controle

Dois grupos, um com e outro sem doença, com uma comparação de fatores de risco relativos aos resultados

Estudo clínico bem-desenhado

Desenho de estudo experimental com uma intervenção e um braço-controle comparado para resultados

Estudo transversal de coorte

Um único grupo avaliado em um único ponto no tempo para prevalência de doenças ou fatores de risco

Séries de casos

Um grupo único de casos consecutivos identificados por uma doença ou condição e acompanhados ao longo do tempo

Opinião de especialista

Opinião baseada em experiência e revisão de literatura

Relatos de casos

Um pequeno grupo identificado por uma doença ou condição e acompanhado ao longo do tempo

Nível IV

Nível V

Adaptada da American Society of Clinical Oncology.

Estudos experimentais Ensaios clínicos controlados randomizados O ensaio clínico controlado randomizado talvez seja o mais complexo entre os desenhos de estudo experimental, e é o padrão no qual os outros devem-se apoiar. O desenho do ensaio controlado randomizado evoluiu após um período de muitos anos, e cada componente dos desenhos tenta minimizar a influência de viés de estudos e variáveis de confusão nos resultados. O objetivo final é criar uma amostra populacional que seja realmente representativa de um todo. Desse modo, os resultados de um ensaio limitado podem ser generalizados para uma população ampla com confiabilidade. De acordo com os National Institutes of Health, ensaios clínicos são conduzidos em quatro fases, cada uma servindo a um diferente propósito e auxiliando os pesquisadores a responderem a diferentes questões (Tabela 10.2). Na fase I, uma substância ou intervenção experimental é avaliada em um pequeno número de indivíduosteste (20-80) para avaliar sua segurança, determinar uma curva dose-resposta e identificar potenciais efeitos colaterais. Na fase II, a substância ou a intervenção experimental é dirigida a um grupo maior de indivíduos (100-300) para testar sua eficácia e para uma avaliação mais ampla de seu perfil de segurança. Na fase III, a substância ou a intervenção experimental é dirigida a um grupo muito mais amplo (1.000-3.000), com o objetivo de “confirmar sua eficácia, monitorar efeitos colaterais, comparar aos tratamentos normalmente utilizados e coletar informação que permita seu uso de modo seguro”. Na fase IV, um monitoramento pós-marketing é mantido para identificar informações adicionais sobre riscos, benefícios e uso ideal da intervenção.10

Tabela 10.2 Quatro fases dos ensaios clínicos Fase Finalidade I

Testar uma substância ou tratamento experimental em 20–80 pessoas para avaliar segurança, determinar uma faixa segura de dosagem e identificar efeitos colaterais

II

Testar uma substância ou tratamento experimental em 100–300 pessoas para determinar a eficácia e avaliar sua segurança

III

Testar uma substância ou tratamento experimental em 1.000–3.000 pessoas para confirmar a eficácia, monitorar os efeitos colaterais, comparar aos tratamentos comumente utilizados e coletar informação que permita seu uso com segurança

IV

Estudos de pós-marketing para aprender mais sobre os riscos, benefícios e uso ótimo da substância ou do tratamento

Infelizmente, ensaios controlados randomizados são caros e frequentemente impraticáveis para responder a questões que comparam um tipo de intervenção cirúrgica a outro.11,12 Enquanto pacientes frequentemente estão dispostos, de forma randômica, a tomar um medicamento real versus placebo, poucos se interessam em passar por uma técnica cirúrgica versus outra ou por uma simulação de procedimento. Ainda assim, cirurgiões frequentemente apresentam forte preferência por um tipo de cirurgia em relação a outro, não se interessando, dessa maneira, em randomizar os pacientes.13 Embora os ensaios clínicos controlados randomizados sejam considerados “padrão-ouro”, não deixam de apresentar limitações.11 Por exemplo, as hipóteses subjacentes dos ensaios clínicos controlados randomizados podem não ser válidas.11 O tratamento preferencial entre duas alternativas pode não estar claro; a evidência dos efeitos de um tratamento em outras fontes pode ser insuficiente; apenas efeitos específicos resultantes da intervenção são terapeuticamente válidos; e somente quando os critérios de inclusão e exclusão do ensaio correspondem às características individuais de um paciente o resultado do estudo pode ser totalmente transferido à prática clínica.11 Além disso, ensaios clínicos controlados randomizados são inadequados para estudar efeitos adversos pouco frequentes ou tardios; são difíceis, se não impossíveis, de ser conduzidos para o estudo de doenças raras; e, embora os benefícios e prejuízos de uma intervenção possam ser bem reconhecidos, sua extensão ou significância nem sempre é bem reconhecida.12

Alternativas para os ensaios clínicos controlados randomizados Na prática, os ensaios clínicos controlados randomizados frequentemente apresentam desafios logísticos e problemas éticos, que limitam os tamanhos das amostras.14,15 Entretanto, alternativas aos ensaios clínicos controlados randomizados são necessárias. Ensaios preferenciais em pacientes Quando os pacientes ou cirurgiões apresentam forte preferência por um tratamento e recusam a randomização, os pacientes podem se submeter a um ensaio preferencial. Um ensaio preferencial é aquele no qual o paciente recebe as opções de tratamento, ao contrário dos ensaios randomizados. Pacientes que apresentam clara preferência recebem o tratamento escolhido, enquanto aqueles que não manifestarem uma preferência serão randomizados.16-18 Dessa maneira, tanto randomizados quanto não randomizados são avaliados juntos, sob o mesmo protocolo, além do tratamento atribuído. Há uma variedade de opiniões acerca da validade e utilidade desse desenho de estudo. Alguns pesquisadores acreditam que complementam, em vez de substituir, os ensaios clínicos controlados randomizados.17 Ensaios preferenciais têm sido criticados por apresentarem resultados que podem não ser generalizáveis em razão de fatores inerentes ao permitir que pacientes com forte preferência selecionem seu próprio tratamento. Os pacientes que preferem um tratamento específico podem ser mais complacentes em relação a outros que não apresentam essa preferência. Esse e outros potenciais impactos da preferência de um paciente no resultado real ainda não são interferências bem estudadas para que sejam considerados. Além disso, particularmente em pequenos estudos, há uma incapacidade em controlar totalmente potenciais variáveis de confusão que podem diferir significativamente entre os grupos de tratamento.17 Os defensores dos ensaios preferenciais acreditam que os indivíduos que escolhem seu tratamento podem ser mais representativos de pacientes na prática clínica real e fornecer percepções no processo de tomada de decisão do paciente.16 Ensaios multicêntricos grandes

Quando um número insuficiente de pacientes é submetido a um ensaio clínico controlado randomizado, os pesquisadores podem optar por utilizar ensaios multicêntricos grandes para aumentar o tamanho da amostra.16 Um ensaio clínico controlado multicêntrico apresenta os mesmos requisitos de um ensaio unicêntrico, e cada centro de pesquisa deve seguir o mesmo protocolo, com idênticos critérios de inclusão e exclusão, estratégias de randomização, intervenções e métodos para obtenção e avaliação de resultados.14 Entretanto, alguns pesquisadores encontraram variabilidade em cirurgias e técnicas cirúrgicas em ensaios multicêntricos.16

Estudos observacionais Dada a dificuldade de execução de um ensaio controlado randomizado, o segundo melhor nível de evidência é produzido por um bom estudo experimental ou um estudo coorte bem desenhado, este último apresentando algumas, porém não todas, as características de um ensaio controlado randomizado. Embora se acredite amplamente que estudos observacionais sejam menos válidos, frequentemente superestimando a magnitude dos efeitos terapêuticos, há ao menos diversos relatos sugerindo que bons estudos observacionais podem fornecer o mesmo nível de validade interna que os ensaios randomizados.19,20

Estudos de coorte Os estudos de coorte avaliam um grupo em risco de doença. A avaliação pode ocorrer ao longo do tempo ou em um único momento. Este último ainda é denominado estudo de coorte transversal e é frequentemente utilizado para a obtenção de dados da prevalência da doença. Um segundo uso comum dos estudos de coorte é para analisar fatores de exposição que coloquem indivíduos em risco de doenças ou intervenções que possam reduzir esse risco. Isso requer uma avaliação do grupo em, no mínimo, dois momentos em um período de tempo. O estudo pode ser desenhado prospectivamente (Fig. 10.3) ou retrospectivamente (Fig. 10.4). No estudo prospectivo de coorte, o pesquisador desenvolve uma hipótese sobre variáveis que possam causar impacto no desfecho clínico do assunto pesquisado, obtém dados sobre os fatores de risco e acompanha o grupo até o desenvolvimento do desfecho clínico de interesse. Por exemplo, quando a associação entre tabagismo e câncer de pulmão foi colocada em suspeita, um desenho de estudo prospectivo elevou a evidência daquela associação causal.

FIG. 10.3 No estudo prospectivo de coorte, o pesquisador desenvolve uma hipótese sobre variáveis que possam afetar o resultado sob investigação, coleta dados sobre esses fatores de risco e acompanha o grupo para o desenvolvimento do resultado de interesse. Por exemplo, quando a associação entre o tabagismo e o câncer de pulmão tornou-se suspeita, um desenho de estudo prospectivo aumentou a força dessa associação causal. Enquanto os estudos prospectivos trazem confiabilidade às associações causais, são caros e geralmente exigem anos de acompanhamento.

FIG. 10.4 No estudo de coorte retrospectivo, o pesquisador identifica um grupo, coleta dados sobre a exposição a fatores de risco ocorridos no passado e examina a associação entre fatores de risco e resultados. Por exemplo, quando a associação entre o tabagismo e o câncer de pulmão tornou-se suspeita, um desenho de estudo retrospectivo apoiou a hipótese, mas falhou em demonstrar uma associação causal. Em estudos retrospectivos, a coleta de dados é frequentemente realizada por meio de recordações dos indivíduos ou análises de gráficos; ambas falham quando comparadas à coleta prospectiva de dados. As maiores vantagens dos estudos retrospectivos são que eles podem ser realizados em um período de tempo relativamente curto e são de custo bem menor em comparação aos estudos prospectivos.

Enquanto estudos prospectivos dão credibilidade às associações causais, eles são caros e geralmente requerem anos de acompanhamento. Estudos retrospectivos apresentam objetivos similares, mas identificam o grupo em risco no presente e investigam os fatores de risco ou exposição ocorridos no passado. Isso é frequentemente realizado por contato com os pacientes ou análise de gráficos, havendo em ambos os casos falhas em comparação à obtenção de dados prospectivos. Os dados obtidos desse modo apresentam maior probabilidade de estarem incompletos, imprecisos, inconsistentes ou sujeitos a interferências. Por outro lado, a maior vantagem dos estudos retrospectivos é que podem ser realizados em um período de tempo relativamente curto e são muito menos onerosos em relação aos estudos prospectivos.

Estudos de caso-controle Estudos de caso-controle (Fig. 10.5) diferem dos estudos de coorte, pois há dois grupos distintos de indivíduos investigados. O primeiro grupo (caso) é selecionado pela presença de doença, e o segundo (controle), pela ausência. Contrariamente, no estudo de coorte, uma única população em risco para uma doença é pesquisada. Da mesma maneira, o desenho dos casos-controle pode ser prospectivo ou retrospectivo. A principal importância do estudo de caso-controle é a investigação de condições ou desfechos clínicos raros. Seu ponto fraco é a incapacidade de avaliar a incidência ou prevalência de doença e sua elevada suscetibilidade aos vieses. Os controles podem ser simultâneos ou históricos, combinados (em variáveis fundamentais, como idade e sexo) ou não combinados.

FIG. 10.5 Estudos de casos-controle diferem dos estudos de coorte em que dois grupos distintos de indivíduos são investigados. O primeiro grupo (caso) é selecionado pela presença de doença, e o segundo (controle), por sua ausência. Como nos estudos de coorte, os estudos de caso-controle podem ser prospectivos ou retrospectivos. A principal força do estudo de caso-controle está na investigação de condições ou resultados raros. Seu ponto fraco está na incapacidade de avaliar a incidência ou prevalência da doença e sua elevada suscetibilidade às interferências.

Séries de casos e relatos de casos Como anteriormente definido, os casos são simplesmente um grupo de indivíduos que foram identificados pela presença de uma doença ou condição. Na literatura, são frequentemente citados com base em uma intervenção específica. Se a obtenção de indivíduos é ampla e consecutiva (série de casos), pode fornecer valiosa informação sobre indicações e contraindicações para cirurgia e resultados esperados. Quando os casos não são consecutivos (relatos de casos), elevam-se os cuidados relativos aos vieses das amostras, como a autosseleção dos pacientes ou viés do cirurgião no contato com o paciente, o que pode diluir a habilidade do estudo em captar os reais indicadores e resultados. O valor dos relatos de caso está em sua capacidade de relatar uma nova ideia, nova abordagem cirúrgica e refinar técnicas cirúrgicas existentes, bem como comunicar eventos adversos raros.

Análise de grandes bancos de dados Pesquisa baseada em populações Efetividade versus eficácia A avaliação de resultados cirúrgicos é necessária para fornecer tratamentos de alta qualidade, segurança dos pacientes e seleção de pacientes informados. Os cirurgiões necessitam de informações confiáveis sobre os riscos e resultados cirúrgicos que são aplicáveis à sua própria população de pacientes. Os resultados cirúrgicos de um único cirurgião ou de estudos unicêntricos demonstram a eficácia de um procedimento realizado por um cirurgião em particular, mas não fornecem dados sobre a efetividade de um procedimento realizado por diferentes cirurgiões em diversas populações de pacientes. Os clínicos precisam obter informações sobre os resultados de uma intervenção sob condições reais, não apenas em condições ótimas.21,22 Assim como já discutido na seção anterior, séries de casos e ensaios clínicos realizados apenas em alguns centros acadêmicos estão em risco de viés de seleção, e os resultados são apresentados em condições ótimas. Bases de dados nacionais, por outro lado, incluem pacientes e médicos de todas as condições de assistência médica, permitindo avaliação de resultados no “mundo real”. Isso foi demonstrado pelos ensaios clínicos randomizados com procedimentos de endarterectomia de carótida (Fig. 10.6).22 Os ensaios clínicos indicaram taxa de mortalidade muito pequena nesses procedimentos. Entretanto,

após a conclusão dos ensaios clínicos, a mortalidade foi substancialmente maior que a reportada nos ensaios, mesmo entre as instituições que participaram dos estudos randomizados. Observou-se também que a mortalidade relacionada com a endarterectomia de carótida foi inversamente proporcional ao volume de casos de endarterectomia da organização de saúde. Assim, os ensaios clínicos não apresentam resultados cirúrgicos do “mundo real”.22 Uma alternativa, uma pesquisa utilizando uma base de dados nacional, seria uma abordagem baseada na população, que forneceria informação da efetividade de um procedimento sob condições do mundo real em vez de apenas sua eficácia em situações ideais.

FIG. 10.6 Taxas de mortalidade após endarterectomia de carótida em pacientes inscritos em um ensaio controlado randomizado (hospitais experimentais) comparados aos não inscritos em um estudo e operados em hospitais com alto, médio e baixo volume de casos de endarterectomia. (Adaptada de Wennberg DE, Lucas FL, Birkmeyer JD, et al. Variation in carotid endarterectomy mortality in the Medicare population: trial hospitals, volume and patient characteristics. JAMA 1998;279:1278–1281.)

A importância da significância estatística (nível p) Um tamanho de amostra adequado é outro componente-chave para os resultados de uma pesquisa. Diferenças verdadeiras nos resultados podem ser detectadas apenas quando os estudos pesquisados apresentam significância adequada por meio de uma amostra com tamanho suficientemente grande.23,24 A cirurgia plástica encara o desafio de ser um grupo de volume relativamente pequeno em comparação a outras especialidades, como os grupos em tratamento para doença cardiovascular. Resultados de estudos com amostras pequenas apresentam frequentemente menor nível de significância e risco de erro tipo II, ou B. Esse erro estatístico ocorre quando um estudo não encontra diferença estatisticamente significativa entre grupos em tratamento quando uma diferença realmente existe.25 Chung et al. encontraram mais de 80% de “estudos negativos” no Journal of Hand Surgery tiveram um nível de significância menor que 0,80 para detectar uma diferença de 25% entre grupos de tratamento.26 Existe um risco maior de 20% de uma diferença real não ser percebida entre grupos de tratamento quando um estudo tem poder de menos de 0,80. A razão primária para esse nível de significância baixo entre esses estudos foi o tamanho insuficiente da amostra.26 A análise de grandes bancos de dados pode fornecer tamanhos de amostras suficientemente grandes para evitar um estudo com nível de significância menor. A Tabela 10.3 ilustra a importância de uma amostra de tamanho adequado em resultados de pesquisas. Nesse exemplo teórico, imagine um grande grupo de médicos que realizaram determinado procedimento cosmético em 48.500 pacientes e obtiveram 1.500 complicações (taxa de complicação de 3%). Imagine um pequeno grupo de cirurgiões plásticos que realizaram o mesmo procedimento em 46 pacientes, e quatro tiveram complicações (8% de taxa de complicação). Essa não é uma diferença estatisticamente significante em razão do pequeno número de procedimentos realizados pelos cirurgiões plásticos. Imagine, em um exemplo semelhante, que a taxa de complicação para o grupo maior de médicos permanece 3% (1.500 pacientes com complicação) e, em razão de uma leve alteração na amostra, os cirurgiões plásticos não tiveram complicações em 46 pacientes (0% de taxa de complicação). Essa também não é uma diferença estatisticamente significante, pois o estudo apresentou menor nível de significância em consideração ao número de pacientes tratados por cirurgiões plásticos. De fato, a amostra do estudo poderia aumentar para 100 pacientes para os cirurgiões plásticos sem

complicações e ainda assim não teria ocorrido diferença estatisticamente significante entre os grupos. Tabela 10.3 Entendendo a relação entre tamanho de amostra e estatística Tamanho da amostra Número de complicações Taxa de complicação (%) Grupo grande de médicos 48.500

1.500

3

Cirurgiões plásticos

4

8

Grupo grande de médicos 48.500

1.500

3

Cirurgiões plásticos

0

0

Grupo grande de médicos 48.500

1.500

3

Cirurgiões plásticos

0

0

46

Diferença não estatisticamente significante

46

Diferença não estatisticamente significante

100

Diferença não estatisticamente significante

Base de dados Registros clínicos Grandes bases de dados na área da saúde podem ser geralmente descritas como registros clínicos ou dados de auditoria administrativa (Tabela 10.4). Os registros clínicos são realizados para o propósito de coletar dados clínicos e têm a vantagem de fornecer detalhada informação sobre os pacientes e os tratamentos. Muitos registros clínicos nacionais são doença-específicos, como o registro Surveillance Epidemiology and End Results (SEER) e o National Comprehensive Cancer Network (NCCN), que monitoram os resultados em pacientes com câncer. A cirurgia plástica tem registro clínico nacional conhecido como Tracking Operations and Outcomes for Plastic Surgeons (TOPS) (Acompanhamento de Cirurgias e Resultados para os Cirurgiões Plásticos), mantido pela American Society of Plastic Surgeons e pela American Board of Plastic Surgery. O propósito primário do TOPS é facilitar a monitoração da qualidade dos cuidados cirúrgicos na cirurgia plástica. Esses tipos de registro clínico podem ser de pouco valor para os pesquisadores interessados em estudar populações de pacientes que não podem ser selecionadas pelos dados de auditoria administrativa, como pacientes mais jovens não selecionados no Medicare ou os pacientes cosméticos particulares. Os pesquisadores devem estar conscientes das potenciais limitações das bases de dados. Por exemplo, os registros do SEER captam apenas dados dentro dos quatro primeiros meses iniciais de tratamento, e a base de dados TOPS confia em dados de médicos voluntários. Entretanto, um estudo recente defende a validade da base de dados TOPS.27

Tabela 10.4 Exemplos de registros clínicos e de dados de alta administrativa Fonte de dados

Descrição

Registros clínicos Registro Surveillance, Epidemiology and End Results (SEER)

Mantido pelo National Cancer Institute e coleta dados sobre incidência de câncer e sobrevivência para aproximadamente 26% da população dos EUA146

National Comprehensive Cancer Network (NCCN)

Aliança dos centros de câncer líderes nos EUA dedicados à melhora da qualidade na assistência ao câncer 147

National Surgical Quality Improvement Program (NSQIP)

O programa é mantido pelo American College of Surgeons e inclui hospitais-escola e do setor privado que desejam participar. Os dados incluem pacientes internados e visitas de pacientes externos entre pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos maiores 148

Tracking Operations and Outcomes for Programa mantido pela American Society of Plastic Surgeons, pela Plastic Surgery Educational Foundation e pela American Plastic Surgeons (TOPS) Board of Plastic Surgery. Cirurgiões certificados pela banca podem participar. São coletados dados de pacientes internos e externos 149 Dados de alta administrativa Parcerias estadual-federais

Organizações estaduais de assistência à saúde apresentam os dados à Agency for Healthcare and Research Quality 150

Base de Dados Estadual de Pacientes Internados (State Inpatient Database) Amostra Nacional de Pacientes Internados (Nationwide Inpatient Sample) Base de Dados de Crianças Internadas (Kids Inpatient Database) Base de Dados de Cirurgia Ambulatorial (State Ambulatory Surgery Database) Medicare 151 Parte A

Resumo das altas hospitalares de pacientes internados

Parte B

Dados dos pacientes externos

Dados dos Veterans Affairs (VA) Arquivo de Pacientes em Tratamento (Patient Treatment File [PTF])

Resumo das altas hospitalares de pacientes internados

Arquivos de Pacientes Externos (Outpatient Care Files [OCF])

Visitas dos pacientes externos às clínicas VA

Cosmetassure 152

Companhia de seguro que cobre complicações relativas à cirurgia cosmética

Dados de administrativos Dados administrativos, também conhecidos como “auditoria administrativa”, são coletados com o objetivo de fechar contas e não têm detalhadas informações sobre os pacientes encontrados em registros clínicos. Os dados estão disponíveis em muitas diferentes fontes, incluindo hospitais, estados e fontes pagadoras. O conteúdo geralmente representa apenas uma etapa do procedimento, ao contrário de um registro clínico. Os dados estão comumente em um formato uniforme, conhecido por relatório de alta hospitalar, que inclui: identificação do paciente, do hospital, informação demográfica (idade, sexo, raça, pagante ou não), circunstância da admissão (emergência, urgência ou eletiva), duração da estada, cobranças do hospital, status da alta (óbito, transferência, cuidados ambulatoriais ou liberado para casa), diagnóstico primário/secundário e procedimentos. Resultados colhidos por dados de fontes administrativas são geralmente limitados a mortalidade, período de internação e cobranças. A acurácia dos dados é maior para os códigos de procedimentos primários, códigos de diagnósticos, dados demográficos e resultados, e menor para diagnósticos secundários, o que dificulta os ajustes de riscos. Não é possível utilizar dados de alta administrativa para avaliar procedimentos estéticos, pois estes são pagos pelos pacientes. Pesquisadores têm utilizado informações do CosmetAssure para avaliar resultados de cirurgias cosméticas.27 O CosmetAssure é um seguro vendido nacionalmente que cobre complicações médicas e cirúrgicas de cirurgias estéticas. Há um incentivo financeiro para que se relate uma complicação coberta pelo

seguro. Entretanto, os resultados clínicos coletados na base de dados são limitados.

Como utilizar grandes bases de dados para a pesquisa Os dados administrativos podem ser um bom ponto para o início de um projeto de pesquisa considerando-se que os dados são facilmente obtidos e frequentemente baratos. A fonte de dados pode também fornecer uma amostra de tamanho grande, o que pode ajudar no estudo de uma condição ou um evento raro. A questão clínica da pesquisa deve tirar proveito dos pontos fortes dos dados para que o projeto obtenha sucesso. As vantagens dos dados administrativos incluem dados fundamentados em populações que podem ser utilizados para avaliar as variações regionais nos atendimentos, nos resultados do mundo real e nas tendências epidemiológicas.

Variação em pequenas áreas Até os anos 1970, a taxa de cirurgias para uma população não podia ser determinada, e os dados eram limitados aos números de casos realizados em dada instituição ou por um cirurgião específico. Em 1973, Wennberg e Gittelsohn publicaram um método para estimar a população servida por um centro médico que permitia pela primeira vez o cálculo das taxas de procedimentos (p. ex., o número de tonsilectomias por 100.000 pessoas servidas).28,29 Atualmente, sabemos que certos procedimentos cirúrgicos demonstram amplas e inexplicadas variações nas taxas regionais e nacionais (p. ex., histerectomia, prostatectomia, cesariana), enquanto outros procedimentos são realizados em taxas similares (p. ex., apendicectomia, colecistectomia). Em geral, tais procedimentos cujos riscos e benefícios estão bem estabelecidos apresentam mínima variabilidade. Procedimentos com alta variabilidade sugerem que um monitoramento adequado ainda tem de ser estabelecido ou adotado. Embora as variações em pequenas áreas permitam-nos fazer observações sobre diferenças nas taxas de procedimentos, estas não ajudam a explicar essas variações ou a saber qual taxa está correta. Sugerem que uma avaliação mais definitiva necessita ser realizada para identificar uma estratégia de tratamento ótima.30 O Dartmouth Atlas of Health Care é um dos melhores exemplos de como utilizar dados administrativos para examinar variações nas taxas de cirurgias nos EUA por meio do uso dos dados da base de dados nacional Medicare, arquivos do fornecedor e da American Hospital Association.31

Análise de resultados baseada no volume Outro campo de investigação que também recai sobre o amplo campo da análise de grandes bases de dados é a área dos estudos de resultados baseada no volume. Há uma crescente evidência que sugere que resultados cirúrgicos são melhores em instituições com alto volume.32 O motivo pode ser, em parte, em razão da habilidade do cirurgião, mas também reflete o hospital e os sistemas que apoiam dada população de pacientes. Um estudo de referência de Birkmeyer et al.33 descreveu uma significante correlação entre o volume de cirurgiões e a mortalidade operatória nos EUA utilizando dados do Medicare. Outro exemplo é o trabalho de Roohan et al.34 aos 5 anos de sobrevivência de pacientes com câncer de mama tratadas em centros de baixo, moderado e alto volume (Tabela 10.5). Esse trabalho mostra que há até 30% de diferença na sobrevivência após 5 anos entre hospitais de baixo e alto volume. Tabela 10.5 Associação entre volume e resultado para sobrevivência de cinco anos após tratamento de câncer de mama Volume do hospital Casos anuais de câncer de mama Taxa de risco de sobrevivência em 5 anos Muito baixo

1-10

1,60

Baixo

11-50

1,30

Moderado

51-150

1,19

Alto

> 150

1,00

(Adaptada de Roohan PJ, Bickell NA, Baptiste MS, et al.: Hospital volume differences and five-year survival from breast cancer. Am J Public Health 1998;88:454–457.)

Estudos grandes de coorte As análises de grandes bases de dados têm desempenhado importante papel nos estudos de coorte. Elas permitem que eventos relativamente raros sejam analisados com amostras grandes, trazendo significância estatística maior e poder para a análise. Frequentemente envolve a ligação de múltiplas análises de bases de dados para examinar fatores de risco ou vulnerabilidades relativas aos resultados. Os resultados mais frequentemente analisados são mortalidade e câncer, dado que ambos são comumente acompanhados por diversos registros regionais e nacionais.

Epidemiologia Grandes bases de dados são também ferramentas úteis na avaliação de tendências ao longo do tempo na utilização de cirurgias e resultados para uma população. Por exemplo, a Nationwide Inpatient Sample foi utilizada para documentar um dramático aumento na realização de cirurgia bariátrica nos EUA.35 A base de dados nacional SEER tem sido utilizada para avaliar diferenças sociodemográficas na reconstrução de mamas pós-mastectomia36 e para avaliar tendências na realização de reconstrução de mamas após o Women’s Health and Cancer Rights Act.37 Esses estudos descobriram que a realização completa da reconstrução de mamas nos EUA é baixa, que a raça/etnia é um significante preditor da reconstrução pós-mastectomia e que a realização da reconstrução não aumentou significativamente após a aprovação da lei federal que tornou obrigatória a cobertura desses procedimentos pelos seguros.

Exemplos de análises de grandes bases de dados em cirurgia plástica Muitas bases de dados nacionais e estaduais tiveram limitadas aplicações para os cirurgiões plásticos.38,39 O motivo mais óbvio é que muitos dos procedimentos realizados por cirurgiões plásticos não são incluídos nessas bases de dados. Por exemplo, a base de dados Medicare inclui apenas pacientes acima de 65 anos de idade que usam o Medicare como primeiro modo de pagamento. Dois autores têm se empenhado em empregar essas bases de dados para reunir informação sobre a variação de áreas pequenas, tornando-se útil para cirurgiões plásticos. Gittelsohn e Powe utilizaram dados do estado de Maryland para comparar taxas de cirurgia eletiva, como septoplastia, rinoplastia, mamoplastia redutora e blefaroplastia.40 Variações significativas foram observadas nas taxas de cirurgia. Variáveis descritivas foram examinadas, e os autores concluíram que a remuneração e a raça foram preditores significativos de cirurgia. Keller et al. pesquisaram variações na taxa de cirurgia de síndrome do túnel do carpo no estado de Maine.41 Os autores puderam identificar uma diferença de 3,5 vezes nas taxas e concluíram que o principal fator direcionador é a decisão do cirurgião. Não sabemos a “real” taxa da cirurgia do túnel do carpo, mas os dados fornecidos por estudos como esse vão nos possibilitar começar a fazer as perguntas apropriadas. As grandes bases de dados forneceram o princípio para os estudos de coorte na relação entre pacientes submetidas à mamoplastia redutora e redução no risco de desenvolvimento de câncer de mama. Boice et al.42 identificaram pacientes submetidas à mamoplastia redutora na Suécia utilizando relatórios de alta hospitalar e relacionando com os registros suecos para câncer, morte e emigração, bem como comparando os resultados com a incidência esperada do câncer de mama na população geral utilizando o Swedish Nationwide Cancer Registry. Os pesquisadores descobriram que mulheres após 7,5 anos de mamoplastia redutora apresentavam risco estatisticamente significativo 28% menor de desenvolver câncer. A base de dados NCCN tem sido utilizada para avaliar a associação entre a reconstrução de mama pós-mastectomia e o início da quimioterapia adjuvante para pacientes com câncer de mama.43 Os autores descobriram que a reconstrução de mama imediatamente após a mastectomia não parece levar à omissão da quimioterapia, mas é associada a um discreto, mas estatisticamente significativo, atraso no início do tratamento. Para a maioria, é pouco provável que esse discreto atraso tenha qualquer importância clínica. Em relação aos procedimentos cosméticos, as bases de dados do TOPS e do CosmetAssure têm sido utilizadas para avaliar resultados em procedimentos com abdominoplastia e mamoplastia de aumento.27 As baixas taxas de complicação encontradas nesse estudo sustentam a segurança desses procedimentos quando realizados por cirurgiões plásticos. Entretanto, os autores ressaltam que os cirurgiões devem estar cientes das taxas de complicações mais altas associadas à combinação da mamoplastia de aumento e outros procedimentos (Fig. 10.7). Em resumo, esses representam apenas alguns exemplos do uso potencial das grandes bases de dados na pesquisa em cirurgia plástica.

FIG. 10.7 O gráfico demonstra diferenças nas taxas de complicações gerais da mamoplastia de aumento entre procedimento único e combinado na base de dados do Tracking Operations and Outcomes for Plastic Surgeons. As complicações em procedimentos combinados representam taxas globais de uma complicação e não podem ser consideradas para um procedimento particular. As taxas de todas as complicações entre procedimentos únicos e combinados foram significativamente diferentes (P < 0,01), utilizando o teste qui-quadrado de Pearson. TVP, trombose venosa profunda; EP, embolismo pulmonar.

Pesquisa de resultados relatados pelos pacientes Definição de termos Na pesquisa em cirurgia plástica, a atenção tem sido crescentemente focada na compreensão da percepção do paciente quanto ao resultado cirúrgico e ao impacto da cirurgia na qualidade de vida (QdV). Para destacar e demonstrar os benefícios de uma técnica cirúrgica escolhida ou de um tratamento alternativo adequado, é importante para os cirurgiões plásticos entender as abordagens disponíveis na avaliação dos resultados relatados pelos pacientes (PRO, do inglês patient reported outcome). A satisfação do paciente e a QdV podem ser avaliadas com o uso de questionários especialmente desenvolvidos, conhecidos por PRO. Esse termo aplica-se especificamente a um questionário utilizado em uma situação clínica ou pesquisa em que as respostas são obtidas diretamente dos pacientes. Esses questionários quantificam a QdV e/ou variáveis de resultados significativos (p. ex., satisfação do paciente, sintomas) da perspectiva do paciente. Os questionários PRO fornecem um meio de ganhar uma percepção sobre a maneira como os pacientes percebem sua saúde e o impacto que os tratamentos têm em sua QdV. Um bom questionário PRO deve avaliar o impacto da doença, trauma, intervenção cirúrgica ou não cirúrgica em vários aspectos do dia a dia do paciente de maneira cientificamente embasada e clinicamente significativa.44 Na pesquisa em cirurgia plástica, muitos dos questionários PRO frequentemente empregados em estudo para avaliar resultados cirúrgicos não foram desenvolvidos e validados utilizando-se parâmetros reconhecidos.44-47 Tais questionários são considerados para essa finalidade e, embora possam apresentar questões clinicamente razoáveis, não é possível apostar em sua confiabilidade (habilidade em reproduzir escores consistentes e reprodutíveis) ou validade (habilidade em quantificar o que se propõe). O uso de tais questionários, entretanto, tem sido extenso em cirurgia plástica. Por exemplo, em uma revisão sistemática para identificar questionários PRO desenvolvidos para uso em pacientes de cirurgia de mama, foram identificados 65 questionários ad hoc.45 Os questionários PRO que podem ser utilizados em qualquer grupo de pacientes, independentemente de sua condição de saúde, são chamados “questionários genéricos”, os quais permitem comparação direta entre grupos de doenças, ou entre grupos doentes e saudáveis. Esses questionários podem fornecer importante informação para decisões políticas na saúde. Por exemplo, pesquisas utilizando o questionário SF-36 – o questionário genérico mais amplamente utilizado no mundo48 – em pacientes submetidas à mamoplastia redutora mostra que as mulheres reportaram diferenças clínicas importantes na QdV comparado a mulheres da população em geral.49-52 Nos EUA, a redução de mamas é um procedimento pelo qual as companhias de seguro de saúde frequentemente disputam o pagamento; é, portanto, útil para identificar o peso avaliado pela mulher com hipertrofia de mamas no contexto dos pacientes com outras condições médicas (p. ex., mulheres com osteoartrite em quadril ou joelho aguardando transplante de articulação). Entretanto, há limitações associadas ao uso dos questionários genéricos. Dada sua natureza genérica, algumas vezes há falta de sensibilidade a questões particulares de determinado grupo de pacientes. Por exemplo, o SF-36, que avalia funções física, emocional e social, não inclui questões sobre sexualidade, imagem

do corpo ou satisfação com a aparência das mamas, as quais são questões claramente importantes às pacientes submetidas à redução de mamas.53 Questionários genéricos, como o SF-36, podem não avaliar a questão mais importante em um grupo particular de pacientes. Questionários específicos para doenças ou condições direcionam problemas específicos de uma única doença ou de um grupo de tratamento. Tais questionários, quando desenvolvidos por meio de entrevistas aprofundadas com pacientes, podem ajudar a identificar questões importantes em um grupo específico de pacientes. Como esses incluem assuntos mais relevantes a dado grupo de pacientes, apresentam maior probabilidade em relação aos questionários genéricos de serem sensíveis a mudanças em aspectos específicos da saúde. Entretanto, em geral não podem ser utilizados para fazer comparações entre diferentes grupos de pacientes. Um desafio adicional é que, na cirurgia plástica, há muitas áreas para as quais questionários de condições específicas foram desenvolvidos de maneira inadequada ou não foram desenvolvidos.45-47 Essa situação está sendo rapidamente resolvida com o desenvolvimento de novos questionários específicos para cirurgia plástica. Como exemplo, o estudo BRAVO,54 que avaliou a efetividade da mamoplastia redutora, foi conduzido em 2001 utilizando o Questionário dos Sintomas da Mamoplastia Redutora. Esse questionário forneceu apenas uma avaliação do alívio dos sintomas. Desde então, o estudo do questionário PRO tem evoluído, e novos questionários, como o BREAST-Q,55 fornecem uma detalhada apreciação, incluindo satisfação com a aparência da mama e bem-estar psicossocial.

Elementos essenciais aos questionários PRO Os questionários PRO devem ser clinicamente significativos e ter consistência científica. Um questionário clinicamente significativo direciona os assuntos considerados importantes aos pacientes e a seus cirurgiões. Consistência científica refere-se à demonstração de uma avaliação confiável, válida e atenciosa do resultado de interesse. Uma avaliação confiável produz resultados consistentes e reprodutíveis de uma mesma área. A confiabilidade é uma importante propriedade de um questionário PRO, pois é essencial para estabelecer que qualquer alteração observada entre grupos de pacientes é causada pela intervenção ou pela doença, e não por problemas na avaliação (Fig. 10.8). A confiabilidade do teste-reteste pode ser avaliada pela obtenção da resposta dos pacientes aos questionários de forma completa em mais de uma ocasião durante um período de tempo em que não se esperam mudanças nos resultados. O grau em que respostas individuais permanecem as mesmas é reportado estatisticamente como coeficientes de Cronbach alfa56 e de correlação intraclasse.57

FIG. 10.8 Confiabilidade e validade. A qualidade de qualquer pesquisa padronizada é julgada por sua confiabilidade e validade. A confiabilidade é tradicionalmente medida pelo teste-reteste; a validade é uma medida de acurácia. Observando de maneira simples, a confiabilidade é a capacidade de atingir um mesmo ponto repetidamente no alvo, enquanto a validade é a capacidade de atingir o centro do alvo repetidamente.

Validade é a habilidade de um instrumento em medir aquilo que se pretende (Fig. 10.8). A distinção entre confiabilidade e validade é importante porque, como confiabilidade não implica validade, o inverso também é verdade. Ou seja, um questionário vai sempre produzir o mesmo escore, mas pode não ser válido, assim como pode não necessariamente avaliar o que está proposto. O estabelecimento da validade pode ser considerado um

processo em andamento. A avaliação é observada sob várias perspectivas, incluindo uma avaliação do processo em desenvolvimento, considerações sobre as diferenças conhecidas entre os grupos, avaliação da consistência interna e da validade convergente e discriminante relativa a outras avaliações existentes. A capacidade de resposta é definida como a habilidade de uma avaliação em detectar uma alteração significativa com acurácia. Se um questionário PRO é utilizado para avaliar alterações como o resultado de um procedimento cirúrgico ou para acompanhar pacientes através do tempo, a avaliação deve ser sensível às mudanças. A capacidade de resposta é examinada pela avaliação de resultados antes e depois de uma intervenção e pela avaliação da sensibilidade do questionário às mudanças.

Perspectiva do desenvolvimento do questionário PRO Para escolher uma avaliação da QdV para uso em um estudo ou em uma prática clínica, deve-se levar em consideração o processo utilizado para desenvolver o questionário PRO. Saber como um questionário PRO foi desenvolvido é crucial para uma escolha adequada. Não é incomum que pesquisadores escolham questionários com base simplesmente no fato de terem ou não sido “validados” e perguntem poucas questões sobre como esses itens do questionário foram construídos e testados. Um questionário ad hoc ou construído de maneira pobre pode ser considerado “validado” simplesmente por ter sido utilizado em diversos estudos e por algumas evidências estatísticas básicas terem sido supridas. O uso frequente de um questionário não equivale à qualidade, nem melhora suas propriedades psicométricas. Contrariamente, para assegurar que um questionário PRO irá finalmente provar ser confiável, receptivo e válido, é essencial um rigoroso processo de desenvolvimento passo a passo. Durante esse processo de desenvolvimento, um cuidadoso trabalho qualitativo é necessário para conceitualizar, planejar e operacionalizar as variáveis mais relevantes aos pacientes. Questionários PRO desenvolvidos com base apenas na opinião de especialistas não podem trazer expectativas de que irão expressar todos os aspectos da satisfação e QdV que os pacientes achem relevantes. Dessa maneira, enquanto a opinião de especialistas é claramente valiosa, entrevistas aos pacientes e grupos em foco são fontes essenciais de informação. Desde o início dos anos 1990, tem ocorrido um crescente consenso internacional relativo a métodos apropriados para o desenvolvimento e a validação de questionários de QdV, culminando com um relatório em 2002 do Scientific Advisory Committee of the Medical Outcomes Trust58 e, mais recentemente, com as recomendações da Food and Drug Administration.59 Cano et al.44 resumiram essas diretrizes em uma abordagem de três passos para o desenvolvimento de questionários PRO envolvendo procedimentos pela geração de itens, redução dos itens e avaliação psicométrica. Adicionamos um quarto passo representando o processo em desenvolvimento de melhora do instrumento (Fig. 10.9).

FIG. 10.9 Quatro passos do desenvolvimento do questionário PRO (patient report outcome – resultado relatado por pacientes).

No primeiro passo, o modelo conceitual a ser avaliado é formalmente definido, e um conjunto de itens é gerado. Esses itens para o questionário PRO são desenvolvidos por meio das três seguintes fontes: revisão de literatura, entrevistas qualitativas aos pacientes e opinião de especialistas. O conjunto de itens é desenvolvido em um questionário que é pré-testado em uma pequena amostra de pacientes com o objetivo de esclarecer ambiguidades entre as palavras, confirmar sua adequação e determinar sua aceitabilidade e tempo a ser cumprido. Em um segundo passo, o questionário PRO é testado a campo, utilizando-se uma grande amostra de pacientes. As questões que representarem os melhores indicadores de resultados são retidas em uma versão resumida do questionário PRO com base em sua performance em comparação a um critério psicométrico padronizado. O objetivo da equipe de pesquisa é escolher os melhores itens do teste a campo para inclusão no questionário final. Itens são eliminados de acordo com testes de redundância, frequência de aceitação, ausência de dados, análise de fatores e suposição de escalas. O item processo de redução completa o desenvolvimento do questionário. No terceiro passo, um estudo de avaliação psicométrica é realizado. Esse passo envolve a administração do questionário com itens resumidos a uma grande população de pacientes para determinar a aceitabilidade, confiabilidade, validade e receptividade. O quarto e último passo envolve a modificação e melhoria constantes do instrumento. Por exemplo, com base nos quatro módulos existentes do BREAST-Q, um novo módulo específico para o procedimento está sendo atualmente desenvolvido para pacientes em terapia conservadora das mamas (TCM). Esse módulo vai facilitar comparações entre grupos de tratamento (p. ex., TCM versus mastectomia e reconstrução) e avaliações de novas abordagens cirúrgicas (p. ex., cirurgia oncoplástica, enxerto de gordura). Nosso grupo de desenvolvimento de pesquisa do BREAST-Q ilustra como novos questionários PRO podem ser desenvolvidos.55 Na fase I, uma estrutura conceitual para entender a satisfação da paciente e QdV em pacientes submetidas à cirurgia de mamas foi desenvolvida e incluiu seis áreas: satisfação com as mamas, resultado geral e evolução do tratamento, e bem-estar psicossocial, físico e sexual. Nossa equipe desenvolveu essa estrutura conceitual e estabeleceu itens para avaliar cada componente da estrutura utilizando entrevistas detalhadas e grupos focais com pacientes, comissões com especialistas em cirurgia plástica e revisão da

literatura.55 Foi então realizado teste-piloto e entrevista cognitiva para certificar que nosso questionário PRO expressava todos os aspectos relevantes e que os itens eram aceitos pelas pacientes e de fácil entendimento. Na fase II, realizamos um teste de campo multicêntrico extenso com 1.950 pacientes. Com base nesses dados, a redução de itens e o desenvolvimento de escalas foram realizados utilizando-se modernos métodos psicométricos. Nesse processo, aproximadamente 60% dos itens foram descartados. Na fase III, o questionário resumido (BREAST-Q) foi complementado com uma grande amostra de pacientes submetidas à cirurgia de mamas (n = 1.283), e os dados foram examinados para determinar a performance do questionário. De modo mais específico, foram examinadas objetividade, confiabilidade, validade convergente, validade discriminante e receptividade.

Métodos psicométricos modernos A ciência que sustenta a avaliação dos atributos da confiabilidade, validade e receptividade é conhecida como psicometria. A escala de avaliação mais utilizada, e a mais familiar aos cirurgiões, é baseada nos métodos psicométricos tradicionais.58 Entretanto, recentemente os pesquisadores se conscientizaram das limitações desses métodos e estão agora utilizando novas técnicas. Métodos psicométricos, como a análise de Rasch60 e a teoria de resposta ao item (TRI),61 têm sido cada vez mais utilizados no desenvolvimento de questionários PRO. O método de Rasch e a TRI foram inicialmente desenvolvidos para uso em testes educacionais. Enquanto as técnicas psicométricas tradicionais fornecem dados em nível ordinal, a análise de Rasch fornece dados em nível de intervalos.60 Os dados em nível ordinal fornecem apenas um resultado em ordem (p. ex., primeiro, segundo, terceiro). Contrariamente, nos dados em nível de intervalos, uma unidade na escala representa a mesma magnitude medida ao longo de toda a amplitude da escala (p. ex., graus Celsius). Isso melhora a acurácia com a qual podemos avaliar as alterações clínicas. Adicionalmente, esses métodos fornecem estimativas para pacientes (e itens) independentes da distribuição da amostragem dos itens (e dos pacientes). Entre outros benefícios, isso fornece estimativas acuradas adequadas às avaliações individuais de pacientes. Pode auxiliar a informar diretamente o monitoramento, a evolução e o tratamento do paciente. Outras vantagens incluem armazenamento dos itens, equiparação de escalas, gerenciamento informatizado das escalas e manipulação dos dados faltantes.62,63 Nos próximos anos, pode-se esperar que essas técnicas mais novas e clinicamente mais amenas irão sobrepor as abordagens tradicionais no desenvolvimento e teste dos questionários PRO. Adicionalmente, em um futuro próximo, pode-se antecipar que a coleta eletrônica de dados PRO será difundida. Com o acesso à internet tornando-se mais prevalente ao redor do mundo, será possível aos pacientes responder aos questionários via internet, o que permitirá relatos em tempo real. Isso tem importantes implicações sobre como os dados PRO poderiam ser utilizados para informar sobre os tratamentos clínicos. Para estudos de pesquisas, a coleta de dados PRO eletrônicos é também atraente, visto que os custos por paciente serão potencialmente reduzidos.

Utilidades e avaliações baseadas em preferência Conceitos-chave Enquanto os questionários PRO podem fornecer valiosa informação no modo com que os pacientes percebem sua saúde e no impacto que os tratamentos têm em sua QdV e outras variáveis de resultados significantes, essas medidas não incorporam as preferências dos pacientes em seus sistemas de escores. A “preferência” é um amplo termo utilizado para descrever o conceito de desejabilidade de um conjunto de resultados.64 Valores e utilidade são dois diferentes tipos de preferências, dependendo de qual método é utilizado para medir as preferências: valores são medidos sob condições de certeza (escala de classificação, permuta com o tempo), enquanto utilidades são medidas sob condições de incerteza (método de aposta padronizada).64 Logo, um valor ou utilidade é uma medida de preferência para um particular estado de saúde ou serviço de saúde: quanto mais preferível um resultado, maior o valor ou utilidade associado a ele. O sistema de medida de preferência mais comum é o ano de vida ajustado pela qualidade (AVAQ). O AVAQ representa a medida do custo em dólar de um ano de vida se uma pessoa sofre uma ou mais limitações de variados tipos e graus, levando em conta a QdV e a expectativa de vida.65 O AVAQ pode ser estimado utilizando-se uma variedade de ferramentas de avaliação, como a aposta padronizada, a permuta com o tempo ou escalas visuais análogas.65,66 Medidas baseadas em preferências incorporam a força da preferência do paciente para a condição ou doença, e as unidades da extensão da medição de 0,0 (isto é, óbito) a 1,0 (ou seja,

saúde perfeita), sendo a ideia que um ano em perfeita saúde vale mais para o paciente do que um ano passado em invalidez (Fig. 10.10). É importante ressaltar que alguns estados de saúde podem ser considerados piores que o óbito e, dessa forma, apresentam escores negativos. Instrumentos fundamentados em preferência levam em consideração valores e/ou utilidades adicionais à QdV e podem ser utilizados em avaliações econômicas para auxiliar nas decisões de alocação de recursos.67

FIG. 10.10 Comparação entre estados de saúde em uma escala de utilidade comum. Os valores de utilidade vão de 0 a 1, em que 0 representa óbito e 1 representa saúde perfeita. As utilidades diferem dos questionários-padrão por quantificarem a qualidade de vida com uma única medida que abrange as preferências físicas, psicológicas e culturais do paciente. Isso permite comparação entre pacientes e entre diferentes doenças em uma escala comum.

Há duas abordagens gerais na avaliação de valores e de utilidades. A primeira envolve o uso de sistemas de classificação de preferência nos quais respostas a um instrumento de status de saúde genérico são convertidas em um valor ou utilidade. Essa conversão é computada por um algoritmo desenvolvido por meio de respostas baseadas na população. Sistemas de classificação por preferência amplamente utilizados incluem Quality of Well-Being Scale,68,69 McMaster Health Utilities Index,70–72 e EuroQol.73,74 Embora os sistemas de classificação por preferência sejam úteis no estudo de status de saúde gerais e saúde da população, estes podem não coletar informação adequada sobre condições específicas ou preferências individuais de pacientes. A segunda abordagem na avaliação de valores e utilidades seria uma análise direta. Diversas técnicas podem ser utilizadas, incluindo uma escala visual analógica, permuta com o tempo e aposta padronizada.66 A aposta padronizada é considerada a que mais se aproxima da teoria de utilidade von Neumann–Morganstern. Nessa técnica, os pacientes devem fazer uma escolha entre duas alternativas. Uma seria manterem-se em seu estado de saúde atual, e a outra seria aceitar uma troca com a chance de sucesso ou fracasso (Fig. 10.11). As chances de sucesso e fracasso variam sistematicamente até que o ponto de indiferença entre as duas opções seja alcançado. A probabilidade de sucesso a esse ponto de indiferença representa a estimativa do valor ou utilidade. Tipicamente, quanto pior a percepção da saúde do paciente, menor o escore de valor ou de utilidade (Fig. 10.10). Enquanto o conceito de avaliação de preferência é considerado uma grande promessa para a cirurgia plástica,75,76 a análise de valores e utilidades é uma ciência em desenvolvimento. Há controvérsias relativas à técnica padrão-ouro para avaliação, e técnicas alternativas podem trazer resultados discretamente diferentes.77,78

FIG. 10.11 Avaliação da utilidade com a técnica de aposta-padrão. Nas apostas-padrão, os pacientes são solicitados a escolher entre duas alternativas. Uma é permanecer em seu estado de saúde atual, a outra é aceitar uma aposta com chance de sucesso e fracasso. As chances de sucesso e fracasso são variadas sistematicamente até que o ponto de indiferença entre as duas escolhas seja alcançado. A probabilidade de sucesso a esse ponto de indiferença é o valor da utilidade. Tipicamente, quanto pior é notada a saúde de um paciente, mais baixa a utilidade.

Análise comparativa de efetividade Definição O propósito primário da pesquisa de efetividade comparativa (PEC) é facilitar a medicina baseada em valores, que é a prática da medicina baseada no valor conferido por uma intervenção médica. Dependendo da definição utilizada, a PEC pode ou não ser um fator de custo na análise.79 O valor ou utilidade total obtido é medido pelo AVAQ e calculado pela multiplicação dos anos de ganho de utilidade pelos anos de duração do benefício. Esse ganho total, ou efetividade comparativa, pode ser comparado com aquele de qualquer intervenção médica, não importando quanto discordantes. O conceito de PEC na saúde é similar aos relatos de consumidores do Zagats para restaurantes e aos relatos de consumidores de carros.80 Atualmente, não há uma definição-padrão para o PEC. Em sua maioria, os pesquisadores utilizam a seguinte definição para a efetividade comparativa pelo Institute of Medicine: “A pesquisa de efetividade comparativa é a geração e síntese de evidência que compara os benefícios e prejuízos de métodos alternativos para prevenir, diagnosticar, tratar e monitorar uma condição clínica, ou para melhorar a disponibilidade de cuidados. O propósito da pesquisa da efetividade comparativa é auxiliar consumidores, clínicos, compradores, formuladores de políticas a tomarem decisões informadas que irão melhorar a assistência médica em nível individual e populacional.”81 As ferramentas analíticas para coleta de dados podem incluir revisões sistemáticas de evidências, modelagem, análises retrospectivas de bases de dados e ensaios prospectivos.80 Há controvérsia sobre o uso de ensaios controlados randomizados para PEC, pois o ambiente de pesquisa deveria demonstrar um resultado de intervenção em situação de “mundo real” em vez de em condições ideais (como demonstrado na Fig. 10.6).80 Entretanto, a definição do Institute of Medicine de PEC não rejeita a inclusão de ensaios controlados randomizados.80,82

Prioridade da pesquisa nacional A reforma do sistema nacional de saúde é uma prioridade para os líderes da política na saúde, e o objetivochave é controlar os custos da assistência médica sem piorar a qualidade. Variações regionais no padrão dos tratamentos e elevação dos custos apoiam a necessidade de tomada de decisões médicas com maior embasamento.82 Muitos acreditam que essa meta será alcançada apenas se houver melhores evidências para informar decisões na assistência médica. Melhores evidências podem aumentar a qualidade, segurança e efetividade da assistência médica, suprindo pacientes e provedores com a informação necessária para as escolhas na assistência médica.82 Como resultado, o Congresso alocou $1,1 bilhão como um sinal para o programa nacional de PEC. Assim como este texto, a House of Representatives e o Senate Finance Committee têm propostas apoiando um programa nacional de PEC.83

Complexidades Qual perspectiva tomar? Uma variedade de perspectivas pode ser tomada ao examinar o valor de um procedimento médico,

abrangendo desde o indivíduo até a sociedade. As quatro perspectivas mais comuns avaliadas são as da sociedade, a do paciente, a do empregador e a do pagante.80 A perspectiva da sociedade inclui todos os benefícios e custos associados a um tratamento para toda a sociedade, em vez de apenas um paciente individualmente. Esse tipo de análise inclui componentes sociais como produtividade no trabalho e custos do fornecedor do tratamento.80,84 A perspectiva do paciente apenas inclui os custos e benefícios de um tratamento que o afeta individualmente. Qualquer elevação na produtividade que beneficiaria a situação de uma companhia ou de um ambiente de trabalho não seria inclusa. A produtividade que beneficia diretamente um indivíduo seria considerada. Os custos inclusos seriam aqueles pagos por fora pelo indivíduo e custos relacionados com viagem e tempo fora do trabalho.80,84 A perspectiva de um empregador apenas inclui os benefícios e custos de um tratamento que o afete. Qualquer benefício, desde elevação na produtividade pelo empregado, está incluso. Adicionalmente, inclui-se qualquer aumento tangencial na produtividade, como redução nas faltas dos empregados como resultado de vacinação. Os custos inclusos são os gastos extras para o empregador e queda na produtividade como resultado de absenteísmo.80,84 A perspectiva do pagante inclui os benefícios e custos de um tratamento que afetam apenas um pagante. Benefícios ao indivíduo não são inclusos. Elevação na produtividade para o indivíduo ou sociedade não é inclusa. O horizonte temporal utilizado para calcular os benefícios e custos é a extensão esperada com que o indivíduo irá utilizar o plano de saúde.80,84

Tipos de estudos econômicos A PEC pode ou não incluir custos quando se comparam tratamentos. Entretanto, há cinco análises econômicas primárias na assistência médica que comparam tratamentos pelos custos e resultados e diferem primariamente na maneira com que os resultados são mensurados. Inicialmente, a análise custo-benefício compara o custo líquido e o benefício líquido de dois tratamentos. Os resultados devem ser convertidos em unidades monetárias, como disposição de pagar. Os resultados são tipicamente expressos como dólares consumidos por dólares ganhos.84,85 Em segundo lugar, a análise de custo efetividade (ACE) mensura o custo associado a duas ou mais intervenções médicas para um dado estado de saúde para determinar o valor relativo de uma intervenção sobre a outra. Com a ACE, o provedor de assistência em saúde procura responder à seguinte pergunta: “quais são os custos associados às diferentes opções de tratamento disponíveis para alcançar essa meta?”65 Em uma ACE, os efeitos da saúde são mensurados em unidades naturais diretamente relacionadas com o objetivo de interesse associado à intervenção. Por exemplo, a mensuração da efetividade primária pode ser expressa em termos de “custo por unidade de efeito”, em que o efeito pode ser o custo de anos de vida economizado pelo transplante de rins comparado à diálise,80,84,85 a diminuição na média da pressão sanguínea em mmHg, ou o número de reimplantes com sucesso.86 Em terceiro lugar, a análise custo-utilidade (ACU) foi desenvolvida para expressar as limitações da ACE. Surgiu nos últimos anos como o método preferido para avaliações econômicas na assistência médica, porque tanto a QdV quanto a longevidade podem ser avaliadas.65,80,84–87 De modo geral, ACE e ACU compartilham similaridades na perspectiva de análise de custo. Entretanto, diferem em termos de resultados: na ACE, os resultados são únicos e específicos da intervenção médica em estudo; na ACU, os resultados podem ser únicos ou múltiplos e, o mais importante, podem considerar a noção de preferência.64 A análise produz um custo por AVAQ para a intervenção que pode ser comparado a outros procedimentos. Em quarto lugar, a análise de custo-consequência não converte resultados para uma unidade comum, mas lista todas as consequências do tratamento.80,84 Finalmente, a análise da minimização de custos é utilizada para comparar os custos dos procedimentos quando os resultados são idênticos. Essa abordagem raramente é feita, porque dois procedimentos geralmente têm algo diferente relativamente a aspectos como taxas de complicações, dor e tempo de recuperação.80,84,85 Um aspecto controverso é se os custos apresentam resultados apropriados na PEC. A justificativa inicial para inclusão dos custos é que o valor total de uma intervenção pode ser facilmente entendido em termos econômicos.82 Entretanto, a PEC pode concluir que o tratamento mais caro tem o melhor valor. Um exemplo é a triagem para o câncer de mama em pacientes com mutações genéticas no gene BRCA. Em um estudo de Plevritis et al., a ressonância magnética de triagem mostrou-se custo-efetiva em relação à mamografia.88 A PEC procura o benefício, não apenas os custos, e, portanto, identifica o tratamento com o melhor valor, não necessariamente aquele com menor custo.82

Desenho do estudo Conforme previamente discutido, existem duas amplas categorias de desenho de pesquisa: estudos experimentais e observacionais. A pesquisa observacional apresenta muitas vantagens, como rapidez, decisões do “mundo real”, grandes tamanhos de amostras e baixo custo. Os estudos experimentais, como os ensaios clínicos randomizados, podem sobrepor algumas das limitações dos estudos observacionais pela atribuição randomizada dos pacientes a diferentes intervenções, controlando, desse modo, fatores de confusão conhecidos e desconhecidos. As recomendações do Institute of Medicine são para que o programa nacional de PEC desenvolva redes de dados clínicos e administrativos em larga escala para facilitar o uso de dados observacionais e experimentais para informar a PEC.83

Limitações Há diversas potenciais limitações à implementação da PEC na assistência médica. Para alguns, não há uma definição-padrão para efetividade comparativa. Também não está claro qual impacto esse tipo de pesquisa vai gerar na assistência médica, dado que muitos provedores não incorporaram esse tipo de informação na tomada de decisão médica. Resultados de estudos fundamentados na população podem não ser aplicáveis às necessidades individuais dos pacientes. A escolha da preferência do tratamento pelo paciente pode afetar os resultados da efetividade comparativa. Um estudo que não encontrou diferença estatisticamente significativa nos resultados dos tratamentos não necessariamente significa que não apresente diferença nos resultados. A ausência de significância estatística pode ser em razão de uma falha no desenho, como um estudo com baixo poder, ou por falhas no desenho do estudo. Adicionalmente, diferentes perspectivas, como a social, a do paciente ou a do empregador, podem apresentar diferentes resultados. É importante entender que a PEC auxilia a informar em uma decisão médica, mas não fornece uma simples resposta pronta.80

Resumo O motivo primário do interesse pelos pacientes, provedores e líderes políticos de saúde na PEC é a crença de que melhor informação será transformada em melhores decisões e melhora nos resultados na saúde. O impacto a longo prazo desses esforços dependerá da reforma legislativa da assistência médica, da habilidade da profissão médica em encorajar os médicos a mudar suas práticas e da disposição dos pacientes em participar de tomadas de decisões médicas compartilhadas.83

Tendências futuras Rede de ensaios clínicos multicêntricos Ao escolher uma opção de tratamento para seus pacientes, os cirurgiões plásticos utilizam muitas fontes de informação para determinar a melhor prática. É compreensivo que os cirurgiões tendam a confiar em grande parte em seu treinamento e em sua experiência pessoal. Resultados de estudos que relatam “experiência de um único cirurgião” têm tradicionalmente predominado na literatura de cirurgia plástica. Enquanto tais séries são de algum valor, seus achados não são necessariamente generalizáveis a outras situações (p. ex., práticas em menores volumes). Uma das forças mais poderosas na modelagem das melhores práticas é o ensaio clínico randomizado. Entretanto, em certas situações, ensaios unicêntricos podem ser difíceis de conduzir em razão das limitações no tamanho da amostra e recursos. Uma maneira de preservar a relevância clínica de um ensaio é contar com pacientes de múltiplas instituições em tratamento e acompanhamento sob um protocolo de estudo em comum. Essa abordagem também eleva a heterogeneidade da população, a qual pode, finalmente, levar a achados mais generalizáveis e relevantes. Essa heterogeneidade pode, entretanto, dificultar a detecção de diferenças no tratamento. Comparado a um ensaio unicêntrico, o efeito de um tratamento pode ser mais difícil de detectar em um ensaio multicêntrico. Entretanto, esses efeitos detectados são, provavelmente, mais convincentes em relação àqueles encontrados em uma única e homogênea população. Para facilitar tais estudos, a Plastic Surgery Education Foundation recentemente estabeleceu a Clinical Trials Network. Enquanto ainda em seu início, essa iniciativa fornece um mecanismo pelo qual cirurgiões plásticos por todo o país podem colaborar e contribuir para o avanço do conhecimento clínico. O exemplo mais convincente do valor dos ensaios clínicos multicêntricos na cirurgia plástica é o Venous Thromboembolism

Prevention Study. Nesse estudo, realizado sob a direção da Clinical Trials Network, cinco grandes centros de cirurgia plástica adotaram um protocolo comum para a quimioprofilaxia perioperatória na trombose venosa profunda. A incidência do tromboembolismo venoso tem sido prospectivamente avaliada e será comparada à incidência de eventos em um estudo de coorte retrospectivo com pacientes que não receberam profilaxia. Dados desse estudo fornecerão recomendações nacionais para a quimioprofilaxia, apoiados na prática da medicina baseada em evidências, e, finalmente, melhorarão a segurança do paciente. Uma importante barreira aos ensaios multicêntricos em cirurgia plástica é o custo.

Tradução de conhecimento Como a pesquisa clínica na cirurgia plástica continua a avançar rapidamente, a sobrecarga de informações é um constante desafio aos cirurgiões. A incorporação dos achados em pesquisas à prática da cirurgia plástica atualmente baseia-se em publicações e jornais de revisão paritária e atividades educacionais como a educação médica continuada (EMC) e o desenvolvimento profissional contínuo (DPC). Em razão de sua natureza passiva, a EMC e o DPC tiveram limitados efeitos na modificação da prática dos médicos. Discrepâncias ou lacunas na assistência mantêm-se entre o que é reconhecido como prática baseada em evidência e a assistência fornecida na prática diária da cirurgia plástica. Além disso, os pacientes estão sujeitos a receber intervenções cirúrgicas ou médicas potencialmente prejudiciais ou não comprovadas. Em um relato de 2001, intitulado Crossing the Quality Chasm: A New Health System for the 21st Century,89 o Instituto identificou três principais lacunas na qualidade da assistência: o erro médico, o sobreuso e o subuso. Como exemplo, apesar da evidência de que o risco da trombose venosa profunda é particularmente alto para pacientes submetidos à abdominoplastia combinada à lipoaspiração, apenas 60% dos cirurgiões plásticos relatam o uso constante de tromboprofilaxia.90 O Canadian Institutes for Health Research (CIHR) é responsável pela adoção da expressão relativamente nova “tradução de conhecimento” (TC), e a define como “um processo dinâmico e iterativo que inclui síntese, disseminação, troca e aplicação ética do conhecimento para melhorar a saúde, fornecer serviços em saúde e produtos mais efetivos e fortalecer o sistema de assistência médica”.91 A TC tem sido proposta como uma solução na redução das lacunas na assistência, garantindo colaboração entre público, pacientes, clínicos, gerentes e legisladores para informar a prática e a política relacionadas com a saúde.92,93

Um modelo para entender a TC O CIHR elaborou um modelo de Conhecimento para Ação, subdividindo a TC em duas categorias: (1) TC endof-grant e (2) TC integrada.93,94 Na TC integrada, estratégias são desenvolvidas para combinar achados de pesquisas às necessidades dos indivíduos e organizações apropriadas após o término da atividade de pesquisa. Essa abordagem é também conhecida como difusão e disseminação dos achados de pesquisa. Contrariamente, a TC integrada liga indivíduos e organizações em cada passo do processo de pesquisa, desde o estabelecimento da questão em pesquisa até a interpretação e disseminação dos achados. A meta dessa abordagem é produzir achados na pesquisa com maior probabilidade de serem relevantes e utilizados pelas partes interessadas, incluindo pacientes, clínicos, gerentes e legisladores.95,96 Há uma variedade de modelos para melhorar a qualidade da assistência médica por meio da TC. Um dos mais comuns é o modelo 4T (Fig. 10.12).97 A primeira estratégia, citada como T1 (tradução 1), é focada na transformação de achados científicos básicos em pesquisa translacional. A T2 (tradução 2) compreende todas as atividades dirigidas para a produção de estudos clínicos com base em achados de pesquisa translacional. As atividades T3 (tradução 3) são focadas na disseminação e entrega das intervenções na assistência médica a todos os pacientes, conforme a condição de saúde de cada paciente. Finalmente, as atividades T4 (tradução 4) focam as experiências da disseminação da tradução em novas investigações científicas básicas.

FIG. 10.12 Modelo 4T de tradução de conhecimento. (Reproduzida de Dougherty D, Corway PH. The “3Ts” road map to transform US healthcare: the “how” of high-quality care. JAMA 2008;299:2319–2321.)

Desafios O sistema de saúde atualmente é falho em sua capacidade de transformar conhecimento em prática clínica. Um estudo comparando assistência médica nos EUA, com diretrizes nacionais estabelecidas, literatura médica e indicadores de qualidade existentes, demonstrou que os pacientes receberam 54,9% do cuidado recomendado.98 De fato, leva em média 17 anos para que o novo conhecimento gerado pela pesquisa, como ensaios controlados randomizados, seja inserido na prática de forma generalizada.99,100 Em uma revisão sistemática de literatura por Cabana et al., a sequência de mudança de comportamento de um médico na prática clínica é dividida em três áreas: conhecimento, atitude e comportamento.101 Cada área pode encontrar forças opostas na aplicação do conhecimento com base em evidências. Em primeiro lugar, a aquisição de conhecimento pelo médico pode encontrar barreiras como falta de familiaridade e falta de consciência (p. ex., o crescente volume de nova literatura, o tempo investido para manter-se informado).101,102 Em segundo lugar, as atitudes do médico que favorecem a mudança de comportamento podem ser detidas pela falta de expectativa de resultados, autoeficácia e motivação (p. ex., dúvida em relação à validade da pesquisa clínica, ceticismo sobre a aplicabilidade da evidência à prática clínica, desconforto relativo à modificação da técnica prévia).101,102 Finalmente, os fatores que dificultam a aplicação prática da mudança de comportamento relativo ao novo conhecimento fundamentado em pesquisa podem ser externos (p. ex., recusa do paciente, evidências de pesquisas conflitantes, falta de recursos, constrangimentos organizacionais).101,102 Outros fatores que influenciam o sucesso da implementação das intervenções baseadas em evidências incluem falta de comunicação entre a organização e os fornecedores de assistência médica, e identificação preventiva de fatores que atrapalham o cumprimento das práticas recomendadas. O sucesso na implementação da prática baseada em evidências tem, desse modo, pouca dependência na adoção de um programa abrangente que incorpore métodos para melhorar a cultura, a equipe de trabalho e a comunicação.103,104

Colaboradores de aprendizado Com o objetivo de melhorar a assistência médica, o Institute for Healthcare Improvement desenvolveu um modelo de colaboração de aprendizado em 1995, chamado modelo Breakthrough Series. É um processo de aprendizado emergente no qual grupos de profissionais de diferentes organizações de saúde trabalham em um ambiente estruturado para melhorar determinada área de sua prática clínica.105 Enquanto as redes de ensaios clínicos são desenhadas para testar uma intervenção (p. ex., droga, procedimento cirúrgico, equipamento médico, abordagem de triagem), grupos de colaboradores de

aprendizado a fim de melhorar a qualidade do atendimento focam a melhor maneira de adotar, programar e adaptar a prática baseada em evidências para os ambientes da vida real. Esses colaboradores frequentemente identificam meios de melhorar a qualidade e a confiança e de baixar custos da assistência médica por meio de comparações detalhadas entre organizações das diversas intervenções de saúde, cultura e sistemas.106 Muitas colaborações bem- -sucedidas se uniram em torno de diversas condições de saúde, como tratamentos cardíacos,107 fibrose cística,108 cuidados pediátricos,109 infecção de cateter central103 e muitos outros tópicos patrocinados pelo Institute for Healthcare Improvement.110 Na tentativa de colaboração, o objetivo final é promover a disseminação e a adoção da prática baseada em evidências para ajudar organizações e profissionais da saúde a reduzir a lacuna entre a prática atual e a melhor prática na assistência médica. Utilizando princípios de instrução para adultos, os grupos de colaboradores de aprendizado permitem que os profissionais compartilhem e aprendam com as experiências e dificuldades coletivas. Por reunir profissionais de diferentes áreas de uma mesma organização103 e de diferentes organizações,111 a informação é compartilhada em melhor prática clínica, métodos de qualidade e experiências durante a implementação de melhorias sistemáticas ao sistema de saúde como um todo. Em sua revisão sistemática, Schouten et al.112 fizeram um relato sobre o impacto dos grupos de colaboradores para melhora da qualidade e concluíram que a evidência é “positiva, mas limitada”, e que estudo mais aprofundado é necessário para o entendimento dos modelos mais efetivos. O que isso significa para os cirurgiões plásticos? Na cirurgia plástica, um grupo-piloto de colaboradores de aprendizado foi lançado utilizando o TOPS113 como depósito central de dados. O foco desse grupo é compartilhar práticas que envolvam procedimentos abdominais e porcentagem de seroma no pós-operatório. Uma dificuldade para as sociedades de cirurgia plástica é a alta taxa de cirurgiões que realizam procedimentos sozinhos, em clínicas particulares, onde podem faltar os recursos necessários para compartilhar resultados. Adicionalmente, a prática da cirurgia plástica ocorre em um mercado altamente competitivo, no qual a cultura da colaboração pode ser dificultada, mas não impossível. É possível que forças externas, como alteração nas estratégias de reembolso, movam nossa comunidade em direção ao reconhecimento da importância de grupos de colaboradores.

Papel dos registros médicos eletrônicos/integração de coleta de dados por meio de assistência de saúde versus pesquisa Para obter uma tradução de conhecimento (TC) realmente efetiva e contínua melhoria na qualidade, segurança e valor da assistência médica, uma infraestrutura para o uso de dados consistentes é essencial. Os sistemas atuais são limitados em razão de os registros médicos serem feitos em papel e pela falta de interligação dos dados coletados, mesmo quando dados eletrônicos estão disponíveis, o que faz a maioria dos dados clínicos ser relativamente inacessível em termos práticos. Nas organizações de saúde em que os dados clínicos são atualmente utilizados (p. ex., Surgical Care Improvement Project [SCIP]114 e National Surgical Quality Improvement Program [NSQIP]115), funcionários devem ser contratados em dedicação exclusiva para sintetizar os dados dos papéis ou registros eletrônicos manualmente e organizá-los em um diferente formato de apresentação. Por causa dos altos custos desse serviço, apenas uma pequena amostra de casos cirúrgicos e dados apontados pode ser incluída. Quando ensaios de pesquisa clínica são realizados, grande parte da coleta de dados é feita em papel, duplicando a informação já presente no registro médico, o que novamente representa um processo de trabalho muito intenso. Adicionalmente, quando dados relatados por pacientes são coletados, os pacientes podem receber perguntas similares àquelas já realizadas durante a consulta médica, adicionando, desse modo, significativa redundância das perguntas aos pacientes. Além disso, pode ser difícil ou até mesmo impossível anexar o score de questionários com base nas informações colhidas dos prontuários ao lado dos leitos, impedindo a interação entre paciente e provedor de dados, a qual poderia ter impacto significativo em sua tomada de decisão. Diversas sociedades de especialidades, incluindo a American Society of Plastic Surgeons, contrataram consultores para desenvolver websites para coleta de dados, como o TOPS. Entretanto, isso requer médicos de áreas específicas para sintetizar os dados manualmente e organizá-los na base de dados nacional, criando, desse modo, uma significativa barreira para a participação de muitos consultores. Poucos grupos, além do Cancer Trialists Collaborative Group, que recebe fundos nacionais, têm conseguido sucesso em desempenhar e sustentar tais esforços.

Soluções possíveis: genéricas Com a evolução da tecnologia da computação e da internet, a viabilidade de transformar dados em informações importantes para tomada de decisão junto ao leito, dar uma resposta ao médico, comparar o desempenho de dois ou mais sistemas, melhorar os cuidados, estabelecer consensos, certificação e pesquisa está se tornando muito mais acessível, prática e realista. Embora a tecnologia da informação tenha muito a oferecer em permitir a transformação da assistência médica, tem sido lenta na adoção e efetividade em comparação a outras indústrias. Para estimular o crescimento, os EUA desenvolveram um plano de 5 anos de duração para definir o “uso significativo” de registros médicos eletrônicos (EMRs).116 Espera-se que isso elevará a adoção significativa da tecnologia da informação na saúde (HIT) pelos provedores e hospitais. Padrões de questionários PRO ainda não foram incluídos na atual e nas futuras definições propostas de “uso significativo”. Entretanto, normas de apoio às decisões e alertas de boas práticas podem beneficiar-se da inclusão dessas medidas. Por exemplo, um questionário PRO para depressão poderia gerar um alerta para indicar um profissional da saúde mental com boas práticas.117 Da mesma forma, um questionário PRO para violência doméstica poderia criar um profissional do serviço social bem-capacitado. Com a informatização de tais questionários PRO integrados à rede de assistência, tornando possível um score imediato e relatando à equipe de assistência médica, avança nossa habilidade em prover cuidados de alta qualidade. Isso supera o que já foi alcançado no passado com questionários impressos e com as ações de investigação aplicados, ambos avaliados muito posteriormente nos congressos e simpósios, e, muitas vezes, nunca retornados à equipe de assistência. A adoção gradual de EMRs por mais organizações de saúde, médicos e consultórios particulares fornece uma crescente oportunidade de captar dados estruturados no local de assistência. Esses sistemas não apenas facilitam a obtenção sistemática de dados, mas também permitem análise sistemática e relatos. Esses relatos podem ser realizados com diversos propósitos, como fornecer imediato apoio à decisão e evidência das boas práticas aos profissionais de saúde com o paciente. Os registros podem ser armazenados em grupos de pacientes com condições de saúde similares (p. ex., todos os pacientes com câncer de mama), procedimentos similares (p. ex., todos os pacientes com retalhos livres) ou em um perfil do profissional de saúde (p. ex., todos os casos cirúrgicos realizados pelo mesmo cirurgião). Esses registros poderiam também ser agrupados pelo nível de prática, nível de departamento ou nível nacional.

Soluções possíveis: cirurgia plástica e questionários PRO A mobilização de recursos para desenvolver e programar ferramentas de coletar dados dentro do ambiente clínico é frequentemente um desafio para o cirurgião plástico. Entretanto, diversos centros avançados começaram a utilizar os questionários PRO. Como há fácil acesso aos resultados laboratoriais oportunos e padronizados, também deveríamos ter disponibilidade similar de dados oportunos e padronizados próximo aos leitos. Em muitos casos, particularmente na especialidade da cirurgia plástica, questionários PRO podem fornecer melhor informação para tomada de decisões, ou adicionar importante dimensão para mais medidas biométricas tradicionais. Por exemplo, a escala de Levine118 para pacientes de síndrome do túnel do carpo, quando disponível durante uma visita médica, é muito útil para pacientes individuais e seus cirurgiões na quantificação do impacto dos sintomas e no acompanhamento do efeito de um tratamento em particular. Igualmente, o BREAST-Q55 foi desenvolvido para proporcionar informação útil da paciente no leito, assim como valiosa informação para pesquisa. Em Dartmouth, fomos capazes de integrar as admissões e ao resumos de alta eletrônicos dos pacientes na rotina hospitalar com o propósito de melhorar a qualidade e a eficiência dos tratamentos, relatos e pesquisa. Isso foi operacionalizado por 14 programas de especialidades, incluindo minucioso cuidado na área de mastologia e cirurgia da mão. No Memorial Sloan-Kettering, o BREAST-Q é rotineiramente administrado no local de cuidado. Cirurgiões plásticos participando de TOPS podem solicitar que o BREAST-Q seja enviado a seus pacientes de cirurgia mamária para acompanhamento pós-operatório longitudinal. Um sentimento comum expresso pelos profissionais que têm acesso a essas informações no momento de uma consulta é que eles não podem imaginar o retorno a uma prática na qual essa informação não esteja disponível. Quanto mais as avaliações tornam-se sofisticadas, há uma necessidade maior em aprovar e utilizar essas mesmas ferramentas a fim de fazer uma significativa comparação dos dados por meio de registro nacional. Não há dúvida de que essas avaliações melhorarão por meio de um processo iterativo em andamento. Quanto mais os cirurgiões plásticos participarem, mais ajudarão a modelar o desenho desses sistemas de dados para fazê-los

ainda mais práticos para pacientes internados e mais efetivos na resposta de importantes questões clínicas por estudos de pesquisas bem desenhados e grupos de colaboradores.

O que fazer com os resultados? EMRs e HIT têm o potencial de melhorar a qualidade da assistência médica e apoiar a transformação da maneira com que a medicina é praticada e fornecida aos pacientes. A avaliação contínua computadorizada de qualidade de dados encontrados em EMRs deve facilitar o monitoramento contínuo e a melhora da qualidade da assistência médica, assim como da tomada de decisões médicas. Nos EUA, numerosas iniciativas nacionais estão atualmente procurando maneiras de avaliar os sistemas de saúde com o objetivo de coletar e comparar dados da estrutura dos sistemas de assistência médica, intervenções médicas e resultados dos pacientes. Esses dados são valiosos para muitos interessados, como pacientes, prestadores de serviços médicos, convênios médicos e agências governamentais. Dessa forma, há atualmente um foco sem precedentes na quantificação da qualidade da saúde, sendo a melhora dos resultados em saúde, assim, um desafio importante e urgente. O primeiro modelo resumindo os fatores que influenciam o desfecho clínico dos pacientes foi desenvolvido por Donabedian em 1966.119 Essa estrutura ainda é relevante hoje e considera a hipótese de que as estruturas da saúde (p. ex., uma equipe de microcirurgia dedicada) e processos da saúde (p. ex., conduta padronizada do reimplante de membros) apresentam papel nos resultados dos pacientes. Nesse tipo de modelo, os resultados podem tomar qualquer forma apropriada a uma prática, como mortalidade, estado de saúde, estado funcional, satisfação, QdV e custos. A criação de diretrizes da prática clínica tornou-se uma estratégia frequentemente utilizada para melhorar a qualidade da assistência médica e dos resultados. Estas representam uma maneira de traçar práticas baseadas em evidências, por meio de uma revisão e síntese da literatura, em uma tentativa de guiar melhor os cuidados com o paciente. Entretanto, embora extremamente útil, as diretrizes isoladamente não são suficientes para produzir melhoras na qualidade da saúde. A estratégia de publicação e disseminação de diretrizes de prática falhou em garantir sua implementação. Hoje, avaliações de desempenho, relatos públicos, P4P e cuidados na decisão do paciente são cada vez mais utilizados para melhorar a qualidade clínica. Inserida em todas essas iniciativas está uma variedade de avaliações de resultados de pacientes.

Avaliações de desempenho No processo de facilitar a avaliação da qualidade da assistência médica, a avaliação da melhora do desempenho serve como um veículo para transformar a evidência mais forte em prática clínica mais rapidamente. As avaliações tipicamente passam por diversas iterações antes de ser amplamente endossadas como significativas e confiáveis. Nos estágios mais precoces de maturação, tem sido proposto que as avaliações sejam nomeadas como “medidas de qualidade”.120 Essas medidas podem ser utilizadas para dar assistência aos prestadores de serviços médicos, hospitais ou ao sistema de saúde na autoavaliação, na melhora da qualidade do atendimento e desfechos clínicos do paciente. Com melhoras repetidas nas próprias avaliações, estas podem-se elevar para os exatos padrões de organização, como o National Quality Forum,121 e ser endossadas como “medidas de desempenho”120 formais, utilizadas para relatos públicos, comparação da assistência entre instituições ou provedores de assistência médica, iniciativas P4P e, em futuro próximo, para uso em iniciativas significativas. O credenciamento e os incentivos financeiros em concordância com as medidas de desempenho encorajam os provedores e organizações de assistência médica a oferecer a qualidade de cuidados baseada nas mais fortes evidências. Um dos principais exemplos de uma iniciativa de processo dirigido à qualidade é a SCIP.114,122,123 Essa parceria de organizações de qualidade nacional foi inicialmente uma colaboração voluntária para melhorar os cuidados cirúrgicos pela redução de complicações cirúrgicas. Houve a transição para um sistema público obrigatório em 2005.124 O objetivo final desse programa foi reduzir nacionalmente a incidência de morbidade e mortalidade cirúrgica preveníveis em 25% até o ano 2010 por meio de esforços colaborativos. Esse programa apresenta quatro módulos de complicações preveníveis: (1) infecções de ferida cirúrgica;114 (2) tromboembolismo venoso;125 (3) eventos cardiovasculares; e (4) complicações respiratórias. O desconto na fonte do pagamento pro rata do Medicare foi utilizado como incentivo financeiro para garantir a participação na SCIP. Entretanto, atualmente, estudos mostrando o efeito das avaliações de processo SCIP após cirurgia colorretal em taxas de infecções de ferida cirúrgica apresentam resultados mistos.126,127 É notável que esses estudos utilizem amostras

de tamanhos relativamente pequenos em cada instituição participante. Além disso, as avaliações SCIP de performance têm como objetivo um limitado conjunto de procedimentos cirúrgicos, nenhum relativo à cirurgia plástica. Tais avaliações são primariamente úteis em nível organizacional, mas não em nível de provedor individual. Entretanto, a coleta de dados SCIP de um dado EMR rico irá fazer o relato em nível de provedor individual muito mais praticável. O American College of Surgeons’ NSQIP115 é outra iniciativa que está ganhando crescente força entre especialidades cirúrgicas e hospitais para melhorar os resultados cirúrgicos. Embora no passado o NSQIP não tenha incluído dados de casos de cirurgia plástica, discussões com a American Society of Plastic Surgeons estão atualmente em atividade. Para os hospitais participantes, e os cirurgiões que eles representam, dados clínicos, mais que dados administrativos, podem ser utilizados para comparar resultados entre organizações e apoiar esforços de melhoria. Até atualmente, o único estudo expressando avaliações de desempenho na cirurgia plástica foi conduzido no Reino Unido. A British Association of Plastic Surgeons, seguindo uma exigência dos clínicos do National Health Service para participar de auditorias clínicas, tomou a iniciativa de identificar procedimentos cirúrgicos que poderiam ser utilizados como marcadores de qualidade na especialidade.128 Em seu estudo-piloto, uma avaliação da qualidade nacional para sobrevivência em retalho livre e retalho pediculado foi realizada. Na comparação de quatro unidades de cirurgia plástica, o resultado geral alcançado foi de 89% de sobrevivência do retalho total. O Programa de Manutenção de Certificação do American Board of Plastic Surgery está tomando a liberdade de avaliar o desempenho médico. Eles lançaram recentemente o módulo Avaliação Prática em Cirurgia Plástica (PA-PS) para 20 dos procedimentos mais realizados na cirurgia plástica. Embora longe de ser tão robustos quanto necessário no futuro, esses módulos irão provavelmente ser submetidos a frequentes aprimoramentos para melhorar sua utilidade na prática clínica e irão, sem dúvida, incluir o PRO no futuro. Em outra frente, a Joint Commission, que credita organizações de assistência médica, criou um padrão envolvendo a avaliação da prática profissional no nível do provedor individual.129 Como outras iniciativas, avaliações preliminares serão derivadas amplamente dos dados em processo e talvez das complicações cirúrgicas, e estaremos aguardando futuras iterações para integrar resultados relatados por pacientes.

Relatos públicos e P4P Apesar da limitada evidência de seus benefícios, relatos públicos de dados sobre a qualidade de hospitais e P4P são as duas estratégias mais defendidas para acelerar a melhora na qualidade e segurança da assistência médica.130 A avaliação e a publicação de informação acerca da qualidade de hospitais, planos de saúde e médicos estão direcionando os programas P4P. A responsabilidade pública de avaliações de qualidade provouse um excelente motivador para os provedores de saúde e hospitais para investir esforços em atividades de qualidade, já que as avaliações de desempenho estão abertas para a revisão pública.131,132 O P4P é um modelo de compensação utilizado por convênios que associa incentivos financeiros à qualidade da assistência médica fornecida.133 Enquanto o conceito P4P está ganhando força como meio de melhorar a qualidade geral da assistência pela redução das lacunas entre a prática clínica e diretrizes baseadas em evidência, é também visto como um modo de encorajar o uso eficiente de recursos na assistência médica. As iniciativas P4P podem tomar variadas formas, abrangendo diferentes modelos de pagamento, vários interessados (p. ex., hospitais, grupos de práticas, profissionais particulares) e diversas condições clínicas. A evidência disponível acerca dos impactos do P4P foi mista.134–136 Alguns estudos em larga escala relataram moderado fortalecimento na avaliação dos processos de cuidados, mas até atualmente nenhum impacto foi relatado em resultados de pacientes ou eficiência de cuidados.130,137–139 Recentemente, o governo federal introduziu seu próprio programa Pay for Reporting (P4R): o Physician Quality Reporting Initiative. Essa iniciativa oferece incentivos financeiros aos provedores do Medicare que participarem dos relatos de qualidade. Ao contrário dos programas P4P, o modelo P4R compensa os médicos independentemente de seu desempenho na avaliação do processo e dos resultados.140 Em 2002 e 2003, um experimento natural ocorreu, envolvendo milhares de hospitais americanos participando de uma iniciativa de relato pública nacional, com mais de 200 organizações engajadas em uma iniciativa P4P simultânea. Lindenauer et al.130 observaram que os hospitais participantes tanto no relato público quanto no programa P4P mostraram melhorias discretamente maiores na qualidade da assistência médica do que os hospitais engajados apenas no relato público.

Alguns críticos argumentam que pequena evidência liga avaliação de performances a resultados de pacientes.132 Uma explicação para isso poderia ser encontrada na percepção de que as avaliações atuais focam um número muito pequeno de processos de cuidados em relação ao total de intervenções que caracterizam a experiência do paciente no hospital.131 Além disso, resultados de ensaios clínicos controlados randomizados com estudos de amostras homogêneas podem não ser generalizáveis a todos os pacientes.132 Adicionalmente, resultados da prática diária são influenciados por várias misturas de pacientes e tratamentos, que são dificilmente replicáveis em ensaios controlados randomizados. Outro fato seria que muitos dos estudos que falharam em demonstrar melhora nos resultados não pesquisaram resultados procedentes de longos intervalos após a realização do processo de cuidado no paciente. Além disso, a presente responsabilidade da coleta detalhada de dados limita a habilidade dos pesquisadores em captar informações dos pacientes nos ambientes de trabalho ao longo do tempo. A coleta de dados deveria ser facilitada pelo uso difundido de registros médicos eletrônicos, permitindo aos pesquisadores uma avaliação de resultados provenientes de longos períodos prontamente.131

Auxílio na decisão dos pacientes Uma tomada de decisão com dados sobre o melhor tratamento pode ser difícil para os pacientes, especialmente quando há mais de uma opção razoável. Nos últimos 30 anos, a área de decisão baseada em evidência na assistência médica cresceu rapidamente. O auxílio na decisão dos pacientes objetiva apoiar esse processo e ajudar no acesso às escolhas com informações baseadas em níveis de evidência. De acordo com a colaboração da International Patient Decision Aids Standards, o auxílio na decisão é uma ferramenta baseada em evidência criada para preparar pacientes para contribuírem ativamente no processo de tomada de decisão entre opções de escolha de assistência médica, de acordo com suas preferências e valores.141–143 Eles diferem dos materiais convencionais de educação dos pacientes por serem mais detalhados, específicos e deliberados, e apresentam um foco mais personalizado nas opções e nos resultados, com o objetivo de ajudar os pacientes a fazerem escolhas com informação.142 O auxílio nas decisões dos pacientes não substitui as visitas médicas a eles, ele apenas suplementa o aconselhamento do provedor sobre as opções na assistência médica.142 Pode ser utilizado antes, durante ou após a interação com um médico. Uma revisão sistemática recente de Cochrane sobre o auxílio às decisões dos pacientes relatou que há melhora no conhecimento deles em relação a suas opções, reduzindo conflitos na decisão por sentirem-se desinformados ou confusos sobre valores pessoais.142 Após o uso do auxílio nas decisões, poucos pacientes mantêm-se indecisos sobre sua escolha de tratamento. É importante ressaltar que mais pacientes participam ativamente do processo de decisão. Entretanto, os ensaios controlados randomizados falharam em demonstrar que essas ferramentas melhoram os resultados dos pacientes, como a incerteza nas decisões, satisfação, ansiedade ou QdV.144 Adicionalmente, há pouca evidência dos efeitos do auxílio ao paciente na tomada de decisão em relação a determinado tratamento, arrependimento da decisão, taxas de processos, custos da assistência médica e uso de recursos.142 A evidência que apoia o uso do auxílio nas decisões na prática clínica é considerável.142,144,145 Um bom auxílio na decisão deve ir ao encontro das necessidades de sua população-alvo e ser aceito tanto pelos pacientes quanto pelos provedores que desejam incorporá-lo à prática clínica. As barreiras para uma implementação bemsucedida são a falta de sistemas efetivos para a disponibilização do apoio nas decisões. É necessário mais pesquisa para avaliar os efeitos do auxílio nas decisões em congruência entre os valores dos pacientes e suas escolhas de opções. O desenho e o desenvolvimento de estratégias para o auxílio de decisões de alta qualidade são amplamente reforçados quando a base de evidência disponível é consistente, incluindo resultados relatados por pacientes. Há muita oportunidade para a comunidade da cirurgia plástica aderir a essa base de evidência.

Conclusões Este capítulo estaria incompleto sem a ênfase nos pontos-chave. Um clínico não pode tomar boas decisões sem boa evidência e não pode gerar boa evidência sem um bom desenho de estudo e bons dados. A maximização dos cuidados com o paciente e dos resultados das cirurgias exigirá contínuo esforço para identificar as necessidades de informação e produzir a melhor evidência para preencher tais necessidades. A pesquisa de resultados oferece amplo espectro de métodos pelos quais se podem obter boa evidências, e esses têm sido

pouco alavancados por nossa especialidade. Em particular, a avaliação da perspectiva dos pacientes sobre os resultados é uma dimensão crucial da pesquisa e da assistência médica, que é subdesenvolvida e subutilizada. A avaliação de resultados não é simplesmente sobre o resultado final das intervenções, mas um meio pelo qual se juntam evidências para melhorar a tomada de decisão, os processos de tratamentos e os sistemas nos quais trabalhamos. O conjunto de dados colaborativos por meio de ensaios clínicos e iniciativas para melhora da qualidade é essencial para a geração de informação clínica significativa em nossa especialidade. Nossas decisões precisam ser baseadas na evidência de maior qualidade, e não no acúmulo de evidências de um mesmo cirurgião, mesmo quando este é realmente um perito na área. Igualmente importante à geração de evidência clinicamente significativa é colocar a informação em prática por intermédio dos cirurgiões com mecanismos para implementar e monitorar novos padrões. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  11. Walach, H., Falkenberg, T., Fonnebo, V., et al. Circular instead of hierarchical: methodological principles for the evaluation of complex interventions. BMC Med Res Methodol. 2006; 6:29. Walach e coautores discutem a suposição amplamente apoiada em torno da hierarquia da evidência que dispõe ensaios controlados randomizados (ECR) no topo – que são, por sua vez, superados apenas pela metanálise de múltiplos ECRs. Entretanto, essa hierarquia é baseada em um modelo farmacológico de terapia. Quando generalizado para outras intervenções, como o gerenciamento médico integrativo, a cicatrização de feridas e a cirurgia, o modelo hierárquico é válido para limitadas questões de eficácia. ECRs são fortes no campo da validação interna (minimização de interferências), mas não tanto em relação à validação externa ou generalização dos achados. Em vez de uma “evidência hierárquica”, eles propõem um “modelo circular” de evidência que inclui múltiplos métodos, com diferentes desenhos de pesquisa, balanceando pontos fortes e fracos para chegar à melhor evidência clínica.

22. Wennberg, D. E., Lucas, F. L., Birkmeyer, J. D., et al. Variation in carotid endarterectomy mortality in the Medicare population: trial hospitals, volume, and patient characteristics. JAMA. 1998; 279:1278–1281. Este artigo avaliou a mortalidade perioperatória entre os pacientes do Medicare submetidos à endarterectomia de carótida (EC). O estudo demonstrou que o risco de mortalidade pré-operatória acompanhando a EC foi significativamente maior do que o relatado em ensaios clínicos, mesmo entre as instituições que participaram dos ensaios clínicos para a eficácia na prática diária.

26. Chung, K. C., Kalliainen, L. K., Hayward, R. A. Type II (beta) errors in the hand literature: the importance of power. J Hand Surg [Am]. 1998; 23:20–25. Este trabalho descreve quantos artigos no Journal of Hand Surgery tiveram insignificante tamanho de amostra e força para fornecer uma adequada avaliação da eficácia terapêutica. Os autores descobriram que 82% dos estudos “negativos” tiveram uma força de menos de 0,80 para detectar efeito de 25% do tratamento. Pesquisadores e clínicos devem estar conscientes da importância de um adequado tamanho de amostra e força estatística com o objetivo de evitar um erro tipo 2 ou beta, que é a conclusão errônea de que a hipótese nula é correta.

44. Cano, S. J., Klassen, A., Pusic, A. L. The science behind quality-of-life measurement: a primer for plastic surgeons. Plast Reconstr Surg. 2009; 123:98e–106e. Os autores fornecem uma visão geral dos princípios-chave fundamentais ao desenvolvimento dos meios de resultados relatados pelos pacientes. Fornecem definições da terminologia pertencente a esse campo de estudo, com explicações de conceitos relevantes. Os autores também fazem uma descrição dos elementos essenciais para a avaliação da qualidade de um instrumento, com um resumo dos desenvolvimentos recentes em métodos psicométricos de avaliação de qualidade de vida.

106. Ayers, L. R., Beyea, S. C., Godfrey, M. M., et al. Quality improvement learning collaboratives. Qual Manag Health Care. 2005; 14:234–247. Os autores entrevistaram indivíduos que tiveram e implantaram grupos colaborativos de aprendizado de grande sucesso, e descrevem as características-chave que fizeram essas iniciativas bem-sucedidas e sustentáveis. Para os interessados em saber como ter sucesso, a descrição dos autores sobre a importância de construir confiança, a apreciação e o contato com diferentes culturas organizacionais e a união ao redor de uma paixão pela melhora da qualidade são muito úteis.

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Nota da Tradução: PICO: P – Population (pacientes/cenário clínico); I – Intervention (intervenção a ser testada); C – Control grupo-controle de interesse); O – Outcomes (desfechos clínicos relevantes).

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Genética e diagnóstico pré-natal Daniel Nowinski, Elizabeth Kiwanuka, Florian Hackl, Bohdan Pomahac e Elof Eriksson

Resumo A expressão genética é regulada principalmente pelo nível da transcrição de genes. As células respondem e se adaptam às mudanças na expressão dos genes em relação aos fatores solúveis, contatos intercelulares e entre as células e a matriz. A regulação epigenética da expressão de genes é preservada por meio da divisão celular e determinada principalmente pela organização tridimensional da cromatina. Na terapia gênica, a expressão de genes individuais é modificada ou genes anormais são corrigidos. Os transgenes distribuídos podem ser classificados como genes inibidores, genes vacinas ou genes substitutos. Métodos biológicos ou não biológicos são utilizados para entregar os transgenes para as células. O método não biológico mais comum é a entrega por meio de vetores de lipossomas catiônicos. O método biológico predominante de entrega de genes é por meio de vetores virais. Abordagens de terapia gênica estão sendo desenvolvidas para melhorar o reparo e a regeneração tecidual. A abordagem mais comum é a entrega de genes que codificam fatores de crescimento. A terapia gênica pode ser combinada com a terapia celular e de biomateriais de suporte para induzir diretamente a regeneração dos tecidos. Com base no mecanismo principal de sua patogênese, as anomalias congênitas podem ser classificadas como malformações, deformações, rupturas ou displasias. Cerca de 70% dos casos de fendas labiais e palatinas são não sindrômicas. Esses casos são normalmente esporádicos (não herdados) e apresentam etiologia multifatorial que envolve diferentes genes e fatores ambientais. A maioria das síndromes de craniossinostoses é causada por mutações de ganho de função no receptor do fator de crescimento de fibroblastos (FGFR). Essas síndromes são herdadas como doenças autossômicas dominantes, no entanto, a maioria dos casos surge como resultado de novas mutações. A ultrassonografia pode ser utilizada para detectar malformações craniofaciais, como as fendas faciais e as craniossinostoses. O diagnóstico pré-natal das anomalias congênitas, que apresentam mutações genéticas conhecidas, pode ser confirmado com testes invasivos.

Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês e a Figura 11.1 em http://www.expertconsult.com

Introdução Durante a última metade do século foi observada uma grande expansão no conhecimento da genética. A contribuição dessa evolução para a cirurgia plástica já é significativa. Diversas metodologias são amplamente utilizadas para explorar a estrutura, função e regulação de genes nas pesquisas relacionadas com a cicatrização de feridas e regeneração tecidual. O esclarecimento da base genética para várias síndromes tem aumentado a

compreensão da patogênese dessas condições e melhorado as possibilidades de diagnóstico. Além disso, os instrumentos para o diagnóstico pré-natal foram aprimorados. Poucos afirmariam que os avanços em genética (os futuros e os em curso) iriam trazer terapias novas e aprimoradas para os pacientes com condições tratadas pelo cirurgião plástico. Este capítulo é uma revisão de alguns aspectos genéticos que são relevantes para a cirurgia plástica. A primeira seção, que é sobre o genoma, proporcionará ao leitor os conceitos básicos para a compreensão da genética como fundamento para a doença. Em seguida, em outra seção será abordada a terapia gênica. Os métodos atuais para a modificação da expressão de genes e exemplos de possíveis aplicações terapêuticas em cirurgia plástica foram descritos. Foi incluído neste capítulo um breve relato sobre os aspectos morais e éticos da genética na pesquisa e prática médica. A parte remanescente é dedicada aos diferentes aspectos do diagnóstico genético e pré-natal. Uma seção sobre a etiologia genética e patogênese das anomalias craniofaciais é seguida por uma breve descrição do diagnóstico pré-natal. Por fim, uma rápida discussão sobre as perspectivas futuras é realizada.

Genoma humano Biologia molecular básica DNA Os genes são feitos da molécula de ácido desoxirribonucleico ou DNA (Fig. 11.2). A molécula de DNA é um longo polímero de unidades denominada desoxirribonucleotídeos ou nucleotídeos. Cada nucleotídeo é composto por açúcar fosforilado, fosfodeoxirribose e uma das quatro bases de nucleotídeos: adenina (A), guanina (G), citosina (C) ou timina (T). Dois desses polímeros formam uma dupla fita em forma de hélice com o fosfato de açúcar como um esqueleto hidrofílico, posicionado no exterior, e as bases hidrofílicas, no interior. As bases de uma fita se ligam às bases da outra fita, aonde A pareia com T e C pareia com G. Como consequência, a cadeia de DNA é complementar, e a sequência de uma fita gera a sequência da outra. Uma extremidade da molécula de DNA inicia com um açúcar fosforilado no carbono 5′ e na outra extremidade a cadeia termina com o carbono 3′ hidroxilado. As duas cadeias estão em orientação antiparalela, com a extremidade 3′ pareando com a extremidade 5′.

FIG. 11.2 Estrutura da molécula de DNA: a dupla hélice (semelhante à escada) com o açúcar fosforilado formando um esqueleto hidrofílico no exterior e as bases nucleotídicas hidrofóbicas no interior (esquerda). As duas cadeias da molécula são complementares, de modo que A pareia com T e G com C (direita). A, adenina; T, timina; G, guanina; C, citosina; P, fosfato.

Após a divisão celular, o DNA é sintetizado no processo de replicação. O pareamento por complementaridade das bases nucelotídicas cria o fundamento para este processo. Assim, cada fita de DNA constitui um molde para a síntese de uma molécula filha idêntica de DNA. Nos eucariotos, a replicação começa em diversas localizações ao longo da molécula de DNA. Várias proteínas de ligação ao DNA atuam para se desenrolar a dupla hélice do DNA e separar as duas fitas, abrindo a molécula para a replicação. A síntese começa com a formação de um RNA primer (iniciadores) pela enzima primase. O iniciador é uma curta extensão complementar de RNA que começa a síntese de DNA pela enzima DNA polimerase III. Esta enzima cria ligações fosfodiéster entre o grupo 3’ hidroxila de um resíduo de açúcar e o grupo fosfato 5’ do outro. A sequência do molde de DNA determina a adição de nucleotídeos para a nova molécula sintetizada. A DNA polimerase possui um mecanismo interno de revisão que remove os nucleotídeos que foram incorretamente inseridos durante a síntese. Além disso, enzimas excisoras e reparadoras trabalham para detectar e corrigir o DNA que tenha sido danificado por vários fatores, como os radicais livres de oxigênio, radiações e certos produtos químicos. Organização do DNA genômico Uma longa molécula de DNA forma um cromossomo e cada cromossomo humano apresenta aproximadamente 1,3 × 108 pares de bases. As células germinativas humanas são haploides, que significa que apresentam um conjunto de 23 cromossomos diferentes. Em contrapartida, as células somáticas são diploides e apresentam 23 pares ou 46 cromossomos. Os autossomos constituem 22 pares, e estes não incluem os cromossomos sexuais X ou Y. As 46 moléculas de DNA que constituem o genoma precisam ser compactadas no interior do núcleo das

células somáticas. Esse evento é realizado com o auxílio de proteínas de ligação ao DNA (histonas), com consequente formação da cromatina (Fig. 11.3). Duas cópias de cada histona, H2A, H2B, H3 e H4 formam um complexo de proteínas chamado de nucleossomos. A molécula de DNA enrola-se em torno dos nucleossomos e cada nucleossomo é separado por um pedaço de DNA ligador. No estado descompactado esta estrutura é observada como “colar em contas” na microscopia eletrônica. Os nucleossomos são reunidos por uma outra histona (H1) para formar a fibra de cromatina de 30 nm. As proteínas não histonas condensam ainda mais a cromatina em um processo denominado de superenrolamento. A cromatina condensada visível ao microscópio óptico é denominada heterocromatina, e a cromatina menos compactada, eucromatina. Os cromossomos ficam mais condensados um pouco antes da mitose. Nesta fase, a célula está prestes a se dividir, o DNA foi replicado e, por conseguinte, cada cromossomo é composto por duas cromátides. Cada cromossomo apresenta um braço longo (q) e um braço curto (p) separados um do outro pelo centrômero.

FIG. 11.3 Organização de DNA genômico. (A) A estrutura descompactada da dupla hélice do DNA compõe o DNA ligador, que são regiões curtas de DNA entre os nucleossomos. (B) A molécula de DNA envolve as estruturas de histonas chamadas de nucleossomos, que forma uma estrutura observada como “colar em contas” no microscópio eletrônico. (C) A cromatina desdobrada é compactada para formar a fibra de cromatina de 30 nm. (D-F) Há um aumento da condensação da eucromatina para heterocromatina pelo processo de superenrolamento. O cromossomo mitótico é a forma mais condensada de cromatina.

Expressão gênica Um gene é uma porção da molécula de DNA que contém a informação para a síntese de produtos gênicos, que podem ser moléculas de RNA ou proteínas. Nos organismos diploides, existem dois alelos ou duas cópias de cada gene, que ocupam o mesmo locus, um em cada cromossomo. Quando os alelos são idênticos, o organismo

é homozigoto para aquele gene específico. Por outro lado, o termo heterozigoto indica a presença de diferentes alelos em um mesmo locus genético. A sequência de DNA do gene contém as regiões codificantes (éxons) e as regiões não codificantes (íntrons). As informações armazenadas na molécula DNA são transferidas para uma molécula de RNA no processo de transcrição. Existem três classes principais de RNA, o RNA mensageiro (m)RNA, o RNA de transferência (t)RNA e o RNA ribossômico (r)RNA, e cada um deles possui diferentes funções na síntese de proteínas. A sequência de DNA dos genes que codificam para uma proteína é transcrita em mRNA, que forma o molde para a síntese proteica. O fluxo dessas informações oriundas do DNA para a proteína é conhecido como o dogma central da biologia molecular. A molécula de RNA apresenta uma estrutura química semelhante ao DNA, embora com algumas diferenças. A estrutura de açúcar do RNA é composta de ribose em vez de desoxirribose, e a base nucleotídica timina (T) substituída por uracila (U). Além disso, a cadeia de RNA é uma molécula de cadeia única, em oposição ao DNA que possui cadeia dupla. Quando o RNA é sintetizado, a sequência de bases dependerá da sequência de DNA a ser transcrita. As bases do DNA T, A, G e C especificam, respectivamente, as bases A, U, C e G do RNA. Assim, a molécula de RNA recentemente sintetizada é complementar ao DNA molde. As sequências de DNA/RNA de um gene são compostas por trios de nucleotídeos, chamados de códons. Cada códon especifica um aminoácido e a forma como estes trios serão lidos para especificar a sequência de aminoácidos de um polipeptídio, sendo assim denominado ordem de leitura. Os códons de iniciação e terminação constituem o local de início e término da síntese de uma cadeia polipeptídica. A enzima RNA polimerase reconhece o início da sequência do gene e cria ligações fosfodiéster entre os nucleotídeos individuais, catalisando o processo de transcrição. O nucleotídeo do DNA molde no início de transcrição é designado +1 e a transcrição continua a partir desse ponto para a extremidade 5’ no final da cadeia de DNA. No entanto, a molécula de RNA é normalmente utilizada como referência e a transcrição ocorre de 5’ para 3’. Nucleotídeos anteriores ao início da transcrição são designados com números negativos. A sequência de DNA imediatamente anterior ao gene é chamada de região promotora. Esta sequência se liga a RNA polimerase e a vários fatores de transcrição após o início da transcrição. Após o término da transcrição, a cadeia de RNA é separada do DNA molde. Em eucariotos, este processo envolve a poliadenilação da extremidade 3’ da molécula de RNA. O mecanismo pelo qual ocorre a separação do RNA do DNA no término da transcrição em procariontes é realizado por meio da formação de um grampo formado a partir de uma região rica em G–C (Rho independente), ou a ligação de um fator peptídico chamado Rho (Rho dependente). Em eucariotos, os transcritos de mRNA sofrem várias modificações. A extremidade 5’ é metilada para formar o cap 7-metil-guanosina, enquanto a extremidade 3’ é alterada pela poliadenilação para formar a cauda poli-A, conforme mencionado anteriormente. O cap e a adição da cauda poli-A aumentam a estabilidade da molécula de mRNA em relação à degradação. Antes de a molécula de mRNA poder ser utilizada como um molde para a síntese de proteínas, ela sofre o processo de splicing, em que as partes da sequência de mRNA que correspondem aos íntrons (regiões não codificadoras) são removidas. No splicing alternativo, os éxons são reorganizados em diferentes formas para criar diferentes isoformas (splice) da proteína a ser formada. Esta etapa constitui um importante mecanismo de regulação, pelo qual as células podem sintetizar diversas variantes de um peptídeo em diferentes momentos. No entanto, o splicing alternativo para a produção de proteínas anormais está também altamente implicado na doença. Nas síndromes de craniossinostoses, as mutações no gene que codifica para a proteína FGFR2 podem produzir locais de splicing que conduzem à síntese anormal desta proteína.11 Regulação gênica O controle da expressão de genes é um processo extremamente complexo. Todo o genoma (com todos os seus genes) está presente em todas as células somáticas. No entanto, o fenótipo e o comportamento das células durante o desenvolvimento, o reparo tecidual e a homeostasia são dirigidos por um padrão altamente seletivo e diferenciado de expressão gênica. As alterações momento a momento na expressão de genes são reguladas principalmente no nível da transcrição de genes. As células respondem e se adaptam às mudanças na expressão dos genes por meio de uma ampla variedade de estímulos do microambiente externo, como fatores solúveis, contatos intercelulares ou contatos entre as células e a matriz. Os efeitos destes estímulos sobre a expressão gênica são, por sua vez, mediados por mecanismos de transdução de sinal intracelular. Após o estímulo extracelular, uma complexa cascata de reações enzimáticas intracelulares é ativada, e resulta na ativação de um conjunto específico de fatores de transcrição (Fig. 11.4). Os fatores de transcrição se ligam à sequência do

promotor e, em conjunto com a RNA polimerase, formam o complexo de pré-iniciação. Outros fatores de transcrição se ligam às denominadas sequências promotoras, localizados upstream ou, por vezes, downstream do gene. Os fatores de transcrição codificados por genes contendo homeobox são particularmente importantes para o processo de desenvolvimento.12 Um homeobox é uma sequência de DNA de cerca de 180 pares de bases, que codifica para um denominado homeodomínio uma sequência de aminoácidos que se liga ao DNA. Complexas vias moleculares, que envolvem vários fatores de crescimento diferentes, regulam a expressão de genes de forma adequada e coordenada durante a embriogênese. Duas famílias de fatores de crescimento, com importância particular nessa temática incluem a superfamília dos fatores de crescimento transformante-β (TGF-β) e os fatores de crescimento de fibroblastos (FGF).13 As proteínas morfogênicas ósseas (BMPs) são membros da superfamília do TGF-β e modulam a transcrição de genes contendo homeobox, como o MSX1 e o MSX2. Os genes MSX1 e MSX2 foram implicados na formação de fendas orofaciais.14 Mutações nos genes do FGFR, que levam a um aumento na sinalização do receptor, são os principais mecanismos subjacentes às síndromes de craniossinostoses relacionadas com FGFR.15 O papel desses fatores no desenvolvimento craniofacial será expresso a seguir.

FIG. 11.4 Via de transdução de sinal do receptor de fator de crescimento de fibroblastos (FGFR). Os FGFRs são compostos por uma parte extracelular e uma intracelular. A parte extracelular apresenta três domínios de imunoglobulina (IGI, IGII e IGIII). Os FGFs ligantes associados às proteoglicanas de heparina sulfato (HSPG) se ligam ao FGFR que ativa e leva à dimerização do receptor. O receptor ativado diminui o receptor do fator de crescimento de fibroblasto substrato 2 alfa (FRS2α) que leva a fosforilação de FRS2α em resíduos de tirosina. O próximo passo é a ativação de Grb2 e Sos. O complexo Grb2-Sos ativa Ras que, por sua vez, fosforila e ativa Raf. Raf ativa ERK, que entra no núcleo para fosforilar e ativar os fatores de transcrição Ets. A ativação do FGFR também leva à ativação de fosfolipase C-γ (PLCγ). PLCγ hidrolisa fosfatidil-inositol-4,5-difosfato (PIP2) em inositol-1,4,5-trifosfato (IP3) e diaglicerol (DAG).IP3 provoca liberação Ca2+ enquanto DAG ativa Raf através da ativação da proteína quinase c-δ (PKCδ). Tal evento conduz a ativação de MEK-ERK Ras-independente.

Mecanismos epigenéticos Variações estáveis na expressão gênica podem ser reguladas por outros mecanismos que não sejam por variações reais na sequência primária do DNA. Alguns dos denominados mecanismos epigenéticos podem modificar a expressão de genes e causar alterações no fenótipo celular. Estes mecanismos são preservados através da divisão celular e acredita-se que sejam importantes para o tecido estável e para expressão gênica de tipos específicos de células nas células diferenciadas. Além disso, os mecanismos epigenéticos podem ser herdados e afetar a expressão fenotípica. A investigação dos mecanismos epigenéticos tornou-se um campo de rápido crescimento das pesquisas, com importantes implicações para a biologia do desenvolvimento, bem

como para as várias etapas das doenças. Os denominados epigenótipos são formados, principalmente, pela organização tridimensional da cromatina. A arquitetura tridimensional da cromatina regula a expressão gênica.16 O desdobramento da estrutura da cromatina expõe a sequência de DNA para a transcrição. Os genes codificadores de proteínas são expressos no ambiente da eucromatina e, inversamente, a heterocromatina altamente condensada inibe a transcrição. A posição física tridimensional da cromatina é, por sua vez, regulada por diferentes mecanismos bioquímicos epigenéticos que podem ser transferidos para a divisão celular. As histonas podem ser modificadas por metilações ou acetilações. O padrão de metilação e acetilação das histonas, por sua vez, direciona a ligação de outras proteínas ligantes da cromatina que regulam a transcrição de genes. Outro mecanismo é a metilação de dinucleotídeos CpG da molécula de DNA por enzimas denominadas DNA metiltransferases. Em geral, a metilação do DNA silencia a transcrição gênica e o padrão de metilações do DNA atua em combinação com as modificações das histonas, determinando a estrutura da cromatina e regulando a transcrição (Fig. 11.5).

FIG. 11.5 Mecanismos epigenéticos de organização DNA e restrição de transcrição de genes. A cromatina desdobrada expõe a molécula de DNA às enzimas de transcrição de gene (em cima). A transcrição de gene é restringida por meio de modificações covalentes de DNA e histonas. Bases na molécula de DNA são metiladas pelas metiltransferases do DNA. O DNA metilado restringe a transcrição, impedindo que os fatores de transcrição se liguem ao DNA. As histonas deacetilases modificam as proteínas histonas de modo que se tornem carregadas positivamente, levando à ligação ao DNA carregado negativamente e à cromatina mais compactada (meio). A metilação do DNA promove a ligação das proteínas da cromatina remodelada que interagem com as histonas para dobrar a cromatina em um estado mais condensado (embaixo).

Os mecanismos epigenéticos originam os denominados fenômenos epigenéticos.17 A inativação de X é o fenômeno pelo qual um dos cromossomos X nas mulheres é inativado aleatoriamente. O cromossomo X inativado pode ser visualizado como uma estrutura de cromatina altamente compactada (corpo de Barr). Pela inativação de um dos dois cromossomos X nas células somáticas das mulheres, a transcrição de genes no cromossomo X, e a consequente síntese de proteínas, são mantidas no mesmo nível entre os sexos (homens e mulheres). Durante a embriogênese, os cromossomos X (paternos e maternos) são inativados de forma aleatória. Assim, em qualquer tecido, haverá um número igual de células com cromossomos X ativos de qualquer um dos progenitores. Este fato explica o porquê de a maioria das doenças ligadas ao cromossomo X

não serem expressas nas mulheres. A inativação do cromossomo X de forma não aleatória é uma anomalia epigenética que pode levar à ocorrência de doença ligada ao X nas mulheres. A regulação gênica pode depender do sexo do progenitor a partir do qual o gene foi herdado. O imprinting genômico é um fenômeno epigenético que promove a expressão de apenas um alelo parental. Isso é realizado principalmente por metilação diferencial do DNA dos alelos em um padrão específico ao progenitor de origem. Assim, um imprinting de um gene herdado não é expresso, resultando em um afastamento do padrão unifatorial (herança mendeliana) para o traço direcionado por esse gene. A dissomia uniparental é um padrão não mendeliano de hereditariedade, onde existem duas cópias de uma sequência genômica de um dos pais, e nenhuma do outro. Se a dissomia uniparental ocorrer em imprintinted genéticos, poderá resultar em perda de função e desenvolvimento de doença.

Hereditariedade Padrões de herança mendeliana As características fenotípicas determinadas por um único locus genético são herdadas de acordo com as leis da herança unifatorial ou mendeliana. A herança desses traços pode ser autossômica ou ligada ao sexo.

Herança autossômica A herança autossômica refere-se à transmissão das características dirigidas por genes em qualquer um dos 22 pares dos cromossomos autossomos. A herança autossômica pode ser dominante ou recessiva (Fig. 11.6). Traços dominantes são expressos em indivíduos heterozigotos, enquanto os recessivos são apenas expressos em homozigotos para um locus genético específico. Assim, na doença autossômica dominante o risco para a prole de um indivíduo afetado é de 50%. Na doença autossômica recessiva, com os pais ambos heterozigotos para o gene que causa a doença, haverá um risco de 25% de terem o filho afetado. É importante ressaltar que a doença autossômica dominante pode surgir como resultado da hereditariedade ou por uma nova mutação genética. Antígenos do grupo sanguíneo A e B são autossômicos dominantes, mas podem ser expressos simultaneamente, como um fenômeno designado por codominância. Os fenótipos determinados por genes herdados ou por novas mutações genéticas podem ser expressos em graus variados. Assim, a mesma doença causada por mutações no mesmo gene, pode não apresentar nenhuma manifestação ou se manifestar com expressão variada desde casos leves até severos. A explicação para esta expressividade variável pode ser causada por diferentes mutações no mesmo gene, por outros modificadores genéticos e moleculares ou por fatores ambientais. O termo não penetrância refere-se a condições em que os indivíduos heterozigotos para um gene autossômico dominante não expressam o fenótipo correspondente. Isso explica por que a doença autossômica dominante pode atravessar gerações sem manifestação e reaparecer em gerações futuras.

FIG. 11.6 (A) Padrão autossômico dominante. (B) Padrão de herança autossômica recessiva. (Reproduzida com permissão de Cohen MM. Dysmorphology, syndromology, and genetics. In: McCarthy JG (ed.) Plastic Surgery. Philadelphia: WB Saunders, 1990:105, 106.)

Herança ligada ao sexo Os genes nos cromossomos X e Y são herdados de acordo com um padrão de herança ligada ao sexo. Traços dominantes ligados ao X podem ser expressos em homens e mulheres, mas nunca serão transmitidos do pai para o filho afetado (Fig. 11.7). Por outro lado, filhas com pais (masculino) afetados apresentarão um risco de 100% de herdar o traço. As mães afetadas apresentarão um risco de 50% de transmissão de um traço dominante ligado ao X para ambos os filhos (homens e mulheres). Os traços recessivos ligados ao X são muito mais comuns e expressos quase exclusivamente em homens. Nas mulheres, como uma das duas cópias do cromossomo X provém de cada progenitor, geralmente é determinado heterozigose. Alguns exemplos de doença recessiva ligada ao X incluem a distrofia muscular de Duchenne, a distrofia muscular de Becker e hemofilias A e B. A herança ligada ao cromossomo Y afeta apenas os homens, exemplificada pela herança do antígeno de histocompatibilidade H-Y.

FIG. 11.7 (A) Padrão dominante ligado ao X. (B) Padrão recessivo ligado ao X. (Reproduzida com permissão de Cohen MM. Dysmorphology, syndromology, and genetics. In: McCarthy JG (ed.) Plastic Surgery. Philadelphia: A WB Saunders, 1990:105, 106.)

Padrões de hereditariedade não mendeliana A herança não mendeliana refere-se a padrões específicos que não seguem os princípios da herança mendeliana. Um exemplo é a herança regida pelo fenômeno epigenético de imprinting (ver anteriormente). Outros padrões são a dissomia uniparental e a herança mitocondrial.

Dissomia uniparental Na dissomia uniparental o indivíduo herda dois cromossomos, ou parte de um cromossomo apenas de um dos pais. Assim, a sequência genômica do outro progenitor estará ausente. Normalmente, esta condição não afeta o fenótipo, no entanto, se combinado com o imprinting (como descrito anteriormente), a doença pode ocorrer. Alguns exemplos incluem a síndrome de Prader-Willi e a síndrome de Angelman.18 Aproximadamente 75% dos pacientes com síndrome de Prader-Willi apresentam deleção na porção proximal do braço longo do cromossomo 15, e, na maioria dos casos, isso ocorre no cromossomo derivado do pai. Os pacientes com síndrome de Angelman apresentam a mesma deleção, porém no cromossomo materno. Os segmentos deletados contêm os genes que causam as doenças, e estas se desenvolvem em virtude do imprinting destes genes no cromossomo derivado do outro progenitor.

Herança mitocondrial Além dos 46 cromossomos presentes no núcleo, as mitocôndrias apresentam seu próprio DNA (denominado mtDNA), constituindo o genoma mitocondrial. O genoma mitocondrial é herdado da mãe e contém principalmente genes que codificam proteínas com funções na cadeia transportadora de elétrons. As mutações no genoma mitocondrial podem ocasionar algumas desordens, como a oftalmoplegia crônica progressiva e alterações auditivas induzidas por aminoglicosídeos.

Causas genéticas para o desenvolvimento de doenças Qualquer distúrbio em que a etiologia pode ser atribuída totalmente ou parcialmente a anormalidades genéticas pode ser considerado uma doença genética. Esta definição cria um amplo espectro, incluindo doenças associadas às mutações em um único gene, herdadas de acordo com as leis da hereditariedade unifatorial, bem como condições de etiologia complexa, em que o aumento da suscetibilidade aos fatores ambientais é proporcionado por polimorfismos ou mutações em vários genes diferentes. No entanto, a relação entre a anormalidade genética e o fenótipo na doença monogênica nem sempre é tão simples conforme indicado por leis mendelianas. Mutações no mesmo gene podem originar diferentes síndromes. Este fato pode ser exemplificado pelas mutações no receptor de FGFR2 originando diversas síndromes como a craniossinostose, Crouzon, Pfeiffer, Apert e Jackson-Weiss. Além disso, a apresentação clínica da síndrome de Crouzon causada

por mutações em FGFR2 pode variar de pansinostoses, exorbitismo grave e retrusão facial do terço médio na infância até um dismorfismo craniofacial sutil detectado na fase adulta. Esta plasticidade na relação entre o genótipo e o fenótipo pode ser devido a diferentes mutações em um mesmo gene, a fatores ambientais, a modificadores e outros mecanismos moleculares que alteram os efeitos fisiopatológicos da mutação do gene causador da doença. O termo “oligogênico” é, por vezes, utilizado para descrever as doenças causadas por mutações em qualquer um dos poucos genes, exemplificado por mutações em ambos os receptores FGFR1 ou FGFR2, como uma causa da síndrome de Pfeiffer. No entanto, a grande maioria das doenças genéticas humanas são desordens multifatoriais, porém poligênicas. O termo “poligênico” refere-se à herança ditada pela expressão de vários genes, cada um com uma pequena contribuição para a característica fenotípica. Condições comuns, como a hipertensão e o diabetes são causadas por mecanismos complexos ditados pela expressão de muitos genes e de fatores ambientais.

Mutações A maioria das diferenças interindividuais presentes no código genético não causam doença. De fato, a sequência de DNA é altamente variável entre dois indivíduos. Esta variabilidade é proporcionada pelos denominados polimorfismos, variações no código genético que normalmente não causam doenças. No entanto, determinados polimorfismos podem estar relacionados com o aumento do risco de doenças em respostas variáveis aos fatores ambientais. A forma mais comum de polimorfismo é o polimorfismo de nucleotídeo único, ou SNP. Os SNPs são substituições de nucleotídeos que ocorrem em 1 em cerca de 300 nucleotídeos de DNA codificantes e não codificantes. Os SNPs podem ser utilizados como marcadores para regiões específicas do código genético e os denominados mapas de SNP têm sido extremamente úteis nos estudos genéticos e de diagnósticos. As formas mais comuns de mutações genéticas são as substituições de nucleotídeo único. Outros exemplos são as deleções ou inserções de vários nucleotídeos. As mutações podem resultar na substituição de aminoácidos (mutação de sentido trocado ou mutações missense). A sequência de aminoácidos alterada, por sua vez, pode causar modificações estruturais ou funcionais da proteína. Estas modificações podem causar doenças por meio de vários mecanismos diferentes. A atividade fisiológica da proteína pode ser suprimida (perda de função) ou aumentada (ganho de função). Alternativamente, as modificações estruturais podem alterar funções específicas para outras proteínas ou ocasionar complexos polipeptídicos disfuncionais. As mutações genéticas podem alterar a expressão de genes em diversos níveis. Mutações nos genes promotores ou em outras sequências que se ligam aos fatores de transcrição podem aumentar ou diminuir a transcrição, enquanto as mutações em íntrons podem afetar a junção de transcritos de mRNA. Outras mutações podem alterar a estabilidade da molécula de mRNA, conduzindo a um aumento da degradação ou ao acúmulo de transcritos. As mutações também podem afetar a síntese de proteínas, interferindo no início e no término da tradução. As chamadas mutações nonsense introduzem um códon de parada que finaliza prematuramente a síntese proteica, levando a uma proteína truncada. Mutações frameshift alteram a leitura e podem conduzir à síntese de cadeias polipeptídicas anormais. Essas proteínas malformadas são frequentemente suscetíveis à degradação proteolítica.

Anormalidades cromossômicas hereditárias Erros na separação dos cromossomos durante a meiose ou mitose podem causar um número anormal dos cromossomos (anormalidade numérica). A anormalidade mais frequente nas doenças humanas é a aneuploidia ou um número de cromossomos que não seja múltiplo do conjunto haploide de cromossomos. A aneuploidia em humanos é mais frequentemente observada devido a um número anormal de cromossomos sexuais. Cromossomos supranumerários X podem levar a um aumento na dosagem de produtos gênicos a partir do cromossomo X. No entanto, se todos, menos um dos cromossomos X são inativados, o efeito sob o fenótipo pode ser muito leve. Monossomia para cromossomo X (45X) é a forma mais comum de todas as anomalias numéricas. No entanto, 45X normalmente leva ao aborto no primeiro trimestre. As anormalidades numéricas autossômicas são normalmente na forma de trissomia. A mais comum de todas as condições cromossômicas é a síndrome de Down, causada pela trissomia do cromossomo 21. Algumas localizações cromossômicas estão propensas a vários rearranjos que produzem anomalias cromossômicas estruturais. Os segmentos dos cromossomos podem ser eliminados ou duplicados. CATCH 22 (ver adiante) é uma síndrome que pode

apresentar anormalidades no palato, sendo causada pela deleção do locus 22q11.19 Outros tipos de anormalidades estruturais são as translocações, onde há uma troca de segmentos entre cromossomos e inversões, referindo aos casos em que um segmento cromossômico é separado, invertido e reinserido.

O gene como foco para a terapia A metodologia de transfecção, em que o DNA ou o RNA é introduzido nas células para modificar a expressão do gene, é muito utilizada na pesquisa molecular. A transfecção e superexpressão de genes em tipos específicos de células podem ser utilizadas para estudar a função das proteínas. A regulação gênica pode ser investigada através da introdução de construções de DNA compostas por promotores de genes ligados aos genes repórteres. A expressão dos genes pode ser silenciada pela introdução de oligonucleotídeos antissenso que se ligam complementarmente às sequências específicas do DNA para bloquear a transcrição. O desenvolvimento de diversas metodologias para transfecção de genes permitiu a possibilidade de modificação terapêutica na expressão gênica. Em 1990, foi relatada a primeira fase de testes clínicos da terapia gênica para a deficiência de adenosina deaminase e melanomas malignos.20,21 Na terapia gênica, a introdução de DNA ou RNA em células é utilizada para curar a doença ou alterar a expressão de genes para obter vantagem transitória dos tecidos nos processos, como no reparo e na regeneração tecidual. Assim, a expressão de genes individuais pode ser modificada ou genes anormais corrigidos. O DNA ou RNA introduzidos podem ser categorizados como genes inibidores, genes vacinas ou genes substitutos. Inibidores de genes, como o siRNA, inibem a expressão dos genes defeituosos. Os genes vacinas codificam para específicos patógenos que ativam as células mediadas e respostas imune e humoral. Os genes substitutos são genes completos que substituem a deficiência absoluta ou relativa de um produto gênico específico. Atualmente, cerca de 1.500 protocolos de ensaios clínicos foram aprovados em todo o mundo. Do total, 64,5% de todos os ensaios em andamento apresentam interesse pelas neoplasias malignas, 8,7% para as doenças cardiovasculares e 7,9% para as doenças monogenéticas.22 A terapia gênica, muitas vezes, leva a uma transformação estável em que o gene introduzido é integrado ao genoma da célula alvo para provocar uma alteração permanente da expressão do gene. As doenças monogênicas hereditárias são as melhores candidatas para este tipo de terapia. Alguns exemplos incluem a hemofilia A e B, a fibrose cística e a doença de Huntington. No entanto, a transformação estável foi possível até agora apenas na terapia dirigida para a modificação de células germinativas, sendo amplamente praticada na agricultura, utilizada para gerar clones de animais de laboratório geneticamente modificados. A terapia gênica em células germinativas levanta questões morais e éticas complexas e não tem sido praticada até agora em seres humanos. A transformação transitória é mais adequada para melhorar as funções teciduais durante um período terapêutico limitado, em condições como a cicatrização de feridas e o câncer. Independentemente do objetivo terapêutico, a terapia gênica baseia-se na metodologia de entrega de genes, de forma eficaz, para as células e tecidos. A terapia gênica pode ser combinada com a terapia celular, onde é realizada a transfecção nas células ex vivo, seguida pelo transplante dessas células transformadas para o paciente (Fig. 11.8). A abordagem da terapia celular (ex vivo) traz várias vantagens, como a transfecção mais eficiente, a redução do risco de reações locais e sistêmicas indesejáveis aos vetores e a melhora da possibilidade de direcionamento de tipos específicos de células. Apesar da criação de diferentes métodos para entrega de genes e para expressão transgênica em seres humanos, apenas um limitado sucesso foi demonstrado até agora com a terapia genética na prática clínica. Os desafios significativos diretamente relacionados com a tecnologia da transferência de genes incluem obtenção de níveis suficientes de transgene, duração adequada da expressão transgênica e aumento da especificidade terapêutica. Além disso, o tratamento multifatorial da doença poligenética requer ainda a identificação adequada de genes específicos.

FIG. 11.8 Terapia gênica ex vivo. As células alvo, bem como as células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea, as células progenitoras endoteliais ou os fibroblastos de pele, podem ser retirados do paciente para terapia genética ex vivo. A entrega de genes pode ser realizada por diversos métodos biológicos ou não biológicos. As células geneticamente modificadas são reimplantadas no paciente no local do defeito tecidual ou da doença.

Entrega de genes A entrega de genes é alcançada por meio de abordagens físicas, químicas e biológicas.23 Todas estas abordagens podem ser utilizadas in vivo ou ex vivo. A entrega do transgene sob a forma de DNA livre é frequentemente menos eficaz, principalmente devido a sua rápida degradação pelas nucleases. Assim, diversas tecnologias especializadas foram desenvolvidas para aumentar a eficiência da transfecção. A abordagem ideal de entrega de genes deve: (1) permitir a entrega do transgene de tamanho apropriado; (2) evitar reações imunológicas/tóxicas ou outros efeitos prejudiciais; (3) permitir especificidade para a célula alvo; (4) produzir entrega eficiente e (5) proporcionar a modificação de genes de duração apropriada. Existem métodos biológicos e não biológicos para a entrega de genes. Os métodos não biológicos podem ser divididos em métodos físicos, químicos e agulhas de injeção de DNA livre.24 Abordagens físicas como a microdispersão, eletroporação, balística, ultrassom ou entrega hidrodinâmica, empregam uma força física para entregar o transgene na célula através da membrana plasmática. As abordagens químicas utilizam compostos químicos sintéticos ou naturais como portadores do transgene. O tipo predominante dos métodos não biológicos é o químico, através da entrega pelos lipossomas catiônicos. Os lipossomas são vetores sintéticos compostos por lipídios catiônicos carregados positivamente e colipídios, que podem ser colesterol ou fosfolipídios não carregados. Estes lipossomas são misturados com os plasmídeos contendo o transgene para formar partículas chamadas lipoplexos. O DNA ligado a essas partículas é resistente à degradação pelas nucleases. Presume-se que a captação celular ocorre por meio de endocitose e o DNA sai das vesículas intracelulares através de compartimentos lisossomais antes de sua degradação (Fig. 11.9).

FIG. 11.9 Entrega de DNA às células utilizando lipossomas catiônicos. Os lipossomas catiônicos (lipoplexos) formam complexos com DNA carregados negativamente através de interações eletrostáticas. As partículas penetram nas células através do processo de endocitose. A membrana endossomal é desestabilizada no citosol, e a molécula de DNA entra no núcleo.

Os lipossomas têm um valor limitado para a terapia genética in vivo, principalmente devido ao risco de reações tóxicas e pela rápida depuração plasmática. Outros exemplos de métodos químicos incluem os polímeros catiônicos mediados por receptores. A entrega de gene viral constitui a forma predominante de entrega de gene de ordem biológica.25 Os vírus utilizados são os adenovírus, os vírus do herpes simples e os retrovírus. A entrega de genes virais baseia-se na capacidade natural do vírus de infectar as células hospedeiras com o material genético. Para utilizar um vírus como vetor, é necessário que ele seja modificado geneticamente. Assim, os genes requeridos para a replicação viral são eliminados e substituídos pelo gene de interesse. Para compensar esta incapacidade de replicação, os vetores virais são propagados em linhagens celulares de empacotamento que fornecem os genes que codificam para as proteínas estruturais da partícula viral. Em geral, as abordagens virais estão associadas a uma maior eficiência de transfecção e a transformações mais estáveis. As principais preocupações associadas aos métodos biológicos incluem os riscos de transmissão de doenças, a indução de mutações de inserção ou o desenvolvimento de reações imunológicas ou tóxicas. Nos vetores retrovirais, o RNA de cadeia simples do genoma retroviral é transcrito de modo inverso para DNA de cadeia dupla, e o transgene é integrado ao DNA genômico das células hospedeiras. Esse método oferece a possibilidade de transfecção estável, no entanto apresenta risco para mutação de inserção (Fig. 11.10). Os riscos de toxicidade da terapia gênica viral foram claramente demonstrados pela trágica morte de um paciente do sexo masculino de 18 anos de idade, tratado para a deficiência de ornitina transcarbamilase.26

FIG. 11.10 Transferência de genes retrovirais. O genoma retroviral de cadeia simples de RNA é transcrito inversamente para DNA de cadeia dupla, e o transgene é integrado ao DNA genômico das células hospedeiras. Os retrovírus oferecem a possibilidade de transfecções estáveis.

A imunossupressão tem sido utilizada para reduzir as respostas imunológicas aos vetores virais. No entanto, esta estratégia aumenta consideravelmente os riscos e os efeitos colaterais do tratamento. Os vetores biológicos não virais, como bactérias, bacteriófagos e partículas semelhantes a vírus podem tornar-se instrumentos valiosos em certas áreas da terapia gênica.27 Hoje em dia, cerca de dois terços dos ensaios clínicos de terapia gênica são baseados em vetores virais, e apenas 5%-10% implantaram a lipofecção como um modo de entrega de genes.22 As características de várias técnicas para entrega de genes estão resumidas na Tabela 11.1. Há necessidade de métodos mais eficazes e seguros para a entrega de genes, e as pesquisas em andamento têm por objetivo o desenvolvimento de melhores tecnologias para essa entrega.

Tabela 11.1 Técnicas comuns para a entrega de genes Técnica de entrega de genes

Vantagens

Desvantagens

Injeção direta de DNA livre/plasmídeo

Simples, entrega local, tamanho ilimitado do gene, não tóxico e não imunogênico.

Apenas injeção direta, eficiência de transfecção muito baixa, somente expressão gênica transitória.

Gene gun

Pode entregar grandes quantidades de DNA; tecnicamente simples

Inespecífica, danos físicos a célula são necessários para absorção do DNA, baixa eficiência de transfecção, reação de corpo estranho em potencial

Microdispersão

Pode entregar grandes quantidades e tipos diferentes de DNA

Baixa eficiência de transfecção, dano celular, experiência limitada

Eletroporação

Transgene de tamanho grande, não tóxico

Inespecífica, equipamentos complexos, danos à membrana celular são necessários para a absorção do DNA

Lipossomas catiônicos

Simples tecnicamente, transfecção de qualquer tipo de célula, transgene de tamanho grande, entrega local, baixa imunogenicidade

Sem segmentação, toxicidade, baixa eficiência de transfecção, transfecção transitória, depuração plasmática rápida in vivo

Retrovírus

Transduz muitos tipos de células diferentes, alta eficiência de transdução ex vivo, a expressão do gene a longo prazo

Transduz principalmente as células em divisão, transdução ineficiente in vivo, risco de mutagênese de inserção, tamanho limitado do transgene, difícil de propagar em cultura

Adenovírus

Transfecta praticamente todos os tipos de células (em divisão e as que não estão em divisão), boa eficiência de transfecção in vitro e in vivo, sem integração no genoma do hospedeiro, transgene de tamanho grande

Resposta imune, falta de expressão permanente, os anticorpos preexistentes são comuns, possibilidade de avanço da infecção do tipo selvagem

Vírus Transduz células em divisão e também as que não estão em divisão, integraadenoassociados se em local específico (cromossomo 19), expressão do gene a longo prazo, baixa imunogenicidade

Crescimento difícil para se obter títulos elevados, risco de mutagênese de inserção, tamanho limitado do transgene, os anticorpos preexistentes, fabricação complexa e dispendiosa

Vírus do herpes simples 1

Anticorpos preexistentes, difícil de manipular devido ao ciclo de vida complexo, possibilidade de avanço da infecção do tipo selvagem

Transduz grande variedade de tipos de células, neurotropismo, transgene de grande tamanho, expressão a longo prazo viável, baixa imunogenicidade

Terapia gênica no reparo tecidual, reconstrução e regeneração A terapia gênica tem se tornado uma área importante na busca de novos tratamentos para melhorar a cicatrização de feridas e promover a regeneração tecidual.28 Uma maior compreensão dos mecanismos moleculares que regulam a diferenciação e a proliferação das células durante as diversas fases dos processos de regeneração e cicatrização de feridas proporcionou fatores candidatos para a terapia. A aplicação de fatores peptídicos no local da ferida é, muitas vezes, ineficiente, devido ao sequestro pela matriz, degradação e depuração. Portanto, a terapia de genes para a manutenção localizada e modificação da expressão de genes para estes fatores é extremamente atraente. A terapia gênica tem sido aplicada experimentalmente para melhorar o reparo em pele, ossos, cartilagens e tendões. Além disso, modificações genéticas de populações de célulastronco podem ser utilizadas para estimular a regeneração de defeitos teciduais, ou para facilitar a produção in vitro de tecidos compostos. Um fenômeno interessante é o uso de retalhos microvasculares como portadores de células geneticamente modificadas para suprimir a recorrência de malignidades. A terapia gênica combinada com suportes de biomateriais como transportadores de células geneticamente modificadas pode ser utilizada para estimular a neoformação tecidual. Estes suportes são constituídos por vários materiais naturais ou sintéticos e servem para inúmeros propósitos. O termo condução refere-se ao efeito favorável sobre a neoformação tecidual. As células atingem um fenótipo tridimensional adequado e utilizam suportes para migração e formação da matriz extracelular. O termo indução refere-se à função de transporte e reservatório para moléculas que estimulam a produção de um novo tecido. Os vetores podem ser entregues no local da transfecção pelos suportes. Em alternativa, os suportes podem ser preenchidos por células ex vivo geneticamente modificadas. Os suportes apresentam várias vantagens importantes na terapia gênica. O biomaterial pode aumentar a eficiência de transfecção, protegendo contra a degradação do transgene e oferecendo entrega mais sustentada. Além disso, a contenção local dos vetores poderá evitar reações inflamatórias. A expressão dos fatores de crescimento durante o reparo tecidual é estreitamente regulada, no tempo e no espaço. Nesse sentido, de forma ideal, qualquer metodologia para a terapia genética na cicatrização de feridas

deve ser realizada através de tipos celulares específicos, fornecendo controle temporal sobre a expressão do transgene. A combinação de terapia celular e de genes permite a entrega direcionada de transgenes ex vivo às células específicas restabelecidas do organismo antes da readministração local ou sistêmica. Outra abordagem utiliza a possibilidade de projetar estruturas de DNA com os promotores que apenas irão ser expressos por determinadas células. 29-31 As construções de DNA também podem ser utilizadas para mediar expressão do transgene induzida farmacologicamente.32-35 O nosso grupo desenvolveu o sistema repressor da tetraciclina, que é a construção de uma estrutura de DNA que permite a regulação do início e do nível da expressão do transgene pela administração de tetraciclina (Fig. 11.11.36,37)

FIG. 11.11 Um modelo provável do repressor de tetraciclina (tetR) mediada por repressão da transcrição ligada no operador de tetraciclina (tetO), que carrega o citomegalovírus humano (HCMV) principal promotor precoce imediato. (A) A ligação do tetR ao tetO inserido em 10 pb downstream do último nucleotídeo do elemento TATATAA impede a proteína de ligação a TATA (TBP) de se ligar ao elemento TATA, levando, assim, ao bloqueio do complexo do início da transcrição, montagem no promotor alvo e a repressão da expressão. (B) Na presença de tetraciclina, a capacidade de TetR interagir com tetO é suprimida, o que leva à interação de TBP com o elemento TATA, que sinaliza a início da transcrição.

Reparo tecidual A pele, por diversas razões, é um órgão adequado para a terapia gênica. A acessibilidade da superfície cutânea facilita a entrega de genes in vivo e o monitoramento para quaisquer efeitos colaterais. As células da derme e da epiderme podem ser coletadas para entrega de genes in vitro e, posteriormente, reaplicadas no organismo. Os suportes podem ser utilizados para fornecer vetores contendo o transgene ou células da pele, geneticamente modificadas, para a ferida. Os enxertos de pele podem ser facilmente obtidos e tratados ex vivo antes da cobertura da ferida. O período limitado de tempo do processo de cicatrização de feridas torna-se uma condição adequada para a modificação transitória de genes. Além disso, a expressão de fatores de crescimento e citocinas é caracterizada pela alta e baixa regulação transitória, tornando os efeitos de curta duração, na expressão genética, mais apropriados. A renovação constante da epiderme pela diferenciação e descamação dos queratinócitos foi considerada um mecanismo seguro contra quaisquer efeitos nocivos prolongados. A renovação rápida das células epidérmicas, bem como a eliminação de fibroblastos do local da ferida por meio da apoptose ao final da cicatrização, reduz o risco de indução tumoral por mutagênese insercional, quando a entrega viral for utilizada. Vários protocolos de terapia gênica têm sido utilizados para melhorar a cicatrização de feridas em modelos animais. Atualmente, a abordagem mais realizada é o fornecimento de conhecidos fatores de crescimento que promovem a cicatrização. O nosso grupo descreveu a entrega de fatores de crescimento em um modelo de cicatrização de feridas em suínos. O fator de crescimento epidérmico (EGF) fornecido diretamente para as feridas, através de partículas de ouro aceleradas por um arco elétrico, resultou na superexpressão de EGF e aumentou a taxa de reepitelização.38 A viabilidade da transfecção in vitro dos queratinócitos, seguida pelo enxerto e pela superexpressão do transgene no local da ferida, foi demonstrada pela entrega do hormônio do

crescimento humano (hGH) por meio de uma abordagem retroviral.39 Queratinócitos em cultura foram transfectados com EGF, utilizando lipossomas catiônicos ex vivo, e reenxertados na ferida. Assim, foram observadas uma superexpressão de EGF e uma melhor cicatrização desses queratinócitos em relação aos não transfectados.40 Outros grupos têm utilizado, principalmente, modelos em roedores para o desenvolvimento de protocolos de terapia gênica para a cicatrização de feridas. O fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF-1) entregue por injeção local por meio de vetores de lipossomas catiônicos demonstrou uma melhor cicatrização das feridas e um aumento de peso em ratos feridos termicamente.41 Um protocolo semelhante foi então utilizado para a entrega do fator de crescimento de queratinócitos (KGF).42 Em um estudo mais recente, o mesmo grupo demonstrou que a transfecção lipossomal de IGF1 e KGF em associação, promoveu um aumento da neovascularização e a expressão do fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) nas feridas, em uma maior proporção do que a transfecção de qualquer um desses fatores isolados.43 O fator de crescimento derivado das plaquetas B (PDFG-B) foi entregue através de retrovírus para os fibroblastos da derme de ratos ex vivo antes de reaplicação nas feridas por um suporte de ácido poliglicólico.44 Os fatores de crescimento placentário, os PDGF, os TGF-β e os KGF foram entregues através de um adenovírus para estimular a cicatrização de feridas em modelos experimentais.45-48 Vários grupos de pesquisa têm utilizado o VEGF entregue através do adenovírus para melhorar a cicatrização em modelos de roedores diabéticos, bem como em não diabéticos.49-52 No entanto, nosso grupo realizou um tratamento de feridas em modelos suínos em idade avançada com entrega de VEGF por meio de adenovírus sem quaisquer efeitos sobre a neovascularização ou taxa de cicatrização das feridas.53 Entretanto, utilizamos câmaras para uma cicatrização apropriada de feridas em ambiente úmido, e muito provavelmente, a superexpressão de VEGF foi incapaz de melhorar ainda mais o processo de cura. Esse fato demonstra que uma estratégia destinada a superexpressão do fator de crescimento geralmente pressupõe um estado de cura comprometido e uma deficiência relativa do gene de interesse. Recentemente, os resultados de ensaios clínicos fase I para o tratamento de úlceras no pé de diabético com entrega de PDGF-B evidenciaram que a injeção perilesional com vetor adenoviral com replicação incompetente foi bem tolerada e melhorou a cicatrização de feridas.54 O efeito pareceu ser mediado pelo aumento da vasculogênese e os autores concluíram que o protocolo deve ser considerado em outros estudos envolvendo seres humanos. A entrega de diferentes fatores de crescimento por um adenovírus foi realizada experimentalmente para estimular o reparo de tendões. BPM12, BMP14 e fator 5 de diferenciação de crescimento foram utilizados com sucesso para melhorar a cicatrização de tendões em modelos de ratos ou reparo de tendões em modelos de frangos.55-57 Recentemente foi demonstrado que as células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) transfectadas com TGF-β1 e aplicadas na lesão do tendão calcâneo de ratos melhoraram vários parâmetros do processo de cicatrização sem nenhum efeito adicional da cotransfecção com VEGF.58 Existe uma grande necessidade de terapias para induzir a formação óssea. A terapia gênica utilizando fatores osteoindutivos tem sido experimentalmente utilizada para melhorar a consolidação de fraturas e aumentar a massa óssea ao redor dos implantes. A consolidação das fraturas em roedores foi estimulada por meio da aplicação direta de vetores adenovirais que transportam BMP2.59-64 Uma abordagem semelhante foi utilizada para aumentar a vascularização e a formação óssea pela entrega de VEGF-A.65 Um gene híbrido, composto por um transgene BMP4 ligado a um sinal de secreção de BMP2, entregue pela aplicação direta, por um vetor retroviral em fratura de periósteo, aumentou a massa óssea da fratura de fêmur em modelos de ratos.66 Suportes degradáveis carregados com DNA plasmídeo foram utilizados para entregar BMP4 e um fragmento do hormônio da paratireoide para melhorar a formação óssea em defeitos ósseos em modelos de ratos e cães.67,68 Vetores lipossomais transportando BMP2 em suportes degradáveis, de colágeno e ósseo autólogo, aumentaram a massa óssea ao redor de implantes dentários colocados em defeitos de calvárias em um modelo suíno.69 Células-tronco mesenquimais geneticamente modificadas ex vivo para superexpressão de BMP2 melhoraram o reparo em defeitos segmentares no osso radial em ratos.70 As células musculares foram retiradas e modificadas ex vivo com um vetor retroviral para expressar BMP4, antes do reimplante nos defeitos críticos no fêmur de ratos.71 A cicatrização com o restabelecimento do canal medular e resistência óssea funcional foi alcançada.

Reconstrução e regeneração tecidual Os fatores que promovem a neovascularização podem ser utilizados para aumentar o fornecimento de sangue dos retalhos. Diversos grupos de pesquisa têm demonstrado que a distribuição in vivo do VEGF aumenta a

viabilidade cutânea e musculocutânea dos retalhos em ratos.72-74 Utilizando uma abordagem ex vivo, a viabilidade do retalho foi reforçada pela superexpressão de VEGF em um modelo de coelho, onde as células endoteliais foram geneticamente modificadas e entregues em um suporte de fibrina.75 O mecanismo do aumento de VEGF na viabilidade do retalho foi encontrado pelo envolvimento do óxido nítrico sintase endotelial.76 A entrega de TGF-β1 por um adenovírus demonstrou um aumento na viabilidade dos retalhos nas artérias epigástricas em modelos de ratos.77 A entrega de vetores de plasmídeo contendo PDGF-B aumentou a expressão de VEGF e FGF básico (bFGF) e melhorou a viabilidade dos retalhos localizados na região dorsal de ratos.78 Recentemente, a entrega de bFGF associado a um adenovírus melhorou a viabilidade de retalhos aleatórios em ratos.79 A recuperação de células progenitoras comprometidas para o gene combinada à terapia gênica e celular apresenta várias aplicações importantes na terapia da ferida, assim como na medicina de regeneração tecidual. A capacidade das células progenitoras endoteliais (CPEs) de residirem em locais de reparo tecidual, isquemia e vascularização estimulada tem sido experimentalmente explorada para a terapia gênica e celular combinadas. As CPEs foram geneticamente modificadas (ex vivo) para superexpressão de VEGF e administradas sistemicamente em camundongos nude com isquemia de membros posteriores.80 Foram observados um aumento da neovascularização e do fluxo sanguíneo e uma redução significativa da frequência de amputação. O aumento da viabilidade de retalhos aleatórios foi demonstrado após o tratamento com CPEs geneticamente modificadas para superexpressão de VEGF.81 As metodologias descritas anteriormente para induzir a formação óssea em fraturas e em torno de implantes também têm sido utilizadas experimentalmente para produzir osso na reconstrução de defeitos craniofaciais. A entrega de um vetor adenoviral contendo BMP2 aumentou a formação óssea durante a fase de consolidação de uma distração mandibular em modelos de ratos.82 Um vetor químico de polietilenimina foi utilizado para entregar BMP4 em um suporte de ácido poliláctico-coglicólico para a dimensão dos defeitos críticos em calvárias de ratos.83 Este tratamento aumentou a formação óssea na região central dos defeitos em comparação com os suportes vazios. Células estromais da medula óssea são retroviralmente transfectadas com BMP7 ex vivo e reentregues em um suporte gelatinoso.84 Um vetor adenoviral foi utilizado para transfectar as células estromais da medula óssea ex vivo com BMP2, com o objetivo de produzir tecido ósseo em defeitos cranianos e maxilares de porcos.85,86 Os fibroblastos de pele geneticamente modificados para superexpressão de fatores osteogênicos apresentam a capacidade de formar os componentes da matriz óssea. Este recurso foi utilizado para produzir tecido ósseo em defeitos de calvárias de ratos.87,88 Os retalhos microvasculares livres são utilizados na reconstrução de defeitos após as cirurgias tumorais ablativas. A separação do retalho do corpo antes da reimplantação cria uma oportunidade para a modificação gênica (ex vivo) das células no retalho. A entrega de transgenes que inibem quaisquer células tumorais remanescentes no local da ressecção constitui uma abordagem terapêutica interessante contra a recorrência e metástases das neoplasias malignas. Em um modelo experimental de artérias aferentes de roedores, um retalho microvascular foi perfundido com vetores adenovirais portadores do gene repórter lacZ.89 Alta expressão regional do transgene foi observada em diferentes tipos de células do retalho, no entanto, nenhuma expressão foi encontrada do lado de fora do retalho.

Questões éticas das descobertas genéticas e da terapia gênica O conhecimento cada vez maior na área da genética, e a possibilidade de utilização terapêutica com genes modificados, levantam várias questões éticas.90,91 O banco de dados genéticos criado a partir do Projeto Genoma Humano suscita questões sobre quem deve ter acesso a essas informações e de que forma elas devem ser utilizadas. Os dados deveriam ser classificados juntamente com os registros médicos e sujeitos às mesmas leis de confidencialidade? Os empregadores e as companhias de seguros deveriam ter o direito de acesso a esses dados? Os dados deveriam ser utilizados para informar aos pacientes sobre as possíveis doenças futuras, mesmo não havendo cura ou prevenção disponível? O conhecimento da estrutura e função do gene é utilizado para desenvolver ferramentas diagnósticas e terapêuticas. Mas qualquer pessoa pode “inventar ” um gene? É correto que pesquisadores ou empresas façam patentes de genes? Vários kits de testes, comercialmente disponíveis, foram desenvolvidos para que as pessoas possam realizar seu rastreamento genético, diagnóstico, e até mesmo a previsão do prognóstico. No entanto, muitas questões ainda precisam ser respondidas sobre a patogênese de doenças comuns, de etiologia multifatorial, como o diabetes e a hipertensão. Nesse sentido, a comunidade científica fez duras críticas a estes kits de testes, pois eles não fornecem informações significativas.

Além disso, a obtenção de uma informação genética sem a participação efetiva de um médico pode levar a erros na interpretação dos resultados. A possibilidade de encontrar a cura definitiva para uma doença grave ou com risco de morte com a terapia gênica poderia ser de grande benefício para muitos pacientes. Além disso, esse progresso seria altamente gratificante para os cientistas, instituições e empresas. Por isso, não há falta de incentivos para pesquisas com essas terapias. Ao mesmo tempo, o desenvolvimento da terapia gênica requer ensaios clínicos, com riscos graves, até mesmo fatais, e efeitos colaterais da administração do vetor ou da própria modificação genética. Isso cria uma área de tensão, onde os princípios básicos da ética médica, como os princípios da autonomia, beneficência e maleficência, podem ser impugnados. A perspectiva de terapia gênica de células germinativas e a clonagem suscitam questões morais e éticas particularmente complexas. A terapia fetal pode ser utilizada para prevenir a doença com risco de morte ou partos cirúrgicos de risco. No entanto, as mesmas tecnologias também podem ser utilizadas para fins relativos à eugenia, ou seja, para melhoramento genético com o objetivo de maximizar o bem-estar de indivíduos ou sociedades. Na tentativa de resposta para estas preocupações, muitos órgãos reguladores foram criados para supervisionar os processos envolvidos e aplicar alguns princípios básicos. O Recombinant DNA Advisory Committee foi uma dessas iniciativas elaboradas pelos National Institutes of Health (NIH), e a Food and Drug Administration (FDA) que convergem para a segurança e a eficácia dos produtos geneticamente modificados.92 Foram estabelecidas regras para que os projetos de pesquisa passem por um processo de revisão, que consiste na aprovação preliminar da comissão de biossegurança da instituição de origem e do conselho de revisão institucional antes da aprovação final, que é realizada pelo Recombinant DNA Advisory Committee. A American Society of Gene and Cell Therapy foi criada em 1996 e tem proporcionado uma política de padrões éticos que envolvem estudos clínicos de terapia gênica.93 O princípio norteador é que os investigadores clínicos sejam capazes de projetar e realizar estudos de pesquisa clínica de forma objetiva e imparcial, ou seja, livres dos conflitos de interesses causados pelo significativo envolvimento financeiro com os patrocinadores comerciais do estudo. Em março de 2000, como parte dos esforços para garantir a proteção do paciente nos testes de terapia gênica, a FDA e o NIH anunciaram duas novas iniciativas para reforçar ainda mais as garantias para os indivíduos inscritos nos estudos clínicos para a terapia gênica: Gene Therapy Clinical Trial Monitoring Plan e o Gene Transfer Safety Symposia.94 O objetivo final de todas as sociedades preocupadas com as questões éticas é o de assegurar que os ensaios clínicos sejam conduzidos mantendo os princípios da constituição das Nações Unidas para a organização educacional, científica e cultural da “dignidade, igualdade e respeito mútuo entre os homens”.

Doença genética e o diagnóstico O termo “doença genética” inclui todas as doenças em que a etiologia pode ser rastreada pela genética ou anormalidades cromossômicas. Na doença monogenética, a causa pode ser identificada através de mutações em um único gene que causam a formação de proteínas anormais. No entanto, a maioria das doenças são complexas e multifatoriais, causadas por vários genes atuando em associação aos fatores ambientais.

Anomalias congênitas A rápida evolução da genética tem aumentado o conhecimento sobre a etiologia e patogênese das anomalias congênitas comumente tratadas pelo cirurgião plástico. Esse progresso melhorou as possibilidades de diagnóstico pré-natal que são extremamente importantes para o aconselhamento do paciente e o planejamento familiar.

Nomenclatura As anomalias congênitas são defeitos na estrutura dos tecidos, órgãos ou partes do corpo, presentes ao nascimento. Com base no principal mecanismo de sua patogênese, as anomalias podem ser categorizadas em malformações, deformações, rupturas e displasias.95 As malformações são anomalias causadas por um processo de desenvolvimento anômalo, intrínseco aos tecidos afetados. As fendas orofaciais representam exemplos dessas condições com uma morfogênese anormal. A fusão dos processos faciais é uma etapa importante da embriogênese facial, sendo dependente de eventos

oportunos e altamente regulados da proliferação, migração, diferenciação e apoptose das células. Estes eventos celulares, por sua vez, são regulados por mecanismos moleculares, principalmente pelos fatores de crescimento e moléculas intracelulares envolvidas na sinalização entre as células. Assim, os distúrbios nos mecanismos moleculares podem levar a um comportamento celular anormal e, em última instância, a malformações nos tecidos faciais envolvidos. Nas deformações, uma força mecânica provoca a anomalia. Apresentação pélvica, grande peso fetal, massas tumorais, útero unicorno e oligoidrâmnio são exemplos de fatores que podem causar compressão mecânica do feto. A displasia do desenvolvimento do quadril também está relacionada com a compressão mecânica do feto.96 O pé torto tem sido tradicionalmente classificado como uma deformação relacionada com a compressão intrauterina durante o terceiro trimestre. No entanto, os dados mais recentes não conseguiram sustentar essa hipótese, e o conhecimento atual sugere uma malformação congênita com causas genéticas diretas.97 Várias deformações e contraturas podem ocorrer secundariamente ao oligoidrâmnio, e a gravidade destas deformações está correlacionada com a sua duração.98,99 Como consequência, as deformações mais graves estão associadas a hipoplasia pulmonar e morte perinatal. A sequência do oligoidrâmnio (sequência de Potter) foi inicialmente descrita em casos de agenesia renal e se caracteriza por compressão facial, mãos espalmadas amplas, hipoplasia pulmonar e deformidades posicionais assimétricas das extremidades.100 O termo ruptura descreve um processo pelo qual o desenvolvimento normal dos tecidos embriológicos com potencial de desenvolvimento normal é dificultado ou retardado por fatores extrínsecos. Na sequência da banda amniótica (SBA), bandas de tecido fibroso podem contrair os dedos ou toda a extremidade, podendo causar necrose e até mesmo amputação. Acredita-se que a ruptura da membrana amniótica, a perda de líquido amniótico e o entrelaçamento subsequente de partes do corpo na membrana amniótica formem as bandas de tecido fibroso. No entanto, uma associação da SBA com as fendas labiopalatinas e a polidactilia sugere que as bandas amnióticas também podem ser o resultado de distúrbios intrínsecos da morfogênese com uma base genética.101 O termo “displasia” refere-se ao desenvolvimento anormal de tecidos embrionários e inclui doenças como a síndrome de Marfan e a osteogênese imperfeita. Com frequência, nessas condições, existe um amplo envolvimento de anomalias em várias estruturas anatômicas derivadas do tecido envolvido. A distinção entre as diferentes categorias descritas anteriormente nem sempre é clara. Algumas anomalias são o resultado da combinação de dois ou três destes mecanismos e o mesmo tipo de anomalia pode resultar de diferentes mecanismos. Em um estudo com 27.145 crianças com defeitos congênitos, 97,94% apresentavam malformações, 3,12% deformações e 1,65% rupturas. Em 3,51%, a causa foi uma associação de dois ou três mecanismos, e a associação entre a malformação e a deformação, a mais comum.102 Os eventos descritos da sequência do oligoidrâmnio exemplificam a associação entre a malformação renal e as deformações da face e das extremidades. Além disso, base genética para as bandas amnióticas (mencionada anteriormente) implica a associação entre as malformações e as rupturas. Como o conhecimento sobre a etiologia genética das anomalias congênitas se expande, as condições em que se acreditavam ser puras deformações ou rupturas, hoje podem se revelar como eventos secundários à morfogênese anormal. A sequência de Pierre Robin (SPR) é descrita como uma série de eventos em que a glossoptose secundária a micrognatia impede fusão do palato, resultando na formação de fenda palatina. De acordo com esta teoria, a fenda palatina é uma deformação provocada pela força mecânica da língua. No entanto, a etiologia da SPR é desconhecida. Não há nenhuma evidência científica que suporte que a compressão fetal intrauterina seja a causa de micrognatia. O fato de a SPR ser encontrada em várias síndromes indica que causas genéticas primárias estejam por trás desse distúrbio de crescimento mandibular. Genes e loci genéticos candidatos à SPR foram identificados.103 Assim, a SPR pode ser outro exemplo de uma associação entre malformação e deformação.

Anomalias congênitas selecionadas Fendas orofaciais As fendas orofaciais incluem as fendas labiais e/ou palatinas, que são as mais comuns, bem como formas raras de fendas faciais. As fendas são formadas quando os processos faciais embrionários não se fundem apropriadamente. Na quarta semana de desenvolvimento embrionário, a proeminência frontonasal e os processos maxilares e mandibulares pareados circundam a cavidade oral primitiva. A formação dos placódios nasais divide, então, a proeminência frontonasal em processos nasais laterais e mediais. O lábio superior e o

palato primário se formam ao final da sexta semana de desenvolvimento pela fusão dos processos nasais mediais bilaterais e os processos maxilares de cada lado. O palato secundário se desenvolve a partir dos processos maxilares, como lâminas palatinas crescendo verticalmente, que se elevam a uma posição horizontal durante a sétima semana de desenvolvimento e se fundem na linha média. Foi demonstrado que a fusão do lábio e do palato primário é controlada por um conjunto diferente de genes daqueles associados à formação do palato secundário.104 As fendas podem ocorrer como malformações isoladas ou como parte de uma síndrome. Estudos em ratos e pintinhos têm sido de fundamental importância para a elucidação dos mecanismos moleculares e da participação de genes no desenvolvimento das fendas orofaciais.105 A busca pelos mecanismos genéticos e moleculares envolvidos na etiologia das fendas combina diferentes abordagens, como: estudos de genes envolvidos nos casos sindrômicos de fendas, pesquisas do genoma para ligação genética em famílias com múltiplos casos de fendas não associadas a síndromes, análise de ligação e estudos de associação alélica de genes candidatos. A lista completa de genes candidatos conhecidos ou suspeitos envolvidos na gênese das fendas orofaciais foi publicada recentemente em uma revisão abrangente realizada por Jugessur et al.106

Fendas labiais e palatinas não sindrômicas As fendas labiais e/ou palatinas ocorrem como manifestações isoladas não sindrômicas em cerca de 70% dos casos, enquanto a fenda palatina não sindrômica é observada em metade dos casos.107 As fendas não sindrômicas são geralmente esporádicas e apresentam etiologia multifatorial, que envolve a participação de diferentes genes e fatores ambientais. No entanto, a presença das fendas orofaciais em núcleos familiares específicos e também a sua concordância em gêmeos apontam para uma predisposição genética.108,109 As taxas de concordância observadas são de 40%-60% para gêmeos monozigóticos e de 3%-5% para gêmeos dizigóticos. Estudos populacionais demonstraram que a ocorrência de fenda labial ou fenda labiopalatina em uma família normalmente não aumenta o risco de desenvolvimento de uma fenda palatina isolada, e vice-versa, o que está de acordo com a ideia de que essas condições apresentam fatores etiológicos genéticos diferenciados.107,110 Além disso, verificou-se que o risco de recorrência foi maior para fenda palatina do que para fenda labial ou fenda labiopalatina e que a gravidade anatômica da fenda não aumenta o risco de recorrência.110 O risco relativo de recorrência em parentes de primeiro grau foi de 32 para qualquer tipo de fenda labial e 56 para a fenda palatina isolada. O risco para os filhos foi semelhante se o parente afetado for o pai, mãe ou irmão, o que indica uma grande contribuição dos genes autossômicos expressos durante a vida fetal. Descobertas recentes a partir de modelos animais experimentais têm aumentado o conhecimento sobre os mecanismos celulares e moleculares na embriogênese facial. A sinalização dos fatores de crescimento e a ativação dos fatores de transcrição regulam os eventos celulares relacionados com o crescimento e a fusão dos processos faciais. As interações entre o epitélio e o mesênquima são de particular importância neste contexto.111 Os genes descobertos que estão envolvidos na formação do lábio e palato primário são as moléculas de sinalização extracelular das proteínas morfogenéticas ósseas (Bmp), fatores de crescimento de fibroblastos (Fgf), gene sonic hedgehog (Shs), os fatores de transcrição homeobox codificados por genes distal-less contendo homeobox (Dlx) Barx1, Msx1 e Msx2, e o fator de transcrição Tp63, que está implicado no desenvolvimento de tecidos epiteliais.112-116 O início e o crescimento vertical das lâminas do palato secundário envolvem um conjunto parcialmente diferente de fatores de crescimento e de transcrição. Estes incluem Osr2, Lhx8, Msx1, Fgf10, Fgfr2, e TGFBR2.117 Foi demonstrado que Fgf10 secretado pelo mesênquima do palato ativa o Fgfr2 no epitélio, que, por sua vez, mantém expressão epitelial de SHH.118 Também foi demonstrado que a interrupção desse mecanismo provoca o desenvolvimento de fenda palatina. Outro mecanismo de interação entre o epitélio e o mesênquima durante o crescimento das lâminas palatinas envolve o Bmp2, Bmp4, Shh e o fator de transcrição Msx1. Atividade de Msx1 regula a expressão de Bmp4 e Shh no epitélio e de Bmp2 e Bmp4 no mesênquima. Shh do epitélio regula positivamente a expressão Bmp2 no mesênquima, que, por sua vez, estimula o crescimento palatino.119 A patogênese é dependente de uma chave para uma aderência incompleta dos tecidos durante o crescimento vertical e da capacidade de aderência durante o crescimento horizontal. Essa chave é regulada pela molécula sinalizadora transmembrana Jaged-2 e pelo fator de transcrição do fator regulador de interferon 6 (IRF6).120-122 O processo de fusão das lâminas palatinas começa com a formação da junção epitelial na linha média, seguido pela decomposição epitelial por apoptose, para permitir a constituição da continuidade mesenquimal. A formação da junção epitelial na linha média envolve a atividade dos fatores de adesão, desmossomos, fatores de crescimento e enzimas proteolíticas.123-125 O Tgf-α é expresso próximo à junção da linha média durante a

fusão, e este foi um dos primeiros fatores a serem associados às fendas orofaciais.126 O Tgf-β3, secretado a partir da extremidade do epitélio medial, apresentou particular importância neste processo.127-132 Foi demonstrado que o Tgf-β3 knockout produziu fenda palatina e esta foi revertida pela administração exógena de Tgf-β3.133-134 Há evidências de que Irf6 é um mediador downstream de Tgf-β3 na extremidade medial do epitélio palatino.135,136 O PDGF-C é também um peptídeo de sinalização envolvido na gênese do palato. Ratos Pdgf–/– morreram no período perinatal, devido à falha respiratória e alimentar secundária à fissura completa do palato secundário.137 Já foi demonstrado que a sinalização PDGF-C é necessária para migração apropriada das células neuroectodermais e foi proposto que deficiência na migração celular no palato de ratos pdgf –/– foi o mecanismo por trás da formação da fissura. SNPs relacionados com as fendas labiais e/ou palatinas foram associados à diminuição da atividade do promotor de Pdgf-C.138 Os genes identificados e relacionados com diversas síndromes com fendas forneceram indícios na busca de genes envolvidos nas fendas não sindrômicas. Alguns exemplos incluem o IRF6 associado à síndrome de Van der Woude (VWS), FGFR1 para síndrome de Kallman, Tp63 e PVRL1 para a displasia ectodérmica, TBX2 para fenda e anquiloglossia ligada ao X e PTCH1 para síndrome de Gorlin.139-149

Fendas labiais e palatinas sindrômicas Cerca de 200 síndromes diferentes foram associadas às fendas labiais e palatinas. A fenda palatina foi identificada como um componente em cerca de 400 síndromes diferentes. A síndrome de Van der Woude (VWS), a síndrome CATCH 22 e diferentes tipos de displasia ectodérmica são as condições mais comumente observadas em pacientes com fendas orofaciais. Todas essas condições podem ser herdadas como doenças autossômicas dominantes. No entanto, cerca de 30%-50% dos casos com VWS e 90% dos casos com CATCH 22 são causados por novas mutações genéticas. A displasia ectodérmica foi identificada em ambos os casos, tanto familial quanto esporádica. A VWS é caracterizada por fendas labiais e/ou palatinas e fossetas congênitas no lábio inferior. Tal síndrome está relacionada com a síndrome do pterígio poplíteo (PPS) e inclui graus variáveis de teias poplíteas, pterígio, singnatia oral, aderências entre as pálpebras, sindactilia e anomalias genitais. Essas síndromes (VWS/PPS) são causadas por mutações no gene que codifica o IRF6, IRF6.150 O IRF6 é um fator de transcrição com um domínio de ligação ao DNA altamente conservado e um domínio de ligação à proteína mais variável. Uma correlação entre o genótipo e o fenótipo nessas síndromes foi realizada e foi verificado que a VWS é causada por mutações missense, em ambos os domínios, enquanto a síndrome pterígio poplíteo é principalmente causada por mutações no domínio de ligação ao DNA.150 Além disso, mutações nonsense e frameshift foram mais frequentemente encontradas em VWS do que no PPS. CATCH 22 é um acrônimo para um grupo de síndromes sobrepostas, de etiologia genética comum, mas com fenótipos heterogêneos. Tal condição está associada à deleção do 22q11 e resulta em anormalidades cardíacas/fácies, déficit de células T em decorrência da hipoplasia do timo, fendas palatinas e hipocalcemia em virtude do hipoparatireoidismo. No total, 69%-100% dos pacientes com essa deleção apresentam anormalidades palatinas, como fenda palatina, insuficiência velofaríngea, úvula bífida e fenda submucosa.19 O 22q11 eliminado contém cerca de 35 genes diferentes. O mais importante destes genes para o desenvolvimento das diversas anomalias é o TBX1. O TBX1 pertence ao grupo genes chamados genes T-box, um grupo de genes que codificam para os reguladores da transcrição, que são expressos no mesênquima faríngeo e tubo endodérmico em camundongos. No entanto, a alta variabilidade dos sintomas nos pacientes com CATCH 22 sugere que outros loci genéticos podem estar envolvidos. Foi demonstrado que o FGF8 e CRKL aumentaram o efeito das mutações em TBX1.151,152 Recentemente, chordin foi relacionado como sendo um modificador do TBX1 para o fenótipo craniofacial em um modelo murino de CATCH 22.153 A displasia ectodérmica é caracterizada por displasia das estruturas derivadas de ectoderma, como cabelo, dentes, unhas e glândulas sudoríparas. No entanto, a displasia ectodérmica é um grupo de síndromes com fenótipos diferentes, que vão além da displasia ectodérmica e podem incluir malformações, como as fendas orofaciais. A fenda orofacial pode ser de qualquer tipo, fenda labial e/ou palatina, e a expressividade variável dessa condição é observada dentro de uma mesma família. Deste modo, defeitos em muitos genes diferentes foram associados a este grupo de síndromes. Curiosamente, mutações em genes diferentes podem causar o mesmo tipo de displasia ectodérmica, e, por outro lado, mutações em um único gene podem dar origem a diferentes tipos dessas síndromes. Várias formas de displasia ectodérmica com fissura orofacial são causadas por mutações no gene TP63, que codifica um importante fator de transcrição para o desenvolvimento dos tecidos epiteliais.146

Craniossinostoses A craniossinostose pode ser uma condição primária ou secundária. A craniossinostose primária consiste em malformações originadas por erros intrínsecos ao processo de desenvolvimento do esqueleto craniano, provocando a fusão prematura das suturas craniais. A craniossinostose secundária desenvolve-se após o nascimento, devido ao crescimento insuficiente do cérebro ou de distúrbios metabólicos. Em cerca de 80%-90% dos casos, a craniossinostose primária é uma malformação congênita não sindrômica, que ocorre em decorrência da fusão prematura de uma normalmente ou, ocasionalmente, de várias suturas cranianas. O tipo de malformação é dependente da sutura(s) envolvida(s). Aproximadamente 100 síndromes diferentes com craniossinostose foram descritas. As mais comuns são as relacionadas com mutações no FGFR, como as síndromes de Crouzon e Apert. Os ossos do crânio se desenvolvem por ossificação intramembranosa entre o mesênquima dérmico sobrejacente e o mesênquima meníngeo abaixo.154 Os ossos individuais são formados por crescimento radial a partir de condensações do tecido ósseo mesenquimal. No pós- -natal, as suturas constituem os principais centros de crescimento para o neurocrânio, permitindo o rápido crescimento do cérebro durante os primeiros 2 anos. Acredita-se que a atividade destes centros de crescimento seja dependente da interação entre os diferentes tecidos que estão justapostos às suturas. Supõem que o mesênquima de sutura, subjacente a duramáter cobrindo o pericrânio, interage para regular a diferenciação e proliferação celular na sutura. Vários estudos demonstraram que a dura-máter apresenta extrema importância na permeabilidade e fusão das suturas.155-158 Estas interações de tecidos são mediadas pelos vários fatores de crescimento, receptores e fatores de transcrição envolvidos na sinalização intercelular. A importância dos FGFRs é mencionada e detalhada na seção de craniossinostoses sindrômicas, a seguir. Os diferentes membros da família dos fatores de crescimento TGF-β foram relatados como sendo importantes para o desenvolvimento do esqueleto craniofacial e para a biologia das suturas cranianas. Camundongos knockout para TGF-β2 morreram no período perinatal com uma ampla variedade de malformações, incluindo malformações craniofaciais com micrognatia e redução do tamanho e ossificação dos ossos cranianos.159 Ratos com inativação condicional do gene do receptor de Tgf-β2, tgf- β2r, na crista neural craniana nasceram com fendas completas no palato secundário e defeitos na calvária.160 O balanço da atividade das diferentes isoformas de TGF-β foi associado à regulação da fusão das suturas.161 Alta expressão de Tgf-β1 e 2 em relação ao Tgf-β3 promoveu a fusão fisiológica da sutura frontal posterior em ratos, enquanto a relação oposta de expressão das isoformas foi ligada à permeabilidade da sutura coronária. Recentemente, foram apresentadas evidências de que o efeito de Tgf-β2 sobre a fusão da sutura é mediada pelo sistema de sinalização de EGF.162 Outros membros da família do TGF-β foram implicados na biologia da sutura. Bmp2 e Bmp4 foram expressos no fronte osteogênico das suturas, e Bmp2 e Bmp4 no mesênquima das suturas cranianas e dura-máter adjacentes.163 Além disso, foi demonstrado que o gene antagonista da Bmp, o Noggin, é expresso no mesênquima de suturas de patentes e que a sua expressão é inibida pelo Fgf2.164 Outro antagonista da Bmp, o Bmp3, é regulado negativamente durante a fusão fisiológica da sutura frontal posterior.165 Um forte apoio ao papel da família TGF-β na biologia da sutura veio a partir da descoberta de uma síndrome associada à craniossinostose causada por mutações em diferentes receptores de TGF-β1 ou TGF-β2.166

Craniossinostose sindrômica A primeira anormalidade genética encontrada na craniossinostose foi uma mutação missense (P148H) e uma mutação de ganho de função no fator de transcrição homeobox-2 segmento muscular (MSX2).167 Esta mutação foi identificada em uma família com uma síndrome autossômica dominante, com alta penetrância e expressividade fenotípica variável, que foi denominada de craniossinostose tipo Boston. Outro gene de fator de transcrição implicado na craniossinostose é o TWIST1. A síndrome de Saethre-Chotzen é originada por várias mutações diferentes no gene TWIST1 que causam a perda da função do fator de transcrição.168,169 Esta síndrome é caracterizada por sinostose leve e assimétrica, linha frontal do cabelo baixa, desvio de septo nasal, nariz de bico de papagaio, anormalidades da orelha externa, estenose do canal lacrimal, ptose palpebral, distopia cantal e braquidactilia. O fenótipo nessa síndrome é altamente heterogêneo e, muitas vezes, sutil em sua expressão, o que reflete a pleiotropia do TWIST e a presença de outros modificadores dos mecanismos moleculares. O MSX2 induz a formação óssea e, se superexpresso, a fusão das suturas através do aumento do número de células osteogênicas.170 A perda da função de MSX2 foi identificada em uma condição genética associada a defeitos nos ossos parietais.171 Em contrapartida, o TWIST apresenta um efeito negativo sobre a diferenciação de células osteoprogenitoras em células osteogênicas.172 O TWIST está envolvido na via de sinalização do FGF e parece ser

um regulador negativo da expressão do gene FGFR.173 Assim, a perda de função do TWIST e ganho de função do FGFR podem ser componentes de uma via molecular comum na patogênese da craniossinostose. As principais síndromes associadas às craniossinostoses são Crouzon, Apert e Pfeiffer, causadas por mutações em genes que codificam para as diferentes isoformas do FGFGR. Comum a estas síndromes, também conhecidas como craniossinostoses faciais ou disostoses craniofaciais, é a combinação de sinostose da calvária com restrição do crescimento da base do crânio e do terço médio facial. As síndromes de craniossinostoses faciais pertencem a um grupo mais amplo de síndromes chamado de displasias esqueléticas, que também incluem as condrodisplasias (nanismo). Além disso, várias das síndromes de craniossinostoses relacionadas com o FGFR incluem as malformações dos membros. Assim, os FGFRs estão envolvidos no desenvolvimento de craniossinostoses craniofaciais e do esqueleto apendicular. As síndromes relacionadas com o FGFR podem ser herdadas como doenças autossômicas dominantes, no entanto a maioria dos casos são esporádicos e não hereditários, sendo causados por novas mutações genéticas. As mutações que causam síndromes associadas a craniossinostoses foram identificadas em FGFR1, FGFR2 ou FGFR3, sendo as mutações em FGF2 as mais comuns.15 Os loci genéticos são 8p para FGFR1, 10q para FGFR2 e 4p para FGFR3. Os FGFR são receptores transmembranares, com um domínio extracelular, um domínio transmembranar e uma região intracelular.174 O domínio extracelular de ligação ao ligante consiste em três laços semelhantes às imunoglobulinas (Ig1, Ig2 e Ig3) e a caixa de ácido que separa Ig2 de Ig3. A região intracelular apresenta atividade de tirosina quinase, bem como de outras sequências reguladoras. A ligação ao ligante é facilitada por proteoglicano sulfato de heparina (hspg). O complexo de ligação ao ligante de hspg ao receptor conduz a dimerização do receptor e a ativação das vias intracelulares de transdução de sinal (Fig. 11.4). As diferentes isoformas do FGFR evidenciam uma grande homologia da sequência de aminoácidos, particularmente nos laços, semelhantes à imunoglobulina, do domínio extracelular. No entanto, a estrutura do gene FGFR permite a síntese de várias formas diferentes do receptor. O splicing alternativo produz uma diversidade de isoformas de receptores com composições nas suas sequências extracelulares altamente variáveis, que servem principalmente para a produção de isoformas que diferem na especificidade de ligação ao ligante. Mutações em FGF3 associadas à acondroplasia foram relatadas em 1994.175 Nesse mesmo ano, o gene associado à síndrome de Crouzon foi mapeado no locus 10q25-q26, e um artigo posterior identificou uma mutação no FGFR2.176 Mutações no FGFR2 já foram identificadas nas síndromes de Crouzon, Apert, Pfeiffer, Jackson-Weiss e Beare-Stevenson (Tabela 11.2). Mais de 30 diferentes mutações do tipo missense no FGFR2 foram identificadas.15 A maioria das mutações são dispersas na sequência que codifica o domínio extracelular do receptor, no entanto, algumas já foram identificadas no domínio transmembranar, bem como nas regiões intracelulares catalisadoras (Fig. 11.12). Craniossinostoses sindrômicas também podem ser causadas por mutações no FGFR1 e FGFR3. Uma forma rara da síndrome de Crouzon associada à acantose nigricans é causada por uma mutação no FGFR3 e a síndrome de Pfeiffer pode ser causada por mutações no FGFR1. Tabela 11.2 Síndromes de craniossinostoses e genes envolvidos Síndrome

Localização cromossômica Gene mutado Entrada no OMIM

Crouzon

10q26

FGFR2 FGFR3

123500

Apert

10q26

FGFR2

101200

Pfeiffer

10q26 8p11

FFR2 FGFR1

101600

Jackson-Weiss

10q26

FGFR2

123150

Craniossinostose tipo Boston 5q34

MSX2

123101

Beare-Sevenson

10q26

FGFR2

123790

Muenke

4p16

FGFR3

602849

Saethre-Chotzen

7p21

TWIST

101400

FIG. 11.12 Mutações nas craniossinostoses sindrômicas. Esquema de mutações encontradas no receptor do fator de crescimento de fibroblastos (FGFR) 1, 2, e 3, causando craniossinostoses sindrômicas. A região extracelular contém um peptídeo sinal (PS), os domínios semelhantes à imunoglobulina (Ig) I, II e III, e uma caixa de ácido. (A) tirosina quinase (TQ) com dois subdomínios TQ1 e TQ2. O domínio transmembranar (TM) se estende à membrana celular.

A síndrome de Muenke é incomum, e sua definição foi feita com base na sua anomalia genética, uma mutação no FGFR3-P250R.177 O fenótipo desta síndrome, descrita pela primeira vez por Glass et al. e, em seguida, por Lajeunie et al. inclui sinostose coronal, hipertelorismo, hipoplasia maxilar leve, braquidactilia e um característico abaulamento das fossas temporais.178,179 Comum às mutações FGFR em craniossinostoses sindrômicas é que levam a ganho de função. As mutações podem causar aumento da sinalização do FGFR por meio de vários mecanismos.180 A destruição de resíduos de cisteína, que podem causar a formação de ligações dissulfureto intermoleculares no domínio extracelular do receptor, resulta na ativação constitutiva do receptor independente do ligante. Outras mutações podem provocar a ativação constitutiva do receptor por meio de alterações conformacionais do domínio extracelular. As mutações encontradas na síndrome de Apert provocam alterações na sinalização do receptor por meio de mudanças na especificidade do ligante. Existe uma grande variação na dismorfologia nestas síndromes, e também entre os indivíduos afetados de uma mesma família. Esta variação é, provavelmente, em virtude dos efeitos fenotípicos de diferentes mutações, expressão tecidual específica de diferentes isoformas de FGFR durante o desenvolvimento, outros fatores modificadores e, possivelmente, fatores ambientais. O aumento da compreensão dos mecanismos genéticos e moleculares envolvidos na craniossinostose pode ter um impacto direto sobre a tomada de decisão clínica. A taxa de reoperação para a hipertensão intracraniana foi consideravelmente mais elevada nas síndromes de Saethre-Chotzen e Muenke quando comparada com os casos não sindrômicos de sinostose bicoronal.181,182 Este fato justifica uma monitoração do grupo de pacientes com diagnóstico sindrômico confirmado. Os pacientes com plagiocefalia frontal unilateral e mutações genéticas apresentam dismorfologia mais acentuada em comparação com pacientes sem mutações.183,184 Por conseguinte, a presença de mutações está associada a uma maior frequência de revisões cirúrgicas e pode exigir procedimentos cirúrgicos primários mais extensos.

Diagnóstico pré-natal Com a evolução da ultrassonografia e um maior conhecimento sobre a base genética e molecular da doença, as possibilidades de diagnóstico pré-natal das anomalias congênitas aumentaram significativamente. O diagnóstico pré-natal pode ser resultado de investigações direcionadas devido a um aumento do risco conhecido para uma anomalia particular, ou pode ser uma descoberta inesperada durante o exame de rotina. O arsenal de diagnóstico inclui a ultrassonografia, os exames de triagem do soro materno, a recuperação transcervical de células trofoblásticas, testes invasivos para a obtenção de DNA fetal e fetoscopia. Existem várias razões para se obter um diagnóstico pré-natal. Essa informação diagnóstica pode ser utilizada para programar o parto sob condições em que existe um aumento do risco perinatal, ou para preparar para um

tratamento médico ou cirúrgico após o parto. As informações também podem ser utilizadas para preparar os pais psicologicamente para qualquer doença congênita ou natimorto. A opção incomum após chegar a um diagnóstico pré-natal é realizar uma intervenção fetal. Uma descrição completa de diagnóstico pré-natal e de triagem está além do escopo deste capítulo. A seção a seguir concentra-se no diagnóstico pré-natal das fendas faciais e craniossinostoses.

Ultrassom A ultrassonografia é realizada normalmente em torno da 20ª semana de gestação para avaliar a anatomia fetal e também pode ser utilizada para visualizar a dismorfologia das anomalias craniofaciais. As fissuras labiais, associadas ou não às fendas palatinas, podem ser detectadas pelo ultrassom pré-natal.185 As taxas de detecção ocorrem em uma proporção de 25%-50%, com pouca ocorrência de casos falsos-positivos. A presença de fendas palatinas não pode ser identificada com a tecnologia atual. O diagnóstico pré-natal de uma fenda facial deve ser seguido pelo encaminhamento para um centro de referência de fendas orofaciais, para que, assim, seja realizada uma consulta sobre o tratamento requerido após o nascimento. As cranossisnostoses, associadas ou não às síndromes, podem ser identificadas pela ultrassonografia.186 O diagnóstico é realizado por qualquer dismorfismo na região da cabeça ou de outras malformações associadas às extremidades. No entanto, um formato anormal da cabeça é encontrado com a digitalização de rotina em aproximadamente 2%-3% das gestações e outras causas, como a espinha bífida e trissomia do cromossomo 18, devem ser excluídas. As medições obtidas que podem facilitar o diagnóstico incluem o diâmetro biparietal e o diâmetro occipitofrontal, e a partir deles o índice cefálico (IC) pode ser calculado. Um IC < 75% significa dolicocefalia e um IC > 85% é considerado braquicefalia. As malformações na região da cabeça secundárias às sinostoses normalmente não são identificadas até o terceiro trimestre. Alguns casos não sindrômicos são identificados; a maioria é detectada durante o terceiro trimestre em conjunto com exames realizados para identificar o polidrâmnio.187-189 As manifestações craniofaciais severas como o crânio em trevo, ou manifestações de extremidades das síndromes associadas a craniossinostoses, geralmente são detectáveis durante o segundo trimestre. A identificação das mãos semelhantes a luvas da síndrome de Apert foi relatada durante o início do segundo trimestre.190 O diagnóstico da síndrome de Apert com base nas anomalias de crânio tem sido realizado entre a 16a e a 19a semana de gestação.191,192 Nos casos de craniossinostoses inesperadas, os pais devem ser encaminhados a um geneticista clínico para aconselhamento genético. Uma vez que o diagnóstico de craniossinostoses seja confirmado, os pais devem ser encaminhados para uma unidade especializada em malformações craniofaciais congênitas para uma discussão sobre o prognóstico e tratamento.

Testes invasivos Quando existe mutação genética parental conhecida ou suspeita de doença congênita com mutações conhecidas, o DNA fetal poderá ser obtido através de amniocentese ou biópsia das vilosidades coliônicas (CVS). A amniocentese pode geralmente ser realizada entre a 14a e a 20a semana gestacional e apresenta um risco de aborto de aproximadamente 1%. A CVS pode ser realizada a partir da 11a semana, mas apresenta um risco ligeiramente maior de perda fetal de 1%-2%. As células fetais coletadas por amniocentese podem ter que ser expandidas em cultura antes que a análise de DNA seja realizada. No entanto, se a mutação exata for conhecida, a amplificação por PCR dos segmentos de DNA mutados poderá ser utilizada para o diagnóstico direto. Se a mutação for desconhecida, a análise de ligação (linkage) poderá ser realizada para identificar as mutações hereditárias. Na gravidez que implique risco de ter uma síndrome craniofacial com mutações conhecidas, como Crouzon, Saethre-Chotzen ou Muenke, um diagnóstico pré-natal genético pode ser feito com testes invasivos. No entanto, a expressividade muito variável destas condições dificulta as previsões prognósticas. A ultrassonografia seriada pode, então, ser utilizada para avaliar a real dismorfologia.

Desenvolvimentos futuros A rápida expansão do conhecimento da genética provavelmente irá continuar. Pode-se esperar um desenvolvimento contínuo de melhores métodos para estudar a função de genes, dos mecanismos epigenéticos e também para modificar a expressão gênica. Neste contexto, a importância da pesquisa básica, com o objetivo

de elucidar os mecanismos moleculares na patogênese, não pode ser suficientemente enfatizada. Novas terapias curativas só podem se desenvolver por meio de uma maior compreensão destes mecanismos fundamentais. Na cirurgia plástica, deve-se esperar terapias moleculares para aumentar a taxa de cicatrização em ferimentos complicados, assim como para prevenir a formação de cicatrizes excessivas e queloides. A terapia gênica pode tornar-se um adjuvante na reconstrução cirúrgica. A entrega de fatores que estimulam a neovascularização e o fluxo sanguíneo pode ser utilizada para aumentar a viabilidade de retalhos e enxertos de pele, permitindo, assim, maiores transferências teciduais. A “braquiterapia biológica”, ou seja, a utilização de retalhos microcirúrgicos para entrega local de substâncias terapêuticas, é um advento interessante que combina a reconstrução com o tratamento adjuvante do câncer. Um descontentamento com o que foi obtido com a terapia gênica ou com a engenharia tecidual é frequentemente expresso. Na verdade, a maioria dos ensaios clínicos da terapia gênica está ainda em fase I ou II. Além disso, a construção em laboratório de tecidos ou órgãos inteiros ainda não pode ser esperada em um futuro próximo. No entanto, não há dúvida de que é apenas o início de uma era fascinante em que a combinação da terapia gênica e celular com os biomateriais de suporte poderá ser utilizada para criar composições para regeneração tecidual. Também se pode esperar uma maior compreensão das bases moleculares das anomalias congênitas, que será de grande valor no diagnóstico e aconselhamento genético. Além disso, uma melhor compreensão da relação entre o genótipo e o fenótipo contribuirá para orientar as decisões cirúrgicas. É de extrema importância que o progresso do conhecimento e da tecnologia para o diagnóstico genético e para a terapia seja firmemente associado a um debate vívido e aberto sobre todas as questões éticas pertinentes a este campo.

Im a ge ns e x t ra s pa ra e st e ca pít ulo e st ã o disponíve is e m h p://www.e x pe rt consult .com Fig. 11.1 História. Linha do tempo com os principais marcos das descobertas genéticas.

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

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90. Fleck, L. M. Ethical Issues In Molecular Medicine and Gene Therapy. In: Kresina T.F., ed. An Introduction to Molecular and Gene Therapy. New York: Wiley-Liss; 2001:319–346. Este capítulo começa com uma discussão sobre as questões éticas que envolvem terapia gênica de células somáticas. Depois, o foco muda para a engenharia genética de células germinativas.

95. Spranger, J., Benirschke, K., Hall, J. G., Lenz, W., Lowry, R. B., Opitz, J. M., et al. Errors of morphogenesis: concepts and terms. Recommendations of an international working group. J Pediatr. 1982; 100:160–165. Este artigo representa uma declaração consensual destinada a esclarecer a terminologia aplicada aos distúrbios da morfogênese. Especificamente, os autores visam facilitar a classificação diagnóstica, oferecendo terminologia precisa para facilitar as discussões em um campo cuja a ênfase está evoluindo da descrição física para uma análise da patogênese.

105. Mossey, P. A., Little, J., Munger, R. G., et al. Cleft lip and palate. Lancet. 2009; 374:1773–1785. Esta é uma revisão de fendas orais. São discutidos tópicos que vão desde a embriologia até o tratamento clínico e a prevenção.

110. Sivertsen, A., Wilcox, A. J., Skjaerven, R., Vindenes, H. A., Abyholm, F., Harville, E., et al. Familial risk of oral clefts by morphological type and severity: population based cohort study of first degree relatives.

Br Med J. 2008; 336:432–434. 185. Jones, M. C. Prenatal diagnosis of cleft lip and palate: detection rates, accuracy of ultrasonography, associated anomalies, and strategies for counseling. Cleft Palate Craniofac J. 2002; 39:169–173. 186. Miller, C., Losken, H. W., Towbin, R., et al. Ultrasound diagnosis of craniosynostosis. Cleft Palate Craniofac J. 2002; 39:73–80.

12

Princípios do tratamento de câncer Tomer Avraham, Evan Matros e Babak J. Mehrara

Resumo Tem havido uma progressão gradual das ressecções radicais de muitos cânceres para ressecções mais conservadoras. As terapias neoadjuvantes têm facilitado a ressecabilidade e até o menor estadiamento da doença. Um conhecimento aprimorado de imunologia tem levado ao desenvolvimento de terapias biológicas, além das quimioterapias citotóxicas padrão. As imunoterapias adaptadas estão sendo estudadas e representam um novo paradigma no tratamento do câncer.

Histórico A introdução da reconstrução após a extirpação foi um avanço importante no tratamento do câncer. As técnicas de cirurgia plástica facilitaram as ressecções em ampla escala ao viabilizarem o fechamento imediato dos defeitos cirúrgicos. Em adição, o desenvolvimento das técnicas microcirúrgicas possibilitou a transferência de retalhos altamente vascularizados a partir de áreas doadoras distantes, aumentando, assim, a versatilidade das técnicas reconstrutivas e evitando a necessidade de espera por demorados procedimentos cirúrgicos ou retalhos pediculados. O conhecimento aprimorado da patobiologia tumoral e dos fatores prognósticos levou a uma mudança gradativa de paradigma no tratamento do câncer, indo de uma “abordagem única”, para uma abordagem de terapia oncológica ajustada. Este capítulo traz a base do conhecimento atual sobre o tratamento moderno dos tumores.

História do tratamento do câncer Enquanto a cirurgia continua sendo o tratamento único mais bem-sucedido para tumores sólidos, a terapia multimodal tem demonstrado um papel crescente no século passado. A meta do tratamento atual para tumores sólidos consiste em minimizar a deformidade produzida pela extirpação cirúrgica em ampla escala, com auxílio de quimiorradiação neoadjuvante e adjuvante, para proporcionar as maiores chances de cura. O termo tratamento neoadjuvante é usado para descrever a quimioterapia e/ou radiação administrada antes da excisão tumoral. A terapia neoadjuvante é usada para promover a redução de tumores irressecáveis, tornando-os passíveis de ressecção, ou para diminuir a magnitude da ablação necessária à obtenção de margens negativas.1 Os pacientes podem apresentar uma resposta completa, com erradicação tumoral total préoperatória, ou uma resposta parcial à terapia neoadjuvante. A resposta à quimioterapia neoadjuvante é um importante preditor do resultado e pode determinar a quimioterapia usada no pós-operatório.2 Clinicamente, a terapia neoadjuvante é parte comum dos algoritmos de tratamento para muitos tumores sólidos. Exemplificando, estudos randomizados demonstram taxas de recorrência menores para tumores retais T3 e T4 associadas à administração da quimiorradiação no pré--operatório, em comparação ao uso no pós-operatório.3 Em adição, para os tumores distais localizados perto do ânus, a terapia neoadjuvante facilita a preservação do

esfíncter ao converter casos que potencialmente requeiram ressecção abdominoperitoneal a ressecção anterior baixa.4 Entre as desvantagens da terapia neoadjuvante, estão a possibilidade de progressão da doença antes da ressecção cirúrgica e as taxas aumentadas de complicações cirúrgicas decorrentes dos efeitos colaterais da quimiorradioterapia. Exemplificando, em uma revisão de quase 1.200 reconstruções microcirúrgicas de mama, Mehrara et al. demonstraram que a quimioterapia neoadjuvante era um fator de risco independente de complicações pós-operatórias em pacientes com câncer de mama submetidos à reconstrução microvascular da mama, resultando em taxas aumentadas de complicações da ferida, caso a cirurgia fosse realizada em menos de 6 semanas após a conclusão da quimioterapia.5 No contexto adjuvante ou pós-ablativo, a quimioterapia ou radiação é implementada para diminuir a recorrência locorregional ou a doença sistêmica, via tratamento dos depósitos tumorais microscópicos ou metástases não detectáveis no momento da cirurgia. É importante enfatizar, todavia, que mesmo quando a radiação ou quimioterapia são planejadas no pós-operatório, todas as tentativas possíveis devem ser feitas (desde que cirurgicamente viáveis) para obter margens tumorais microscopicamente negativas no momento da ressecção cirúrgica. Este conceito baseia-se no fato de que as margens tumorais negativas são um importante preditor de metástases locais ou regionais na maioria dos tumores sólidos.6

Cirurgia Os primeiros tratamentos para tumores foram a fulguração com eletrocautério, aplicação de materiais tóxicos ou ressecção cirúrgica. Devido às elevadas taxas de recorrência local observadas após a excisão tumoral, o tratamento cirúrgico na virada do século XX evoluiu para uma abordagem do tipo “maior é melhor ”, com margens amplas. O exemplo mais conhecido é a mastectomia radical de Halsted para câncer de mama invasivo, que defende a remoção do músculo peitoral maior, de todo o tecido mamário e dos linfonodos axilares.7 Similarmente, as malignidades de cabeça e pescoço eram tratadas com ligação da veia jugular interna, ressecção do músculo esternocleidomastóideo e sacrifício do nervo espinal acessório. Subsequentemente, foi comprovado que estas abordagens agressivas para o controle do tumor são desnecessárias para muitos cânceres. Em vez disso, a eficácia das ressecções anatômicas limitadas foi comprovada por estudos que: (1) demonstraram a equivalência com abordagens mais radicais; ou (2) combinaram cirurgia com terapia multimodal. Foi comprovado, por exemplo, que margens maiores que 2 cm não são benéficas no tratamento do melanoma cutâneo.8 Adicionalmente, o tratamento efetivo do câncer de mama dispensa a mastectomia obrigatória, se uma lumpectomia for combinada com radioterapia pós-operatória.9 A terapia cirúrgica moderna usa ideias oriundas de estudos clínicos, para minimizar o escopo da ressecção, preocupando-se com a preservação da forma e da função (Fig. 12.1). As abordagens radicais são reservadas apenas para os cânceres mais avançados com extensiva invasão local.

FIG. 12.1 Superioridade das ressecções menores em relação à cirurgia radical. (A) Esta paciente foi submetida a uma abordagem cirúrgica menos agressiva, com mastectomia poupadora do mamilo seguida de reconstrução imediata com tecido autólogo. (B) A segunda paciente passou por uma mastectomia radical modificada mais agressiva, seguida de radiação e reconstrução tardia. Note que ambas as pacientes apresentam uma reconstrução cosmética aceitável, sendo que o resultado final obtido pela paciente mostrada em (B) é inferior àquele alcançado pela paciente mostrada em (A). Devido, em parte, à natureza extensiva de sua cirurgia, ela apresenta uma cicatriz mais ampla e aparente, além das diferenças de tonalidade de pele.

Se por um lado a utilidade da excisão do tumor primário está estabelecida, o papel da cirurgia no tratamento da doença metastática é menos definido. A maioria dos pacientes com metástases recebe tratamento paliativo com radiação, para obter controle local, e quimioterapia para a doença disseminada. No entanto, quando uma avaliação minuciosa revela a existência de uma metástase isolada ou de número limitado de metástases em uma

paciente com prognóstico favorável, tanto a cura como uma sobrevida estendida são alcançadas com a realização de “metastectomias” cirúrgicas. Pacientes com sarcomas em membros submetidos a ressecções pulmonares apresentam taxas de sobrevida de 5 anos de até 25%.10 De modo semelhante, a lobectomia hepática para metástase colorretal está associada a uma sobrevida de 5 anos de 25%-40%, entre pacientes selecionados.11 Por fim, o cirurgião pode ser requisitado para a obtenção de tecido, com o objetivo de diagnosticar uma nova massa. Dependendo do tamanho do tumor, são obtidas biópsias incisionais ou excisionais como procedimento precursor à ressecção definitiva ou para estabelecer um diagnóstico em casos de cânceres tratados sem cirurgia. As biópsias incisionais devem ser sempre orientadas de forma a facilitar uma futura excisão cirúrgica ampla.

Radiação A radiação ionizante é definida como a energia suficiente para liberar elétron(s) de um átomo ou molécula. A maioria dos agentes radioativos usa fótons ou elétrons para produzir ionização. A quantidade de ionização produzida no ar por um feixe de radiação é denominada exposição e é medida em unidades de roentgens. A medida mais clinicamente relevante é a dose absorvida, que consiste no cálculo da quantidade de energia absorvida por unidade de massa. Isto é quantificado em joules por quilograma, ou unidades de Gray (Gy). Ao entrar nos tecidos, a dose de agente ionizante aumenta, mas então sofre degradação exponencial conforme se distancia da fonte, seguindo a lei do inverso do quadrado.12 O mecanismo pelo qual a radiação ionizante promove a destruição da célula tumoral não está totalmente elucidado. A radiação ionizante causa dano celular direto, via liberação de elétrons, ou indireto, via produção de radicais livres a partir da água. Como o oxigênio aumenta a meia-vida das espécies de radicais reativos, a radiação é mais efetiva nos ambientes ricos em oxigênio. Quando elétrons ou radicais livres entram em contato com moléculas biologicamente importantes, como o DNA, ocorrem efeitos prejudiciais. Embora as células promovam o reparo eficiente dos danos da cadeia simples de DNA, os danos da cadeia dupla são de difícil reparo pelo maquinário celular. O acúmulo de danos ao DNA em quantidade suficiente, antes do próximo ciclo mitótico, sobrecarrega a célula e acarreta sua destruição. Quando o intervalo entre doses sucessivas de radiação aumenta, números maiores de células podem reparar os danos na fita de DNA. Este princípio é denominado dano subletal e fornece a lógica para o uso da radiação em doses fracionadas diárias, que variam de 1,8 a 2,5 Gy. O êxito da radioterapia é atribuído ao fato de as células normais terem maior capacidade de reparar danos subletais entre frações de radiações, em comparação às células tumorais. A radioterapia é mais comumente administrada a distância do tumor, sendo chamada teleterapia ou radioterapia com feixe externo. Entretanto, também pode ser administrada como braquiterapia, com doses altas aplicadas diretamente em uma área específica.12 O uso clínico da radioterapia teve início nas décadas de 1940 e 1950, depois que os pioneiros da área conseguiram minimizar as complicações locais, como as queimaduras por radiação e os cânceres de pele secundários. Ainda que de forma pouco comum, a radiação pode ser usada como monoterapia para tumores radiossensíveis, como a doença de Hodgkin.13 Para outros tipos de tumor, foi demonstrada a equivalência entre excisão cirúrgica e radioterapia. Exemplificando, o tratamento do câncer de próstata T1/T2 com prostatectomia radical ou radioterapia com feixe externo está associado a taxas de sobrevida comparáveis, contudo os perfis de risco diferem para cada terapia.14,15 A escolha do tratamento é feita com base na preferência do paciente e nos fatores de risco cirúrgico, conforme a avaliação feita pelo urologista que está tratando o paciente. De modo semelhante, os tumores aerodigestivos inferiores a 2 cm respondem igualmente bem à radiação e à cirurgia. No caso das neoplasias de laringe, a radioterapia é preferida por sua habilidade de preservar o órgão.16 Os cirurgiões mais comumente empregam a radiação como parte de regimes neoadjuvantes ou adjuvantes combinados com extirpação para tumores sólidos. Estas duas modalidades são complementares entre si, na promoção da melhora do controle locorregional. Enquanto a cirurgia falha nas margens tumorais onde as contagens celulares são baixas ou submicroscópicas, a radiação atua melhor na periferia, onde os níveis de oxigenação são mais altos. A radiação é menos efetiva no centro avascular das massas tumorais necróticas, onde a tensão de oxigênio é fraca.17 O papel ampliado da radioterapia no tratamento do câncer fez com que sua administração fosse aprimorada. No passado, a radiação era aplicada no contexto neoadjuvante, com o objetivo de tornar os depósitos tumorais microscópicos, então espalhados inadvertidamente no momento da ressecção, incapazes de divisão celular. Entretanto, as dificuldades técnicas e os aumentados índices de complicações, como ruptura e infecção da ferida associadas a este esquema de radiação, levaram ao uso preferencial da radioterapia no contexto adjuvante

para muitos cânceres. Apesar dos índices aumentados de complicações associadas à cicatrização da ferida após a cirurgia, nos tecidos irradiados, tenham sido considerados relacionados com os efeitos prejudiciais da radiação sobre o suprimento sanguíneo local, a(s) causa(s) exata(s) deste risco aumentado é(são) desconhecida(s).18 De fato, estudos sugeriram que a lesão causada por radiação depleta as células-tronco teciduais locais e a restituição destas células com injeções de células-tronco pode melhorar a cicatrização tecidual.19

Quimioterapia As metas da quimioterapia são similares àquelas da radioterapia, a saber: a destruição preferencial das células cancerosas em relação aos tecidos normais e, ao mesmo tempo, a minimização da toxicidade. O sucesso da quimioterapia é devido ao fato de as células normais apresentarem uma capacidade melhorada de reparar DNA danificado e de sobreviver, em comparação às células cancerosas. Para o êxito da quimioterapia, é essencial que todas as células tumorais sejam erradicadas. Os agentes que destroem 99,99% de 109 células tumorais (a concentração aproximada de células em uma massa de 1 cm) permitem que uma carga tumoral de 105 células persista. Como é improvável que os agentes matem todas as células tumorais em apenas uma única aplicação, as quimioterapias são administradas em várias rodadas para obter o máximo de morte celular. A administração da quimioterapia em frações aproveita a vantagem de alguns agentes serem efetivos apenas em certos estágios do ciclo celular (denominada resistência cinética) e minimizarem a toxicidade em cada administração, por permitirem o uso de doses menores.20 Além disso, a quimioterapia combinada, usando agentes que possuem diferentes mecanismos de ação e toxicidades, possibilita o máximo de morte celular tumoral e, ao mesmo tempo, minimiza os efeitos colaterais no hospedeiro. A identificação da toxicidade da quimioterapia levou à introdução de modificações, como a administração regional, que permite o uso de doses maiores com produção reduzida de efeitos colaterais sistêmicos. Entre os exemplos deste tipo de aplicação, estão a perfusão de membro isolado, para pacientes com metástases em trânsito de melanoma, ou a colocação de bombas de infusão na artéria hepática, para casos de metástases hepáticas colorretais.21,22 Agentes quimioterápicos como a mostarda nitrogenada e o metotrexato foram introduzidos na década de 1940, com a intenção de evitar a cirurgia como um todo. Embora tenha sido demonstrada a efetividade dos quimioterápicos como modalidade terapêutica isolada para malignidades hematológicas, como a leucemia e o linfoma, sua eficácia no tratamento primário de tumores sólidos ainda não foi comprovada, na maioria dos casos. As exceções incluem a quimioterapia para subtipos particulares de câncer testicular e a quimioterapia combinada, como o protocolo Nigro para tratamento do câncer anal.23,24 No tratamento de tumores sólidos, a indicação para quimioterapia comumente é o uso paliativo em pacientes com doença metastática que não sejam candidatos à cirurgia curativa. Nesses casos, a quimioterapia é administrada com o intuito de prolongar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida. Os cirurgiões mais frequentemente se deparam com a quimioterapia como parte de um tratamento neoadjuvante ou adjuvante combinado à excisão tumoral. Entre os exemplos de tumores comumente tratados deste modo, estão os cânceres de mama, cólon, e cabeça e pescoço. A sinergia entre cirurgia e quimioterapia é exemplificada pelos sarcomas de membro. Antigamente, os pacientes com osteossarcomas eram tratados com amputação. Entretanto, a introdução da quimioterapia neoadjuvante aumentou os índices de preservação de membro com sobrevida a longo prazo equivalente.25

Imunoterapia e biológicos As formas de imunoterapia passiva e ativa são as modalidades de tratamento de câncer mais modernas, que empregam mecanismos da imunidade para destruir as células tumorais. Na imunoterapia passiva, o sistema imune do hospedeiro permanece quiescente, enquanto os agentes terapêuticos são introduzidos para erradicar as células de tumor. A aplicação mais comum deste tratamento é a administração de anticorpos monoclonais dirigidos contra antígenos tumorais específicos (Fig. 12.2). A vantagem desta abordagem é a natureza altamente específica da terapia, que teoricamente diminui os efeitos colaterais e a toxicidade. Um agente bastante usado é o trastuzumabe, um anticorpo monoclonal que se liga ao segmento extracelular do receptor HER2/neu, superexpresso em cerca de 25% dos cânceres de mama.26,27

FIG. 12.2 Imunoterapia passiva com anticorpos monoclonais (mAc). (A) Os anticorpos monoclonais podem atuar ligando-se a uma molécula da superfície celular que atue como transdutora de sinal. A ligação do anticorpo a esta molécula inibe sua habilidade de transduzir sinais e ativa as vias sucessivas que conferem os fenótipos malignos de desregulação do ciclo celular, sobrevivência celular e potencial metastático (p. ex., trastuzumabe). (B) Os anticorpos monoclonais podem contribuir para a imunoterapia por meio de seus efeitos citotóxicos (p. ex., rituximabe). A ligação do anticorpo a antígenos tumorais específicos pode resultar em fixação e ativação do complemento, culminando na formação do complexo de ataque à membrana. Este complexo abre poros na membrana da célula tumoral. A ligação do anticorpo também pode causar ativação de células natural killer citotóxicas ou macrófagos fagocíticos. (C) Por fim, os anticorpos monoclonais podem se ligar e bloquear a atividade de fatores de crescimento necessários à manutenção tumoral. Um exemplo é o bevacizumabe, que se liga ao fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) e, assim, inibe a angiogênese tumoral.

A imunoterapia adotiva é uma forma alternativa de imunoterapia passiva, em que células dotadas de atividade antitumoral são introduzidas no hospedeiro (Fig. 12.3). Um exemplo seria a manipulação ex vivo de linfócitos tumor-infiltrantes autólogos do hospedeiro, que apresentam uma reatividade natural ao câncer, em presença de IL-2 para aumentar o potencial citolítico ou o reconhecimento do antígeno tumoral.28 Estudos em curso estão avaliando a utilidade desta terapia para o tratamento do melanoma.29

FIG. 12.3 Transferência adotiva de linfócitos autólogos de tumor infiltrantes. Os linfócitos são obtidos e cultivados a partir de uma amostra de tumor. A proliferação dos linfócitos é estimulada com interleucina-2 (IL-2). As células com especificidade são isoladas e expandidas. A mieloablação do paciente é promovida por meio de quimioterapia e radioterapia. Os linfócitos antitumorais expandidos são readministrados, muitas vezes com administração concomitante de IL-2.

A imunoterapia ativa descreve protocolos em que o sistema imune do hospedeiro é diretamente estimulado pela apresentação de materiais antigênicos. Quando o material antigênico causa estimulação generalizada do sistema imune, a estimulação é considerada inespecífica (Fig. 12.4). O agente imunoestimulante mais conhecido é o bacilo de Calmette-Guérin (BCG), uma forma atenuada do bacilo da tuberculose bovina. Embora seu mecanismo de ação seja obscuro, este agente é comprovadamente benéfico no tratamento dos cânceres de bexiga superficiais, apresentando resultados menos promissores como terapia para melanoma.30 As infusões com citocinas são outra forma inespecífica de imunoterapia ativa. Exemplificando, o melanoma é alvo frequente de agentes como a IL-2 e o interferon-α (IFN-α), pois é o tumor que apresenta resposta mais imunogênica.31,32

FIG. 12.4 Imunoterapia ativa com agente inespecífico, como o bacilo de Calmette-Guérin (BCG). A administração do agente provoca uma reação inflamatória inespecífica com consequente liberação de citocina. Isso resulta na ativação de neutrófilos, células natural killer (NK) e macrófagos. Essas células, por sua vez, liberam várias citocinas, inclusive interleucina-2 (IL-2), fator de necrose tumoral-α (TNF-α) e interferon-γ (IFN-γ). Essas citocinas, por sua vez, ativam os linfócitos e a resultante morte de células tumorais.

Os agentes que deflagram uma resposta dirigida contra antígenos tumorais ou células efetoras são considerados específicos (Fig. 12.5). O melhor exemplo de imunoterapia ativa específica é o desenvolvimento de vacinas derivadas de antígenos expressos em células cancerosas do paciente. A natureza altamente específica desta abordagem terapêutica destaca suas limitações. Exemplificando, múltiplos tumores do paciente podem expressar diferentes peptídeos antigênicos ou, alternativamente, é possível que existam diferentes populações subclonais em um mesmo indivíduo.

FIG. 12.5 Imunoterapia ativa com vacina tumoral. Diversas abordagens de vacinação tumoral foram usadas e alcançaram resultados variáveis. Uma abordagem recentemente defendida usa a ativação ex vivo da célula dendrítica (CD) apresentadora de antígeno. As CDs imaturas são expandidas ex vivo. Em seguida, essas células são expostas a um antígeno tumor-específico e estimuladas. As CDs maduras resultantes são administradas ao paciente, as quais atuam como células apresentadoras de antígeno, levando à ativação de células T com atividade antitumoral específica.

A última geração de agentes antineoplásicos, denominados agentes biológicos, tem como alvo as vias moleculares identificadas a partir da ciência básica da biologia tumoral. Em contraste com os métodos tradicionais, que desenvolvem fármacos por testes de triagem-e-erro, a criação de fármacos feita desse modo é referida como delineamento racional, pois os alvos são especificados a priori. Como muitos agentes biológicos são anticorpos, podem ser considerados formas de imunoterapia passiva. O exemplo mais antigo, o imatinibe (Gleevec®), foi projetado para bloquear o produto genético anômalo do cromossomo Philadelphia, a Bcr-Abl tirosina quinase constitutivamente ativa.33 A eficácia clínica obtida com o imatinibe levou à adoção de outros oncogenes-alvo, como o fator de crescimento endotelial vascular com bevacizumabe (Avastatina®) e o CD20 com rituximabe (Rituxan®). Sendo a classe mais nova de agentes antineoplásicos, os agentes biológicos estão sendo investigados quanto ao seu papel no arsenal quimioterápico. Diante da disponibilidade e uso amplamente disseminados, os cirurgiões plásticos passarão cada vez mais a operar pacientes tratados com esses agentes. Há poucos dados sobre a realização de cirurgia nesse contexto, porém relatos de caso sugerem que os inibidores de angiogênese (bevacizumabe) contribuem para a ruptura da ferida, uma vez que a neovascularização é um componente essencial à cicatrização normal da ferida.34

Terapia fotodinâmica A fotorradiação usa a luz no espectro visível para produzir energia junto às células. A aplicação mais amplamente conhecida da fotorradiação é o laser. Os compostos químicos chamados de fotossensibilizadores, que são captados de maneira preferencial pelas células cancerosas, em comparação aos tecidos normais, respondem à luz produzindo radicais livres. Quando a luz reflete nestas células, o acúmulo de energia produz dano térmico e destruição celular.35 Como a terapia fotodinâmica requer luz para ser ativada, sua utilidade é limitada aos tumores superficiais. A terapia fotodinâmica atualmente é usada para tratamento dos tumores em estágio avançado de esôfago e de pulmão de células não pequenas, e está sendo investigada para uso no tratamento dos cânceres oral, de pele, entre outros.36,37

Patobiologia O conhecimento da biologia da célula tumoral fornece a base para o tratamento clínico atual dos cânceres.

Massa crítica As células normais tendem a não se amontoar e se alinham de maneira ordenada. Em contraste, as células tumorais perdem esta propensão e crescem se sobrepondo umas as outras. O crescimento das células tumorais é logarítmico e quantificado como tempo de duplicação. Cada tumor cresce a uma velocidade diferente, assim os tempos de duplicação podem variar entre 2 e 200 dias.38,39 Os tumores geralmente não são detectáveis até atingirem cerca de 1 cm de diâmetro. Dependendo do tempo de duplicação, um tumor pode estar presente em um paciente por anos, antes de se tornar palpável. Conhecer este conceito permite que a equipe de oncologia tenha tempo suficiente para avaliar pacientes recém-diagnosticados, de uma forma adequada e minuciosa, sem apressar a terapia. O primeiro passo, desde que tecnicamente viável, é obter uma biópsia da massa tumoral para estabelecer o tipo celular e o diagnóstico correto. São obtidas biópsias excisional, incisional ou por agulha, dependendo do tamanho e localização do tumor. Em alguns casos, como, por exemplo, o câncer de células renais, a biópsia por agulha ou a biópsia incisional podem ser contraindicadas, pois são procedimentos que podem causar semeadura peritoneal. O diagnóstico tecidual geralmente é correlacionado com exames de imagem, como o de tomografia computadorizada e o de ressonância magnética, para identificar metástases tumorais regionais e a distância. Com esses dados, o paciente pode tomar decisões esclarecidas sobre o melhor tratamento e o momento da instituição das terapias adjuvantes em relação à cirurgia.

Margens tumorais A variabilidade da distribuição das células tumorais junto a uma dada amostra tecidual pode prejudicar a identificação das células malignas nos cortes de tecido. Exemplificando, se 10% das células de uma amostra apresentam fenótipo maligno, poderão ser facilmente visualizadas ao microscópio. Entretanto, se o número de

células malignas cai para 0,1% ou 1:1.000, a menos que as células estejam agrupadas, sua identificação pode ser um desafio e talvez requeira a adoção de medidas mais sensíveis, como a imuno-histoquímica (marcação de antígenos tumorais). Até mesmo essas medidas mais sensíveis podem não detectar focos de metástases cancerosas, resultando, assim, em um diagnóstico falso-negativo. O diagnóstico acurado das margens cirúrgicas e amostras de biópsia é essencial, uma vez que os achados falso-negativos podem afetar significativamente o diagnóstico e o tratamento. Os achados clínicos ilustram esse conceito. Exemplificando, os pacientes com câncer de células escamosas de cabeça e pescoço submetidos à linfadenectomia profilática apresentam taxas de recorrência local significativas, apesar da ausência de células tumorais na patologia final.40 Um segundo exemplo pode ser observado nos cânceres de reto com margens negativas à ressecção inicial. A avaliação de pacientes com doença localmente recorrente mostra que 50% das recidivas ocorrem na linha de sutura, apesar da histologia negativa.41 Nestes cenários, a recorrência tumoral pode ser atribuível aos depósitos tumorais microscópicos não detectados pela avaliação patológica. Exames laboratoriais também demonstraram a presença de células tumorais microscópicas. Há exemplos em amostras de câncer de cabeça e pescoço e de melanoma, em que as células cancerosas não podem ser detectadas pela histologia de rotina, mas crescem com sucesso in vitro.42,43 Mais recentemente, as técnicas de biologia molecular, como a reação em cadeia da polimerase e a imuno-histoquímica, são usadas no ultraestadiamento molecular de pacientes histologicamente linfonodo-negativos, para identificação de depósitos tumorais microscopicamente invisíveis. Pesquisas adicionais investigam se essas pequenas cargas tumorais têm importância clínica.44 Os exemplos mencionados justificam o tratamento multimodal dos tumores sólidos tratados primariamente com extirpação cirúrgica. Embora as margens sejam frequentemente relatadas como “negativas”, as recorrências são comuns. A quimioterapia ou, na maioria das vezes, a radiação é usada em tais contextos para tratar células tumorais potencialmente viáveis ocultas. Alternativamente, é preciso notar que o sistema imune tem o potencial de erradicar as células tumorais residuais que persistem após a extirpação. A revisão de pacientes com margens positivas de câncer de células basais mostra taxas de recorrência de apenas 20%-30%, sugerindo a capacidade do corpo de destruir pequenos números de células cancerosas.45 Idealmente, a meta do diagnóstico de câncer é identificar com acurácia os pacientes que apresentam disseminação microscópica de tumor, a fim de evitar a administração desnecessária de agentes adjuvantes com efeitos colaterais e toxicidades indesejáveis.

Classificação A classificação do tumor pode ser baseada em diversos fatores, incluindo a morfologia, grau de diferenciação e tipo celular histológico. Os esquemas de classificação diferem para cada tipo de tumor, uma vez que os fatores determinantes do comportamento são variáveis. Estudos retrospectivos identificaram características tumorais que podem ser usadas para prever o comportamento clínico do tipo tumoral. O comportamento de um sarcoma, por exemplo, está correlacionado a certo número de mitoses identificadas por campo de maior aumento ou subtipo histológico.46-48 Em contraste, os fatores prognósticos do câncer de mama incluem o tamanho do tumor, o estado dos linfonodos e a expressão de receptor hormonal.49-52 A principal meta dos esquemas de classificação é subestratificar os tumores para prever o comportamento clínico com maior acurácia e guiar a terapia. Apesar dos recentes avanços ocorridos nesta área, a busca por diagnósticos mais acurados e prognósticos do comportamento tumoral constitui uma das principais fontes de pesquisa atual. Futuramente, a meta será identificar os tumores com base em “assinaturas genéticas” que permitam não só estabelecer um diagnóstico mais preciso, como também instituir um tratamento alvo-dirigido. O sistema de classificação mais antigo é baseado nos achados clínicos. Nesse caso, o estadiamento é feito com base no grau de disseminação tumoral, ocorrência de envolvimento de linfonodo e presença de metástases distantes detectadas por radiografia ou biópsia. O sistema TNM, amplamente usado e exposto com base nos sistemas de classificação clínica, é uma tentativa de estratificação adicional dos pacientes em grupos prognósticos. Neste sistema, o tumor (T) representa a extensão do tumor primário segundo as medidas de tamanho, profundidade da invasão ou grau de envolvimento anatômico. O linfonodo (N) enumera o envolvimento dos linfonodos, como o número de linfonodos afetados ou o tamanho do linfonodo. A metástase (M) reflete o envolvimento de órgãos distantes. Outros sistemas de classificação apoiam-se na morfologia tumoral como base do prognóstico.

Exemplificando, a classificação de Lund para carcinomas de células basais é fundamentada nas características descritivas do tumor, como nodular (margens bem-definidas), ulcerativo, morfeia e esclerosante (margens indefinidas). Neste sistema, a presença de características de morfeia ou esclerose está associada a um curso mais agressivo e problemático.53 Um segundo exemplo é a classificação morfológica estabelecida por Clark para o melanoma, que inclui as variantes superficial, nodular, lentigo maligno, e acral lentiginoso.54 Os sistemas de classificação histológica usam a categoria ou tipo celular histológico para estratificar os resultados clínicos. Os sistemas de gradação histológica são exemplificados pelos tumores de glândulas salivares, que estão separados nos subtipos mucoepidermoide, adenoide cístico, células acinares e de células escamosas.55 O sistema histológico de Clark classificou os melanomas de acordo com o nível de invasão, em melanoma de derme papilar, derme reticular e de tecido adiposo subcutâneo.54 Usando essa abordagem, a determinação da profundidade da invasão era subjetiva e com uma fraca confiabilidade entre os avaliadores. Subsequentemente, foi desenvolvido o sistema de Breslow, que quantificava a espessura tumoral de forma mais objetiva, por meio de medidas realizadas com um micrômetro preso ao campo do microscópio.56 Mais recentemente, os conceitos de biologia molecular foram aplicados à classificação tumoral. O conhecimento do transcriptoma e proteassoma tumorais levou à identificação de assinaturas moleculares exclusivas para cada tumor, que são preditivas do comportamento clínico. Um exemplo é a assinatura molecular reproduzível e altamente específica dos tumores de mama triplo-negativos (ausência dos receptores ER/PR/HER2), clinicamente agressivos.57 Com o uso de técnicas da ciência básica, os pesquisadores objetivam subclassificar os tumores em nível molecular, a fim de refinar os esquemas de estadiamento e fornecer uma terapia ajustada.

Tratamento O objetivo do oncologista é aplicar as opções terapêuticas disponíveis, tanto cirúrgicas como não cirúrgicas, para minimizar a morbidade e, ao mesmo tempo, possibilitar a cura do paciente. Em adição, o valor relativo da reconstrução na restauração da função orgânica e cosmética não é o mesmo em todos os cenários, podendo exercer algum papel na escolha do regime oncológico. Exemplificando, o tratamento do câncer de laringe com radioterapia é fortemente preferido à laringectomia, dada a inadequação dos métodos de reconstrução da voz atualmente usados. Em contraste, muitos cânceres de mama são tratados de modo igualmente satisfatório por lumpectomia e radioterapia ou apenas por mastectomia. Estas situações requerem uma consulta detalhada a uma equipe de oncologia abrangente, acerca dos riscos e benefícios associados a cada terapia, com tomada de decisão informada pelo paciente. Em adição, a disponibilidade das técnicas de reconstrução mamária à base de implante e autóloga, que são altamente efetivas, pode influenciar a decisão de realizar uma mastectomia simples. De modo semelhante, a preservação do membro em casos de osteossarcoma somente se torna possível com o uso da quimioterapia neoadjuvante e realização de reconstruções funcionais com aloenxertos ou endopróteses. Estes exemplos destacam a ocorrência de uma mudança de paradigma nas estratégias ablativas, ao longo do último século, passando de uma “abordagem Halstead” para o tratamento moderno baseado nos avanços da terapia multimodal e da reconstrução para tratamento de tumores sólidos. Além da excisão da massatumoral primária, o tratamento dos linfonodos é parte importante do tratamento de tumores sólidos. Como os carcinomas drenam através das bacias linfonodais regionais, em contraste com os sarcomas que se espalham por via hematogênica, a remoção dos linfonodos regionais é essencial no caso dessas malignidades. A linfadenectomia regional é realizada de forma rotineira, como parte do estadiamento, para determinar o prognóstico e por seu potencial valor terapêutico.58-62 Para pacientes com linfonodos clinicamente palpáveis no momento da ressecção tumoral, a remoção dos linfonodos envolvidos geralmente é realizada para obter o controle regional por meio da prevenção do efeito em massa e da ruptura da pele. Nos casos sem evidência clínica de envolvimento de linfonodos, seja ao exame ou nas radiografias, o momento em que a linfadenectomia deve ser realizada é controverso. A dissecção de linfonodo pode ser realizada no momento da extirpação inicial do tumor (denominada dissecção de linfonodo eletiva ou profilática [ELND]) ou quando da recorrência subsequente do tumor em uma bacia linfonodal (dissecção de linfonodo terapêutica [TLND]). A ELND não é recomendada de forma rotineira, por dois motivos. Primeiro, a linfadenectomia regional resulta em morbidade aumentada, como linfedema de membro, ou complicações da dissecção cirúrgica, como um dano a um nervo. Em segundo lugar, não está comprovado definitivamente que a ELND melhora a sobrevida, em comparação à TLND, no caso de malignidades como o melanoma.63 De modo ideal, o uso da ELND deve ser restrito aos casos com alta probabilidade de disseminação

tumoral regional oculta, como os cânceres de cabeça e pescoço com tumor primário amplo.64 A introdução do conceito de linfonodo sentinela, por Morton et al., modificou ainda mais o tratamento cirúrgico das bacias de linfonodos regionais clinicamente negativas.65 O conceito de linfonodo sentinela é baseado no fato de os tecidos drenarem para dentro dos linfonodos regionais de uma forma reproduzível e ordenada. Após a injeção de coloide radioativo ou corante azul no tumor, o primeiro linfonodo ou linfonodo sentinela que drena a bacia é excisado para ser examinado quanto ao envolvimento tumoral. O estado do linfonodo sentinela é representativo de toda a cadeia linfonodal regional, sugerindo se a ELND deve ou não ser realizada. Por meio de uma detalhada identificação intraoperatória do linfonodo sentinela e de uma análise histológica abrangente, os índices de resultados falso-negativos de biópsia de linfonodo sentinela hoje variam de 0% a 11%.66,67 Um subgrupo de pacientes com linfonodo sentinela negativos à coloração de hematoxilina e eosina apresentará doença micrometastática à análise de imuno-histoquímica. A consequência destes pequenos depósitos tumorais é obscura, uma vez que tais pacientes apresentam sobrevida similar a dos pacientes do grupo-controle.68 Um benefício adicional do mapeamento do linfonodo sentinela é que, como apenas um único linfonodo é coletado, a amostra passa por uma avaliação patológica e histológica mais completa para maior acurácia do estadiamento linfonodal. Teoricamente, o mapeamento do linfonodo sentinela deveria diminuir o número de linfadenectomias regionais desnecessárias realizadas, com a associada morbidade. As taxas de linfedema de membros associadas ao mapeamento do linfonodo sentinela caíram para 5%, em comparação aos 35% associados às linfadenectomias completas.69,70 O mapeamento concomitante do linfonodo sentinela é realizado em casos de câncer de mama e melanoma, enquanto a confiabilidade do conceito em casos de câncer de cabeça e pescoço, pulmão e útero ainda está sendo investigada.71-73 Um segundo aspecto importante a ser considerado ao realizar uma linfadenectomia é a extensão da dissecção. Os argumentos que sustentam uma linfadenectomia estendida ou radical são o fato de uma remoção mais ampla estadiar a doença de forma mais acurada e de uma falha em remover estes linfonodos deixar células cancerosas residuais para trás. Por exemplo, as diretrizes para o câncer de cólon recomendam que pelo menos 12 linfonodos sejam avaliados histologicamente, a fim de evitar um estado linfonodal falso-negativo.74 Os argumentos contrários ao uso da linfadenectomia estendida incluem a morbidade aumentada associada à dissecção e a falta de benefício em termos de sobrevida, em comparação ao observado com o uso das dissecções limitadas, em estudos randomizados. Uma discussão abrangente sobre a vigilância no câncer foge ao objetivo deste capítulo, embora alguns pontos mereçam ser mencionados. Apesar da premissa subjacente à vigilância seja a de melhorar o resultado final por meio da detecção antecipada, poucos protocolos demonstram um benefício de sobrevida real. Por exemplo, os pacientes com câncer de cabeça e pescoço e recorrências assintomáticas identificadas por métodos de triagem não apresentam diferenças em termos de sobrevida, quando comparados aos pacientes sintomáticos.75 Também foram levantadas preocupações relacionadas com a possibilidade da reconstrução obscurecer a detecção das recidivas, porém não há dados para sustentar essa hipótese. Os defeitos de maxilectomia reconstruída com retalhos, em oposição aos obturadores, apresentam tempos para recorrência estatisticamente comparáveis.76 De modo similar, para o câncer de mama, nem o implante nem a reconstrução autóloga foram associados a um atraso no estabelecimento do diagnóstico de doença recorrente.77,78 As recorrências subsequentes à reconstrução com retalho miocutâneo transverso do reto abdominal podem ser tratadas com sucesso por meio de uma excisão local e manutenção de retalho, em 80% dos casos. Independentemente do tipo de reconstrução da mama realizada, a doença recorrente é detectável ao exame físico e não por mamografia.

Conclusão Hoje, o tratamento mais comum para tumores sólidos ainda é a excisão cirúrgica. No entanto, o século passado mostrou as vantagens proporcionadas pela terapia multimodal com utilização de quimiorradiação. O estadiamento refinado e o conhecimento ampliado da patobiologia possibilitaram o tratamento individualizado do tumor, com desenvolvimento de regimes terapêuticos alvo-dirigidos. Cabe aos cirurgiões plásticos compreender os princípios do tratamento do câncer, a fim de realizar reconstruções que minimizem as complicações pós-cirúrgicas e, dessa forma, permitam aos pacientes receber terapia adjuvante no momento certo.

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  1. Trimble, E. L., Ungerleider, R. S., Abrams, J. A., et al. Neoadjuvant therapy in cancer treatment. Cancer. 1993; 72(11 Suppl):3515–3524. 3. Improved survival with preoperative radiotherapy in resectable rectal cancer. Swedish Rectal Cancer Trial. N Engl J Med. 1997; 336(14):980–987. Estudo amplo que demonstrou de forma inequívoca os resultados finais melhorados alcançados por pacientes submetidos à radioterapia neoadjuvante para tratamento de câncer do reto. Atualmente, este paradigma está em uso ou sendo explorado em diversos cânceres, como os de cabeça e pescoço e de pulmão. É possível que haja implicações significativas para as opções reconstrutivas.

7. Halsted, W. S. I. The Results of Operations for the Cure of Cancer of the Breast Performed at the Johns Hopkins Hospital from June, 1889, to January, 1894. Ann Surg. 1894; 20(5):497–555. Manuscrito original, demonstrando a crença amplamente sustentada no século XIX, de que uma ampla excisão tumoral, baseada em aspectos anatômicos importantes, proporcionaria maior chance de cura.

9. Fisher, B., Anderson, S., Bryant, J., et al. Twenty-year follow-up of a randomized trial comparing total mastectomy, lumpectomy, and lumpectomy plus irradiation for the treatment of invasive breast cancer. N Engl J Med. 2002; 347(16):1233–1241. Estudo altamente controverso, foi o primeiro a demonstrar que a cirurgia conservadora da mama promove resultados finais similares aos da mastectomia radical modificada. A mastectomia já não é considerada obrigatória e seu uso é reservado para pacientes selecionadas.

24. Nigro, N. D., Vaitkevicius, V. K., Buroker, T., et al. Combined therapy for cancer of the anal canal. Dis Colon Rectum. 1981; 24:73–75. Estudo original, demonstrou o tratamento curativo de um tumor “sólido” usando apenas quimiorradiação, sem cirurgia. O protocolo Nigro hoje poupa muitos pacientes da ressecção abdominoperineal (RAP), altamente mórbida.

27. Baselga, J., Norton, L., Albanell, J., et al. Recombinant humanized anti-HER2 antibody (Herceptin) enhances the antitumor activity of paclitaxel and doxorubicin against HER2/neu overexpressing human breast cancer xenografts. Cancer Res. 1998; 58:2825–2831. 33. O’Brien, S. G., Guilhot, F., Larson, R. A., et al. Imatinib compared with interferon and low-dose cytarabine for newly diagnosed chronic-phase chronic myeloid leukemia. N Engl J Med. 2003; 348:994– 1004. 54. Clark, W. H., Jr., From, L., Bernadino, E. A., et al. The histogenesis and biologic behavior of primary human malignant melanomas of the skin. Cancer Res. 1969; 29:705–727. 56. Breslow, A. Thickness, cross-sectional areas and depth of invasion in the prognosis of cutaneous melanoma. Ann Surg. 1970; 172:902–908. Este estudo demonstrou que a biologia do melanoma é determinada pela espessura da lesão. Até hoje, o estadiamento e o tratamento do melanoma são guiados por uma versão modificada do sistema de Breslow.

65. Morton, D. L., Wen, D. R., Wong, J. H., et al. Technical details of intraoperative lymphatic mapping for early stage melanoma. Arch Surg. 1992; 127:392–399. A biópsia do linfonodo sentinela foi desenvolvida para o estadiamento do melanoma, mas também produziu impacto significativo no tratamento do câncer de mama. Como alternativa à dissecção obrigatória do linfonodo, este procedimento diminui a morbidade do paciente, inclusive o linfedema, e o tempo de internação.

78. Howard, M. A., Polo, K., Pusic, A. L., et al. Breast cancer local recurrence after mastectomy and TRAM flap reconstruction: incidence and treatment options. Plast Reconstr Surg. 2006; 117:1381–1386.

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Células-tronco e medicina regenerativa Benjamin Levi, Derrick C. Wan, Victor W. Wong, Geoffrey C. Gurtner e Michael T. Longaker

Resumo

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A demanda biomédica por reconstrução e regeneração tecidual é significativa atualmente. As células-tronco são os blocos de construção básicos de qualquer estratégia de engenharia ou regeneração tecidual. As células-tronco podem ser derivadas de múltiplas fontes e tecidos que existem em diversos estágios de diferenciação. As células-tronco podem apresentar capacidades distintas in vitro e in vivo, e se encontram em estágios diferentes na pesquisa básica e na pesquisa aplicada: células-tronco embrionárias células-tronco pós-natais e somáticas células-tronco derivadas do tecido adiposo (CTAs) células-tronco mesenquimais (CTMs) células-tronco tecido específicas células pluripotentes induzidas Aplicações clínicas futuras de terapia com células-tronco irão provavelmente requerer abordagens multidisciplinares com emprego de engenharia tecidual e terapias de indução (matrizes biomiméticas, terapia genética, moléculas pequenas, fatores de crescimento).

Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês no site http://www.expertconsult.com

Introdução • As três características que definem uma célula-tronco são: 1. Autorrenovação: as células-tronco são capazes de se expandir e originar uma população clonal de células por meio de divisão, às vezes após longos períodos de senescência. 2. Clonalidade: as células-tronco são capazes de originar novas células-tronco. 3. Diferenciação em vários tipos celulares: as células-tronco podem se diferenciar in vitro e in vivo em múltiplos tipos celulares, e reconstituir um tecido específico após o transplante. • As células-tronco podem ser oriundas de fontes embrionárias ou pós-natais. • As células-tronco embrionárias existem em um estado mais pluripotente do que as células-tronco pós-natais, somáticas e tecido específicos. • A diferenciação das CTMs foi elucidada com o uso de protocolos específicos in vivo e in vitro. • As células-tronco adultas, ou tecido específicas, são células indiferenciadas encontradas em quase todos os tecidos e órgãos após o desenvolvimento embrionário. • As células-tronco pós-natais podem ser reprogramadas em um estado semelhante ao embrionário, sendo

chamadas células pluripotentes induzidas.

Discussão sobre a carga biomédica (Fig. 13.1) À medida que a população global continua a envelhecer e a se expandir, o mesmo processo também ocorre com a incidência das doenças, defeitos e déficits secundários a camada mais numerosa de etiologias congênitas, póscirúrgicas, pós-traumáticas, vasculares e degenerativas (artrite, osteoporose, feridas crônicas, ressecção pósoncológica) que afligem os pacientes. Em 2007, estimava-se que as doenças do sistema musculoesquelético custaram mais de 26 bilhões de dólares aos EUA, um crescimento anual médio de 8,5% (a segunda maior taxa de crescimento de todos os sistemas corporais).1 Com relação às reconstruções oncológicas, a American Society of Plastic Surgery estima que quase 5,2 milhões de procedimentos de reconstrução tenham sido realizados por cirurgiões plásticos em 2009, com mais de 3,9 milhões para a reconstrução oncológica, e mais de 86.000 casos de reconstrução mamária.2

FIG. 13.1 Carga biomédica. Diferentes desafios de reconstrução tecidual enfrentados pelos cirurgiões plásticos. Da esquerda para a direita, as possíveis aplicações da engenharia de tecidos incluem o tratamento de feridas crônicas, ablação pós-câncer, reconstrução da mama, reconstrução craniofacial e lesão traumática.

A reconstrução de tecidos compostos continua sendo um desafio significativo para os cirurgiões plásticos que tratam pacientes que passaram por traumatismos, ressecções oncológicas e anomalias congênitas. As soluções sintéticas, como as próteses, placas e implantes para correção de defeitos de tecido mole, melhoraram bastante as vidas de milhões de pacientes. Entretanto, estes tecidos artificiais pecam pela durabilidade subótima e infecções. Alguns destes desafios foram minimizados pelo uso de enxertos de cadáver e autógenos que, no entanto, também são limitados pela durabilidade, disponibilidade e defeitos do sítio doador. Assim, os cirurgiões plásticos estão limitados pela incapacidade dos implantes e enxertos hoje disponíveis em replicar totalmente a capacidade de um tecido vivo dinâmico de remodelação e regeneração tecidual em resposta aos estímulos ambientais. Em última análise, é preciso que as estratégias de reconstrução passem do simples reparo tecidual à regeneração tecidual. A ideia básica por trás da regeneração tecidual é o uso de um arcabouço biologicamente ativo semeado com um tipo celular pluripotente autorrenovador. A sinergia entre um arcabouço biomimético e um elemento celular competente permitirá a criação de tecidos capazes de responder e se regenerar diante de uma lesão. Estas células, conhecidas como células-tronco, são abundantes desde os embriões até nos idosos (Fig. 13.2).

FIG. 13.2 Diferenciação de células-tronco pluripotentes em diferentes linhagens multipotentes. Uma célula-tronco embrionária é uma célula-tronco pluripotente, enquanto uma célula mesenquimal derivada de tecido adiposo é uma célula-tronco mesodérmica multipotente.

As células-tronco são funcionalmente definidas como uma população clonogênica de células capazes de se autorrenovar, diferenciar em progenitoras comprometidas e, subsequentemente, originar tecidos funcionais diferenciados.3 Tradicionalmente, as células-tronco foram agrupadas em duas categorias com base em sua capacidade de diferenciação. As células-tronco pluripotentes (embrionárias) podem se diferenciar em qualquer tipo celular do corpo, enquanto as células-tronco multipotentes (adultas) são capazes de se diferenciar em múltiplas (mas não em todas) linhagens celulares. Além da classificação tradicional das células-tronco, uma nova classe de células-tronco foi recentemente descrita – as células-tronco pluripotentes induzidas (CTPi) – que derivam de células adultas geneticamente reprogramadas e aparentemente dotadas de potencial de célulastronco embrionárias.

Por que as células-tronco e a medicina regenerativa deveriam ser de interesse para os cirurgiões plásticos? Os cirurgiões plásticos estão na vanguarda clínica do uso das CTAs, uma vez que têm acesso direto a grandes quantidades de tecido adiposo oriundo de lipoaspiração, bem como de procedimentos de contorno corporal. A esperança dos médicos seria um dia levar o paciente à sala cirúrgica e que, em um estágio, fosse usado um arcabouço biomimético pré-fabricado que então seria semeado com células-tronco derivadas de um pequeno volume de lipoaspirado, para tratar um defeito de tecido mole, esquelético, muscular, cartilaginoso, vascular ou articular. Além disso, conforme os cirurgiões ortopedistas realizam mais a cirurgia da coluna e a proteína óssea morfogênica-2 (BMP-2), podemos antever os cirurgiões plásticos auxiliando na lipoaspiração imediata e coleta de CTA aliada a outros fatores de crescimento, como a BMP-2 para regeneração óssea. Estudos recentes mostraram que pode haver diferenças em termos de potencial osteogênico e adipogênico dependendo da região subcutânea a partir da qual as células são coletadas. Isto faz com que os cirurgiões tenham que ajustar a região a partir da qual será feita a coleta de tecido adiposo, para melhor atender às necessidades do paciente.4 As potenciais descobertas no uso de células-tronco e células estromais humanas levaram alguns indivíduos a armazenar seus próprios tecidos, sendo cobrados por esse serviço. O exemplo mais evidente é o crioarmazenamento do sangue de cordão umbilical.5 O processo de congelamento e armazenamento prolongado de células também tem sido usado para CTAs humanas (hCTAs).

Células-tronco embrionárias humanas Definições A pesquisa com hCTEs é uma área que se desenvolveu rapidamente, atraindo atenção crescente ao longo da última década. A capacidade das hCTEs de reproduzir quase qualquer tipo celular encontrado no corpo humano levou a muitas áreas de investigação promissoras que poderiam direcionar a um conhecimento mais

aprofundado acerca da biologia celular e potenciais curas para muitas doenças.37,38 Além disso, a capacidade de reparar e regenerar tecidos lesados por traumatismo pode favorecer o desenvolvimento e a implantação de novos paradigmas terapêuticos empregando as hCTEs para restaurar áreas de dano em órgãos e reverter o que até então era considerado um déficit funcional permanente. Apesar das controvérsias recentes em torno de questões políticas e éticas relacionadas à pesquisa e uso clínico destas células, os estudos com células hCTEs não pararam e esta área de investigação continua sendo bastante promissora. O termo “célula-tronco embrionária” foi cunhado por Gail Martin para distinguir estas células das células previamente descritas do carcinoma embrionário (CE) pluripotente, derivadas de teratocarcinomas.29 Em essência, as CTEs apresentam três características básicas: (1) derivação de um embrião pré ou peri-implantação; (2) capacidade de autorrenovação e proliferação em estado indiferenciado prolongado; e (3) capacidade de formar derivados de todas as três camadas germinativas embrionárias – ou pluripotência – após a cultura por tempo prolongado.39 Como uma extensão do trabalho inicial realizado com camundongos, as hCTEs foram isoladas pela primeira vez em 1998.39 Embriões humanos frescos doados, no estágio de clivagem, produzidos por fertilização in vitro, foram obtidos por Thomson et al. e cultivados até o estágio de blastocisto, alcançado tipicamente em 4-5 dias após a fertilização. A partir da massa celular interna (que ao final origina o embrião), cinco linhagens de hCTRs separadas foram estabelecidas e mantidas em cultura com sucesso por 6 meses, em estado indiferenciado. Todas as cinco linhagens também retiveram a capacidade de formar teratomas após serem inoculadas em camundongos imunodeficientes. O exame histológico destes teratomas mostrou a presença de epitélio intestinal, cartilagem, osso, músculo liso, epitélio neural, gânglios e epitélio estratificado escamoso. Achados similares também foram descritos por Reubinoff et al., que derivaram duas linhagens de hCTEs adicionais e demonstraram nestas células a expressão do fator de transcrição Oct-4, previamente comprovada como sendo essencial à manutenção da capacidade pluripotente de CTEs murinas.40,41 O desenvolvimento das hCTEs gerou entusiasmo em torno do potencial destas células de serem usadas como plataformas para estudo de várias doenças. Os estudos projetados para trazer esclarecimentos sobre a embriogênese humana, desenvolvimento de defeitos congênitos e mecanismos celulares de vários estados patológicos prosseguiram a uma velocidade frenética. Entretanto, uma parte significativa deste agitação científica inicial foi abrandada por vários aspectos relevantes. Teoricamente, a hCTE tem a capacidade de tratar uma variedade de doenças, cânceres, diabetes, condições degenerativas neurológicas e lesões medulares espinais. Seu uso no contexto desta capacidade clínica, porém, levanta a importante questão da doença do enxerto versus hospedeiro associada ao transplante de células-tronco alogênicas. Uma solução oferecida para estes centros de histocompatibilidade é baseada no desenvolvimento de várias linhagens de hCTEs a partir de backgrounds genéticos diversificados, para uso adaptado em pacientes, com o intuito de minimizar o risco de rejeição. Outras estratégias propostas incluem o uso de células-tronco adultas de doador autólogo ou da CTPi, mais recentemente descrita.13,18,42 Ao mesmo tempo em que os trabalhos sobre diminuição da rejeição do hospedeiro ao doador continuam sendo conduzidos, também foram levantadas preocupações relacionadas à contaminação xenogênica. Desde que foram isoladas pela primeira vez, as hCTEs têm sido tradicionalmente cultivadas in vitro na presença de camadas alimentadoras de fibroblastos embriônicos murinos (FEM).39 Na ausência destes, foi comprovado que as hCTEs se diferenciam rapidamente. Um sistema de cultura sem camadas alimentadoras foi apresentado por Xu et al. que empregaram Matrigel® em meio condicionado por FEMs. Contudo, em ambas as técnicas, as hCTEs foram expostas a produtos murinos para manterem sua pluripotência.43 Em 2005, Martin et al. relataram a presença de um ácido siálico não humano (Neu5Gc) na superfície das hCTEs.44 Como os seres humanos são incapazes de gerar este ácido siálico em particular, é provável que o ácido siálico encontrado representasse a captação a partir do meio contendo produtos de origem animal e subsequente incorporação através do processo de glicosilação. Quando estas hCTEs e os corpos embrioides por elas formados foram expostos ao soro humano, observou-se uma rápida ligação de imunoglobulina e deposição de complemento que resultaram em morte celular. Para transpor esta dificuldade, foi necessário criar uma nova linhagem de células-tronco sob condições não murinas. Isto foi alcançado por meio do desenvolvimento de novas placas revestidas com matriz extracelular a partir dos FEMs e esterilização antes do uso.45 Quando as hCTEs foram cultivadas usando estas placas, observou-se uma proliferação indiferenciada por seis meses e as células mantiveram a capacidade de formar as três camadas germinativas embrionárias. Este sistema, então, eliminou a exposição das hCTEs à potencial contaminação a partir do soro e/ou células alimentadoras vivas, além de ter minimizado o risco de transmissão

de doença através do contato das células com agentes patogênicos animais ou humanos.

Conceitos atuais e pesquisa As pesquisas científicas feitas com hCTEs começaram a revelar o potencial destas células de renovar drasticamente o nosso conhecimento contemporâneo e o tratamento de doenças (Fig. 13.3). As tecnologias que podem ser derivadas da pesquisa com células-tronco poderão ser usadas algum dia para tratar lesões medulares espinais, condições degenerativas neurológicas e várias doenças genéticas. Embora o tratamento do traumatismo de medula espinal e da doença de Parkinson recentemente tenha sido alvo de um perfil mais elevado de atenção, os investigadores de células-tronco também promoveram avanços significativos no campo da pesquisa sobre diabetes, bem como nas áreas de pesquisa cardíaca e hematopoiética/vascular.

FIG. 13.3 Uso de células-tronco embrionárias. As células-tronco embrionárias podem ser usadas no estudo de alterações genéticas, triagem de fármacos e delineamento de novas terapias.

A capacidade das CTEs de sofrerem diferenciação neuronal foi demonstrada pela primeira vez por Bain et al., em 1995.46 A exposição de CTEs murinas ao ácido retinoico resultou na observação de múltiplos fenótipos celulares, dos quais um amplo percentual deu origem a protuberâncias semelhantes a neurônios. A análise de expressão genética destas células revelou a existência de vários transcritos com associação neural, incluindo neurofilamentos, subunidades do receptor de glutamato e fatores de transcrição neuro-específicos. Além disso, estudos fisiológicos revelaram que estas células semelhantes a neurônios poderiam gerar potenciais de ação. Em paralelo a estes experimentos, Schuldiner et al. induziram diferenciação neuronal a partir de hCTEs empregando ácido retinoico e fator de crescimento neuronal (NGF).47 Foi constatado que estes progenitores neurais eram capazes de se diferenciar in vitro em astrócitos, oligodendrócitos e neurônios maduros.40,48 Quando estas células neuronais derivadas de hCTEs foram transplantadas nos ventrículos cerebrais de camundongos recém-nascidos, foi possível vê-las sendo amplamente distribuídas por todo o cérebro e integrando-se em uma região específica. Estes achados, portanto, mostram o potencial de desenvolvimento das hCTEs e sua capacidade de responder in vivo aos estímulos ambientais locais para se diferenciarem nas linhagens neurais apropriadas. Enquanto preliminares, estes achados trazem esperança para o uso do hCTE no tratamento futuro das doenças neurológicas. De modo semelhante à pesquisa com células-tronco neurais, as hCTEs pluripotentes se mostraram

igualmente promissoras na área da pesquisa sobre diabetes. No momento, a única terapia considerada potencialmente curativa para o diabetes de tipo 1 é a substituição das células das ilhotas pancreáticas.49 Infelizmente, a escassez de doadores tem sido um forte obstáculo para que esta modalidade se torne uma solução terapêutica prática. Além disso, o risco de potencial transmissão de doença e rejeição celular ainda é significativo. A descoberta das células secretoras de insulina sensíveis à glicose derivadas de CTEs murinas, todavia, introduziu uma nova fonte de células em potencial para o tratamento do diabetes de tipo 1.49 O cultivo de hCTEs em suspensão permitindo a formação de corpos embrioides também resultou na detecção de células produtoras de insulina após 14 dias de diferenciação.50 À imuno-histoquímica, 1%-3% de todas as células, apresentaram coloração positiva para insulina e foram observadas dispersas em meio à população mista de células em diferenciação espontânea. Estudos mais recentes trouxeram dúvidas quanto à frequência destas células, estimando, porém, uma incidência real inferior a 1:100.000 células.51 Trabalhos subsequentes são necessários, mas mesmo assim, estes estudos demonstram o potencial de desenvolvimento de células com capacidade funcional de ilhotas-β e de liberação de insulina. Este tipo de subgrupo de células derivadas de hCTEs teoricamente poderia ser explorado como fonte de substituição celular para tratamento de pacientes com diabetes de tipo 1. O estudo do desenvolvimento do tecido cardíaco sempre foi prejudicado pela desvantagem da falta de um modelo in vitro conveniente. O advento da pesquisa com hCTEs, todavia, também ofereceu uma forma em potencial de avançar neste campo. Kehat et al. foram os primeiros a observar a existência de áreas em contração espontânea junto a hCTEs cultivadas em suspensão e, então, plaqueadas para formar corpos embrioides.52 As células oriundas destas regiões, que representavam cerca de 8% da área total, apresentaram coloração positiva para uma variedade de marcadores cardíacos, entre os quais miosina, desmina, troponina I e fator atrial natriurético. Além disso, nessas células contráteis foram observados efeitos cronotróficos tanto positivos como negativos após a aplicação de isoproterenol ou carbamilcolina, respectivamente. A diferenciação das hCTEs nestas células também pode ser intensificada pela aplicação de 5-aza-2’-desoxicitidina e purificada por centrifugação em gradiente de densidade para obtenção de uma população de células contendo 70% de progenitores de cardiomiócitos.53 Em 2003, Mummery et al. demonstraram pela primeira vez a diferenciação da hCTE em cardiomiócitos empregando técnicas de cocultura com células do tipo endoderma visceral.54 Esta abordagem minimizou a necessidade de cardiogênese espontânea e produziu efetivamente agregados sólidos de células pulsantes constituídos por 10-200 cardiomiócitos. Curiosamente, estas colônias também poderiam ser congeladas, tendo a pulsação retomada após o descongelamento. Tomados em conjunto, estes achados argumentam fortemente a favor do desenvolvimento contínuo das hCTEs como modelo para pesquisa cardíaca. Sua capacidade de diferenciação em cardiomiócitos e a potencial capacidade natural de enriquecimento para estas células levarão ao futuro desenvolvimento de aplicações clínicas no contexto das doenças cardíacas. Aliado ao trabalho sobre diferenciação cardíaca, pesquisadores também descobriram a capacidade das hCTEs de formarem células endoteliais vasculares. As células endoteliais são essenciais ao reparo e regeneração tecidual, e o potencial das células vasculares derivadas de hCTE de participarem do tratamento de doenças vasculares é promissor.55 Zambidis et al. foram os primeiros a descrever a presença de colônias de aglomerados mesoderma-hematoendoteliais junto aos corpos embrioides em 6-9 dias.56 Constatou-se que estas colônias eram constituídas por células não aderentes expressando CD45 que originavam linhagens celulares hematopoiéticas, bem como por células aderentes que expressavam CD31 e marcadores característicos do endotélio vascular. O isolamento destas células endoteliais derivadas de hCTE foi realizado por citometria de fluxo com anticorpos anti-CD31.57 Estas células então puderam ser expandidas em cultura e, ao serem inoculadas em camundongos imunocomprometidos, demonstraram formar redes microvasculares. Embora sua estabilidade a longo prazo seja desconhecida, estas células representam o primeiro passo na direção do potencial tratamento das doenças vasculares e estimulação do crescimento de tecido isquêmico com o uso de hCTEs. Elas também fornecem a base para estudos futuros sobre os mecanismos biomoleculares envolvidos na formação de vasos sanguíneos.

Correlações clínicas O uso clínico das hCTEs ainda está nos primórdios e há vários obstáculos no caminho. Entre os obstáculos a serem vencidos, estão o risco de tumorigenicidade, a imunocompatibilidade e o isolamento dos tipos celulares desejados para fins terapêuticos. Mesmo assim, continua-se trabalhando naquilo que pode ser a aplicação mais

promissora das hCTEs e isto seria na área da neurorregeneração. Os estudos preliminares realizados com o modelo murino mostraram-se promissores e conduziram à primeira triagem clínica aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) a incorporar as hCTEs no tratamento clínico. A capacidade de regeneração do sistema nervoso central é limitada, tornando atraente o potencial de reparo e recuperação funcional por meio da terapia com hCTE. Após o traumatismo, as lesões ao encéfalo e medula espinal podem resultar na desmielinização secundária à morte de oligodendrócitos locais.58 Embora alguns axônios possam ser poupados, a propagação do potencial de ação pode ser afetada, com consequente perda irreversível da função motora. A capacidade das hCTEs de se diferenciarem em oligodendrócitos, todavia, traz certo otimismo em relação à recuperação clínica. Como prova deste conceito, Keirstead et al. avaliaram a capacidade das hCTEs de incorporar, remielinizar e restaurar a locomoção após a lesão da medula espinal de ratos.59 As lesões por contusão da medula espinal foram induzidas em ratos Sprague- Dawley no nível de T10, usando um gerador de força controlado e reproduzível, com capacidade de produzir o impacto súbito desejado. Os oligodendrócitos derivados das hCTEs foram purificados e aplicados acima e abaixo do local da contusão, decorridos 7 dias da lesão, por inoculação direta na medula espinal. A análise histológica realizada após 8 semanas revelou uma densidade significativamente maior de axônios remielinizados, em comparação ao observado nos animais-controle. A constatação mais importante, porém, foi a de que os animais tratados com oligodendrócitos derivados de hCTE alcançaram escores de função locomotora significativamente mais altos, com melhora progressiva por até 1 mês após a produção da lesão inicial. Estes achados, portanto, revelam que o transplante de hCTEs diferenciadas em oligodendrócitos pode ser uma forma efetiva de tratar as lesões medulares espinais agudas. Notavelmente, nenhum teratoma foi observado neste estudo, sugerindo que a prédiferenciação das hCTEs antes do uso clínico pode evidenciar as preocupações relacionadas a esta potencial complicação.60 Depois da obtenção destes dados promissores relacionados com a recuperação funcional em ratos, a empresa de biotecnologia Geron entrou com uma petição para conseguir a aprovação da FDA para a realização de estudos com seres humanos, nos quais as hCTEs seriam usadas de maneira semelhante para tratar pacientes com lesões na medula espinal. Os estudos de fase I para este trabalho receberam apoio financeiro em janeiro de 2009, permitindo que 8-10 pacientes com lesões medulares espinais graves fossem tratados com oligodendrócitos derivados de hCTE. Entretanto, este estudo foi interrompido pela FDA devido à pendência de revisão adicional de dados pré-clínicos. Embora ainda esteja para ser demonstrado se os achados descritos em ratos podem ser clinicamente replicados, este representa o primeiro passo rumo às futuras terapias translacionais projetadas para incorporar estas células ao tratamento da doença humana. Embora uma restauração funcional completa subsequente à paralisia atualmente não seja esperada, há esperanças de que os pacientes com lesões menos graves um dia possam ser beneficiados pelo uso das hCTEs.61

Células-tronco pós-natais e somáticas Células estromais derivadas do tecido adiposo Definições e coleta O tecido adiposo contém uma população estromal que consiste em células endoteliais microvasculares, células musculares lisas e células multipotentes. As CTAs exibem a capacidade de se diferenciar em adipócitos, osteoblastos e condroblastos in vitro.16,18,19,62,63 Entretanto, a origem das hCTAs ainda não está claramente definida. Vários laboratórios admitiram a hipótese de estas células representarem pericitos circundando os vasos sanguíneos, o que poderia explicar sua capacidade de diferenciação em células endoteliais. Outros suspeitam que estas células constituem uma subpopulação de fibroblastos residindo junto ao tecido adiposo (Fig. 13.4).

FIG. 13.4 Origem desconhecida da célula estromal derivada de tecido adiposo humano. As células-tronco derivadas do tecido adiposo são consideradas derivadas dos adipócitos ou fibroblastos, ou ainda das células murais perivasculares conhecidas como pericitos. CTA, célula estromal derivada de tecido adiposo.

As CTAs, assim como as células-tronco oriundas da medula óssea, apresentam um extensivo potencial proliferativo e são capazes não só de autorrenovação, como de diferenciação osteogênica, condrogênica, miogênica e adipogênica. Esta população também pode ser definida por seus marcadores de superfície celular, sendo comprovadamente positivas para CD105, STRO-1, CD29, CD144 e CD166, e negativas para CD3, CD4, CD11c, CD14, CD15, CD16, CD19, CD31, CD33, CD38, CD56, CD62p, CD104 e CD144.24,25

Coleta de CTAs A coleta de CTAs humanas pode ser feita no lipoaspirado ou tecido adiposo humano ressecado (Fig. 13.5). O benefício associado ao uso de lipoaspirado está na eliminação da etapa de picar o tecido adiposo. Além disso, foi demonstrado que, mesmo após a lipoaspiração assistida por ultrassom, as CTAs retêm a capacidade de diferenciação osteogênica.64 Quando o tecido adiposo é coletado de múltiplos sítios anatômicos, as amostras obtidas devem ser guardadas separadamente e identificadas, uma vez que depósitos subcutâneos distintos são diferentes quanto à capacidade de diferenciação (Fig. 13.6).4 Após a lipoaspiração, o tecido adiposo deve ser processado o quanto antes, sob condições ambientais de cultura celular estéril (Fig. 13.7). As amostras de tecido adiposo devem ser primeiro lavadas em Betadine® diluído e, em seguida, lavadas duas vezes em tampão fosfato (PBS) com volumes iguais ao de cada amostra de lipoaspiração. Os tecidos assim lavados devem ser subsequentemente digeridos com um volume igual de solução salina de Hank balanceada contendo 0,075% (p/v) de colagenase tipo II, a 37°C, em banho-maria com agitação (140 rpm), durante 60 minutos. A cada 15 minutos, durante a digestão, o tecido adiposo deve ser agitado e arejado. Em seguida, o produto da digestão pela colagenase deve ser inativado com a adição de um volume igual de PBS contendo 10% de soro fetal bovino (SFB) e 1% de penicilina/estreptomicina. A fração vascular estromal é precipitada por centrifugação a 1.000 rpm, por 6 minutos. O sobrenadante é descartado e o precipitado celular é ressuspendido e filtrado através de um filtro celular de 100 µm, para remoção dos fragmentos teciduais não digeridos. As células são precipitadas e ressuspendidas em meio de crescimento, e uma cultura primária é estabelecida em placas de cultura de tecidos incubadas a 37°C, em atmosfera contendo 5% de CO2. A contagem de células pode ser uma tarefa difícil, dado o grande número de eritrócitos presentes no precipitado celular final. Entretanto, nós não recomendamos proceder à etapa de lise de hemácias, pois acreditamos que isto diminui a viabilidade das CTAs. Em média, 10 mL de tecido adiposo inicial permitem a coleta de 1 milhão de hCTAs.

FIG. 13.5 Lipoaspiração humana da coxa. CTA, células estromais derivadas de tecido adiposo.

FIG. 13.6 Diferentes localizações a partir das quais o tecido adiposo de lipoaspiração pode ser coletado. Foi demonstrado que estes locais apresentam potenciais osteogênicos e adipogênicos diferentes.

FIG. 13.7 Visão geral do processo de coleta de célula estromal derivada de tecido adiposo. O aspirado do lipoaspiração (esquerda) é digerido, centrifugado em seguida para precipitação da fração estromal vascular (meio) e então plaqueado em placas de 10 cm para expansão (direita). SFB, soro fetal bovino; PBS, tampão fosfato; PCN, penicilina.

A coleta de CTA murina (mCTA) é feita de modo semelhante. A primeira etapa consiste na coleta do coxim adiposo inguinal, bilateralmente, de pelo menos quatro camundongos. Neste etapa, é imperativo picar bem o tecido adiposo antes de seguir para a etapa de digestão. Subsequentemente, as etapas são as mesmas descritas para as hCTAs, com uma etapa de digestão seguida de neutralização, centrifugação, filtração e plaqueamento.

Conceitos atuais e pesquisa Diferença entre CTAs murinas e humanas O estudo das mCTAs é interessante por causa da relativa facilidade na coleta das células e pela disponibilidade de camundongos de laboratório. Em adição, o uso amplamente disseminado de camundongos knockout geneticamente modificados promove meios de pesquisa úteis em potencial. Contudo, há diferenças importantes entre as CTAs de origem murina e humana que ainda não foram totalmente investigadas. Exemplificando, foi constatado que as hCTAs apresentam uma capacidade osteogênica in vitro significativamente mais robusta do que as mCTAs.65,66 Para sofrerem uma osteogênese significativa in vitro, as mCTAs requerem estímulos osteogênicos adicionais, como o ácido retinoico.67 Além disso, citocinas como o fator de crescimento de fibroblastos (FGF)-2 abolem a diferenciação osteogênica nas mCTAs, enquanto a diferenciação osteogênica das hCTAs ocorre relativamente sem inibição na presença ou ausência de FGF-2.66,68 Em nosso laboratório, observamos que as CTAs, sejam derivadas de camundongos ou de origem humana, contribuem para a cicatrização óssea dos defeitos cranianos murinos.69,70 Exemplificando, um defeito de calota craniana murina de tamanho significativo não apresenta cicatrização na ausência do enxerto de CTA nem mesmo em até 16 semanas após a aquisição da lesão. No entanto, quando o enxerto de hCTA é realizado, uma significativa cicatrização óssea é observada já em 4 semanas após a aquisição da lesão.70

Enriquecimento baseado em receptores de superfície celular Apesar dos avanços substanciais alcançados no estudo das CTAs, ainda somos limitados pela necessidade de trabalhar com uma população celular heterogênea. Acreditamos que uma subpopulação celular selecionada (ou clonal) enriquecida com base em seus marcadores de superfície celular se faz necessária para impulsionar nossas pesquisas adiante (Fig. 13.8). Fazendo a otimização e seleção para uma subpopulação enriquecida de CTAs com capacidade de diferenciação robusta ao longo de uma linhagem osteogênica, podemos maximizar os resultados alcançados com as terapias celulares de regeneração esquelética. Emprestando uma abordagem usada para isolar células-tronco hematopoiéticas (CTHs), é possível enriquecer as CTAs com base em seus marcadores de superfície celular usando seleção celular ativada por fluorescência. A heterogeneidade persiste até mesmo junto a um subgrupo específico de CTAs selecionadas por meio de um receptor de superfície celular. Apesar de as populações de células-tronco serem comprovadamente heterogêneas, as consequências funcionais desta heterogeneidade não foram totalmente esclarecidas. O problema da heterogeneidade indefinida junto às células-tronco deve ser elucidado antes que elas possam ser usadas de maneira efetiva para aplicação terapêutica. A primeira etapa para compreender esta heterogeneidade é elucidar os perfis de expressão genética destas células complexas, o que pode ser feito empregando a tecnologia de célula única microfluida (Fig. 13.9). Isto permite a mistura precisa de quantidades da ordem de nanolitros de reagentes de

PCR quantitativa para realização da análise de transcrição de células individuais.

FIG. 13.8 A seleção celular ativada por fluorescência (FACS) pode ser empregada para separar as células com base nos receptores de superfície. A meta seria usar estes receptores de superfície para identificar as células mais propensas a se diferenciar em uma linhagem específica. Aqui, a FACS é usada em uma população de células estromais derivadas de tecido adiposo (CTAs), para isolar uma população de progenitores ósseos.

FIG. 13.9 A seleção celular ativada por fluorescência (FACS) pode ser usada para isolar células no nível unicelular. Subsequentemente, as células estromais derivadas de tecido adiposo humanas podem ser estudadas no nível de célula única, para delinear ainda mais as propriedades transcricionais de cada célula. PCR, reação em cadeia da polimerase.

Métodos de distribuição de CTAs Apesar do número crescente de estudos realizados com animais e de relatos de caso intrigantes, o modo ideal de distribuição das CTAs continua em grande parte desconhecido. Um número significativo e crescente de estudos examinaram a administração das CTAs por via intravenosa (IV). Estes estudos investigaram a distribuição natural das CTAs após a injeção por via IV. Notavelmente, a maioria dos órgãos apresenta captação de CTAs após a administração, inclusive os ossos e tecidos medulares ósseos, e pelo menos alguns estudos demonstram a persistência prolongada das células junto ao hospedeiro sem transformação oncogênica.71-73 Embora estes estudos tenham sido conduzidos em torno de interesses diversos, todos foram fundamentados nas capacidades regenerativas das CTAs. Exemplificando, os estudos investigaram a injeção IV das CTAs para fins de reparo hepático,72 cardíaco,74 endotelial75 e até mesmo do epitélio olfativo.76 Ainda, tem havido um interesse emergente na administração IV de CTAs para tratamento de distúrbios autoimunes e inflamatórios, como a colite experimental e a sepse abdominal,77-79 distrofia muscular,80 artrite experimental78 e encefalomielite.81 Também foram publicados dois estudos de caso provocantes envolvendo seres humanos, que demonstraram resultados benéficos da administração IV das CTAs: o primeiro na artrite reumatoide e o segundo na trombocitopenia autoimune crônica.82,83 Desta forma, é possível que o uso das CTAs IV venha a ser uma modalidade terapêutica segura e benéfica.

In vitro: protocolos de diferenciação Diferenciação osteogênica (Fig. 13.10) Para a diferenciação osteogênica, as células devem ser plaqueadas numa placa de cultura de seis poços, a uma densidade de 100.000 células/poço; em placa de cultura de 12 poços, a uma densidade de 50.000 células/poço; ou em uma placa de cultura de 24 poços, a uma densidade de 25.000 células/poço. Após a adesão, as CTAs são tratadas com meio de diferenciação osteogênica (MDO) contendo meio Eagle de Dulbecco modificado (DMEM) contendo 10% de SFB, 100 µg de ácido ascórbico/mL, 10 mM de β-glicerofosfato e 100 UI de penicilinaestreptomicina/mL. Para estimular o aumento da osteogênese, é possível enriquecer este meio de diferenciação suplementando-o com várias citocinas, incluindo o fator de crescimento similar à insulina, fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) ou BMP-2.84,85 O MDO deve ser substituído a cada 3 dias.

FIG. 13.10 Potenciais usos clínicos do tecido adiposo obtido por lipoaspiração. As células estromais derivadas de tecido adiposo (CTAs) são coletadas por lipoaspiração (esquerda), cultivadas in vitro em meio de diferenciação óssea (meio) e, subsequentemente, usadas em procedimentos de reconstrução para tratar uma miríade de doenças (direita).

A diferenciação osteogênica inicial e tardia foi definida em diferentes momentos que, por sua vez, diferem entre as espécies. Enquanto as mCTAs entram na fase inicial da osteogênese no dia 7 e na fase tardia da osteogênese em torno do dia 14, as hCTAs passam por uma osteogênese bem mais robusta e devem ser analisadas no dia 3 quanto à osteogênese inicial e no dia 7 para diferenciação tardia. Para avaliar a diferenciação osteogênica, é possível analisar o RNA das CTAs. Entre os marcadores genéticos específicos da diferenciação osteogênica, estão a osteocalcina (OCN), proteína runt-associada-2 (RUNX-2), colágeno Ia (COL1A) e fosfatase alcalina (ALP). A coloração e quantificação da ALP também podem ser realizadas no dia 3 de diferenciação para avaliar a atividade osteogênica inicial (Fig. 13.11). Subsequentemente, a atividade osteogênica tardia pode ser avaliada no dia 7 de diferenciação através da coloração de alizarina, que detecta a mineralização extracelular.

FIG. 13.11 Genes envolvidos na diferenciação de uma célula progenitora óssea em osteoblasto. A diferenciação da linhagem específica está associada à sequência ordenada de expressão de vários genes. A diferenciação em osteoblasto está associada à expressão da proteína runt-relacionada-2 (Runx2), osteopontina (OPN) e osteoclacina (OCN), correspondentes à osteogênese inicial, intermediária e tardia.

Diferenciação adipogênica (Fig. 13.12) Para direcionar as CTAs para o tecido adiposo, as células são semeadas em densidade semelhante à descrita para a diferenciação osteogênica. O meio de diferenciação adipogênica contém 10 µg de insulina/mL, 1 µM de dexametasona, 0,5 mM de metilxantina e 200 µM de indometacina. No dia 3, é necessário substituir o meio com 10 µg de insulina/mL. A diferenciação pode ser avaliada por coloração com oil red O e quantificação ou análise genética. Os genes específicos expressos pelo tecido adiposo durante a diferenciação que podem ser analisados incluem GCP1, lipoproteína lipase (LPL) e receptor γ ativado por proliferador de peroxissoma (PPAR-γ) (Fig. 13.13).

FIG. 13.12 Potenciais usos clínicos da diferenciação em adipócitos das células estromais derivadas de tecido adiposo (CTAs) humanas. As CTAs são coletadas por lipoaspiração (esquerda), cultivadas in vitro em meio de diferenciação em adipócito (meio) e, subsequentemente, empregadas em procedimentos de reconstrução para tratar defeitos de tecido mole (direita).

FIG. 13.13 A diferenciação em adipócito está associada à expressão de lipoproteína lipase (LPL), receptor γ ativado por proliferador de peroxissoma (PPAR-γ) e proteínas de ligação intensificadoras (EbP).

Diferenciação condrogênica Como é difícil realizar a diferenciação condrogênica em monocamada, este tipo de diferenciação envolve o uso de gotículas celulares de micromassa. Cada 10 mL de gotículas contêm 100.000 células que, então, são semeadas em placas de cultura para formarem agregados celulares e substrato, a 37°C, por 2 horas. O meio condrogênico inclui DMEM, 1% de SFB, 1% de penicilina-estreptomicina, 37,5 mg de ascorbato-2-fosfato/mL, pré-mistura ITL (insulina, transferrina humana e ácido selenoso) e 10 ng de fator transformador do crescimento β1 (TGF-β)/mL. Este meio é cuidadosamente adicionado ao redor dos agregados celulares. Após cerca de 24 horas, os agregados devem coalescer e se tornar esféricos. As micromassas são fixadas em 4% de paraformaldeído/4% de sucrose e incorporadas nos dias 3 e 6 para realização de análise histológica. A adição do corante azul de alcião permite a coloração dos tecidos condrogênicos, enquanto os ensaios de glicosaminoglicana possibilitam quantificar a condrogênese. Um exame genético subsequente pode ser realizado empregando análise de gene condrogênico, como SOX-9, agrecana e colágeno II.

Modelo in vivo Defeito de calota craniana de 4 mm em camundongo nude atímico Para traduzir os achados dos experimentos in vitro em realidade clínica, é necessário obter dados robustos de experimentos in vivo que demonstrem a capacidade osteogênica das CTAs. Os modelos in vivo devem incluir animais de grande porte imunocompetentes, como ovelhas86 e cães,87,88 além de animais de pequeno porte imunocomprometidos, como coelhos,89 ratos90 ou camundongos.28 Embora existam vários modelos experimentais para determinação da cicatrização osteogênica in vivo, nós acreditamos que o modelo do camundongo nude proporciona um defeito confiável, facilmente reproduzível e de seguimento simples. Os animais imunocomprometidos, como o camundongo nude atímico, permitem aos cientistas avaliar o efeito das CTAs sobre uma área e, ao mesmo tempo, diminuir a resposta imune inata contra as células xenotransplantadas, que poderia confundir os resultados. Os camundongos são prontamente disponíveis em amplas quantidades e podem ser estudados usando a maioria das tecnologias de imagem de pequenos animais, como a tomografia microcomputadorizada (micro-TC), tomografia por emissão de micropósitrons (micro-PET) e imagem de bioluminescência. Contudo, as feridas murinas cicatrizam rápido e efetivamente, de modo que os cientistas precisam demonstrar que qualquer resultado obtido é superior à capacidade de cicatrização basal do animal. Uma forma de demonstrar um efeito consiste em criar um defeito grande o bastante para ultrapassar a capacidade inata de cicatrização da ferida. Este defeito amplo, que não cicatriza no decorrer do seguimento, é referido como “defeito de tamanho crítico”. Um defeito deste tipo que tem utilidade comprovada como modelo in vivo tem 4 mm de extensão e é produzido no osso parietal de um camundongo nude atímico.69

Os defeitos de calota craniana de tamanho crítico (4 mm), que não cicatrizam, podem ser criados no osso parietal direito de camundongos nude CD-1 machos adultos (60 dias de idade), com auxílio de uma serra odontológica de alta velocidade. Após limpar o sítio cirúrgico com Betadine®, é feita uma incisão fora da linha média sagital para expor o osso parietal direito. O pericrânio será então removido com auxílio de um cotonete de algodão estéril. Usando broca de trefina revestida de diamante e irrigação com solução salina, são produzidos defeitos de tamanho crítico e espessura integral na calota craniana, junto ao osso parietal direito não sutura associado. É importante ressaltar que a dura-máter deve permanecer intacta (Fig. 13.14). Na preparação para o implante, arcabouços podem ser semeados com hCTAs 24 horas antes da implantação. Para a criação do arcabouço, foram fabricados suportes de PLGA revestidos com apatita, a partir de 85/15 poli(ácido láctico-coglicólico), por modelagem com solvente e através de um processo de lixiviação particulada. Em resumo, soluções de PLGA/clorofórmio foram misturadas a partículas de sucrose de 200-300 µm de diâmetro, para obter uma porosidade de 92% (fração do volume), e comprimidas em lâminas delgadas em um molde de Teflon®. Após a secagem-congelamento de um dia para outro, os arcabouços foram imersos em ddH2O para dissolução da sucrose, e cuidadosamente removidos da placa de Teflon® para desinfecção e secagem.

FIG. 13.14 Um defeito de tamanho crítico não cicatrizável, de 4 mm, localizado no osso parietal direito de um camundongo nude atímico CD-1.

Para o revestimento de apatita, foi preparada uma solução simuladora de líquido corporal (SFB) através da dissolução sequencial de CaCl2, MgCl2·6H2O, NaHCO3 e K2HPO4·3H2O em ddH2O. O pH da solução foi diminuído para 6 com a adição de ácido hidroclorídrico a 1 M, para aumentar a solubilidade. Na2SO4, KCl e NaCl foram adicionados e o pH final foi ajustado para 6,5 (SFB 1). Uma solução de SFB livre de Mg2+ e HCO3– (SFB 2) foi preparada pela adição de CaCl2 e K2HPO4·3H2O em ddH2O, com o pH sendo reduzido para 6. KCl e NaCl foram adicionados e o pH final foi ajustado para 6,8. Todas as soluções foram esterilizadas por filtração em membrana de polietersulfona (PES) de 0,22 µm (Nalgene, NY). Os arcabouços de PLGA obtidos foram incubados em SFB 1 por 12 horas. Em seguida, esta solução foi trocada por SFB 2 livre de Mg2+ e HCO3– e os arcabouços foram incubados por mais 12 horas, a 37°C, sob agitação leve. Os arcabouços revestidos foram lavados com ddH2O para remoção do excesso de íons e, então, liofilizados antes da realização de novos estudos. Constatamos que a concentração de 150.000 células/arcabouço era ideal para nossas condições de laboratório.70 As hCTAs a serem semeadas em cada arcabouço são suspensas em 25 µL de meio de crescimento

e deixadas no arcabouço por 30 minutos. Subsequentemente, o arcabouço será imerso em 100 µL de meio de crescimento por 12 horas de incubação. Antes da implantação, os arcabouços semeados com células devem ser enxaguados em PBS estéril, para prevenir a transferência de fatores de crescimento derivados do meio.

Correlações clínicas Estudos de caso recentes enfocaram o uso de hCTAs para reposição de perda óssea.91 Nos relatos de caso, os defeitos da calota craniana,92 maxila93 e mandíbula94 foram curados ou tiveram a cura acelerada pelo uso das hCTAs. Estas reconstruções eliminam a necessidade de usar materiais aloplásticos e, desta forma, diminuem o risco de infecção, quebras ou rejeição. Apesar da crescente pesquisa translacional, observa-se uma escassez de dados que definam os mecanismos pelos quais as hCTAs influenciam um defeito ósseo. As hCTAs formam osso diretamente para cicatrizar um defeito esquelético? Ao contrário, as hCTAs enxertadas atuam como “fábricas” eficientes de produção de citocinas pró-osteogênicas? No caso do modelo do defeito de calota craniana, o exame minucioso dos defeitos de calota craniana enxertados com CTAs fornece algumas hipóteses proveitosas acerca da potencial derivação da cicatrização. Exemplificando, observa-se frequentemente que o osso mineraliza a partir das bordas de um defeito craniano para a parte interna. Isto sugere que a calota craniana do hospedeiro pode contribuir para a regeneração óssea. Ao mesmo tempo, pequenas ilhas ósseas isoladas muitas vezes são observadas logo no início do pós-operatório. Isto, por sua vez, é sugestivo da contribuição das CTAs enxertadas ou, alternativamente, da dura-máter do hospedeiro (outra fonte de progenitores osteogênicos significativos).95-97 Enfim, a cicatrização uniforme e completa do defeito enxertado com hCTA sugere a cicatrização óssea primária derivada das próprias células doadas enxertadas. É provável que todos os três tipos celulares (CTAs doadas, osteoblastos da calota craniana do hospedeiro e dura-máter do hospedeiro) contribuam para a cicatrização óssea.

Perspectivas futuras da engenharia tecidual com uso de CTAs Existe uma lacuna considerável entre o atual conhecimento da biologia da CTA e sua futura translação para uso clínico. Primeiramente, é necessário determinar a segurança das hCTAs. A transformação oncogênica deve ser inibida, de modo que não haja produção de tumores de origem mesodérmica após o enxerto bem-sucedido da célula.73 Nós acreditamos que avanços significativos na cirurgia estética e reconstrutiva usando tecido autólogo não serão alcançados com melhorias em aspectos técnicos, como cânulas de lipoaspiração ou seringas de injeção. Em vez disso, é necessário explorar novas estratégias baseadas na utilização de células, para identificar e isolar precursores adiposos específicos a partir das hCTAs, bem como coordenar a indução fisiológica da diferenciação do tecido adiposo em um ambiente biomimético in vivo (Fig. 13.15). As construções de biomaterial semeadas com hCTAs podem trazer um novo direcionamento para a transferência de tecido adiposo autólogo por meio da montagem tridimensional natural dos tecidos adiposo, cartilaginoso ou ósseo.98 Nossa meta translacional final é, durante o curso de um único procedimento operatório, coletar tecido adiposo cutâneo, isolar CTA e implantar estas células em um arcabouço osteocondutor e/ou osteoinduzido, dentro do defeito esquelético, sem sair da sala cirúrgica (Fig. 13.16).

FIG. 13.15 Uso de células estromais derivadas de tecido adiposo (CTAs) para curar um defeito esquelético. (A-C) Imagens de tomografia microcomputadorizada de um defeito ósseo parietal murino de tamanho crítico, medindo 4 mm, em nosso camundongo P60 nude CD-1. (A) Na ausência de uma armação ou de CTAs, este defeito não é curado em duas semanas. (B) Apenas o arcabouço. As feridas tratadas apenas com arcabouço também apresentam cicatrização mínima. (C) Arcabouço com CTAs. Uma remineralização significativa é observada em apenas duas semanas após a aquisição da lesão, nas feridas tratadas com arcabouços semeados com CTAs.

FIG. 13.16 Objetivo translacional clínico final: levar o paciente à sala cirúrgica e coletar uma população celular multipotente e com capacidade de autorrenovação, como as células estromais derivadas de tecido adiposo (CTAs) humanas, e então transferi-las para um arcabouço para reconstruir um defeito tecidual. FGF-2, fator de crescimento do fibroblasto-2; BMP-2, proteína morfogenética óssea-2.

Células-tronco mesenquimais de medula óssea Definições As CTMs da medula óssea são células multipotentes que comprovadamente se diferenciam em vários tipos celulares, tais como adipócitos, condrócitos, osteócitos, miócitos esqueléticos e cardiomiócitos. Após sua identificação original, como células oriundas da medula óssea capazes de aderir ao plástico, numerosos estudos comprovaram sua plasticidade, propriedades imunomodulatórias e potencial para uso em estratégias de engenharia tecidual. Foi constatado que as CTMs são recrutadas para locais de lesão, onde podem participar do sistema de reparo natural do próprio corpo. Estes achados destacam o enorme potencial das CTMs para a utilização clínica e, recentemente, foram iniciados ensaios terapêuticos para uma gama cada vez maior de distúrbios médicos. Embora ainda haja alguma discussão acerca dos efeitos reais que as CTMs podem exercer em vários estados patológicos, as perspectivas para o uso destas células como terapia biológica “de disponibilidade imediata” continuam sendo uma meta tangível. O papel das CTMs junto à medula óssea foi discutido, sendo que o trabalho conduzido por Prockop et al. ajudou a elucidar as funções intrínseca e extrínseca do próprio osso em si.7,99 Através da infusão de CTMs geneticamente marcadas em camundongos isogênicos, estudos revelaram uma distribuição destas células para vários locais, incluindo os ossos corticais e esponjosos, cartilagem, baço, timo, pulmão e fígado.7 As CTMs, portanto, apresentam capacidade de circular e participar da renovação celular normal, e potencialmente do reparo e regeneração tecidual.

Conceitos atuais e pesquisa Nos últimos anos, o potencial uso das CTMs em modalidades terapêuticas para reparo tecidual tem se tornado cada vez mais promissor. Sendo assim, alguns estudos enfocaram a caracterização fenotípica destas células tanto in vitro como in vivo. O isolamento inicial das CTMs explorou a capacidade destas células de aderirem ao plástico. Entretanto, muitos dos clones isolados através do método de Friedenstein se mostraram incapazes de diferenciação osteogênica.100,101 Isto sugeriu, portanto, a existência de uma população celular consideravelmente heterogênea junto ao estroma medular. Os gradientes de Percoll®, da maneira como foram usados por Pittenger et al.,13 Caplan102 e Haynesworth et al.,103 proporcionaram a coleta de uma população mais homogênea de CTMs, demonstrada por análise de citometria de fluxo dos antígenos de superfície celular. Métodos alternativos para obtenção de altos graus de homogeneidade também foram tentados, incluindo a cultura de CTMs sob baixa tensão de oxigênio.104,105 Talvez o modo mais rigoroso de definir as CTMs, porém, tenha sido através do uso dos antígenos de superfície celular expressos in vitro. Numerosos antígenos foram examinados, mas a International Society for Cellular Therapy anunciou critérios específicos para definir as CTMs de medula óssea em 2006.106 Com base nestes critérios, as CTMs devem ser aderentes em plástico quando mantidas sob condições de cultura-padrão, expressar CD73 (ecto 5’-nucleotidase), CD90 (Thy-1) e CD105 (Endoglin), e não expressar CD45 (proteína tirosina fosfatase), CD34 (molécula de diferenciação do grupamento hematopoiético 34), CD14 (molécula de diferenciação do grupamento de macrófago/neutrófilo 14), CD19 (molécula 19 de diferenciação do grupamento de célula dendrítica folicular/célula B) e antígeno leucocitário humano (HLA)-DR. Além disso, as CTMs devem ser capazes de se diferenciar em adipócitos, condroblastos e osteoblastos in vitro. Embora estes critérios tenham persistido ao longo da evolução, serviram de padrão mínimo para as pesquisas mais recentes. À medida que a caracterização das CTMs in vitro progride, o delineamento fenotípico destas células in vivo avança a um ritmo bem mais lento e os dados como um todo ainda são bastante incompletos. Mais recentemente, os pesquisadores enriqueceram ainda mais a fração STRO-1 por meio da seleção positiva adicional de CD106 (molécula de adesão celular vascular-1: [VCAM-1]) e de CD146 (molécula de adesão celular do melanoma), obtendo uma fração purificada que apresenta capacidade de autorrenovação e diferenciação multipotente.107 Sendo assim, estes achados sustentam ainda mais a noção de que as CTMs de fato atuam como fonte de células-tronco in vivo para derivação de tecido mesenquimal. As linhagens de CTMs e de CTHs também foram cuidadosamente avaliadas pelos pesquisadores, que buscaram determinar se as CTMs e CTHs existem como populações distintas na medula óssea. Por meio de aloenxertos de medula óssea de HLA idêntico e sexualmente incompatíveis, os pesquisadores demonstraram que as células estromais derivadas da medula podem ser exclusivamente originárias do hospedeiro, enquanto os macrófagos derivados de CTH são comprovadamente originários dos doadores.108 Este achado indicou que as CTMs existentes junto à fração estromal representam uma fração à parte, distinta das células hematopoiéticas.

Os modelos contemporâneos, portanto, identificam pelo menos dois tipos de células-tronco junto à medula óssea, com as CTHs dando origem aos tipos celulares hematopoiéticos e osteoclastos, enquanto as CTMs se diferenciam na camada mais numerosa de linhagens mesenquimais. Além disso, acredita-se amplamente que as CTMs derivam embriologicamente do mesoderma e que, como apresentam coloração positiva para angiopoietina-1, tendem a residir com os pericitos localizados ao longo das paredes dos vasos sanguíneos sinusoidais encontrados na medula óssea.109,110 Investigações recentes começaram a identificar uma propriedade extraordinária das CTMs, com implicações terapêuticas relevantes. Embora ainda sejam pouco compreendidas, as CTMs comprovadamente apresentam propriedades imunomodulatórias.111-116 A expressão basal das proteínas de classe I da CTH foi detectada nas CTMs, enquanto as proteínas de classe II das CTHs estão totalmente ausentes.117 Este perfil particular foi associado a condições não imunogênicas, permitindo assim potencialmente o transplante de CTM em hospedeiros alogênicos sem necessidade de terapia imunossupressora.118 Ainda mais surpreendente, foi constatado que as CTMs são capazes de modular a função da célula T.111,112,114,116 Sob condições de cocultura, foi demonstrado que as CTMs diminuem os níveis de expressão de citocinas pró-inflamatórias, incluindo fator de necrose tumoral-α, interferon-γ, interleucina-4 e interleucina-10 nas células dendríticas e células T auxiliares.112 Também foi demonstrado que a secreção de antagonista do receptor de interleucina-1 pela CTM contribui para a imunossupressão global mediada pela CTM.119 A partir de uma perspectiva clínica, é possível que estas propriedades um dia venham a ser exploradas para uso no tratamento de condições como a doença do enxerto versus hospedeiro e os distúrbios autoimunes.118,120

In vitro: protocolos de coleta e diferenciação tecidual As técnicas contemporâneas de coleta e cultura de CTMs ainda estão implicadas na mesma propriedade fundamental de aderência ao plástico empregada por Friedenstein et al., há mais de 40 anos.8 Mais recentemente, pesquisadores incorporaram o uso dos gradientes de densidade para eliminar os tipos celulares indesejados presentes no aspirado de medula e aumentar a homogeneidade.13 Ao trabalhar com CTMs humanas, a crista ilíaca tem sido mais frequentemente citada como fonte para coleta de medula óssea.121 As CTMs murinas, em contraste, podem ser coletadas da fíbula ou da tíbia, lavando primeiramente os conteúdos medulares com auxílio de uma seringa 27G.122 A medula óssea coletada então é transferida para uma solução aquosa de polissacarídeos hidrofílicos altamente ramificados. Após uma centrifugação por 30 minutos, quatro camadas se tornam visíveis. As hemácias podem ser encontradas no fundo, com a solução polissacarídica por cima. A terceira camada contém a maioria das células mononucleares e a última camada de cima contém primariamente meio acelular. A terceira camada (células mononucleares) deve ser isolada, recentrifugada e transferida para placas de cultura de plástico. Com frequência, é possível observar as colônias de CTMs se formarem após 6-8 dias de cultura in vitro. As condições de cultura linhagem específicas para indução da diferenciação de CTMs em adipócitos, condrócitos, osteoblastos e mioblastos estão bem descritas. A diferenciação adipogênica pode ser induzida pelo tratamento das CTMs com 1-metil-3-isobutilxantina, dexametasona, insulina e indometacina.13 O acúmulo de tecido adiposo pode ser prontamente avaliado por histologia, através da formação de vacúolos ricos em lipídio dentro das células. Além disso, foi demonstrado que as CTMs diferenciadas expressam vários marcadores de diferenciação adipogênica, incluindo PPARγ2, LPL e proteína ligadora de ácido graxo aP2 (Fig. 13.13). Para promover a diferenciação condrogênica, as CTMs são cultivadas na ausência de soro, em uma “micromassa” precipitada, em presença de TGF-β3.13 Uma matriz extracelular rica em proteoglicana pode ser observada em paralelo à expressão de colágeno de tipo II após duas semanas, sendo que ambas são tipicamente encontradas na cartilagem articular. A diferenciação osteogênica das CTMs pode ser obtida com os mesmos componentes descritos na seção sobre CTAs. Enfim, foi demonstrado que a cultura de CTMs com dexametasona e hidrocortisona induz expressão de fatores regulatórios essenciais para diferenciação miogênica, incluindo MyoD1 e miogenina.123 À parte das linhagens mesenquimais tradicionais, as CTMs também são comprovadamente capazes de transdiferenciação in vitro, formando vários tecidos diferentes mesmo além daqueles derivados do mesoderma. Cultivando CTMs com 5-azacitidina, Makino et al. relataram a formação de estruturas semelhantes a miotúbulos com pulsação espontânea.124 Foi constatado que estas células expressam marcadores consistentes com diferenciação de cardiomiócitos. A diferenciação neural também foi relatada com o tratamento das CTMs com β-mercaptoetanol.125 Sob tais condições, as células rapidamente assumem a morfologia neuronal e passam

a expressar nestina, enolase neurônio específica e proteína específica do neurônio, que são todas proteínas associadas à diferenciação neuronal inicial. Desta forma, as CTMs apresentam uma ampla capacidade de diferenciação, com uma plasticidade além daquela tipicamente associada aos tecidos mesenquimais derivados do mesoderma. Esta capacidade ampla também pode fornecer as bases futuras para um potencial terapêutico amplo e distinto.

Modelos in vivo A capacidade das CTMs de se diferenciarem ao longo de várias linhagens as torna excelentes candidatas ao reparo e à regeneração de muitos tecidos. A multipotência das CTMs, aliada à facilidade de isolamento e potencial de expansão, levou a uma variedade de estudos pré-clínicos para avaliação de seu uso em doenças cardiovasculares, lesão do sistema nervoso central, diabetes e regeneração ósseo/cartilaginosa. A doença cardiovascular continua sendo uma das principais causas de morbidade e mortalidade em todo o mundo, sendo responsável por quase 20 milhões de mortes a cada ano.126 As abordagens contemporâneas de tratamento se concentram na preservação do miocárdio por meio da terapia farmacológica e revascularização. Entretanto, a capacidade das CTMs de sofrer transdiferenciação ao longo de uma linhagem cardiomiogênica despertou interesse recente em sua aplicação para fins de regeneração miocárdica pós-infarto.124 De modo significativo, os estudos in vivo demonstraram que as CTMs inoculadas migram preferencialmente para locais de inflamação e isto possibilita sua potencial participação no reparo do miocárdio lesado.127 A isquemia do miocárdio pode promover liberação de fatores quimiotáticos, aumentar a permeabilidade vascular e aumentar a expressão de proteínas de adesão para permitir o alojamento adequado das CTMs. Entretanto, ainda é controverso o modo como estas células realmente atuam nos locais de pós-infarto. Assim como o infarto do miocárdio, a lesão ao sistema nervoso central também contribui para estatísticas significativas de morte e incapacitação em nível mundial. À medida que os pesquisadores foram demonstrando que as CTMs são capazes de sofrer transdiferenciação em tecido neuronal derivado de ectoderma, o uso destas células em vários modelos experimentais de acidente vascular encefálico em animais forneceu achados bastante provocativos.125 Vários estudos demonstraram que as CTMs injetadas podem migrar para locais de lesão por acidente vascular encefálico e se diferenciar em células que expressam marcadores neuronais.128-130 Relatos preliminares de achados obtidos com ratos mostraram que as CTMs potencialmente podem contribuir para restaurar neurônios danificados.129,130 De uma perspectiva funcional, foi demonstrada uma função sensoriomotora melhorada após a injeção das CTMs nos locais de isquemia cortical.131 O tratamento do diabetes é outro campo em que o uso das CTMs tem fornecido resultados promissores. Atualmente, o diabetes de tipo 1 pode ser parcialmente revertido com a reposição das células β pancreáticas funcionais. Infelizmente, o transplante de células de ilhota é limitado pela imunorrejeição e continuada destruição autoimune.132 A escassez de células de ilhotas doadas dificulta ainda mais o tratamento desta doença. Entretanto, a potencial capacidade das CTMs de modular o sistema imune e de sofrer transdiferenciação em células β in vitro levou à realização de várias investigações pré-clínicas utilizando estas células em modelos experimentais de diabetes induzido em animais.132-135 Assim como com a isquemia cardíaca e o acidente vascular encefálico, o verdadeiro papel das CTMs na melhora da hiperglicemia ainda é controverso. A introdução das CTMs humanas em camundongos diabéticos imunocomprometidos resultou na regulação positiva apenas da produção de insulina, sugerindo que as CTMs promovem regeneração das ilhotas endógenas, em vez de sofrerem transdiferenciação e se integrarem ao pâncreas do hospedeiro.135 Mesmo assim, estes estudos mostraram que as CTMs um dia poderão representar uma alternativa terapêutica viável para o tratamento do diabetes de tipo 1. Contudo, dentre todos os trabalhos que giram em torno de estudos in vivo sobre a aplicação pré-clínica das CTMs, um dos mais pertinentes ao campo da cirurgia plástica e reconstrutora ainda é o uso destas células na regeneração óssea e cartilaginosa. A homeostasia óssea representa um equilíbrio sensível entre a produção de osso pelos osteoblastos de linhagem mesenquimal e a reabsorção óssea por osteoclastos de linhagem hematopoiética.118 Foi constatado que as CTMs alteram potencialmente este equilíbrio através da modulação da expressão do ligante do ativador do receptor de fator nuclear κB (RANKL) e da osteoprotegrina.118 Também foi sugerido que a perda da função de CTM pode contribuir para a diminuição da regeneração óssea com o avanço da idade.136 Da perspectiva de reparo e regeneração óssea, as CTMs foram avaliadas como potenciais blocos de construção celular para estratégias de engenharia tecidual. Empregando o modelo de defeito femoral canino de tamanho crítico, pesquisadores demonstraram que as CTMs são capazes de regenerar ossos quando carregadas

em cilindros de hidroxiapatita-tricálcio fosfato.88,137,138 Decorridas 16 semanas da introdução das CTMs, a análise histológica revelou a presença de osso novo abrangendo totalmente o defeito.88 Em adição, observou-se que as CTMs autólogas e alogênicas forneceram resultados equivalentes, sem infiltração linfocítica nem formação de anticorpos detectada quando células alogênicas incompatíveis para antígeno leucocitário foram implantadas.88 À parte do esqueleto apendicular, pesquisadores também estudaram o uso das CTMs na promoção de formação de osso para a coluna espinal. A fusão espinal ainda é o último recurso para pacientes com doença degenerativa de disco e, nos EUA, mais de 300.000 casos são realizados anualmente.118 A pesquisa atual enfoca a melhora da fusão espinal por meio da combinação de medula óssea autóloga com arcabouços sintéticos e terapia à base de citocinas. As CTMs implantadas em Matrigel® e transferidas para o leito de fusão lombar de ratos resultam comprovadamente numa maior taxa de êxito da fusão, em comparação ao observado nos animais que recebem apenas uma mistura de células estromais medulares.139 Kai et al. relataram resultados similares em coelhos, usando uma combinação de CTMs, blocos de cerâmica contendo fosfato de cálcio e BMP-2 humana recombinante.140 Estes resultados sugerem que as CTMs podem ser um substituto conveniente aos métodos mais tradicionais que empregam enxertos ósseos de crista ilíaca, além de também poderem permitir a formação de tecido ósseo mais maduro antecipadamente, após a fusão espinal. O reparo e a regeneração da cartilagem ainda representam um problema desafiador, em que as CTMs podem fornecer estratégias alternativas e mais atraentes do que aquelas usadas atualmente. A capacidade de tratar uma cartilagem danificada e a osteoartrite é bastante limitada hoje, com a substituição por prótese articular representando a melhor solução contemporânea. Por outro lado, estudos pré-clínicos realizados com cabras demonstraram a capacidade das CTMs de promover regeneração da cartilagem nas articulações do joelho.141 Após a indução cirúrgica de osteoartrite, por meio da excisão do menisco medial e ressecção do ligamento cruzado anterior, Murphy et al. descobriram que uma única injeção de CTMs suspensas em hialuronan sódico diluído poderia resultar em diminuição da degeneração da cartilagem articular, remodelamento osteofítico e esclerose subcondral.141 Estes achados também foram observados em um modelo murino de artrite reumatoide humana, em que as CTMs alogênicas introduzidas por via intraperitoneal preveniram a ocorrência de danos graves irreversíveis à cartilagem e ao osso.142 Em vez de fornecer diretamente uma contribuição celular para a formação de cartilagem, neste caso, as CTMs pareceram modular a imunorresponsividade e a expressão de citocinas inflamatórias.142 Trabalhos futuros, sem dúvida, terão que avaliar se uma abordagem deste tipo também pode se mostrar efetiva no controle da doença preexistente.

Correlações clínicas As duas últimas décadas de pesquisa com CTMs, tanto em culturas in vitro como em modelos experimentais animais in vivo, permitiu aos cientistas começarem a incorporar estas células em estudos clínicos de uma gama cada vez maior de potenciais doenças.118,120 O uso das CTMs foi proposto para o tratamento de uma ampla variedade de doenças e os pacientes já começaram a se inscrever em estudos patrocinados pela indústria (Osiris Therapeutics, Waltham, MA) com o objetivo de investigar o uso destas células na doença do enxerto versus hospedeiro, doença de Crohn e diabetes de tipo 1. A FDA também aprovou o estudo de CTMs autólogas no tratamento do acidente vascular encefálico agudo na artéria cerebral média. Contudo, até o momento, a aplicação mais proeminente das CTMs nos estudos clínicos é seu uso na cardiopatia isquêmica. Após a agressão isquêmica ao miocárdio, a reperfusão pode salvar amplas regiões de músculo viável. Contudo, este salvamento frequentemente é incompleto e resulta num processo de remodelamento ventricular esquerdo adverso.143 Como mencionado anteriormente, estudos pré- clínicos demonstraram que as CTMs autólogas promovem uma melhora modesta da função cardíaca, seja por transdiferenciação ou por elaboração de fatores tróficos capazes de estimular mecanismos reparadores endógenos.144,145 As CTMs também se mostraram eficazes em estudos clínicos iniciais envolvendo a doença esquelética, similar ao ocorrido com as cardiomiopatias isquêmicas. A osteogênese por distração de osso longo é um campo emergente, em que os pesquisadores descobriram que as CTMs promovem melhora da cicatrização e velocidades de recuperação mais rápidas.146 Em 17 pacientes submetidos à distração, a injeção de CTMs com plasma rico em plaquetas no calo, durante as fases de alongamento e consolidação, resultou na formação acelerada de osso maduro e em diminuição da incidência de complicações.147,148 Horwitz et al. também investigaram o uso de CTMs no tratamento da osteogênese imperfeita, um distúrbio genético do colágeno de tipo 1 que resulta em ossos frágeis e deformidades esqueléticas.149-151 Embora não exista cura para a osteogênese imperfeita, relatos preliminares demonstraram que as CTMs são potencialmente efetivas na promoção de

aumento da formação óssea nestes pacientes.150 Crianças que receberam duas infusões de CTMs alogênicas apresentaram células enxertadas em múltiplos locais, incluindo ossos e pele. De modo significativo, a velocidade de crescimento acelerada foi observada durante os primeiros 6 meses subsequentes ao tratamento e não houve nenhuma complicação associada.149 Estes achados então revelam que as CTMs podem ser administradas com segurança em crianças e, uma vez injetadas, podem permanecer localizadas nos tecidos geneticamente defeituosos. A amplitude dos estudos clínicos envolvendo CTMs está se expandindo rapidamente, uma vez que estudos demonstraram que estas células exibem uma forte propensão a melhorar uma ampla gama de déficits teciduais secundários a lesões ou doenças. Apesar do avanço dos trabalhos no estudo do papel destas células na cardiomiopatia isquêmica e na deficiência esquelética, estes campos representam apenas a ponta do iceberg em relação ao potencial demonstrado para estas células in vitro e nos estudos pré-clínicos. Conforme os estudos continuam a elucidar o modo como as CTMs de fato funcionam nos estados patológicos, o conjunto diversificado de mecanismos biológicos destas células torna as perspectivas de desenvolvimento de uma terapia imediata de ampla eficácia atrativamente próximas.

Células-tronco tecido específicas Definições As células-tronco adultas, ou tecido específicas, são células indiferenciadas encontradas em quase todos os tecidos e órgãos após o desenvolvimento embrionário.152 Estas células preenchem a definição de uma célulatronco, pois apresentam capacidade de autorrenovação e de diferenciação nos tipos celulares especializados dos tecidos ou órgãos em que são encontradas. Sua principal função é manter a homeostasia e garantir que as várias formas de agressão ou lesão sejam reparadas para restauração da função. Postula-se que os defeitos funcionais da célula-tronco adulta podem ser responsáveis por uma gama de doenças. Além disso, o estudo da função da célula-tronco adulta seria capaz de revelar mecanismos biológicos importantes que poderiam ser explorados para fins terapêuticos.153 Ainda que raras, as células-tronco adultas exercem uma função essencial junto à organização hierárquica de órgãos e tecidos complexos, dando origem a células substitutas que mantêm a integridade tecidual ao longo de todo o desenvolvimento. Um modelo de subpopulações progenitoras quiescentes e ativas coexistentes foi proposto para descrever as células-tronco adultas em diferentes estados do ciclo celular.154 Admitiu-se a hipótese de que estas células existem em zonas rigidamente controladas, para garantir que as células diferenciadas possam ser rapidamente repopuladas e, ao mesmo tempo, mantenham um sistema de apoio quiescente para manter a longevidade dos grupos de células-tronco adultas. Outro conceito estudado envolvendo as células-tronco é a transdiferenciação ou capacidade das células-tronco linhagem direcionadas se diferenciarem em tecidos ou órgãos de outra linhagem embrionária.155 Exemplificando, estudos realizados com camundongos demonstraram a capacidade das células-tronco da medula óssea de se diferenciarem em múltiplos tipos celulares.

Conceitos atuais e pesquisa Pele A pele dos mamíferos é um tecido amplamente disponível e de pronta acessibilidade para o estudo da função da célula-tronco adulta. Os estudos de expressão genética identificaram reguladores decisivos da função da célula-tronco epitelial, entre os quais as vias de Wnt/β-catenina, BMP, notch e Hedgehog.156 Além disso, numerosos subtipos de progenitores epiteliais foram identificados recentemente e contribuem para os diferentes compartimentos cutâneos que contêm células-tronco epiteliais residentes, como o folículo piloso, as glândulas sebáceas e a epiderme interfolicular (Fig. 13.17).157 As células-tronco do folículo piloso estão localizadas na região do bulbo e apresentam ciclo lento sob condições normais. Entretanto, depois de uma lesão, estas células são rapidamente ativadas e migram na direção da região do dano epitelial.158

FIG. 13.17 As células que circundam o folículo piloso transitam para o local da ferida. GS, glândula sebácea; CT, célula-tronco; BRE, bainha radicular externa; BRI, bainha radicular interna; EIF, epiderme interfolicular; CTMs, células-tronco mesenquimais.

Estas células-tronco epiteliais estão localizadas em compartimentos cutâneos discretos, mas apresentam características comuns que podem revelar mecanismos unificadores na homeostasia normal. Todas expressam K5, K14 e δ-Np63; são adjacentes a uma membrana basal subjacente e utilizam muitas das mesmas vias sinalizadoras regulatórias.159 O complexo ambiente cutâneo também abriga células-tronco melanocíticas putativas, envolvidas no processo que torna os cabelos grisalhos,160 e pericitos dérmicos, que foram implicados como reguladores importantes das células-tronco regeneradoras da pele.161 Muitos dos mecanismos subjacentes à embriogênese cutânea são recapitulados posteriormente, na vida adulta, para manter a homeostasia da pele.156 Vários modelos foram propostos para explicar o equilíbrio das populações de células-tronco e sua função. Um destes modelos descreve os processos de divisão celular assimétrica versus simétrica. A divisão celular simétrica descreve a geração de duas células-filhas que eventualmente adquirem o mesmo destino diferenciado. A divisão assimétrica descreve o processo pelo qual uma célula-tronco produz uma célula-filha destinada a ser célula-tronco e outra célula-filha destinada a sofrer diferenciação. Estes modelos não são mutuamente exclusivos e considera-se que ambos exercem papel importante na manutenção das populações de células-tronco da pele.162 Osso Os osteoblastos derivam das CTMs da medula óssea e suas vias de diferenciação foram bem estudadas. Estas células formam o osso, regulam o crescimento e remodelamento ósseo e se diferenciam em osteócitos maduros em resposta a estímulos como carga mecânica, hormônios e citocinas.163 Um delicado equilíbrio é mantido com seus osteoclastos correspondentes, que reabsorvem osso e são derivados de precursores de monócitos/macrófagos. Durante a osteogênese adulta, a formação óssea prossegue através de duas vias distintas: ossificação intramembranosa (p. ex., crânio) ou ossificação endocondral (p. ex., ossos longos). A primeira ocorre diretamente a partir da condensação da CTM, enquanto a segunda envolve uma etapa intermediária de formação de cartilagem mediada por CTM, seguida de substituição por matriz óssea164 (Fig. 13.18).

FIG. 13.18 Condensação da célula-tronco mesenquimal (CTM) em um osteoblasto, como na ossificação intramembranosa.

A diferenciação do osteoblasto é regulada por diversas vias de sinalização importantes, como as vias de Wnt, BMP, FGF e Hedgehog, bem como por fatores de transcrição, como Runx2, Osterix, ATF4 e TAZ.165 Estes sinais determinam o destino dos precursores da linhagem esquelética e podem ser manipulados potencialmente para induzir regeneração óssea. As BMPs-2, 4 e 7 foram usadas com sucesso para induzir diferenciação de osteoblasto e formação de matriz in vivo, sendo que os veículos para distribuição do gene BMP, como plasmídios e vírus, foram empregados de maneira efetiva.166 A distribuição genética combinada tem alcançado êxito e parece recapitular mais estreitamente o ambiente de sinalização in vivo, fornecendo um estímulo sinérgico para a formação de ossos. Este efeito de sensibilização foi demonstrado por meio de combinações de distribuição de BMPs, fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), RANKL e Runx2.166 Vasos sanguíneos O desenvolvimento regulado de vasos sanguíneos em resposta à lesão ou isquemia tecidual é essencial para a manutenção dos tecidos sadios e a disfunção deste processo de neovascularização muitas vezes resulta em doença.167 A cicatrização adequada de uma ferida, por exemplo, requer que uma robusta resposta vascular forneça células imunes e substratos metabólicos necessários à regeneração tecidual.168 Além disso, um padrão coordenado de sinalização de neovascularização e recrutamento de células-tronco é essencial ao desenvolvimento normal dos órgãos durante a embriogênese,169 bem como para o crescimento tumoral e para as metástases.170 Durante a embriogênese, os angioblastos derivados do mesoderma se organizam por vasculogênese para formar vasos sanguíneos.171 Inicialmente, acreditava-se que todo o crescimento de vasos sanguíneos subsequente ocorria por meio do brotamento de células endoteliais preexistentes, num processo conhecido como angiogênese172 (Fig. 13.19). Entretanto, foi descoberto que a programação vascular evidente durante o desenvolvimento embrionário é recapitulada em vários estados pós-natais, durante um processo conhecido como vasculogênese do adulto173 (Fig. 13.19).

FIG. 13.19 Brotamento de células endoteliais preexistentes em um processo conhecido como angiogênese (esquerda). Formação de novos vasos a partir de célula progenitora endotelial circulante, conhecida como vasculogênese (direita).

As células precursoras endoteliais (CPEs), que são células progenitoras derivadas da medula óssea que participam da vasculogênese do adulto, foram identificadas pela primeira vez por Asahara et al.174 Estas células são recrutadas para o local da isquemia e se dividem para formar massas de sincício que, por sua vez, se tubularizam e canalizam para formar uma rede vascular patente.175 Os pericitos, que retêm a pluripotência das CTMs,109 também estão intimamente envolvidos na morfogênese vascular. Estas células residem na interface situada entre as células endoteliais e o tecido circundante, e produzem sinais pró-angiogênicos que regulam a diferenciação e o crescimento da célula endotelial.176 Por meio da interação física direta e da sinalização parácrina, as células endoteliais e os pericitos se engajam em uma complexa conversação cruzada que é essencial à vasculogênese normal.177 Músculo As células-tronco satélite foram descritas pela primeira vez por Mauro, na década de 1960, como células mononucleares localizadas entre as fibras musculares e sua membrana basal178 (Fig. 13.20). Diferentes modos de divisão celular assimétrica foram propostos para a regulação da autorrenovação da célula satélite.179,180 Entretanto, a divisão celular simétrica pode exercer um papel significativo na resposta à lesão muscular já que amplas concentrações de células miogênicas são necessárias para repor a massa muscular perdida ou disfuncional.180 Considera-se ainda que os mecanismos de reparo envolvem o recrutamento de células satélite vizinhas e células-tronco miogênicas circulantes. Além disso, foi proposto que a disfunção da célula satélite está por trás de certas doenças musculares, como a distrofia muscular de Duchenne, embora esta hipótese precise ser mais estudada.

FIG. 13.20 Células satélites musculares localizadas entre as fibras musculares e suas membranas basais.

Os principais componentes do nicho de célula satélite são a fibra muscular adjacente (incluindo os sinais mecânicos, elétricos e bioquímicos que dela emanam), a lâmina basal e a microvasculatura. Estes componentes inter-relacionados regulam a atividade das populações de células-tronco musculares e incluem os receptores de caveolina-1, esfingomielina e calcitonina; a proteína transmembrana Megf10; a sinalização Notch; e os

componentes da matriz (como proteoglicanas).180 Nervo periférico Embora os nervos periféricos tenham a capacidade de regenerar os axônios após uma lesão, os resultados alcançados ao final do reparo ainda são precários, devido ao dano neuronal direto e também à desnervação crônica da extremidade distal.181 Entretanto, quando as células de Schwann de suporte desnervadas foram substituídas por células saudáveis no local da lesão, houve a melhora na regeneração do nervo (Fig. 13.21). Isto sugere que as terapias celulares podem exercer papel importante no tratamento das lesões de nervos. Guenard et al. demonstraram que as células de Schwann singênicas podem melhorar efetivamente a regeneração dos nervos nas lesões do nervo ciático de ratos.182 Murakami et al. transplantaram células-tronco neurais obtidas do hipocampo de embriões de rato em defeitos do nervo ciático e mostraram a ocorrência de regeneração do nervo após 8 semanas.183 O número médio de fibras mielinizadas e o tamanho das fibras aumentou, em comparação ao observado nos controles.

FIG. 13.21 Migração da célula de Schwann para o local de lesão no nervo periférico, para auxiliar o reparo.

Os fatores de crescimento neurotróficos também exerceram papel relevante em modelos experimentais de reparo de nervo. Tais fatores incluem o NGF, fator neurotrófico derivado do encéfalo (BDNF), neurotrofina-3 (NT-3), NT-4/5, FGF e PDGF, entre outros.184 Estes fatores foram distribuídos por liberação da matriz/canal ou através de minissistemas de bombeamento, contudo a biodisponibilidade ao longo das escalas temporais regenerativas necessárias continua sendo problemática.

Correlações clínicas Pele As terapias celulares são usadas há décadas no tratamento da lesão por queimadura, com os folhetos epidérmicos autólogos crescendo ex vivo e sendo subsequentemente reimplatados com graus variáveis de sucesso.185 As terapias com CTMs derivadas da medula óssea e do tecido adiposo se mostraram úteis para feridas crônicas no contexto clínico, apesar de a maior parte ser de relatos de caso.186 Dash et al. relataram um estudo clínico randomizado, em que foram usadas CTMs de medula óssea autólogas para tratar úlceras crônicas que não cicatrizavam.187 Os pacientes tratados com células-tronco apresentaram melhora na caminhada livre de dor e reduções do tamanho da úlcera em até 12 semanas após o tratamento. O transplante de CTHs oriundas do sangue periférico e da medula óssea também resultou em integração do enxerto celular na pele.188 A avaliação histológica de amostras de pele de transplantes sem compatibilidade

sexual revelou que até 7% das células eram positivas para XY, indicando que as células-tronco circulantes podiam se diferenciar em epitélio maduro. No entanto, outro estudo que usou um delineamento experimental semelhante de transplante sem compatibilidade sexual falhou em demonstrar a contribuição das células-tronco doadas para as populações de queratinócitos.189 Badiavas e Falanga descreveram três pacientes com feridas crônicas em membro inferior, refratárias à terapia-padrão, que foram tratadas com células-tronco de medula óssea autólogas.190 O fechamento completo da ferida foi observado em todos os pacientes e houve menos fibrose nas feridas do que observado em amostras obtidas das feridas antes do tratamento. Aparentemente, as numerosas populações de células-tronco adultas podem contribuir para a regeneração da pele, porém a combinação ideal de células e sinais ainda é desconhecida. Osso Como já mencionado, as células-tronco alogênicas derivadas da medula óssea comprovadamente melhoram a osteogênese em crianças com osteogênese imperfeita, com uma integração do enxerto de células doadas de cerca de 2%.150 Decorridos três meses do tratamento, todos os pacientes apresentaram conteúdo mineral ósseo total aumentado, incremento da velocidade de crescimento e frequência reduzida de fraturas ósseas. Vasos sanguíneos Estudos demonstraram a existência de uma forte correlação entre fatores de risco clínico para doença cardiovascular e função e número de CPEs. Doenças como o diabetes, arteriopatia coronariana, tabagismo e hipercolesterolemia comprovadamente afetam as CPEs de modo adverso, induzindo esforços no sentido de melhorar os resultados clínicos alcançados via aumento de CPEs.191 A injeção direta de CPEs e também de fatores de crescimento, como o fator estimulador de colônias de granulócitos-macrófagos, tem sido empregada com algum sucesso após isquemia cardíaca. Uma meta-análise constatou que as infusões intracoronarianas de células de medula óssea são seguras e estão associadas a uma melhora mínima da função ventricular esquerda em 3-6 meses após o infarto agudo do miocárdio.192 Músculo As células satélite geralmente são incompatíveis com a administração sistêmica, além de apresentarem baixa viabilidade e migração ao serem distribuídas por via intramuscular. Assim, o potencial terapêutico das célulastronco musculares está mais concentrado nas populações progenitoras derivadas da linhagem endotelial. Estas células, que incluem mesoangioblastos, pericitos e células CD133 +, apresentam um potencial miogênico significativo e atravessam prontamente o endotélio, possibilitando a distribuição intra-arterial.179 Em modelos experimentais animais, estas progenitoras musculares apresentaram capacidade de restaurar a função muscular e promover graus variáveis de reconstrução do compartimento de células-tronco satélite.193 Numerosos estudos sobre distrofia muscular de Duchenne realizados com seres humanos demonstraram uma produção efetiva de distrofina associada ao uso da injeção de células-tronco, mas não observaram benefícios clínicos.194 Também foram realizados estudos clínicos empregando células-tronco musculares no tratamento da cardiopatia isquêmica e da incontinência urinária por estresse, que alcançaram melhoras mistas da função muscular.195 Sistema nervoso A vasta maioria dos estudos sobre o uso do transplante de células no tratamento da lesão medular espinal foi realizada com roedores, sendo que vários destes estudos empregaram células-tronco de medula óssea humana.196 Recentemente, a FDA aprovou um estudo com seres humanos conduzido pela Geron Corporation (EUA), sobre o tratamento da lesão de medula espinal aguda com células-tronco embrionárias. Este estudo, porém, foi interrompido em 2009 devido ao desenvolvimento de cistos no local da lesão, durante os estudos pré-clínicos. Embora as células-tronco humanas sejam usadas em modelos pré-clínicos de lesão de nervo periférico, ainda é necessário realizar estudos clínicos com células-tronco.

Futuras aplicações clínicas da terapia com células-tronco Arcabouços para distribuição das células-tronco As células-tronco são encontradas em nichos ambientais rigidamente controlados e as alterações neste

microambiente podem modificar drasticamente seu comportamento e suas capacidades. Além disso, estas células frequentemente são usadas no contexto de doença ou lesão, em que sinais tóxicos podem ser prevalentes, prejudicando ainda mais a sua função. Desta forma, as estratégias que empregam arcabouços de biomaterial podem proporcionar um ambiente controlado, que protege as células implantadas contra a ação de estímulos nocivos. As matrizes de biomaterial também são usadas para distribuir material genético e/ou sinais bioquímicos indutores que permitem algum grau de controle do desenvolvimento das células-tronco administradas (Fig. 13.22). Em termos de regeneração de tecidos e órgãos, os arcabouços fornecem o suporte estrutural onde são construídos os novos tecidos e, sendo assim, podem ser pré-fabricadas com base na finalidade com que serão usadas. Exemplificando, os arcabouços rígidos são bem mais convenientes para a engenharia óssea, enquanto os arcabouços flexíveis moles são ideais para uso cutâneo.

FIG. 13.22 Construção de bioarcabouço. Os bioarcabouços podem ser ajustados com base no tipo de célula-tronco e na molécula pequena usada, bem como no tipo de proteína, sequência de peptídeo e componentes da matriz.

Os arcabouços podem ser amplamente agrupados em duas categorias: naturais ou sintéticos. Os arcabouços naturais incluem aqueles derivados de doadores cadáveres ou vivos, e podem ser autógenos, alogênicos ou xenogênicos. Um exemplo excelente é o tratamento de grandes queimaduras com substitutos dérmicos, que são usados a partir de uma ampla gama de fontes humanas e não humanas. As matrizes naturais também podem ser obtidas a partir da remoção de células de tecidos e órgãos inteiros que, por sua vez, podem ser semeados com células exógenas.197,198 Estas técnicas incluem o uso de força física/mecânica, agentes químicos e enzimáticos para remover o material celular causando o mínimo possível de ruptura da matriz.199 Um enfoque maior tem sido dado recentemente aos chamados biomateriais “inteligentes”.200 Estes materiais incorporam sequências peptídicas capazes de mimetizar melhor o ambiente celular nativo, e podem modular significativamente a diferenciação, adesão e proliferação celular.201 Os polímeros inteligentes podem permitir que os arcabouços respondam à temperatura, pH, luz ou interações iônicas, e estas respostas incluem propriedades mecânicas alteradas, hidrofobicidade e colapso ou expansão.202 O desenvolvimento destes materiais reflete as interações dinâmicas necessárias ao sucesso da regeneração tecidual. Numerosos estudos demonstraram os benefícios proporcionados pelo uso das construções de arcabouço + células-tronco na medicina regenerativa. Os arcabouços proporcionam também um veículo altamente modificável para fatores indutores. Fang et al. empregaram plasmídio carregado com DNA em esponjas de colágeno e mostraram o êxito da manipulação genética de fibroblastos in vivo para indução da formação óssea em ratos.203 Os arcabouços de poli(lactídeo-coglicolídeo) carregados com DNA plasmidial promoveram melhor

transfecção celular e formação de matriz em comparação com os resultados obtidos com a injeção do plasmídio apenas.204 Schek et al. demonstraram uma maior formação de osso em camundongos com o uso de hidrogel para distribuição de adenovírus expressando BMP-7, em comparação ao observado nos controles que não usaram hidrogel.205 Estes são alguns dos exemplos dos benefícios proporcionados pelas aplicações baseadas no uso de arcabouços para intensificar o potencial regenerativo das células-tronco. À medida que os pesquisadores continuam descobrindo os complexos sinais e interações necessárias à diferenciação das células-tronco, aumenta a necessidade de técnicas que empregam biomaterial para recapitular precisamente os diversos microambientes das células-tronco endógenas.200

Terapias de indução genética As estratégias regenerativas baseadas em células também são criticamente dependentes do ambiente de sinalização bioquímica. A administração exógena de fatores de crescimento específicos e citocinas pode induzir a diferenciação das células-tronco, propiciando aos pesquisadores uma poderosa forma de manipulação destas células in vitro. É possível induzi-las a se transformarem em numerosos tipos celulares por meio das terapias de transferência de gene e citocinas (Fig. 13.23). Entretanto, antes de poderem ser usadas de maneira efetiva in vivo, estas modalidades indutoras devem ser controladas de forma temporoespacialmente ao longo das escalas temporais requeridas para o reparo e regeneração tecidual com células-tronco.

FIG. 13.23 Estratégias de indução para terapia genética. Moléculas pequenas, plasmídios ou lipossomos podem estimular a diferenciação da célula-tronco.

A terapia genética realizada por células-tronco demonstrou um enorme potencial após a cura de crianças com imunodeficiência severa combinada ligada ao X e deficiência de adenosina deaminase.206,207 Entretanto, duas em cada 10 crianças tratadas desenvolveram leucemia subsequentemente e isto diminuiu o entusiasmo em relação à terapia genética de células-tronco. Outro obstáculo tem sido a falta de modelos in vitro e animais relevantes para previsão da eficácia em seres humanos.208 Entre os sistemas de vetores comuns empregados estão o vírus da leucemia murina de Moloney, vírus da imunodeficiência humana e lentivírus. Entretanto, o uso destes sistemas está sempre associado a preocupações com a ocorrência de respostas inflamatórias adversas. A transferência genética de fatores de crescimento, como o fator de crescimento similar à insulina e FGF, melhorou a cicatrização de feridas em modelos experimentais animais.209,210 Estudos recentes demonstraram que os vetores lentivírus podem ser preferíveis para transfecções a longo prazo de células cutâneas, enquanto os vetores adenovirais ou associados ao adenovírus podem ser mais convenientes para as terapias cutâneas de curta duração.211 Margolis et al. usaram adenovírus não replicante para expressar PDGF em úlceras venosas

crônicas de perna, em um estudo clínico de fase I.212 As terapias genéticas não virais por transferência genética lipossomal também são empregadas de maneira efetiva para regeneração de feridas.213 Iwaguro et al. demonstraram que a transferência do gene de VEGF poderia ser usada para intensificar a função da CPE na promoção da regeneração vascular.214 Estes pesquisadores mostraram a melhora da adesão, incorporação vascular e proliferação das CPEs em um modelo de isquemia de membro de roedor. As CPEs foram transfectadas para produção de proteínas anticoagulantes, em um modelo de lesão de angioplastia,215 e as CPEs transfectadas com VEGF foram usadas para fabricar enxertos vasculares de bioengenharia.216 A terapia genética de CPEs incluiu a potencial terapia do câncer devido ao ávido recrutamento destas células para as áreas de neovascularização.217 A terapia genética mediada por células-tronco também foi proposta para uma ampla gama de doenças neurológicas, como a doença de Parkinson, doença de Alzheimer, esclerose lateral amiotrófica e dor neuropática.218 Com relação à lesão de nervo, as células de Schwann foram transduzidas para expressar fator neurotrófico ciliar para intensificação do crescimento de nervos em ratos.219 Um sistema de transferência genética adenoviral também foi desenvolvido para a transfecção de células de Schwann e lesão de nervo periférico.220 Assim, as estratégias mediadas por vetor proporcionam uma ferramenta regeneradora adicional para controlar a programação genética das células-tronco administradas com a promessa de substituir órgãos faltantes ou disfuncionais.

Células iTPs Definições A pluripotência é a capacidade de uma célula se diferenciar em todos os tipos celulares do corpo. É uma propriedade encontrada nos blastocistos ou na massa celular interna de embriões de mamíferos ainda na fase inicial. Conforme o embrião amadurece, as células vão se tornando progressivamente mais especializadas e menos pluripotentes. Embora estudos prévios tenham tornado as células maduras mais pluripotentes, em 2007 cientistas descreveram o processo de reprogramação ou “indução” de pluripotência em uma célula madura, usando alguns fatores de transcrição essenciais na célula durante algumas semanas221 (Fig. 13.24). Estas células foram denominadas células-tronco pluripotentes “induzidas” porque apresentam propriedades semelhantes às de uma célula-tronco. As descrições originais das células iTPs empregavam um conjunto dos nossos fatores de transcrição: Oct4, Sox2, Klf4 e c-Myc (Fig. 13.25). A partir destes estudos originais, os cientistas conseguiram reprogramar células maduras com apenas dois fatores. Yamanaka, que originalmente descreveu a célula iTP, utilizou um modelo estocástico para descrever o mecanismo subjacente a este tipo de diferenciação. Em um modelo estocástico, a maioria, ou todas as células diferenciadas, têm potencial de se tornarem células iTPs com o uso de quatro fatores. A ideia é a de que uma célula representa uma “bola rolando no contexto epigenético, do estado totipotente para o estado pluripotente, e por um estado comprometido com uma linhagem”. Com o desenvolvimento das células adultas normais, as células pluripotentes ocorrem brevemente e não podem ser interrompidas “em seu caminho”. Por outro lado, as células-tronco embrionárias (CTEs) são bloqueadas por um “impacto ou obstáculo no caminho, imposto por seu estado epigenético”. Assim, os quatro fatores de Yamanaka atuam reprogramando as células de volta a um estado pluripotente.222

FIG. 13.24 As células-tronco podem ser obtidas em diferentes estágios do desenvolvimento ao longo da vida. Com o desenvolvimento da tecnologia da célula-tronco pluripotente induzida (iTP), as células adultas agora podem ser reprogramadas para se tornarem células similares às células-tronco embrionárias.

FIG. 13.25 Por meio da ativação de quatro fatores de transcrição, as células somáticas adultas podem ser reprogramadas em células-tronco pluripotentes induzidas que, por sua vez, são capazes de se diferenciar em todas as linhagens embrionárias: ectoderma, mesoderma e endoderma.

As células iTPs evitam as questões éticas associadas à derivação de CTEs, já que são derivadas de tecidos adultos não fetais. Além disso, como estas células são coletadas do mesmo indivíduo em que provavelmente serão reimplantadas, podem escapar da imunorrejeição que limita o uso de células alogênicas. Outra vantagem da derivação das células iTPs está na possibilidade de coletar estas células a partir de vários tipos celulares. As descrições iniciais da derivação de iTPs envolvem o uso de fibroblastos cutâneos.223,224 Este sítio doador proporcionou a vantagem de uma pequena biópsia de pele poder ser seguida por 3-4 semanas de expansão in vitro. Uma das principais desvantagens do uso de fibroblastos cutâneos, porém, é a baixíssima eficiência de reprogramação destas células (inferior a 0,01%) com o uso dos quatro fatores de Yamanaka (e até menor na ausência de c-Myc). Além disso, a duração da transfecção representa uma demora de 3-4 semanas a mais para o aparecimento das iTPs similares às CTEs.225 Com base no modelo de contexto epigenético, os fibroblastos são considerados terminalmente diferenciados e, por este motivo, demoram mais e demandam mais energia para serem reprogramados. Os queratinócitos oriundos de biópsias de prepúcio e cabelo humanos foram usados para derivar células iTPs.226 Estas células também são facilmente acessíveis, mas sua expansão in vitro requer mais tempo. Em comparação aos fibroblastos, estas células, quando derivadas do prepúcio neonatal/juvenil, apresentam uma

eficiência de reprogramação cerca de 100 vezes maior. Este aspecto, contudo, ainda não foi estabelecido em queratinócitos adultos. Utikal et al. também descreveram melanócitos após a coleta a partir de uma biópsia de pele.227 Estas células apresentam expressão inerente de altos níveis de Sox2 e, por isso, podem ser reprogramadas com apenas três fatores (Oct4, Kilf4 e c-Myc). Os estudos originais, que usaram os quatro fatores de Yamanaka, demonstraram uma eficiência de reprogramação cinco vezes maior que a dos fibroblastos. Em adição, os melanócitos puderam ser reprogramados em apenas 10 dias. Recentemente, o sangue de cordão umbilical ganhou popularidade em relação ao armazenamento para possíveis usos terapêuticos futuros. Há pouco tempo, dois laboratórios descreveram a derivação de células iTPs a partir de células do sangue de cordão umbilical. Um laboratório conseguiu reprogramar sucessivamente as células de sangue de cordão umbilical usando apenas Oct4 e Sox2.228 Um dos benefícios proporcionados por esta técnica reside na possibilidade de armazenar o sangue do cordão umbilical por mais de 5 anos sem perder a capacidade de reprogramação. Entretanto, períodos mais longos de criopreservação devem ser estudados para determinar a viabilidade a longo prazo das células para fins de reprogramação. Uma das últimas descobertas de uma fonte ainda mais abundante de células para aplicação de iTPs foram as hCTAs.229 Nosso laboratório isolou células adiposas a partir de lipoaspirados de pacientes adultos e fez reprogramações sucessivas usando os quatro fatores de Yamanaka. A lipoaspiração de um pequeno volume, num contexto ambulatorial minimamente invasivo, permite coletar milhões de células. Estima-se que 10 mL de lipoaspirado fresco forneçam 1 milhão de células após 48 horas de cultura in vitro. Isto possibilita a realização imediata da reprogramação, sem necessidade de expansão in vitro prévia. Até mesmo em pacientes magros é possível usar 15-50 mL de tecido adiposo para derivar células iTPs. De modo semelhante, por sua rápida expansão, as hCTAs podem ser reprogramadas com uma eficiência 20 vezes maior, em comparação aos fibroblastos. Estas células apresentam elevada expressão de Klf4 e c-Myc, em comparação ao observado nos fibroblastos, e dispensam a presença de células alimentadoras murinas. Esta facilidade de coleta e a velocidade da expansão e reprogramação fazem das hCTAs uma opção excitante para os cientistas que exploram estratégias translacionais com iTPs, além de colocar os cirurgiões plásticos na vanguarda da coleta de tecidos.229 Apesar da excitação gerada em torno das células iTPs, os métodos disponíveis para derivação e uso destas células ainda precisam passar por testes e aprimoramentos adicionais. Os lentivírus e retrovírus levam a uma integração genômica dos transgenes que as células do hospedeiro talvez sejam incapazes de silenciar totalmente. Além disso, Klf4 e c-Myc são oncogenes. As perspectivas futuras podem envolver o uso de moléculas pequenas e RNAs de interferência ou micro-RNAs para tornar a geração de células iTPs mais segura. Com relação à cultura celular, as células iTPs ainda são dependentes de uma camada de FEMs inativados. Embora estudos futuros possam vir a usar fibroblastos derivados de um mesmo paciente, uma superfície revestida com Matrigel® poderia proporcionar potencialmente um ambiente livre de alimentador. Recentemente, os laboratórios descobriram formas de contornar o uso de vírus gerando um vetor em forma de minicírculo não viral para induzir a formação das iTPs.230 Os vetores minicírculos são moléculas de DNA superespiraladas não bacterianas, compostas por um cassete eucariótico de expressão. Os minicírculos também proporcionam as vantagens de uma maior eficiência de transfecção e de uma expressão ectópica mais prolongada devido ao baixo nível de ativação dos mecanismos silenciadores exógenos. O êxito deste feito foi conseguido com o uso de hCTAs oriundas de três pacientes diferentes, tornando-o uma opção interessante para os casos em que há necessidade de uma rápida expansão e reprogramação celular.230 Apesar da excitação gerada por trás do uso das células iTPs, os estudos pré-clínicos ainda não são seguros o bastante para a transição dos estudos envolvendo seres humanos. Um modelo murino de anemia falciforme humana foi tratado com êxito com células iTPs geneticamente corrigidas.231 Embora este tenha sido um modelo de anemia falciforme humana, avaliações significativas de segurança se fazem necessárias para determinar o número mínimo de células iTPs indiferenciadas que podem se transformar em teratoma. Em segundo lugar, a integração do transgene oncogênico e mutagênese poderiam induzir câncer (Fig. 13.26). As células iTPs geradas sem vírus oferecem uma potencial solução, mas ainda não passaram por estudos rigorosos. Em terceiro lugar, a injeção subcutânea de células iTPs, atualmente em uso, resultou em diferenciação teratogênica. Isto significa que estas células provavelmente terão que ser diferenciadas in situ antes da implantação, a fim de proporcionar uma regeneração tecidual apropriada (Fig. 13.27). Além disso, uma vez estabelecidos os modelos de animais pequenos, é necessário repeti-los usando modelos de animais de grande porte. Por fim, do ponto de vista comercial, ainda é preciso estabelecer se há possibilidade de criar um modelo de negócios viável para tratamentos com iTPs para paciente específicos, considerando o desafio de reprogramar estas células e as

questões relacionadas à oncogenicidade.225

FIG. 13.26 Um potencial risco associado ao uso da célula multipotente autorregeneradora é a divisão descontrolada destas células com consequente formação de tumor. Entretanto, na engenharia de tecidos, o problema usual é a escassez (e não o excesso) de tecido.

FIG. 13.27 Quando as células-tronco pluripotentes induzidas (iTPs) são injetadas por via subcutânea, ocorre diferenciação em todas as três linhagens embrionárias, resultando na formação de um teratoma. A esperança está na possibilidade de estas células serem reprogramadas antes da implantação ou in situ, para reparar os tecidos que não podem ser reparados com células estromais derivadas de tecido adiposo humano, como os tecidos neurais.

In vitro Cultura e manutenção das células iTPs Os fibroblastos humanos IMR90 ou outros tipos celulares a serem reprogramados podem ser mantidos em DMEM contendo 10% de SFB, L-glutamina, 4,5 g de glicose/dL, 100 U de penicilina/mL e 100 µg de estreptomicina/mL. Todas as células usadas para reprogramação devem ser no máximo de segunda passagem. As células iTPs derivadas podem ser mantidas em camada alimentadora de FEM ou em placas de cultura tecidual cobertas com Matrigel® (qualificada para CTE; BD Biosciences) com meio de crescimento mTESR-1 hES (Stemcell Technology).229

Produção e transdução de lentivírus As células 293FT (Invitrogen) são plaqueadas com ≈ 80% de confluência por placa de 100 mm e transfectadas com 12 µg de cada vetor lentiviral (Oct4, Sox2, Klf4, c-MYC) mais 8 µg de plasmídios de embalamento e 4 µg de plasmídios VSVG usando Lipofectamine 2000® (Invitrogen), conforme as instruções do fabricante. O sobrenadante resultante deve ser coletado em 48 horas após a transfecção, filtrado em membrana de acetato de celulose com porosidade de 0,45 µm (Whatman) e misturado com PEG-it VirusConcentrationSolution® (System Biosciences) de um dia a outro a 4°C. Os vírus são precipitados a 1.500 g, no dia seguinte, e ressuspendidos em meio Opti-MEM® (Invitrogen).

Diferenciação in vitro As células iTPs cultivadas em Matrigel® são tratadas com colagenase de tipo IV (Invitrogen), transferidas para placas de fixação ultrabaixa (Corning Life Sciences) e cultivadas em suspensão por 8 dias com DMEM/F12 (1:1) contendo 20% de soro knockout (Invitrogen), 4,5 g de glicose/dL, L-glutamina, 1% de aminoácidos não essenciais, 0,1 mM de 2-mercaptoetanol, 50 U de penicilina/mL e 50 µg de estreptomicina/mL, para permitir a formação de corpos embrioides (CEs). Os CEs são então semeados em placas de cultura de tecido cobertas com gelatina a 0,25% e cultivados por mais 3-8 dias. A diferenciação espontânea das células iTPs em células de

linhagens mesodérmica e endodérmica pode ser detectada por imunofluorescência usando marcadores apropriados. Para a diferenciação osteogênica, um meio osteogênico similar contendo ácido ascórbico e βglicerol fosfato tem sido usado com suplementação de ácido retinoico e proteínas morfogenéticas ósseas. Além disso, ainda é discutido se a etapa de formação de CEs é de fato necessária e leva a uma diferenciação osteogênica mais eficiente ou se esta etapa pode ser omitida. A diferenciação em neurônios dopaminérgicos pode ser realizada por meio do cocultivo de células hCTAs e iTPs com células PA6s.

Modelos in vivo e potenciais correlações clínicas O potencial uso da tecnologia das iTPs revolucionaria clinicamente o campo da engenharia de tecidos, já que possibilitaria a criação de qualquer uma das três camadas germinativas simplesmente a partir de biópsia cutânea autóloga ou lipoaspiração. Nós acreditamos que a derivação das células iTPs a partir das hCTAs proporciona diversas vantagens, em comparação a outros tipos celulares, como as células-tronco neurais, células hepáticas e fibroblastos cutâneos. Em primeiro lugar, o procedimento de lipoaspiração para isolamento das hCTAs é relativamente simples, rápido e seguro. Em segundo lugar, é fácil obter uma grande quantidade de hCTAs como população de partida para a reprogramação após uma única cirurgia de lipoaspiração. Milhões de hCTAs podem ser derivadas no mesmo dia da lipoaspiração e a reprogramação pode ser realizada imediatamente. Até pouco tempo atrás, as células iTPs requeriam uma camada de fibroblastos murinos para sobreviver em estado indiferenciado, e isto impunha vários obstáculos clínicos, pois as proteínas murinas poderiam contaminar estas células humanas e causar complicações nos receptores humanos. A derivação livre de alimentador das células iTPs a partir das hCTAs representa, portanto, um método mais clinicamente aplicável para derivação de células iTPs, em comparação a outros tipos celulares, e deve possibilitar a geração mais eficiente e rápida de células iTPs paciente específicas e doença específicas.229 Os testes pré-clínicos de células iTPs necessitarão de um extensivo modelo animal. Um déficit focal, como aquele presente nas lesões de medula espinal, doença de Parkinson ou diabetes de tipo I, poderia envolver uma distribuição direta. As doenças mais sistêmicas, como as distrofias musculares, todavia, talvez requeiram múltiplas injeções intravenosas para distribuição sistêmica.229ª Estes modelos, porém, estão associados a vários aspectos preocupantes relacionados à segurança e eficácia, que terão de ser solucionados antes da utilização em seres humanos. Desta forma, existem três obstáculos principais para que o uso das iTPs se transforme na tendência preponderante: 1. As proteínas animais atualmente usadas durante a reprogramação das células humanas, em forma de camada alimentadora de fibroblastos murinos. Uma potencial solução seria o uso de uma camada livre de alimentador ou Matrigel® sem componentes animais. 2. Os vírus atualmente empregados na reprogramação são capazes de se integrar ao genoma, podendo causar mutações e possivelmente malignidades. Neste caso, faz-se necessária uma abordagem viral não integradora ou uma abordagem não viral robusta e eficiente, como o plasmídio em minicírculo. 3. As células iTPs indiferenciadas formam teratomas in vivo. Para eliminar este problema é necessário reprogramar diretamente uma célula iTP para a célula diferenciada de interesse ou pré-diferenciar uma célula iTP no tipo celular desejado antes de colocá-la in vivo. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  13. Pittenger, M. F., Mackay, A. M., Beck, S. C., et al. Multilineage potential of adult human mesenchymal stem cells. Science. 1999; 284(5411):143–147. 25. Gronthos, S., Graves, S. E., Ohta, S., et al. The STRO-1+ fraction of adult human bone marrow contains the osteogenic precursors. Blood. 1994; 84(12):4164–4173. Este artigo traz uma das primeiras descrições da fração vascular estromal de tecido adiposo e caracteriza seus marcadores de superfície celular.

28. Cowan, C. M., Shi, Y. Y., Aalami, O. O., et al. Adipose-derived adult stromal cells heal critical-size mouse calvarial defects. Nat Biotechnol. 2004; 22(5):560–567. Este artigo foi a primeira descrição do uso de células mesenquimais derivadas de tecido adiposo não tratadas para curar um defeito de calota craniana. Foram usadas técnicas de engenharia de tecidos novas, além de modalidades de análise de imagem.

35. Moore, K. A., Lemischka, I. R. Stem cells and their niches. Science. 2006; 311(5769):1880–1885. 48. Zhang, S. C., Wernig, M., Duncan, I. D., et al. In vitro differentiation of transplantable neural precursors from human embryonic stem cells. Nat Biotechnol. 2001; 19(12):1129–1133. 57. Levenberg, S., Golub, J. S., Amit, M., et al. Endothelial cells derived from human embryonic stem cells. Proc Natl Acad Sci USA. 2002; 26:26. 62. Gimble, J., Guilak, F. Adipose-derived adult stem cells: isolation, characterization, and differentiation potential. Cytotherapy. 2003; 5(5):362–369. 92. Lendeckel, S., Jodicke, A., Christophis, P., et al. Autologous stem cells (adipose) and fibrin glue used to treat widespread traumatic calvarial defects: case report. J Craniomaxillofac Surg. 2004; 32(6):370–373. Este artigo descreve uma das primeiras aplicações clínicas das células estromais derivadas do tecido adiposo, para ajudar a tratar um paciente pediátrico que apresentava defeito ósseo. Apesar do número limitado de pacientes, este trabalho deve ser guardado como estudo de base para futuras investigações.

222. Yamanaka, S. Elite and stochastic models for induced pluripotent stem cell generation. Nature. 2009; 460(7251):49–52. O artigo fornece uma excelente descrição do conceito subjacente à derivação da iTP. Uma boa descrição esquemática e detalhada da indução da iTP faz uma descoberta dificílima e inovadora parecer simples.

225. Sun, N., Longaker, M. T., Wu, J. C. Human iPS cell-based therapy: Considerations before clinical applications. Cell Cycle. 2010; 9(5):880–885. Excelente revisão dos diferentes tipos celulares dos quais as células iTPs podem ser derivadas, e também dos benefícios e armadilhas associados a cada tipo celular. Discute ainda, de forma concisa e clara, os atuais obstáculos que impedem que as células iTPs sejam trazidas para a cabeceira.

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Cicatrização de feridas Chandan K. Sen e Sashwati Roy

Resumo Existem basicamente três técnicas de cicatrização de feridas: primeira intensão, segunda intenção e terceira intenção. As fases a seguir dão sequência à resposta de cicatrização global: hemostasia, inflamatória, proliferação e remodelamento. Uma hemostasia bem-sucedida com a coagulação sanguínea resulta na prevenção da perda de sangue, coagulando a ferida em questão de segundos através de vasoconstrição e formação de um coágulo sanguíneo hemostático. Este coágulo é composto por plaquetas e fibrina. O processo é dividido em iniciação e amplificação. A iniciação é causada pela via extrínseca, enquanto a amplificação é executada pela via intrínseca. A resposta inflamatória durante a cicatrização normal é caracterizada por mudança espacial e temporal variável nos padrões de subgrupos de leucócitos específicos. A inflamação desordenada dificulta a cicatrização da ferida. A resolução completa de uma resposta inflamatória aguda é o resultado final ideal após uma injúria. A infecção é um problema comum em feridas crônicas, resultando frequentemente em feridas que não cicatrizam e em taxas significativas de morbidade e mortalidade entre os pacientes. Os micro-organismos nem sempre vivem como culturas puras de células isoladas dispersas e, em vez disso, se acumulam nas interfaces para formar agregados polimicrobianos, como películas, filmes, grupos, sedimento ou biofilmes. Em uma ferida aberta que se contrai, a restauração da barreira epidérmica intacta é possibilitada via epitelização da ferida, também conhecida como re-epitelização. Durante a fase proliferativa da cicatrização da ferida, o tecido de granulação exibe uma cor vermelho-claro ou rosa-escuro conferida pela perfusão realizada pelas novas conexões capilares. Este tecido macio ao toque e úmido apresenta um aspecto granular. O tecido de granulação serve de leito para o reparo tecidual. A vascularização da ferida pode ser conseguida por angiogênese ou vasculogênese. Uma ferida geralmente é considerada crônica quando não cicatriza dentro de quatro semanas. As feridas crônicas podem ser basicamente classificadas em três categorias principais: úlceras venosas e arteriais; úlceras diabéticas; e úlceras de pressão. As complicações vasculares comumente associadas às feridas problemáticas são as principais responsáveis pela isquemia da ferida. As limitações da capacidade da vascularização e para distribuir sangue rico em O2 aos tecidos da ferida acarretam, entre outras consequências, hipóxia. Três fatores principais podem contribuir para a hipóxia no tecido da ferida: (1) vasculopatias periféricas que garroteiam o suprimento de O2; (2) aumento da demanda de O2 no tecido em cicatrização; e (3) geração de espécies reativas do oxigênio (EROs) através da explosão respiratória e para sinalização redox. Os pequenos RNAs constituem uma nova classe de reguladores da biologia eucariótica. Ao lado de outros pequenos RNAs interferons (siRNAs), os miRNAs realizam o silenciamento genético pós-transcricional por meio da desestabilização do mRNA e repressão translacional. Os miRNAs estão emergindo como reguladores essenciais do processo geral de cicatrização de feridas. O potencial regulatório do tecido adulto lesado sugere a existência fisiológica de células capazes de participar

do processo de reparo. Foi demonstrado que as células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (CTM-MOs) promovem a cicatrização de feridas diabéticas. Isto implica na existência de um potencial terapêutico profundo para defeitos cutâneos, como as feridas crônicas e queimaduras. As cicatrizes são tecidos fibrosos macroscópicos que substituem visivelmente a pele normal após a lesão. Existe um amplo espectro de cicatrização cutânea pós-ferida, incluindo a cicatrização de ferida fetal sem cicatriz; cicatrizes de primeira linha ou normais; cicatrizes alargadas; cicatrizes atróficas (deprimidas); contraturas cicatriciais; cicatrizes hipertróficas; e queloides.

Introdução O trauma físico representa um dos desafios mais primitivos a ameaçar a sobrevivência. Em outras palavras, a lesão elimina o que é impróprio. Uma tábua de argila suméria (2.150 a.C.) descreveu como era o tratamento das feridas na antiguidade, que incluía a lavagem da ferida com cerveja e água quente, aplicação de cataplasmas feitos com substâncias como borras de vinho e esterco de lagarto, e finalmente o envolvimento da ferida com bandagens. As escrituras antigas que descrevem a ciência da vida ou Ayurveda datam dos séculos VI a VII a.C. e representam o início da prática de produzir lesão física com intenção de cura.1,2 Hipócrates (s. 400 a.C.) detalhou a importância da drenagem do pus da ferida. Galeno (s. 130-200 d.C.) descreveu o princípio da cicatrização por primeira e segunda intenção.3 A cicatrização de feridas evoluiu lentamente com o passar dos séculos e os avanços mais significativos, que ocorreram no século XIX, envolveram o reconhecimento da importância do controle da infecção, da hemostasia e do tecido necrótico.4 Hoje, o trauma cirúrgico, aliado às lesões produzidas em acidentes e secundárias a outras condições clínicas (p. ex., diabetes), representa um gasto substancial para nossa sociedade.5 Qualquer solução para os problemas relacionados à cicatrização de feridas requer uma abordagem multifatorial abrangente. Antes de tudo, será necessário tornar o leito da ferida receptivo às terapias. Em segundo lugar, o regime terapêutico apropriado deve ser identificado e fornecido, ao mesmo tempo em que devem ser controladas as limitações sistêmicas capazes de limitar secundariamente a resposta cicatricial. O objetivo deste capítulo é destacar em linhas gerais o processo de cicatrização de feridas.

Feridas agudas Qualquer violação da integridade de um tecido vivo pode ser considerada uma ferida. A pele é o maior órgão do corpo humano, abrangendo uma área aproximada de 7.620 cm2 em um indivíduo adulto mediano. O papel mais importante da pele para os animais terrestres é a proteção dos órgãos internos ricos em água contra o meio ambiente externo seco. Como uma linha de defesa primária contra as ameaças externas, a manutenção da integridade da pele é um pré-requisito essencial à sobrevivência. Por este motivo, a pele sadia é capaz de se autorregenerar e autorreparar sob a maioria das condições habituais. As feridas cutâneas podem ser abertas quando ocorrem como rupturas, cortes ou punções. O traumatismo cego por aplicação de força pode causar feridas fechadas ou contusão, em que a pele parece estar intacta, mas está sofrendo em decorrência do dano causado aos tecidos subjacentes. As feridas abertas podem ser classificadas, de uma forma geral, em: • Lacerações – rupturas e cortes irregulares; tecidos moles rompidos subjacente; são produzidas por facas cegas, fragmentos de bomba e máquinas, podendo incluir esmagamento tecidual; são contaminadas com frequência (Fig. 14.1).

FIG. 14.1 Feridas por laceração e perfuração.

• Perfurações – por exemplo, perfurações causadas por unhas, agulhas, arame ou projéteis (Fig. 14.1). São bastante preocupantes em diabéticos, pois muitos destes pacientes apresentam polineuropatia e insensibilidade nos pés, que levam à aquisição de lesões ocultas. Estes pacientes costumam pisar em tachinhas, alfinetes de segurança ou outros objetos domésticos pontiagudos, e nem mesmo percebem – isto aliado ao estado de comprometimento vascular conduz ao desenvolvimento de infecção crônica na ferida. • Abrasões – a camada superficial da pele é removida; são exemplos o joelho e cotovelos ralados, bem como as queimaduras com corda; uma abrasão se presta à infecção por si só. • Avulsões – cortes de pele rompida parcialmente (continua presa ao corpo) ou totalmente (se solta do corpo); é comum haver sangramento intenso. • Amputações – a amputação traumática resulta na remoção não cirúrgica do membro do corpo e é acompanhada de sangramento intenso. Existem três técnicas gerais de tratamento de feridas: 1. Por primeira intensão (cicatrização primária): em que todos os tecidos, inclusive a pele, são fechados com sutura. 2. Por segunda intenção (cicatrização secundária): em que a ferida é deixada aberta e se fecha naturalmente. 3. Por terceira intenção (cicatrização terciária): em que a ferida é deixada aberta por alguns dias e, então, fechada se for considerada limpa.

O processo de cicatrização da ferida Todo o processo de cicatrização da ferida pode ser visto como uma cascata que é governada por numerosas alças de feedback e feedforward e circuitos regulatórias que, por sua vez, são dirigidas por sinais oriundos do tecido da própria ferida e do microambiente da ferida, bem como pelas intervenções sob as condições a que a ferida é sujeita na terapia. Para simplificar o entendimento dos vários processos biológicos interdigitados que conduzem a resposta de cicatrização geral, a cicatrização das feridas costuma ser discutida como um processo que envolve as seguintes fases: fase de hemostasia e inflamatória; fase proliferativa (granulação, vascularização e síntese da ferida, em que a síntese pode ser discutida como sendo a contração e epitelização da ferida); e fase de remodelamento (que pode durar semanas a anos e abrange a formação da cicatriz, força tênsil e renovação dos componentes da matriz extracelular [MEC]). Estes estágios, tomados em conjunto, também são referidos como cascata da cicatrização de feridas (Fig. 14.2).

FIG. 14.2 (A-C) Fases da cicatrização de feridas cutâneas: uma representação simplificada.

Hemostasia Para as feridas com sangramento, a prioridade número um é cessar o sangramento e isto é conseguido por meio da hemostasia. A hemostasia, portanto, é uma resposta fisiológica protetora à lesão vascular, que resulta na exposição de componentes sanguíneos às camadas subendoteliais da parede do vaso. O êxito da hemostasia previne a perda de sangue, por ação de um tampão que se forma na ferida em questão de segundos, através de vasoconstrição, e pela formação de um coágulo sanguíneo hemostático constituído de plaquetas e fibrina. A hemostasia precisa das plaquetas e do sistema de coagulação sanguínea. O processo de coagulação do sangue pode ser subdividido em iniciação e amplificação. A iniciação é causada por uma via extrínseca, enquanto a amplificação é executada por via intrínseca. A via intrínseca envolve os fatores plasmáticos XI (FXI), IX e VIII (Fig. 14.3). O fator tecidual (FT) gera uma “explosão de trombina”, que é um processo pelo qual a trombina é liberada instantaneamente. A trombina é um condutor essencial da cascata da coagulação geral.

FIG. 14.3 Cascata de coagulação sanguínea. FXII, fator XII; CAPM, cininogênio de alto peso molecular; FT, fator tecidual; LEU, leucócito; HEM, hemácia; TM, trombomodulina; FP3, fator plaquetário 3; IVFT, inibidor da via do fator tecidual.

A via extrínseca responsável pelo início da coagulação sanguínea consiste no receptor transmembrana de FT e nos fatores plasmáticos FVII/VIIa. Por outro lado, a via intrínseca é constituída pelos fatores plasmáticos FXI, FIX e FVIII. Sob condições fisiológicas, o FT é expresso de forma constitutiva nas células adventícias que circundam os vasos sanguíneos e inicia a coagulação. Entre os exemplos de células adventícias, estão as células musculares lisas vasculares, pericitos e fibroblastos adventícios.6,7 O FT também pode contribuir para a amplificação da coagulação sanguínea através da sua conhecida forma transportada pelo sangue, que está presente em forma de micropartículas derivadas de células e em forma de FT expresso nas plaquetas.6-8 Os níveis de FVIIa – um integrante essencial da via extrínseca – no sangue circulante são mais altos do que os níveis de qualquer fator de coagulação ativado. Após a lesão na parede do vaso sanguíneo, o FVII entra em contato com o FT expresso nas células portadoras de FT (p. ex., leucócitos sanguíneos) e forma um complexo ativo (FT-FVIIa). Este complexo ativa FIX e FX, resultando na geração de FIXa e FXa, respectivamente. FVII é ativado pela trombina, FXIa, FXII e FXa. A ativação de FXa por FT-FVIIa é quase imediatamente inibida pelo inibidor da via do FT. FXa e seu cofator, o FVa, formam o complexo protrombinase que ativa a protrombina em trombina. A trombina é uma serina protease que exerce papel central na hemostasia após a lesão tecidual, convertendo o fibrinogênio plasmático solúvel em um coágulo de fibrina insolúvel e provendo agregação plaquetária. A trombina ativa outros componentes da cascata de coagulação, incluindo FV e FVIII que, por sua vez, ativa FXI e as cascatas de ativação de FIX. A trombina também ativa e libera FVIII ligado ao fator de von Willebrand. FVIIIa é o cofator de FIXa e ambos, juntos, formam o complexo “tenase” que ativa FX. O ciclo prossegue neste sentido. A via intrínseca é iniciada com a formação do complexo primário no colágeno, através do cininogênio de alto peso molecular, pré-calicreína e FXII (fator de Hageman). A pré-calicreína é convertida

em calicreína e FXII se transforma em FXIIa. Este converte FXI em FXIa. FXIa ativa FIX que, com seu cofator FVIIIa, forma o complexo tenase. Este complexo ativa FX em FXa (Fig. 14.3). O coágulo sanguíneo ajuda fisicamente a tampar a ferida, minimizando a perda de sangue. É constituído primariamente de fibrina em ligação cruzada, células (p. ex., eritrócitos e plaquetas) e outras proteínas da MEC (p. ex., fibronectina, vitronectina e trombospondina). O conhecimento atual descreve o coágulo como sendo uma matriz estrutural dinâmica contendo células e proteínas funcionalmente ativas. Além da contenção da perda de sangue, o coágulo atua como um primeiro auxílio contra a invasão microbiana. O coágulo também atua como matriz provisória para alojamento de células transportadas pelo sangue, incluindo células inflamatórias e células-tronco ou progenitoras. A matriz provisória é rica em citocinas e fatores de crescimento que, então, regulam a função das células alojadas.9,10 A formação do coágulo sanguíneo é iniciada pela clivagem proteolítica do fibrinogênio pela trombina. Como resultado, há produção de fibrina cujas moléculas formam ligações cruzadas entre si. As moléculas de fibrina assim ligadas capturam as plaquetas e, juntas, ambas aderem ao subendotélio através de moléculas de adesão chamadas integrinas. O coágulo de fibrina exerce papel central não só na montagem do processo inflamatório como na facilitação da angiogênese e da proliferação de células estromais na ferida. A fibrina liga-se à integrina CD11b/CD18 existente nos monócitos e neutrófilos infiltrantes. A fibrina também se liga ao fator de crescimento do fibroblasto-2 (FGF-2) e ao fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), que auxilia a vascularização do tecido da ferida. Além disso, a fibrina liga-se ao fator de crescimento insulina-like-I e promove proliferação das células estromais.11,12 O coágulo sanguíneo representa a base da quimiotaxia para a ferida. A trombina, liberada pelas plaquetas no sítio da ferida, é um mediador inicial do desenvolvimento do coágulo.13 A trombina é uma serina protease que converte fibrinogênio plasmático solúvel em coágulo de fibrina insolúvel. Em adição, a trombina promove agregação plaquetária. A função da trombina pode ser vista como uma interface entre a fase de hemostasia da cicatrização da ferida e a fase inflamatória que se segue, pois exerce um papel poderoso na montagem da inflamação na ferida. Os efeitos pró-inflamatórios da trombina incluem a estimulação da vasodilatação responsável pelo extravasamento de plasma, edema e expressão aumentada de moléculas de adesão celular endoteliais, que ajudam os monócitos e outras células a extravasarem e se infiltrarem no sítio da ferida. A trombina também induz liberação de citocinas pró-inflamatórias, como CCL2, interleucina-6 (IL-6) e IL-8 pelas células endoteliais. Estas citocinas induzem quimiotaxia de monócitos.14 Além disso, a trombina induz liberação de citocinas inflamatórias pelos monócitos, entre as quais a IL-6, interferon-γ, IL-1β e fator de necrose tumoral-α (TNF-α). Estas citocinas de fase inicial são tipicamente pró-inflamatórias, podendo governar a diferenciação dos monócitos derivados do sangue em macrófagos de ferida M1.15 A quimiotaxia para a ferida também é dirigida pela degradação da fibrina e subsequente ativação do sistema complemento. Como parte deste processo, vários agentes quimiotáticos e citocinas são liberados e, por sua vez, iniciam a fase inflamatória da cicatrização da ferida por meio do recrutamento quimiotático de células imunes transportadas pelo sangue.16 As plaquetas são uma das primeiras fontes de citocinas a realizarem a quimiotaxia de células imunes, bem como a ativação dos macrófagos. Uma vez capturadas pela rede de fibrina, as plaquetas liberam grânulos que atuam como reservatórios de proteínas biologicamente ativas, como RANTES (regulada por ativação e expressa e secretada pela célula T normal, ou CCL5), trombina, fator transformador do crescimento-β (TGF-β), fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) e VEGF. A CCL5 é um dos fatores quimiotáticos de monócitos mais potentes, liberados pelas plaquetas após a lesão. Outras citocinas e quimiocinas que atraem monócitos para o leito da ferida incluem a proteína quimiotática de monócitos-1 (MCP-1) (CCL2), MIP-1α (CCL3), TGF-α, fibronectina, elastina, C5a, C3a, fator de crescimento de nervos e componentes da MEC.17,18

Inflamação A lesão tecidual deflagra uma resposta de fase aguda inflamatória (do latim inflammare, incendiar) que tem a função de preparar o sítio da ferida para o subsequente fechamento da ferida (Fig. 14.4). A inflamação abrange uma série de respostas de tecidos corporais vascularizados à lesão. Os mediadores bioquímicos locais biossintetizados durante a inflamação aguda promovem eventos macroscópicos caracterizados por Celsus, no século I, como sendo de rubor (vermelhidão), tumor (inchaço), calor (calor) e dolor (dor). Aos níveis celular e molecular, a inflamação resulta da coordenação de múltiplos sistemas de receptores e sensores que afetam os programas transcricionais e pós-transcricionais necessários à defesa do hospedeiro e resolução da infecção. Durante a cicatrização normal, a resposta inflamatória é caracterizada por padrões espacial e temporalmente

variáveis de subgrupos de leucócitos específicos.

FIG. 14.4 A resposta inflamatória na ferida.

Plaquetas A formação do coágulo ou do trombo depende da ativação plaquetária. O coágulo sanguíneo rico em plaquetas também captura leucócitos polimorfonucleares (neutrófilos). Isto ajuda a amplificar a coagulação sanguínea e estabelece a base para a resposta de fase aguda inflamatória subsequente. Decorridas algumas horas da aquisição da lesão, numerosos neutrófilos extravasam via transmigração através da parede da célula endotelial dos capilares sanguíneos para o sítio da ferida. Para que isto seja possível, os vasos sanguíneos locais são ativados por citocinas pró-inflamatórias como IL-1β, TNF-α e interferon-γ. Estas citocinas induzem a expressão das moléculas de adesão necessárias à adesão e diapedese dos leucócitos (Fig. 14.5). As moléculas de adesão, como as integrinas, P-selectina e E-selectina, exercem papel central na viabilização da diapedese dos neutrófilos (Fig. 14.6). Estas moléculas de adesão se ligam às integrinas expressas na superfície dos neutrófilos, entre as quais CD11a/CD18 (LFA), CD 11b/CD18 (MAC-1), CD11c/ CD18 (gp150, 95) e CD11d/CD18. Ao lado das citocinas, as quimiocinas exercem papel importante na montagem da inflamação de fase aguda após a lesão. Entre as quimiocinas, estão IL-8, MCP-1 e oncogene relacionado ao crescimento-α. No caso de uma ferida infeccionada, os produtos bacterianos (p. ex., lipopolissacarídeo e peptídeos formil-metionil) podem intensificar o recrutamento de neutrófilos para o sítio da lesão (Fig. 14.7).

FIG. 14.5 Diapedese. Em capilares sadios permeáveis, o revestimento endotelial impede as células sanguíneas de saírem da circulação. Em resposta à lesão, os vasos sanguíneos localizados ao redor do sítio da ferida sofrem vasodilatação, com aumento da permeabilidade dos capilares. Esta alteração permite que as células inflamatórias extravasem através da parede dos capilares e migrem para o sítio da lesão. Este processo inclui a liberação de líquido a partir dos vasos, no espaço extracelular, resultando na resposta edematosa comumente observada durante a inflamação. Os vasos sanguíneos apresentam uma via embutida, que permite que esta diapedese ocorra em resposta à lesão tecidual.

FIG. 14.6 Extravasamento de neutrófilos em resposta à lesão tecidual. Os neutrófilos deslocam-se ao longo dos capilares através de um movimento de rolagem, que é facilitado pela ligação e liberação da L-selectina presente em sua superfície ao sialil-Lewis, um carboidrato ligante expresso na parede interna dos capilares pelas células endoteliais. Quando há uma lesão e/ou infecção, a liberação de lipopolissacarídeos, fator de necrose tumoral-α e interleucina-1 resulta na liberação de L-selectina pelos neutrófilos que, então, aderem firmemente à parede interna do capilar, via ligação das integrinas neutrofílicas às E-selectinas presentes nas células endoteliais. Depois que esta adesão ocorre, o processo de diapedese começa, permitindo que os neutrófilos extravasem para o sítio da ferida.

FIG. 14.7 Diapedese e migração de leucócitos para o sítio da ferida.

Neutrófilos Os neutrófilos atravessam as vênulas pós-capilares nos sítios inflamatórios, degradam patógenos junto aos fagolisossomos e sofrem apoptose. Os neutrófilos exercem uma ampla gama de funções, que variam da fagocitose de agentes infecciosos à depuração de tecidos desvitalizados. Quando cobertos com opsoninas (em

geral, complemento e/ou anticorpos), os micro-organismos se ligam a receptores específicos existentes na superfície dos fagócitos, com consequente invaginação da membrana celular e incorporação do microorganismo para dentro de um fagossomo intracelular. Em seguida, há uma explosão de consumo de oxigênio e grande parte (senão todo) do oxigênio extra consumido é convertida em espécies altamente reativas. Isto é chamado explosão respiratória. Em adição, os grânulos citoplasmáticos liberam seus conteúdos dentro do fagossomo e o micro-organismo ingerido morre logo em seguida. Ente os sistemas antimicrobianos formados no fagossomo, existe um que consiste de mieloperoxidase (MPO), liberada no interior do fagossomo durante o processo de degranulação; peróxido de hidrogênio (H2O2), formado na explosão respiratória; e um halido, em particular o cloreto. O produto inicial do sistema MPO-H2O2-cloreto é o ácido hipocloroso e, subsequentemente, foi proposto que há formação de cloro, cloraminas, radicais hidroxila, oxigênio singlete e ozônio. Estes mesmos agentes tóxicos podem ser liberados para fora da célula, onde podem atacar o tecido normal e, assim, contribuir para a patogênese da doença.19 Outros produtos distribuídos pelos neutrófilos no sítio da ferida incluem agentes antimicrobianos, como os peptídeos catiônicos e eicosanoides, além das proteases como a elastase, catepsina G, proteinase 3 e ativador de plasminogênio do tipo uroquinase. Por estarem relacionados ao processo inflamatório geral deflagrado em resposta à lesão, os neutrófilos são os principais elementos participantes, pois conseguem modificar a função dos macrófagos e, portanto, regular a resposta imune inata durante a cicatrização da ferida.20 Na ausência de neutrófilos, parece que os macrófagos presentes no sítio da lesão ficam sem orientação para conduzir o processo da cicatrização.21 Em uma ferida em processo de cicatrização, a infiltração neutrofílica cessa após alguns dias da aquisição da lesão. Os neutrófilos que participaram do processo são programados para morrerem e os neutrófilos que estão morrendo são reconhecidos pelos macrófagos presentes no sítio da lesão e fagocitados. No sítio da ferida, uma pequena parte dos macrófagos são residentes e a maioria é recrutada a partir da circulação periférica. O extravasamento dos monócitos sanguíneos periféricos é possibilitado pela interação entre a molécula de adesão celular endotelial vascular-1 e o antígeno de monócito bem tardio-4 (integrina α4β1). Os fatores que guiam os monócitos extravasados até o sítio da lesão incluem fatores de crescimento, proteínas quimiotáticas, citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas (p. ex., proteína inflamatória do macrófago-1α, MCP-1 e RANTES). A fonte destes fatores quimiotáticos inclui as plaquetas associadas ao coágulo, os queratinócitos hiperproliferativos da borda da ferida, os fibroblastos do tecido da ferida e subgrupos de leucócitos previamente existentes no sítio da ferida. Depois que os monócitos saem do vaso sanguíneo e transmigram para o sítio da ferida atravessando o microambiente da MEC, o processo de diferenciação dos monócitos em macrófagos é iniciado. Os mediadores presentes no microambiente que os monócitos atravessam para chegar ao sítio da ferida interagem com receptores presentes na superfície dos monócitos, produzindo alterações significativas na constituição transcriptômica e proteômica das células. Alguns exemplos significativos de receptores presentes na superfície do monócito são os receptores toll-like (TLRs: Fig. 14.8), receptores de complemento e receptores de Fc. No sítio da ferida, os macrófagos atuam como células apresentadoras de antígeno e fagócitos removedores de células mortas e debris. Em adição, os macrófagos distribuem uma ampla variedade de fatores de crescimento que são conhecidos pela capacidade de promover o processo de cicatrização de feridas. Estes fatores de crescimento incluem TGF-β, TGF-α, FGF básico (bFGF), VEGF e PDGF e possibilitam a cicatrização da ferida ao promoverem a proliferação celular, síntese de MEC e indução da angiogênese. Os macrófagos exercem papel decisivo na viabilização da cicatrização das feridas. Está comprovado que a depleção de macrófagos prejudica significativamente o fechamento das feridas.4,22

FIG. 14.8 Receptores toll-like: respondendo a agentes infecciosos e ao microambiente da ferida.

Mastócitos Os mastócitos são mais conhecidos por seu papel central na mediação das respostas alérgicas. Além desta função, hoje é sabido que os mastócitos são fisiologicamente importantes no reconhecimento de patógenos e na regulação da resposta imune.23 Os mastócitos podem liberar instantaneamente vários mediadores próinflamatórios de suas reversas intracelulares. Em adição, estão localizados na interface hospedeiro-ambiente. Estas propriedades fazem dos mastócitos elementos essenciais para o ajuste fino das respostas imunes durante a infecção. Estudos recentes, usando ativadores de mastócitos como adjuvantes de vacina efetivos, demonstram o potencial de coletar estas células para conferir imunidade protetora contra patógenos microbianos.24 A ativação do mastócito ajuda a iniciar a fase inflamatória da cicatrização da ferida. Em resposta à lesão, os mastócitos presentes no sítio da ferida degranulam em questão de horas e, assim, são histologicamente silenciados no tecido da ferida. Decorridas cerca de 48 horas da lesão, os mastócitos são vistos novamente no tecido da ferida e aumentam em número à medida que a cicatrização evolui.25 Embora tenha sido relatado o comprometimento da cicatrização de feridas em camundongos deficientes de mastócito,26 os mastócitos também foram implicados na fibrose da pele na ferida.27 Com auxílio de um amplo conjunto de mediadores pré ou recém-formados e liberados por degranulação, o mastócito ativado controla os eventos centrais das fases da cicatrização: deflagração e modulação do estágio inflamatório; proliferação de elementos celulares conectivos; e remodelamento final da matriz tecidual conectiva recém-formada. A importância do mastócito na regulação dos processos de cicatrização também é demonstrada pelo fato de um excesso ou déficit de mediadores biológicos degranulados causarem comprometimento do reparo, com formação de um exuberante tecido de granulação (p. ex., queloides e cicatrizes hipertróficas) atrasarem o fechamento (deiscência) e tornarem crônico o estágio inflamatório.28

Macrófagos Os macrófagos representam o tipo celular predominante na ferida em processo de cicatrização, decorridos 3-5 dias da aquisição da lesão. A função primária aguda dos macrófagos da ferida, que chegam no sítio da lesão horas após a chegada dos neutrófilos, é atuar como fagócitos vorazes limpando da ferida todos os debris de

matriz e celulares, incluindo a fibrina e os neutrófilos apoptóticos. Os macrófagos também produzem uma gama de citocinas, fatores de crescimento e fatores angiogênicos que conduzem à proliferação dos fibroblastos e à angiogênese.4,29-32 Em um estudo clássico, Leibovich e Ross33 demonstraram que o soro antimacrófago combinado à hidrocortisona diminui o acúmulo de macrófagos em feridas cutâneas em processo de cicatrização, em cobaias adultas. Este tipo de depleção resultou no comprometimento da eliminação do tecido danificado e da matriz provisória, prejudicou a contagem de fibroblastos e atrasou a cicatrização. Hoje, o macrófago emerge como um dos principais condutores de um reparo cutâneo eficiente.34,35 Os macrófagos são células plásticas e heterogêneas, amplamente classificadas em dois grupos: macrófagos classicamente ativados ou de tipo I, que são efetores pró-inflamatórios; e macrófagos alternativamente ativados ou de tipo II.36 No tecido inflamado, não está claro se os macrófagos de tipo II que aparecem durante a fase de cicatrização são originários de monócitos recém-chegados ou da mudança do estado de ativação de macrófagos previamente pró-inflamatórios. A primeira população de macrófagos a participar da inflamação pode mudar de fenótipo e assumir o papel de cessar a inflamação.37,38 Os macrófagos presentes em feridas diabéticas exibem respostas inflamatórias disfuncionais.39 O estado inflamatório persistente dos macrófagos de feridas diabéticas é devido ao comprometimento da capacidade destas células de fagocitar células apoptóticas no sítio da ferida, que previne a mudança fenotípica de M1 para M2.39

Resolução da inflamação As respostas inflamatórias deflagradas pela lesão somente são úteis ao processo de cicatrização quando ocorrem no momento certo e são transientes. A inflamação descontrolada prejudica a cicatrização da ferida.39 A resolução completa de uma resposta inflamatória aguda é o resultado final ideal, subsequente a uma agressão. Para que a resolução ocorra, o recrutamento de leucócitos adicionais deve ser interrompido e acompanhado da remoção dos leucócitos do sítio inflamatório. A resolução da inflamação é executada por alguns fatores essenciais. No sítio da ferida, a fagocitose bem-sucedida dos neutrófilos mortos pelos macrófagos é um fator decisivo. O comprometimento da função do macrófago no sítio da ferida arruína a resolução da inflamação.39 Os mediadores lipídicos, como as lipoxinas, resolvinas, protectinas e as recém-identificadas maresinas emergiram como um novo gênero de poderosos componentes estereosseletivos que contrarregulam a inflamação aguda excessiva e estimulam eventos moleculares e celulares definidores da resolução.40 O êxito da resolução abre caminho para que o processo de cicatrização avance rumo ao fechamento bem-sucedido da ferida. A inflamação prolongada pode não só comprometer o fechamento da ferida como também piorar o resultado final da formação da cicatriz.41,42

Infecção A infecção é um problema comum nas feridas crônicas, que frequentemente resulta na não cicatrização e em taxas significativas de morbidade e mortalidade entre os pacientes.43 A infecção da ferida e a subsequente liberação de moduladores pró-inflamatórios resulta em dor e atraso da cicatrização. A dor, por sua vez, compromete a resposta imune à infecção.44 Todas as feridas são contaminadas por bactérias oriundas da pele adjacente, do ambiente local e das fontes autólogas do paciente. O ambiente local é particularmente relevante para pacientes internados. A colonização é definida pela presença de bactérias proliferantes na ausência de uma resposta perceptível do hospedeiro. A colonização da ferida pode intensificar ou impedir a cicatrização da ferida, dependendo da carga bacteriana. As cargas bacterianas superiores a 105 organismos/g de tecido ameaçam a cicatrização da ferida, embora este limiar possa ser alterado pelo estado do sistema imune do hospedeiro, bem como pelo número e tipos de espécies bacterianas presentes. O conceito de colonização crítica é controverso e não universalmente aceito. A colonização crítica é caracterizada por uma carga bacteriana aumentada ou infecção encoberta e a ferida pode entrar em um estágio inflamatório crônico não cicatrizante. Uma colonização substancial pode não causar os sinais evidentes de inflamação, mas provavelmente afetará a cicatrização da ferida que, por sua vez, será falha ou terá progressão lenta. Os sinais de colonização grave são a atrofia ou deterioração do tecido de granulação; descoloração do tecido de granulação em uma cor cinza ou vermelho-escuro; aumento da friabilidade da ferida; e aumento da drenagem. A transição para infecção ocorre quando a proliferação bacteriana supera a resposta imune do hospedeiro e este sofre uma lesão. Vários fatores determinam a transição da colonização para infecção: a própria biocarga em si; a virulência dos organismos; a ação sinérgica de diferentes espécies bacterianas; e a capacidade do hospedeiro de montar uma resposta

imune.43 Ao longo da última década, houve uma rápida evolução do conhecimento acerca do reconhecimento imune inato de componentes microbianos e seu papel decisivo na defesa do hospedeiro contra a infecção. O conceito inicial de imunidade inata era o da imunidade que reconhecia os micróbios de maneira inespecífica. Entretanto, a descoberta dos TLRs (Fig. 14.8), na metade da década de 1990, mostrou que o reconhecimento dos patógenos pelo sistema imune inato é na verdade específico, baseado nos receptores de reconhecimento de padrões (PRRs) codificados na linhagem germinativa, que evoluíram para detectar componentes de patógenos estranhos, referidos como padrões moleculares associados a patógenos (PAMPs).45 Os TLRs regulam as respostas imunes inata e adaptativa e são importantes como modulares da inflamação durante as respostas de cicatrização de feridas. A descoberta de que há ativação da sinalização por TLR durante o dano tecidual em vários contextos patológicos, na ausência de infecção, sugere a existência de moléculas endógenas que atuam como agonistas de TLR. Entretanto, não foi esclarecido se esta resposta é biologicamente importante para a manutenção da hemostasia, do mesmo modo como o reparo tecidual, ou se este reconhecimento é apenas acidental. É notável o fato de a infecção microbiana deflagrar a produção de moléculas endógenas modificadas (como a proteína B1 do grupo de alta mobilidade, os fosfolipídios oxidados, a β-defensina 2 e os ácido nucleicos) que são reconhecidas por TLRs ou outros PRRs citosólicos. Isto pode sugerir que estas moléculas endógenas, aliadas aos PAMPs, atuam como adjuvantes na ativação de programas de imunidade inata via TLRs e/ou outros PRRs, e que exercem papéis essenciais na facilitação da imunidade adaptativa contra micróbios infecciosos. As feridas crônicas possuem uma flora colonizadora complexa que muda com o passar do tempo. Staphylococcus aureus e estafilococos coagulase negativos são os organismos mais comumente isolados. As feridas crônicas são colonizadas por múltiplas espécies bacterianas que, uma vez estabelecidas, podem persistir na ferida. Nas úlceras venosas crônicas de perna, as bactérias mais comumente observadas, em ordem de abundância, são: S. aureus, Enterococcus faecalis, Pseudomonas aeruginosa, estafilococos coagulase negativos, Proteus spp. e bactérias anaeróbicas. As espécies bacterianas residentes (colonizadoras) comumente estão presentes nas úlceras. Quanto mais tempo uma úlcera permanece não cicatrizada, maior é a probabilidade de que venha a adquirir múltiplos organismos aeróbicos e uma significativa população anaeróbica. As feridas crônicas costumam ser agravadas por uma isquemia subjacente e, assim, tendem a apresentar um baixo nível de oxigenação tecidual. Isto facilita o crescimento de organismos anaeróbicos nas feridas isquêmicas. A distribuição adequada de oxigênio ao tecido da ferida é vital para a ótima cicatrização e resistência à infecção.46 A internação, procedimentos cirúrgicos e terapia antibiótica prolongada ou de amplo espectro podem predispor os pacientes à colonização ou infecção, ou a ambas, por organismos resistentes, incluindo S. aureus (resistente à meticilina [MARSA]) ou enterococos resistentes à vancomicina.43 Como as respostas inflamatórias à invasão microbiana podem estar diminuídas em indivíduos diabéticos, os sinais clínicos de infecção muitas vezes estão ausentes em indivíduos com úlceras diabéticas no pé, em que a infecção é limitada ao tecido localizado.47

Biomembrana (Biofilm) Os micro-organismos nem sempre vivem como culturas puras de células isoladas dispersadas. Em vez disso, acumulam-se nas interfaces para formar agregados polimicrobianos, como películas, cachos, sedimento ou biomembranas. O estado de biomembrana de micro-organismos pode levar ao aumento da virulência e propensão a causar infecção. Na maioria das biomembranas, os micro-organismos representam menos de 10% da massa seca, enquanto a matriz pode representar mais 90%. A matriz é o material extracelular, produzido principalmente pelos próprios organismos, em que as células da biomembrana ficam incrustadas. Consiste num conglomerado de diferentes tipos de biopolímeros – conhecidos como substâncias poliméricas extracelulares (SPE) – que forma a armação da arquitetura tridimensional da biomembrana e é responsável pela adesão a superfícies e coesão na biomembrana. A formação de uma biomembrana proporciona um estilo de vida totalmente diferente do estado planctônico. Embora as interações precisas e moleculares realizadas pelos vários polímeros da matriz da biomembrana secretados ainda sejam indefinidas, e as contribuições destes componentes à integridade da matriz sejam pouco conhecidas ao nível molecular, várias funções dos SPE foram determinadas e mostram uma ampla gama de vantagens proporcionadas pelo estilo de vida em biomembrana. A arquitetura das biomembranas é influenciada por muitos fatores, incluindo condições hidrodinâmicas, concentração de nutrientes, motilidade bacteriana e comunicação intercelular, bem como pelos

exopolissacarídeos e proteínas.48 As feridas crônicas oferecem condições atraentes para a produção da biomembrana, pois contêm proteínas (colágeno, fibronectina) e tecidos danificados que possibilitam a fixação. A biomembrana impede a cicatrização das feridas crônicas. A maioria dos patógenos presentes nas feridas crônicas, como MARSA e Pseudomonas spp., são produtores de biomembrana típicos. Em comparação às bactérias encontradas na forma planctônica de vida livre, as bactérias residentes em biomembranas maduras são altamente resistentes às terapias antibióticas tradicionais. As bactérias presentes nas biomembranas crescem mais devagar e o crescimento mais lento pode acarretar diminuição da captação do fármaco e outras alterações fisiológicas que podem prejudicar a efetividade do medicamento.43

Vascularização Feridas crônicas podem ser fechadas pela difusão do oxigênio a partir dos vasos sanguíneos intactos adjacentes, ou as feridas agravadas por uma isquemia subjacente, dependem amplamente da vascularização da ferida para que o seu fechamento ocorra. A vascularização da ferida pode ser alcançada por angiogênese ou vasculogênese. A angiogênese representa o brotamento de capilares a partir de vasos sanguíneos preexistentes no tecido da borda da ferida. A vasculogênese consiste na formação de novos vasos sanguíneos via mobilização de célulastronco endoteliais derivadas da medula óssea. A vascularização da ferida é regulada por todas as fases, na cicatrização da ferida – hemostasia, inflamação, formação de tecido e remodelamento tecidual. O tampão hemostático fornece um leito para as células transportadas pelo sangue se alojarem. Depois que as células se emaranham neste tampão, o ambiente da MEC modifica a função celular para uma cicatrização bem-sucedida. As plaquetas presentes no coágulo atuam como fonte de fatores de crescimento e citocinas, que recrutam vários tipos celulares, incluindo células endoteliais para o sítio da ferida. Durante a fase inflamatória, os leucócitos presentes no sítio da ferida atuam como uma das principais fontes de fatores pró-angiogênicos, como o VEGF-A e IL-8, que constituem a base inicial para a vascularização bem-sucedida do tecido da ferida. Conforme os neutrófilos vão sendo consumidos e morrem, o número de macrófagos no sítio da ferida aumenta substancialmente. O TGF-β, TGF-α, bFGF, PDGF e VEGF derivados dos macrófagos exercem papel essencial no direcionamento da angiogênese na pele da ferida. Evidências crescentes mostram que nenhum fator isolado é singularmente efetivo para influenciar de modo significativo o destino final da ferida. A vascularização da ferida é um processo sofisticado que requer uma interação dinâmica entre as células, fatores angiogênicos e MEC, regulada temporal e espacialmente. A Figura 14.9 ilustra os processos decisivos na vascularização tecidual. Os sinais angiogênicos são deflagrados por sinais do microambiente (p. ex., hipóxia) e amplificados por fatores angiogênicos (p. ex., VEGF) expressos e liberados por células presentes no sítio da ferida. O VEGF foi originalmente identificado como um fator de crescimento específico da célula endotelial estimulador da angiogênese e da permeabilidade vascular. Alguns membros da família do VEGF, VEGF C e VEGF D estão envolvidos especificamente na linfangiogênese. A ligação destes fatores angiogênicos aos receptores correspondentes deflagra uma multitude de processos sinalizadores celulares que ativam as células endoteliais microvasculares. O VEGF e seus receptores tirosina quinase endoteliais, por exemplo, são reguladores centrais da vascularização tecidual. A sinalização do VEGF através do VEGFR-2 é a principal via angiogênica. O VEGFR-3 também é comprovadamente importante para a angiogênese, atuando ao lado do VEGF/VEGFR-2 e Dll4/Notch na sinalização de controle do brotamento angiogênico.49 A importância biológica de outros fatores angiogênicos, como EGF e bFGF, é mediada por seus receptores correspondentes, que também pertencem à família de receptores tirosina quinase EGFR, FGFR-1, FGFR-2, FGFR-3 e FGFR-4.

FIG. 14.9 Neoangiogênese: formação de novos vasos sanguíneos. VEGF, fator de crescimento endotelial vascular; MEC, matriz extracelular.

Outros receptores tirosina quinase de importância notável, com relação a este aspecto, são Tie-1 e Tie-2. Aliados ao receptor do VEGF, são os únicos receptores tirosina quinase específicos da célula endotelial conhecidos. Tie-2 é induzido no endotélio dos vasos novos que se formam nas feridas cutâneas, e sua expressão vai sendo inibida com a regressão dos vasos recém-formados. Como indicação da ativação de Tie-2, a fosforilação de Tie-2 é detectada em feridas cutâneas em todos os estágios do processo de cicatrização.50 As células endoteliais microvasculares ativadas respondem proliferando e essa proliferação é seguida pela migração direta destas células. A migração é um processo complexo, em que as células se movem numa dada direção, seja em resposta a alterações no ambiente extracelular ou como consequência de uma propensão intrínseca ao movimento direcionado. O remodelamento da MEC por ação de proteases promove a migração celular, que é um evento decisivo na formação de vasos novos. A regulação temporal e espacial dos eventos de remodelamento da MEC permite a ocorrência de alterações na deposição ou degradação líquida da matriz que, por sua vez, contribui para o controle do crescimento, migração e diferenciação celular durante os diferentes estágios da angiogênese. Os fatores de crescimento ligados à matriz liberados pelas proteases e/ou por fatores angiogênicos promovem angiogênese intensificando a migração e o crescimento endotelial. As moléculas da matriz promovem crescimento e morfogênese das células endoteliais, e/ou estabilizam os vasos sanguíneos nascentes. Sendo assim, as moléculas e os eventos de remodelamento da MEC exercem papel essencial na regulação da angiogênese.51 A formação de vasos capilares-like é específica das células endoteliais e integral ao processo de angiogênese. A membrana basal representa uma MEC funcional altamente especializada, cuja superfície basal não luminal repousam as células endoteliais. Esta matriz forma uma manga ao redor das células endoteliais e mantém as estruturas semelhantes a tubos dos vasos sanguíneos. Há mais de 20 anos, Kubota et al. observaram que as células endoteliais plaqueadas em uma matriz de membrana basal reconstituída rapidamente se fixavam, alinhavam e formavam túbulos semelhantes a capilares. As células não proliferavam. Os vasos assim formados apresentam um lúmen e contatos célula-célula firmes. As células são polarizadas com os núcleos em posição basal, na direção da matriz da membrana basal. Em adição, as estruturas capilares-like captam lipoproteínas de baixa densidade acetiladas, que são um dos marcadores de diferenciação destas células.52 A angiogênese não só depende da invasão e proliferação das células endoteliais, como também requer a cobertura dos brotamentos vasculares pelos pericitos para estabilização do vaso. Estes processos são coordenados pelo VEGF e PDGF através de seus receptores cognatos presentes nas células endoteliais e nas células musculares lisas vasculares, respectivamente.53 O suporte estrutural para os vasos sanguíneos é fornecido aos pericitos e células musculares lisas vasculares. Os pericitos normais estão encrustados na membrana basal dos capilares, seja como células solitárias ou formando uma camada celular única, onde coordenam a sinalização intercelular com as células

endoteliais e outros componentes do vaso sanguíneo, para prevenir vazamentos. Em contraste, as células musculares lisas vasculares formam uma camada única ou múltiplas camadas em torno das artérias e veias, para mediar o tônus e a contração vasculares. A cobertura de pericitos se faz necessária à estabilização dos tubos endoteliais imaturos.54 Os pericitos possuem outras funções, além da angiogênese, que são relevantes à cicatrização das feridas. Os pericitos cutâneos podem atuar como células-tronco mesenquimais (CTMs), com capacidade de se diferenciarem nas linhagens de osso, tecido adiposo e cartilagem. Desta forma, os pericitos representam uma poderosa população de células-tronco na pele, com capacidade de modificar o microambiente da MEC e promover renovação do tecido epidérmico a partir de células que não são células-tronco.55

Fechamento da ferida A contração e reepitelização da ferida contribuem para o fechamento de feridas que cicatrizam por intenção secundária. A contração da ferida representa uma resposta inicial à lesão, cujo objetivo é justapor as bordas de uma ferida aberta.56 Esta fase inicial do fechamento da ferida parece ser mediada por uma força contrátil, do tipo “bolsa de tabaco” produzida por uma faixa circunferencialmente disposta de células epidérmicas fusiformes, situada na margem da ferida.57 Os fibroblastos presentes no tecido da borda da ferida exercem um papel essencial na contração da ferida.58 Durante a fase inflamatória da cicatrização da ferida, os fibroblastos adquirem características de célula muscular lisa e se diferenciam em miofibroblastos contráteis. A primeira transição fenotípica dos fibroblastos da borda da ferida nos conhecidos protomiofibroblastos é caracterizada pela neoformação de fibras de estresse de actina β-citoplasmática contrátil e ocorre em resposta às citocinas pró-fibróticas e às propriedades alteradas da MEC. Em presença de TGF-β1 em um ambiente mecanicamente restrito, estas células expressam a actina muscular lisa de novo, que aumenta significativamente a sua atividade contrátil e é uma das principais características do miofibroblasto diferenciado.59 A contração da ferida pode contribuir de modo significativo para o fechamento, embora esta contribuição seja bem maior em roedores de pele solta do que em seres humanos. Em uma ferida aberta que sofreu contração, a restauração de uma barreira epidérmica intacta é possibilitada pela epitelização da ferida, também conhecida como reepitalização.60,61 Uma ferida não epitelizada não é considerada “cicatrizada”, não importa o quão perfeitamente restauradas possam estar as estruturas dérmicas subjacentes. Assim, a epitelização da ferida, também chamada reepitelização, é um aspecto essencial e definidor do reparo da ferida e pode ser vista teoricamente como sendo o resultado de três funções sobrepostas dos queratinócitos: migração, proliferação e diferenciação. Em geral, acredita-se que a sequência de eventos pelos quais os queratinócitos cumprem a tarefa de promover a reepitelização começa com a dissolução dos contatos célula- célula e célula-substrato. A isto, segue-se a polarização e iniciação da migração direcionada na base e em um subgrupo de queratinócitos suprabasilares sobre a matriz provisória da ferida. Um subgrupo de queratinócitos imediatamente adjacente (e não junto) ao leito da ferida entra em mitose. Enfim, observa-se uma deposição de múltiplas camadas de epiderme recém-formada, bem como indução de produtos genéticos específicos de diferenciação para restaurar a funcionalidade da epiderme. O fator mais limitante na reepitelização é a migração, uma vez que os defeitos dessa função, e não os defeitos de proliferação nem diferenciação, estão associados ao fenótipo clínico de feridas crônicas que não cicatrizam.62 O processo de epitelização prossegue até a barreira ser restabelecida e a ferida, coberta. O processo de reepitelização é acelerado por um ambiente úmido63,64 e facilitado por uma enzima da matriz, a metaloproteinase 1, que diminui a afinidade dos contatos colágeno-integrina.65

Fase proliferativa A fase proliferativa começa em cerca de 2 dias após a aquisição da lesão e normalmente dura até 3 semanas, em uma ferida cutânea em processo de cicatrização. Esta fase se sobrepõe à fase inflamatória e sustenta a reepitelização, formação de vasos novos, além do influxo de fibroblastos e deposição da MEC. No momento em que esta fase começa, a degradação do coágulo de fibrina pelos macrófagos já está em curso, e as células endoteliais e fibroblastos invasores preenchem rapidamente o espaço antes ocupado pelo coágulo. Os fibroblastos migratórios produzem as citocinas que induzem a migração e proliferação dos queratinócitos.66 Os macrófagos ativados produzem várias citocinas, como PDGF e TNF-α, que também induzem os fibroblastos a produzirem fator de crescimento de queratinócito. Este fator, por sua vez, induz a reepitelização da ferida.60,61

Tecido de granulação O coágulo de fibrina formado durante a hemostasia participa da fase inflamatória inicial e é substituído por um tecido conectivo fibroso e perfundido, que cresce a partir da base de uma ferida e é capaz de preencher feridas de praticamente qualquer tamanho. Durante a fase proliferativa da cicatrização da ferida, este tecido de granulação exibe cor vermelho-claro ou rosa-escuro, por causa da perfusão pelas novas alças capilares. É suave ao toque, úmido e exibe aspecto granular. O tecido de granulação serve de leito para o reparo tecidual. A MEC de tecido granular é criada e modificada pelos fibroblastos. A princípio, consiste numa rede de colágeno tipo III, uma forma mais fraca da proteína estrutural que pode ser produzida rapidamente. Este colágeno é posteriormente substituído por colágeno tipo I, cujas fibras são mais longas e fortes, como evidenciado no tecido da cicatrização. A formação e contração do tecido de granulação representam aspectos integrais da ferida em cicatrização. Nas feridas isquêmicas, a contração do tecido de granulação é comprometida pela função defeituosa dos miofibroblastos, que são as células responsáveis pela contração do tecido de granulação.67

Feridas crônicas Em geral, uma ferida é considerada crônica quando não está cicatrizada em 4 semanas. As feridas crônicas também foram definidas como sendo feridas que não apresentam redução de 20%-40% de sua área após 2-4 semanas de terapia ideal. Os livros-texto de cirurgia definem as feridas crônicas como feridas que, decorridos 3 meses, ainda não cicatrizaram. As feridas crônicas podem ser amplamente classificadas em três categorias principais: úlceras venosas e arteriais, úlceras diabéticas e úlceras de pressão.

Úlceras venosas As úlceras venosas (úlceras de estase ou úlceras varicosas) são feridas consideradas resultantes do funcionamento inadequado de valvas venosas, usualmente das pernas. São a principal causa de feridas crônicas, representando 50%-70% dos casos de feridas crônicas.68 As úlceras venosas desenvolvem-se principalmente ao longo da porção medial distal da perna e podem ser bastante dolorosas. De acordo com a classificação revisão da clínica, etiologia, anatomia e fisiopatologia (classificação CEAP) da doença venosa crônica, publicada em 2004, uma úlcera venosa é definida como um defeito cutâneo de espessura integral, mais frequentemente localizado na região do tornozelo, que falha em cicatrizar de maneira espontânea e é sustentado por uma doença venosa crônica.69 Sistematicamente, uma úlcera venosa pode ser definida como um defeito cutâneo circundado por pigmentação e acompanhado de dermatite, localizado na parte inferior da perna (em geral, na região abrangida por uma polaina), que está presente há mais de 30 dias, é caracterizado por uma persistente hipertensão venosa e anomalia funcional venosa (resultante de refluxo venoso e/ou obstrução confirmada por avaliação hemodinâmica e/ou fisiológica), na ausência de uma causa primária ou associada de origem arterial, imunológica, endócrina ou sistêmica. Admite-se que as úlceras podem ser causadas puramente por patologias venosas, como o refluxo ou obstrução venosa. Quando estas anormalidades ocorrem combinadas a condições patológicas adicionais, contribuem para a produção e perpetuação da úlcera. Esta última situação inclui as comorbidades, como isquemia arterial, inchaço e linfedema, traumatismo, distúrbios autoimunes, condições neurotróficas e vasculopatia diabética. Estas úlceras são classificadas como sendo de origem mista, em que o componente venoso pode ou não exercer papel dominante. O tratamento bem-sucedido destas úlceras inclui não só o componente venoso como também o controle concomitante da comorbidade.

Úlceras arteriais Como as úlceras arteriais e venosas tipicamente ocorrem na parte inferior da perna, distingui-las pode ser uma tarefa desafiadora para os profissionais que cuidam de feridas. Entretanto, estes dois tipos de úlceras possuem características fisiopatológicas e vias de controle bastante diferentes. A causa mais comum das úlceras arteriais é a aterosclerose. Os fatores de risco de desenvolvimento de aterosclerose incluem a idade, tabagismo, diabetes melito, hipertensão, dislipidemia, história familiar, obesidade e estilo de vida sedentário.70 A isquemia e a necrose são consequências comuns. A insuficiência arterial, tanto aguda como crônica, pode levar à formação de úlceras nos membros inferiores. A insuficiência arterial pode ocorrer em qualquer nível, desde as grandes artérias até as arteríolas e capilares. A isquemia tecidual que leva ao aparecimento de úlceras na perna tende a ser mais frequente no contexto de doença em vaso de grande calibre ou na doença mista. A claudicação

vascular, seja com o exercício, à noite ou durante o repouso, frequentemente é a característica mais distintiva das úlceras arteriais. A determinação do índice tornozelo-braquial fornece uma indicação da capacidade de cicatrização do paciente. Mesmo assim, os pacientes diabéticos exibem um índice tornozelo-braquial falsamente elevado secundário à calcificação vascular. Os pacientes com úlceras arteriais devem receber um suprimento sanguíneo aumentado/adequado à cicatrização, e são mais beneficiados pelos procedimentos de revascularização. É preciso notar que a insuficiência arterial pode agir de modo combinado a outros mecanismos patológicos, acarretando necrose tecidual e ulceração. As úlceras diabéticas podais, por exemplo, podem ser resultantes da combinação de neuropatia, traumatismo e insuficiência arterial.

Úlceras diabéticas As úlceras diabéticas são as lesões podais que mais comumente resultam em amputação de membro inferior (Figs. 14.10 e 14.11). No diabetes, os efeitos da neuropatia periférica, vasculopatia periférica e infecção muitas vezes se combinam para favorecer o desenvolvimento de úlceras diabéticas que podem causar gangrena e amputação. Indivíduos diabéticos, assim como indivíduos não diabéticos, podem desenvolver doença aterosclerótica em artérias de médio e grande calibre, como a aterosclerose aortoilíaca e femoropoplítea. Entretanto, uma doença aterosclerótica significativa nos segmentos infrapoplíteos é particularmente comum na população diabética. A arteriopatia digital subjacente, quando composta por uma úlcera infeccionada em estreita proximidade, pode resultar na perda total dos acessórios digitais e precipitar uma gangrena. A causa da prevalência desta forma de arteriopatia em diabéticos é considerada resultante de algumas anormalidades metabólicas, incluindo os altos níveis de lipoproteína de baixa densidade e de lipoproteína de densidade muito baixa; níveis plasmáticos elevados de fator de von Willebrand; inibição da síntese de prostaciclina; níveis plasmáticos elevados de fibrinogênio; e aumento da adesividade plaquetária.71 Quando a insuficiência arterial periférica agrava a neuropatia, há um risco 10 vezes maior de a ulceração progredir para infecção, gangrena e amputação.72

FIG. 14.10 Pé diabético isquêmico.

FIG. 14.11 Úlcera diabética no pé.

A neuropatia sensorial periférica afeta 50% dos pacientes diabéticos e é atribuída à hiperglicemia crônica. É uma das principais causas de ulceração no pé e amputação de membro inferior. Além do controle precário da glicose, os fatores de risco cardiovasculares tradicionais de doença microvascular são fatores de risco independentes de incidência de neuropatia periférica. Em adição, dados fornecidos pela coorte EURODIAB sugerem que o sexo feminino pode atuar como fator de risco independente. Isto dificulta a identificação dos componentes diabetes-específicos da neuropatia.73 As lesões nervosas do pé também podem ser causadas por feridas perfurantes. As sequelas deixadas por este tipo de lesão dependem do nervo lesado e do nível de lesão. No pé e tornozelo, a principal função dos nervos é conferir sensibilidade. Em geral, o nervo tibial e seus ramos (ou seja, os nervos plantares medial e lateral) inervam a musculatura intrínseca, embora o nervo peroneal profundo inerve os músculos extensor curto dos artelhos e extensor curto do hálux (Fig. 14.12). A remoção destes nervos motores pode produzir os dedos do pé em garra, devido ao resultante desequilíbrio entre os músculos intrínsecos e extrínsecos. A morbidade a longo prazo associada às lesões de nervos do pé está predominantemente relacionada à lesão de nervos sensoriais, exceto quando a lesão do nervo tibial causa perda da função da musculatura intrínseca. Os dois problemas principais associados às lesões nestes nervos são a falta de sensibilidade junto à distribuição distal do nervo (Fig. 14.12) e a formação de um neuroma doloroso. Quando a lesão de nervo ocorre em uma área do pé que sustenta peso, a presença de um neuroma doloroso muitas vezes leva ao desenvolvimento da síndrome da dor regional complexa de tipo I.74

FIG. 14.12 Inervações cutâneas do pé.

Úlceras de pressão Uma úlcera de pressão é uma lesão localizada na pele ou tecidos subjacentes, usualmente sobre alguma proeminência óssea, que resulta da aplicação de pressão não aliviada. As úlceras de pressão ou feridas de pressão representam um problema de saúde comum, particularmente entre idosos com limitações físicas ou confinados ao leito. As úlceras de pressão localizadas nas nádegas afetam quase todos os cadeirantes. O termo “úlcera de pressão” é um termo geral que abrange diversas lesões teciduais, desde as feridas superficiais no calcanhar até as feridas de pressão profundas localizadas nas nádegas. Como as forças de compressão, forças de cisalhamento e/ou atrito são suas principais causas subjacentes, há quem chame estas lesões de úlceras de decúbito.75 As úlceras de pressão ocorrem em cerca de 5%-15% dos pacientes das casas de repouso, instituições de assistência médica e hospitais. As úlceras de pressão são dolorosas, diminuem a qualidade de vida, aumentam a suscetibilidade a infecções, risco de morte e carga de trabalho do cuidador, e geram despesas significativas.76 Os fatores predisponentes são classificados como intrínsecos (p. ex., mobilidade limitada, nutrição precária, comorbidades, pele envelhecida) ou extrínsecos (p. ex., pressão, atrito, cisalhamento, umidade). Quando uma úlcera se forma, a documentação de cada úlcera (ou seja, tamanho, localização, presença de escara e tecido de granulação, exsudato, odor, tratos sinusais, escavação e infecção) e o estadiamento correto são essenciais para a avaliação da ferida.77 Apesar de haver poucas dúvidas de que as úlceras de pressão estejam relacionadas com a agressão mecânica ao tecido mole, foram desenvolvidas várias hipóteses pertinentes à ligação existente entre carga mecânica e necrose tecidual. Estas duas hipóteses principais abordam a deformação e isquemia teciduais.78 A destruiçãoo do tecido mole induzida por pressão causa necrose celular. A existência de uma relação tempo/tensão implica que o tempo de fato exerce algum papel. Em outras palavras, a aplicação de uma carga externa sobre um tecido por tempo prolongado ou de maneira crônica resulta na formação de uma úlcera. A prevenção inclui a identificação de indivíduos de alto risco e a implementação de medidas preventivas específicas, como seguir um esquema de reposicionamento do paciente; manter a cabeceira do leito na menor elevação considerada segura para evitar o cisalhamento; e usar superfícies redutoras de pressão. A isquemia é um estado causado pela falta de suprimento sanguíneo a um dado tecido. A hipótese propõe que a aplicação de uma carga mecânica ao tecido impinge os vasos sanguíneos arteriais e, assim, causa isquemia local. Como as células dependem de oxigênio, calor e dos nutrientes transportados pelo sangue, acabam se tornando hipóxicas e subsequentemente necróticas.

Isquemia e oxigenação tecidual As complicações vasculares comumente associadas a feridas problemáticas são as responsáveis primárias pela isquemia destas feridas. As limitações da capacidade da vasculatura de levar sangue rico em O2 ao tecido da ferida acarretam, entre outras consequências, hipóxia. A hipóxia consiste na diminuição da distribuição de oxigênio para níveis inferiores à demanda tecidual. A isquemia, por outro lado, é a falta de perfusão, caracterizada não só por hipóxia como também por um suprimento de nutrientes insuficiente.79 A hipóxia, por definição, é um termo relativo. É definida por uma pressão parcial de oxigênio (pO2) tecidual mais baixa, para a qual o elemento tecidual específico em questão é ajustado sob condições saudáveis, in vivo. Dependendo da magnitude, as células que confrontam um desafio hipóxico induzem uma resposta adaptativa que envolve o aumento das taxas de glicólise e conservação de energia, ou sofrem morte celular. Em geral, a hipóxia aguda leve a moderada sustenta a adaptação e sobrevivência. Em contraste, a hipóxia extrema crônica leva à perda tecidual. Enquanto o tecido tumoral é metabolicamente projetado para resistir sob condições de hipóxia, a hipóxia de uma ferida primariamente causada por limitações vasculares é intensificada por condições concomitantes (p. ex., infecção, dor, ansiedade e hipertermia) e leva a resultados finais desfavoráveis à cicatrização. O oxigênio e seus derivados reativos (Fig. 14.13) são necessários à síntese de energia derivada do metabolismo oxidativo, síntese proteica e maturação (hidroxilação) de matrizes extracelulares, como a de colágeno. O oxigênio molecular também é requerido para síntese de óxido nítrico (NO) que, por sua vez, exerce papel central na regulação do tônus vascular e angiogênese. No contexto de uma ferida, grandes quantidades de oxigênio molecular são parcialmente reduzidas para formar espécies reativas de oxigênio (EROs). Entre as EROs, estão os radicais livres de oxigênio, como os ânions superóxido, bem como seu derivado não radical, o peróxido de hidrogênio (H2O2). O radical ânion superóxido é um produto de redução de um elétron do oxigênio. As NADPH oxidases representam uma das principais fontes de radicais ânion superóxido no sítio da ferida. As NADPH oxidases presentes nas células fagocíticas ajudam a enfrentar a infecção. O ânion superóxido também direciona a sinalização celular endotelial, como aquela requerida durante a angiogênese. Nos tecidos biológicos, o radical ânion superóxido é rapidamente dismutado em peróxido de hidrogênio, seja de modo espontâneo ou facilitado por enzimas denominadas superóxido dismutases. O peróxido de hidrogênio endógeno dirige a sinalização redox, que consiste numa rede molecular de propagação de sinal sustentadora de eventos essenciais da cicatrização de feridas, como migração celular, proliferação e angiogênese. O peróxido de hidrogênio derivado de neutrófilos pode ser usado pela MPO para mediar a peroxidação de íons cloreto, resultando na formação de ácido hipocloroso (HOCl), um poderoso agente desinfectante (Fig. 14.13).

FIG. 14.13 Oxigênio molecular e seus derivados na cicatrização de feridas. ATP, trifosfato de adenosina; NO, óxido nítrico.

Três fatores principais podem contribuir para a hipóxia tecidual: (1) vasculopatias periféricas que garroteiam o suprimento de O2; (2) demanda aumentada de O2 do tecido em cicatrização; e (3) geração de EROs via explosão respiratória e para sinalização redox.80 Outros fatores relacionados, como a hipóxia arterial (p. ex., fibrose pulmonar ou pneumonia, resposta simpática à dor, hipotermia, anemia decorrente de perda de sangue significativa, cardiopatia cianótica, altitude elevada), também podem contribuir para a hipóxia. Dependendo de fatores como estes, é importante reconhecer que a hipóxia da ferida pode variar de uma quase anóxia a uma hipóxia leve a modesta. Neste contexto, também é importante considerar que as medidas pontuais realizadas no tecido da ferida podem não fornecer um panorama completo da biologia tecidual da ferida, dada a probabilidade de que a magnitude da hipóxia na ferida não esteja uniformemente distribuída em todo o tecido afetado, sobretudo nas feridas amplas. Isto é mais provável nas feridas crônicas clinicamente manifestadas como o oposto das feridas experimentais, que por natureza são mais controladas e homogêneas. Em qualquer ferida problemática encontrada na clínica, é provável que existam bolsas de quase anóxia e bolsas de hipóxia em diferentes graus (Fig. 14.14). Como elo mais fraco da cadeia, o tecido localizado perto das bolsas de quase anóxia será vulnerável à necrose que, por sua vez, pode propagar dano tecidual secundário e infecção. As bolsas de hipóxia extrema podem estar inundadas por fatores angiogênicos induzíveis por hipóxia, mas falharão em apresentar vascularização funcional por possuírem uma concentração insuficiente de O2, que é necessário para alimentar o processo de reparo. De fato, a expressão descontrolada de VEGF e seus receptores leva a uma angiogênese cutânea insuficiente.81 Outra preocupação é a responsividade ao O2 das células presentes nas bolsas de hipóxia extrema. Mesmo que estas células possam ter ultrapassado o ponto sem volta da curva de sobrevida, a correção da oxigenação tecidual provavelmente ajudará a depurar o tecido morto ou moribundo e a substituir o espaço vazio com células adjacentes proliferantes. As bolsas de hipóxia leve ou moderada são propensas a serem o ponto de origem de uma resposta angiogênica bem-sucedida, enquanto outras barreiras (p. ex., infecção e alterações epigenéticas) continuarem reduzidas ao mínimo.

FIG. 14.14 Distribuição heterogênea do oxigênio no tecido da ferida: bolsas de níveis graduados de hipóxia. O sombreado azul representa a hipóxia graduada. O sombreamento vermelho ou rosa representa o tecido oxigenado. O tecido que circunda cada vaso sanguíneo está sombreado de rosa-escuro, representando as regiões bem oxigenadas (bolsas ricas em oxigênio). As bactérias e a infecção bacteriana são mostradas pelos sombreados verdes na superfície da ferida aberta.

Suprimento limitado e demanda elevada: o desequilíbrio do oxigênio A vasculopatia periférica pode afetar as artérias e veias, além dos vasos linfáticos. O tipo mais comum e importante de vasculopatia periférica é a arteriopatia periférica ou AP, que afeta cerca de oito milhões de americanos. O índice tornozelo-braquial de pressão representa um método simples e não invasivo de detecção de insuficiência arterial em um membro. As arteriopatias, em especial aquelas associadas ao diabetes, representam um importante fator agravante da cicatrização de feridas. A AP é a única etiologia identificável em cerca de 10% das úlceras de perna. Em um membro isquêmico, à medida que a AP evolui, os tecidos periféricos vão sendo privados do suprimento sanguíneo, com consequente perda tecidual, formação de úlceras e gangrena. A insuficiência vascular, por outro lado, é a raiz causadora da maioria das úlceras de perna. A insuficiência venosa crônica, caracterizada pelo fluxo retrógrado de sangue no membro inferior, está associada à ocorrência de alterações na parede e valvas venosas, geralmente causadas por distúrbios inflamatórios induzidos por hipertensão venosa e pelo associado cisalhamento de líquidos. Os fatores causadores de hipoxemia arterial também podem limitar o suprimento de O2 para o tecido da ferida. A saúde pulmonar comprometida, perda de função hepática, hemodiálise, anemia, hipoxemia associada à altitude, terapia com nitroglicerina, tamponamento nasal, doença grave, dor e hipotermia são exemplos de condições associadas à hipoxemia arterial. Os fármacos vasoconstritores também podem contribuir para a hipóxia tecidual.79 A demanda energética aumentada do tecido da ferida resulta num estado hipermetabólico, em que a energia extra é gerada a partir do metabolismo oxidativo, aumentando a demanda de O2 do tecido em cicatrização. O trifosfato de adenosina (ATP) assim gerado fornece energia para o reparo tecidual. No sítio de lesão, as plaquetas e outras células em desintegração podem contribuir para o ATP extracelular. O ATP extracelular liberado durante a hipóxia ou inflamação pode sinalizar diretamente aos receptores purinérgicos ou, após a metabolização fosfo-hidrolítica, ativar os receptores de superfície de adenosina. A sinalização purinérgica pode influenciar numerosos aspectos da biologia da ferida, incluindo a resposta imune, inflamação, biologia vascular e biologia epitelial. O ATP pode ser imunoestimulatório ou vice-versa, dependendo das concentrações extracelulares e dos padrões de expressão dos receptores purinérgicos e ectoenzimas. O ATP extracelular induz ativação de receptor nas células epiteliais. Ao ser liberado na lesão à célula epitelial, o ATP atua como um sinal inicial para deflagração de respostas celulares –incluindo um aumento da liberação de fator de crescimento de ligação de heparina semelhante ao fator de crescimento epidérmico (EGF) – e subsequente transativação do

receptor de EGF e respectiva sinalização, resultando na cicatrização da ferida. O ATP liberado das células epiteliais lesadas atualmente também é conhecido por ativar as NADPH oxidases. A atividade destas enzimas é essencialmente requerida para produção dos sinais de redox necessários à cicatrização das feridas.80 As células endoteliais humanas são ricas em receptores purinérgicos e, portanto, responsivas também ao ATP extracelular. O ATP induz vasodilatação endotélio-dependente. Tanto o ATP como a adenosina regulam a proliferação das células musculares lisas e endoteliais. Admitindo que a hipóxia limita a síntese de ATP no tecido isquêmico da ferida, os sistemas terapêuticos de distribuição de ATP foram estudados quanto ao efeito produzido sobre a cicatrização de feridas. Embora possam compensar a deficiência de ATP em si no tecido isquêmico da ferida, estas abordagens acabam falhando em abordar outras funções essenciais do O2 e seus derivados na cicatrização da ferida, conforme discutido adiante. Os requerimentos absolutos de O2 surgem em vários pontos ao longo da sequência angiogênica. Exemplificando, todos os vasos requerem uma rede ou bainha de MEC, sobretudo de colágeno e proteoglicanas, para guiar a formação de tubos e resistir às pressões do fluxo sanguíneo. As condições propícias à deposição e polimerização de colágeno somente podem ser criadas se houver disponibilidade de O2 molecular para ser incorporado à estrutura de colágeno nascente, por ação das prolil- e lisil-hidroxilases. Na ausência do colágeno hidroxilado extracelular obrigatório, os novos tubos capilares têm a montagem comprometida e se tornam frágeis.82-84 Este cenário encontra uma correlação clínica convincente no escorbuto, isto é, na deficiência de ascorbato. O escorbuto resulta da ingestão insuficiente de ascorbato, que é necessário à síntese correta de colágeno nos seres humanos. O ascorbato é requerido para a hidroxilação pós-translacional do colágeno, que permite o escape das moléculas de colágeno maduras para o espaço extracelular, para conferirem a força tênsil necessária. No escorbuto, a bainha colágena não pode ser formada, pois o colágeno não pode ser hidrolisado sob condições de deficiência de ascorbato. Em consequência, os vasos novos não amadurecem. Os vasos mais antigos enfraquecem e se rompem, enquanto as feridas não cicatrizam. Desta forma, se por um lado a hipóxia é comprovadamente um instigador de sinais moleculares para angiogênese, por outro é também um inimigo comprovado do próprio crescimento vascular em tecidos não tumorais. A deposição de colágeno continua em proporção direta à pO2, em toda a faixa fisiológica, de zero a centenas de mmHg. O Km para O2 para esta reação vale aproximadamente 25, enquanto a Vmáx é de cerca de 250 mmHg, sugerindo que os vasos novos não conseguem nem mesmo chegar perto de sua maior velocidade de crescimento possível, a menos que a pO2 tecidual da ferida seja alta.85 A angiogênese é diretamente proporcional à pO2 nos tecidos lesados.83 As feridas hipóxicas apresentam deposição de colágeno precária e são facilmente infectadas, sendo estes dois problemas de considerável importância clínica.79

Sinalização redox A elevada demanda adicional de oxigênio é imposta por uma família de enzimas denominadas NADPH oxidases, que são conhecidas por serem intensamente ativas no sítio da ferida.86 Trabalhos recentes constataram que o oxigênio não é requerido apenas para desinfectar as feridas e fornecer energia para a cicatrização, mas que os processos de sinalização redox-sensíveis dependentes de oxigênio representam um componente integral da cascata de cicatrização.80 A noção amplamente aceita de que os radicais livres biológicos são necessariamente agentes destrutivos está sendo seriamente desafiada.87 Há mais de uma década foi proposto que os sistemas oxidantes biológicos nem sempre são necessariamente os deflagradores do dano oxidativo, e oxidantes como o H2O2 podem na verdade atuar como mensageiros sinalizadores e conduzir vários aspectos da sinalização celular.88 Hoje, este conceito está bem mais desenvolvido e amadurecido. Evidências convincentes sustentam o papel dos oxidantes (p. ex., H2O2) como mensageiros sinalizadores.89-99

Óxido nítrico No sítio da ferida, o NO é gerado através de um processo biossintético dependente de oxigênio. No final da década de 1970, as pesquisas revelaram o envolvimento do NO no processo de vasodilatação. Por volta de 1986, as pesquisas culminaram na identificação do NO como fator de relaxamento derivado do endotélio responsável pela manutenção do tônus vascular, implicando assim o NO como um agente cicatrizante de feridas em potencial.100 A atividade máxima da NO sintase é notada logo no início da cicatrização de feridas cutâneas, com uma produção sustentada por até 10 dias após a formação da ferida. Os macrófagos presentes na ferida

representam a principal fonte de produção de NO na fase inicial da cicatrização.101 A inibição da síntese de NO diminuiu o acúmulo de colágeno e a resistência da ferida ao rompimento, sugerindo que a síntese de NO é essencial para o acúmulo de colágeno e aquisição de resistência mecânica. Posteriormente, foi demonstrado que os fibroblastos presentes na ferida são fenotipicamente alterados durante o processo de cicatrização e passam a sintetizar NO que, por sua vez, regula suas atividades sintéticas e contráteis.102 O bloqueio da síntese de NO compromete a cicatrização da ferida cutânea, atuando nas fases inicial e tardia do reparo.103 Curiosamente, a cicatrização de feridas diabéticas está associada à diminuição da NO sintase de feridas.104

MicroRNAs A cicatrização de feridas depende muito de genes codificadores de proteínas induzidas por lesão, que atuam como direcionadores de um importante programa de reparo tecidual inerente, destinado a restaurar o tecido lesado tanto estrutural como funcionalmente. Existem duas etapas que separam um gene codificador de proteína de sua proteína correspondente. Primeiro, o DNA que contém o gene deve ser transcrito em mRNA. Por fim, o mRNA deve ser traduzido em proteína. Os trabalhos que emergiram nos últimos anos mostraram que estas duas etapas essenciais estão sujeitas a uma regulação robusta e redundante por parte dos microRNAs (miRNAs: 19-22 nucleotídeos de comprimento). Estes são RNAs não codificadores encontrados em todas as células eucarióticas. Os trabalhos realizados na última década identificaram pequenos miRNAs como sendo uma nova classe de reguladores da biologia eucariótica. Ao lado de outros pequenos RNAs interferentes (siRNAs), os miRNAs executam o silenciamento genético pós-transcricional, via desestabilização do mRNA, bem como a repressão translacional. Dito de forma simplificada, a decisão que determina se um gene codifica ou não uma proteína é tomada pelos miRNAs dos quais este gene é alvo. Os miRNAs formam pares de bases com sequências específicas em miRNAs codificadores de proteína. O pareamento quase perfeito induz clivagem do mRNA-alvo, enquanto o pareamento parcial resulta em repressão translacional e decaimento do mRNA por vias de desadenilação.105 Conforme o banco de dados de miRNA, o genoma humano codifica 1.048 miRNAs. Esta contagem está aumentando rapidamente. Estes miRNAs podem regular mais de um terço de todos os genes codificadores de proteína e quase todos os processos biológicos. As células de mamíferos expressam miRNAs específicos para os tipos celulares, que silenciam subgrupos exclusivos de genes-alvo junto à célula. Enquanto os miRNAs são conhecidos principalmente por serem funcionais no citoplasma, os miRNAs nucleares também podem participar da regulação genética. Considerado a princípio um aspecto estranho, o controle miRNA-dependente da expressão genética agora é aceito como sendo parte integrante da função normal das células e organismos. Os miRNAs estão emergindo como reguladores essenciais de todo o processo de cicatrização de feridas.106

Inflamação A desorganização da biogênese do miRNA exerce um impacto significativo sobre o sistema imune em geral. Estudos emergentes indicam que os miRNAs, sobretudo miR-21, miR-146a/b e miR-155, exercem papel fundamental na regulação de vários centros orquestradores do processo inflamatório.107 Os miRNAs foram diretamente implicados na patogênese das doenças inflamatórias, entre as quais a osteoartrite e a artrite reumatoide. Os genes-alvo de miRNAs específicos regulados por resolvina envolvidos na resolução da inflamação estabelecem um novo circuito de resolução envolvendo a regulação dependente de receptor RvD1 de miRNAs específicos.108 Em adição, o microRNA-124 específico do encéfalo é capaz de refrear a inflamação desligando as células microgliais e macrófagos ativados.109 A alça reguladora também é relevante para o reparo tecidual. As citocinas envolvidas nesta alça, incluindo aquelas deflagradas após a lesão, são reguladas por miRNAs e regulam a expressão destes.110,111

Angiogênese No período de 2005-2008, a primeira série de observações a estabelecer a importância central dos miRNAs na regulação da biologia vascular de mamíferos resultou de estudos experimentais relacionados com a parada da biogênese dos miRNAs para depleção de lagos de miRNA de células e tecidos vasculares.112 A biogênese Dicerdependente dos miRNAs é necessária ao desenvolvimento dos vasos sanguíneos durante a embriogênese. Camundongos que apresentam deleção de Dicer (uma enzima essencial que sustenta a biogênese dos miRNAs)

específica de célula endotelial exibem uma angiogênese pós-natal defeituosa. As EROs derivadas da NADPH oxidase dirigem a angiogênese na ferida. A NADPH oxidase endotelial está sujeita ao controle pelos miRNAs.113 A hipóxia é amplamente reconhecida como sendo um sinal que dirige a angiogênese como parte de uma resposta adaptativa para vascularização do tecido hospedeiro deficiente de oxigênio. O miR-200b, sensível à hipóxia, está envolvido nesta indução da angiogênese em que Ets-1 é diretamente o alvo.114 Vários aspectos da angiogênese, como proliferação, migração e morfogênese das células endoteliais, podem ser regulados por miRNAs específicos, de uma forma endotelial-específica. Os miRNAs que comprovadamente regulam a angiogênese in vivo são referidos como angiomiRs.115 O miRNA-126 é específico para células endoteliais, regulando a integridade vascular e a angiogênese no desenvolvimento. A manipulação dos angiomiRs no contexto de reparo tecidual representa uma nova abordagem terapêutica que poderia ser efetiva na promoção da angiogênese em feridas.

Resposta à hipóxia A lesão tecidual muitas vezes está associada à interrupção do suprimento vascular destinado ao sítio da lesão. Assim, o tecido lesado frequentemente sofre com o suprimento insuficiente de oxigênio ou hipóxia. Sob condições de isquemia subjacente adicional, a hipóxia é grave e limita seriamente a cicatrização da ferida.79 A hipóxia induz miRNAs específicos, coletivamente referidos como hipoxamirs.116 O miRNA-210 é um hipoxamir clássico. A expressão de fator induzível por hipóxia-1 (HIF-1) também é controlada por miRNAs específicos. O HIF-1, por sua vez, controla a expressão dos hipoxamirs, que são induzidos no tecido lesado.117 Os hipoxamirs são ainda induzidos por vias independentes de HIF. Embora os hipoxamirs geralmente favoreçam a angiogênese, suas funções metabólica e de parada do ciclo celular conflitam com a cicatrização das feridas, em especial no contexto de isquemia. Desta forma, o silenciamento de hipoxamirs específicos pode representar uma abordagem sensata para facilitação do reparo tecidual. O miRNA-210 reprime a respiração mitocondrial116 e exagera a produção de EROs mitocondriais indesejáveis.118 Estes resultados são incompatíveis com as demandas energéticas aumentadas associadas ao reparo tecidual. O miR-210 também silencia a sinalização via FGF,119 um dos principais contribuidores para a cicatrização de feridas. O tecido lesado é altamente rico em EROs.86 Adicionalmente, no sítio de lesão, há liberação de íons metálicos de transição a partir de um estado ligado a proteínas. Condições como estas causam dano ao DNA em oposição ao reparo tecidual. Os sistemas de reparo do DNA, portanto, têm importância central na possibilitação do reparo tecidual. O miR-210 antagoniza o reparo do DNA.120 Esta é outra função do hipoxamir que conflita com a cicatrização de feridas. Compatível com a observação comum de que as feridas isquêmicas são refratárias à resposta de cicatrização, níveis altos de miRNA-210 nestas feridas atenuaram a proliferação dos queratinócitos e impediram o fechamento da ferida.106,121

Células-tronco Sítios de ligação de miRNA endógenos foram identificados em células-tronco embrionárias (CTEs) murinas. Os miRNAs governam a função das CTEs ao atuarem como centros de controle das redes regulatórias. Uma importância central deste tipo de controle é destacada pela observação de que as CTEs sem miRNAs perdem a característica de “tronco”. As CTEs com sistema de biogênese de miRNA defeituoso mudam para um modo de divisão celular contínua. Estas células não se diferenciam por demanda devido à falha em desligar o programa regulatório da pluripotência.122 Os miRNAs regem a orquestra das redes regulatórias de genes essenciais, controladas por fatores de pluripotência junto às células-tronco. Já foram identificadas as vias dependentes de miRNA individuais, que promovem a reprogramação das células somáticas em células-tronco pluripotentes induzidas (iTPs). A manipulação de miRNAs celulares específicos ajuda a melhorar a reprogramação das células somáticas para um fenótipo CTE-símile, ajudando a gerar células iTPs.123 A expressão dos miRNAs também está sujeita ao controle por fatores epigenéticos.124 Este controle influencia o equilíbrio existente entre proliferação e diferenciação das células-tronco. Ao executar este controle, o elemento miRNA da epigenética estabelece uma comunicação cruzada com alterações envolvendo a estrutura da cromatina, bem como com alterações na metilação do DNA. Coletivamente, isto cria um mecanismo que permite ao microambiente da lesão tecidual influenciar os processos regenerativos e reparativos dependentes de miRNA.

Células-tronco O potencial regenerador do tecido adulto lesado sugere a existência fisiológica de células capazes de participar do processo de reparo. O epitélio da pele, a epiderme, está em equilíbrio contínuo de crescimento e diferenciação, além de ter a notável capacidade de se autorrenovar completamente, o que depende de seus reservatórios de células-tronco. Nos mamíferos existem dois tipos amplos de células-tronco: CTEs, que são isoladas da massa celular interna de blastocistos, e células-tronco adultas, que são encontradas em vários tecidos. Nos organismos adultos, as células-tronco e as células progenitoras atuam como sistema de reparo para o corpo, que é reabastecido nos tecidos adultos. As células-tronco têm a propriedade de autorrenovação na ausência de diferenciação, bem como potencial de se diferenciarem em qualquer tipo celular. As células-tronco totipotentes têm a capacidade de originar um organismo inteiro porque são capazes de se diferenciarem em células embrionárias e extraembrionárias. As células-tronco pluripotentes derivam das células totipotentes e podem se diferenciar em todos os tipos celulares, mas não dão origem a um novo organismo (Fig. 14.15). As CTEs derivam do embrião em desenvolvimento geralmente a partir da massa celular interna de um blastocisto ou dos estágios iniciais de mórula. As células perdidas ou danificadas podem ser substituídas por diferenciação, desdiferenciação ou transdiferenciação (Fig. 14.16). Avanços recentes mostraram que a adição de um grupo de genes pode não só restaurar a pluripotência em um estado totalmente diferenciado (diferenciação) como também pode induzir a célula a proliferar (desdiferenciação) ou até trocar de tipo celular (transdiferenciação). A desdiferenciação é representada por uma célula terminalmente diferenciada que reverte para um estágio menos diferenciado, ainda na mesma linhagem. Este processo permite que a célula volte a proliferar antes de se rediferenciar e, assim, reponha as células que foram perdidas. A transdiferenciação é outro mecanismo que ocorre naturalmente, levando a desdiferenciação a avançar uma etapa adicional, até as células regredirem a um ponto em que se tornam capazes de trocar de linhagem, podendo se diferenciar em outro tipo celular. Além disso, a reprogramação tem o objetivo de reverter as células diferenciadas ao estado de pluripotência. A partir deste ponto, estas células podem se diferenciar em quase qualquer tipo celular. Embora a reprogramação ocorra naturalmente durante a fertilização, para produzir células totipotentes capazes de se diferenciar em qualquer tipo celular, ainda não está formalmente comprovado que esta seja uma resposta regenerativa verdadeira. Em adição, a reprogramação evita a necessidade de usar embriões para terapias de regeneração, porque usa células diferenciadas obtidas de um paciente. Na perspectiva clínica, isto é acompanhado pelo bônus extra de evitar problemas imunológicos, como a rejeição do transplante e a doença do enxerto versus hospedeiro, associados à implantação do enxerto.125

FIG. 14.15 Renovação da célula-tronco.

FIG. 14.16 Diferenciação, desdiferenciação e transdiferenciação da célula-tronco.

A medula óssea (Fig. 14.17), sede das células-tronco e células progenitoras, contribui com uma proporção significativa de células na pele. Sabe-se de longa data que a pele normal contém células derivadas da medula óssea envolvidas na defesa do hospedeiro e nos processos inflamatórios, entre os quais a cicatrização de feridas. Entretanto, estudos recentes mostram que a medula óssea contribui para a pele não só com células inflamatórias, mas também com queratinócitos e células em forma de fibroblastos. Similarmente aos leucócitos em trânsito, as células-tronco/células progenitoras derivadas da medula óssea poderiam se alojar nos tecidos lesados e participar do reparo/regeneração. Em adição, foi demonstrado que CTMs derivadas da medula óssea expandidas em cultura promovem a cicatrização de feridas diabéticas. Isto implica um profundo potencial terapêutico para defeitos cutâneos, como as feridas crônicas e queimaduras.126

FIG. 14.17 Células-tronco da medula óssea. SNC, sistema nervoso central.

Durante a fase inflamatória, os leucócitos que migram para o sítio da ferida são células hematopoiéticas derivadas da medula óssea. Na pele, o bulbo do folículo piloso (Fig. 14.18) atua como reservatório de célulastronco. Em camundongos, foi demonstrado que a região do bulbo contém células hematopoiéticas idênticas às células derivadas da medula óssea e também àquelas encontradas na circulação fetal.127 Além disso, esta região atua ainda como reservatório de precursores de mastócitos. A descoberta destas células-tronco epidérmicas no bulbo do folículo piloso originou a hipótese de que estas células são necessárias tanto à renovação da epiderme como para a cicatrização de feridas.128 Foi demonstrado que as células oriundas do bulbo não contribuem para a regeneração da epiderme. Entretanto, diante de uma lesão, as células do bulbo são recrutadas para dentro da epiderme e migram de forma linear rumo ao centro da ferida.129 Constatou-se que estas células são transientes, vivendo apenas por algumas semanas, e representam então uma resposta aguda à lesão.

FIG. 14.18 Células-tronco na epiderme. Os folículos pilosos atuam como reservatórios de células-tronco na pele. (A) Vista de corte transversal de um folículo piloso. As células-tronco da matriz se diferenciam em várias partes do pelo, enquanto as célulastronco de longa duração estão presentes na região bulbar. As células-tronco do bulbo mantêm a glândula sebácea e as célulastronco epidérmicas. (B) Uma cripta intestinal de mamífero. As células-tronco estão localizadas na região basal, com as células de Paneth. As células amplificadoras de trânsito (AT) constituem a progênie das células-tronco, que se desloca para cima e sofre diferenciação.

Existem dois ramos principais de células-tronco na medula óssea, que são as células-tronco hematopoiéticas (CTHs) e as CTMs. As CTHs adultas derivadas da medula óssea foram reconhecidas, há muito tempo, como as células precursoras de todas as linhagens sanguíneas. Adicionalmente, as CTHs também podem originar fibrócitos e células progenitoras endoteliais. As células precursoras endoteliais circulantes atuam na neoangiogênese, que é essencial para a cicatrização.130,131 As células-tronco derivadas da medula óssea também contribuem para a deposição de colágeno tipo III na ferida132 e se diferenciam em fibroblastos,133 queratinócitos134 e fibrócitos.135 As CTMs derivadas da medula óssea, que também são referidas como células estromais mesenquimais da medula óssea ou células estromais medulares, são células-tronco com capacidade de autorrenovação e expansíveis. Embora sejam uma população celular rara da medula óssea, representando cerca de 0,001%-0,01% das células nucleadas, aproximadamente 10 vezes menos abundantes do que as CTHs, as CTMs podem ser expandidas em cultura e são multipotentes, com capacidade de se diferenciarem em vários tipos celulares. Devido às propriedades de regeneração e diferenciação das células-tronco, seu uso para cicatrizar feridas problemáticas tem sido alvo de interesse há muito tempo. De fato, os aspirados e células cultivadas de medula óssea autóloga mostraram-se úteis na cicatrização de feridas crônicas.136 No caso das feridas de queimadura, o tratamento com células-tronco derivadas da medula óssea é igualmente promissor.137 Outra fonte importante de células-tronco adultas é o tecido adiposo.138 A capacidade das células-tronco adultas derivadas do tecido adiposo de se diferenciarem em osso, músculo, tecido adiposo ou cartilagem, ou ainda em células da linhagem

mesenquimal, as torna um alvo excelente para uso terapêutico. Foi demonstrado que as células-tronco adultas melhoraram a cicatrização em um modelo murino.139,140 Os folículos pilosos são parte integrante da pele dos mamíferos, onde ajudam a epiderme a manter a barreira protetora corporal contra o ambiente externo. Com raras exceções (como as palmas das mãos e pálpebras), os folículos pilosos estão presentes em toda a superfície da pele e exercem papel importante na renovação fisiológica e regeneração dos tecidos após a lesão. Os folículos pilosos representam um mini-órgão autônomo, que fornece um excelente sistema-modelo para estudo da biologia das células-tronco adultas.141 Existem diferenças evidentes entre a pele humana e a pele murina, ainda que o conhecimento obtido com os experimentos traçadores de linhagem realizados com camundongos tenham expandido significativamente nossa compreensão acerca do comportamento celular de diferentes populações de queratinócitos durante a regeneração tecidual fisiológica e induzida por lesão. Como na maioria dos órgãos do corpo, a pele é constantemente renovada. A camada queratinizada superior da epiderme interfolicular, que consiste em células terminalmente diferenciadas, se solta e é substituída por células oriundas da camada ativamente proliferante situada logo abaixo. Em contraste, os folículos pilosos passam por ciclos de crescimento (anágena) e repouso (telógeno). O potencial de proliferação para sustentar a reposição vitalícia da perda celular normal e para reparar ocasionais danos teciduais está presente na população de células-tronco epidermais. O bulbo do folículo piloso aloja células-tronco que podem ser úteis para a renovação e reparo da pele. O termo “bulbo”, originalmente denominado der Wulst, foi introduzido em 1903 por um morfologista alemão, P. Stöhr, para descrever uma estrutura eminente no sítio de fixação do músculo eretor de pelos nos folículos pilosos humanos.141 Similarmente a muitas células-tronco somáticas distintas, as células bulbares são células de ciclo lento por natureza. Esta característica permitiu sua identificação inicial e isolamento como células retentoras de marcação, que são capazes de reter um pulso de marcador nucleotídico após um longo período de seguimento e que frequentemente são consideradas uma característica definidora da célula-tronco do folículo piloso. Em adição, a disponibilidade de vários marcadores imuno-histoquímicos, incluindo a queratina-15 e o CD34, que marcam especificamente as células-tronco foliculares murinas, proporcionou aos pesquisadores a habilidade de examinar detalhadamente os sinais requeridos para ativação e renovação das células-tronco adultas. Nós agora sabemos que o bulbo serve como repositório de células-tronco multipotentes de vida longa, dotadas da capacidade de se diferenciarem em todos os tipos celulares que constituem a porção cíclica inferior do folículo piloso, bem como a epiderme interfolicular durante o reparo da ferida.142,143 Apesar de as pesquisas sobre o uso de células-tronco para fins de medicina regenerativa estarem em ascensão, o êxito clínico alcançado não tem sido tão acessível. Isto tem sido atribuído primariamente à falta de informação sobre a biologia básica das células-tronco, que ainda é insuficiente para justificar a realização de estudos clínicos. Como a maioria dos protocolos clínicos empregam a aplicação intravenosa de CTMs, tornou-se importante saber o trajeto percorrido por estas células na circulação sanguínea. Em adição, como relativamente pouco se sabe sobre onde as CTMs transplantadas poderiam se localizar, um conhecimento maior dos mecanismos de alojamento envolvidos provavelmente esclarecerá o modo como as CTMs exercem seus efeitos terapêuticos. Por enquanto, não está esclarecido se os mecanismos atuantes nos sítios de lesão são localespecíficos ou se este recrutamento pode ser modulado para fins terapêuticos. Em adição, foi recentemente sugerido que as plaquetas podem exercer papel importante no recrutamento das células-tronco para os sítios de lesão. Uma melhor compreensão acerca dos mecanismos usados pelas células-tronco durante o alojamento tecidual nos permitiria desenvolver estratégias para melhorar o recrutamento destas células raras.144

Células-tronco pluripotentes induzidas As células-tronco pluripotentes são dotadas da propriedade exclusiva de se diferenciarem em todos os outros tipos celulares do corpo humano. A descoberta das iTPs, em 2006, abriu novos caminhos na medicina clínica.145,146 Estudos avançados recentes, que empregaram uma combinação de quatro fatores para reprogramar as células somáticas humanas em células-tronco pluripotentes sem usar embriões nem óvulos, promoveram uma revolução importante na pesquisa sobre células-tronco. Hoje é possível converter as células somáticas, como os fibroblastos cutâneos e linfócitos B, em células-tronco pluripotentes bastante semelhantes às CTEs. Recentemente, neurônios, miocardiócitos, células de ilhota pancreática, hepatócitos e células de retina, todos funcionais, foram derivados de iTPs humanas. Isto reconfirmou a pluripotência e a capacidade de diferenciação destas células. Estes achados abrem a possibilidade adicional de usar as iTPs na terapia de substituição celular para vários distúrbios, inclusive para feridas crônicas.

Cicatrizes (escara) As cicatrizes (também referidas como escaras) são um tecido fibroso macroscópico que nitidamente substitui a pele normal após a lesão. Existe um amplo espectro de cicatrização cutânea pós-aquisição de ferida, que inclui a cicatrização de ferida fetal sem cicatriz, as cicatrizes em linha fina (normais), cicatrizes esticadas (amplas), cicatrizes atróficas (deprimidas), contraturadas, cicatrizes hipertróficas e queloides. A avaliação da cicatriz póscirúrgica é fundamental para uma avaliação funcional completa e como medida do resultado final alcançado. A Vancouver Scar Scale é a escala de classificação de escaras mais usada, porém a Patient and Observer Scar Assessment Scale é reconhecida como ferramenta mais abrangente, considerando o aspecto importante da perspectiva do paciente. Recentemente, uma nova escala – denominada Stony Brook Scar Evaluation Scale – foi proposta.147 Apesar de o remodelamento da cicatriz ocorrer durante meses a anos após a aquisição da lesão inicial, a restauração completa da arquitetura da MEC normal jamais é conseguida. As cicatrizes maduras restauram apenas 70% da resistência tênsil da pele normal, sendo que a função pré-cicatrização nunca é totalmente recuperada.148 A formação de cicatriz é componente integral do processo de cicatrização e um resultado final do estágio de remodelamento do reparo de feridas, que tem início em 2-3 semanas após a aquisição da lesão e dura pelo menos 1 ano.149 Durante este estágio, todos os processos ativados após a lesão enfraquecem e cessam. A maioria das células endoteliais, macrófagos e miofibroblastos sofre apoptose ou sai da ferida, deixando uma massa que contém algumas células e consiste principalmente de colágeno e outras proteínas da MEC.149,150 As interações epiteliais-mesenquimais provavelmente regulam de modo contínuo a integridade e homeostasia da pele. Em adição, ao longo de 6-12 meses, a matriz acelular é ativamente remodelada a partir principalmente de uma estrutura de colágeno tipo III em outra composta predominantemente de colágeno tipo I.151 Este processo é realizado pelas metaloproteinases da matriz que são secretadas pelas células epidérmicas, células endoteliais, fibroblastos e macrófagos que permanecem na cicatriz e fortalece o tecido reparado. Entretanto, o tecido nunca recupera as propriedades da pele não lesada. Os fibroblastos presentes no sítio da ferida oriundos dos tecidos adjacentes, bem como fornecidos em forma de células derivadas da medula transportadas pelo sangue são reconhecidos como condutores primários da formação da cicatriz. As plaquetas, macrófagos, linfócitos T, mastócitos, células de Langerhans e queratinócitos estão direta e indiretamente envolvidos na ativação de fibroblastos que, por sua vez, produzem MEC em excesso. A formação de cicatriz dérmica pode resultar em perda de função, restrição do movimento e desfiguração. O mecanismo de formação da cicatriz envolve inflamação, fibroplasia, formação de tecido de granulação e maturação da cicatriz. Em resposta à lesão tecidual, a resposta inflamatória é seguida da proliferação de fibroblastos, que são as células responsáveis pela síntese de vários componentes teciduais, incluindo colágeno e fibrina. Durante a fase inflamatória aguda, as células progenitoras circulantes migram para o tecido lesado. Ocorre uma proliferação celular rápida que, por fim, resulta na formação de novos vasos sanguíneos e epitélio. Os fibroblastos então se diferenciam em miofibroblastos, que são responsáveis pela deposição de colágeno e contração da ferida. A formação da cicatriz resulta enfim do acúmulo excessivo de MEC desorganizada.148,152 Os nervos sensoriais, incluindo as fibras C não mielinizadas e fibras δ, atravessam todas as camadas cutâneas, incluindo a epiderme. Estas fibras seguem paralelas aos capilares que passam ao redor dos complexos foliculares. Uma maior densidade de fibras nervosas está associada ao tecido da cicatriz. Diferente dos tecidos diabéticos, a cicatriz hipertrófica apresenta atividade neuropeptídica excessiva. Em adição, a concentração de substância P pró-inflamatória é maior em amostras de cicatriz hipertrófica, em comparação à pele intacta normal. A alta atividade de substância P e baixa atividade de endopeptidase neutra no tecido da cicatriz parece induzir uma exuberante resposta neuroinflamatória, contribuindo para a formação da cicatriz.153

Queloide A cicatrização com formação de queloide, também conhecida como doença do queloide, consiste numa cicatriz fibroproliferativa benigna localmente agressiva que cresce de forma contínua e ultrapassa as margens da ferida original, invadindo a pele sadia adjacente. Diferente das cicatrizes hipertróficas, que permanecem dentro dos limites das feridas originais e usualmente regridem de modo espontâneo, os queloides crescem além dos limites das feridas originais e somente regridem em raros casos. Estas cicatrizes patológicas não só são esteticamente desagradáveis como também podem ser dolorosas e funcionalmente incapacitantes, causando

angústia física e psicológica nos pacientes. Existe uma forte predisposição genética associada à doença do queloide. Primeiro, os queloides são mais comuns em indivíduos de etnias com pele de pigmentação mais escura, tendo sido relatados como sendo 5-15 vezes mais prevalentes em negros do que em brancos. A hereditariedade familiar e a prevalência em gêmeos também sustentam o conceito de suscetibilidade genética à cicatrização por queloide. As principais vias envolvidas na doença do queloide incluem a apoptose, proteína quinase ativada por mitógeno, TGF-β, IL-6 e inibidor do ativador de plasminogênio-1.154

Cicatriz hipertrófica A fisiopatologia da formação da cicatriz hipertrófica envolve uma fase proliferativa constitutivamente ativa de cicatrização da ferida.155 O tecido da cicatriz possui uma composição estrutural exclusiva que é altamente vascular, com as células inflamatórias e fibroblastos contribuindo para a estrutura de uma matriz abundante e desorganizada. O resultado líquido é a substituição do defeito cutâneo original por uma massa de tecido não funcional. Além destas observações, as pesquisas sobre a fisiopatologia da doença têm sido limitadas pela falta de um modelo experimental animal prático e se baseiam no uso de amostras patológicas humanas. Tais estudos são problemáticos, pois estas amostras representam os estágios terminais do processo de cicatrização e podem não conter os fatores iniciadores que originalmente levam ao desenvolvimento da doença. Enquanto os modelos animais forneceram algumas hipóteses sobre a genética e patogênese da fibrose cutânea, continua obscuro o grau de semelhança do processo de cicatrização hipertrófica nestes modelos com aquele observado em seres humanos. Especificamente, não está esclarecido se os mesmos fatores que iniciam a cicatrização hipertrófica nestas amostras estão envolvidos na doença humana.155

Cicatrização regenerativa fetal Em contraste com a cicatrização de feridas no adulto, a cicatrização de ferida cutânea fetal ainda no início da gestação é rápida, ocorre de forma regenerativa e não há formação de cicatriz. A velocidade acelerada da cicatrização, a relativa ausência de uma resposta inflamatória aguda e a ausência de neovascularização distinguem a cicatrização de feridas no feto e no adulto.156 A cicatrização de feridas sem formação de cicatriz foi observada em fetos de camundongos, ratos, porcos, macacos e seres humanos. A pele fetal cicatriza sem formar cicatriz antes de uma determinada idade gestacional. Após esta idade, há a típica formação pontual de cicatriz. Nos seres humanos, a cicatrização das feridas começa em cerca de 24 semanas de gestação, enquanto nos camundongos a cicatrização das feridas começa aos 18,5 dias de vida embrionária (o período de gestação médio para camundongos é de 20 dias). Entretanto, este ponto de transição é modulado pelo tamanho da ferida. Exemplificando, à medida que o tamanho da ferida aumenta em fetos de carneiro, a capacidade de cicatrização sem formação de cicatriz vai sendo perdida mais cedo, ao longo da gestação.148 Em resposta à lesão tecidual, a derme fetal tem a capacidade de regenerar uma matriz colágena contínua que é idêntica à do tecido original. Em adição, as estruturas dérmicas, como as glândulas sebáceas e folículos pilosos, são formados normalmente após a lesão fetal. Embora os mecanismos exatos de cicatrização de feridas fetais sem formação de cicatrizes ainda sejam desconhecidos, são considerados devido às diferenças existentes entre a MEC, resposta inflamatória, mediadores celulares, expressão genética diferencial e função das células-tronco nas feridas fetais e pós-natais.148

Agradecimentos Apoio financeiro do NIH RO1, subsídios GM069589, GM077185, NS42617, DK076566 e HL 073087. Os autores agradecem a Sabyasachi Biswas PhD, Rashmet Reen PhD, e Viren Patel MD, pelo suporte na redação deste artigo. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  30. Martin, P. Wound healing – aiming for perfect skin regeneration. Science. 1997; 276:75–81. A cicatrização de uma

ferida cutânea em um indivíduo adulto é um processo complexo, que requer esforços cooperativos de muitos tecidos e linhagens celulares. Esta revisão discute os sinais e processos essenciais que regulam o reparo de feridas cutâneas em indivíduos adultos normais.

31. Martin, P., Leibovich, S. J. Inflammatory cells during wound repair: the good, the bad and the ugly. Trends Cell Biol. 2005; 15:599–607. 39. Khanna, S., Biswas, S., Shang, Y., et al. Macrophage dysfunction impairs resolution of inflammation in the wounds of diabetic mice. PLoS One. 2010; 5:e9539. 53. Carmeliet, P. Angiogenesis in life, disease and medicine. Nature. 2005; 438:932–936. 79. Sen, C. K. Wound healing essentials: let there be oxygen. Wound Repair Regen. 2009; 17:1–18. 86. Roy, S., Khanna, S., Nallu, K., et al. Dermal wound healing is subject to redox control. Mol Ther. 2006; 13:211–220. Foi demonstrado que o H O sustenta a cicatrização de feridas ao induzir a expressão de VEGF nos queratinócitos humanos. Este 2

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trabalho apresenta as primeiras evidências in vivo a indicarem que as estratégias influenciadoras do ambiente redox do sítio da ferida podem ter relação com os resultados finais da cicatrização.

98. Sen, C. K. The general case for redox control of wound repair. Wound Repair Regen. 2003; 11:431–438. Em concentrações baixíssimas, as espécies reativas do oxigênio podem regular as vias de sinalização celular através de mecanismos redox-dependentes. As estratégias baseadas em redox podem ser úteis como adjuntos efetivos para “dar um empurrão” na cicatrização das feridas crônicas. A revisão enfoca a compreensão da biologia redox do sítio da ferida e as novas hipóteses acerca dos mecanismos fundamentais que ajudariam a otimizar as condições para a terapia com oxigênio.

106. Banerjee, J., Chan, Y. C., Sen, C. K. MicroRNAs in skin and wound healing. Physiol Genomics. 2010. Os microRNAs (miRNAs) são pequenas moléculas de RNA endógeno, com cerca de 22 nucleotídeos de comprimento, que podem fazer a regulação genética pós-transcricional ligando-se aos seus RNAs mensageiros (mRNAs) alvos. Esta revisão enfoca o papel dos miRNAs na biologia cutânea, os vários métodos de modulação com microRNA e as oportunidades terapêuticas no tratamento das doenças cutâneas e cicatrização de feridas.

129. Ito, M., Liu, Y., Yang, Z., et al. Stem cells in the hair follicle bulge contribute to wound repair but not to homeostasis of the epidermis. Nat Med. 2005; 11:1351–1354. A descoberta das células-tronco epiteliais de vida longa na região do bulbo do folículo piloso conduziu à hipótese de que a renovação epidérmica e o reparo da epiderme após a formação de uma ferida são ambos dependentes destas células. Este artigo discute as implicações das células-tronco epiteliais para a terapia genética e desenvolvimento de tratamentos para feridas.

149. Gurtner, G. C., Werner, S., Barrandon, Y., et al. Wound repair and regeneration. Nature. 2008; 453:314– 321.

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Cicatrização de feridas cutâneas: biologia do reparo, ferida e tratamento da cicatriz Ursula Mirastschijski, Andreas Jokuszies e Peter M. Vogt

Resumo O reparo rápido e sem intercorrências da ferida garante a integridade do nosso corpo e é essencial para a sobrevivência de todos os organismos vivos. As fases de cicatrização de feridas sobrepostas refletem o reparo no adulto que resulta em uma cicatriz, em contraste com a regeneração da pele fetal sem cicatriz. Distúrbios de cicatrização da ferida estendem-se entre dois extremos: úlceras não cicatrizadas crônicas de um lado e cicatrização excessiva com cicatriz hipertrófica do outro. Causas multifatoriais levam e sustentam feridas crônicas, enquanto a cicatrização excessiva é encontrada predominantemente após queimaduras dérmicas profundas. Em ambos os casos, os processos biomoleculares ainda não são bem delineados e precisam de investigação intensa. O manejo da ferida clínica começa com uma avaliação do tipo de ferida para se escolher o curativo adequado e termina com um tratamento interdisciplinar da ferida e comorbidades que a acompanham. O tratamento de longo prazo da cicatriz é caracterizado por fisioterapia, malhas de pressão e liberação da contratura cirúrgica. Terapias inovadoras para reparo de ferida aberrante ainda não estão avaliadas o suficiente e são em sua maior parte experimentais. Faltam estudos clínicos de Fase III para comprovação de eficácia e uso clínico difundido.

Biologia de reparo da ferida Um ser humano tem cerca de 3.000 lesões cutâneas durante toda a vida. As pequenas feridas em geral cicatrizam sem intercorrências. Perguntas sobre processos normais e patológicos no cenário de cicatrização da ferida surgem apenas quando há qualquer tipo de perturbação no reparo da ferida. O fechamento rápido e sem intercorrências da ferida que restaura a integridade do envoltório externo é um critério para a sobrevida de todos os organismos vivos. Desde os tempos pré-históricos até a medicina altamente desenvolvida de hoje, os objetivos do reparo da ferida não mudaram: a restauração da superfície externa tem por objetivo proteger o indivíduo contra infecção e desidratação. Os papiros egípcios documentam o tratamento de feridas e recomendam o uso de diferentes curativos dependendo do estado da ferida.1 O uso do mel como antisséptico tem uma história surpreendente que remonta a mais de 4.000 anos e foi redescoberto há pouco tempo para o tratamento de feridas crônicas.2 Além disso, diferentes resinas, mirra, incenso e canela foram utilizados para o tratamento de feridas. Tribos da América do Sul aplicaram resinas antissépticas, tais como copaíba, Tolu ou bálsamo do Peru.3 A sutura mais antiga de ferida foi detectada em uma múmia egípcia que data da 21ª dinastia, por volta de 1100 a.C.1 Quatro mil anos depois, o reparo rápido e sem intercorrências ainda é a máxima de cicatrização de feridas cutâneas, embora questões estéticas em torno de cicatrizes minúsculas e invisíveis desempenhem um papel crescente. Feridas agudas que cicatrizam em 3 meses se diferenciam das feridas crônicas não cicatrizantes. O termo “agudo” compreende queimaduras, lesões traumáticas ou feridas incisionais cirúrgicas.

Reparo da ferida no adulto A cascata de reparo consiste nas fases inflamatória, proliferativa e de remodelagem (Fig. 15.1). Essas fases de sobreposição atuam em relações bem coordenadas para cicatrizar defeitos da pele. Durante a fase inflamatória, ocorre hemostasia e, como resultado, um infiltrado inflamatório agudo. A fase proliferativa é caracterizada por fibroplasia, granulação, contração e epitelização. A fase final é a remodelagem, que costuma ser descrita como o amadurecimento da cicatriz.

FIG. 15.1 Padrões temporais da fase de reparo, influxo celular e resposta vascular durante o reparo de feridas. Os pontos no tempo são aproximados e ocorre sobreposição durante estes eventos de reparo.7

Fase inflamatória A inflamação é a primeira fase de cicatrização de feridas e compreende as respostas celulares e vasculares, incluindo hemostasia. No local da lesão, os vasos lacerados contraem imediatamente. Produtos de tecido tromboplástico, sobretudo do subendotélio, são expostos. As plaquetas aderem, agregadas, e formam o tampão hemostático inicial. As cascatas de coagulação e do complemento são iniciadas. As vias de coagulação intrínseca e extrínseca levam à ativação da protrombina em trombina, que converte fibrinogênio em fibrina; a fiibrina é, então, polimerizada em um coágulo estável. À medida que o trombo se forma, dá-se hemostasia na ferida (Fig. 15.2). As plaquetas agregadas degranulam, liberando quimioatraentes potentes para as células inflamatórias, fatores de ativação para fibroblastos locais e células endoteliais, além de vasoconstritores. A adesividade das plaquetas é mediada por receptores ativados de integrina, tais como GPIIb-IIIa (αIIbβ3) na sua superfície.4,5 O interessante é que, em condições trombocitopênicas, os macrófagos e células T no local da ferida compensaram a ausência de fatores de crescimento derivados de plaquetas (PDGFs) e iniciação da fase inflamatória.6

FIG. 15.2 A hemostasia é estimulada pela desgranulação de plaquetas e exposição de agentes tromboplásticos do tecido imediatamente após a lesão.7 SQ, subcutânea.

Os processos de reparo são logo iniciados. Depois da hemostasia, os vasos locais dilatam secundários aos efeitos de coagulação e cascatas do complemento. A bradicinina é um potente vasodilatador e fator de permeabilidade vascular, que é gerado pela ativação do fator de Hageman na cascata de coagulação.8 A cascata do complemento gera as anafilatoxinas C3a e C5a, que aumentam diretamente a permeabilidade dos vasos sanguíneos e atraem os neutrófilos e monócitos para a ferida. Estes componentes do complemento também estimulam a liberação de histamina e leucotrienos C4 e D4 de mastócitos. As células endoteliais locais em seguida interrompem o contato celular e aumentam a permeabilidade, o que aumenta a marginação de células inflamatórias no local da ferida.8 O influxo inicial de leucócitos na ferida é composto por neutrófilos (Fig. 15.3). Esse infiltrado de neutrófilos iniciais elimina restos celulares, corpos estranhos e bactérias. Fragmentos de complemento ativado ajudam na morte bacteriana por meio de opsonização. O infiltrado de neutrófilo é reduzido em feridas cirúrgicas limpas em comparação com feridas contaminadas ou infectadas.

FIG. 15.3 Influxo de neutrófilo na ferida ocorre em 24 horas. Os neutrófilos limpam os detritos e bactérias e secretam citocinas para atração e ativação de monócitos de linfócitos. Os ceratinócitos começam a migração quando uma matriz provisória está presente.7

Em 2-3 dias, a população de células inflamatórias começa a mudar para um com predominância de monócitos. Monócitos circulantes e mastócitos são atraídos e infiltram o local da ferida.9,10 Esses monócitos se diferenciam em macrófagos e, junto com os macrófagos teciduais residentes, orquestram o processo de reparo. Os macrófagos não apenas continuam a fagocitar tecidos e restos bacterianos, mas também secretam vários fatores de crescimento peptídicos. Esses fatores de crescimento ativam e atraem células endoteliais locais, fibroblastos e ceratinócitos para começar suas respectivas funções de reparo. Mais de 20 citocinas e fatores de crescimento diferentes são conhecidos por serem secretados por macrófagos (Tabela 15.1).11

Tabela 15.1 Lista parcial de fatores de crescimento presentes no local da ferida* Fator de crescimento

Fonte celular

Células-alvo

Atividade biológica

Activina

Fibroblastos, ceratinócitos

Células estromais

Formação de tecido de granulação, formação de cicatriz

TGF-β e TGF-β 2

Macrófagos, plaquetas, fibroblastos, ceratinócitos

Células inflamatórias, ceratinócitos, fibroblastos

Quimiotaxia, proliferação, produção de matriz (fibrose)

TGF-β 3

Macrófagos

Fibroblastos

Anticicatriz?

TGF-α

Macrófagos, plaquetas, ceratinócitos

Ceratinócitos, fibroblastos, células endoteliais

Proliferação

TNF-α

Neutrófilos, mastócitos

Macrófagos, ceratinócitos, fibroblastos

Ativação da expressão do fator de crescimento

PDGF

Macrófagos, plaquetas, ceratinócitos, fibroblastos, células endoteliais, células do músculo liso vascular

Neutrófilos, macrófagos, fibroblastos, células endoteliais, células do músculo liso vascular

Quimiotaxia, proliferação, produção da matriz

FGF-1, FGF-2, FGF-4

Macrófagos, fibroblastos, células endoteliais

Ceratinócitos, fibroblastos, células endoteliais, condrócitos

Angiogênese, proliferação, quimiotaxia

FGF-7 (KGF-1), FGF-10 (KGF2)

Fibroblastos

Ceratinócitos

Proliferação, quimiotaxia

EGF

Plaquetas, macrófagos, ceratinócitos

Ceratinócitos, fibroblastos, células endoteliais

Proliferação, quimiotaxia

HB-EGF

Macrófagos, ceratinócitos

Ceratinócitos, fibroblastos

Proliferação, migração epitelial, sinergística com IGF

IGF-1/Sm-C

Fibroblastos, macrófagos, plaquetas

Fibroblastos, células endoteliais

Proliferação, síntese de colagenase

IL-1α e IL-1β

Macrófagos, neutrófilos

Macrófagos, fibroblastos, ceratinócitos

Proliferação, síntese de colagenase, quimiotaxia

CTGF/CCN2

Fibroblastos, células endoteliais

Fibroblastos

A jusante de TGF-β 1

VEGF

Macrófagos, ceratinócitos, fibroblastos

Células endoteliais

Angiogênese

TGF-α, fator α de crescimento transformador; TGF-β, fator de crescimento transformador β; TNF-α, fator α de necrose tumoral; PDGF, fator de crescimento derivado de plaquetas; FGF, fator de crescimento de fibroblastos; KGF, fator de crescimento de ceratinócitos; EGF, fator de crescimento epidérmico; HB-EGF, EGF de ligação à heparina, IGF-1, fator 1 de crescimento semelhante à insulina; Sm-C, somatostatina C; IL-1, interleucina-1; CTGF, fator de crescimento do tecido conjuntivo; VEGF, fator de crescimento de células endoteliais vasculares. *

Efeitos biológicos redundantes ocorrem por meio tanto de mecanismos autócrinos como parácrinos.

(Reproduzido de Lorenz HP, Longaker MT. Wounds: biology, pathology, and management. New York: Springer-Verlag; 2000.)

A depleção de monócitos e macrófagos em combinação com a terapia com esteroides resultou em deficiência grave de cicatrização da ferida com debridamento precário, proliferação tardia de fibroblastos e angiogênese inadequada.12 Em contradição ao dogma de que a inflamação é essencial para a cicatrização de feridas cutâneas, ratos com deficiência de fator de transcrição da família ETS hematopoética PU.1 apresentaram reparo normal da ferida13 a despeito de macrófagos não funcionais e leucócitos imunocompetentes.14 Embora o fator de crescimento e o padrão de citocina tenham sido alterados, as feridas incisionais cicatrizaram sem intercorrências e sem cicatrizes com fibroblastos fagocíticos que limpam a ferida dos detritos. Sem dúvida, a inflamação atenuada é benéfica para a cicatrização de feridas.9

Fase de proliferação Formação de matriz extracelular Durante a fibroplasia, os fibroblastos sintetizam e depositam matriz extracelular de reposição (MEC) no local da ferida. A fase proliferativa começa com a degradação da matriz provisória inicial de fibrina-plaquetas. Três grandes classes de proteases estão envolvidas no reparo de feridas. As proteases da família da serina, cisteína e de metaloproteinases da matriz (MPM) são secretadas para facilitar a migração celular através do coágulo de

fibrina e da matriz provisória. Tanto o ativador de plasminogênio tecidual como o de urocinase são expressados para dissolver o coágulo de sangue.15 As MPM compreendem endopeptidases, tais como colagenases, gelatinases e estomelisinas que podem degradar quase todas as proteínas da matriz, ativar fatores de crescimento e ligar-se a superfícies celulares.16,17 As proteases de cisteína estão presentes no epitélio durante o reparo da ferida e estão envolvidas na sinalização e degradação de proteínas da membrana basal.18 Os macrófagos, mastócitos e MEC adjacente liberam fatores de crescimento que estimulam a ativação de fibroblastos.9 Os fibroblastos locais tornam-se ativados e aumentam a síntese de proteínas na preparação para a divisão celular. Conforme os fibroblastos proliferam, eles se tornam o tipo predominante de célula por 3-5 dias em feridas limpas, não infectadas (Fig. 15.4). Após a divisão e proliferação celular, os fibroblastos iniciam a síntese e secreção de produtos de MEC. A matriz de fibrina inicial é substituída por uma matriz provisória de fibronectina e ácido hialurônico, facilitando a migração de fibroblastos. O controle da deposição de MEC por fibroblastos é complexo e regulado em parte pelos fatores de crescimento e interações de receptores da membrana celular de fibroblastos com a MEC. As integrinas são reguladores da função celular durante o reparo e, também, receptores transmembrana com domínios proteicos extracelulares, da membrana e intracelulares. As integrinas são heterodiméricas e compostas por subunidades α e β que interagem para formar o receptor de proteína ativa. Os ligandos para as integrinas incluem fatores de crescimento e componentes estruturais de MEC, tais como colágeno, elastina e outras células.19,20 Depois de os ligandos se unirem, a fosforilação ocorre no domínio citoplasmático do receptor de integrina, que inicia uma cascata de transdução de sinal que no final das contas muda a expressão do gene, e uma nova função celular é iniciada.

FIG. 15.4 Fibroblastos são ativados e estão presentes na ferida 3-5 dias após a lesão. Estas células secretam os componentes da matriz e os fatores de crescimento que continuam estimulando a cicatrização. Os ceratinócitos migram ao longo da nova matriz. A migração começa a partir das bordas da ferida, bem como a partir de ninhos de células epidérmicas de glândulas sudoríparas e folículos pilosos no centro da ferida.7

A fibronectina e o ácido hialurônico de glicosaminoglicano compõem a matriz da ferida inicial.10 O ácido hialurônico proporciona uma matriz que aumenta a migração celular em razão de seu grande conteúdo de água. As glicoproteínas de adesão, incluindo fibronectina, laminina e tenascina, estão presentes em toda a matriz inicial e facilitam a fixação e migração celular. Os receptores de integrina nas superfícies celulares ligamse aos glicosaminoglicanos e glicoproteínas da matriz. À medida que os fibroblastos entram e povoam a ferida, eles secretam a hialuronidase para digerir a matriz provisória rica em ácido hialurônico e glicosaminoglicanos sulfatados maiores são, em seguida, depositados. Ao mesmo tempo, um novo colágeno é depositado por fibroblastos sobre a fibronectina e estrutura de glicosaminoglicanos de uma maneira desordenada, resultando

na formação de cicatrizes. Os principais colágenos fibrilares que compõem a MEC na pele e cicatriz são colágenos tipos I e III. A proporção de colágeno tipo I a tipo III é de 4:1 tanto na pele como na cicatriz da ferida. Embora o colágeno tipo III a princípio seja depositado em quantidades relativamente maiores em feridas, sua quantidade é sempre menor do que o colágeno tipo I na cicatriz madura.21 Hoje em dia, pelo menos 28 tipos diferentes de colágeno são conhecidos.22 A maioria dos tipos de colágeno da MEC é sintetizada por fibroblastos; no entanto, alguns tipos são sintetizados por ceratinócitos.23 Os colágenos partilham características comuns: a unidade estrutural básica é uma tripla hélice de mão direita. As propriedades estruturais únicas que distinguem os diferentes tipos de colágeno incluem segmentos que interrompem a tripla hélice e dobram-na em outras estruturas com propriedades exclusivas.24 O principal componente estrutural de cicatriz da ferida é o colágeno. Os fibroblastos sintetizam e secretam colágenos por meio de um complexo processo intracelular e extracelular. Sucede transcrição coordenada de genes em diferentes cromossomos (2, 6, 7, 12, 13, 17 e 21). Além disso, várias modificações intracelulares e extracelulares são necessárias para formar a nova fibra de colágeno. Os colágenos contêm uma alta fração de resíduos de aminoácidos prolina e essa é a base da sua estrutura de tripla hélice. No que diz respeito aos colágenos I e III, o tropocolágeno é formado na MEC.24 As moléculas de tropocolágeno agregam lateralmente e estão covalentemente cruzadas pela enzima lisil oxidase para formar fibrilas de colágeno.25 As fibrilas interagem com outros tipos de fibrila, que então se agregam em fibras. As fibras então se agregam em feixes e formam uma cicatriz rica em colágeno.

Formação de tecido de granulação e angiogênese O tecido de granulação é uma população densa de vasos sanguíneos, macrófagos e fibroblastos, incorporados em uma matriz provisória frouxa de fibronectina, ácido hialurônico e colágeno. O tecido de granulação é clinicamente caracterizado por seu aspecto carnudo-vermelho (ou seja, “carne exuberante”) e está presente em feridas abertas. É uma consequência do leito rico de novas redes de capilares (neoangiogênese) que se formam pela divisão de células endoteliais e migração. O crescimento direcionado das células do endotélio vascular é estimulado por hipoxia do tecido e plaquetas e macrófagos ativados e produtos de fibroblastos.26 Exemplos são fibroblasto básico e fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), que induz a migração e proliferação de células endoteliais.27 Um pré-requisito para o crescimento endotelial é a expressão da integrina αvβ3 na ponta capilar principal28 e a secreção de proteases para a degradação da matriz. O tecido de granulação é um indicador clínico de que uma ferida aberta é passível de tratamento de enxerto de pele. Feridas que se beneficiam dos enxertos de pele têm tamanho suficiente tal que o tempo de cicatrização pode ser menor após o enxerto. Pelo fato de o tecido de granulação ter um nível alto de vascularização resultante da abundância de nova formação capilar, ele aceita de imediato os enxertos de pele e os suporta.

Contração da ferida Contração é o processo pelo qual a pele circundante é puxada em direção circunferencial para uma ferida aberta (Fig. 15.5). Esse fenômeno não ocorre com incisões cirúrgicas fechadas. As feridas abertas após traumatismo, queimaduras e feridas já fechadas secundariamente abertas por infecção estão associadas à contração. A contração da ferida diminui o tamanho da ferida de maneira drástica sem formação de tecido novo. Este processo de reparo acelera o fechamento da ferida em comparação com epitelização e formação de cicatriz isolada. Além do mais, a área de cicatriz insensível é menor. Os animais têm uma capacidade muito maior para contração da ferida do que os humanos. A maioria dos animais mamíferos (p. ex., roedores, gatos, cães, ovelhas e coelhos) tem um panículo carnoso, que é uma camada miofascial entre a gordura subcutânea e as camadas musculoesqueléticas. Essa anatomia resulta em um plano de baixa resistência entre duas camadas fasciais, que possibilita aumento da mobilidade da pele e, portanto, contração. A quantidade de contração está relacionada tanto com o tamanho da ferida quanto com a mobilidade da pele. Nos seres humanos, a contração é maior no tronco e períneo, menor nas extremidades e intermediária na cabeça e pescoço. Oitenta a 90% do fechamento da ferida pode ser causado pela contração no tronco e períneo.29 É provável que essas diferenças regionais de contração devam-se a diferenças relativas de flacidez da pele.

FIG. 15.5 Contração de feridas é o processo em que o tecido circundante é puxado radialmente para o ferimento. O tamanho da ferida é reduzido, o que diminui o tempo de cicatrização. Feridas de espessura total na pele de ratos nos dias pós-operatórios 0 (A), 4 (B), 8 (C), 12 (D) e 14 (E) após o ferimento. Observe a ferida cicatrizada por completo no dia de pós-operatório 14.

Tornou-se aceito que miofibroblastos desempenham um papel-chave na contração da ferida. Depois da formação da ferida, os fibroblastos dérmicos nas margens da ferida são ativados por fatores de crescimento liberados na ferida. Estimulados pela tensão mecânica e PDGF, eles se transformam em protomiofibroblastos que expressam fibra de estresse. Os protomiofibroblastos são encontrados no tecido de granulação inicial e no tecido conjuntivo normal com alta carga mecânica. Cerca de 4 dias após o ferimento, os miofibroblastos aparecem na ferida.30 A tensão mecânica, o fator de crescimento transformador β ativado (TGF-β1)16 e a fibronectina variante ED-A splice desencadeia a diferenciação de protofibroblastos em miofibroblastos que expressam actina do músculo liso alfa.31 Miofibroblastos exercem suas forças contráteis por contatos de adesão focal que ligam o citoesqueleto intracelular ao ECM. De modo curioso, os contatos do miofibroblasto intercelular via junções de hiato que contêm conexina são importantes para a contratilidade porque fibroblastos depletados da conexina 43 foram incapazes de contrair matrizes de colágeno.32 Ademais, o papel de ceratinócitos na contração da ferida não deve ser negligenciado. Experimentos in vitro mostraram forças de contração maiores de ceratinócitos em comparação com fibroblastos.33 As pesquisas futuras irão lançar mais luz sobre a biologia da contração de feridas cutâneas. A contração da ferida deve ser diferenciada da contratura. Clinicamente, a contratura é definida como encurtamento do tecido ou distorção que causa diminuição da mobilidade e função articular. A contratura da cicatriz costuma se relacionar à diminuição da função da área, enquanto a contração da cicatriz diz respeito ao encurtamento do comprimento da cicatriz em comparação com a ferida original.

Resurfacing epitelial Alterações morfológicas nos ceratinócitos na margem da ferida são evidentes algumas horas após a lesão. As células basais marginais dissolvem os contatos intercelulares, por exemplo, desmossomos e junções de aderência e os contatos célula-matriz, como hemidesmossomos. Células migratórias aplainadas expressam filamentos citoplasmáticos de actina, integrinas promigratórias, por exemplo, α2β1, α5β1, αvβ5, αvβ6 e secretam proteases para possibilitar o movimento.34 A MPM-3 está localizada nos ceratinócitos das margens da ferida e cliva a proteína de contato intercelular E-caderina.35 A MPM-9 cliva as proteínas de base, como o colágeno tipo IV e VII, liberando ceratinócitos do seu substrato.36 A MPM-1 degrada o colágeno nativo tipo I e III, abrindo o caminho para a matriz recém-formada. Além disso, a MPM-1 liga-se à integrina α2β1 nas membranas celulares, atuando de maneira presumível como um promotor de migração.37 O bloqueio da atividade de MPM com inibidores sintéticos de amplo espectro aboliu a migração epitelial in vitro e in vivo.38,39 Em contraste com os ceratinócitos, os fibroblastos são capazes de adotar um fenótipo ameboide e espremer pela rede da matriz na presença de inibidores de MPM.40 Há pouco tempo, as proteases de cisteína, por exemplo a catepsina-B, C, K e L, entraram no campo da cicatrização da ferida da pele atuando como endopeptidases envolvidas na degradação das proteínas ECM.18 Após o restabelecimento da camada epitelial, os ceratinócitos e fibroblastos secretam laminina e colágeno tipo IV para formar a membrana basal.41 Os ceratinócitos tornam-se colunares e se dividem, restaurando as camadas da epiderme e reformando uma barreira para mais contaminação e perda de umidade. Os ceratinócitos podem responder à estimulação de corpo estranho também com a migração. Suturas em feridas cutâneas promovem trilhas ao longo das quais essas células podem migrar. Reações fibróticas, cistos e abcessos estéreis centrados sobre a sutura podem ser tratados por meio da remoção da sutura incitante e trilha do seio celular epitelial ou cisto, caso ocorram.

Fase de remodelagem A estrutura de suporte das células tanto nos estados sem feridas como naqueles com feridas é a MEC, é o

componente estrutural da pele e tem de ser reparado após a lesão. A MEC é dinâmica e está em constante remodelagem durante o reparo, que pode ser conceituado como o equilíbrio entre a síntese, deposição e degradação. Lisil oxidase é a principal enzima cruzada de colágeno intermolecular.25 O colágeno cruzado diminui a sua degradação e melhora a força tênsil da ferida. O equilíbrio da deposição de colágeno e degradação é, em parte, determinado pela regulação da atividade da MPM.42 As MPM são inativadas por inibidores teciduais de MPM, α-macroglobulina e degradação por outras proteases.17,43 Exceto pela contração reduzida da ferida nos camundongos com deficiência de MPM-3,44 outros camundongos knockout de MPM têm pouco ou nenhum distúrbio de cicatrização de ferida.36 A formação de cicatrizes é o desfecho final do reparo da ferida em crianças e adultos. A cicatriz não tem nenhum anexo epidérmico (folículos pilosos e glândulas sebáceas) e tem um padrão de colágeno que é diferente da pele sem ferimentos, como se distingue. Novas fibras de colágeno secretadas por fibroblastos estão presentes já 3 dias após o ferimento. Conforme a matriz de colágeno se forma, fibras densamente empacotadas preenchem o local da ferida. O padrão final de colágeno na cicatriz é uma das fibras densamente empacotadas e não o padrão reticular encontrado na derme sem ferimentos. A remodelagem da cicatriz da ferida demora meses a anos até formar uma cicatriz “madura”. O aspecto inicial da cicatriz é vermelho por ocasião de sua densa rede capilar induzida no local da lesão. Quando o fechamento está completo, os capilares regridem até que poucos permanecem em relação ao total. Como a vermelhidão da cicatriz se dissipa em um período de meses, a verdadeira pigmentação da cicatriz torna-se evidente. As cicatrizes em geral são hipopigmentadas depois da maturação completa. No entanto, elas podem tornar-se hiperpigmentadas em pacientes com pigmentação mais escura e naqueles pacientes com pigmentados mais leve, cujas cicatrizes recebem excesso de exposição ao sol. Por essa razão, as medidas de proteção solar são recomendadas para pacientes com cicatrizes iniciais em áreas expostas ao sol como o couro cabeludo, face e pescoço. Durante a remodelagem, as feridas tornam-se aos poucos mais fortes com o tempo. A resistência à tração da ferida aumenta rápido de 1 a 8 semanas após o ferimento e correlaciona-se com cruzamento de colágeno por lisil-oxidase. Contudo, a resistência à tração da pele ferida na melhor das hipóteses atinge apenas cerca de 80% daquela da pele íntegra45, mas pode ser aumentada por inibidores de MPM sintéticos.46 Além do mais, a cicatriz é frágil e menos elástica do que a pele normal. É visível com facilidade por causa de diferenças de cor, contorno e textura em comparação com a pele intacta. Embora as cicatrizes possam ser bem escondidas com planejamento cirúrgico adequado e cicatrização sem complicações, elas podem ter aspectos esteticamente inaceitáveis em feridas não eletivas após traumatismo e queimaduras e em feridas com problemas de cicatrização.

Regulação Fatores de crescimento na cicatrização de feridas cutâneas Os fatores de crescimento são os pontos focais reguladores do processo de reparo. Eles são polipeptídeos liberados por uma variedade de células ativadas no local da ferida (Tabela 15.1). Eles atuam de maneira parácrina ou autócrina para estimular ou inibir a expressão do gene por suas células-alvo na ferida. Em geral, estimulam a proliferação celular e novas células quimioatraentes para a ferida. Uma miríade de fatores de crescimento está presente em feridas e muitos têm funções biológicas sobrepostas. Existem mais fatores de crescimento em várias isoformas, com diversos tipos de receptores presentes nas feridas, o que aumenta a complexidade da função de fator de crescimento. Além de ligandos do fator de crescimento, seus receptores de sinalização são outro local para a regulação do reparo. Os fatores de crescimento não têm um efeito sobre células-alvo sem uma sinalização funcional do receptor presente na superfície da célula. O nível de regulação é complexo, haja vista que os fatores de crescimento têm vários tipos diferentes de receptores aos quais se podem ligar e induzir a sinalização celular. De alguns anos para cá, o desenvolvimento de modelos de camundongos transgênicos e knockout, como tecnologias indutíveis e cre-lox geraram novo conhecimento na função de muitos fatores de crescimento na cicatrização de feridas. Ensaios clínicos que aplicam diversos fatores de crescimento para feridas crônicas não cicatrizadas mostraram efeitos benéficos,47 embora a eficácia do tratamento deva ser confirmada por estudos maiores, randomizados, duplo-cegos.48

Fator de crescimento derivado de plaquetas O PDGF é liberado de grânulos alfa das plaquetas logo após a lesão. O PDGF atrai neutrófilos, macrófagos e

fibroblastos para a ferida e serve como um mitógeno potente. Os macrófagos, células endoteliais e fibroblastos também sintetizam e secretam PDGF na ferida. O PDGF estimula fibroblastos a sintetizar nova MEC, em predominância os componentes não colagenosos como os glicosaminoglicanos e proteínas de adesão, e contrair essas matrizes.49 O PDGF também aumenta a quantidade de colagenase secretada por fibroblastos, indicando um papel para esse fator de crescimento na remodelagem de tecidos. O PDGF induz com vigor a produção de tecido de granulação e foi o primeiro fator de crescimento a ser aprovado para o tratamento de feridas diabéticas não cicatrizadas.50

Fator β de crescimento transformador A família TGF-β compreende TGF-β1-3, proteínas morfogenéticas ósseas (PMO) e activinas. TGF-β1 predomina na cicatrização de feridas do adulto e é um fator de crescimento pró-migratório e pró-fibrosado que estimula de maneira direta a síntese de colágeno e diminui a degradação de MEC por fibroblastos. Ele é liberado de todas as células no local da ferida, incluindo plaquetas, macrófagos, fibroblastos e ceratinócitos. O TGF-β atua de forma autócrina, estimulando a própria síntese e secreção. TGF-β também atrai de forma química fibroblastos e macrófagos para a ferida, promove a formação de tecido de granulação, a diferenciação de miofibroblastos e contração da ferida. O TGF-β acelera a cicatrização de feridas quando ele é aplicado de modo experimental em feridas que não têm deficiência no reparo. Todavia, o aumento na taxa de reparo ocorre à custa do aumento da fibrose, que poderia ser uma desvantagem durante a cicatrização normal da pele. Além disso, o aumento da atividade de TGF-β está associado à fibrose patológica em múltiplos sistemas de órgãos diferentes, incluindo coração, pulmões, cérebro, fígado e rins. O TGF-β estimula a síntese de MEC aumentando o colágeno, elastina e síntese de glicosaminoglicanos. Ele aumenta a expressão da integrina, que aumenta interações célula-matriz. TGF-β aumenta o acúmulo de MEC diminuindo MPM e aumentando inibidor tecidual da expressão de MPM. Por intermédio desses mecanismos, a fibrose exógena de TGF-β aumenta a fibrose no local da ferida.51 Como é curioso notar, estudos em camundongos com a falta de atividade de TGF-β endógeno demonstram cicatrização acelerada com uma resposta inflamatória prejudicada.52 Em feridas crônicas, no entanto, TGF-β significativamente reduzido foi encontrado conduzindo a ensaios clínicos com tratamento de TGF-β que falhou em mostrar efeitos benéficos.53 As activinas e PMO são proteínas pró-migratórias secretadas por ceratinócitos e fibroblastos durante o reparo de feridas e promovem a diferenciação de ceratinócitos.53 Esses achados realçam os efeitos complexos de TGF-β e outros fatores de crescimento durante o processo de reparo.

Fatores de crescimento de fibroblastos Os fatores de crescimento de fibroblastos (FGFs) são um grupo de fatores de crescimento de ligação à heparina secretados na MEC, local em que permanecem dormentes até serem ativados por lesão tecidual. Eles são ligados pela heparina e sulfato de heparano glicosaminoglicanos, e têm uma ampla gama de funções biológicas, específicas para cada isoforma. FGF-1 (FGF ácido) e FGF-2 (FGF básico) estimulam a angiogênese.26 As células endoteliais, fibroblastos e macrófagos produzem FGF-1 e FGF-2. A membrana basal serve como um depósito de armazenamento para o FGF-2, o qual é liberado na degradação dos componentes da heparina da membrana basal nos locais de lesão. FGF-1 e FGF-2 estimulam as células endoteliais dividindo e formando novos capilares. Eles também atraem de forma química células endoteliais e fibroblastos. FGF-7 (fator de crescimento de ceratinócitos 1 (FCC-1)), FGF-10 (FCC-2) e fator de crescimento epidérmico (FCE) estimulam a epitelização. FCC-1 e FCC-2 são expressos em fibroblastos da ferida e promovem a proliferação dos ceratinócitos e migração de maneira parácrina. A expressão reduzida de FCC-1 ocorre em diabéticos e os níveis de FGF-2, em feridas de camundongos com idade avançada com resposta angiogênica reduzida.54,55 Em um modelo de ferida em um coelho isquêmico, o tratamento exógeno de FCC-2 acelera a epitelização sem um aumento na formação de cicatrizes.32 FCC-2 exógeno também aumenta a resistência à tração da ferida, o conteúdo de colágeno e a espessura da epiderme em modelos animais de cicatrização normal.56 Até agora, apenas um ensaio clínico foi realizado utilizando FCC-2 humano recombinante para o tratamento de úlceras venosas crônicas e apresentou cicatrização acelerada.57

Fator de crescimento endotelial vascular O VEGF é também um estímulo angiogênico potente.58 Ele atua de modo parácrino para estimular a permeabilidade vascular e proliferação por células endoteliais após a liberação de plaquetas, células endoteliais, neutrófilos, macrófagos, fibroblastos e ceratinócitos.59-61 A sua expressão é aumentada em

condições hipóxicas, como as encontradas no local da ferida.62 A transferência do gene intramuscular do VEGF para pacientes com úlceras isquêmicas resultou em germinação de vasos colaterais e salvamento do membro.63 Apesar desses resultados promissores, recomenda-se o uso cuidadoso de VEGF porque a administração de VEGF exógeno produziu vazamento vascular e malformação.64 O fator de crescimento placentário (FCPL) também é pró-angiogênico e atua de maneira sinergística para o VEGF.65 FCPL é suprarregulado na migração de ceratinócitos e promove a formação de tecido de granulação e migração. Ao contrário de VEGF, PLGF não interfere na formação de vaso linfático66 e acelera a cicatrização da ferida em camundongos diabéticos.67

Outros fatores de crescimento e citocinas Vários outros fatores de crescimento afetam o reparo de feridas. A epitelização também é diretamente estimulada pelos membros da família de EGF, por exemplo, EGF, EGF de ligação à heparina (HB-EGF) e TGF-α. Esses mitógenos são liberados por ceratinócitos que atuam de maneira autócrina. O fator de crescimento 1 (IGF-1) semelhante à insulina estimula a proliferação das células e síntese de colágeno por fibroblastos e interage de forma sinérgica com HB-EGF, PDGF, FGF-2, facilitando a proliferação de fibroblastos.51 Várias citocinas que compreendem interleucinas (IL), quimiocinas e fator-α de necrose tumoral (TNF-α) medeiam as funções das células inflamatórias no local da ferida e contribuem para a remodelagem de tecidos e angiogênese.51 IL-6 é crucial para o início da resposta de cicatrização da ferida68 ao passo que a superexpressão leva à formação de cicatriz cutânea. TNF-α e interferon-γ demonstraram infrarregular a síntese de proteínas de MEC. O fator estimulador de colônia de granulócitos-macrófagos (GM-CSF) é uma citocina pleiotrópica que estimula a migração e proliferação durante o reparo de feridas. O tratamento experimental de feridas diabéticas e crônicas mostrou resultados promissores com as taxas de cicatrização mais rápida.69,70 Embora mais estudos sejam necessários para determinar a combinação precisa do fator de crescimento que é ideal para tipos específicos de ferida, a aplicação do fator de crescimento terapêutico tornou-se uma realidade. O uso clínico de PDGF-BB foi aprovado pela Food and Drug Administration para úlceras crônicas. Candidatos mais promissores são VEGF/PLGF, FGF-2 e GM-CSF.

Interações de fatores de crescimento com a matriz extracelular Em condições normais, sem ferimentos, a MEC é um depositário de fatores de crescimento em formas latentes. Com lesão e destruição da matriz, fatores de crescimento são liberados a partir da MEC em forma ativa e, assim, ajudam na iniciação e regulação do processo de reparo. Por exemplo, TGF-β é ligado na MEC ao proteoglicano decorina e é inativo quando ligado. Em locais de lesão, TGF-β forma complexos com sua proteína de ligação, proteína associada à latência (LAP) e é liberado. Sob condições ácidas, tais como em locais de hipóxia e lesão tecidual, LAP desassocia e TGF-β ativa é formada. LAP também pode ser proteoliticamente clivada e liberada por MPM e outras proteases no local da ferida. TGF-β ativa liga-se de imediato aos seus receptores (RI e RII), que estão presentes em fibroblastos, macrófagos e células endoteliais.71 Os receptores RI e RII do TGF-β formam complexos heterodiméricos uns com os outros e a atividade biológica de TGF-β é iniciada na célula-alvo, pela via de Smad.72 Os FGFs são outro exemplo de fatores de crescimento ligados pela MEC. PDGF e HB-EGF também demonstraram ligar-se a proteínas da MEC. O sequestro de fatores de crescimento, com sua posterior liberação durante a lesão, faz com que a MEC desempenhe um papel fundamental no reparo da ferida, apresentando fatores de crescimento que regulam os processos de reparo.

Biologia do reparo da ferida fetal A solução terapêutica para a redução e possível eliminação da formação da cicatriz pode ser encontrada nos mecanismos responsáveis pela cicatrização de feridas sem formação de cicatriz no feto. O feto do início da gestação pode cicatrizar feridas da pele com reparo do tipo regenerativo e sem formação de cicatrizes.74,75 Nas feridas fetais sem formação de cicatrizes, a epiderme e a derme são restauradas a uma arquitetura normal. O padrão da matriz dérmica de colágeno é reticular e inalterado a partir da derme sem ferimentos. O folículo piloso da ferida e os padrões de glândulas sudoríparas são normais também (Fig. 15.6). A ferida não é evidenciada por meio macroscópico a menos que exista uma alteração no contorno da extremidade da ferida, e isso vai lançar uma leve sombra em circunstâncias apropriadas.73 A cicatrização sem formação de cicatriz pelo feto não depende do ambiente fetal. Feridas fetais em marsupiais76 ou feridas no enxerto de pele cicatrizam

sem formação de cicatriz após o transplante para um ambiente pós-natal. Assim, o líquido amniótico, o ambiente intrauterino e os fatores do soro fetal não são necessários para a cicatrização sem cicatriz. O reparo sem cicatriz parece ser inerente ao tecido fetal e é provável que dependa de fatores associados ao desenvolvimento da pele.75 Como é possível notar, o reparo fetal sem formação de cicatriz na pele é específico do órgão com formação de cicatrizes de feridas intestinais na mesma idade gestacional.77 O ambiente fetal por si só não pode induzir cicatrização sem formação de cicatriz na pele adulta. Quando a pele do adulto é transplantada para um feto e, em seguida, ferida em um ponto na gestação quando a pele fetal cicatriza sem formação de cicatriz, os enxertos da pele do adulto ainda cicatrizam com formação de cicatrizes.78 A transformação da cicatrização do adulto em reparo sem cicatriz não pode ser conseguida apenas por perfusão da pele de um adulto com soro fetal ou por imersão em líquido amniótico. Assim, a indução da cicatrização sem formação de cicatriz na pele de um adulto vai exigir mais do que a recriação do ambiente fetal. É possível que os processos de reparo do adulto tenham de ser modificados para recapitular o desenvolvimento da pele. Uma compreensão da biologia do reparo da ferida fetal sem cicatriz vai ajudar os cirurgiões a desenvolver estratégias terapêuticas para minimizar cicatrizes e fibrose.

FIG. 15.6 Ferida na pele de rato fetal feita em idade gestacional de 16,5 dias (termo = 21 dias), corada com hematoxilina e eosina. O padrão dos folículos pilosos é normal e não há formação de cicatriz dérmica de colágeno. Setas pretas indicam tatuagem com tinta nanquim feita no momento do ferimento para localizar a ferida sem cicatriz. (A, C) Feridas cicatrizadas colhidas com 72 horas (×100). O padrão de apêndice epidérmico (folículos pilosos em desenvolvimento) mostra inúmeros apêndices na ferida cicatrizada. (B, D) Vistas ampliadas das mesmas feridas mostram anexos epidérmicos (setas abertas) dentro do local da ferida (×200). Não há presença de infiltrado inflamatório. (Modificado de Beanes SR, Hu FY, Soo C, et al. Confocal microscopic analysis of scarless repair in the fetal rat: defining the transition. Plast Reconstr Surg 2002; 109:160-170.)

Transição de cicatrização sem formação de cicatriz para com formação de cicatriz Tanto a idade gestacional como o tamanho da ferida determinam se o feto vai cicatrizar uma ferida sem cicatriz.79 À medida que a gestação progride, uma transição da cicatrização sem formação de cicatriz para a cicatrização com formação de cicatriz ocorre antes do nascimento. Em modelos animais de grande porte, como o cordeiro fetal e macaco (Fig. 15.7), essa transição se dá durante a primeira parte do terceiro trimestre para feridas incisionais, fechadas. Além disso, o tamanho da ferida afeta a ocorrência temporal dessa transição. Feridas excisionais abertas devem ser feitas mais cedo na gestação do que as feridas incisionais fechadas para

que ocorra a cicatrização sem formação de cicatriz. Ademais, as feridas abertas maiores devem ser feitas mais cedo na gestação do que as feridas abertas menores para cicatrização sem formação de cicatriz.79 As razões exatas subjacentes a essas observações permanecem desconhecidas, mas devem se relacionar com o fato de a ferida ter ou não cicatrizado antes de um determinado limiar no desenvolvimento. A mudança de cicatrização sem formação de cicatriz para com formação de cicatriz não é abrupta, mas em vez disso ocorre de maneira gradual, com um desfecho de reparo intermediário que não é nem a regeneração nem a cicatriz: é a ferida de transição. A ferida de transição tem colágeno reticular normal e padrão da matriz do tecido conjuntivo, mas não tem restauração de apêndices epidérmicos.73 Assim, ele tem características tanto de cicatrização com formação de cicatriz (sem apêndices) como sem cicatriz (MEC normal).

FIG. 15.7 Ferida em lábio por excisão em cunha de espessura total em feto de macaco feita no início do terceiro trimestre e colhida 2 semanas depois. A ferida cutânea é identificada pelas suturas. Não há presença de cicatriz histológica e o músculo orbicular da boca foi reformado pelo defeito.73 Como é interessante notar, a narina estava deformada em comparação com o lado contralateral.

Diferenças entre a cirurgia fetal e reparo no adulto Diferenças celulares Como os fibroblastos fetais depositam matriz em um padrão livre de cicatriz, eles são cruciais para o reparo sem cicatriz. Um número de estudos definiu as diferenças funcionais entre fibroblastos dérmicos fetais e pósnatais. Em primeiro lugar, os fibroblastos fetais sintetizam mais colágeno tipo III e IV com proliferação simultânea, em contraste com suas contrapartes pós-natais in vitro.80 Os fibroblastos fetais não responderam à estimulação de TGF-β com a síntese de colágeno em comparação com fibroblastos pós-natais in vitro.81 Além disso, a maior expressão do gene de MPM-1, 2, 3, 9 e 14 é encontrada durante a cicatrização de feridas fetais com miofibroblastos praticamente ausentes durante o início da gestação.82,83 Os fibroblastos fetais também migram a uma velocidade maior do que os fibroblastos pós-natais.84 É provável que o aumento da velocidade de migração durante o reparo afete a deposição de colágeno e reticulação. Em feridas pós-natal, a continuidade da epiderme é restaurada por proliferação de células-tronco derivadas da membrana basal epidérmica e da protuberância do folículo piloso.85 Pelo fato de a pele fetal imatura não ter protuberâncias pilosas, a origem das células-tronco talvez seja diferente para o reparo da ferida do adulto.86 Na

verdade, uma nova célula-tronco foi descoberta há pouco tempo e denominada célula pontilhada porque era extremamente pequena.86 As células pontilhadas são encontradas em membranas basais e no sangue durante o desenvolvimento fetal e têm uma forte afinidade com o tecido ferido. Após o transplante de células pontilhadas nas feridas murinas adultas, observou-se cicatrização sem formação de cicatriz. Apesar do seu tamanho pequeno, essas células parecem ter um grande futuro no reparo de feridas.

Diferenças no reparo de feridas Vários parâmetros de reparo são diferentes em feridas fetais em comparação com feridas pós-natais. A taxa de reparo para feridas de igual tamanho é mais rápida no feto. A taxa de síntese de colágeno é maior em feridas fetais. Também se pode acrescentar que a taxa de epitelização é mais rápida na ferida fetal.80 O reparo da ferida fetal pode ser mais rápido porque há um período pequeno ou ausente de ativação para o fibroblasto fetal sintetizar MEC no local da ferida. Uma diferença fundamental entre o reparo do tecido fetal e pós-natal é um infiltrado celular inflamatório reduzido no reparo da ferida fetal.87 A inflamação desempenha um papel proeminente no reparo pós-natal, mas não está presente em quantidades significativas durante a cicatrização fetal sem formação de cicatriz. Isso pode ser causado pelo sistema imunológico fetal imaturo com redução da degranulação plaquetária, de produção de PDGF e TGF-β.87 No entanto, um infiltrado celular inflamatório acentuado ocorre mais tarde na gestação após a transição quando feridas fetais formam cicatrizes. A quantidade de inflamação correlaciona-se bem com a quantidade de formação de cicatriz.

Expressão do fator de crescimento no reparo da ferida fetal Poucos fatores de crescimento associados ao reparo no adulto têm expressão aumentada em feridas fetais sem formação de cicatriz. Isso pode ser devido às grandes diferenças inerentes na regulação entre os dois sistemas de reparo. Os fatores de crescimento que são suprarregulados em feridas sem cicatriz aumentam com maior rapidez do que feridas pós-natais. Um exemplo é VEGF, que é expressado com rapidez e três vezes mais após a lesão em feridas sem cicatriz, mas é atrasado em feridas no pós-natal.88 A expressão das isoformas de TGF-β, receptores e moduladores de bioatividade foi analisada em feridas fetais. Em comparação com feridas com cicatrizes, as feridas fetais sem cicatriz têm mais TGF-β3, tipo de receptor II e expressão de fibromodulina.89 Em contrapartida, o aumento de TGF-β1, receptor tipo I e expressão de decorina está associado à transição para a formação de cicatriz. Assim, o perfil de expressão de isoformas, receptores e moduladores para um fator de crescimento pode ser diferente em feridas com cicatrizes e sem cicatrizes. Ao compreender o perfil de expressão do reparo sem cicatriz para um fator de crescimento, obtém-se a informação que pode possibilitar a recapitulação deste perfil durante o reparo pós-natal para reduzir a formação de cicatrizes. A adição exógena de várias citocinas às feridas fetais também foi realizada e em todos os casos resultou na cicatrização acelerada. As citocinas testadas incluem TGF-β1, TGF-β2, PDGF e BMP-2, sendo que cada uma delas apresenta expressão aumentada durante a formação de cicatriz nas feridas pós-natais.90-92 Assim, fatores de crescimento com expressão aumentada de feridas com formação de cicatriz provavelmente modulam feridas sem cicatriz de maneira semelhante, e isso resulta em formação de cicatriz.

Diferenças na expressão gênica Como a pele fetal está crescendo e se diferenciando, os genes associados ao desenvolvimento são propensos a ter um papel importante durante a cicatrização sem formação de cicatriz. Sua expressão não pode ocorrer durante a cicatrização do adulto em consequência de sua inativação no fim do desenvolvimento. Os genes homeobox são fatores de transcrição que regulam a expressão do gene durante a embriogênese. PRX2 é um gene homeobox que tem a expressão aumentada durante a cicatrização da ferida fetal sem formação de cicatriz e apenas expressão fraca durante a cicatrização da pele de adultos.93 Novos dados estão disponíveis para proteínas Wnt envolvidas na maturação da pele, reparo da ferida fetal e do adulto.94,95 A sinalização Wnt é aumentada na cicatrização da ferida pós-parto, mas não na ferida murina fetal com influência fibrosada semelhante a TGF-β1 no pós-natal, mas não nos fibroblastos fetais.96 A sinalização diferencial em células fetais e adultas em resposta ao ferimento parece direcionar o caminho para regeneração de tecido ou formação de cicatriz.

Diferenças na composição da matriz A pele fetal e a matriz da ferida são compostas por mais ácido hialurônico do que a pele e cicatriz pós-natal. O ácido hialurônico estimula a migração de fibroblasto e talvez afete o padrão de deposição de MEC.84 A elastina, presente na pele de adultos, está ausente na derme fetal, embora não tenham sido encontradas diferenças nas proteínas da membrana basal ou na formação de vasos.97 A pele fetal e MEC da ferida têm uma quantidade até certo ponto maior de colágeno tipo III, mas não se sabe como isso afeta a formação da cicatriz. A espessura da fibra de colágeno é aumentada em feridas fetais com formação de cicatriz se comparadas com a pele não ferida, como medido por microscopia confocal. Essa distância entre as fibras de colágeno também é maior nas feridas fetais com formação de cicatrizes, mas os mecanismos que causam essas primeiras mudanças na cicatrização associadas à formação de cicatriz ainda precisam ser elucidadas.74 O reparo da pele fetal sem formação de cicatriz é o plano para reparo ideal. No que se refere ao TGF-β3, um produto contra a formação de cicatrizes foi desenvolvido98 mas não se conseguiu provar sua eficácia em ensaios clínicos de fase III. Contudo, os mecanismos responsáveis pelo reparo sem formação de cicatriz ainda precisam ser determinados por completo e, quando delineados, é provável que levem a estratégias inovadoras de tratamento contra a formação de cicatrizes.

Patologia da ferida do adulto Feridas crônicas (não cicatrizadas) As feridas crônicas ou não cicatrizadas são feridas abertas que não epitelializam nem fecham em uma quantidade razoável de tempo, em geral definido como 30 dias. Essas feridas costumam ser clinicamente estagnadas e incapazes de formar tecido de granulação robusto. Muitos fatores contribuem para inibir a cicatrização nesses pacientes, mas nenhuma teoria unificadora pode explicar a etiopatogenia de cada ferida não cicatrizada isolada (Tabela 15.2). Condições clínicas como diabetes, insuficiência arterial, doença venosa, linfedema, uso de esteroides, doença do tecido conjuntivo e lesão por radiação inibem a cicatrização de feridas. Feridas não cicatrizadas também podem ser causadas por necrose de pressão, infecção (sobretudo osteomielite), câncer de pele, desnutrição, doença dermatológica crônica e outras condições metabólicas. Em cada caso, o tratamento inicia-se com o desbridamento de qualquer tecido necrosado presente.99 Apesar do tratamento ideal para cada problema clínico, porém, essas feridas com frequência ainda não cicatrizam e a intervenção cirúrgica é necessária.

Tabela 15.2 Fatores que podem prejudicar a cicatrização normal e levar a feridas crônicas não cicatrizadas Etiopatologia Vascular

Causas físicas, químicas e biológicas

Neuropática

Exemplos Arterial

Arteriosclerose, aneurisma arterial, embolia gordurosa com obstrução arterial, hipertensão (úlcera de Martorell)

Linfático

Edema linfático, linfangiodisplasia

Venoso

Insuficiência venosa crônica, tromboflebite necrosante

Arteriovenoso misto

Arteriosclerose combinada com insuficiência venosa, malformações/displasia arteriovenosa; fenômeno de roubar (p. ex., derivações arteriovenosas, compressão/obstrução vascular (causada por tumores, aumento dos nódulos linfáticos etc.)

Vasculite

Granulomatose de Wegener, vasculite de Churg-Strauss, púrpura de Henoch-Schönlein, síndrome de Sneddon, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide, síndrome de Felty, arterite de Takayasu, poliarterite nodosa, síndrome de Kawasaki, pioderma gangrenoso, necrobiose diabética lipoídica, trombangiite obliterante (síndrome de Buerger), reações alérgicas

Síndromes vasculopáticas

Síndrome de Raynaud, esclerodermia sistêmica, CREST, síndrome de Klippel-Trenaunay, síndrome de proteus 145,146, síndrome CLOVE,147 síndrome de Kasabach-Merritt

Pressão

Imobilidade, repouso intra e pós-operatório, sapatos e gessos apertados, terapia de compressão

Traumatismo

Lacerações, qualquer tipo de tecido mole e lesão óssea, ruptura vascular

Térmica

Queimaduras/geladura, lesão elétrica (corrente elétrica/alta tensão/raios)

Radiação

Radioterapia

Química-tóxica

Extravasamento, queimaduras químicas (ácidos/bases), escleroterapia

Infecções

Erisipela, fasciíte necrotizante, embolia cutânea séptica, osteomielite, complicações após infecção cutânea Herpes simples, citomegalovírus, vírus da imunodeficiência humana, sífilis, lepra, tuberculose Úlceras tropicais, infecções parasitárias e infecções vermiculares

Pós-traumática

Lesões medulares com paralisia, lesão de nervo periférico

Congênita

Espinha bífida, siringomielia, esclerose múltipla, síndromes neurológicas

Doenças neuropáticas sistêmicas

Diabetes melito, neuropatia etiltóxica, neuropatias degenerativas centrais e periféricas Poliomielite, lepra, tabes dorsalis

Hemopatológica Doenças sistêmicas

Doenças neoplásicas

Policitemia vera, anemia falciforme, outras anemias, talassemia, trombocitemia vera, púrpura trombocitopênica, aumento da viscosidade sanguínea (paraneoplásica, paraproteinemia, hiperglobulinemia, leucemia), complicação após transfusão de sangue

Hemostasiologia comprometida

Síndrome do Fator V de Leiden, síndrome antifosfolípide, fibrinólise perturbada, síndrome de deficiência de fator XIII, deficiência de antitrombina III, deficiência de proteína C/S, necrose Marcumar, coagulação intravascular disseminada, necrose decorrente de terapia antagonista da vitamina K

Tumores cutâneos

Carcinoma basal e espinocelular, melanoma, síndrome de Bowen, úlcera de Marjolin (carcinoma de cicatriz),148 tumores com metástase cutânea ou penetração (p. ex., síndrome de Paget)

Modalidades terapêuticas

Esteroides, úlcera de vacinação (BCG), fármacos citostáticos, AINE, extravasamento de vários fármacos

Doenças sistêmicas

Insuficiência hepática e/ou renal, imunossupressão, sarcoidose, homocisteinemia, hemocromatose

Outras causas

Alcoolismo, obesidade, gota, tabagismo, idade avançada, desnutrição (p. ex., deficiência de vitaminas, proteínas e micronutrientes, escorbuto); doenças psiquiátricas com automutilação, negligência, uso abusivo de fármacos intravenosos; corpos estranhos/projéteis com fístulas

CREST, calcinose, síndrome de Raynaud; dismotilidade esofágica, esclerodactilia e telangiectasia; CLOVE, supercrescimento lipomatoso congênito; malformações vasculares e nevos epidérmicos; BCG, bacilo Calmette-Guérin; AINE, medicamentos anti-inflamatórios não esteroides.

Úlceras de pressão As feridas que se desenvolvem sobre uma proeminência óssea, na maioria das vezes no paciente imóvel, são denominadas úlceras de pressão. Elas também são chamadas de úlceras de decúbito ou escaras. O sacro, ísquio e trocânter maior são as localizações mais comuns acometidas.100 Todavia, as cabeças dos metatarsos, tornozelos, calcanhares, joelhos e occipício são suscetíveis sob determinadas condições. Outro problema é a necrose de pressão da pele maleolar ocasionada pela colocação de gesso para constrição. A quantidade de necrose de pressão do tecido é determinada tanto pelo grau quanto pela duração da pressão. Quando a pressão do tecido é maior do que 25-30 mmHg e a pressão de perfusão capilar é bloqueada, a microcirculação é

comprometida. Pode ocorrer necrose com apenas 2 horas de pressão contínua nesse nível.101 A pele é mais resistente a necrose de pressão do que a gordura e músculo subjacentes, o que explica o achado comum de uma pequena área de ulceração da pele que recobre um volume cavitário grande de necrose de gordura e músculo subcutâneos. O tratamento começa com identificação e controle dos fatores que levam ao aumento da pressão e posterior formação da ferida. Os pacientes paralisados exigem rotação periódica e um colchão de ar ou outro tipo de leito de baixa pressão. É comum que as almofadas de assento de cadeiras de rodas precisem ser mudadas em pacientes com úlcera de pressão isquiática. O comportamento, como ficar sentado em cadeiras de rodas por tempo prolongado sem distribuição igual do peso, deve ser modificado com frequência. Contraturas de membros inferiores que causam pressão excessiva nos quadris, joelho e tornozelo podem precisar de liberação. Gessos apertados devem ser removidos e substituídos. Próteses de extremidade inferior indevidamente ajustadas podem levar a feridas no coto e precisar de modificação. Outros fatores contribuintes, como desnutrição, infecção e diabetes melito devem ser identificados e tratados. A maioria das úlceras de pressão vai cicatrizar evitando-se pressão sobre a área envolvida. No entanto, elas se curam com cicatriz, que é menos resistente a traumatismos do que a pele normal. Assim, existe uma maior incidência de recorrência após o fechamento espontâneo dessas feridas do que se elas forem fechadas via cirurgia com retalhos de pele normal e músculo ao longo da proeminência óssea.102,103

Feridas das extremidades inferiores As feridas nas pernas em geral surgem como decorrência de uma de duas doenças vasculares diferentes: insuficiência arterial ou venosa. A maioria (80%-90%) resulta de doença valvular venosa (insuficiência venosa).104 O papel da drenagem linfática comprometida é discutido de maneira controversa sobre ser uma causa direta de feridas não cicatrizantes ou agravamento de insuficiência venosa.104a Venoso O aumento da pressão venosa na extremidade inferior dependente com incompetência valvular leva a edema localizado com extravasamento de plasma. O extravazamento de fibrinogênio resulta na formação de uma camada de fibrina em torno dos capilares, que prejudica a difusão de oxigênio e nutrientes.105 Os leucócitos podem ficar presos e ser ativados em capilares obstruídos. Os radicais de oxigênio e proteases podem então ser liberados, o que provoca necrose do tecido. A obstrução pós-capilar leva a um aumento da pressão de perfusão e hipóxia, com posterior necrose. Sem tratamento, o tamanho da ferida pode facilmente continuar a aumentar. Arterial As feridas requerem distribuição adequada de oxigênio para cicatrizarem. Feridas isquêmicas cicatrizam de maneira precária e têm um risco muito maior de infecção.106 O traumatismo menor, resultante de arranhões e escoriações que de outra forma logo cicatrizariam em uma extremidade bem vascularizada, pode evoluir para grandes feridas em membros isquêmicos. Há desenvolvimento de infecção necrosante que não é apenas ameaçadora do membro, mas também da vida. Um sinal clínico confiável de influxo arterial adequado para cicatrização é a presença de um pulso arterial. O índice de pressão tornozelo-braquial (ABPI) representa um método não invasivo simples para detectar insuficiência arterial em um membro. Para calcular ABPI, divide-se a pressão arterial sistólica medida no nível do tornozelo pela pressão arterial sistólica medida na artéria braquial.107 As faixas normais de ABPI foram definidas como sendo de 0,91-1,3, enquanto que índices de ≤0,4 implicam clinicamente em isquemia crítica do membro.108 A medição de oxigênio transcutânea é um método não invasivo com 83% de precisão em previsibilidade de fechamento da ferida e 68% em prever falha em um membro isquêmico.109,110 Para padronizar medições de oxigênio transcutâneas, a hipóxia tecidual foi definida como 1 cm) 50% taxa de recorrência com laser de dióxido de carbono

Crioterapia

Alguma eficácia comprovada na redução de queloide

Hipopigmentação, dor, atrofia da pele

Fita microporosa

Facilidade, baixo custo

Benefício não comprovado, exceto relatórios não controlados

Tratamentos populares (vitamina E, extratos de cebola e outros cremes vegetais)

Facilidade, baixo custo

Nenhum benefício comprovado

Tratamentos fisioterápicos: ultrassom, estimulação elétrica pulsada, hidroterapia, massagem

Participação de pacientes, aumento da amplitude de movimento; pode diminuir a dor da cicatriz, prurido

Nenhuma eficácia quantitativa comprovada, custo

TGF-β 3 recombinante humano (avotermin), rh IL-10 (ilodecakin), inibidores de TGF-β1

Ensaios clínicos de fases

Experimental, custos elevados, falta de eficácia

Injeções com medicação antiinflamatória/proliferativa (5fluorouracil, interferons, retinoides, antagonistas de histamina)

Fluorouracil: aplicação repetida necessária, sem efeitos sistêmicos Retinoides: ainda experimental, reduz tecido da cicatriz e produção de sebo

Fluorouracil: administração única, com recorrência Interferon: alta taxa de recorrência, efeitos sistêmicos adversos Retinoides: efeitos adversos com fotossensibilidade e irritação da pele

Bloqueadores dos canais de cálcio (verapamil)

Ensaios clínicos em curso, boa eficácia

Ainda experimental

Terapias experimentais (bleomicina, imiquimod, ciclosporina)

Experimental, alguma eficácia

Benefício não comprovado, efeitos colaterais sistêmicos?

Agulhamento clínico (medical needling)

Ensaios clínicos de fases usando o Medical Roll-CIT, baixo custo, facilidade

Pré-tratamento com retinoides, anestesia geral necessária para o tratamento de superfícies de maiores dimensões, acompanhamento curto, recorrência

Prevenção A primeira etapa para o tratamento de cicatrizes excessivas é o reconhecimento precoce e a instituição da terapêutica após a cirurgia ou traumatismo. A manipulação meticulosa do tecido, a realização da sutura e o manejo da ferida com esforços para evitar a infecção são obrigatórios.203 É essencial a proteção solar para reduzir a hiperpigmentação da cicatriz. Os pacientes que estão sob maior risco de formação excessiva de cicatrizes beneficiam-se de técnicas de prevenção, que incluem lâminas de gel de silicone ou pomadas, fita microporosa hipoalergênica e injeção intralesional de esteroides concomitante.203 A lâmina de gel de silicone é bastante utilizada para tratamento de cicatriz hipertrófica e queloide. As lâminas de gel de silicone têm uma história de mais de 20 anos com vários ensaios randomizados, controlados que sustentam sua utilização segura e eficaz.204,205 É indolor e, portanto, útil para as crianças. Os mecanismos

propostos de ação para redução de cicatrizes incluem a melhora da hidratação e oclusão,206 aumento da elevação da temperatura de 1°C (ou menos) que pode afetar a cinética de colagenase, e mudança na expressão de moléculas de adesão do infiltrado linfocítico.207 Quando o tratamento com lâminas de gel de silicone não é viável (p. ex., localização da cicatriz na face, couro cabeludo ou pescoço), cremes à base de óleo de silicone são uma alternativa.208 Por exemplo, cremes à base de silicone são usados com frequência em cicatrizes de reparo de fenda labial, cicatrizes hipertróficas após queimaduras, ou lesão na mão, sem reação alérgica ou outra reação adversa até o momento. A fita hipoalergênica microporosa pode aliviar a tensão através de feridas e minimizar o risco de cicatrizes excessivas decorrentes de cisalhamento. Embora não existam estudos prospectivos controlados para apoiar a sua utilização, a fita é usada de modo rotineiro e recomendada por muitos autores.203 A fita é aplicada por algumas semanas após a cirurgia. Em pacientes que estão em risco extremamente elevado, como após excisão de queloide ou cicatriz hipertrófica, injeções intralesionais de esteroides concomitantes podem ser administradas de forma profilática, seguidas por injeções mensais, se necessário. As taxas de sucesso, medidas pela ausência de recidiva, são relatadas em até 92% para queloides e 95% para as cicatrizes hipertróficas em uma média de acompanhamento de 30,5 meses.209

Algoritmo de tratamento Cicatrizes hipertróficas imaturas (vermelhas) Tão logo a formação de cicatriz excessiva seja identificada, o tratamento inicial de consenso do International Advisory Panel on Scar Management (Conselho Internacional de Recomendações para Controle de Cicatrizes) é uma lâmina de gel de silicone, injeção de esteroides e terapia de pressão localizada (Fig. 15.8).203 Pode ser difícil prever se as cicatrizes hipertróficas imaturas (vermelhas, um pouco elevadas) vão regredir ou progredir. Quando o eritema persiste por mais de 1 mês, o risco de progressão para cicatriz hipertrófica linear aumenta, e deve-se iniciar uma terapia apropriada.

FIG. 15.8 Algoritmo de manejo de cicatriz. (Reproduzido de Mustoe TA, Cooter RD, Gold MH, et al., International clinical recommendations on scar management. Plast Reconstr Surg 2002; 110: 560-571, com permissão.)

Cicatrizes hipertróficas lineares (vermelhas, um pouco elevadas) As opções de tratamento incluem a aplicação de vestimentas com pressão ou lâminas de silicone de uso tópico, terapia a laser de corante pulsado de 585 nm e reexcisão. A última opção é a mais útil em casos de excesso de cicatriz ocasionada por infecção da ferida ou deiscência. Se a ferida original foi fechada após os princípios básicos descritos e cicatrizou sem intercorrências em outros aspectos, a reexcisão com fechamento primário não é suscetível de resultar em uma cicatriz melhorada. A recorrência de cicatriz hipertrófica é alta nessas circunstâncias e, portanto, a maioria dos cirurgiões plásticos não trata a cicatriz hipertrófica com excisão e fechamento primário, a menos que eles planejem terapia adjuvante. O gel de silicone provou ser benéfico em estudos randomizados, controlados e é uma terapia recomendada de primeira linha.203 Injeções de esteroides simultâneas são úteis para cicatrizes pruriginosas ou resistentes. A terapia de pressão pode ser adicionada quando viável. O tratamento com laser de luz pulsada (585 e 595 nm) de cicatrizes hipertróficas é outra alternativa. A energia da luz do laser com corante pulsado é absorvida pela hemoglobina intravasal, levando a coagulação, obstrução de vaso e hipóxia tecidual com necrose. Como consequência, nova síntese de colágeno, realinhamento da fibra de colágeno e remodelagem são as bases moleculares para os efeitos observados após tratamento com laser com corante pulsado.210

Cicatrizes hipertróficas disseminadas decorrentes de queimaduras (vermelhas, elevadas) Cicatrizes hipertróficas de queimaduras em uma área de superfície extensa podem ser mais bem tratadas em centros de queimadura quando viável. As terapias multimodalidade em geral são utilizadas; estas incluem lâminas de gel de silicone, malhas com pressão ajustada, personalizada e fisioterapia isolada ou com massagem, estimulação elétrica ou ultrassom. A aplicação de injeção de esteroides, em particular em áreas difíceis, às vezes é necessária. O tratamento com laser pode ser útil.211 O tratamento cirúrgico com Z-plastia, excisão e enxerto e a reconstrução com retalhos é necessária na maioria das vezes.203

Queloides menores (vermelhos, elevados) Não existe nenhum tratamento bem-sucedido com constância para a cicatriz queloide. A excisão e fechamento primário sempre resultam em recorrência. Portanto, é necessária terapia adicional, e sua eficácia depende do momento da apresentação do paciente. A injeção de esteroides diretamente no queloide tem o maior benefício no início do curso do queloide.212 O esteroide mostrou diminuir a expressão do gene do colágeno.213 Misturado com lidocaína a 2% simples em uma proporção de 50:50, o acetonido de triancinolona de 10 mg/mL é em geral usado a princípio; se não houver resposta, tenta-se concentração de 40 mg/mL. Lâminas de gel de silicone devem ser utilizadas ao mesmo tempo. Os pacientes que apresentam lesões queloideanas maduras de meses a anos de duração que estão mudando devagar respondem mal a injeção de esteroides e lâminas de silicone. A excisão cirúrgica com terapia adjuvante, incluindo esteroides intralesionais, lâminas de silicone e terapia de pressão, é uma alternativa de tratamento razoável.210 O acompanhamento cuidadoso é necessário para evitar recidiva. Um curso curto de terapia de radiação de baixa dose no local da excisão do queloide logo após a excisão demonstrou reduzir a taxa de recorrência.214

Principais queloides (escuros, elevados) Os principais queloides são difíceis de serem tratados de maneira efetiva, e muitos são resistentes a qualquer tratamento. O tratamento cirúrgico com todas as terapias adjuvantes já descritas ainda pode falhar e resultar em recorrência. A radioterapia costuma ser usada neste grupo, desde que o paciente não seja jovem e aceite o possível risco de formação de câncer tardio. Antes de a cirurgia ser realizada com terapia adjuvante no pósoperatório, os pacientes devem ser orientados sobre a alta taxa de recorrência com o risco de que o próximo queloide será maior e mais difícil de controlar. Conforme recomendado pelo Conselho Internacional de Recomendações para Controle de Cicatrizes, esses pacientes podem ser mais bem tratados por médicos com um interesse especial no tratamento de queloides.203

Impacto da cicatriz na cirurgia plástica Além da formação de cicatriz hipertrófica e de queloide na pele, a cicatriz afeta todos os aspectos da cirurgia plástica. Cicatriz e fibrose são o resultado após o reparo tecidual e, quando em excesso, leva à doença clínica. Por exemplo, a fibrose de cápsulas articulares leva a contratura, o que pode ser debilitante. A fibrose

anastomótica de retalhos jejunais livres no esôfago ou faringe leva à obstrução do lúmen. Cápsulas de implantes mamários são a resposta fibrosada normal à lesão, o que pode ser excessivo e evoluir para contratura capsular. Os locais de reparo de nervos com excesso de fibrose comumente desenvolvem neuromas e falha do reparo funcional. A formação de cicatriz em locais de reparo do tendão restringe o movimento. A doença de Dupuytren é um distúrbio fibroproliferativo que envolve a fáscia palmar e derme profunda. Cada uma dessas condições de cicatrizes excessivas leva à morbidade do paciente, o que pode requerer tratamento cirúrgico adicional.

Terapias para surgimento de cicatrizes Uma grande parte da pesquisa está voltada para o desenvolvimento de estratégias de tratamento para reduzir ou evitar a formação de cicatrizes. Alertados por observações de cicatrização fetal de feridas, os pesquisadores primeiro analisaram o efeito contra a formação de cicatrizes das estratégias de TGF-β. O tratamento com anticorpo neutralizante ao TGF-β diminuiu a resposta inflamatória e reduziu a formação de cicatrizes em feridas de roedores pós-natais experimentais.215 Mais evidências de que estratégias relacionadas ao TGF-β podem ser bem-sucedidas são fornecidas por um estudo que mostra que a adição exógena, às feridas, de fibromodulina, um modulador de TGF-β, reduz a cicatriz.89 Sem dúvida, mais estudos são necessários, e como resultado da redundância de ação entre fatores de crescimento, TGF-β talvez não seja o único fator de crescimento direcionado a reduzir cicatriz humana e fibrose. Modalidades de tratamento mais recentes, como injeção intralesional de bleomicina, 5-fluorouracil e imiquimod podem ser úteis no futuro. Tais tratamentos atuam diminuindo a inflamação e a síntese de colágeno; no entanto, seus mecanismos de ação permanecem sob investigação. A terapia com interferon foi deixada por causa de efeitos colaterais adversos e altas taxas de recorrência.210,216 Outras estratégias inovadoras incluem a aplicação de fatores de crescimento antifibróticos humanos recombinantes e citocinas (p. ex., rh IL10), substâncias anti-inflamatórias, inibidores de protease e moléculas que interferem na função de citocinas (por exemplo, TGF-β) e a síntese de colágeno no local da ferida.217 Os ensaios clínicos hoje são realizados utilizando duas novas técnicas diferentes para redução de cicatrizes. Fototermólise seletiva é induzida por lasers dopados com érbio que operam em um comprimento de onda de 1.550 nm, tendo como alvo água como um cromóforo. Isso cria microlesões dérmicas com largura, profundidade e densidade controladas seguidas por neocolagênese.218 Esses lasers são usados tanto para o tratamento de hiperpigmentação e cicatrizes de acne quanto para cicatrizes cirúrgicas e traumáticas. A terapia de indução percutânea de colágeno é usada em nosso departamento para a redução de cicatrizes hipertróficas, distensão de estrias, rugas e flacidez da pele. Após o pré-tratamento com creme com vitamina A e C, os pacientes são tratados sob anestesia. Agulhas do Medical Roll-CIT criam microferidas dérmicas e estruturas de colágeno separadas ligam a cicatriz à derme superior. A reação inflamatória que se segue é responsável pela remodelagem do colágeno que é induzida com consequente achatamento da cicatriz.219

Perspectivas futuras Fator de crescimento e terapia sequestradora de protease Os fatores de crescimento mais bem estudados como mais promissores para melhorar a cicatrização são PDGF, TGF-β e membros da família FGF (Tabela 15.1). Antes do uso generalizado, porém, vários obstáculos devem ser superados, inclusive aplicação eficaz, desenvolvimento do veículo e custo. Por exemplo, líquido e tecido para ferida humana não cicatrizada aumentaram a atividade da protease, o que é provável de degradar os fatores de crescimento peptídicos aplicados de maneira rápida e exógena.118,220 Produtos que visam atividade excessiva poderiam ser matrizes sequestradoras de protease (p. ex., Promogran),196 inibidores seletivos,221 ou anticorpos específicos. Estudos experimentais e clínicos relataram uma certa eficácia de fatores de crescimento para o tratamento de feridas de queimaduras ou crônicas. A transferência do gene de VEGF foi eficaz em úlceras isquêmicas na perna com formação de vasos colaterais.222 FGF bovino recombinante tópico, KGF humano (repifermin) e GM-CSF aumentaram a cicatrização de úlceras de pressão crônicas e venosas na perna, respectivamente. O EGF humano recombinante crônico teve um efeito positivo sobre a cicatrização de queimaduras de segundo grau, enquanto PDGF-BB humano recombinante tópico (becaplermina), TGF-β2 e fator de estimulação de colônias de granulócitos foram eficazes em úlceras do pé diabético. Contudo, para a terapia de feridas crônicas, até agora

apenas PDGF-BB foi licenciada para uso comercial nos EUA e Europa.196,223

Terapia gênica A terapia gênica para melhorar o reparo de feridas com a introdução de um gene do fator de crescimento, ou outro gene terapêutico, em células de reparo está passando por investigação ativa. Com essa abordagem, o gene deve ser distribuído para a célula-alvo e sua expressão sustentada em um nível terapêutico; o nível e o momento de sua expressão devem ser controlados de maneira reversível, de modo que possa ser interrompido quando não for mais necessário.224 Vários veículos de distribuição estão sendo desenvolvidos, cada um com vantagens e desvantagens exclusivas. O adenovírus deficiente em replicação, vírus herpes simples tipo 1 e vetores do retrovírus têm sido utilizados com sucesso para transferir células e tecidos epidérmicos e dérmicos.224,225 Outras abordagens de distribuição eliminam o vírus e seu possível risco de efeitos colaterais indesejáveis causados pela antigenicidade, potencial de recombinação com vírus do tipo selvagem e dano celular decorrente de exposição viral persistente. Os métodos não virais são classificados em métodos químicos e físicos de transferência de genes. A transferência de genes mediada por lipossomas é um método químico em que o gene é ligado a uma vesícula lipossômica sintética e transportado para a célula-alvo por endocitose. Genes FGF,226 IGF-1,224 KGF,227 e VEGF228 foram transferidos com sucesso para feridas experimentais. A transferência de genes mediada por partículas (biobalística) injeta DNA diretamente nas células e foi utilizada para transferência gênica de TGF-β1,229 EGF,230 e PDGF231 em feridas experimentais. É provável que a terapia gênica se torne uma ferramenta cada vez mais importante para o tratamento de feridas não cicatrizadas à medida que seu método avança. Em um estudo clínico de fase I a segurança, viabilidade e plausibilidade biológica da terapia gênica mediada por adenovírus rhPDGF-BB para tratar doença com úlcera de perna venosa foram demonstradas.232 Existe extrema redundância na função dos fatores de crescimento no local da ferida. Além disso, processos simultâneos múltiplos estão ocorrendo durante o reparo. Assim, é provável que vários fatores de crescimento possam ser adicionados a feridas comprometidas e até mesmo as normais em outros aspectos para efetuar uma melhora significativa em termos clínicos na qualidade e taxa de reparo. Diferentes combinações de fatores de crescimento podem ser necessárias para tratar feridas comprometidas em razão de diferentes doenças subjacentes, tais como diabetes versus insuficiência arterial. Para complicar ainda mais, a neutralização de determinados fatores de crescimento pode ser necessária, bem como o aumento de outros fatores na mesma ferida.

Terapia com células-tronco Por serem abundantes e de fácil acesso em cada paciente, células-tronco adultas multipotentes entraram em foco como fonte de reposição celular e distribuição de fator de crescimento para defeitos do tecido da pele e feridas não cicatrizantes. Além do mais, o enxerto autólogo evita o risco de rejeição e considerações éticas ou morais relativas a material alogênico ou embrionário. Dois tipos principais de células-tronco adultas estão disponíveis: células-tronco epidérmicas e mesenquimatosas (CTMs). As células-tronco epidérmicas estão localizadas na camada basal e folículos pilosos contribuem para a reepitelização após o ferimento.233 Takahashi et al. relataram outro acesso promissor para as células epidérmicas por meio da reprogramação de fibroblastos dérmicos nas células-tronco epidérmicas pluripotentes.234 As CTMs são encontradas em vários tecidos derivados de mesoderme. As CTMs têm o potencial de transdiferenciar em tecidos de origem mesodérmica, por exemplo, músculo esquelético, osso, tendões, cartilagens e gordura, ou fazer “diferenciação cruzada” em células não mesodérmicas sob condições adequadas.235 Os resultados promissores foram relatados no tratamento de feridas crônicas com CTM derivada de medula óssea.236 Como é de fácil acessibilidade e abundância de tecido, o tecido adiposo é uma fonte importante de células-tronco mesenquimatosas. As técnicas de colheita e rotulagem foram refinadas e automatizadas para uma melhor disponibilidade clínica.237,238 Estudos pilotos usando células-tronco derivadas de tecido adiposo multipotentes (CTMad) para a substituição de tecidos moles e cobertura de feridas não cicatrizadas estão em andamento em nosso departamento. Nossa compreensão da regulação biomolecular de reparação e manipulação de células e de tecidos autólogos está em rápida expansão, enquanto a biotecnologia moderna acompanha o progresso científico. Estudos piloto vão comprovar se vale a pena continuar com essas abordagens futuristas com ensaios clínicos controlados.

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Prevenção de cicatriz, tratamento e correção Peter Lorenz e A. Sina Bari

Resumo Desde o trabalho estético mais preciso ao caso de reconstrução mais desafiador, a prevenção e o tratamento de problemas de cicatrizes são fundamentais para a satisfação do paciente e para bons resultados cirúrgicos. O entendimento a respeito de cicatrizes determina o planejamento cirúrgico, a abordagem e a técnica. No acompanhamento dos cuidados, minimizar as cicatrizes pode levar a uma melhora tanto da forma como da função. Mesmo muito tempo depois da recuperação, pacientes com cicatriz patológica ou anormal podem buscar o auxílio de um cirurgião plástico para corrigi-la. E o mais experiente dos cirurgiões pode se deparar com desafios da manipulação do tecido cicatricial nas reoperações. Para começar a enfrentar esses obstáculos, os cirurgiões plásticos criaram um arsenal de ferramentas baseadss nos princípios centrais da nossa disciplina. Publicado em 1957 por Gillies e Millard, The Principles and Art of Plastic Surgery definiu as doutrinas fundamentais da cirurgia plástica e formou a base de nossa área.1 O tratamento e a correção cirúrgica da cicatriz dependem desses princípios. Ideias como diagnosticar antes de tratar, fazer um planejamento, marcar pontos de referência, transferir tecidos de áreas doadoras e restaurar o contorno adequado fazem parte da abordagem para tratar cicatrizes. Mais do que realizar uma simples cirurgia para cada defeito, o cirurgião plástico é responsável por elaborar esses princípios individualmente a cada paciente. Para este arsenal cirúrgico, adicionamos o crescente conhecimento da biologia da cicatrização. Modelos fetais lançaram uma luz sobre os fatores complexos que determinam a cicatrização versus cicatrização de feridas sem cicatriz. Além disso, temos aprofundado nosso conhecimento sobre o mecanismo que leva à formação da cicatriz patológica hipertrófica e da queloide. Avanços na biologia tecidual e celular revelaram muitos novos alvos terapêuticos sendo atualmente estudados. Apesar das ferramentas e dos avanços, cada tratamento, no entanto, começa com o paciente. Um bom resultado no tratamento raramente é obtido sem o conhecimento inicial dos antecedentes ocorridos com o paciente, suas queixas atuais e expectativas futuras. Aqui descreveremos importantes aspectos na abordagem de um paciente com cicatriz, avaliando a cicatriz e conhecendo a biologia da cicatrização. Com isso, focaremos nas estratégias de prevenção, tratamento e correção das cicatrizes. Essas estratégias cada vez mais refletem tanto os avanços modernos na medicina como também os princípios da cirurgia comprovados pelo tempo.

A importância da cicatriz no aspecto social e pessoal As cicatrizes muitas vezes causam profundas comoções. Para os médicos, as cicatrizes representam o ponto final na cicatrização dos tecidos. Para os pacientes, no entanto, frequentemente, as cicatrizes apresentam significados mais profundos e pessoais. Deformidades por doenças, traumas violentos ou malformações no desenvolvimento podem resultar em sequelas físicas e psicológicas ao longo da vida. O tratamento de cicatrizes requer uma compreensão da dificuldade psíquica e social que o paciente pode vivenciar. As cicatrizes podem surgir tanto por situações culturalmente sancionadas como por práticas proibidas. Marcas provenientes de rituais, ou cicatrizes, eram uma parte importante da identificação de tribos pertencentes a certas localidades da África e Austrália.2 Nas comunidades tribais no Sudão e na Papua-Nova

Guiné, a prevalência de formação de queloide em certos grupos raciais tem sido explorada como características espirituais e culturais. Da mesma forma, a arte japonesa da tatuagem, ou irezumi, carregava suficiente peso cultural e foi proibida até 1945, quando as forças de ocupação novamente legalizaram a sua prática. Hoje a tatuagem e, em menor grau, as marcas e as escarificações continuam sendo uma forma popular de autoexpressão. Embora aceitas até certo ponto dentro da sociedade, a psicologia por trás dessas cicatrizes pode sobrepor-se à daquelas patológicas, mas não menos intencionais, de autolesão e automutilação.3 Na cultura ocidental, as cicatrizes muitas vezes carregam uma conotação sinistra ou ameaçadora. Nesse sentido, a questão do gênero desempenha claramente um papel importante no efeito das cicatrizes. Um estudo recente sugere que algumas cicatrizes faciais nos homens sinalizam um comportamento de risco e bravura, sendo observadas como algo mais atraente.4 Esse efeito não foi encontrado quando os observadores mostravam mulheres similarmente marcadas. No entanto, muitas cicatrizes carregam implicações sociais fortemente negativas para ambos os sexos. Estudos de medidas de qualidade de vida em pacientes queimados revelam interferências significativas em relação ao conforto físico, bem como a vida social e o trabalho.5 A depressão e o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) foram identificados como potenciais sequelas a longo prazo. As taxas de TEPT em pacientes queimados variam de 23% a 45% em 1 ano após a lesão.6 Fatores de risco incluem fuga das estratégias de enfrentamento e histórico psiquiátrico preexistente, assim como envolvimento de mão e face e queimadura grave.7 Entender quais aspectos específicos da vida do paciente estão sendo mais prejudicados pode ajudar a direcionar o tratamento tanto médico como não médico. O psicólogo Thomas F Cash descreveu a importância em conciliar no paciente uma “visão de fora” e uma “visão de dentro” para lidar com a deformidade.8 Portanto, é fundamental no tratamento compreender o contexto social e a relação emocional do paciente com as cicatrizes. Uma ferramenta potencialmente útil na compreensão e na avaliação dessas variáveis é o Psychological Aspects of Reconstructive and Cosmetic Plastic Surgery: Clinical, Empirical, and Ethical Perspectives.9 Publicado em 2006, esse texto reflete um esforço multidisciplinar de levar psicólogos, psiquiatras e cirurgiões a determinar e prestar cuidados aos pacientes com deformidades reais ou perceptíveis.

História e exame físico Tal como acontece com todas as formas de tratamento, o primeiro passo na avaliação de um paciente com cicatriz é a obtenção de uma história direcionada e a realização de um exame físico (Quadro 16.1). A etiologia da cicatriz deve ser determinada, bem como os fatores relevantes que influenciam, tais como cirurgia anterior insatisfatória, crime violento ou infecção. O médico responsável deve ter o cuidado de criar empatia com o paciente sem colocar a culpa ou refutar os médicos que o trataram anteriormente. Muitas vezes isso pode ser conseguido focalizando o problema e os próximos passos, em vez de enfatizar os erros passados. Não se consegue nada culpando outros médicos que podem sinceramente buscar seu conhecimento no tratamento de cicatrizes difíceis. Q uadr o 16. 1 Pont os- cha ve

História Etiologia História da infecção Sintomas associados (dor, prurido) Radiação e exposição ao esteroide

Exame físico Tamanho, cor, textura Relação com estruturas normais Aderência ou contratura Mudanças com movimento O exame físico inclui a avaliação da cicatriz, bem como dos tecidos ao redor. Nas cicatrizes faciais, deve-se dar atenção especial às rugas e aos aspectos normais, conforme determinados pelas subunidades estéticas. É útil

examinar outras cicatrizes no paciente para determinar a predisposição a uma cicatrização ruim. A avaliação da cicatriz deve incluir uma documentação escrita e fotográfica de tamanho, cor e textura. A relação da cicatriz com estruturas vizinhas durante o movimento e o repouso deve ser avaliada cuidadosamente para determinar adesão ou contratura. As cicatrizes podem resultar em problemas funcionais, estéticos ou emocionais. Na maioria das vezes, os pacientes incorrem em dificuldades através de uma relação complexa e alternada entre todas as três dimensões. Antes de iniciar o tratamento, o médico deve ter um tempo para entender e diagnosticar cada elemento. A extensão da cicatriz deve ser considerada juntamente com a intenção do paciente em realizar o tratamento. Pode-se precisar de várias visitas ou uma combinação de cirurgia e aconselhamento para chegar a metas e expectativas realistas. Frequentemente, agendar uma segunda ou terceira visita para assegurar a compreensão do paciente em relação às expectativas realísticas do tratamento planejado é o principal objetivo do cirurgião.

Avaliação de cicatrizes A avaliação clínica de uma cicatriz é necessária para determinar a melhor forma de tratamento e, uma vez iniciada, a eficácia da terapia. Várias ferramentas subjetivas e objetivas foram idealizadas para caracterizar cicatrizes. A escala ideal deve apresentar validação, a confiabilidade interobservadores e a aplicabilidade clínica. Enquanto ainda não houver um consenso universal sobre a classificação da cicatriz, a medida mais frequentemente utilizada é a Burn Scar Index, também conhecida como Escala de Cicatriz de Vancouver (ECV) (Tabela 16.1).10 Originalmente publicada em 1990, a ECV foi criada para avaliar as mudanças nas cicatrizes de queimaduras com maturidade e sua resposta ao tratamento. As cicatrizes são avaliadas através da pigmentação, vascularização, flexibilidade e altura. Os escores são então distribuídos entre essas quatro variáveis, com base no grau de variação da pele normal. Quando aplicado, a escala pode ser uma ferramenta útil na avaliação do prognóstico e do tratamento. Em 1995, Baryza e Baryza11 descobriram que a adição de um instrumento de baixo custo poderia melhorar a confiabilidade interobservador. Sua ferramenta combina uma régua, um pedaço de plástico transparente e uma planilha de pontos para auxiliar na medição, no clareamento e na determinação do escore, respectivamente.

Tabela 16.1 Escala de cicatriz de Vancouver Pigmentação 0

Normal: cor que se assemelha a cor do resto do corpo

1

Hipopigmentação

2

Hiperpigmentação

Vascularização 0

Normal: cor que se assemelha a cor do resto do corpo

1

Rosa

2

Vermelho

3

Roxo

Flexibilidade 0

Normal

1

Maleável: flexível com mínima resistência

2

Complacente: cede à pressão

3

Resistente: inflexível, que não é facilmente movido, resistente à pressão normal

4

Bandas: tecidos parecidos com cordas que empalidecem com a extensão da cicatriz

5

Contratura: encurtamento permanente da cicatriz, produzindo deformidade ou distorção

Altura 0

Normal: plana

1

25 cm2 são reconstruídos com este cimento ósseo, (2) aumento estatisticamente significativo da taxa de complicação quando construções onlay foram colocadas em zonas de contaminação bacteriana elevada (seios paranasais). Tais resultados indicam que este cimento ósseo, não muito diferente de outros, é provavelmente não osteocondutor, apoiado por vários estudos experimentais.451

Materiais osteoativos Materiais osteoativos incluem vidro bioativo (Nova Bone®, Porex Inc. Surgical) e DBM. Composto de dióxido de sílica, dióxido de sódio, fosfato e dióxido de cálcio, o vidro bioativo confere suas propriedades osteogênicas quando esses componentes são misturados em conjunto para formar uma camada de superfície de apatita. Esta camada recruta e estimula as células osteoprogenitoras a produzir citocinas que têm um efeito autócrino e parácrino. Os osteoblastos proliferam-se e diferenciam-se sobre esta superfície, levando à formação de osso novo. Por sua vez, o vidro particulado é reabsorvido por meio da atividade dos osteoclastos. A formulação que compreende a DBM é baseada no trabalho marcante de Urist e Strates452 e Reddi e Huggins.453 Até o momento, os fabricantes produzem este substituto ósseo com a metodologia padrão: longas diáfises de cadáver humano são fragmentadas em partículas de 250-600 mm de tamanhos, desmineralizadas em ácido clorídrico 0,6 N e lavadas com água desionizada, etanol e éter etílico. Em contraste com o vidro bioativo, o DBM contém vestígios de BMP, o que torna este biomaterial tanto osteocondutor quanto osteoindutivo. Basicamente, no entanto, o DBM sozinho é difícil de se manusear, tornando-o difícil de se aplicar clinicamente. A fim de melhorar as características de manuseio, os fabricantes têm adicionado vários tipos de carreadores na formulação (p. ex., glicerol, gelatina, sulfato de cálcio). Portanto, nem todas as preparações de DBM são iguais. Para este fim, Acarturk e Hollinger454 realizaram uma análise comparativa de todos os diferentes tipos de DBM. Em um modelo defeituoso de calvária de rato atímico de porte crítico, eles descobriram que havia de fato um

efeito ósseo-regenerativo diferencial entre as diferentes formulações. Um princípio unificador foi o de que essas formulações de melhor manuseio (DBM + glicerol [Grafton, Osteotech, Inc.], DBM + ácido hialurônico [DBX, Synthes EUA]) demonstraram estatísticas de formação de osso significativamente maiores que outros grupos, conforme avaliação histomorfométrica. Em geral, no entanto, a capacidade osteorregenerativa não foi tão robusta quanto os autores previam, o que poderia estar relacionado com o não atingimento da quantidade de limiar de partículas de DBM necessárias para a ossificação completa do defeito.

Polímeros pré-fabricados Metil metacrilato Um composto à base de acrílico, o metil metacrilato,455-457 forma-se quando uma mistura de pó de polímero de metila metacrilato, copolímero de metacrilato de metil-estireno, monômero e peróxido de benzoíla é combinada. A reação é cáustica, levando a uma exotermia que se aproxima a 85°C e vapores pungentes, que são cancerígenos. Na verdade, as recomendações de pré-mistura deste composto indicam seu uso em um exaustor testado. Depois de se misturar por 8-10 minutos, o processo de polimerização produz um material rígido, durável, que pode ser contornado, é radiolúcido e pode ser fixado rigidamente ao local da cranioplastia. As vantagens deste material incluem um custo relativamente baixo, possibilidade de contorno in situ e ausência de biodegradação. Uma versão pré-fabricada, personalizada e modificada deste material (Hard Tissue Replacement, Biomet Corporation, Jacksonville, Florida) é composta de polimetil-metacrilato-polihidroxietilo metacrilato e disponível com base em dados computados por tomografia pré-operatória458 (veja adiante). A principal desvantagem das resinas à base de acrílico, e em particular o metilo, é a reação exotérmica substancial envolvida na cura, que in situ pode levar a uma lesão térmica grave do tecido. A substância rígida curada tem um perfil de adesão bacteriana elevado, e, assim, a incidência de cranioplastias infectadas pelo uso dessa substância é elevada.

Medpor Composto de polietileno poroso de alta densidade (poro de tamanho 100-250 mm), o Medpor ganhou alguma popularidade na reconstrução de locais selecionados do esqueleto craniofacial. As aplicações atuais incluem aumento nasal/malar, reconstrução do assoalho orbital, mentoplastia e aumento craniano. Nesta última aplicação, descobriu-se que o Medpor aumenta com sucesso de reabsorção áreas do esqueleto craniofacial (p. ex., fossas temporais). Devido à sua natureza porosa, este implante permite o crescimento interno de tecido nativo e, por conseguinte, pode fornecer alguma resistência à infecção. Outras vantagens incluem a capacidade para o contorno intraoperatório e a pré-fabricação personalizada, baseada em dados volumétricos tridimensionais (DICOM) por meio de tomografia computadorizada. Apesar destes benefícios, existem desvantagens claras para este material (risco de infecção, exposição, extrusão), limitando seu uso em leitos receptores bem vascularizados. Como todas as cranioplastias aloplásticas, um campo irradiado tem uma contraindicação relativa da utilização deste implante. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

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329. McCarthy, J. G., Schreiber, J., Karp, N., et al. Lengthening of the human mandible by gradual distraction. Plast Reconstr Surg. 1992; 89:1–8. [discussion 9–10]. Esse artigo descreve um estudo pioneiro sobre distração osteogênese do esqueleto craniofacial. As primeiras evidências sobre a eficácia da distração mandibular bilateral são descritas no contexto de experiência clínica.

333. Ilizarov, G. The tension-stress effect on the genesis and growth of tissues. Part II. The influence of the rate and frequency of distraction. Clin Orthop Relat Res. 1989; 239:263–285. 364. Chamay, A., Tschantz, P. Mechanical influences in bone remodeling. Experimental research on Wolff ’s law. J Biomech. 1972; 5:173–180. 374. Finkemeier, C. G. Bone-grafting and bone-graft substitutes. J Bone Joint Surg Am. 2002; 84-A:454–464. Esse trabalho revisa o conceito de enxerto ósseo e substitutos ósseos de enxerto. Várias opções para enxerto ósseo, incluindo enxertos ósseos autólogos, aloenxertos e compostos de cerâmica, são discutidas.

378. Tessier, P., Kawamoto, H., Matthews, D., et al. Autogenous bone grafts and bone substitutes – tools and techniques: I. A 20 000-case experience in maxillofacial and craniofacial surgery. Plast Reconstr Surg. 2005; 116(suppl):6S–24S. [discussion 92S–4S]. 383. Tessier, P., Kawamoto, H., Matthews, D., et al. Taking bone grafts from the anterior and posterior ilium – tools and techniques: II. A 6800-case experience in maxillofacial and craniofacial surgery. Plast Reconstr Surg. 2005; 116(suppl):25S–37S. [discussion 92S–4S]. Esse trabalho revisa o uso do ilíaco para enxerto ósseo. Vantagens, desvantagens e técnicas relativas ao uso do enxerto ilíaco são discutidas.

400. Weiland, A. J., Phillips, T. W., Randolph, M. A. Bone grafts: A radiologic, histologic and biomechanical model comparing autografts, allografts and free vascularized bone grafts. Plast Reconstr Surg. 1984; 74:368–379. 431. Stevenson, S. Biology of bone grafts. Orthop Clin North Am. 1999; 30:543–552.

22

Reparo e enxerto do nervo periférico Renata V. Weber, Kirsty U. Boyd e Susan E. Mackinnon

Resumo

• • • • • • • •

A neurorrafia primária é o padrão ouro de reparo de nervo pelo qual as demais técnicas são avaliadas. Reparo primário, reparo primário retardado e reparo secundário indicam o tempo do reparo com relação à lesão. A tensão excessiva inibirá a regeneração do nervo, entretanto uma pequena quantidade de tensão para atingir a coaptação primária é aceitável. O autoenxerto do nervo é o padrão ouro para a reconstrução de um espaço no nervo. No caso de um espaço no nervo, as opções para o reparo incluem: mobilização e coaptação primária reparo do nervo com enxerto ou conduíte do nervo transferência do nervo Os fatores que mais afetam a recuperação do nervo incluem: idade do paciente localização da lesão (nervo periférico proximal versus distal) tipo de lesão: esmagamento versus avulsão versus transecção tempo ou reparo técnica ou reparo (tensão, alinhamento, cicatrização)

Introdução O reparo e o enxerto do nervo não mudaram significativamente nas últimas décadas. Os principais avanços nos últimos 20 anos foram na compreensão da topografia neural interna e da tensão no local da neurorrafia, nas técnicas de suturação e no desenvolvimento de transferência de nervos. Embora o futuro da cirurgia de nervo sustente muitas possibilidades, a principal limitação para a recuperação do nervo periférico é o limite de tempo de sua regeneração. Isso permanece uma verdade independente da técnica usada para o reparo. Sem o estímulo de entrada do nervo motor, o músculo sem nervo, após um período prolongado, se torna resistente à regeneração. Embora sejamos capazes de acelerar o processo regenerativo para algumas extensões, o sucesso completo depende de várias condições, como o número de locais de neurorrafia, fornecimento e tipo de nervos doadores e a condição do tecido vizinho. Em cada local de coaptação, uma porcentagem de fibras nervosas é perdida. A tensão excessiva é prejudicial para um local de reparo e, no caso de um grande espaço, um enxerto do nervo é usado frequentemente para completar a ausência dos mesmos. Os enxertos autólogos de nervo são limitados: o nervo sural é a fonte mais comum para o enxerto autólogo de nervo. As alternativas para o tratamento padrão são enxertos de veias, conduítes de nervo disponíveis comercialmente, aloenxertos de nervo e transferências de nervo. Os conduítes de nervo, alinhados com a célula de Schwann e as substituições por tecidos elaborados, podem oferecer a solução para melhorar a regeneração do nervo no futuro.

Tipos de lesão do nervo Lesão do nervo Uma lesão periférica do nervo pode ser classificada de várias maneiras. Historicamente, o primeiro sistema de classificação foi feito por Sir Herbert Seddon (1943) e era baseado nas alterações anatômicas brutas e histológicas, em vez de no mecanismo da lesão.1 Ele descreveu três tipos de lesões do nervo. Primeiro, a neuropraxia, que envolve um bloqueio de condução local em uma área discreta ao longo do nervo. A degeneração walleriana não ocorre e a recuperação é excelente. Segundo, a axoniotmese, que implica dano direto ao axônio; enquanto o terceiro, a neurotmese, é a transecção de um nervo periférico. Na axoniotmese e na neurotmese, a degeneração waleriana ocorre distal ao local da lesão. Entretanto, embora o primeiro se recupere, o último não. Dentro da axoniotmese, Seddon descreveu um grau de lesão associada com a cicatrização e com a recuperação menos completa. Dentro da neurotmese, ele descreveu um “em continuidade”, cicatriz total e sem recuperação da lesão. Entretanto, foi Sunderland quem expandiu a classificação anterior de Seddon e enfatizou os cinco graus de lesão do nervo.2 Depois, Mackinnon veio a incluir uma sexta (Tabela 22.1).3,4 As lesões de primeiro grau (neuropraxia) e as de segundo grau (axoniotmese) se recuperam espontaneamente, a última em uma taxa clássica de 1 polegada (2,5 cm)/mês ou 1-1,5 mm/dia.5 As lesões de quarto e quinto graus não se recuperam, embora as lesões de terceiro e sexto graus se recuperem parcialmente por diferentes razões. A dificuldade da correção cirúrgica de uma lesão de sexto grau é limitar o reparo dos fascículos afetados pelo dano de quarto e quinto graus e não danificar os fascículos com potencial para recuperação espontânea. Tabela 22.1 Classificação de lesão do nervo Seddon Neurapraxia

Sunderland Grau I

Axonotemese Grau II

Neurotmese

Lesão

Recuperação

O bloqueio da condução se resolve espontaneamente

Rápida/excelente

Ruptura do axônio sem interrupção dos túbulos da lâmina basal

Lenta/excelente

Grau III

Ruptura dos axônios e dos túbulos da lâmina basal, alguma cicatriz Lenta/incompleta

Grau IV

Bloqueio completo pela cicatriz

Nenhuma

Grau V

Transecção completa

Nenhuma

Grau VI (Mackinnon) Combinação do grau I a IV ± fascículos normais

Mista

As lesões no nervo também podem ser agrupadas pelo mecanismo da lesão e por se encontrarem abertas ou fechadas. Essa classificação clínica é útil na avaliação das lesões do nervo, o que determinada a probabilidade de recuperação espontânea e fornece um algoritmo para o tratamento dessas lesões. A Tabela 22.2 lista os padrões de lesão típicos do nervo e sua significância com relação à avaliação e ao tratamento. Para simplificar, as lesões do nervo podem ser agrupadas em: (1) lesões penetrantes; (2) lesões por esmagamento e compressão; e (3) lesões por estiramento e avulsão. Embora, geralmente, as lesões de estiramento e avulsão tendam a ser lesões fechadas, elas também podem ser abertas. Isso implica uma força mais severa, está associado com lesões do tecido macio, vascular e ortopédico e se estende do dano muscular e cutâneo, o que resultará, em última instância, em desfecho do reparo do nervo. As lesões mais extensas do tecido mole e/ou ósseo aumentam a complexidade, bem como a probabilidade de uma reconstrução por etapas. Frequentemente, a reconstrução do nervo é atrasada em função da vascular mais aguda e ortopédica das lesões.

Tabela 22.2 Classificação de lesão do nervo pelo mecanismo. A significância de cada tipo de lesão em termos de capacidade de reparar e o desfecho são discutidos Tipo

Pode ser lesado

Significância

Lesão por estiramento/avulsão Avulsão

Raízes do nervo

Não pode ser reparado primariamente.

Nervos que saem

Indicação para transferência do nervo

Forame, fratura óssea Estiramento

Qualquer nervo

Lesão mista do nervo (grau VI)

Lesão por esmagamento e compressão Lesão Esmagamento complexo

Pele, subcutâneo

Variação do grau de profundidade, a perda de função está relacionada à quantidade de destruição do tecido

Compressão crônica

Nervo

Apresentação inicial lenta, reversível

Compressão aguda

Nervo ± músculo

Apresentação inicial rápida, isquemia muscular reversível, recuperação variável do músculo e do nervo

Tecido, músculo, nervo, ± osso

Síndrome Nervo + músculo compartimental

Apresentação inicial rápida, isquemia muscular reversível, com isquemia inferior a 6 horas; nenhuma recuperação ou variável de músculo, se liberado depois de 6 horas

Lesão penetrante Cortante

Pele, tecido subcutâneo, músculo, nervo, ± osso

Precisa de exploração cirúrgica devido à alta probabilidade de rompimento do nervo

Todos os níveis Contuso

Variável

A lesão pode se estender além do esperado

Tiro

Variável

O padrão de lesão depende da trajetória e velocidade da bala

Elétrico

Variável

A neuropatia é devida ao dano da bainha de mielina e varia de neuropatia a causalgia

Lesões penetrantes O trauma penetrante pode ser o resultado de uma penetração cortante ou romba e com frequência tem estruturas concomitantes vasculares e tendões lesados além do nervo. Uma laceração cortante, como uma laceração da mão com uma faca ou um pedaço de vidro, quase sempre precisa de exploração quanto à presença de uma deficiência na inervação a probabilidade de o nervo estar parcial ou completamente seccionado é alta. Recomenda-se explorar essas lesões de forma semieletiva em até uma semana. Quanto mais tarde, a partir do momento da lesão, menos provável de as duas extremidades do nervo poderem ser mobilizadas o suficiente para coaptarem primariamente, sendo mais provável ser necessário um enxerto de nervo para sobrepor o espaço. Na nossa prática, entretanto, os enxertos agudos de nervo são realizados com frequência se houver uma preocupação sobre o grau da lesão que tornaria difícil uma nova operação no futuro. No caso de um traumatismo penetrante com uma lesão vascular associada, justifica-se uma investigação imediata do quadro do paciente. Ocasionalmente, nas lesões proximais com grandes lesões arteriais, com ou sem fraturas subjacentes, a lesão do nervo é ocultada em face das lesões vasculares e ortopédicas mais urgentes. Observe com atenção o déficit no pós-operatório, quando não é claro se a lesão do nervo é decorrente do evento inicial, iatrogênica durante o reparo da lesão vascular ou secundária ao edema ou hematoma. Embora uma imagem de tomografia computadorizada ou de ressonância magnética possa ser útil para uma avaliação mais tardia, a cicatrização interna do nervo nem sempre pode ser determinada claramente. As lesões por penetração romba e por golpe são geralmente tratadas conservadoramente, similares às lesões de esmagamento fechado e estiramento, uma vez que podem ser recuperadas espontaneamente. O edema do tecido local causa frequentemente uma neuropraxia que se resolve. Entretanto, as que não se recuperarem depois de 3 meses devem ser avaliadas pelos estudos de eletrodiagnóstico e o algoritmo para a lesão por tração ou esmagamento deve ser seguido (Fig. 22.1).

FIG. 22.1 Algoritmo para lesão penetrante e lacerações. EMG, eletromiograma; IRM, imagem de ressonância magnética; TC, tomografia computadorizada.

Lesões por esmagamento As lesões por esmagamento compreendem uma das lesões mais comuns; a do nervo periférico que se encontra na extremidade. A compressão externa pode ser complicada pelo aumento da pressão interna por hematomas, fraturas e pelo edema local do tecido. Quando menos complexa, o risco de neuropraxia temporária existe, porém com uma compressão maior, e a probabilidade de uma lesão permanente aumenta. A consequência mais grave de uma lesão por esmagamento é a progressão para a síndrome compartimental, que é uma emergência cirúrgica. Frequentemente, um sinal precoce da síndrome compartimental iminente é a diminuição da sensibilidade às vibrações.6 A síndrome compartimental é discutida em mais detalhes em outro capítulo. Embora os nervos sejam amplamente resistentes à lesão, especialmente quando o tecido circundante não é significativamente danificado, uma lesão mista de nervo pode ocorrer com frequência. Uma lesão mais extensa por esmagamento pode provocar dano ao tecido local, o que contribui mais para a perda da função do que para a lesão do nervo. O tecido muscular é mais suscetível às forças externas. Mesmo se a lesão não for significativa o suficiente para provocar uma síndrome compartimental, a destruição local do músculo pode levar à morte muscular. O tendão e a pele são mais resistentes e podem resistir a forças de compressão mais altas antes do resultado de dano irreversível às células. A porção do nervo lesado geralmente é tratada conservadoramente e a exploração é garantida se a recuperação do nervo não seguir um padrão esperado. Junto com as lesões por avulsão, o algoritmo é seguir a recuperação por 3-4 meses e intervir se a recuperação esperada não estiver próxima ao esperado (Fig. 22.2).

FIG. 22.2 Algoritmo para lesões por tração, estiramento e avulsão. EMG, eletromiograma; MUPs ou unidades nascentes.

Lesões por estiramento e avulsão do nervo As lesões por estiramento ocorrem porque a tensão sobre o nervo excede o limite máximo e a estrutura interna do nervo se torna lesada sem qualquer evidência de lesão externa que possa ser observada. Os nervos que são estirados ao ponto de avulsão da extremidade proximal sugerem uma lesão de alta velocidade ou alto impacto, a qual está associada frequentemente a lesões com risco ao membro que precedem a lesão do nervo. Os nervos tendem a ser avulsionados ao redor das áreas onde apresentam fixação, como forame ósseo e medula espinhal. Se o nervo proximal pode ser acessado, como nas lesões do nervo obturador da pelve, um enxerto pode ser colocado através do orifício e uma neurorrafia com o enxerto de nervo pode ser realizada. Para áreas como a dos nervos cranianos ou da raiz espinhal, onde a porção proximal para a avulsão é o tecido nervoso central ou inacessível devido às limitações esqueléticas, a reconstrução é realizada através da transferência de nervo.7 Nosso algoritmo cirúrgico atual foca primeiro na reconstrução do nervo, seguida pela transferência de tendão e os procedimentos associados com o aumento ou complemento da reconstrução do nervo, quando justificado (Fig. 22.2).8 Os nervos avulsionados na junção neuromuscular apresentam um problema diferente, pois a extremidade distal está indisponível. No caso dos nervos motores que são avulsionados dos músculos abdominais, o implante do nervo proximal diretamente no músculo é a alternativa quando não há extremidade distal disponível. Alguns estudos mostram recuperação motora tão boa quanto M4 1-2 anos após neurotização direta do nervo para o músculo;9 contudo os estudos experimentais não corroboram esses achados. Em vez disso, a recuperação é muito menor do que aquela que a coaptação nervosa produziria.10 Dica: As lesões pontiagudas com déficit agudo do nervo devem ser exploradas precocemente (em 1 semana) para possibilitar a realização de uma neurorrafia primária. As lesões por esmagamento e compressão devem ser tratadas de forma conservadora com exames em série e eletromiogramas (EMG) em 3 meses se não for notada evidência clínica de recuperação.

Avaliação das lesões do nervo Um exame físico completo continua sendo o método mais confiável para a determinação da falha neurológica. Sensação ou sua ausência pode se testada com o uso dos filamentos de Semmes-Weinstein, discriminação de dois pontos estáticos e em movimentos, além do “teste dez”. O exame sensorial rápido e fácil do teste dez usa a própria percepção subjetiva do paciente para o toque leve de movimento para obter diferenças na sensação.11 Por exemplo, para testar uma lesão mediana do nervo, os dedos indicadores lesados e não lesados do paciente são tocados ao mesmo tempo, em áreas correspondentes em cada dedo, perguntando-se ao paciente se a sensação subjetiva é a mesma ou é diferente. Essa técnica é especialmente útil em crianças pequenas que podem não ser capazes de cooperar com um teste de discriminação de dois pontos. Em pacientes que apresentam déficit ou paralisia motora aguda, a determinação de se o nervo se recuperará espontaneamente ou se a intervenção cirúrgica é necessária pode ser frequentemente difícil. O mecanismo da lesão com frequência pode ajudar na avaliação pré-operatória. Qualquer lesão penetrante sem evidência clínica de recuperação deve ser examinada. O prazo ideal é de 0-7 dias, desde que o paciente esteja estável cirurgicamente e uma equipe cirúrgica experiente esteja disponível. Qualquer lesão na qual haja um índice alto de suspeita de transecção do nervo deve ser avaliada e reparada. A vantagem do reparo nas primeiras duas semanas da lesão é que nesse momento as extremidades do nervo ainda não se retraíram e a neurorrafia primária frequentemente é possível. As lesões por tração fechada, avulsão parcial e por esmagamento com paralisia são mais difíceis de serem avaliadas. Recomenda-se que se esperem 3-4 meses, com exames físicos em série, para avaliar a evidência de recuperação espontânea. Os testes de eletrodiagnóstico são aconselhados em 3 meses quando não houver evidência de recuperação clínica, como alterações de EMG que precedem a recuperação clínica. Se não houver evidência de reinervação em 3 meses (p. ex., potenciais da unidade motora), a exploração cirúrgica e a reconstrução são justificadas. Existem pesquisas clínicas com o uso das máquinas de ultrassom mais recentes que podem detectar neuromas do nervo digital. Entretanto, esses estudos ainda estão em desenvolvimento e esse resultado depende muito do operador da máquina de ultrassom. Dica: Preferimos avaliar o paciente precocemente e acompanhar o exame clínico, bem como solicitar testes eletrodiagnósticos, para reduzir o atraso no reconhecimento do déficit nervoso que não se resolveria espontaneamente.

Reparo do nervo Prazo de reparo Quando existe uma alto índice de suspeita de que haja transecção do nervo, não existe razão para esperar até que o paciente esteja clinicamente estável e seja capaz de ir à sala de operação para exploração e reparo do nervo. Os nervos reparados agudamente nos 2 primeiros dias são considerados reparados primariamente. Um reparo primário atrasado ocorre entre 2 e 7 dias. Em ambos os casos, as extremidades distal e proximal do nervo estão frescas e uma coaptação entre as extremidades é realizada. Os nervos reparados depois da primeira semana são considerados reparados secundariamente. Claramente, os dias limites 2 e 7 são arbitrários. Com frequência, após 2-3 semanas da lesão o nervo pode ser coaptado sem a necessidade de um enxerto. Contudo, quanto mais tempo após a lesão, menor a probabilidade de que uma neurorrafia primária possa ser atingida, mesmo com a mobilização significativa das extremidades proximal e distal do nervo.

Tensão e reparo do nervo A tensão excessiva através do reparo do nervo é conhecida por aumentar a cicatrização no local de coaptação e comprometer a regeneração. Em um nervo não lesionado, uma tensão de 15% provoca uma redução no fluxo microvascular e, 1 hora depois do relaxamento, persiste um retardo na velocidade de pico de 66% do valor inicial.12 Acredita-se, por outro lado, que a tensão moderada seja realmente benéfica para o reparo por estimular os fatores de crescimento neurotrópicos. Na prática clínica, não medimos formalmente a tensão durante uma neurorrafia, mas sempre evitamos a tensão durante um reparo. As duas extremidades de um nervo são mobilizadas para levar as extremidades a uma aproximação razoável. A tensão sobre o nervo diminui a microcirculação e a tensão excessiva provocará o

rompimento do reparo. Além disso, os artifícios, como posicionamento do braço na adução ou do pulso e dos dedos em flexão, reduzirão significativamente a tensão durante o reparo, dependendo da localização da lesão, e podem aumentar o comprimento total disponível do nervo. Contudo, recomendamos que se evite a manipulação da postura para forçar o reparo primário. Não apenas a deiscência pode ocorrer quando a articulação próxima ao reparo é movida muito precocemente, mas isso pode criar rigidez significativa da imobilização prolongada.13 Um nervo imobilizado também resulta na cicatrização no local do reparo.

Tipo de reparo: epineural versus fascicular Qualquer reparo que resista à variação leve de movimento é considerado um reparo “sem tensão”. Giddins et al.14 mostraram no estudo cadavérico que compara o tamanho da sutura com a força de um reparo agudo do nervo mediano, que o náilon 9-0 resistiu às maiores forças de interferência. Em uma tensão menor, suturas 10-0 arrebentaram e 8-0 se extruíram do tecido nervoso. Entretanto, na prática clínica, suturas de 10-0 e 8-0 são usadas com frequência com base no tamanho dos nervos, na espessura do epineuro e na quantidade da inflamação. Alternativamente, alguns cirurgiões usam cola de fibrina, especialmente quando não existe tensão no reparo. A energia a laser para coaptação epineural foi pesquisada experimentalmente. Entretanto, ela produz calor que danifica o tecido nervoso e resulta em uma redução inaceitável da força de tensão no local do reparo. O principal padrão continua sendo a microssutura aplicada sob controle microscópico. O reparo epineural é o método preferido, pois as extremidades agravadas estão cirurgicamente frescas. Os marcadores externos, como um vaso na superfície e a combinação de padrões fasciculares, são usados para alinhar os fascículos sem sobreposição (Fig. 22.3). Para os nervos periféricos principais, um argumento para o reparo perineural pode ser realizado para melhorar o alinhamento dos maiores grupos fasciculares individualmente. Contudo, estudos clínicos apoiam ambas as técnicas como sendo igualmente eficazes, desde que os fascículos não estejam sobrepostos (Fig. 22.4).15 A desvantagem de um reparo perineural é que a dissecção extensiva e os pontos intraneurais permanentes podem levar ao aumento da fibrose.16 Na prática, é frequentemente difícil alinhar os fascículos com precisão, pois traumatismo, edema e cicatrização podem distorcer a topografia normal.

FIG. 22.3 Representação esquemática de um reparo epineural (B) versus perineural (C) depois da transecção do nervo (A). A artéria nativa e o padrão fascicular são usados para alinhar adequadamente a neurorrafia. O número mínimo de suturas usando náilon 8-0, 9-0, 10-0 é usado.

FIG. 22.4 (A, B) O alinhamento dos fascículos é crucial para o desfecho ideal.

Nosso método preferencial é um reparo epineural com o uso da artéria nativa como um guia (Fig. 22.2). É usado o menor número das suturas epineurais com a utilização de náilon 8–0, 9–0 ou 10–0 para aproximar e manter o reparo intacto através de uma variação completa de movimentos.

Tipo de reparo: terminoterminal versus terminolateral A maioria dos reparos de nervo é realizada de extremidade à extremidade. Isso é independente da neurorrafia primária ou de um reparo com enxerto de nervo. A controvérsia do reparo terminolateral continua a ser debatida. Atualmente, recomendamos o reparo terminoterminal para todos os nervos motores e mistos, além dos nervos sensoriais nas distribuições críticas. Usamos o reparo terminolateral para os nervos sensoriais não críticos, como a ramificação cutânea dorsal do nervo ulnar. Nós também usamos o terminolateral para restaurar a sensação de um território de enxerto do nervo sensorial, como transferência da extremidade distal do nervo cutâneo anterobraquial mediano para o lado sensorial (lateral) do nervo mediano. Quando realizamos transferências terminoterminais sensoriais (p. ex., mediano do terceiro espaço interdigital para o ulnar sensorial), fazemos uma anastomose terminolateral da extremidade distal do nervo doador para um nervo sensorial normal adjacente. Essa transferência é conduzida para restaurar a sensação na distribuição do nervo doador. Com respeito à anastomose terminolateral motora, sabemos que os axônios motores, diferente dos axônios sensoriais, não se dispersarão espontaneamente na porção colateral. Os axônios devem ser lesados para a dispersão “traumática” ocorrer.17 Portanto, raramente essa técnica é usada. Essa técnica é empregada no contexto de reconstrução do nervo supraescapular, onde a neurectomia parcial e o esmagamento proximal do nervo acessório são realizados com uma transferência de nervo terminolateral. Isso permite a reinervação do nervo supraescapular e ainda preserva alguma função no músculo trapézio.

Estímulo intraoperatório do nervo Para lesões não complicadas do nervo, como uma transecção ou um neuroma em envolvimento contínuo, o corte completo do nervo, no qual o plano cirúrgico é ressecar o tecido cicatrizado por inteiro e reparar ou reconstruir, o estímulo intraoperatório do nervo pode não ser útil. Entretanto, nas lesões por tração fechada, especialmente do plexo braquial, ou as lesões aos nervos periféricos maiores mistos nas extremidades que apresentam recuperação variável, o monitoramento formal intraoperatório ou um estimulador portátil do nervo podem oferecer orientação na tomada de decisão cirúrgica. Se o nervo for lesado em vários segmentos ao longo do seu comprimento, ou no caso de uma lesão parcial do plexo braquial, usaremos com frequência o mapeamento formal intraoperatório do nervo para ajudar na tomada de decisão cirúrgica. Além disso, o uso de estímulo elétrico intraoperatório formal nos casos em que os resultados da EMG pré-operatória foram

equivocados ou a recuperação adicional pode ter ocorrido entre o momento do estudo anterior e a operação, desde que os resultados possam afetar o plano cirúrgico. Um estimulador portátil do nervo, que fornece a contração muscular, mas não informações sobre a recuperação sensorial, é usado quando as transferências de nervo motor são realizadas. Isso permite que escolhamos, de forma bruta, os fascículos do nervo motor redundante, que serão unidos aos nervos motores sem funcionamento para restaurar a animação. Para as lacerações de rotina que precisem de enxerto ou reparo primário, não há benefício adicional para o uso do estimulador de nervo, exceto se for realizado nos nervos motores e nos motores mistos seccionados e reparados em 72 horas. Para uma lesão parcial do nervo com o neuroma envolvendo apenas uma porção da área seccional do nervo, um estimulador de nervo pode ajudar a determinar quais fascículos do nervo se podem preservar durante a ressecção do tecido danificado. Nos nervos que são puramente ou em sua maioria fibras sensoriais, um estimulador portátil não é útil.

Fatores que afetam o desfecho Vários fatores afetarão o reparo do nervo. A idade do paciente parece ser o fator mais predominante. Sabemos, a partir de dados históricos, que o reparo do nervo em crianças e jovens adultos (sensorial e motor) produz melhores resultados que em adultos. Em parte, isso é devido ao fato de que as crianças são menores, portanto a regeneração do nervo é de 1-1,5 mm/dia. Espera-se que o nervo de uma criança se recupere mais rápido que o de um adulto devido à menor distância para o órgão-alvo, independente de ser um músculo para um nervo motor ou um receptor sensorial para um nervo sensorial. A plasticidade do cérebro de uma criança tem uma função igualmente importante no desfecho geral, uma vez que a capacidade das crianças de processar o nervo motor e o sensorial reinervado dentro do córtex cerebral é maior que a dos adultos. O grau e o tipo de lesão também afetam o desfecho. As lesões proximais são geralmente de nervos mistos que contêm fibras motoras e sensoriais. A reconstrução desses nervos maiores com alinhamento ideal é mais difícil que dos nervos distais, os quais apresentam maior probabilidade de serem sensoriais ou motores “puros”. As lesões por esmagamento e avulsão são mais prováveis de danificar o tecido mole associadas e, assim, tendem a ser piores que uma lesão pontiaguda que ocorra no mesmo nível. O dano interno do nervo é subestimado agudamente com frequência e a recuperação ruim é geralmente um resultado do reparo dentro da zona da lesão quando reexplorada. O prazo de reparo revelou historicamente que o reparo mais precoce resulta em melhor prognóstico, mais provavelmente porque uma neurorrafia primária foi possível. Espera-se um bom prognóstico se o reparo ocorrer antes de 6 meses, e os melhores resultados ocorrem se o reparo for realizado antes de 3 semanas. Em geral, a recuperação funcional (RF) é inversamente proporcional ao tempo de denervação e diretamente proporcional ao número de axônios motores que atingem a placa terminal alvo. “Tempo é músculo”.

União do espaço: técnicas atuais A pronta neurorrafia primária é universalmente aceita como reparo ideal e vários estudos animais corroboram a ideia de que um reparo de nervo único resulta em um desfecho melhor do que um nervo reparado em dois locais de neurorrafia.18 Uma vez em cada local de reparo, uma porcentagem de fibras é perdida; as menores neurorrafias garantem uma porcentagem maior de axônios do nervo proximal atinjam o órgão-alvo. Alguns pesquisadores acreditam que até 50% da regeneração dos axônios sensoriais ou motores, nunca podem atingir a extremidade correta do órgão.19 Entretanto, o ponto principal para um reparo do nervo é técnica microneurocirúrgica excelente para evitar a tensão, o que deixa o reparo fora da zona de lesão, em associação com precisão da topografia sensorial/motora e movimento precoce controlado para permitir o deslizamento neural. No caso de uma neurorrafia primária não ser possível imediatamente, a mobilização das extremidades do

nervo podem se sobrepor ao pequeno espaço (menos de 5 mm) devido à propriedade elástica de um nervo.10 Se o reparo for realizado em face da tensão extrema e de contaminação, pode ocorrer uma cicatrização desfavorável. Neste caso, dois locais de neurorrafia sob condições favoráveis são preferenciais a uma neurorrafia única sob condições desfavoráveis.13,21 Se o reparo primário pela mobilização e alongamento não puder ser atingido, existem várias técnicas para orientar o enxerto do nervo resultante (Tabela 22.3).22 A técnica mais comum para reparo dos defeitos nos nervos periféricos é a que emprega enxertos de nervo autólogo. Tabela 22.3 Opções para o tratamento do espaço do nervo Vantagens

Desvantagens

Autoenxerto do nervo

Padrão ouro para a reconstrução Células de Schwann na matriz extracelular

Segundo local de operação Resultados na perda sensorial do doador Potencial para formação de neuroma/dor Autoenxertos de nervo sensorial não suportam a regeneração motora, bem como os nervos motores ou sensório-motores mistos Comprimento disponível limitado

Aloenxerto

Pode potencialmente permitir a recuperação funcional equivalente ao autoenxerto Sem morbidade local do doador

Exige imunossupressão sistêmica do paciente (∼18 meses) Pacientes vulneráveis a infecções oportunistas

Conduítes

Contorna os efeitos adversos dos autoenxertos e aloenxertos Guia a regeneração do nervo para o alvo destinado

Limitação de comprimento (< 3 cm) Apenas para os nervos sensoriais de pequeno diâmetroSem células de Schwann Sem matriz Caro

Enxerto acelularizado

Mantém a matriz inferior do tecido nervoso Limitação de comprimento (< 5 cm) Não imunogênico e inerte Sem células de Schwann Substrato biológico para a regeneração do nervo sem a Apenas para os nervos de pequeno diâmetro necessidade da imunossupressão Muito caro

Extremidade para a lateral

Sem limitação de comprimento

Resultados sensoriais ruins Motor precisa de neuroctomia do doador

Extremidade para a lateral reversa

Aumento parcial da lesão do nervo motor/sensorial

Precisa de conhecimento de topografia Exige conhecimento de doadores dispensáveis Pode precisar de autoenxerto de nervo ou enxerto acelular

Transferência de nervo

Recuperação precoce do alvo motor/sensorial

Exige doador dispensável Exige reeducação motora (sensorial) Precisa de conhecimento da topografia do nervo

Um enxerto de nervo serve como um guia para o axônio de acordo com seu novo crescimento para a extremidade distal. O sural é o nervo doador mais comumente usado, embora haja outros nervos doadores disponíveis, incluindo a extremidade sensorial distal do nervo cutâneo antebraquial lateral e mediano do nervo interósseo posterior e a porção terminal do nervo interósseo anterior.23-25 Nosso enxerto doador favorito para a reconstrução da extremidade superior é o cutâneo antebraquial mediano. Os estudos experimentais que comparam os enxertos de nervo motor, misto e sensorial apoiam a ideia de que os enxertos de nervo motor e misto atingem melhor a regeneração até o reparo.26,27 Entretanto, os enxertos de nervo motor existem em suprimento mais limitado e, na prática clínica, o nervo muscular grácil e o nervo interósseo distal anterior são os dois enxertos motores que provocam a menor morbidade. As práticas atuais que contam para o sucesso dos enxertos de nervo são o uso de pequenos enxertos finos que são unidos, quando necessário. Historicamente, quando os feixes de nervo de espessura completa foram usados como enxertos, resultados ruins apareceram.28 Para o enxerto ser bem-sucedido, ele deve sobreviver o suficiente para o nervo se regenerar completamente. Enxertos finos e pequenos vascularizam mais facilmente que os nervos grandes e isso contribui para o sucesso do desfecho funcional. Não existe acordo sobre o comprimento máximo que pode ser unido por um enxerto de nervo. Entretanto, enxertos maiores de 20 cm foram usados com graus variáveis de sucesso.29,30 Os enxertos de vascularização livre foram introduzidos em 1976 por Taylor e Ham para tratar falhas maiores.31 Para defeitos menores, um enxerto vascularizado e um enxerto convencional não parecem diferir no resultado clínico. Entretanto, Doi et al.32 recomendam o uso de enxertos de nervo livre vascularizado quando a distância do espaço for maior que 6 cm com perda de tecido mole associado sobre a área reparada. Atualmente, a indicação para um enxerto de nervo livre vascularizado é para a reconstrução de

enxertos de nervo de grande diâmetro, como o nervo ulnar na cirurgia de avulsão de plexo branquial.33,34 Embora os enxertos de nervo sejam o padrão pelo qual os espaços são reconstruídos, a principal desvantagem é o número limitado de doadores de nervos disponíveis, o que resulta na morbidade local do doador. Isso levou ao desenvolvimento de novas técnicas para ligação de espaço do nervo, incluindo enxertos de veias, conduítes biológicos e sintéticos e aloenxerto de nervo. O consenso atual é de que, para um déficit sensorial menor que 3 cm, qualquer dessas opções é igualmente confiável.35 Os nervos reparados com uma técnica de sutura são geralmente envoltos no local da neurorrafia com um guia de nervo ou um encapsulamento com veia e, então, cobertos com cola de fibrina. Isso é especialmente útil se houver uma leve incompatibilidade de tamanho, como no contexto de uma transferência de nervo ou se dois nervos menores são coaptadas a um nervo maior. Os enxertos autólogos de veia são os conduítes mais antigos e ainda são usados como conduítes primários e como invólucros.35 Conduítes biológicos, como osso, artéria, colágeno36 e músculo37, têm sido usados, mas não são tão utilizados convencionalmente quanto a veia ou a submucosa do intestino delgado.38 Os conduítes sintéticos biodegradáveis, como ácido poliglicolítico, são usados atualmente, enquanto os guias de nervo não degradáveis, feitos de silicone, caíram em desuso.39 Sua principal desvantagem é deixar o material estranho, que potencialmente provoca uma reação crônica com cicatrização excessiva. Todos esses conduítes podem ser usados como primários ou como invólucros de nervo. Os conduítes do nervo podem ser usados nos espaços do nervo sensorial inferiores a 3 cm e não são recomendados para espaços maiores ou para defeitos motores. Eles fornecem pelo menos sensação protetora e, em alguns casos, boa recuperação sensorial.40 Durante o uso do conduíte, pelo menos 5 mm de nervo devem ser inseridos no conduíte para reduzir o risco de destacamento na extremidade do nervo (Fig. 22.5). O nervo pode ser suturado ao conduíte ou deixado no lugar e fixado com um selante, como um dos produtos de cola de fibrina disponíveis. Durante o uso de um conduíte, recomendamos a colocação de uma pequena porção do nervo proximal nele para fornecer uma fonte de células de Schwann.

FIG. 22.5 Quando um túbulo neural é usado para ligar um espaço de nervo (A), um túbulo de nervo ligeiramente maior que o diâmetro do nervo é escolhido. Uma sutura horizontal ou simples é colocada para segurar o epireuríneo ao limite do túbulo neural, escondendo na extremidade do nervo cerca de 2-5 mm dentro do túbulo para evitar o deslocamento da extremidade (B). Quando usado para cobrir um local da neurorrafia, o tubo pode ser deslizado sobre uma extremidade do nervo antes de se suturar o nervo e, então, deslizar de volta sobre o local da neurorrafia para proteger o reparo ou pode ser cortado longitudinalmente e envolvido sobre o local da neurorrafia. Uma sutura pode ser colocada em volta da parte externa do conduíte para ajudar a mantê-la no local (C).

Uma vez que a exigência para os invólucros de nervo aumentou, muitas empresas de tubo de nervo oferecem os invólucros de nervo além do conduíte. Nesses casos, em que um reparo primário é realizado, mas há a preocupação de que o movimento pode desassociá-lo, um invólucro oferece a proteção de uma cobertura no caso de a neurorrafia separar, mas está dentro do tubo e permite a possibilidade de que a recuperação do nervo ainda possa ocorrer. Os invólucros de nervo mais recentes são mais finos que os conduítes padrão e são usados geralmente no pré-corte para permitir a aplicação mais fácil em volta do nervo (Fig. 22.6). Também usamos a barreira de adesão Seprafilm® (Genzyme, Cambridge, MA) como um invólucro de nervo, colocando um pequeno pedaço acima e abaixo do reparo.

FIG. 22.6 O nervo é reparado primariamente (A) e o invólucro é colocado sobre o reparo (B) para protegê-lo. Os invólucros são mais translúcidos que os conduítes e a sutura do reparo primário é observada por todo o invólucro.

Como esses tubos não têm estrutura, os estudos experimentais mostraram que a colocação de nervo fracionado pode ajudar a aumentar o crescimento do nervo.41 Mais recentemente, os enxertos de nervo humano processado acelular foram introduzidos como uma alternativa aos conduítes. Os estudos clínicos iniciais mostram que a recuperação de pequenos espaços sensoriais é melhor do que com os conduítes e mais comparável aos autoenxertos.42 Como esse é um tecido humano, ele mantém sua estrutura tridimensional, incluindo epinêurio, fascículos, tubos endoneurais e laminina e acredita-se que o scaffold permite a repopulação das células hospedeiras de maneira similar ao tecido de nervo autólogo (Fig. 22.7). O produto é caro em comprimentos longos, mas competitivo com conduítes de 15 mm de comprimento. Ele reduz o tempo de operação e elimina um déficit do doador. Ele manuseia de forma semelhante ao nervo autólogo. Há várias larguras (variando de 1 a 5 mm) e comprimentos (variando de 15 a 50 mm) e pode ser suturado no local ou alinhado e fixado com um selante, como a cola de fibrina. Além disso, o local da neurorrafia também pode ser coberto por um invólucro de nervo, como no caso do reparo de nervo autólogo.

FIG. 22.7 O aloenxerto do nervo (B) pode ser escolhido para se adaptar à largura dos nervos lesionados. Aqui estão dois enxertos de tamanhos diferentes que foram suturados no local com suturas de náilon 9-0 depois da ressecção de dois neuromas do nervo digital (A).

Um estudo recente de Whitlock et al.43 mostrou que o aloenxerto acelular com sua matriz extracelular foi superior a um conduíte vazio, mas inferior a um autoenxerto, que fornece não apenas a matriz extracelular, mas também as células de Schwann. Usamos aloenxertos acelulares para espaços pequenos (5-10 mm), espaços de nervo de pequeno diâmetro, não críticos e nos quais um conduíte poderia ser usado com segurança. Caso contrário, preferimos autoenxertos.

Transferência de nervo: alternativa aos conduítes Um espaço de nervo facilmente reparado com um enxerto ou um tubo neural deve ser tratado do modo padrão. Contudo, quando a lesão do nervo é mais complicada que um espaço no tecido do nervo, as transferências de nervo podem oferecer a capacidade de reparar as lesões que, antes dos anos de 1990, imaginava-se que não seriam completamente reparáveis. O procedimento tem uma curva de aprendizagem mais alta que um reparo padrão do nervo e deve ser reservado para situações como as listadas no Quadro 22.1.

Q uadr o 22. 1 Indica çõe s pa ra t ra nsfe rê ncia do ne rvo 1. Lesão do plexo branquial somente com o nervo muito proximal ou nenhum nervo disponível para enxerto 2. Lesão alta proximal que precisa de uma grande distância para regeneração 3. Áreas cicatrizadas em localizações críticas com potencial para lesão das estruturas críticas 4. Trauma do membro principal com perda do segmento do tecido nervoso que requer vários enxertos 5. Tempo prolongado de lesão para reconstrução como uma alternativa ao enxerto do nervo 6. Lesão parcial do nervo com uma perda funcional definida 7. Lesão de avulsão na raiz da medula espinhal 8. Neurites idiopáticas, traumatismo de radiação e lesões do nervo onde o nível de lesão é incerto As transferências de nervo motor, a partir do conhecimento das transferências de tendão, são modeladas depois das suas transferências análogas de tendão e, assim, apresentam princípios similares. Apenas os fascículos de nervos dispensáveis são usados. Os nervos com fascículos ou ramos redundantes formam nervos doadores excelentes. Diferente de uma transferência de tendão, uma transferência de nervo não depende da amplitude e da incursão da unidade do músculo do tendão, nem é limitada a um tendão, uma função e à linha reta dos princípios agrupados. O tipo de unidade da fibra muscular e a inserção do tendão influenciarão a eficácia final da contração do músculo na sua nova posição.44,45 As principais vantagens de uma transferência de nervo em relação à transferência de um tendão são: (1) pode restabelecer a sensibilidade em adição à função motora; (2) um nervo que inerva vários grupos de músculos pode ser restaurado com uma transferência única; e (3) a inserção e os anexos do(s) músculo(s) em questão não são rompidos, assim a função original do músculo e a tensão são mantidas. Apesar de uma transferência de nervo sinergístico ser ideal, as transferências de nervo antagonistas podem ser utilizadas com êxito em muitos casos, como os ramos do nervo radial usados para restaurar a função do mediano. Uma vantagem significativa das transferências do nervo ao longo dos enxertos é a capacidade de converter uma lesão de alto nível em uma lesão de baixo nível. Isso é especialmente importante no nervo mediano alto e nas lesões do nervo ulnar. O nervo doador perto do nervo lesionado, bem como a placa motora da extremidade, é selecionado, e o enxerto de nervo raramente é necessário, além de um nervo transferência. Uma neurólise interna permite a separação dos fascículos do doador e do destinatário principal para que um reparo terminoterminal seja realizado. As transferências serão discutidas mais detalhadamentes em outro capítulo. Quando for escolher os nervos doadores para transferência, um que inerva um grupo de músculo sinergístico é preferencial, pois facilita a reeducação pós-operatória. Apesar de um nervo que forneça um grupo muscular não sinergístico ou mesmo antagonista poder ser usado, mais retreinamento motor pode ser necessário para apender a contrair o músculo recentemente inervado. Nosso método preferencial para neurorrafia é um reparo de extremidade a extremidade. Como discutido anteriormente, existem crescentes circunstâncias comuns nas quais realizados uma transferência com uma neurorrafia terminolateral.7 Nossos estudos experimentais mostram que, enquanto os nervos sensoriais se renovam espontaneamente de uma janela epineural ou perineural, um nervo motor precisa de uma neurectomia parcial para facilitar a regeneração da extremidade para a lateral.46 As transferências do nervo sensorial se desenvolveram como uma extensão natural das transferências do nervo motor. As transferências são possíveis, em parte, devido à redundância existente nas fibras de nervos mistos proximais. O conhecimento da topografia interna facilita a separação dos grupos de fascículos mesmo na extremidade proximal. Embora no passado tenha-se acreditado que as fibras de nervo para um grupo fascicular distinto permanecia separada proximal e imergia distalmente, mais perto do órgão-alvo, sabemos agora que essas fibras correm adjacentes umas às outras mesmo no membro proximal, apesar das vias do plexo extensivo.47 As fibras motoras para a função distal específica são agrupadas e assim podem ser identificadas eletricamente no intraoperatório quando forem selecionadas para uma possível transferência de nervo.

Bioengenharia: o futuro? No horizonte está a bioengenharia de tubos neurais para ser preenchida com células de Schwann e agentes neurotrófico a fim de facilitar o processo regenerativo. Estudos dos fatores tróficos (promotores do crescimento) incluem fator de crescimento, fator neurotrófico derivado do cérebro, fatores de crescimento

fibroblástico, fatores neurotróficos ciliares e interleucina-6, entre outros.48,49 O mecanismo pelo qual esses fatores de crescimento estimulam a regeneração do axônio ainda não está claro, nem o momento dos seus efeitos, embora muitos desses fatores de crescimento e as citocinas sejam liberados nos tecidos circundantes depois da lesão do nervo. Em teoria, um espaço no local de reparo do nervo deve permitir a ligação de axônios para identificar corretamente o órgão-alvo final. As pesquisas mostraram que a regeneração ideal precisa de nervos coaptados fortemente, sem espaço com alinhamento preciso.50 Finalmente, a capacidade de algumas glicoproteínas da membrana do axônio que atraem os axônios motores e sensoriais foi investigada preferencialmente como um método de regeneração de nervo guia.51 O conduíte de nervo desenvolvido por bioengenharia será capaz de melhorar a regeneração, bloquear a invasão de tecido da cicatriz e se autodegradar quando não for mais necessário. As células de Schwann dentro de um conduíte são conhecidas por melhorar a regeneração do nervo, e estudos clínicos de túbulos neurais alinhados com a célula de Schwann estão em andamento. Os fatores de crescimento foram estudados para determinar a utilidade e o cronograma das doses. O fator de crescimento derivado da insulina52 não promove a regeneração do nervo através de um nervo guia, enquanto o fator de crescimento do nervo53 e o fator de crescimento do fibroblasto54 mostraram melhora na regeneração do nervo através do guia. As modalidades externas para melhorar a regeneração incluem o uso de campos eletromagnéticos pulsados. A taxa de regeneração não aumentou, entretanto o número de neurônios motores, bem como a sua capacidade de atingir o órgão-alvo, melhorou significativamente.55 Parece ser orientado por uma regulação positiva do fator neurotrófico derivado do cérebro.56 Até o presente não há modalidade benigna para o aumento da taxa no qual um nervo se regenera; contudo foi possível, experimentalmente, alterar a taxa na qual as placas da extremidade motora reabsorvem. A leptina, um inibidor de calpaína, bloqueia a absorção mediada por calpaína protease das placas motoras de extremidade e pode oferecer um avanço importante no reparo do nervo e na sua recuperação em nível periférico e da medula espinhal.57

Tratamento pós-operatório Depois de uma neurorrafia simples, imobilizamos a área por 1-2 semanas, mas começamos a proteger a extensão do movimento em 2-3 dias. Acreditamos que proteger precocemente a extensão do movimento é essencial para o deslizamento neural e para um resultado excelente. No momento do reparo do nervo primário, avaliamos o grau de movimento tolerado sem fornecer a tensão no local de reparo. Esses guias nos protegem da faixa de movimento, que começa em 2-3 dias. Em pacientes com lesões de tendão ou ossos concomitantes, o protocolo pós-operatório é orientado pela lesão mais difícil de ser reabilitada. Por exemplo, em lacerações do dedo, nas quais o tendão e os nervos são seccionados, um protocolo de tendão flexor é seguido no pósoperatório para aumentar o deslizamento do tendão. O reparo do nervo, embora importante, é mais fácil para reconstruir caso seja necessário posteriormente. No caso de fraturas além das lesões do nervo e do tecido mole, a fixação óssea toma precedência. Não existe consenso sobre qual intervalo de tempo é necessário para a imobilização. Um estudo clínico sugere que a movimentação mais precoce pode não ser tão prejudicial com os resultados a longo prazo, como se acreditava previamente. Os pacientes com lesões do nervo digital isolado foram comparados com aqueles com lesões combinadas do tendão flexor e do nervo digital. Os pacientes com lesões do nervo isolado foram imobilizados por 21 dias, enquanto os com lesões combinadas iniciaram movimentação protegida por volta de 4 dias de pós-operatório. No acompanhamento, o nervo reparado teve menos sensibilidade que o lesionado. Não ocorreu diferença significativa nos testes de discriminação final de dois pontos e nos testes de SemmesWientein entre os dois grupos reparados, o que desafia a crença de que os reparos de nervo devem ser completamente imobilizados depois da cirrugia.58 A maioria dos pacientes se queixa, no período pós-operatório, de parestesia e choques elétricos, que se estendem além da área da lesão. A maioria deles pode ser controlada com medicações neurotrópicas, como nortriptilina, gabapentina ou pregabalina. Em alguns pacientes, as dores do nervo recuperado são muito severas e precisam de medicações significativas de narcótico e neurolépticas, tornando essencial o envolvimento de um especialista em dor. A fisioterapia e a terapia ocupacional continuam por um período estendido da reabilitação para prevenir as contraturas da articulação, enquanto a recuperação do nervo está em andamento, fabricando e ajustando as talas protetoras e ajudando na reeducação motora e sensorial durante o processo de recuperação.

Resumo A neurorrafia primária continua sendo a principal técnicas de reparo do nervo, embora um enxerto do nervo autólogo seja o padrão para a ligação de um nervo defeituoso. Desde a primeira implementação de um aloenxerto de nervo, em 1870, por Philipeaux e Vulpian, contribuições significativas em relação a técnica de sutura, topografia neural e biologia da regeneração do nervo têm transformado o caminho que abordamos para a reconstrução do nervo. Embora a neurorrafia primária e os autoenxertos sejam os métodos mais comuns de reparo, várias novas opções estão disponíveis. As transferências de nervo revolucionaram a abordagem em relação ao tratamento de lesões devastadoras do plexo branquial que convergem em lesões do nervo motor superior e inferior e do nervo sensorial altamente selecionado. Os aloenxertos do nervo e os conduítes oferecem alternativas aos enxertos de nervo autólogo quando necessário. A bioengenharia dos nervos e dos conduítes, bem como as terapias para aumento das propriedades regenerativas do nervo periférico, está em desenvolvimento na academia e na indústria. A quebra dessas barreiras de regeneração do nervo levará a cirurgia de nervo periférico para o próximo nível. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  14. Giddins, G. E., Wade, P. J., Amis, A. A. Primary nerve repair: strength of repair with different gauges of nylon suture material. J Hand Surg Br. 1989; 14:301–302. 15. Cabaud, H. E., Rodkey, W. G., McCarroll, H. R., Jr., et al. Epineurial and perineurial fascicular nerve repairs: a critical comparison. J Hand Surg Am. 1976; 1:131–137. 17. Hayashi, A., Pannucci, C., Moradzadeh, A., et al. Axotomy or compression is required for axonal sprouting following end-to-side neurorrhaphy. Exp Neurol. 2008; 211:539–550. 22. Ray, W. Z., Mackinnon, S. E. Management of nerve gaps: autografts, allografts, nerve transfers, and endto-side neurorrhaphy. Exp Neurol. 2010; 223:77–85. Essa é uma revisão atualizada dos principais prós e contras da reconstrução com autoenxertos de nervos, aloenxertos acelularizados, aloenxertos de cadáver e conduítes de nervo. Ela também revisa a reconstrução lateroterminal e as transferências de nervo. As indicações para cada uma dessas técnicas são fornecidas.

24. Myckatyn, T. M., Mackinnon, S. E. Surgical techniques of nerve grafting (standard/vascularized/allograft). Oper Tech Orthop. 2004; 14:171–178. Esse artigo de revisão resume muito bem a neurofisiologia da regeneração nervosa e explica os benefícios cirúrgicos do autoenxerto versus o autoenxerto vascularizado versus o aloenxerto de cadáver.

27. Moradzadeh, A., Borschel, G. H., Luciano, J. P., et al. The impact of motor and sensory nerve architecture on nerve regeneration. Exp Neurol. 2008; 212:370–376. 35. Chiu, D. T., Strauch, B. A prospective clinical evaluation of autogenous vein grafts used as a nerve conduit for distal sensory nerve defects of 3 cm or less. Plast Reconstr Surg. 1990; 86:928–934. 40. Weber, R. A., Breidenbach, W. C., Brown, R. E., et al. A randomized prospective study of polyglycolic acid conduits for digital nerve reconstruction in humans. Plast Reconstr Surg. 2000; 106:1036–1045. [discussion 1046–8]. 42. Karabekmez, F. E., Duymaz, A., Moran, S. L. Early clinical outcomes with the use of decellularized nerve allograft for repair of sensory defects within the hand. Hand (N Y). 2009; 4:245–249. 43. Whitlock, E. L., Tuffaha, S. H., Luciano, J. P., et al. Processed allografts and type I collagen conduits for repair of peripheral nerve gaps. Muscle Nerve. 2009; 39:787–799. 47. Brandt, K. E., Mackinnon, S. E. Microsurgical repair of peripheral nerves and nerve grafts. In: Aston S.J., Beasley R.W., Thorne C.H.M., eds. Grabb and Smiths’ Plastic Surgery. New York: Lippincott-Raven; 1997:79–90. Esse capítulo explica muito bem os aspectos essenciais do reparo do nervo periférico e do enxerto do nervo. É uma revisão excelente para médicos e residentes.

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Os territórios vasculares Steven F. Morris e G. Ian Taylor

Resumo Este capítulo fornece uma visão geral do conceito de angiossomas e revisa a anatomia vascular do corpo humano. A perspectiva histórica resume os maiores avanços na compreensão da base vascular e as aplicações clínicas de retalhos na cirurgia reconstrutiva A base anatômica dos angiossomas, das veias anastomosadas, dos territórios arteriais e da drenagem venosa do corpo humano é resumida aqui. Os territórios neurovasculares da pele e dos músculos também são descritos. Comparações com outras espécies enfatizam as características consistentes da anatomia vascular do corpo humano e ilustram a necessidade da conscientização a respeito da anatomia vascular dos modelos de retalhos animais. A anatomia vascular da pele, músculos e ossos de cada região do corpo é discutida com ênfase no desenho dos retalhos, evitando complicações cirúrgicas e fornecendo uma visão geral dos angiossomas do corpo Os conceitos gerais de suprimento vascular aos tecidos do corpo são revistos. A importância desses conceitos para o desenho dos retalhos é enfatizada com exemplos clínicos. Esses conceitos também fornecem a base para interpretar eventos patológicos e psicológicos relacionados aos retalhos de pele. A visão geral da arquitetura da vasculatura do corpo humano é consistente, porém há uma variabilidade significativa que requer um planejamento cirúrgico versátil para o sucesso do desenho do retalho. Os métodos de avaliação da anatomia vascular e dos tipos de retalhos no período pré-operatório, incluindo retalhos de pele, fasciocutâneos, musculocutâneos e perfurantes são revisados. A base do fenômeno retardado e seu procedimento são explorados.

Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês no site http://www.expertconsult.com

Introdução A teoria dos angiossomas tem sido bem aceita na área da cirurgia plástica e da cirurgia reconstrutiva, permitindo a conceitualização do suprimento vascular para todos os tecidos do corpo humano. Um angiossoma é um bloco composto de tecido que recebe suprimento de uma veia de fornecimento principal. Os angiossomas adjacentes são conectados por veias que fazem anastomose entre si de calibre reduzido ou por veias sem redução de calibre – que fazem a anastomose no lado arterial. A segunda é vista em muitos músculos ou na pele, especialmente onde os vasos acompanham os nervos cutâneos. Os retalhos desenhados ao longo do eixo de veias ligadas por anastomose apresentam maior tempo de sobrevida similar a um retalho que tenha sido retardado. Pelo lado venoso, as artérias anastomosadas encontram as veias desprovidas de válvulas que permitem o fluxo bidirecional. O corpo humano todo consiste em um incontável número de arcadas de veias interconectadas que levam suprimento a todos os tecidos. Em 1977, Converse1 disse que “não existe um sistema simples ou englobado que seja adequado para classificar os retalhos de pele”. Atualmente, é de consenso geral que a base anatômica vascular do retalho

fornece a mais precisa abordagem para essa classificação. A nomenclatura anatômica básica e específica simplifica a comunicação entre cirurgiões e permite o avanço da cirurgia plástica reconstrutiva. A nomeação dos principais vasos de acesso por todo o corpo fornece um mapa útil para a descrição dos retalhos. A arquitetura vascular do corpo está anatomicamente organizada como uma série contínua de ciclos vasculares como os alinhamentos de um aqueduto romano, que aumenta em número enquanto seu tamanho e calibre diminuem ao se aproximar do leito capilar (Fig. 23.1). A situação inversa ocorre no lado venoso. A organização anatômica do esqueleto vascular é maravilhosamente demonstrada nos estudos de moldes por corrosão em recém-nascido executado por Tompsett2 encontrados no Hunterian Museum na Royal College of Surgeons em Londres (Fig. 23.2). Note como os principais ciclos arteriais abraçam a estrutura óssea e as arcadas secundárias seguem a estrutura do tecido de ligamentos intramusculares e intermusculares. As fundações dessas arcadas são representadas normalmente por artérias e arteríolas de calibre reduzido (anastomosadas), acompanhadas no lado venoso pelas veias avalvulares (oscilantes) que permitem o fluxo bidirecional. As artérias anastomosadas e as veias avalvulares têm um papel essencial no controle dessa pressão gradiente através do leito capilar (Fig. 23.1).

FIG. 23.1 Representação esquemática do suprimento arterial e da drenagem venosa do leito capilar. Note as artérias que fazem anastomose entre elas (setas pequenas) e as veias avalvulares bidirecionais (setas pequenas sombreadas) que permitem o equilíbrio do fluxo e pressão em direção e a partir do leito capilar.

FIG. 23.2 Esqueleto arterial do corpo de Tompsett. Este molde por corrosão do corpo de um recém-nascido mostra a arquitetura arterial do corpo. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

FIGS. 23.3 E 23.4 SOMENTE ONLINE.

A pesquisa anatômica vascular Angiossomas O angiossoma (do grego angeion, significa veia, e somitos, segmento ou setor do corpo derivado da soma, corpo) é definido como um bloco composto de tecidos suprido por uma artéria de origem principal. As artérias de origem, que podem ser artéria segmentadas ou de distribuição, suprem esses blocos de tecidos são responsáveis por fornecer a a pele e as estruturas profundas subjacentes. Quando colocados juntos como um quebra-cabeça, eles constituem o território vascular tridimensional do corpo (veja sessão sobre o conceito de angiossomas, a seguir). Nessa sessão, apresentamos a base dos estudos anatômicos que fundamentam o conceito de angiossomas. Os estudos angiográficos produzidos por Salmon usando óxido de chumbo, gelatina e água foram excepcionais, entretanto, as modificações nas técnicas já melhoraram bastante os resultados.41,42 Particularmente, reduzindo a concentração do óxido de chumbo melhoram os estudos anatômicos angiográficos de tomografias computadorizadas (TC).43 Uma revisão das técnicas de injeções vasculares revela uma gama de técnicas disponíveis para investigação.44

Inicialmente, estudos de injeções em cadáveres para estudar a anatomia vascular do tegumento humano e outras estruturas utilizaram injeções intra-arteriais de substâncias radiopacas como o sulfato de bário ou óxido de chumbo ou substâncias visíveis como o látex e o corante. Dependendo do estudo específico, a área do tecido de interesse foi a área dissecada e radiografada. Conforme a qualidade do filme radiográfico melhora, a qualidade das imagens das pequenas veias sanguíneas também evolui. Entretanto, os estudos usando radiografias simples têm sido largamente substituídos por técnicas de TC.43,45,46 Essas pesquisas foram conduzidas em cadáveres frescos. Na maioria dos estudos, a questão anatômica foi guiada com vistas a fornecer uma solução cirúrgica para as necessidades individuais do paciente. Foram feitos um grande número de estudos com cadáveres frescos, investigando várias regiões, tecidos e combinações de tecidos. Incluindo uma investigação de todo o tegumento e de todas as estruturas profundas subjacentes em uma série de estudos de todas as artérias,47 que resultaram no conceito de angiossomas, discutido detalhadamente na sessão anterior. Este estudo foi seguido pela pesquisa das veias48 e dos territórios neurovasculares do corpo49 e de investugações detalhados dos angiossomas no antebraço,50 nas pernas,51 na cabeça e pescoço52 e também como um estudo comparativo em uma série de mamíferos.53 Além disso, executamos uma análise detalhada de vários retalhos de músculo, incluindo o sartório,54 o reto femural,55 o grácil,56 o peitoral maior,57 e retalhos de pele, incluindo o retalho reverso da artéria sural,58 o retalho perfurante da artéria toracodorsal,59 o retalho perfurante da artéria femoral profunda60 e o retalho perfurante das artérias glútea inferior e superior.61 A investigação incialmente envolveu uma análise de várias regiões do corpo para definir possíveis locais doadores para a transferência livre de retalhos de pele.62 Os estudos subsequentes focaam outros tecidos e incluem a base anatômica para a transferência de ossos,63 nervos64 e alguns músculos.21,65 Com o sucesso dos resultados de alguns procedimentos clínicos, os autores expandiram a pesquisa para investigar unidades compostas de tecidos, supridos por um único sistema vascular. As unidades de pele e tendões,66 músculos com nervos67 e pele, músculo e osso68-70 também foram analisadas. Foi a partir desse trabalho que o conceito dos angiossomas surgiu. Várias regiões, incluindo a parede abdominal anterior,21,36,65,71 o tórax anterior,72,73 os membros inferiores e superiores foram estudados. Os resultados deram força ao conceito de angiossomas do suprimento sanguíneo e revelaram as interconexões que existem em todos os níveis entre os territórios vasculares adjacentes, uma relação evidente por todo o corpo.74 Na pesquisa vascular em cadáveres, várias técnicas podem ser utilizadas para identificar e estudar a área de interesse. No passado, o tegumento (pele e tecido subcutâneo) era removido e os locais onde os perfurantes dominantes emergiam (0,5 mm ou mais) eram identificados na superfície da fáscia profunda com chumbo granulado. Atualmente, os perfurantes individuais são facilmente identificados em uma angiografia por TC (Angio-TC). Aproximadamente 400 perfurantes cutâneos foram identificados em média por corpo.40,47 O padrão de ramificação tridimensional das veias de origem principais podem ser identificados. Outros pesquisadores, incluindo Salmon, fizeram incisões topográficas limites para remover áreas de pele, particularmente na linha da virilha, axila, pescoço e juntas dos membros (Fig. 23.5). As regiões dos ligamentos são de grande importância clínica e por essa razão as incisões foram desenhadas para reter sua continuidade sempre que possível. Nas técnicas atuais, com o uso do Angio-TC, as incisões utilizadas para a dissecção não são tão cruciais, já que os caminhos e ramificações das veias individuais estão claramente documentados antes da cabeça e do pescoço,52 e também nos estudos comparativos de dissecção. FIG. 23.5 SOMENTE ONLINE Nos estudos originais do suprimento vascular dos tecidos do corpo, o tegumento foi radiografado e uma montagem de toda a circulação cutânea foi construída em “plano transversal” (Figs. 23.6, 23.7).47 Apesar de Manchot e Salmon descreverem a origem e o curso das artérias cutâneas, e Salmon9 ter feito um estudo separado dos músculos individuais, nenhum dos dois ilustrou o curso das artérias entre os tecidos profundos e a pele. Portanto, os tecidos da pele e subcutâneos foram cortados em tiras paralelas e colocados lado a lado, e as radiografias foram tiradas pra conseguir uma visão da elevação das veias nas diferentes regiões do corpo (Fig. 23.8). As técnicas atuais de Angio-TC permitem uma avaliação tridimensional bem mais detalhada da anatomia vascular dos tecidos (Fig. 23.9).

FIG. 23.7 Montagem das artérias cutâneas do corpo. A pele foi incisa pela borda ulnar nas extremidades superiores e o tegumento foi removido com a fáscia profunda no lado esquerdo e sem ela na direita. Nota: (1) a direção, tamanho e densidade dos perfurantes, que são grandes no dorso e na cabeça e se tornam progressivamente menores e mais numerosos em direção à periferia dos membros; e (2) as artérias anastomosadas de calibre reduzido que conectam os perfurantes a uma rede contínua. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

FIG. 23.8 Estudo radiográfico seccional de fita da mama (A), coxa (B), sola do pé (C), e das nádegas (D) inclui o músculo máximo glúteo subjacente. O diagrama esquemático ilustra o eixo horizontal dominante da veia que fornece o suprimento primário para pele em cada caso e sua relação com a fáscia profunda (seta). (A) Elas predominam no plexo subdermal. Note da esquerda para a direita o perfurante torácico interno e a artéria torácica lateral convergem no mamilo na radiografia da região de pele solta do tronco. (B) Elas são vistas circulando na superfície da fáscia profunda nessa área relativamente fixa de pele. (C) A artéria de origem sozinha é a via horizontal dominante que supre a pele, passando por debaixo da fáscia profunda na região de pele rigidamente fixa. (D) As pequenas setas definem a fáscia profunda e a flecha grande indica a grande ramificação de fasciocutâneos da artéria glútea que desce com o nervo cutâneo posterior da coxa. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental)

FIG. 23.9 Angiografia por tomografia computadorizada da pélvis de um cadáver mostrando a anatomia tridimensional da pele, vascular e dos ossos. Com o uso do programa MIMICS, as várias estruturas anatômicas podem ser inclusas ou removidas. (De Morris SF, Tang M, Almutairi K, et al. The anatomic basis of perforator flaps. Clin Plast Surg. 2010;37:553–570.)

FIG. 23.6 SOMENTE ONLINE Todos os perfurantes cutâneos de diâmetro maior que 0,5 mm foram rastreados até suas artérias de origem subjacentes. Os resultados foram mediados de cada estudo cadavérico e colocados em um diagrama do corpo (Fig. 23.10). Subsequentemente, as investigações expandiram para mapear os territórios venosos do corpo juntamente com os territórios neurovasculares da pele e dos músculos.48 Esses resultados geraram uma figura geral dos territórios vasculares do corpo todo. O restante dessa sessão oferece uma visão breve dos territórios nervoso, venoso e arterial do corpo.

FIG. 23.10 Mapa dos perfurantes arteriais de 0,5 mm ou mais, que estão codificados por cores para corresponder às artérias principais subjacentes e seguir com a veias perfurantes associadas. Elas fornecem a base para os retalhos perfurantes. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

Os territórios arteriais A rede arterial do corpo forma uma arcada interligada contínua de veias por cada tecido e por todo o corpo, conectadas como anéis de veias, normalmente de calibre reduzido. O curso dos perfurantes cutâneos depende da proximidade da artéria de origem à superfície sob a fáscia profunda. Conforme Michel Solmon mencionou em 1936,8 as artérias suprem as ramificações de cada tecido em que passam, incluindo o septo, a fáscia, os nervos e os tendões. As artérias geralmente estão em grupos diretos ou indiretos (Fig. 23.11). Em nossas dissecções anatômicas, é clara uma grande variabilidade no curso exato e no tamanho das veias individuais. As veias diretas cutâneas passam entre os tecidos profundos antes de penetrar nas outras camadas da fáscia profunda. Elas são normalmente as veias cutâneas primárias, com a pele como seu principal destino, e tendem a suprir os tecidos com veias de grande diâmetro com um território vascular grande (p. ex., artéria escapular circunflexa). As ramificações diretas significam veias cutâneas diretas (às vezes chamadas de veias axiais) e veias septocutâneas. As veias indiretas podem ser consideradas como o suprimento cutâneo secundário. Elas emergem da fáscia profunda como terminações das ramificações das artérias que suprem os músculos e outros tecidos profundos. A maioria das ramificações indiretas são ramificações perfurantes musculocutâneas que emergem para suprir a pele. De fato, existe normalmente uma variabilidade significante na distribuição das veias diretas e indiretas e de seu território vascular de indivíduo para indivíduo. Existe uma vasta rede interligada de artérias diretas e indiretas que suprem a pele. Os territórios vasculares de perfurantes individuais variam e tendem a ser recíprocos com os territórios vasculares arteriais de acordo com a comentada lei do equilíbrio, descrita por Salmon e embasada pelo seu trabalho.

FIG. 23.11 Ilustração esquemática das veias cutâneas diretas e indiretas. CD, cutânea direta; SC, septocutânea; MC, musculocutânea; D, derme; DS, derme superficial; FP, fáscia profunda; AO, Artéria de origem; M, músculo. (De Geddes CR. MSc Thesis, Dalhousie University, Halifax, Nova Scotia, Canada.)

As veias cutâneas diretas surgem: (1) de artérias de origem logo abaixo da fáscia profunda (p. ex., a artéria epigástrica inferior superficial); (2) da continuação direta da artéria de origem (p. ex., as ramificações cutâneas da artéria carótida externa); (3) das artérias de origem profundamente localizadas ou uma de suas ramificações em um músculo; elas seguem o septo intermuscular até a superfície (p. ex., ramificações do septocutâneo da artéria femoral circunflexa lateral). As veias cutâneas indiretas geralmente surgem da artéria de origem conforme o seu curso no interior de um músculo e penetra pelo músculo; por exemplo, perfurantes musculocutâneos das artérias epigástricas inferiores profundas (DIEA). No corpo humano, existem aproximadamente 400 perfurantes, cerca de 40% das veias são perfurantes diretas e 60% indiretas. Os perfurantes diretos cutâneos perfuram a fáscia profunda perto de onde ela está ancorada ao osso ou ao septo intramuscular ou intermuscular (Fig. 23.10). Essas linhas e zonas de fixação também correspondem às áreas de pele fixa do corpo. A partir desses pontos, o fluxo das veias em direção às partes convexas da superfície do corpo, ramificam por dentro do tegumento. Quanto mais larga a distância entre as cavidades e maior a junção, mais longa a veia (Fig. 23.8). O tamanho e densidade dos perfurantes diretos também variam em regiões diferentes. Por exemplo, na cabeça, no pescoço, no tronco, nos braços e nas coxas, as veias são mais largas, mais longas e menos numerosas. No antebraço, na perna e no dorso das mãos e dos pés, as veias tendem a serem menores, mais curtas e mais numerosas. Nas palmas das mãos e na sola dos pés, onde a pele é fixa, existe uma alta densidade de perfurantes menores. Consequentemente, o suprimento primário de cada território cutâneo varia entre as artérias de origem. Cada um desses territórios também tem perfurantes indiretos. O curso dos perfurantes cutâneos entre a fáscia profunda e a pele também varia em regiões diferentes. Independente de sua localização, entretanto, ele segue a estrutura de um tecido de ligamento da fáscia superficial, interligando todos os níveis. Ele ramifica no interior da gordura subcutânea adjacente a fáscia profunda e depois, ramifica e segue na direção do plexo subdermal, passando por entre os lóbulos de gordura. Uma veia menor tende a cursar verticalmente em direção à pele, considerando que as veias maiores ramificam em todas as direções em um padrão estrelado ou seguem um eixo específico, ramificando conforme passam paralelas à superfície da pele. No couro cabeludo e nos membros, onde a pele é relativamente fixa à fáscia profunda, as veias maiores abraçam a superfície. Elas passam pela fáscia profunda por uma distância considerável na camada solta areolar que as separa da gordura subcutânea (Fig. 23.8). Isso acontece especialmente quando os perfurantes acompanham o nervo cutâneo. Nas áreas de pele solta do corpo, as veias cutâneas diretas seguem por uma distância variável paralela a fáscia profunda. Elas são mais intimamente relacionadas ao interior da gordura subcutânea, porém são grudadas a ela por uma folha fina fascial que as separa pela sua superfície mais profunda do plexo das veias menores. Esse plexo fica no tecido areolar solto na superfície da fáscia profunda. Ele é formado por ramificações que surgem dos perfurantes diretos conforme penetram a fáscia profunda e as ligações que essas ramificações fazem com os perfurantes indiretos menores. Os perfurantes diretos maiores então penetram a camada subcutânea. Eles sobem por dentro da fáscia superficial (gordura subcutânea) para alcançar o plexo subdermal rico onde eles seguem por distâncias consideráveis (Fig. 23.8). Por dentro do tecido profundo, seja ele músculo ou tendão, nervo ou osso, um padrão similar ao do tegumento existe, com uma rede tridimensional de veias interligando os territórios vasculares e o perímetro por

onde as artérias anastomosadas estão conectadas. Por dentro dos músculos, essas veias anastomosadas frequentemente exibem uma aparência de parafuso e porca característica.

Drenagem venosa As veias cutâneas também formam um plexo tridimensional de canais interligados por todo o corpo (Fig. 23.12). Existem segmentos com válvulas em que as válvulas diretas têm o fluxo em direções específicas, e existem segmentos avalvulares, onde não há a presença de válvulas. As veias avalvulares ou oscilantes permitem o fluxo bidirecional entre os territórios venosos adjacentes. Elas conectam as veias em que as válvulas podem ser guiadas para a direção oposta, consequentemente equilibrando o fluxo e a pressão. Na verdade, existem muitas veias nas quais as as válvulas têm o fluxo direto inicialmente a uma direção distal, para longe do coração antes de se juntar as veias com fluxo proximal. Um exemplo disso é a veia epigástrica inferior superficial que drena a parte inferior do tegumento da parede abdominal em direção à virilha. Em algumas regiões, os canais com válvulas têm o fluxo direto radialmente para longe do plexo de veias avalvulares, por exemplo, na drenagem venosa do complexo mamilo-auréola. Em outras áreas, os canais com válvulas tem o fluxo direto em direção ao foco central, conforme visto nas ramificações estreladas das veias perfurantes cutâneas dos membros.

FIG. 23.12 A rede venosa do tegumento em uma paciente mulher. Esta é uma montagem do venograma de um estudo de injeções. (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories [venosomes] of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

Geralmente, a anatomia venosa é paralela à anatomia arterial (Fig. 23.13). A partir dos plexos venosos dermais e subdermais, as veias se convertem em veias horizontais de grande calibre onde frequentemente se relacionam

com nervos cutâneos e um sistema longitudinal de artérias ligado por elos. Alternativamente, elas também se convertem em padrão centrífugo ou estrelado para dentro de um canal em comum que passa verticalmente para baixo acompanhado de artérias cutâneas para penetrar a fáscia profunda. Portanto, as veias seguem com as artérias cutâneas diretas e indiretas, drenando por fim dentro das veias satélites das artérias de origem dentro do tecido profundo.

FIG. 23.13 Estudos (A) arteriais e (B) venosos do anterior do tronco. Note a artéria anastomosada de aparência saca-rolha que conecta os territórios adjacentes no estudo arterial, e a mistura que foi expelida das veias epigástricas inferiores profundas resultantes da resistência das válvulas. O granulado de chumbo radiográfico identificou a origem dos perfurantes cutâneos de suas veias de origem no estudo arterial. (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories [venosomes] of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

No geral, a origem, o curso e a distribuição das veias profundas (veias satélites) são a imagem espelho das artérias de origem profundas, porém são maiores e mais cheias. Apesar da anatomia das veias serem sujeitas a uma variação considerável entre os lados no mesmo indivíduo e também entre outros, o padrão da arcada venosa é evidente num todo. Essas arcadas geralmente se tornam menores e mais numerosas conforme a periferia da região ou o alcance do tecido. As veias superficiais, entretanto, são independentes das artérias profundas (p. ex., a veia safena maior, e a veia cefálica) e podem ter uma área diferente de drenagem; por exemplo, no antebraço, existem pares de veias satélites para as artérias ulnares e radiais, porém com um sistema separado de veias subcutâneas de grande calibre, incluindo as cefálicas, basílicas e veias antebraquiais. O local e a densidade das válvulas dentro da rede venosa profunda estão disponíveis. As veias profundas seguem o esqueleto ósseo ou o septo intermuscular com suas artérias associadas. Em algumas regiões, essas veias são sozinhas; em outras, elas são duplicadas como veias satélites. Nos membros, as veias começam distalmente nas mãos e nos pés como canais únicos ligados por arcadas venosas. Essas arcadas se tornam progressivamente maiores conforme se aproximam do pulso e do tornozelo. As veias são duplicadas no antebraço e na perna, e cada par de veias é ligado por um rico degrau do canal venoso que normalmente não tem válvulas. Essas veias satélites se reúnem então para formar só canais únicos. Nos membros inferiores, isso ocorre no oco poplíteo, porém nos membros superiores a união é mais comum na porção proximal do braço ou até mesmo tão alto quanto nas axilas. No tronco, o padrão da arcada é conspícuo (Fig. 23.13); as veias principais são orientadas como arcadas longitudinais e transversas que combinam com o padrão da artéria de origem. Territórios distintos são evidentes. Onde as artérias anastomosadas definem os territórios arteriais, elas combinam com as veias oscilantes na rede venosa. A existência de veias satélites é variável. Por dentro do músculo, a rede venosa intramuscular espelha o lado arterial. Onde os territórios arteriais são

ligados por artérias anastomosadas ou por artérias anastomosadas sem mudanças de calibre, os territórios venosos do músculo, que drenam na direção oposta, são ligados por veias oscilantes avalvulares. No geral, os músculos podem ser classificados em três tipos com base na sua arquitetura venosa. Os músculos do tipo I têm um único território venoso que segue apenas uma direção. Os músculos tipo II têm dois territórios que seguem vindos das veias oscilantes em direções opostas. Os músculos tipo III consistem de três ou mais territórios venosos que seguem em direções múltiplas (Fig. 23.14).

FIG. 23.14 Ilustrações e radiografias de estudos sobre injeções venosas dos músculos supraespinhal (A), grácil (B) e sartório (C). Note as veias oscilantes que separam elas dos músculos tipos I, II e III e as veias eferentes entrando nos músculos supraespinhal e grácil (setas pontilhadas). (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories [venosomes] of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

As veias extra musculares são de dois tipos. O primeiro grupo consiste de veias eferentes. Elas contêm válvulas e drenam os músculos para a sua veia principal. O outro grupo consiste de veias aferentes. Elas são derivadas do tegumento adjacente como os perfurantes musculocutâneos ou vindas dos músculos adjacentes (Fig. 23.14).

Os territórios neurovasculares Em nossos estudos dos territórios neurovasculares, cadáveres frescos foram injetados com uma mistura de óxido de chumbo radiopaco e os nervos foram dissecados e rotulados com um fio fino de computador.49 Os nervos e veias foram então segregados por uma angiografia de subtração. As características mais óbvias vistas pela pele e pelo músculo são a organização linear dos nervos e suas ramificações, comparadas às arcadas em ciclos da rede de veias interconexa com os nervos pegando a rota mais curta entre dois pontos. No geral, a orientação dos nervos cutâneos é longitudinal aos membros, transversa ou oblíqua no tronco e radiando a partir do centro na cabeça e pescoço. É importante mencionar que os nervos cutâneos como a artérias, perfuram a fáscia profunda nos locais de pele fixa. Cada nervo cutâneo é acompanhado por uma artéria, porém sua relação é variável. Algumas das organizações vistas no tegumento são demonstradas na Figura 23.15. Em cada caso, ou uma artéria longa ou um sistema em cadeia de artérias pega “carona” com o nervo.

FIG. 23.15 Os padrões neurovasculares descobertos no tegumento. (A) Uma longa artéria ligada a sua vizinha por cursos de anastomose com o nervo. (B) Um sistema de ligação em rede de artérias pega “carona” com o nervo. (C) O nervo e a artéria perfuram a fáscia profunda em locais separados. As ramificações das veias se destacam para acompanhar o nervo enquanto ele cruza o tronco arterial principal. (D) O nervo, a princípio, segue paralelo a uma artéria e depois se aproxima da artéria vizinha pela sua periferia para descer pelas suas ramificações em direção ao tronco principal. (E) O nervo cruza as arcadas principais e secundárias da artéria antes de seguir paralelo a rede vascular. (De Taylor GI, Gianoutsos MP, Morris SF. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1994;94:1.)

Quando o nervo cutâneo e a artéria aparecem na fáscia profunda juntos, a sua relação é normalmente estabelecida mais cedo (p. ex., os perfurantes neurovasculares intercostais laterais no tronco ou o sistema de safenas no membro inferior). Entretanto, o nervo, às vezes, perfura a fáscia profunda em um ponto remoto do surgimento de sua artéria associada (p. ex., o nervo cutâneo lateral da coxa e a artéria ilíaca circunflexa superficial abaixo do ligamento inguinal; Fig. 23.16). Alternativamente, o nervo deixa um sistema vascular com o qual está viajando em paralelo para cruzar o caminho de outro (p. ex., o nervo lateral intercostal, que inicia seu curso com sua artéria e a deixa para encontrar a veia epigástrica inferior superficial). Em muitos desses casos, ramificações terciárias e secundárias da artéria normalmente se destacam para acompanhar o nervo (Fig. 23.16). Sunderland percebeu que cada nervo periférico é abundantemente vascularizado por uma “rede vascular ” de uma série de artérias nutrientes que entram no nervo em níveis diferentes.75 FIG. 23.16 SOMENTE ONLINE A arquitetura vascular das veias e artérias intramusculares, conforme discutido anteriormente, é quase idêntica para cada músculo. Então, para simplificar a descrição do suprimento nervoso aos músculos, somente as relações arteriais dos nervos foram discutidas e ilustradas. As ramificações intramusculares dos nervos foram dissecadas, porém não para dentro, até o pacote de músculos individual. As seguintes observações foram feitas: 1. Os nervos seguem uma estrutura de tecidos conjuntivos. As dissecções demostraram que os nervos motores seguem no revestimento do tecido conjuntivo a partir de sua origem no tronco do nervo em direção ao hilo neurovascular dos músculos. Em seguida, o nervo e suas ramificações seguem o tecido conjuntivo

intramuscular para alcançar o conjunto do músculo. 2. Os nervos são econômicos. Como no tegumento, o curso direto dos nervos motores estão em grande contraste com os padrões de deslocamento das veias. Os nervos seguem as rotas extramusculares e intramusculares mais curtas compatíveis com a função do músculo. 3. As relações neurovasculares variam com o músculo, o curso extramuscular, e a ramificação intramuscular dos nervos e das veias. Alguns músculos têm um único nervo de suprimento; outros recebem ramificações motoras múltiplas. Todos recebem pedículos arteriais múltiplos. Entretanto, apesar das variáveis, algumas observações podem ser feitas: Cada nervo motor é acompanhado por um pedículo vascular, porém o inverso não ocorre. O nervo motor é normalmente acompanhado pelo pedículo vascular dominante. Existem exceções para este caso; por exemplo, o suprimento do nervo para o esternocleidomastoideo é normalmente acompanhado por um pedículo vascular menor. O nervo pode entrar no músculo antes de se ramificar. Quando dentro do músculo, o nervo se divide mais cedo e suas ramificações deslizam rapidamente até a posição paralela às fibras musculares. As veias, entretanto, se ramificam e formam arcadas primárias e secundárias, frequentemente cruzando o conjunto dos músculos e nervos antes que as ramificações terciária e quaternária cheguem até as fibras musculares. Por fim, as ramificações terminais das veias e nervos entram em contato e seguem juntas na estrutura dos tecidos conjuntivos paralelas ao conjunto do músculo.

A anatomia neurovascular dos músculos do corpo Vários métodos têm sido usados para classificar os músculos baseados na morfologia, função, suprimento de sangue e suprimento nervoso (Tabela 23.1). Classificamos os músculos do corpo de acordo com seu padrão mais comum de enervação (Fig. 23.17). O padrão da anatomia neurovascular dos músculos influencia a maneira que um músculo inteiro ou segmento de músculo pode ser coletado como uma transferência microvascular de músculo funcional. É possível subdividir alguns músculos, baseados na anatomia neurovascular, em unidades neurovasculares separadas caso cada segmento possuir um pedículo vascular individual. Clinicamente, o anterior serrátil, o músculo grande dorsal, o grácil e o reto femoral são frequentemente usados desta maneira, levando uma porção do músculo com seu nervo motor e suprimento sanguíneo.55,56 Tabela 23.1 Classificação dos músculos baseada no seu suprimento de nervos Tipo I

Tipo II

Tipo III

Tipo IV

Grande dorsal

Deltoide

Gastrocnêmio

Reto do abdome

Extensor do indicador

Glúteo máximo

Sartório

Levantador da escápula

Extensor longo do polegar Trapézio

Tibial anterior

Oblíquo interno

Abdutor longo do polegar Vasto lateral

Flexor superficial dos dedos Digástrico

Palmar longo

Serrátil anterior

Subescapular

Redondo menor

Flexor ulnar do carpo

Redondo maior

Extensor longo do hálux

Bíceps braquial

Tríceps

Plantar

Braquial anterior

Extensor ulnar do carpo

Poplíteo

Flexor longo do polegar Extensor longo dos dedos Flexor longo do hálux

Glúteo médio

Pectíneo

Glúteo Mínimo

Adutor longo

Vasto medial

Adutor curto

Vasto intermédio Perônio longo Sóleo Tibial posterior

Sacroiliolombar

FIG. 23.17 classificação dos nervos baseada no suprimento de nervos. (De Taylor GI, Gianoutsos MP, Morris SF. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1994;94:1.)

• Tipo I. O músculo é suprido por um único nervo motor que normalmente se divide após entrar no músculo (Fig. 23.18). Pedículos vasculares múltiplos suprem cada músculo e formam uma rede contínua pelo tecido. É possível, em cada caso, remover um segmento vascularizado do músculo dentro do seu suprimento de nervo e ainda deixar um músculo viável no local.

FIG. 23.18 Diagrama esquemático (esquerda) dos músculos (A) Tipo I (músculo grande dorsal), (B) tipo II (deltoide), (C) tipo III (gastrocnêmio) e (D) Tipo IV (reto do abdome) a combinar com a radiografia de cada músculo. Os nervos e veias são vistos juntos nas radiografias. Os nervos são retos, enquanto as veias são aspirais. Os nervos, marcadas por computador, aparentam pretos e as veias são pálidas “como fantasmas” no estudo de subtração. (De Taylor GI, Gianoutsos MP, Morris SF. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1994;94:1.)

• Tipo II. Um único nervo motor supre cada músculo neste grupo, porém dessa vez o nervo se divide antes de entrar no músculo. Os músculos desse grupo incluem o deltoide (Fig. 23.18), o glúteo máximo, o trapézio, o vasto lateral, o serrátil anterior e o flexor ulnar do carpo. • Tipo III. As ramificações de nervo motor múltiplas derivam do mesmo tronco de nervos (Fig. 23.18). Mais uma vez, é possível subdividir cada músculo em unidades funcionais separadas devido aos pedículos vasculares múltiplos e as várias ramificações de nervo. O gastrocnêmio é frequentemente dividido dessa maneira, usando uma cabeça para a reconstrução, deixando para trás a outra unidade funcional com seu suprimento neurovascular acoplado. • Tipo IV. Os nervos motores múltiplos são derivados de diferentes troncos de nervos (Fig. 23.18). Aparentemente, cada músculo pode ser subdividido anatomicamente em várias unidades funcionais devido aos pedículos neurovasculares múltiplos e frequentemente segmentados. Na verdade, vários desses músculos têm a formação do seu desenvolvimento por fusão dos somitos adjacentes (p. ex., o reto do abdome e o oblíquo interno). FIGS. 23.19, 23.20 E 23.21 SOMENTE ONLINE

O conceito de angiossomas Seguindo a revisão dos trabalhos de Manchot e Salmon, em conjunto com os resultados do nosso estudo total do corpo em suprimento sanguíneo para a pele e para os tecidos profundos subjacentes, é possível segregar o

corpo anatomicamente em territórios vasculares tridimensionais nomeados angiossomas. Esses territórios anatômicos tridimensionais são supridos por uma artéria de origem (segmental ou de distribuição) e sua veia companheira ou veias que se espalham entre a pele e o osso (Figs 23.22–23.24). Cada angiossoma pode ser subdividido em territórios arteriais e venosos. Desses territórios, 40 foram inicialmente descritos,73 porém, investigações subsequentes demonstraram muitos desses territórios sendo subdivididos ainda mais em unidades compostas menores e revelaram algumas que não atingem a superfície da pele. Mais tarde, em outro estudo, 61 territórios vasculares foram identificados.40 Trabalhos recentes ilustraram não menos que 13 angiossomas da cabeça e pescoço, originariamente mapeados como oito, supridas por ramificações da carótida externa, da carótida interna e das artérias subclávias.52 O conceito de angiossoma indica que uma obstrução de tecido tridimensional é suprida por uma artéria de origem principal e suas veias companheiras, porém é importante notar que o angiossoma por si próprio é divisível dependendo do padrão de ramificação da veia de origem.

FIG. 23.22 A técnica pela qual os angiossomas foram definidos. (A) Os perfurantes cutâneos com suas conexões anastomosadas são descritos a esquerda. A origem dos perfurantes a partir de suas artérias de origem subjacentes e suas ramificações de músculos é mostrada a direita. (B) Os territórios vasculares de cada artéria de origem estão ilustrados no tegumento (esquerda) e nos tecidos profundos (direita) por linhas desenhadas pelas veias de conexão anastomosadas. Note que os territórios correspondem nessas duas camadas e aparentam como setores nos membros. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

FIG. 23.23 Os angiossomas das artérias de origem do corpo foram acinzentadas para corresponder a Figura 23.9. Os angiossomas são: (1) tireoide; (2) facial; (3) bucal (maxilar interno); (4) oftálmico; (5) temporal superficial; (6) occipital; (7) cervical profunda; (8) cervical transversa; (9) toracoacromial; (10) supraescapular; (11) umeral posterior circunflexa; (12) escapular circunflexa; (13) braquial profunda; (14) braquial; (15) ulnar; (16) radial; (17) intercostal posterior; (18) lombar; (19) glútea superior; (20) glútea inferior; (21) femoral profunda; 22) poplíteo; (22a) safena; (23) sural; (24) fibular; (25) plantar lateral; (26) tibial anterior; (27) femoral lateral circunflexo; (28) adutor (profunda); (29) plantar medial; (30) tibial posterior; (31) femoral superficial; (32) femoral; (33) ilíaca profunda circunflexa; (34) epigástrica inferior profunda; (35) torácica interna; (36) torácica lateral; (37) toracodorsal; (38) interóssea posterior; (39) interóssea anterior; e (40) pudenda interna.

FIG. 23.24 Os territórios venosos do corpo. Comparar com a Figura 23.22. (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories (venosomes) of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

Esses compostos de obstrução de pele, osso, músculo e outros tecidos se encaixam como pedaços de um quebra-cabeça para fazer o corpo. Em alguns angiossomas, existe uma grande área cutânea subjacente e uma região de tecido profundo relativamente pequena; em outros, o padrão reverso. Cada angiossoma é ligado ao seu vizinho em cada nível de tecido, ou por uma conexão anastomosada (simples) sem mudança no calibre das veias ou por veias anastomosadas de calibre reduzido. Um padrão similar com veias avalvulares (bidirecionais ou oscilantes) no lado venoso define os limites do território venoso (Fig. 23.24). O conceito de angiossoma tem várias implicações clínicas importantes: 1. Cada angiossoma define o limite anatômico seguro do tecido em cada camada que pode ser transferida separadamente ou combinada na veia de origem subjacente como um retalho composto. Além disso, o território anatômico de cada tecido nos angiossomas adjacentes pode normalmente ser capturado com segurança quando combinado no desenho do retalho. 2. Porque a zona de junção entre os angiossomas adjacentes normalmente ocorre dentro dos músculos do tecido profundo, ao invés de entre eles, esses músculos fornecem um importante desvio anastomosado (manobra de desvio) se a artéria de origem principal ou se a veia for obstruída. 3. Porque a maioria dos músculos abrange dois ou mais angiossomas e são supridos por cada território, um é capaz de capturar a ilha de pele de outro angiossoma por músculo suprido no território adjacente. Conforme veremos, este fato fornece a base para o desenho de muitos retalhos musculocutâneos. FIGS. 23.25, 23.26, 23.27, 23.28, 23.29, 23.30, 23.31, 23.32, 23.33, 23.34, 23.35, 23.36, 23.37 SOMENTE ONLINE

Os conceitos anatômicos relacionados ao desenho do retalho Os seguintes conceitos fornecem uma visão geral do suprimento sanguíneo ao tegumento e aos tecidos profundos (Quadro 23.1). Eles são fundamentais para o mapeamento dos territórios vasculares e para o planejamento de incisões do retalho. Eles ajudam a explicar as variações anatômicas que existem entre as veias de diferentes regiões do corpo e permitem uma melhor compreensão das várias classificações do suprimento sanguíneo cutâneo, que têm aparecido na literatura. Finalmente, esses conceitos anatômicos fornecem a base para interpretação dos muitos processos patológicos e psicológicos, incluindo o fenômeno retardado e a linha

de necrose dos retalhos. Q uadr o 23. 1 C once it os a na t ôm icos As veias seguem a estrutura de tecidos conjuntivos do corpo As artérias irradiam a partir de uma área fixa para uma área móvel e as veias convergem a partir de uma área móvel para uma fixa As veias “pegam carona” com os nervos O tamanho das veias e sua orientação são o produto do crescimento e diferenciação dos tecidos As veias interconectam para formar uma rede de arcadas vasculares tridimensionais contínuas As veias obedecem à lei do equilíbrio As veias têm um destino relativamente constante, porém podem ter uma origem variável As redes venosas consistem de canais avalvulares e valvulares ligados que permitem o equilíbrio do fluxo e da pressão Os músculos são os principais movimentadores do retorno venoso

As veias seguem a estrutura de tecidos conjuntivos do corpo Este conceito é fundamental para o desenho dos retalhos em geral e para os retalhos fasciocutâneos e septocutâneos em particular. A estrutura de tecidos conjuntivos do corpo é um sincício contínuo, como as paredes de uma colmeia, calcificada em algumas áreas para formar o esqueleto ósseo, que abrigam, permeiam e dão suporte ao tecido especializado. As veias seguem essa estrutura até o nível microscópico. Embriologicamente, as veias se desenvolvem com o tecido conjuntivo no mesoderme e, através de seu desenvolvimento, se mantêm estreitamente relacionadas. A aplicação clínica disso é o retalho fasciocutâneo ou septocutâneo. No geral, se o tecido conjuntivo é rígido, como o septo intermuscular, o periósteo ou a fáscia profunda, as veias seguem ao lado dele ou por cima dele. Se o tecido conjuntivo é solto, elas seguem por dentro dele. As veias ocasionalmente seguem por um revestimento fibroso ou canal de osso, porém esse túnel sempre contém tecido areolar solto, fisiologicamente, para permitir que as veias dilatem e as artérias pulsem.82 O padrão é bem ilustrado se a rede arterial é traçada a partir do coração para a periferia. As artérias principais são estreitamente relacionadas aos ossos do esqueleto axial (Fig. 23.2). As ramificações, em princípio, seguem o septo intermuscular. Nos tecidos profundos, elas penetram só nos músculos (normalmente em sua superfície profunda), tendões, ossos, nervos e depósitos de gordura profundos. Conforme as veias se dividem e subdividem dentro dos tecidos especializados, suas ramificações seguem novamente a estrutura do tecido conjuntivo para refletir a arquitetura do tecido em questão. A estrutura arterial é maravilhosamente ilustrada nos estudos de moldes por corrosão de Last e Tompsett.2,83 Os perfurantes cutâneos exibem o mesmo padrão. Eles surgem a partir de suas artérias de origem (segmental ou artéria distribuidora) ou de uma de suas ramificações de músculos e seguem o septo intermuscular ou intramuscular em direção à superfície (Fig. 23.8). Eles perfuram a fáscia profunda, ramificam-se, depois ramificam na sua superfície e sobem para a estrutura de tecidos conjuntivos da fáscia superficial, viajando entre os lóculos de gordura para alcançar o plexo subdermal. Durante o seu curso, as veias cutâneas fornecem ramificações para os tecidos adjacentes, sejam eles músculo, nervo, osso, fáscia ou gordura. As veias cutâneas perfurantes podem ser rastreadas de uma maneira retrógrada através do septo intramuscular e intermuscular para a camada externa da fáscia profunda, onde elas normalmente formam um plexo rico em cada lado de sua superfície. A partir desse ponto, elas podem ser seguidas pela estrutura de tecidos conjuntivos da fáscia superficial, traçando seu caminho sinuosamente entre os lóbulos de gordura até se encontrarem e se tornarem contínuas com o plexo horizontal de grandes veias superficiais perto da derme.

As artérias irradiam a partir de uma área fixa para uma área móvel e as veias convergem a partir de uma área móvel para uma fixa Poucas artérias cruzam os planos de tecidos móveis. Ao invés disso, elas cruzam onde os tecidos são ancorados e irradiam paralelas ao plano de mobilidade, frequentemente por longas distâncias. As veias cutâneas perfuram e surgem a partir da camada externa da fáscia profunda próxima a sua ancoragem, seja do septo profundo ou do osso. O tegumento adjacente é fixado também à fáscia profunda nestes locais. As regiões de

pele fixa são vistas facilmente em um indivíduo de musculatura bem desenhada como vincos e vales. Ela pode ser vista em volta do perímetro do músculo, especialmente onde eles se interalinham; sobre o septo intermuscular bem desenvolvido; sobre a superfície flexora das juntas; adjacente à linha média do ventre e dorsal do corpo; em volta da base do crânio; e na região de algumas proeminências ósseas (Fig. 23.16). A partir dos vincos e vales na fáscia profunda, as artérias tem o fluxo direcionado às partes convexas da superfície do corpo, ramificando por dentro do tegumento. Quanto maior a distância entre as concavidades e maior a agregação, mais longa a veia. Esse padrão é bem demonstrado no suprimento sanguíneo ao tegumento no couro cabeludo, nariz, orelhas, mamas e na genitália; na superfície extensora das juntas; e na superfície saliente dos músculos (Fig. 23.8). Onde a pele é relativamente fixa na fáscia profunda por uma área larga (p. ex., no couro cabeludo e nas muitas áreas dos membros), as veias permanecem próximas a superfície da fáscia profunda por uma distância considerável. Nas áreas de pele solta do corpo, especialmente por sobre o músculo peitoral maior, o oco ilíaco e a superfície extensora das juntas, as veias seguem por uma curta distância adjacente à fáscia profunda. Em breve, são coladas à camada interior da camada subcutânea por uma fina folha cintilante da fáscia, e então perfuram a gordura em um ângulo oblíquo para alcançar o plexo subdermal, onde seguem por longas distâncias. As veias seguem paralelas ao plano de mobilidade, frequentemente por longas distâncias e cruzam onde os tecidos são ancorados à fáscia e ao osso. Isso é visto nos mesmos locais das artérias. Por dentro do plexo subdermal e na gordura subcutânea, as veias e artérias frequentemente seguem por perto a uma distância e somente se juntam quando perfuram a camada externa da fáscia profunda. As veias deixam os tecidos subcutâneos e perfuram a fáscia profunda onde o tegumento é ancorado a ela. Isso ocorre em volta do perímetro dos músculos, em particular onde se interalinham, sobre o septo intermuscular bem desenvolvido. Isso é especialmente verdadeiro nos membros, onde elas se concentram em filas longitudinais sobre a superfície flexora das juntas (p. ex., na fossa cubital, na axila, no oco poplíteo e na virilha); adjacentes à linha média do ventre e dorsal do corpo; em volta da base do crânio e nas margens orbitais onde a gálea é ancorada; e onde a fáscia profunda é fixada ao osso, como nas bordas subcutâneas da tíbia (Fig. 23.10). Nos tecidos profundos, as veias deixam os músculos normalmente próximos a suas ligações aos ossos ou à fáscia, mais frequentemente nas superfícies profundas. Se um grupo de músculos tem uma origem comum, por exemplo, onde os músculos flexores e extensores surgem a partir do epicôndilo medial do úmero, a drenagem venosa de cada um é frequentemente coletada por um grande arco venoso que segue pela massa muscular próxima ao osso. As veias seguem onde o tecido é móvel por uma longa distância, seja pelo músculo, pele, tendão ou nervo. Os grandes retalhos estão disponíveis para a transferência e deveriam ser baseados na margem fixa ou no final daquele tecido. Existem inúmeras situações nas quais essa observação é usada na prática clínica diária. Por exemplo, um retalho de pele grande axial baseado na área fixa da virilha, na região paraumbilical e na região paraesternal usa as áreas de pele móveis sobre as paredes anteriores abdominais e do tórax. As transferências de tendões e músculos mais comumente usadas também são baseadas nesse princípio. Se a mobilidade existe entre os planos de tecido, um plano relativamente avascular é formado.

As veias “pegam carona” com os nervos Existe uma relação íntima entre os nervos e as veias sanguíneas por todos os tecidos profundos, e também nos tecidos da pele e subcutâneos do corpo, especialmente onde o nervo cutâneo segue pela superfície na fáscia profunda. Uma artéria pode acompanhar o nervo por uma distância considerável, frequentemente conectandose ao seu vizinho e formando uma corrente para fornecer a base de um retalho neurovascular axial. As veias cutâneas e os nervos são ocasionalmente justapostos; em outras situações, eles seguem paralelos uns aos outros, porém mantendo uma distância. Quando os nervos cutâneos cruzam um local de pele fixa, eles frequentemente “carregam” seus companheiros vasculares próximos (Figs. 23.15, 23.16). Existem numerosas instâncias pelo corpo onde esse padrão de distribuição de nervos e veias existe para suprir o tegumento. Isso inclui os conjuntos neurovasculares occipitais, infraorbitais e supraorbitais na cabeça; as ramificações de coleta do nervo supraclavicular das veias supraclaviculares e supraescapulares conforme elas cruzam a clavícula no tórax; os conjuntos neurovasculares intercostais do tronco; e os nervos cutâneos do braço, antebraço, coxa, perna e dedos, que são acompanhados por veias longas com nomes ou sem nomes ou um sistema de veias ligadas como correntes.

Os nervos cutâneos são acompanhados por um sistema longitudinal de artérias e veias que são frequentemente o suprimento sanguíneo dominante para a região. As veias em conjunto com os nervos são vias venosas sem paradas frequentemente grandes, como a cefálica, a basílica, os sistemas de safena longos e curtos. As artérias são ou veias longas (p. ex., as artérias supraorbital, intercostal lateral ou safena) ou existem como sistemas de correntes de perfurantes cutâneos, frequentemente juntos em séries por anastomoses sem mudança de calibre (Fig. 23.16). Os nervos perfuram a fáscia profunda junto com as veias, eles surgem separadamente e cruzam as veias em um ângulo ou se aproximam das veias a partir de direções opostas. O tronco principal de veias ou algumas de suas ramificações se destaca para seguir paralelamente (Fig. 23.15) ao nervo. Essas veias ou seguem bem próximas aos nervos ou seguem por perto (Fig. 23.16B). Essa relação neurovascular apresenta outra base de desenho de longos retalhos com o potencial de fornecer sensações no local de reparo. Muitos dos atuais retalhos “fasciocutâneos” ou “axiais” são na verdade retalhos neurovasculares. Os retalhos originais de safena curtos e longos descritos por Pontén são casos a serem analisados.

O crescimento das veias e sua orientação são o produto do crescimento e diferenciação dos tecidos Há dois séculos, John Hunter77 sugeriu que em algum estágio do desenvolvimento fetal, e certamente ao nascer, existe um número fixo de artérias no corpo. Essa foi a impressão do autor quando comparou o número de perfurantes cutâneos encontrados ao criar o mesmo retalho em uma criança e em um adulto. Se esse conceito estiver correto, ele fornece uma explicação para densidade e morfologia das artérias cutâneas em diferentes regiões do corpo. Ele explica porque as veias irradiam a partir de concavidades e convergem nas convexidades; e porque as veias, em algumas áreas, são pequenas e próximas, enquanto em outras são grandes e espaçadas (Fig. 23.38).

FIG. 23.38 Diagrama mostrando como o tamanho e curso dos perfurantes cutâneos diretos x e y, que surgem a partir de pontos fixos na fáscia profunda, poderiam ser modificados pelo crescimento antes ou depois do nascimento. (A) Os perfurantes, que são fixos em número e posição, formam uma rede de conexão maior na superfície da fáscia profunda no seu “estado de descanso”. (B) Eles são alongados com a fáscia profunda pela expansão do tecido subjacente (p. ex., as veias do couro cabeludo, conforme o cérebro e o crânio expandem durante o desenvolvimento fetal). (C) Conforme a mama se desenvolve dentro do tegumento, as veias são acomodadas em direção da derme e alongadas conforme convergem até o mamilo. (D) Elas são separadas nos membros conforme os ossos longos crescem, porém elas ainda retém sua relação original com a fáscia profunda. (E) As veias novamente separadas pelo crescimento, porém a relação móvel entre a superfície interna do tegumento e da fáscia profunda é responsável pelo seu curso oblíquo. Esse padrão é uma característica das áreas de pele solta do tronco. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

Existem inúmeros exemplos para dar suporte a essa hipótese. Os músculos esternocleidomastoideo e trapézio de dividem do mesmo somito.84 O trapézio “carrega” sua artéria cervical transversa de suprimento (e seu nervo) pela raiz do pescoço e das costas, juntamente com uma grande banda de pele que ele cultiva. Manchot4,5 sugeriu que o longo curso e direção das artérias epigástricas inferiores e superiores superficiais são trazidos pela extensão do tronco fetal. Se alguém se lembra de que o perfurante cutâneo atravessa a fáscia profunda nos pontos fixos e que eles são todos interligados, isso explicaria porque, enquanto o cérebro e o crânio expandem, as veias do couro cabeludo hipertrofiam e são esticadas a partir da base do crânio em direção ao seu vértice. Os perfurantes cutâneos primitivos do feto se ramificam, em todas as direções após perfurar a fáscia profunda e têm uma aparência estrelada. Esse padrão é mantido até a idade adulta em muitas regiões do corpo. Quando um perfurante sai deste padrão e se direciona especificamente, ele enfatiza o aumento diferencial no crescimento que ocorreu pelo eixo ou a influência de um nervo cutâneo em desenvolvimento. Onde os pequenos perfurantes são aglomerados, esse padrão sugere que, por comparação, o crescimento e a hipertrofia na área são menores do que nos locais onde os perfurantes são maiores e mais espaçados. Isso é bem demonstrado na comparação dos perfurantes nas regiões proximais e distais dos membros.

As veias interconectam para formar uma rede de arcadas vasculares tridimensionais contínuas Artérias Por todo o corpo, cada veia e suas ramificações são conectadas às veias adjacentes e as ramificações das veias vizinhas para formar arcos. A fundação dessas arcadas é formada às vezes por anastomosadas sem mudança de calibre. Normalmente, elas são representadas por artérias anastomosadas e arteríolas de calibre reduzido. O

perímetro das veias anastomosadas define o território anatômico de cada artéria (Fig. 23.39). Cada território é cercado por veias anastomosadas de calibre reduzido. Deste modo, cada tecido é suprido por uma série de territórios arteriais interligados, alguns pequenos e outros grandes.

FIG. 23.39 Linha pontilhada pelas veias de conexão anastomosadas de um grande perfurante toracoacromial para definir seu território anatômico. Comparar com a Figura 23.19, lado esquerdo do tórax. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

O conceito é tridimensional e foi documentado por Hunter em 1794.77 Ele citou as arcadas vasculares das mãos e dos pés como exemplos e declarou que as arcadas são menores e ocorrem mais frequentemente conforme as artérias se tornam mais distais (Fig. 23.40). Deste modo, como um aqueduto romano, a estrutura arterial consiste de alinhamentos das arcadas vasculares que começam a partir da aorta e se tronam progressivamente menores conforme se aproximam do leito capilar. Geralmente, as arcadas grandes são formadas por artérias de origem de distribuição ou segmentais (p. ex., artéria intercostal, radial, ulnar, e epigástrica profunda) que seguem por entre os tecidos. Alinhamentos de arcadas sucessivos são formados por artérias, arteríolas e capilares que suprem aqueles tecidos. FIGS. 23.40, 23.41, 23.42 SOMENTE ONLINE Veias Começando no leito capilar, as arcadas venosas têm um desenho similar ao das artérias, porém inversamente, com os alinhamentos se tornando maior e menos numerosos até que a última arcada é atingida – a arcada representada pela veia cava inferior e superior, com o coração como pedra fundamental. Essas arcadas se conectam adjacentes aos territórios venosos entre e por dentro dos tecidos. Dentro dessa rede, existe um módulo venoso básico que é repetido nos alinhamentos da rede venosa, modificado em tamanho e formato por uma estrutura de função do tecido e o crescimento e a diferenciação embriológica que deu surgimento a sua forma adulta (Fig. 23.43A). Ele é estrelado e em formato de uma águaviva, e consiste em um número de veias de coleta que convergem em um pedículo. Um bom exemplo deste arranjo é a roda de veias superficiais que converge no bulbo da safena na virilha. Em algumas áreas, os tributários são polarizados a partir de uma direção, como uma árvore que foi soprada pelo vento (Fig. 23.43B); isso acontece no couro cabeludo, nos músculos e na perna onde a veia safena curta se aproxima do oco poplíteo.

FIG. 23.43 Diagrama esquemático de um (A) módulo venoso básico, (B) seu arranjo modificado em áreas diferentes, e (C) como esses módulos se ligam para formar uma rede contínua. (D) No tegumento, essa rede de perfurantes venosos é reorganizada no plexo subdermal para formar os canais longitudinais. Os segmentos com válvulas são azuis escuras, e as veias oscilantes avalvulares são azuis claras. (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories [venosomes] of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

As ramificações com cada “árvore venosa” são ligadas por canais, frequentemente sem válvulas, que se orientam como os degraus de uma escada ou as voltas circunferenciais de uma teia de aranha. Essas arcadas são bem demonstradas nas mãos, nos pés na fossa cubital e entre as veias satélites que acompanham as artérias. Perifericamente, as ramificações irradiadas de cada árvore venosa são ligadas aos de seus vizinhos, novamente por uma veia avalvular, para completar a rede (Fig. 23.43C). No tegumento, canais largos horizontais se desenvolveram dentro da estrutura reticular e subservem a função especializada de termorregulação (Fig. 23.43D). Sua conexão com as veias profundas é retida como canais grandes, as veias comunicantes, ou por veias satélites menores das artérias cutâneas perfurantes (Fig. 23.44).

FIG. 23.44 Acima, Diagrama esquemático do tegumento e do músculo subjacente (sombreado) de um membro ilustrando os sistemas venosos superficiais (S) e profundos (D) com suas redes interconexas. Uma grande veia comunicante (C) conecta esses sistemas e o caminho alternativo das quatro veias satélites é mostrado. As veias com válvulas são azuis escuras, e as veias oscilantes são azuis claras. Abaixo, Diagrama similar representando outras regiões onde a drenagem venosa predominante é através das veias satélites. Note que em cada diagrama, as veias oscilantes ligam os territórios adjacentes no tegumento e nos tecidos profundos. (De Taylor GI, Caddy CM, Watterson PA, et al. The venous territories [venosomes] of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990;86:185.)

As veias obedecem à lei do equilíbrio Esse conceito foi descrito por Debreuil-Chambardel e é mencionado na descrição de Salmon das artérias cutâneas.8,10 Basicamente, esse conceito declara que “os territórios anatômicos das artérias adjacentes mantêm uma relação inversa uns com os outros, porém se combinam para suprir a mesma região”. Se uma veia é pequena, sua parceira é grande para compensar, e vice-versa. Isso é bem ilustrado pelo tamanho relativo da artéria epigástrica superficial e os perfurantes do DIEA. Quando o território da artéria epigástrica inferior superficial é notadamente grande, o território de DIEA é relativamente menor e vice-versa (Fig. 23.7). Essa é uma importante observação já que, se uma veia epigástrica inferior superficial grande é vista, a drenagem da porção inferior do retalho DIEA pode ser dependente do sistema de drenagem venosa superficial.

As veias têm um destino relativamente constante, porém podem ter uma origem variável Esse comportamento é típico das veias que emanam da virilha para suprir a pele da parte inferior do abdome e superior da coxa. As artérias epigástricas inferiores superficiais e as ilíacas circunflexas superficiais, por exemplo, podem surgir ou separadamente de uma artéria comum femoral ou como um tronco combinado a partir da mesma veia ou de uma de suas ramificações. Qualquer que seja o caso, sua destinação é constante para suprir o tegumento da parte inferior do abdome e do quadril (Fig. 23.7, 23.16).

As redes venosas consistem de canais avalvulares e valvulares ligados que permitem o equilíbrio do fluxo e da pressão A rede venosa do corpo é relativamente mal estudada, em comparação ao sistema arterial. Ela consiste de segmentos que tem válvulas consistentes e vários canais venosos, pequenos e grandes, que não tem válvulas e permitem o fluxo por dentro de seu lúmen nas duas direções. No contrário, existem muitas veias pequenas que têm válvulas ou próximas do seu óstio (válvulas sentinelas) conforme entram em canais largos (Fig. 23.43). Veias direcionais

As veias direcionais são veias com válvulas que existem ou nos canais longitudinais, bem desenvolvidas nos tecidos profundos e subcutâneos dos membros, ou como padrões estrelados de veias de coleta que convergem em um pedículo. Os perfurantes cutâneos e os músculos de drenagem do pedículo são bons exemplos do arranjo mencionado. Já que muitas tributárias têm suas válvulas em orientação distal conforme convergem no pedículo, elas fornecem a base anatômica para retalhos de base distal (Fig. 23.43). Veias avalvulares oscilantes Veias avalvulares oscilantes são veias avalvulares que são numerosas e podem atingir grandes dimensões. Elas se conectam e permitem o fluxo livre entre os canais com válvulas dos territórios venosos adjacentes, territórios dos quais as válvulas são orientadas na direção oposta (Fig. 23.43, 23.44). Além disso, também são achadas entre os canais com válvulas do mesmo sistema; combinando e acompanhando as artérias anastomosadas da estrutura arterial. Da mesma forma que as artérias anastomosadas definem os territórios arteriais, as veias oscilantes definem o perímetro dos territórios venosos (Fig. 23.44). Isso é bem ilustrado no estudo dos músculos (Fig. 23.14) e em algumas áreas do tegumento, especialmente no tronco, cabeça e pescoço. Na pele dos membros, esse padrão é disfarçado pelos grandes canais superficiais no plexo subdermal, porém é aparente em estudos transversais. Se os canais venosos grandes forem extraídos mentalmente da figura dos membros, o padrão estrelado remanescente das veias perfurantes combinam com o padrão das artérias perfurantes. É notável que exista uma rica rede de grandes veias oscilantes na coxa anterior. Isso pode nos dar uma explicação para os retalhos livres venosos arterializados.

Os músculos são os principais movimentadores do retorno venoso A maioria dos cirurgiões têm se preocupado com o suprimento arterial de vários músculos usados para a transferência. As veias eferentes que acompanham as artérias e drenam os músculos tem sido notadas e assumidas, corretamente, como eficientes para fornecer o retorno venoso adequado. Entretanto, essa é somente metade da figura. Existem veias eferentes entrando em quase todos os músculos do corpo que surgem do tegumento de cobertura, dos músculos adjacentes e dos ossos subjacentes, onde os músculos estão acoplados. Quando o músculo se contrai, as válvulas nas veias eferentes têm o fluxo direto até o coração. Durante a “diástole”, as válvulas tem o fluxo direto para dentro dos músculos pelas suas veias eferentes. Se as válvulas nos músculos da perna se tornam incompetentes (p. ex., como um resultado de trombose venosa profunda), não seria difícil visualizar o efeito de pressão contrária nas veias cutâneas eferentes que entram nos músculos e o seu papel na patogenia das veias varicosas e ulcerações venosas. Muitas veias conectam pares de músculos ou grupos de músculos como arcadas. Vale a pena notar que os músculos que têm o suprimento eferente mais rico foram aqueles que se encheram mais rapidamente com nossos estudos de injeção. Exemplos notáveis podem ser observados no complexo sóleo e gastrocnêmio, dos músculos do quadríceps, do tríceps e dos músculos da cintura escapular, especialmente os deltoides.

Veias superficiais seguem os nervos e as veias profundas seguem as artérias A drenagem venosa da pele na investigação a seguir consiste de duas partes. 1. Uma rede subdermal horizontal tende a seguir os nervos cutâneos. Isso é visto em particular nos membros, com nervos cutâneos específicos seguindo a veias superficiais específicas (Fig. 23.45).

FIG. 23.45 Estudos (A) arteriais e (B) venosos do tegumento do membro superior: (1) o axilar; (2) braquial lateral inferior; (3) supraclavicular; (4) intercostal braquial; (5) antebraquial posterior; (6) antebraquial medial; (7) braquial medial; (8) antebraquial lateral; (9) plexo dorsal ulnar; (10) radil superficial; (11) mediano; e (12) nervos ulnares. (De Taylor GI, Gianoutsos MP, Morris SF. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1994;94:1.)

2. Onde as veias perfurantes passam pela fáscia profunda de maneira perpendicular, isso ocorre com as artérias que as acompanham. Conforme declarado nos conceitos anteriores, isso normalmente ocorre em locais fixos (Fig. 23.38).

Aplicações do conceito de angiossomas A informação vascular anatômica contida neste capítulo é uma visão geral para fornecer ao leitor informações gerais importantes para o desenho dos retalhos. A partir dos nossos estudos anatômicos extensos, determinamos que a arquitetura geral vascular do corpo seja consistente, porém a variação entre indivíduos diferentes e entre locais diferentes dentro do mesmo indivíduo é a regra. Conforme a nossa compreensão da anatomia vascular do corpo humano melhora, nossa habilidade de desenhar e transferir retalhos com sucesso. Apesar do largo conhecimento nos dias de hoje sobre a estrutura arterial do corpo, ainda apresentamos falhas no conhecimento da estrutura venosa e da rede nervosa. Apesar do conhecimento sobre a anatomia vascular poder ser aplicado em todos os aspectos da cirurgia, o foco principal na cirurgia plástica reconstrutiva é normalmente dedicado ao desenho de sucesso do retalho. Portanto, a aplicabilidade clínica deste capítulo se mantem primordial para a identificação dos perfurantes cutâneos, sua inclusão no desenho do retalho reforçando o fluxo de sangue das veias que suprem o retalho quando necessário.

Avaliação pré-operatória do suprimento vascular cutâneo Desenho do retalho Já foi determinado clinicamente e experimentalmente que os retalhos podem ser seguramente desenhados identificando os perfurantes cutâneos e um perfurante adjacente; uma linha entre os dois perfurantes deve representar o eixo de um retalho viável.85-87 Na situação mais simples, essa abordagem pode funcionar; entretanto, a técnica depende de uma avaliação bem precisa dos perfurantes cutâneos.

Dopplers Uma variedade de aparelhos de ultrassonografia de Doppler vem sendo utilizada para identificar as veias cutâneas. As sondas de Doppler são sondas de Doppler portátil.85 Elas são fáceis de usar, não são caras, e fornecem informações limitadas (Fig. 23.46). Todos os Dopplers exigem investigações sobre suas limitações. Os Dopplers podem enxergar as veias no fundo, não podem determinar o curso das veias com precisão e tendem a

ser dependentes de seus operadores. Entretanto, um Doppler simples é uma ferramenta útil para identificar precisamente as veias cutâneas. FIG. 23.46 SOMENTE ONLINE As sondas de Doppler permitem aos cirurgiões localizar os perfurantes cutâneos com precisão em casos específicos. Levando em conta o conhecimento de que a maioria das artérias cutâneas emerge de locais de pele fixa, conforme já explicado na sessão de conceitos anatômicos (Fig. 23.10), a sua origem esperada pode ser antecipada e localizada rapidamente. Existe uma considerável variabilidade do interobservador com o uso do Doppler. O Doppler portátil, é barato, e pode ser utilizado de prontidão por cirurgiões para confirmar os perfurantes cutâneos. Entretanto, o curso do perfurante é difícil determinar e existe uma curva de aprendizagem significativa associada com o uso do Doppler portátil. Também existem limitações para o seu uso. Nos pacientes obesos, em particular, sua eficiência é limitada por duas razões. Primeiro, a camada grossa cutânea pode esconder a detecção dos perfurantes conforme emergem a partir da fáscia profunda. Segundo, conforme o tecido adiposo aumenta, o tegumento se alonga em dobras e o curso e destino do perfurante se distorce. Existe então, uma margem aumentada ao erro em determinar a base e o eixo do retalho de pele. O uso da sonda de Doppler para localizar a origem do perfurante cutâneo não é novidade e já foi usado por muitos no passado.85 Não são necessários em todos os casos, por razões óbvias. Entretanto, a aplicação na transferência de retalhos livres se provou sem valor, especialmente ao assentar um retalho pequeno. Um bom exemplo é o retalho fibular osteocutâneo, onde somente um pequeno pedaço de pele é exigido para monitorar a anastomose vascular ou como parte da reconstrução. A sonda Doppler é um método rápido e simples de definir os perfurantes.

Duplex Doppler colorido Os Dopplers mais sofisticados são aparelhos duplex coloridos, que têm maior resolução, custo e inconveniências, pois fornecem muito mais detalhes nos exames.88-90 O ultrassom duplex colorido pode detectar precisamente o diâmetro das veias e a velocidade do fluxo.90 Os ultrassons duplex Doppler tem vantagens sobre a Angio-TC, sem incluir contraste intravenoso e sem a exposição à radiação.90 O Doppler colorido duplex está normalmente presente nos departamentos de radiologia de muitos hospitais, porém geralmente exigem treinamento técnico para obter resultados confiáveis e consistentes.

Angiografia por tomografia O método mais preciso para determinar a posição, o diâmetro e o curso dos perfurantes na pele é a Angio-TC. Masia et al. relataram incialmente o uso de um escâner TC multidetector para mapear os perfurantes antes da coleta do retalho DIEAP.91 A técnica de TC se tornou muito popular e é agora usada pelo mundo todo para definir, no pré-operatório, o tamanho, o curso e detalhes dos perfurantes individuais (Fig. 23.47). Comparamos a precisão do Doppler contra o Angio-TC e descobrimos que a Angio-TC é mais precisa e mais útil (Fig. 23.47). As imagens em alta resolução da Angio-TC fornecem informações extensas para os cirurgiões em relação aos perfurantes individuais de 0,3 mm. Na reconstrução de retalhos DIEAP nas mamas, desenvolvemos um sistema para relatar perfurantes individuais usando uma grade, deste modo aumentamos a comunicação entre radiologista e cirurgiões (Fig. 23.25C). Além disso, de forma livre, na cirurgia de retalhos livres de perfurantes,93 o conhecimento do curso do perfurante antes da coleta do retalho pode economizar muito no tempo de cirurgia. As principais desvantagens do Angio-TC incluem o custo e a exposição à radiação. Os proponentes de Angio-TC enfatizam as economias feitas com a redução do tempo de cirurgia. Além disso, a radiação pode ser minimizada por exames focados no local de doação do retalho. E, as reações alérgicas ao contraste e a claustrofobia são problemas potenciais com a Angio-TC.90

FIG. 23.47 O uso da Angio-tomografia computadorizada (Angio-TC) no planejamento de retalhos de perfurantes da artéria epigástrica inferior profunda. (A) Visão axial do abdome de um paciente no pré-operatório antes da reconstrução da mama com o uso de retalho da artéria epigástrica inferior profunda. As setas indicam os perfurantes cutâneos. (B) Usando a Angio-TC para planejar a cirurgia. As marcas mostram os perfurantes detectados pelo Doppler de mão. (C) A sobreposição da grade com pontos brancos reflete a descrição do radiologista dos perfurantes cutâneos baseados na Angio-TC usando as coordenadas: D/E, distância da linha média em milímetros, distância inferior ao umbigo, tamanho do perfurante em milímetros. (De Al-Dhamin A, Berry R, Prasad MA, et al. Coding system for CTA of the inferior epigastric artery perforators in DIEAP flap. Plast Reconstr Surg (in press).)

Os eixos do retalho de pele As artérias cutâneas da pele fornecem a base dos retalhos “axiais” intensamente usados na cirurgia plástica reconstrutiva. A Figura 23.48 mostra os detalhes da origem, curso, tamanho, densidade e interligações dos perfurantes cutâneos. Fornecendo então um planejamento lógico da base e do eixo do retalho de pele. Estudos transversais confirmam as razões para incluir a camada externa da fáscia profunda nos retalhos criados no couro cabeludo e nas extremidades; nessas situações, as veias abraçam a fáscia por distâncias consideráveis. Se um retalho é desenhado pelo curso do nervo cutâneo, como o nervo de safena ou o nervo sural, retalhos longos e seguros podem ser e têm sido cultivados. Os retalhos originais de Pontén28 foram desenhados dessa maneira e os retalhos neurovasculares safenosos foram planejados de maneira similar.94 Nas áreas de pele solta do tronco não é necessário incluir a fáscia profunda porque as artérias cutâneas estão em curso no estágio inicial no tegumento. Elas frequentemente correspondem ao curso dos nervos cutâneos.95

FIG. 23.48 Alguns dos retalhos cutâneos axiais grandes que têm sido usados ou que estão disponíveis baseados nas artérias perfurantes específicas e suas veias perfurantes companheiras, conforme definidos pelos estudos radiográficos do tegumento. No couro cabeludo e nos membros, eles devem incluir a fáscia profunda. Compare com as Figuras 23.9 e 23.16 (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987;40:113.)

Retalho de pele baseados distalmente Os perfurantes arteriais irradiam em padrões estrelados, incluindo ramificações que seguem bem próximas. As veias que acompanham convergem a partir da mesma direção. Para tanto, se o retalho é baseado distalmente sobre um sistema de perfurantes, ele vai conter ramificações arteriais que irradiam próximas delas mesmas e das veias com válvulas que retornam para aquele ponto. Portanto, notamos que a presença dos perfurantes na base do retalho é importante e permite retalhos de base distal.96-98 Uma extensão disso é o famoso retalho em hélice (Fig. 23.49), que é um retalho fasciocutâneo de ilha local baseado em um único perfurante dissecado.99 O conceito de hélice é uma extensão do conceito de retalhos perfurantes. Basicamente, o elemento mais crucial para o desenho de um retalho adequadamente vascularizado é a inclusão do número suficiente de perfurantes cutâneos e suas veias correspondentes na base do retalho. Os retalhos podem ser desenhados por todo o corpo em uma variedade de orientações desde que a veia incluída como um retalho de suprimento vascular não seja danificada antes ou durante a elevação do retalho e não seja retorcida. Entretanto, o manejo cuidadoso e a técnica cirúrgica são importantes para o sucesso dos retalhos em hélice e de outros retalhos locais perfurantes, tanto quanto soltar a fáscia profunda em volta do perfurante para evitar dobras enquanto o retalho é rotacionado.

FIG. 23.49 Retalho de hélice. (A) O retalho se parece com as pás de uma hélice. (B) O retalho é desenhado baseado no maior perfurante intacto adjacente ao ferimento; a = b + c + 1 cm. (C) O retalho é elevado com base no perfurante. (D) A porção do retalho b é usada par cobrir o local doador e o retalho é usado para cobrir o ferimento. (De Teo TW. The propeller flap concept. Clin Plast Surg. 2010;37: 615–626.)

As dimensões do retalho de pele Devido ao suprimento de sangue do tegumento, tanto venoso como arterial, ter sido mostrado como um sistema contínuo de territórios vasculares conectados, o tempo de sobrevivência do retalho de pele deve depender: (1) do calibre e comprimento das veias dominantes em que o retalho é baseado; (2) do calibre e cobertura da artéria ou artérias, veia ou veias capturadas adjacentes; (3) do calibre e comprimento das veias anastomosadas de ligação; e (4) de um retorno venoso favorável ou desfavorável anatomicamente. Onde os perfurantes arteriais são grandes e largamente separados, o território de cada um é grande e um retalho longo pode ser cultivado com segurança. Esses retalhos são típicos de áreas de pele solta do tronco e do couro cabeludo. Por outro lado, se os perfurantes são diminutos e próximos uns dos outros, o território de cada um é pequeno. O comprimento viável de um retalho é curto, a não ser que o suprimento da veia de origem seja incluído no desenho. Isso é evidente nas áreas de pele fixa da sola do pé. Se um retalho muito grande é exigido ou se veias de grande calibre são necessárias para a anastomose microvascular, as exigências podem ser atingidas ao achar os perfurantes no septo intermuscular ou no septo intramuscular para incluir as veias de origem subjacentes. O uso inteligente do retardamento também permite a captura segura dos territórios vasculares adjacentes. Quando consideramos a drenagem venosa, as veias longitudinais grandes no tecido subcutâneo dos membros oferecem uma excelente drenagem para retalhos baseados de forma proximal porque suas válvulas são orientadas naquela direção. Entretanto, no abdome inferior, a drenagem de retalhos de base proximal pode ser anatomicamente desfavorável porque as válvulas das veias epigástricas inferiores são direcionadas para a virilha. O retalho de uma lipectomia abdominal transversa é um caso a se discutir, e talvez por sorte, a área do retalho em questão seja amputada no procedimento. As veias do couro cabeludo são na sua maioria sem válvulas, por isso os retalhos baseados em qualquer direção drenarão favoravelmente. Em muitas regiões, entretanto, a rede venosa consiste em territórios de veias com válvulas orientadas em diferentes direções que são ligadas por veias oscilantes. O mecanismo preciso da linha de necrose do retalho é desconhecido, apesar da abertura do desvio arteriovenoso fornecer uma teoria plausível. Aconteça o que acontecer, já foi provado que a veias anastomosadas no lado arterial e em alguns dos territórios com válvulas do retorno venoso fornecem uma obstrução mecânica potencial do fluxo.

Os retalhos fasciocutâneos

A fáscia profunda deve ser incluída no desenho do retalho fasciocutâneo nos locais onde a pele é relativamente fixa a fáscia profunda, por exemplo, nos membros e no couro cabeludo. Nesses locais, as veias cutâneas dominantes seguem ou se encontram adjacentes à fáscia profunda. Apesar de poderem ser dissecadas livremente em alguns casos, pode ser mais simples e seguro incluir a fáscia profunda com o retalho. Entretanto, onde a pele e os tecidos subcutâneos são móveis por sobre a fáscia profunda, por exemplo, na fossa ilíaca ou na mama, é desnecessário incluir essa camada fascial porque as veias cutâneas principais já deixaram a superfície. O entusiasmo inicial dos retalhos fasciocutâneo foi amenizado, até certo ponto, pela compreensão anatômica aumentada e existem indicações relativamente pequenas para a inclusão da fáscia profunda em um retalho cutâneo. O termo “septocutâneo” é, muitas vezes, desorientador, especialmente quando ele é usado para descrever uma entidade cirurgicamente criada ao invés de uma estrutura anatômica verdadeira. Isso pode ocorrer, por exemplo, onde os perfurantes cutâneos de um retalho ulnar e radial são dissecados dentro do envelope do tecido areolar solto. Além disso, o retalho septocutâneo pode fornecer armadilhas para o cirurgião desavisado. Em alguns casos, a artéria cutânea e suas veias companheiras deixam a veias de origem subjacente e seguem em direção à superfície para uma posição cirurgicamente favorável, adjacente ao septo fibroso branco intermuscular verdadeiro. Isso é típico no suprimento sanguíneo da pele do retalho lateral de braço onde os perfurantes cutâneos surgem de ramificações descendentes das veias braquiais profundas e seguem o septo intermuscular lateral em direção da pele. Esse padrão de suprimento normalmente existe onde os músculos flutuam em qualquer um dos lados do septo intermuscular. Entretanto, se o músculo ataca qualquer um dos lados do septo intermuscular, os perfurantes cutâneos podem ter um curso variável. Essa variabilidade é vista em particular no aspecto lateral da panturrilha superior. Se um retalho composto de pele e osso é desenhado nesse local por sobre o septo intermuscular lateral baseado nos perfurantes cutâneos das veias fibulares, ou essas veias da pele podem seguir diretamente para a superfície, seguindo em uma posição favorável, ou adjacente ao septo por dentro da massa do músculo sóleo ou do flexor longo do hálux, próximos às suas conexões da fíbula, ou, alternativamente, podem surgir indiretamente das ramificações para o músculo sóleo ou flexor longo do hálux como galhos das ramificações de músculos surgem a partir das veias fibulares a distâncias consideráveis do septo intermuscular lateral. Nesses casos, a dissecção intramuscular longa e trabalhosa do suprimento cutâneo será exigida para cultivar o retalho com sucesso.

Os retalhos musculocutâneos Os retalhos musculocutâneos incialmente se tornam populares quando foi reconhecido que músculos de suprimento de grandes veias são mais confiáveis do que as veias cutâneas muito menores, e como resultado, a pele que cobre o músculo foi transferida de forma confiável.23-26 Os retalhos musculocutâneos se mantêm como preferidos nos casos onde um feixe do tecido vascularizado grande é exigido. Entretanto, é atualmente entendido que os perfurantes musculocutâneos podem ser coletados sem o feixe de músculos como retalhos perfurantes. Quando a pele e a fáscia profunda estão firmemente ligadas ao músculo subjacente (p. ex., o músculo glúteo máximo e o músculo grande dorsal), o suprimento sanguíneo para a pele adjacente é assegurado. Em cada local fixo por sobre o músculo, as veias surgem para suprir o tegumento. Entretanto, quando o músculo é móvel por baixo da fáscia profunda (p. ex., o músculo grácil), o suprimento cutâneo e no máximo tênue. No geral, os retalhos musculocutâneos podem ser cultivados se o pedaço de pele é colocado por sobre os perfurantes da artéria do músculo de alimentação ou daqueles no território do músculo adjacente. As tentativas de capturar os territórios além disso, sem uma retardação prévia, frequentemente resulta em insuficiência vascular. Essa situação pode prevalecer, pelas razões já descritas aqui, no músculo peitoral maior e nos retalhos TRAM inferiores. Dependendo do tipo de músculo e do local do pedaço de pele, o caminho venoso pode se tornar novamente anatomicamente favorável ou desfavorável. Em cada caso, a drenagem venosa é confiada aos perfurantes que drenam o plexo intramuscular das veias. Nos músculos tipo I, a drenagem é favorável independente do local do pedaço de pele por sobre o músculo porque a drenagem venosa está em uma direção. Se o pedaço de pele é colocado por sobre o território distal de um músculo tipo II e tipo III, as válvulas desses territórios são orientadas na direção oposta daqueles pedículos de drenagem e o caminho é anatomicamente desfavorável. Esse problema foi enfatizado por Costa et al.100 Em sua investigação da drenagem venosa dos retalhos TRAM

inferiores. Muitos dos retalhos musculocutâneos estão sendo substituídos por retalhos perfurantes microvasculares livres ou locais baseados nos perfurantes musculocutâneos. Os perfurantes musculocutâneos são variáveis em tamanho e posição e exigem uma abordagem operatória flexível. Esses “retalhos perfurantes” são usados para fornecer grandes veias para a transferência microvascular; para eliminar o feixe de músculos, quando adequado; e para preservar a função dos músculos, por exemplo, na coleta de um retalho de pele abdominal transversal de um ou mais perfurantes de DIEA.38,39 Entretanto, todos os retalhos cutâneos são baseados em perfurantes cutâneos, sejam diretos ou indiretos, e independente de passarem entre ou pelos músculos para atingir o tegumento adjacente. Portanto, confinar o termo “retalho perfurante” àquelas instâncias em que as veias cutâneas surgem a partir de músculos para perfurar a fáscia profunda por sobre elas é desorientador. O termo “retalho perfurante” deveria então incluir qualquer ilha de retalho de pele, baseado nos perfurantes cutâneos, seja cultivado a partir de veias de origem ou por dentro de um músculo ou outro tecido profundo. Alguns dos retalhos livres precoces, por exemplo, o retalho da virilha, são retalhos perfurantes, nessa situação baseados nas artérias epigástrica inferior superficial ou ilíaca circunflexa superficial.22

Os retalhos perfurantes Um retalho perfurante tem sido definido de muitas formas como retalhos cutâneos baseados em perfurantes musculocutâneos ou qualquer retalho cutâneo baseado em qualquer veia que supre a pele.30,101,102 Entretanto, essa é uma discussão semântica que não é tão importante como o conceito dos retalhos perfurantes que representam a contínua evolução das transferências de tecidos. Relatos iniciais pioneiros de retalhos perfurantes demonstraram que foi possível coletar um retalho de pele confiável baseado em perfurantes musculocutâneos.38,103,104 Os retalhos perfurantes têm a vantagem do tamanho grande das veias de suprimento dos músculos do corpo sem a desvantagem do feixe de músculo desnecessário e a perda das funções devido ao sacrifício desnecessário do músculo. A popularidade dos retalhos perfurantes tem crescido exponencialmente, conforme evidenciado na literatura mundial da cirurgia plástica, desde os relatos iniciais das técnicas cirúrgicas. A compreensão anatômica tem deixado base para o sucesso dos retalhos perfurantes.47 Sem o conhecimento detalhado da vasculatura subjacente, a cirurgia de retalhos perfurantes seria difícil. Compilamos um atlas dos perfurantes do corpo humano e subdividimos sua distribuição em 61 territórios vasculares (Fig. 23.50).39,40,105 São aproximadamente 400 perfurantes cutâneos na pele, cerca de 60% musculocutâneos e 40% septo-cutâneos.39,40,105 O campo se abriu significantemente devido ao entusiasmo aumentado dos cirurgiões para aprender a “técnica dos retalhos perfurantes” e as opções de retalhos em crescimento. Por fim, os retalhos perfurantes se tornaram mais populares porque os resultados em pacientes têm melhorado. Além disso, a ênfase nos retalhos perfurantes focou a atenção na anatomia vascular da pele. Muitos dos quatrocentos perfurantes da pele podem ser usados como retalhos livres ou locais de suprimento vascular, deste modo, expandindo dramaticamente as possíveis opções de retalhos. O uso da técnica de retalhos perfurantes permite a reconstrução customizada e inteligente que pode fornecer resultados optimizados nos pacientes. Entretanto, os retalhos perfurantes são simplesmente mais retalhos no arsenal dos cirurgiões plásticos; portanto, o bom senso clínico ainda é exigido para escolher o melhor retalho ou técnica para uma aplicação específica.106

FIG. 23.50 Territórios vasculares perfurantes do corpo humano. Os territórios vasculares do corpo que correspondem às regiões dos perfurantes septocutâneos e musculocutâneos à pele. (De Geddes CR. MSc Thesis, Dalhousie University, Halifax, Nova Scotia, Canada.) AIOA, artéria anterior interóssea; ATA, artéria tibial anterior; BA, artéria braquial; CSA, artéria escapular circunflexa; DCA, arco dorsal carpal; DCIA, artéria circunflexa ilíaca profunda; DGA, artéria rotular descendente; DIEA, artéria epigástrica inferior; DPA, artéria dorsal do pé; DPAA, arco palmar profundo; DPIA, ramificação dorsal da artéria intercostal posterior; EPA, artéria pudental externa; FA, artéria facial; IGA, artéria glútea inferior; IOA, artéria infraorbital; IPA, artéria pudendal interna; ITA, artéria torácica interna (mamária); IUCA, artéria colateral ulnar inferior; LA, artéria lombar; LCA, artéria calcânea lateral; LCFA, artéria femoral lateral circunflexa; LIGA, artéria rotular inferior lateral; LPA, artéria plantar lateral; LPIA, ramificações laterais da artéria posterior intercostal; LSA, artéria sural lateral; LSGA, artéria rotular superior lateral; LTA, artéria lateral torácica (mamária); MA, artéria mental; MCA, artéria calcânea edial; MCFA, artéria femoral medial circunflexa; MIGA, artéria rotular inferior medial; MSA, artéria sural medial; MSGA, artéria rotular superior medial; OCA, artéria occipital; OPA, artéria oftálmica; PA, arterial poplítea; PAURA, artéria auricular posterior; PBA, artéria profunda braquial; PCHA, artéria umeral posterior circunflexa; PFA, artéria profunda femoral; PIOA, artéria interóssea posterior; PNA, artéria fibular; PRCA, artéria colateral radial posterior; PTA, artéria tibial posterior; RA, artéria radial; RRA, artéria recorrente radial; SCIA, artéria ilíaca circunflexa superficial; SEA, artéria epigástrica superior; SFA, artéria femoral superficial; SGA, artéria glútea superior; SIEA, artéria epigástrica inferior superficial; SMA, artéria submental; SPA, arco palmar superficial; STA, artéria temporal superficial; STHA, artéria tireoide superior; SUCA, artéria colateral ulnar superior; TAA, artéria toracoacromial.

Os pioneiros em retalhos perfurantes nomearam os retalhos de uma maneira descritiva que originou uma grande gama de termos para descrever os retalhos.101,106 Em alguns casos, muito termos foram usados para o mesmo retalho, o que gerou confusão e, algumas vezes, o atraso na comunicação em relação ao retalho.101,106 Em um esforço de padronizar as descrições dos retalhos perfurantes, introduzimos uma nomenclatura em que todos os retalhos perfurantes são nomeados de acordo com a veia de origem suprindo o retalho.30 As letras AP são adicionadas para indicar artérias perfurantes e as iniciais dos músculos pelo qual os perfurantes passam são adicionadas como sufixo (Fig. 23.51). Para tanto, no caso do retalho DIEAP, DIEAP-ra (reto do abdome). O sufixo com as iniciais dos músculos somente é necessário quando a veia perfurante pode passar por músculos diferentes. O sufixo -s indica que o retalho perfurante é um retalho septocutâneo.

FIG. 23.51 Nomenclatura dos retalhos perfurantes. (DE Geddes CR, Morris SF, Neligan PC. Perforator flaps – evolution, classification and applications. Ann Plast Surg. 2003;50:90–99.)

A escolha do perfurante adequado e a dissecção do pedículo de um retalho perfurante musculocutâneo através de um músculo exigem treinamento, especialidade e habilidades cirúrgicas delicadas. Geralmente, o retalho perfurante é planejado no pré-operatório com o uso de um Doppler de mão, um Doppler duplex colorido ou uma Angio-TC.90,107 Os perfurantes maiores são normalmente escolhidos para o retalho. Conforme a dissecção do retalho começa, cada perfurante maior que 0,5 mm de diâmetro é preservado até que o pedículo seja claramente visualizado. Conforme a dissecção continua, uma técnica cirúrgica delicada é exigida, particularmente no nível fascial para evitar danos de tração nas pequenas veias perfurantes. Geralmente, a técnica cirúrgica é para definir o pedículo vascular e manter o campo seco.107,108 Dúzias de novos retalhos perfurantes já foram descritos nas ultimas décadas. Entretanto, existe um grupo núcleo de retalhos perfurantes muito úteis que se tornaram padrão, incluindo o retalho DIEAP,38,103,104 o retalho anterolateral da coxa (baseado na ramificação descendente das veias femorais circunflexas laterais pelo vasto lateral, LCFAP-vl),109 o retalho da artéria subdermal (SMAP),110 o retalho interósseo posterior (PIOAP-s),111 o retalho perfurante da artéria toracodorsal (TAP-ld),112 a artéria glútea superior (SGAP-gm)113 e o retalho perfurante da artéria glútea inferior (IGAP-gm).114 Dependendo da experiência do cirurgião e suas preferências, muitos desses já substituíram os retalhos convencionais. O retalho anterolateral da coxa, particularmente, já foi chamado de o retalho livre ideal, devido a sua utilidade em uma grande variedade de aplicações clínicas.115 Os retalhos perfurantes são descritos detalhadamente em um livro sobre eles.39 Como já declarado por Pribaz e Chan, “o uso de retalhos perfurantes é um paradigma novo e entusiasmante na cirurgia reconstrutiva”.116

O fenômeno retardado ou autonomização O único método documentado para aumentar a sobrevivência do retalho de pele é o procedimento de retardamento. Um procedimento de retardamento pode ser feito de várias maneiras, desde uma incisão parcial em volta da margem do retalho planejado, uma ligação das veias sem pedículo que suprem o retalho, até a elevação parcial ou completa do retalho (Fig. 23.52). O retardamento pode ser feito em um ou muitos estágios e pode melhorar muito a sobrevivência do retalho de pele. O efeito fisiológico do retardamento é o aumento das artérias existentes ao longo do eixo do retalho que já foram bem documentadas em modelos experimentais em animais (Figs. 23.53, 23.54).86,117,118 Um território vascular anatômico adjacente pode ser capturado com segurança na artéria cutânea do retalho de base. Os fundamentos da anastomose vascular, normalmente formados por artérias anastomosadas de calibre reduzido que ligam os perfurantes cutâneos adjacentes, têm papel integral no fenômeno retardado. Quando um retalho é elevado, essas veias anastomosadas que inicialmente reduzem o fluxo a partir de um território arterial até o próximo ao longo do retalho, aumentam até o mesmo calibre das artérias cutâneas a que se conectam. Entretanto, esse processo de aumento no calibre das veias é um evento ativo que leva tempo. É um processo permanente e irreversível que envolve a multiplicação e hipertrofia das células de cada camada da parede da veia atingindo seu efeito máximo entre 48 e 72 horas após a operação (Fig. 23.55).117 Já foi observado que a necrose normalmente ocorre no nível da próxima anastomose na rede arterial ou na próxima. Cirurgicamente, a sobrevivência do retalho pode ser estendida pela divisão estratégica dos pedículos vasculares em vários intervalos ao longo do comprimento do retalho proposto – o procedimento do “retalho retardado”.

FIG. 23.52 Representação diagramática do mesmo retalho cultivado com e sem o retardamento cirúrgico para ilustrar a linha de necrose e as mudanças nas veias anastomosadas. (A) O território adjacente x é capturado com segurança e a linha de necrose ocorre na interface das veias anastomosadas com a veia y ou a próxima veia. (B) A veia x foi retardada. Note o efeito das veias anastomosadas e o local da linha de necrose. (C) As veias x e y foram retardadas neste retalho com bipedículos. A veia z é dividia e a ponta do retalho elevada em uma segunda fase para fornecer o retalho mais longo. (De Callegari PR, Taylor GI, Caddy CM, et al. An anatomic review of the delay phenomenon I: experimental studies. Plast Reconstr Surg. 1992;89:397–418.)

FIG. 23.53 Arteriograma do músculo reto do abdome controle (esquerda) e retardado (direita) de um cão 7 dias após a cirurgia. Note as veias anastomosadas dilatadas no retalho retardado por ligação da artéria epigástrica inferior profunda (seta). (De Dhar SC, Taylor GI. The delay phenomenon: the story unfolds. Plast Reconstr Surg. 1999;104:2079.)

FIG. 23.54 SOMENTE ONLINE

Os retalhos compostos O conhecimento do suprimento vascular de todos os tecidos que constituem cada angiossoma fornece a base para a transferência de unidades compostas de pele, músculo, nervo, tendão e osso supridos por um único sistema arteriovenoso. Esse conhecimento tem sido aplicado extensivamente na transferência de compostos de tecidos livres. As veias dentro do angiossoma se interligam entre várias camadas. Essa interconexão é bem ilustrada com a transferência de compostos de tecido a partir da região da virilha. Os perfurantes cutâneos diretos da artéria ilíaca circunflexa superficial interconectam com os perfurantes indiretos da artéria ilíaca circunflexa profunda. Quando um retalho osteocutâneo é baseado no sistema profundo, os perfurantes da artéria ilíaca circunflexa profunda capturam o território da artéria ilíaca circunflexa superficial para se difundir na pele.66 Quando esse sistema superficial é usado, o contrário se aplica para difundir o segmento anterior do pico ilíaco e os músculos acoplados.68

O conceito de angiossomas e o desenho do retalho Neste capítulo, apresentamos uma variedade de informações anatômicas que dão suporte ao conceito de

angiossomas e que fornecem uma planta para o desenho de sucesso de um retalho. Como sempre no curso da evolução cirúrgica, as ideias e conceitos irão gradualmente mudar para refletir as novas descobertas e os esforços pioneiros de cirurgiões criativos. Os avanços cirúrgicos se movem como um pêndulo em um caminho acidentado, cada vez mais perto do caminho verdadeiro.

Im a ge ns e x t ra s pa ra e st e ca pít ulo e st ã o disponíve is e m h p://www.e x pe rt consult .com Fig. 23.3 Os territórios vasculares de Carl Mancot do tegumento humano. (A) Territórios vasculares cutâneos, superfície ventral. (B) Territórios vasculares cutâneos, superfície dorsal. (De Manchot C. Die Hautarterien des menschlichen Körpers. Leipzig: FCW Vogel, 1889.) Fig. 23.4 Os territórios vasculares de Michel Salmon do tegumento humano, 1936. Um resumo dos territórios arteriais cutâneos da superfície ventral do corpo. (De Salmon M. Artères de la peau. Paris: Masson, 1936.) Fig. 23.5 Cadáver com marcadores no corpo e linha de incisão marcada. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg 1987;40:113.) Fig. 23.6 Visão lateral de um indivíduo feminino (A) e visão anterior de outro (B). (A) O braço foi removido. Note que a rede de grandes veias que passa pela lateral a partir das linhas médias dorsais e ventral, sobe a partir da virilha, descendo a partir da cintura escapular e convergem no encontro do couro cabeludo e da mama. Essa é a demonstração do princípio de que as veias irradiam a partir de zonas côncavas fixas e irradiam para as áreas convexas móveis. (B) Uma cicatriz de linha média inferior interrompe as veias com aberturas compensatórias de uma grande veia anastomosada acima do umbigo (flecha) para reestabelecer o fluxo através da linha média. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg 1987;40:113.) Fig. 23.16 Injeção arterial do membro superior direito e do tronco. (A) Note que o sistema de artérias em forma de corrente (setas) segue ao longo do nervo cutâneo no membro superior. (B) No tronco, os nervos são marcados no estudo arterial. Eles seguem junto com as artérias cutâneas, as cruzam em ângulos e coletam as ramificações arteriais, ou se aproximam das artérias a partir de direções opostas (setas). (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg 1987;40:113; and Taylor GI, Gianoutsos MP, Morris SF. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg 1994;94:1.) Fig. 23.19 (A) Arteriograma da pele de um porco. Note perfurantes pequenos e numerosos na lateral do tronco, uma veia superficial que foi preenchida no estudo (flecha), as veias segmentais maiores perto da linha média dorsal e ventral e os perfurantes grandes da artéria ilíaca circunflexa profunda perto do quadril. (B) Angiograma de um cão. Note o grande perfurante da artéria ilíaca circunflexa profunda e da artéria toracodorsal (fechas) próximas ao quadril e ao ombro, respectivamente. (C) Arteriograma de um coelho. Note os perfurantes bem grandes da artéria ilíaca circunflexa profunda e das artérias toracodorsais de forma dorsal e da artéria epigástrica inferior superficial e das artérias torácicas laterais de forma ventral. Note também as veias grandes suprindo a orelha. (D) Arteriograma de um pato. Note os territórios discretos ligados por artérias anastomosadas e o perfurante longo esticado da artéria cervical transversa na área de pele móvel do pescoço (flecha). (De Taylor GI, Minabe T. The angiosomes of the mammals and other vertebrates. Plast Reconstr Surg 1992;89:181.) Fig. 23.20 Estudos de injeção do tronco anterior com seu tegumento removido e o umbigo localizado (ponto grande). Os estudos do humano de do cão (A e C) são quase idênticos, com a artéria epigástrica inferior profunda maior do que a artéria epigástrica superior profunda. No coelho e no porco (B e D), o contrário se aplica. (De Taylor GI, Minabe T. The angiosomes of the mammals and other vertebrates. Plast Reconstr Surg 1992;89:181.) Fig. 23.21 Estudo comparativo do músculo reto abdominal de vários mamíferos estudados. Há uma similaridade gritante entre os estudos. Entretanto, em todos os animais, exceto o porco, os músculos se estendem até o tórax de forma mais craniana do que em humanos, e essa região do reto recebe ramificações adicionais da artéria torácica interna. A relação recíproca de tamanho da artéria epigástrica superior profunda e da artéria epigástrica inferior profunda entre as espécies é um bom exemplo da lei do equilíbrio. (De Taylor GI, Minabe T. The angiosomes of the mammals and other vertebrates. Plast Reconstr Surg 1992;89:181.)

Fig. 23.25 Os perfurantes cutâneos do antebraço, codificados por cores para combinar com os angiossomas. Perfurantes grandes e pequenos de pele são indicados por tamanho pelas marcas coloridas. Compare com a Figura 23.22 (De Inoue Y, Taylor GI. The angiosomes of the forearm: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1996;98:195.) Fig. 23.26 Os territórios vasculares do músculo flexor do antebraço (A) superficial, (B) médio e (C) profundo. Note que a zona de junção entre os angiossomas ocorre primeiramente dentro dos músculos e que a maioria dos músculos cruzam pelo menos dois angiossomas. Compare com as Figuras 23.2 e 23.24 (De Inoue Y, Taylor GI. The angiosomes of the forearm: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1996;98:195.) Fig. 23.27 Os territórios vasculares do músculo extensor do antebraço (A) superficial e (B) profundo, demonstrando mais uma vez que a zona de junção está primeiramente dentro dos músculos. (De Inoue Y, Taylor GI. The angiosomes of the forearm: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1996;98:195.) Fig. 23.28 Estudo transversal do antebraço ao nível da (A) cabeça do rádio, (B) inserção do pronador redondo e (C) meio do antebraço, demonstrando os angiossomas do antebraço: artérias braquial (amarelo), radial (azul), ulnar (vermelho), interósseo anterior (verde) e interósseo posterior (laranja). Note que as junções dos angiossomas ocorrem dentro da pele, dentro dos músculos e dentro do osso. (De Inoue Y, Taylor GI. The angiosomes of the forearm: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1996;98:195.) Fig. 23.29 Os territórios vasculares da parte inferior da perna. As esferas coloridas representam os perfurantes cutâneos surgindo a partir da fáscia profunda e o tamanho relativo das veias. (De Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the leg: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1998;102:599.) Fig. 23.30 Os territórios vasculares da parte inferior da perna. (A) Ilustrações do grupo de músculos anteriores que ficam totalmente dentro do angiossoma tibial anterior (azul). Esse angiossoma se estende pra incluir parte dos músculos fibulares. (B) Ilustração dos músculos laterais e seu suprimento a partir dos angiossomas tibial anterior (azul) e fibular (verde). (De Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the leg: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1998;102:599.) Fig. 23.31 Os territórios vasculares da parte inferior da perna. (A) O grupo de músculos superficiais com o suprimento a partir dos angiossomas das artérias do poplíteo (roxo), sural (laranja), tibial posterior (amarelo) e fibular (verde). Todos os músculos cruzam e recebem as ramificações a partir das artérias de origem de cada um. (B) Os músculos profundos e seu suprimento formam as artérias de origem de cada angiossoma. (De Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the leg: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1998;102:599.) Fig. 23.32 (A-C) Os territórios vasculares da parte inferior da perna. Visão anterior da perna com cortes transversais em três níveis, de forma distal. As figuras mostram angiossomas das artérias tibial anterior (azul), tibial posterior (amarelo), fibular (verde) e sural (laranja). Note que, em cada caso, os territórios de angiossomas se estendem a partir da pele até o osso e suas bordas, definidas pelas veias anastomosadas, se encontram normalmente dentro dos tecidos, especialmente nos músculos, e não entre eles. (De Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the leg: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 1998;102:599.) Fig. 23.33 Estudo com cadáver fresco de óxido de chumbo com visão do composto de pele lateral (A) e anterior (B) e do sistema gerou estudo da unidade arterial musculoaponeurótica superficial (SMAS) na cabeça e pescoço. As artérias occipital (a), temporal superficial (b), e oftálmica foram rotuladas. Note que a veia fascial (v) segue mais diretamente e mantendo certa distância de sua contraparte arterial, a artéria facial (d). (C) A camada de pele sozinha revela uma zona “corada” arterial da pele e SMAS mostrada em uma visão sagital. Nota: (1) as “ondas” anastomosadas arteriais ricas formadas entre as ramificações das artérias occipital, temporal superficial e oftálmica no couro cabeludo; (2) o feixe de pequenas veias suprindo a área de pele fixa sobre a glândula parótida e do músculo masseter comparadas com as grandes ramificações das artérias faciais que suprem a face anterior móvel; e (3) a relativa escassez de veias grandes no pescoço exceto no triangulo anterior. As camadas de SMAS são vistas somente (D) com os músculos da expressão facial delineados. (De Houseman ND, Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the head and neck: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 2000;105:2287.) Fig. 23.34 (A) Estudo arterial de óxido de chumbo sobre o suprimento sanguíneo da orelha e dos tecidos adjacentes. Note as arcadas formadas entre as artérias auricular posterior e temporal superficial, marcadas com setas. (B) A figura esquemática mostra as ramificações do suprimento temporal superficial (escuro) e

auricular posterior (claro) para frente e parte de trás da orelha, respectivamente. Note também a anastomose e anastomose simples entre essas duas artérias no couro cabeludo. (C e D) exame de perto da anatomia arterial da parte externa do nariz. Note as arcadas que ocorrem em volta da cúpula alar entre a ramificação de columela da artéria labial superior e da artéria facial. As veias faciais também foram parcialmente preenchidas com óxido de chumbo e marcadas por setas. (De Houseman ND, Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the head and neck: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 2000;105:2287.) Fig. 23.35 Angiossomas dos músculos de expressão facial e mastificação na face. (De Houseman ND, Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the head and neck: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 2000;105:2287.) Fig. 23.36 (A–D) Os angiossomas da cabeça e pescoço coloridos e numerados para combinar com as Figuras 23.22 e 23.24. (B) A seção sagital mostra os três angiossomas. (De Houseman ND, Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the head and neck: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 2000;105:2287.) Fig. 23.37 Radiografia da língua; note a linha média quase avascular. (De Houseman ND, Taylor GI, Pan WR. The angiosomes of the head and neck: anatomic study and clinical applications. Plast Reconstr Surg 2000;105:2287.) Fig. 23.40 Radiografias do tegumento do membro superior e da mão. (A) A pele foi incisada ao longo da borda ulnar. Ela foi removida (B) com a fáscia profunda e (C) sem ela. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg 1987;40:113.) Fig. 23.41 As arcadas interconexas do intestino delgado. (De Crosthwaite GL, Taylor GI, Palmer JH. A new radio-opaque injection technique for tissue preservation. Br J Plast Surg 1987;40:497.) Fig. 23.42 (A) A asa de uma mariposa e (B) a folha de uma árvore, mostrando suas arcadas interconexas de “veias”. (De Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories [angiosomes] of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg 1987;40:113.) Fig. 23.46 Sonda de Doppler para o desenho do retalho de pele. O Doppler de mão pode ser usado para identificar perfurantes cutâneos para o desenho dos retalhos de pele. Neste caso, o Doppler é usado para desenhar o retalho baseado nos perfurantes das veias epigástricas inferiores profundas. Fig. 23.54 Arteriograma do músculo reto do abdome (direita) e retardado (esquerda) de um cão 12 semanas após a reanastomosis da artéria epigástrica inferior profunda previamente ligada (flecha). Note que as veias anastomosadas permanecem curvas e dilatadas, revelando o efeito do retardamento como permanente e irreversível. (De Dhar SC, Taylor GI. The delay phenomenon: the story unfolds. Plast Reconstr Surg 1999;104:2079.) Fig. 23.55 Sequencia de tempo do retardamento. Imediatamente após a elevação cirúrgica do retalho, o diâmetro vascular geral é reduzido pela vasoconstrição. Em seguida, uma dilatação gradual ocorre durante as primeiras 48 horas, e então a dilatação dramática ocorre a partir de 48 até 72 horas. A velocidade de alargamento das veias se estabiliza e, em seguida aumentam gradualmente.

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  10. Taylor, G. I., Tempest, M. Salmon’s arteries of the skin. Edinburgh: Churchill Livingstone; 1988. 21. Taylor, G. I., Daniel, R. K. The free flap: composite tissue transfer by vascular anastomosis. Aust N Z J Surg. 1973; 43:1. Esse é o primeiro relato do autor sobre a transferência de tecidos vascularizados. Um retalho livre foi exigido para cobrir a extremidade inferior de um ferimento que era inadequado para as técnicas mais comuns na época.

26. Mathes, S. J., Nahai, F. Clinical atlas of muscle and musculocutaneous flaps. St. Louis: Mosby; 1979. Essa referência bibliográfica marcante oferece esquemas detalhados dos retalhos chave para os procedimentos reconstrutivos. Fotos vívidas engrandecem o texto.

30. Geddes, C. R., Morris, S. F., Neligan, P. C. Perforator flaps – evolution, classification and applications. Ann Plast Surg. 2003; 50:90–99. Os autores fornecem uma revisão histórica da evolução dos retalhos perfurantes e as vantagens desses retalhos são descritas. Um sistema de nomenclatura para os retalhos perfurantes é oferecido.

31. Taylor, G. I., Corlett, R. J., Dhar, S. C., et al. The anatomical (angiosome) and clinical territories of cutaneous perforating arteries: development of the concept and designing safe flaps. Plast Reconstr Surg. 2011; 127:1447–1459. 39. Blondeel, P. N., Morris, S. F., Hallock, G. G., et al. Perforator flaps. Anatomy, technique and clinical applications. St. Louis: Quality Medical Publishing; 2006. 40. Morris, S. F., Tang, M., Almutairi, K., et al. The anatomic basis of perforator flaps. Clin Plast Surg Oct. 2010; 37:553–570. Esse relato mostra a importância de compreender o suprimento sanguíneo cutâneo no desenho dos retalhos perfurantes. Enquanto a anatomia dos perfurantes individuais pode ser variável, a anatomia das artérias de origem é relativamente consistente.

47. Taylor, G. I., Palmer, J. H. The vascular territories (angiosomes) of the body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg. 1987; 40:113. 48. Taylor, G. I., Caddy, C. M., Watterson, P. A., et al. The venous territories (venosomes) of the human body: experimental study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1990; 86:185. 49. Taylor, G. I., Gianoutsos, M. P., Morris, S. F. The neurovascular territories of the skin and muscles: anatomic study and clinical implications. Plast Reconstr Surg. 1994; 94:1. Estudos cadavéricos extensivos em humanos e animais foram executados para caracterizar a anatomia dos retalhos de pele fasciocutâneos. Nervos motores e cutâneos foram descobertos acompanhados por um sistema vascular que frequentemente fornece o suprimento sanguíneo dominante da região.

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Classificação de retalhos e aplicações Scott L. Hansen, David M. Young, Patrick Lang e Hani Sbitany

Resumo O uso de retalhos com um suprimento sanguíneo intacto revolucionou o campo da cirurgia plástica. Atualmente, o cirurgião reconstrutivo que se defronta com um defeito de tecidos moles possui diversas opções disponíveis. O retalho muscular, o retalho musculocutâneo, o retalho fasciocutâneo, o retalho perfurante e várias técnicas de transplante de tecido composto microvasculares têm possibilitado maiores avanços no campo da cirurgia plástica. Aplicando um conhecimento bem definido da anatomia da pele, musculatura, ossos e fáscia no planejamento de procedimentos reconstrutivos, o cirurgião tem a capacidade para restaurar a forma e a função em defeitos congênitos e adquiridos na maioria das regiões topográficas. As modificações e os aperfeiçoamentos no projeto do retalho proporcionam variedade e versatilidade nas técnicas disponíveis para utilização na cirurgia reconstrutiva. Aplicando os princípios do planejamento e da técnica do retalho, é possível simplificar a abordagem do defeito cirúrgico. A cobertura, a forma e a função das partes moles são os três fatores mais importantes na determinação de um resultado bem-sucedido. Através de uma análise cuidadosa de cada defeito cirúrgico individualmente, o método mais apropriado de reconstrução pode então ser selecionado. Este capítulo revisa a classificação de retalhos e apresenta exemplos de suas aplicações.

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Classificação de retalhos Um retalho consiste no tecido que é mobilizado com base na sua anatomia vascular. Os retalhos podem ser compostos por pele, pele e fáscia, pele e músculo ou pele, músculo e osso. Considerando que a circulação para o tecido a ser mobilizado é fundamental para a sobrevida do retalho, o desenvolvimento de técnicas de retalho apresenta uma dependência da definição da anatomia vascular da pele e do tecido mole subjacente. Um conceito prévio de anatomia vascular no que se refere à cirurgia com retalho foi o raciocínio de que a circulação dérmica foi baseada no plexo subdérmico longitudinal. Um retalho de padrão aleatório baseado nesse plexo subdérmico foi planejado para permitir a elevação de um retalho de forma retangular, composto de pele e tecido subcutâneo com uma extensão: razão de largura em uma variação de 2-1,5:1. Posteriormente, Milton contestou o conceito das relações de largura/comprimento.30 Embora limitado em seu alcance, o retalho de padrão aleatório pode ser elevado e rodado para proporcionar uma pele viável e tecido subcutâneo para cobrir uma ferida ou lesão adjacente. Retalhos comuns baseados no plexo subdérmico incluem o retalho bipediculado, retalhos de avanço (ou seja, V-Y) e retalhos de rotação ou transposição (Fig. 24.1).

FIG. 24.1 (A) Procedimento cirúrgico tardio com retalho bipediculado. (B) Retalho de avanço. (C) Retalho de rotação.

Do ponto de vista histórico, tentativas de usar um retalho com padrão aleatório baseado na circulação subdérmica distante do local da lesão resultaram eventualmente na introdução do retalho tubular pediculado. Por meio de uma série de usos tardios do desenho do retalho inicial bipediculado, o arco de rotação do retalho de pele foi aumentando. Alternativamente, o retalho foi ligado a um ramo transportador, que em seguida foi necessário transferir o ramo transportador do retalho com padrão aleatório, a partir de uma região do corpo (sítio doador) para uma outra região (sítio receptor). Essa utilização do retalho randomizado com múltiplos processos de autonomização ou com o ramo transportador permitiu a reconstrução de defeitos complexos e distantes, especialmente na região da cabeça e pescoço, e para a cobertura de lesões compostas, quando o tecido local não estiver disponível ou severamente danificado. Apesar disso, o retalho randomizado não ofereceu uma nova fonte de circulação quando transferido para um sítio distante. Dessa forma, os sucessos desses retalhos ultimamente dependem do ambiente do local da ferida para a nutrição. Outras restrições de retalhos aleatórios incluem o arco limitado de rotação, a proximidade do retalho à ferida e a zona associada de lesão, e a resistência bacteriana reduzida.31 Considerando as limitações vasculares do retalho com padrão aleatório, os investigadores tentaram diversos meios para maximizar a área potencial de um retalho, conduzindo ao conceito de retalho autonomizado. Apesar de o procedimento de autonomização ter sido usado por várias centenas de anos, esse conceito não foi reconhecido até o início de 1900. Blair introduziu o termo transferência autonomizada em 1921.32 No século XVI, Tagliacozzi efetuou um procedimento cirúrgico de autonomização em seus retalhos da parte superior do braço, realizando incisões paralelas através da pele e do tecido subcutâneo sobrejacente ao músculo bíceps. Em 1965, usando o modelo de porco, Milton investigou a eficácia de quatro métodos diferentes de autonomizar cirurgicamente a utilização de um retalho. Ele detectou que no desenvolvimento de um retalho bipediculado a melhor forma de autonomizá-lo é realizar duas incisões e enfraquecer (ou debilitar) a pele entre tais incisões.33 O objetivo do procedimento cirúrgico de autonomização de um retalho é melhorar sua circulação, garantindo a sobrevida do mesmo após o avanço, transposição ou transplante para um sítio de defeito. O procedimento cirúrgico de autonomização do retalho pode ser usado para aumentar a circulação para o músculo ou fáscia ou para melhorar as conexões vasculares para o território cutâneo ou para as estruturas adjacentes a serem incluídas durante as elevações dos retalhos (tendão, fáscia e osso). Embora o procedimento cirúrgico de autonomização possa ser acompanhado por meios bioquímicos para melhorar a perfusão do retalho, atualmente o método mais efetivo para garantir esse procedimento é a manipulação cirúrgica do retalho. Até o momento, não existe nenhum método farmacológico que tenha superado a reprodutibilidade e o grau pelos quais o procedimento cirúrgico de autonomização protege contra a

necrose do retalho.34 Existem duas teorias que descrevem o mecanismo potencial pelo qual o fenômeno de autonomização evita a necrose dérmica. A primeira é que o procedimento de autonomização aclimata o retalho à isquemia (tolerância), permitindo que o retalho sobreviva com menor fluxo sanguíneo do que normalmente seria necessário. Essa teoria sugere que o fluxo vascular diminuído causa alterações metabólicas adaptativas em um nível celular dentro do tecido.35 A segunda teoria é que o procedimento cirúrgico tardio melhora a vascularização pelo aumento do fluxo através dos vasos pré-existentes, reorganizando o padrão de fluxo sanguíneo para as áreas mais isquêmicas.36,37 Com base nos dados experimentais, parece que ambos os mecanismos, direta ou indiretamente, contribuem para os efeitos benéficos do procedimento de autonomização do retalho. Independentemente dos mecanismos subjacentes, a maioria dos trabalhos experimentais sobre procedimento cirúrgico tardio demonstra alterações no nível microcirculatório.38,39 O procedimento cirúrgico de autonomização dos retalhos é realizado de duas formas: autonomização padrão, com uma incisão na periferia do território cutâneo ou elevação parcial do retalho; e autonomização estratégica, com a divisão de pedículos selecionados para o retalho, para melhorar a perfusão através do pedículo ou pedículos remanescentes. Os aspectos técnicos do procedimento cirúrgico de autonomização padrão para melhorar a circulação são simples e bem definidos. O território cutâneo do retalho é delineado e são realizadas incisões totais ou em parte da borda de um território cutâneo planejado (Fig. 24.2). A seguir, é realizado um descolamento cirúrgico mínimo a parcial do retalho. As incisões então são fechadas. Em seguida, o retalho é elevado após 10-14 dias. Foi observado que, após 1 semana, o fluxo sanguíneo dentro da área do procedimento cirúrgico alcança um pico máximo.40

FIG. 24.2 Modificação de retalho pelo procedimento cirúrgico tardio padrão. (A) Território cutâneo do retalho. (B) Incisão pelo procedimento cirúrgico tardio. (C) Incisão pelo procedimento cirúrgico tardio com a elevação parcial do retalho distal.

O procedimento de autonomização estratégico do pedículo é realizado fazendo incisões na borda do território cutâneo planejado do retalho. A dissecção é realizada de forma profunda no músculo ou fáscia, dependendo do tipo de retalho, para alcançar os pedículos na entrada do território do retalho. Esses pedículos são divididos e a incisão é fechada. O segundo estágio de elevação do retalho é realizado após um período de 2 semanas. A eficácia do procedimento de autonomização estratégico com base na ligação do pedículo vascular dominante foi demonstrada inicialmente no modelo invertido do retalho musculocutâneo do grácil.21 Esse tipo de procedimento cirúrgico em geral é recomendado para os pacientes com fatores de risco para a isquemia do retalho (ou seja, histórico de fumo, obesidade, terapia por radiação, cicatriz abdominal). Um exemplo de uma indicação para o procedimento cirúrgico de autonomização seria uma paciente que vai submeter-se a uma reconstrução de mama com um retalho transverso do músculo reto abdominal (TRAM). Observou-se que pacientes de alto risco são beneficiados com o procedimento cirúrgico de autonomização.41 Além disso, foi demonstrado que o procedimento cirúrgico reduz potencialmente a incidência de complicações na parede abdominal.42 Novas técnicas para o procedimento cirúrgico de autonomização são projetadas para minimizar o comprimento da incisão e a morbidade relacionada a esse processo. Técnicas endoscópicas permitem o acesso e a divisão de pedículos com incisões mínimas. As técnicas de radiologia intervencionista também podem ser

usadas para ocluir pedículos dominantes ou secundários no território do retalho para melhorar a perfusão para os pedículos do retalho remanescente. Apesar da importância histórica, a técnica do procedimento cirúrgico de autonomização é usada com menor frequência devido ao desenvolvimento de técnicas melhores, incluindo os retalhos axial, musculocutâneo, fasciocutâneo, de transposição, perfurante e o retalho livre microvascular. Como ocorre com o retalho de padrão aleatório, a limitação do retalho com procedimento cirúrgico de autonomização refere-se ao suprimento sanguíneo paralelo não eficiente. O procedimento cirúrgico de autonomização do retalho apresenta também desvantagens: é necessária uma cirurgia preliminar; é possível a ocorrência de uma lesão acidental no pedículo selecionado para o projeto do retalho; e o tecido cicatrizado resultante no sítio do procedimento cirúrgico tardio do retalho pode prejudicar a manipulação subsequente e a inserção do retalho no sítio receptor. A realidade do procedimento cirúrgico de autonomização pode resultar em parte de um estado simpaticolítico que resulta do corte da inervação simpática para a vasculatura e a subsequente vasodilatação. Drogas que bloqueiam a vasoconstrição ou aquelas com ação vasodilatadora podem representar um valor teórico. Foram realizadas tentativas para estimular farmacologicamente o procedimento de autonomização pela manipulação do sistema nervoso autônomo.43 Embora a autonomização farmacológica seja de importância teórica, são necessários estudos complementares para comprovar a eficácia desse processo. O conceito inadequado de que a circulação dérmica é baseada em uma rede vascular longitudinal independente de estruturas mais profundas retardou o progresso da descoberta do retalho. Poucas áreas isoladas com vasos cutâneos diretos permitiram a elevação do retalho sem a restrição da relação de comprimento e largura 2:1 (p. ex., retalho da parte mediana da fronte). Entretanto, a necessidade de retalhos mais longos sem um requisito do procedimento de autonomização resultou na identificação de retalhos com territórios vasculares específicos baseados no mapeamento dos pedículos vasculares superficiais com um alinhamento axial (Fig. 24.3). Os retalhos axiais baseados nesse conceito incluem a fronte lateral (artéria temporal superficial), a região deltopeitoral (ramos mamários internos), groin (artéria circunflexa ilíaca superficial) e a região dorsal do pé (artéria dorsal do pé). O desenvolvimento desses retalhos axiais causou um grande impacto, especialmente na reconstrução de cabeça e do pescoço, bem como da extremidade superior.

FIG. 24.3 Retalho de padrão axial. (A) Baseado na artéria temporal superficial. (B) Arco de rotação do retalho temporoparietal.

Os retalhos axiais mais longos, não submetidos ao procedimento cirúrgico de autonomização, tornaram possível a reconstrução imediata de defeitos na cabeça e pescoço, virilha e extremidade superior, incentivando a busca por novos retalhos baseados em pedículos vasculares consistentes no tronco e extremidades. O músculo foi logo identificado como uma fonte de tecido que poderia ser separada de sua origem normal ou inserção e transposto como um retalho baseado em seu suprimento vascular principal (dominante). A análise complementar da circulação dérmica revelou a existência de vasos perfurantes musculocutâneos importantes suprindo a pele sobrejacente, alterando a abordagem para o projeto do retalho.12-14 Esse processo conduz eventualmente para o conceito de que músculos e fáscia apresentam pedículos vasculares distintos. O sucesso de retalhos musculares na cirurgia reconstrutiva é baseado no suprimento sanguíneo seguro. Com o conhecimento do local e a preservação subsequente dos pedículos vasculares para a musculatura, todo músculo pode ser rodado como um retalho.

Retalhos musculares e musculocutâneos Em 1981, Mathes e Nahai descreveram um sistema de classificação para músculos baseado nas seguintes relações anatômicas entre músculo e seus pedículos vasculares: 1. O local de origem do pedículo penetrando o músculo. 2. O número e o tamanho do pedículo. 3. O local do pedículo no que se refere à origem do músculo e inserção. 4. Os padrões angiográficos dos vasos intramusculares. Esse sistema de classificação permite ao cirurgião classificar os diversos retalhos musculares e

musculocutâneos dentro de grupos clinicamente aplicáveis e distintamente diferentes, com base na anatomia vascular. Existem cinco padrões vasculares diferentes, pelos quais diversos músculos são classificados (Fig. 24.4).15

FIG. 24.4 Classificação de Mathes-Nahai de retalhos musculocutâneos e musculares.

Tipo I: um pedículo vascular Os músculos Tipo I são supridos por um único pedículo vascular (Tabela 24.2). Tabela 24.2 Músculos de padrão vascular tipo I Abdutor do dedo mínimo (mão) Abdutor curto do polegar Ancôneo Cólon Artéria circunflexa ilíaca profunda Primeiro interósseo dorsal Gastrocnêmio, medial e lateral Genioglosso Hioglosso Jejuno Lingual longitudinal Estiloglosso Tensor da fáscia lata Transverso e vertical da língua Vasto lateral

Tipo II: pedículo vascular dominante e pedículo menor Os músculos Tipo II são supridos por um pedículo vascular menor e um dominante. O pedículo vascular dominante em geral sustentará a circulação desses músculos, após a elevação do retalho quando os pedículos menores são seccionados. Esse é o padrão mais comum de circulação observado na musculatura humana (Tabela 24.3).

Tabela 24.3 Músculos de padrão vascular tipo II Abdutor do dedo mínimo (pé) Abdutor do hálux Braquiorradial Coracobraquial Flexor ulnar do carpo Flexor curto dos dedos Grácil Isquiotibial (bíceps femoral) Fibular curto Fibular longo Platisma Reto femoral Sóleo Esternocleidomastóideo Trapézio Tríceps Vasto medial

Tipo III: dois pedículos dominantes Os músculos Tipo III possuem dois pedículos vasculares amplos, com origem vascular distinta. Esses pedículos apresentam uma origem separada de circulação ou estão localizados em lados opostos do músculo. A secção de um pedículo durante a elevação do retalho raramente resulta na perda de músculo dentro de sua distribuição vascular. O músculo geralmente sobreviverá com um de seus pedículos vasculares dominantes. Esse padrão vascular permite que o músculo se divida, possibilitando o uso de apenas parte da musculatura como um retalho muscular ou musculocutâneo (Tabela 24.4). Tabela 24.4 Músculos de padrão vascular tipo III Glúteo máximo Intercostal Peitoral ou omento Orbicular da boca Peitoral menor Reto abdominal Serrátil anterior Temporal

Tipo IV: pedículos vasculares segmentares Os músculos tipo IV são supridos pelos pedículos vasculares segmentares, penetrando ao longo do ventre muscular. Cada pedículo fornece circulação para um segmento do músculo. A secção de mais de dois ou três dos pedículos durante a elevação de um retalho pode resultar em necrose da porção distal do músculo (Tabela 24.5). Tabela 24.5 Músculos de padrão vascular tipo IV Extensor longo dos dedos Extensor longo do hálux Oblíquo externo Flexor longo dos dedos Flexor longo do hálux Sartório Tibial anterior

Tipo V: um pedículo vascular dominante e pedículos vasculares segmentares secundários Os músculos tipo V são supridos por um único pedículo dominante e pedículos secundários vasculares segmentares. Esses músculos apresentam um pedículo vascular dominante amplo próximo da inserção do músculo com diversos pedículos segmentares na proximidade da origem. A vascularização interna pode ser suprida pelos pedículos dominantes ou segmentares e, desta forma, o músculo pode ser elevado como um retalho em cada sistema vascular (Tabela 24.6). Tabela 24.6 Músculos de padrão vascular tipo V Fíbula Oblíquo interno Latíssimo do dorso (ou grande dorsal) Peitoral maior

Retalhos fasciocutâneo e da fáscia Um conhecimento crescente da fonte de circulação dérmica após o reconhecimento do sistema musculocutâneo e muscular conduz à identificação de pedículos vasculares que surgem entre os músculos (pedículos septocutâneos) e penetram a fáscia profunda. A elevação da pele com sua fáscia profunda representou uma nova base vascular para o projeto do retalho. Um retalho fascial consiste da fáscia separada de sua origem normal ou inserção, transposta para um outro local. A ausência de pele sobrejacente e gordura representa um retalho frágil. Um retalho fasciocutâneo, originalmente denominado retalho axial, inclui a pele, tecido subcutâneo e fáscia subjacente, que podem ser evidenciados de forma distinta a partir da fáscia que cobre a musculatura subjacente. O suprimento vascular é originado na base do retalho, a partir dos perfurantes musculocutâneos ou diretamente dos ramos septocutâneos das artérias principais (ou maiores). Os primeiros retalhos fasciocutâneos e da fáscia foram descritos por Ponten em 1981 para a reconstrução da extremidade inferior e por Tolhurst em 1983 para a reconstrução axilar e do tronco.22,44 Pesquisas demonstraram que o sistema fasciocutâneo consiste de vasos perfurantes que surgem a partir das artérias regionais e passam ao longo do septo fibroso entre o ventre muscular ou compartimentos musculares. Os vasos então se propagam ao nível da fáscia profunda, tanto acima como abaixo, para formar plexos, que em retorno liberam ramificações para a pele. Em 1975, Schafer detectou três sistemas vasculares principais da fáscia profunda.45 1. As artérias perfurantes da musculatura subjacente liberam diversos ramos irradiadores que perfuram a fáscia antes de prosseguir para o plexo subdérmico. 2. Artérias subcutâneas percorrendo a região de gordura, anastomosando frequentemente com o plexo superficial da fáscia profunda e entre ambos. 3. Artérias subfasciais surgindo a partir do septo intermuscular percorrendo no tecido conjuntivo (areolar) frouxo abaixo da fáscia profunda, e adjacente do plexo superficial e profundo. Esses pedículos consistem de uma artéria (geralmente um ramo da artéria para a região anatômica específica da fáscia e da musculatura regional) e veias comitantes emparelhadas que drenam o interior das veias regionais principais. Os pedículos cutâneos e septocutâneos diretos estão bastante concentrados no local. Existe uma variabilidade maior na localização dos perfurantes musculocutâneos. Esses pedículos proporcionam uma base vascular para retalhos fasciais específicos ou fasciocutâneos. De acordo com essa base, Mathes e Nahai classificaram os retalhos fasciocutâneos e da fáscia como tipos A, B e C (Fig. 24.5).29

FIG. 24.5 Classificação de Mathes-Nahai de retalhos fasciocutâneos e da fáscia.

Estudos anatômicos demonstram que os retalhos fasciocutâneos tipo A apresentam um pedículo vascular para a fáscia profunda que surge a partir de uma fonte regional, percorrendo inicialmente abaixo da fáscia profunda e, eventualmente, prossegue seu curso superficial para a fáscia profunda. Esse pedículo fornece inúmeros perfurantes fasciocutâneos para a pele. Considerando que o pedículo tende a percorrer de uma forma radial a partir de sua fonte regional dentro da sua distribuição cutânea distal, o retalho é referenciado muitas vezes como um retalho axial. O curso relativamente superficial e longo do pedículo dominante permite a avaliação por palpação ou sonda Doppler (Tabela 24.7).

Tabela 24.7 Retalhos fasciocutâneos e fasciais tipo A Artéria pudenda externa profunda Artéria digital Artéria metacarpiana dorsal Região glútea e coxa Dedão do pé (hálux) Groin Torácico lateral (axilar) Pudendo da coxa Safeno Couro cabeludo Segundo dedo do pé Frontal-padrão Artéria pudenda externa superficial Artéria epigástrica inferior superficial Artéria sural Fáscia temporoparietal

Os retalhos fasciocutâneos tipo B apresentam um pedículo septocutâneo, que percorre entre os grupos musculares principais em um septo intermuscular ou entre os músculos adjacentes. Esse pedículo está localizado dentro do septo intermuscular ou no espaço potencial entre os músculos adjacentes e supre um sistema vascular fascial regional. Os pedículos septocutâneos mais amplos são os pedículos dominantes para os retalhos fasciocutâneos específicos e são bastante estáveis no local (Tabela 24.8). Tabela 24.8 Retalhos fasciocutâneos e fasciais tipo B Anterolateral da coxa Artéria tibial anterior Deltoide Dorsal do pé Artéria cubital (ulnar) inferior (anticubital) Lateral do braço Artéria plantar lateral Lateral da coxa Medial do braço Artéria plantar medial Medial da coxa Artéria fibular Artéria interóssea posterior Artéria tibial posterior Radial do antebraço Artéria recorrente radial Escapular Artéria recorrente ulnar

Em certas regiões, os perfurantes musculocutâneos maiores penetram a fáscia profunda e contribuem tanto para a circulação cutânea como da fáscia profunda. O projeto de um retalho fasciocutâneo pode ser baseado nesses vasos perfurantes dominantes, sem incorporação da musculatura subjacente; tal padrão vascular representa o retalho fasciocutâneo tipo C. Entretanto, para aumentar a extensão do pedículo será necessária a dissecção proximal do pedículo através da musculatura para a sua fonte regional ou a incorporação total ou de parte da musculatura no projeto do retalho. Os retalhos tipo C geralmente são representados pelo modelo anatômico usado para o retalho perfurante no transplante microcirúrgico (Tabela 24.9).

Tabela 24.9 Retalhos fasciocutâneos e fasciais tipo C Anterolateral da coxa Deltopeitoral Nasolabial Frontal mediano Toracoepigástrico (abdominal transverso) Dorsal transverso

Cormark e Lamberty classificaram também os retalhos fasciocutâneos de acordo com a anatomia vascular.46 O retalho tipo A é suprido por múltiplos perfurantes fasciocutâneos que penetram na base do retalho e se estendem por toda a extensão longitudinal. O retalho pode ser baseado de forma proximal ou distal, ou como uma “ilha”. O retalho tipo B apresenta um único perfurante fasciocutâneo, que é de tamanho moderado e razoavelmente estável. Esse tipo de retalho é direcionado para uso como um retalho livre. O retalho tipo C é baseado em múltiplos perfurantes pequenos que percorrem ao longo de um septo fascial. A artéria de suprimento está incluída dentro do retalho. Esse retalho pode apresentar uma base proximal ou distal, ou como um retalho livre. O retalho tipo D é osteomuscular fasciocutâneo baseado em múltiplos perfurantes pequenos semelhantes ao retalho tipo C, porém inclui também uma porção óssea e de músculo adjacente. Esse retalho pode apresentar uma base proximal ou distal em um pedículo ou ser usado para transplante de tecido microvascular (Fig. 24.6).

FIG. 24.6 Classificação de retalhos fasciocutâneos.

Retalhos perfurantes Os aperfeiçoamentos complementares na aplicação do retalho têm conduzido para o desenvolvimento de retalhos perfurantes. Os retalhos perfurantes têm evoluído a partir de retalhos musculocutâneos e fasciocutâneos sem levar músculo ou fáscia. Foi demonstrado que nem o músculo carregador de forma passiva nem o plexo vascular fascial profundo são necessários para a sobrevida do retalho.47 As vantagens dos retalhos perfurantes incluem a morbidade reduzida da área doadora, a versatilidade no desenho do retalho, a preservação muscular (menor déficit funcional) e uma melhor recuperação pós-operatória do paciente.48-51 As desvantagens dos retalhos perfurantes incluem a dissecção meticulosa, necessária para isolar os vasos perfurantes (resultando no aumento do período de cirurgia), a variabilidade da posição e do tamanho dos vasos perfurantes e a facilidade com que os vasos podem ser danificados.52-54 A nomenclatura dos retalhos perfurantes é confusa e muitas vezes incorreta. Os retalhos perfurantes foram designados de acordo com suas localizações (p. ex., retalho anterolateral da coxa), suprimento arterial (p. ex., retalho perfurante da artéria epigástrica inferior profunda) ou o músculo de origem (p. ex., retalho cutâneo das artérias perfurantes do músculo gastrocnêmio). Geddes et al. sugeriram a padronização da nomenclatura dos retalhos de perfurantes pela descrição de todos os retalhos de perfurantes de acordo com a artéria principal de origem.48 Nesse sistema, os retalhos cutâneos estão divididos em retalhos cutâneos ou retalhos de perfurantes musculocutâneos. Os retalhos cutâneos incluem aqueles descritos previamente como axiais, septocutâneos e fasciocutâneos (retalhos fasciocutâneos tipo A e B, de acordo com Mathes e Nahai). Os retalhos de perfurantes musculocutâneos são os retalhos fasciocutâneos tipo C de acordo com Mathes e Nahai, nos quais o pedículo

para o retalho perfurante é o dominante ou o pedículo principal para o músculo, com seu vaso perfurante passando através do músculo para a fáscia sobrejacente, tecido subcutâneo e pele. Considerando que o músculo é excluído do retalho, o retalho de perfurante é anatomicamente um retalho fasciocutâneo tipo C, embora seja confuso subclassificar esses retalhos de tal modo, e provavelmente seja melhor apenas considerar um retalho de perfurante como tal, não como um subtipo de um retalho fasciocutâneo. Existem muitos retalhos de perfurantes usados atualmente e outros que são de valor teórico. Conforme foi estudado rigorosamente por Taylor e Palmer, existem muitos vasos denominados perfurantes para cada angiossoma do corpo.55 Os sítios doadores de retalhos de perfurantes aceitáveis apresentam quatro características comuns: (1) suprimento sanguíneo adequado e previsível; (2) ao menos um vaso perfurante amplo (diâmetro ≥0,5 mm); (3) extensão suficiente do pedículo para a anastomose necessária, a não ser que o retalho seja usado como um retalho pediculado; (4) capacidade para fechar o sítio doador primeiramente. Os retalhos de perfurantes usados normalmente incluem o retalho de perfurante da artéria epigástrica inferior profunda, o retalho de perfurante da artéria glútea superior, retalho de perfurante da artéria toracodorsal, retalho anterolateral da coxa, retalho de perfurante do músculo tensor da fáscia lata e retalho de perfurante da artéria sural medial.47,48,56-59

Classificação das vísceras abdominais As vísceras abdominais não são classificadas facilmente; entretanto, para os objetivos de transposição de retalho ou de transplante de tecido microvascular, o cólon, o jejuno e o omento se enquadram convenientemente dentro do sistema de classificação muscular (Tabela 24.10). Para o transplante microvascular, o segmento do intestino (jejuno ou colón) é elevado em uma arcada vascular com um único vaso dominante, um padrão de circulação tipo I. Em circunstâncias excepcionais, onde um segmento mais longo do intestino se estende além do território vascular de uma arcada, duas arcadas devem ser incluídas para garantir a viabilidade desse segmento mais longo do intestino. Nesse caso, o padrão de circulação será tipo III (duas arcadas dominantes ou pedículos). É possível reconstruir o esôfago a partir da base da língua para o estômago com um segmento longo de jejuno, onde um pedículo é revascularizado no tórax superior ou pescoço e o segundo pedículo é mantido intacto. Outras utilizações do cólon ou do jejuno como retalhos foram para a reconstrução vaginal. Tabela 24.10 Classificação de retalhos das vísceras abdominais Retalho Tipo

Circulação-padrão Tamanho

Cólon

Intestino Tipo I

20-25 cm de extensão Diâmetro do lúmen de 8 cm

Jejuno

Intestino Tipo I

7-25 cm podem ser transferidos em um pedículo Diâmetro do lúmen de 3-5 cm

Omento Omento

Tipo III

Variável; até 40 × 60 cm

O omento pode ser determinado como um retalho de transposição nos vasos gastroepiploicos da direita ou da esquerda e é assim classificado como tendo um padrão de circulação tipo III. Em geral, o omento também é transferido por microcirurgia e pode ser usado para reconstruir uma ampla variedade de defeitos intraperitoneais, demonstrando possuir propriedades imunológicas e angiogênicas.60-62 Apesar da utilidade para a reconstrução, as complicações do sítio doador podem ser significativas, incluindo infecção da parede abdominal e hérnia.63,64 Com os avanços da cirurgia minimamente invasiva, a víscera abdominal pode ser coletada com sucesso pelo procedimento laparoscópico, dispensando a necessidade para uma incisão mediana ampla, proporcionando um resultado estético melhor e menor morbidade do sítio doador.65-67

Modificações dos retalhos Tem ocorrido ao longo dos anos um progresso considerável na aplicação clínica de retalhos musculocutâneos e musculares. Inúmeras modificações e aperfeiçoamentos, tanto na técnica como no projeto, foram descritas na busca contínua por melhores resultados na cirurgia reconstrutiva. Essas modificações incluem a expansão de

tecidos, retalhos de transposição segmentar, retalhos ósseos vascularizados, retalhos com base distal, retalhos de transposição reversa, retalhos combinados, retalhos tardios e retalhos pré-fabricados. O desenvolvimento de retalhos de tecidos especiais proporcionou aos cirurgiões a capacidade para restaurar a função motora, a sensibilidade e a estrutura óssea no defeito cirúrgico. Com o uso de tecidos complexos, tais como músculo inervado, omento, intestino, articulação, dedos, crista ilíaca e diversos ossos longos, o cirurgião pode produzir, de acordo com os conceitos de McDowell, “como o dedilhar de alguns acordes, em vez de muitos registros [...] reconhecíveis, novos, artísticos e plenamente aceitáveis, narizes, faces, queixos, pescoços, pernas e braços, em vez de porções e bolhas de tecidos transportados nessas áreas”.68

Expansão de tecidos Pele e tecido mole adjacente ao defeito são preferidos para o fechamento do defeito, tendo em vista a semelhança na cor da pele, textura e contorno. O projeto dos retalhos locais de avanço com frequência permitirá o uso de tecido adjacente, especialmente se houver excesso de pele na área doadora. Um retalho de avanço ou de rotação muitas vezes necessita de um recorte ou enxerto de pele no sítio doador. O tamanho do defeito ou a região circundante da lesão muitas vezes evita o uso de tecido adjacente, que com frequência não está disponível para o fechamento de feridas ou para a reconstrução de defeitos compostos. Nessas circunstâncias, a expansão de tecidos pode permitir o uso do tecido adjacente selecionado para a reconstrução. A expansão de tecidos é um método efetivo para aumentar o território cutâneo de retalhos faciais e músculos localizados superficialmente. Embora esse método seja utilizado mais comumente para aumentar o território do retalho cutâneo, o princípio de expansão de tecidos pode ser aplicado também a todos os tecidos moles, incluindo fáscia e nervo periférico. Neumann é responsável pela apresentação do primeiro relato recente dessa técnica em 1957.69 Posteriormente, Radovan descreveu o uso dessa técnica para a reconstrução de mama, em 1976.70 Tecnicamente, o expansor de tecidos é inserido sob a pele para proporcionar um mecanismo que possibilite o aumento das dimensões da pele e oferecer uma circunferência dérmica suficiente para projetar um retalho de transposição ou de avanço. Se for planejado um retalho fasciocutâneo, o expansor é colocado abaixo da fáscia profunda. Se for planejado um retalho musculocutâneo, o expansor é colocado abaixo da superfície profunda do músculo. O expansor não deve ser colocado diretamente abaixo do pedículo vascular dominante no seu ponto de entrada no território do retalho para evitar a lesão do pedículo durante o processo de expansão. Embora seja possível a expansão imediata da pele, a expansão prévia geralmente é realizada antes da elevação do retalho. Durante um intervalo de tempo determinado, normalmente 6 semanas a 3 meses, o expansor é preenchido com solução salina em intervalos semanais. Quando a quantidade de expansão estabelecida for alcançada, o expansor é removido e o território cutâneo do retalho modificado é conduzido para a reconstrução. A expansão segura dos tecidos depende de um julgamento cirúrgico no que diz respeito à sua utilidade para um problema específico. Os benefícios dos tecidos circundantes no local para a cirurgia reconstrutiva são bem reconhecidos; todavia, esse tecido frequentemente é lesado devido a sua proximidade do defeito cirúrgico ou traumático, impedindo a possibilidade de usá-lo. A falha da expansão de tecidos geralmente é atribuível à estabilidade inadequada da pele e associada ao tecido mole durante o processo de expansão. A falha do expansor é sinalizada pela deiscência da ferida, seguida pela exposição do expansor e infecção. Ao contrário da falha nas técnicas de transplante ou transposição de retalhos, a falha do expansor geralmente não está associada com o aumento da complexidade da ferida ou aos problemas do sítio doador.71,72

Retalhos de transposição segmentar Um músculo pode ser dividido em uma porção em continuidade com o pedículo vascular dominante, como um retalho de transposição. Foram descritas as técnicas de divisão muscular para preservar o tecido e a função. O músculo remanescente com sua origem e inserção é mantido para preservar a função. Alternativamente, a musculatura completa pode ser dividida e usada para cobrir dois defeitos de forma simultânea. Muitas vezes, apenas uma parte do músculo na proximidade do pedículo vascular dominante é elevado para o transplante microvascular. O território cutâneo também pode ser modificado e dividido em duas ilhas cutâneas separadas ou elevado com apenas um segmento do retalho muscular. Entretanto, o território cutâneo deve incluir conexões vasculares através dos vasos perfurantes musculocutâneos, a partir do retalho segmentar (Figs. 24.7, 24.8).

FIG. 24.7 Transposição do músculo segmentar do glúteo máximo. (A) Metade superior do glúteo máximo, arco para o sacro. (B) Metade inferior do músculo glúteo máximo.

FIG. 24.8 (A-E) Função preservando o projeto do retalho muscular.

O retalho musculocutâneo do latíssimo do dorso (ou grande dorsal) foi descrito como um músculo que pode

ser transferido de forma segmentar. Esse músculo apresenta uma bifurcação proximal estável em relação ao seu suprimento neurovascular, em uma subunidade lateral e medial. Por exemplo, na reconstrução do esôfago cervical, o retalho musculocutâneo do latíssimo do dorso (ou grande dorsal) pode ser dividido em porções de pele que podem ser usadas para revestimento e cobertura dérmica.15,28,73-75 A transferência do latíssimo do dorso (ou grande dorsal) por segmentação também tem sido utilizada na reanimação facial e para a cobertura de defeitos amplos de tecidos mole da extremidade inferior.76-78 A base para a divisão do músculo peitoral maior foi demonstrada por Tobin em 1985.79 Os músculos peitorais apresentam três subunidades neurovasculares segmentares: a clavicular, a esternocostal e a subunidade externa. Tais subunidades podem ser divididas cirurgicamente e transferidas de forma independente nos pedículos vasculares, a partir dos vasos torácicos laterais, mamários internos e toracoacromiais.80 A divisão do músculo peitoral maior em segmentos tem sido realizada quando a transferência segmentar de uma única porção do músculo peitoral, com base em um único ramo perfurante medial da artéria torácica interna for necessária para a reconstrução do pescoço e da parede torácica (Figs. 24.9, 24.10).81 O conceito de transposição segmentar de músculo permite o transplante de unidades neuromusculares independentes (segmentos de músculo inervado por um único fascículo de nervos).82

FIG. 24.9 (A,B) Transposição segmentar de retalho do músculo peitoral maior.

FIG. 24.10 Retalhos do músculo tibial anterior divididos para a transposição segmentar. (A) Retalho segmentar. (B) Retalho de avanço posterior. (C) Retalho de rotação anterior.

Osso vascularizado O osso é vascularizado através de fontes de tecido conjuntivo que constituem as superfícies endósteas e periósteas (Fig. 24.11). O suprimento sanguíneo complexo do osso é baseado nos vasos nutrientes penetrando o osso diretamente e através de conexões vasculares entre músculos e osso, especificamente onde o músculo apresenta uma fonte óssea ampla ou uma inserção. Os músculos com todos os cinco padrões de circulação apresentam conexões vasculares entre as fibras musculares e o periósteo. Todavia, a incorporação de osso vascularizado com o retalho de transposição geralmente não é viável, considerando que o ponto de entrada do pedículo vascular dominante no músculo determina o ponto de rotação do retalho. As inserções ósseas geralmente estão localizadas além do ponto de rotação. Um exemplo de um retalho ósseo rotacional é o enxerto ósseo radial vascularizado baseado nos ramos suprarretinaculares intercompartimentais 1,2 ou 4,5 da artéria radial, para a reconstrução do osso do carpo.83 Um outro exemplo de um retalho rotacional incluindo osso é o músculo peitoral maior com conexões vasculares periósteas para a quinta costela anterior no sítio de origem do músculo. Historicamente, esse procedimento era usado para a reconstrução da mandíbula irradiada.84

FIG. 24.11 Conexões vasculares do retalho ao osso.

O osso vascularizado é útil nos músculos adequados para o transplante microvascular ou naqueles músculos projetados para a transposição, quando as inserções vasculares para o osso são distais ao ponto de rotação. Os ossos mais comumente transferidos incluem a fíbula baseada na artéria fibular (ou peroneal) (Figs. 24.12, 24.13), crista ilíaca baseada na artéria circunflexa ilíaca profunda (Fig. 24.14), a escápula baseada nas artérias toracodorsal ou escapular circunflexa (Fig. 24.15) e rádio baseado na artéria radial.

FIG. 24.12 Retalho fasciocutâneo com osso vascularizado da fíbula.

FIG. 24.13 (A-G) Transplante microvascular da fíbula para a reconstrução da mandíbula.

FIG. 24.14 Retalho composto da artéria circunflexa ilíaca profunda. (A) Marcação. (B) Divisão da aponeurose oblíqua externa e identificação do pedículo. (C) Divisão da aponeurose oblíqua interna. (D) Liberação do tensor da fáscia lata (TFL). (E) Término da dissecção.

FIG. 24.15 Segmentos vascularizados independentes da escápula baseados nos pedículos circunflexos escapulares e pedículos toracodorsais. s, artéria subescapular; D, artéria circunflexa escapular; t, artéria toracodorsal; a, ramo arterial escapular.

O padrão de circulação para a escápula e o rádio é classificado de acordo com o retalho progenitor, que consiste do suprimento vascular e do componente do tecido mole associado (p. ex., retalhos escapulares e radiais do antebraço). Esses ossos sempre são transpostos como uma parte integral do retalho progenitor. A

fíbula e a crista ilíaca, entretanto, são transferidas com maior frequência apenas como osso, sem um componente de tecido mole. A classificação da crista ilíaca como um padrão vascular tipo I reflete sua dependência nos músculos adjacentes, bem como vasos ósseos diretos a partir da artéria circunflexa ilíaca profunda. A fíbula é classificada como tendo um padrão vascular tipo V, devido ao seu pedículo nutriente dominante dentro do osso proximal, a partir da artéria fibular e do segmento na origem dos pedículos periósteos ao longo da extensão óssea (pedículos-padrão segmentares). Esse padrão tipo V de circulação permite que as osteotomias sejam realizadas para separar o osso em segmentos distintos e vascularizados de forma independente (Tabela 24.11). Tabela 24.11 Classificação vascular dos ossos Osso Fíbula

Suprimento sanguíneo Artéria fibular (ou peroneal)

Crista ilíaca Artéria circunflexa ilíaca profunda

Tipo de retalho Va Ia

Escápula

Artérias toracodorsal ou escapular circunflexa Bb

Rádio

Artéria radial

Bb

a

Osso associado com retalho musculocutâneo.

b

Osso associado com retalho fasciocutâneo.

Alguns retalhos fasciocutâneos tipo A e tipo B podem ser elevados com o osso. A origem vascular do retalho proporciona também vasos nutrientes para os ossos adjacentes. Um segmento de osso pode ser incluído com o retalho fasciocutâneo ou da fáscia, quando projetado para transposição ou transplante microvascular (p. ex., retalho da fáscia temporoparietal e radial do antebraço).

Retalhos musculares funcionais A liberação da origem ou inserção do retalho de transposição muscular resultará na perda de função muscular. Entretanto, muitos dos retalhos musculares podem ser projetados tanto para a cobertura como para a transferência de músculos funcionais. Para a função ser preservada, o nervo motor deve ser preservado juntamente com o suprimento vascular dominante; o músculo deve ser reinserido a um novo osso ou tendão através de uma articulação; e o músculo deve exercer uma força direta em seu novo ponto de inserção. Músculos adequados para uso como retalhos de transposição ou transplante de tecidos compostos microvasculares, proporcionando tanto cobertura como função, incluem os músculos latíssimo, glúteo máximo (segmentar), grácil, gastrocnêmio e serrátil. A restauração da relação comprimento/largura do músculo original e o reparo do nervo motor para um nervo motor receptor adequado no sítio destinatário são essenciais para a restauração da função do músculo em seu novo local de inserção. O retalho do músculo latíssimo do dorso tem sido usado para: proporcionar movimento neodiafragmático para o reparo de hérnias diafragmáticas congênitas recorrentes; restaurar a função dos joelhos após a ressecção do mecanismo do quadríceps na extremidade inferior; restaurar o movimento do ombro e cotovelo na extremidade superior; e restaurar a função oral e nasal após a ablação de tumores da cabeça e do pescoço.85-88

Retalho sensorial Os nervos sensoriais específicos são identificados no território cutâneo de muitos retalhos disponíveis para a cirurgia reconstrutiva. Tanto os retalhos de transposição fasciocutâneos com os musculocutâneos podem ser indicados para incorporar o nervo sensorial na base do retalho. Se o nervo cutâneo não penetrar a base do retalho na proximidade do pedículo vascular, é possível também dividir o nervo sensorial durante a elevação do retalho e depois coaptar o nervo a um nervo sensorial adequado no sítio receptor. Os retalhos musculares com nervos motores intactos ou com reanastomose do nervo motor para os nervos sensoriais ou motores adequados no sítio receptor parecem reter uma sensibilidade protetora, possivelmente através de fibras nervosas de propriocepção. A manutenção da sensibilidade protetora é essencial para mãos, pés e outras áreas de sustentação de peso. Uma outra área comum na qual são usados o retalhos sensoriais é a cavidade oral, melhorando potencialmente a função oral pós-operatória.89-91 Harris et al. relatam que a

reconstrução de áreas de sustentação de peso deve proporcionar contorno adequado para o calçado normal, pele de espessura durável, sensibilidade protetora e ancoragem sólida para estruturas profundas a fim de resistir às forças de cisalhamento.92 Estudos demonstraram os benefícios da sensibilidade protetora para a reconstrução de tornozelo e calcanhar, ambos com retalhos rotacionais e por transferência de tecidos microvasculares.93-95

Retalhos combinados Dois retalhos musculares frequentemente compartilham uma fonte regional comum para suas veias ou artérias dominantes. Ambos os retalhos podem ser elevados simultaneamente e também transpostos como um retalho regional ou transplantados pela cirurgia microvascular baseada na veia ou artéria regional comum. Essa técnica permite um projeto de retalho com a capacidade para cobrir defeitos amplos ou o uso de dois ou mais retalhos para uma cobertura especializada. A artéria e a veia subescapular são uma fonte regional comum para os pedículos dominantes do retalho musculocutâneo ou do músculo latíssimo do dorso (ou grande dorsal), retalho do músculo serrátil anterior e retalho fasciocutâneo escapular; todos os três retalhos podem ser transpostos ou transplantados nessa única artéria e veia (Fig. 24.16). Clinicamente, o sistema subescapular oferece muitas variedades de retalhos combinados úteis.96,97 Outro exemplo é o retalho da região glútea e coxa, e um retalho musculocutâneo da região glútea inferior com uma extensão fasciocutânea.98-100 As características mais sutis de cada componente dos tecidos permitem ao cirurgião adaptar o retalho exatamente às especificações individuais do defeito. Os retalhos combinados foram divididos posteriormente em retalhos siameses, conjuntos e sequenciais.101 Os retalhos siameses apresentam múltiplos territórios de retalhos, dependentes de alguma junção física comum porém, cada um retém seu suprimento vascular independente. Os retalhos conjuntos apresentam múltiplos retalhos independentes, cada um com um suprimento vascular independente, porém ligados por um vaso fonte comum. Um retalho sequencial é definido como retalhos múltiplos independentes, cada um com um suprimento vascular independente ligado artificialmente por uma microanastomose.

FIG. 24.16 Modificação do retalho combinado. (A) Conexões vasculares comuns entre a artéria e a veia subescapular para o pedículo dominante dos retalhos do latíssimo do dorso, serrátio anterior e escapular. (B) Conexões vasculares comuns entre a artéria circunflexa ilíaca superficial e o retalho groin flap, e a artéria epigástrica e o retalho abdominal inferior.

Retalhos pré-fabricados e pré-laminados Pré-laminação de retalhos, um termo introduzido em 1994, envolve a manipulação cirúrgica de um retalho, que requer uma elevação parcial a completa do retalho e a sutura do mesmo para formar estruturas no sítio da reconstrução.102 Essa técnica pode incorporar também tecidos novos no território do retalho, estabelecendo um retalho multifacetado ou com múltiplas camadas. Quando essas estruturas estiverem cicatrizadas no sítio doador, é realizada a transposição ou o transplante do retalho. Com as linhas de sutura ou vários enxertos cicatrizados no momento da inserção do retalho, as reconstruções complexas são executadas teoricamente com menor risco de complicações no sítio receptor. Esse procedimento é realizado geralmente em retalhos para serem usados na reconstrução de cabeça e de pescoço. Baudet et al. e Pribaz et al. usaram técnicas de prélaminação no antebraço, para a reconstrução da porção central da face e da região nasal.103,104 Embora essa técnica seja útil, muitos cirurgiões reconstrutivos preferem ainda realizar procedimentos secundários após a inserção inicial bem-sucedida do retalho em vez da pré-laminação do retalho no sítio doador. Outra forma de manipulação de retalho é denominada pré-fabricação. A pré-fabricação proporciona um novo pedículo vascular dominante para estruturas destinadas ao transplante ou transposição subsequente. Artéria e veia adequadas são selecionadas e fixadas na fáscia ou no tecido subcutâneo no território do retalho planejado. Um pedículo amplo situado no músculo adjacente é usado com frequência. Um pedículo e um pequeno segmento muscular são elevados e inseridos abaixo do sítio do retalho proposto. Em 6 semanas, o retalho com base no novo pedículo vascular é elevado e transposto ou transplantado por microcirurgia. Essa técnica de pré-

fabricação nem sempre é confiável para se estabelecer um novo pedículo dominante para o território do retalho. Com as numerosas opções disponíveis para a seleção segura do retalho, essa técnica de pré-fabricação de retalho raramente é usada.105

Retalhos com base distal e retalhos de fluxo reverso Certos músculos podem ser elevados nos pedículos segmentares menores ou secundários. Os músculos com uma circulação tipo II podem ser baseados no pedículo menor (Tabela 24.12). Para executar esse procedimento, é necessário dividir o pedículo vascular dominante e transpor o músculo distalmente, com base no pedículo menor. No projeto de um retalho com base distal, é necessário considerar que os pedículos menores diferem em tamanho e localização, e dessa forma podem ser considerados não confiáveis. Sem um procedimento tardio estratégico prévio (divisão preliminar do pedículo dominante), apenas um segmento do músculo com base no pedículo menor terá sobrevida. Se a ferida que necessita de cobertura for traumática, o pedículo menor pode estar localizado na zona de lesão (ou seja, no terço distal da extremidade inferior). O procedimento tardio prévio do músculo pela divisão seletiva do pedículo vascular dominante proporcionará uma circulação muscular mais confiável e permitirá o uso do território cutâneo do músculo proximal se for planejado um retalho musculocutâneo.21 Tabela 24.12 Retalhos com base distal Abdutor do dedo mínimo Artéria tibial anterior Artéria dorsal do pé Músculo oblíquo externo Músculo gastrocnêmio Músculo grácil Músculo hemisóleo Artéria fibular Músculo fibular curto Artéria tibial posterior Músculo sóleo Músculo vasto lateral Músculo vasto medial

Os retalhos fasciocutâneos podem ser planejados como retalhos com base distal. A fáscia profunda recebe suprimento sanguíneo específico através dos pedículos cutâneos, septocutâneos e musculocutâneos. Por exemplo, os retalhos fasciocutâneos tipo B apresentam com frequência múltiplos pedículos localizados sequencialmente ao longo do eixo do septo intermuscular (p. ex., retalhos tibiais posteriores, tibiais anteriores e fasciocutâneos fibulares). Embora o território específico de um retalho fasciocutâneo tipo B possa ter um pedículo maior nas extremidades proximais, é possível estabelecer a base do retalho distalmente nos pedículos septocutâneos isolados. Da mesma forma, o território cutâneo de um retalho fascial tipo C em geral é baseado de modo específico em um pedículo perfurante, musculocutâneo amplo. A presença de um pedículo musculocutâneo isolado no retalho distal permitirá a transposição com base distal de um retalho fasciocutâneo. Embora os retalhos com base distal sejam denominados, com frequência, retalhos de fluxo reverso, nem todos os retalhos com base distal apresentam fluxo reverso, considerando que os vasos perfurantes se propagam radialmente nos tecidos subcutâneos. Assim, um retalho pode ser direcionado de tal forma que o fluxo seja anterógrado e ainda o pedículo possa ser evidenciado com base proximal, distal, medial ou lateral. Diversas utilidades clínicas dos retalhos de fluxo reverso foram descritas desde o relato inicial em 1995, incluindo o retalho fasciocutâneo radial do antebraço com base distal, o retalho interósseo posterior e o retalho reverso da primeira artéria dorsal metacarpiana usado na reconstrução da mão.106 O retalho radial do antebraço com base distal depende do fluxo retrógrado através do arco palmar profundo e das veias comitantes associadas com o ponto de rotação do retalho reverso no nível do pulso (Fig. 24.17). Exemplos de retalhos de fluxo reverso usados para a reconstrução das extremidades inferiores são os fasciocutâneos surais, baseados nos perfurantes a partir da artéria fibular, e os reversos do flexor longo do hálux, baseados no fluxo retrógrado através da artéria fibular.107,108

FIG. 24.17 Retalho radial do antebraço. (A) Arco-padrão para a fossa antecubital. (B) Arco reverso para a superfície palmar da mão.

Retalho de transposição reversa Um retalho muscular baseado em um pedículo menor é definido como um retalho com base distal. No entanto, é possível elevar a artéria e a veia regional com o retalho, incluindo ambos os pedículos maiores e menores. Com a secção da artéria e veia regional proximal e a transposição do retalho em uma direção distal oposta ao arco-padrão de rotação, é realizada uma transposição reversa. Essa modificação do retalho necessita de uma reversão do fluxo dentro da artéria e veia regional para o retalho, podendo afetar de forma adversa a perfusão distal devido à divisão de um vaso regional maior. Um retalho do músculo sóleo, baseado em pedículos menores a partir da artéria tibial posterior e veia localizada no terço distal da extremidade inferior, seria classificado como um retalho com base distal. Um exemplo de um retalho de fluxo reverso é o do músculo sóleo baseado no pedículo distal a partir da artéria e veia tibial posterior. O retalho é transposto distalmente com a secção proximal da artéria e veia tibial posterior. (Esse retalho foi substituído pelo retalho sural, conforme descrito no Vol. IV, Cap. 5.) Os músculos tipo V apresentam dois arcos de rotação. O arco-padrão é baseado no seu pedículo vascular principal (ou seja, artéria toracodorsal e veias comitantes para o músculo latíssimo do dorso, e artéria toracoacromial e veias comitantes para o músculo peitoral maior). O segundo arco de rotação é baseado em uma série de pedículos secundários que oferecem um arco reverso de rotação (ou seja, intercostal posterior e artérias lombares e veias comitantes para o músculo do latíssimo do dorso, e ramos da artéria mamária interna e veias comitantes para o músculo peitoral maior). O arco reverso de rotação para o músculo latíssimo do dorso foi descrito por Bostwick et al. em 1980.109 O uso do retalho do músculo latíssimo do dorso demonstrou ser um método confiável de fechamento para feridas complexas das costas em pacientes com exposição da medula espinhal ou instrumentação vertebral exposta.110 Um retalho fasciocutâneo direto (tipo B) pode ser projetado como um retalho de fluxo reverso. Após um pedículo regional dominante para o retalho ser seccionado, o retalho é elevado com o pedículo dominante seccionado para transposição na direção oposta a partir da origem do pedículo dominante dividido. O suprimento sanguíneo do retalho dependerá do fluxo reverso em seu pedículo principal. Por exemplo, após a secção da artéria e veia radial proximal, o retalho radial do antebraço pode ser elevado com sua artéria radial e veias comitantes, e transposto distalmente para a mão como um retalho reverso (Fig. 24.18).

FIG. 24.18 Modificação do retalho fasciocutâneo de transposição reversa. (A) Retalho radial do antebraço. (B) Transposição do retalho distal baseada no fluxo reverso.

Em um retalho tipo B, a fonte regional proximal para um pedículo septocutâneo pode ser seccionada e o retalho e seu pedículo vascular regional podem ser rotacionados como um retalho de transposição reversa. Essa técnica requer também a reversão de fluxo no pedículo regional. Em consequência, os pedículos dominantes para a perna (artéria tibial anterior e veias comitantes, artéria tibial posterior e veias comitantes, e artéria fibular e veias comitantes) podem ser divididos de forma proximal para o ponto de entrada do pedículo dominante no território do retalho fasciocutâneo. Os ramos septocutâneos a partir das fontes dominantes de fluxo sanguíneo para a perna podem ser mantidos e servir como uma base para o projeto de um retalho de transposição reversa para a cobertura distal de feridas da perna.

Retalhos venosos Um retalho venoso é definido como um retalho composto de pele, tecido subcutâneo e outros tecidos, tais como nervo, tendão e osso, que utiliza uma veia subcutânea para o influxo arterial e escoamento venoso. Nakayama et al., em 1981, descreveram inicialmente esses retalhos.111 Foram identificados três tipos de retalho venoso (Fig. 24.19).112 Tipo I: é um retalho venoso unipediculado; uma única veia cefálica é o único condutor para perfusão e drenagem. Esses retalhos podem apresentar base proximal ou distal. Tipo II: é um retalho venoso bipediculado com uma veia de entrada (extremidade caudal), bem como uma de saída (extremidade cefálica) do retalho. O fluxo sanguíneo se dá a partir da extremidade caudal para a cefálica. Tipo III: é um retalho venoso arterializado, perfundido por uma artéria proximal e drenado por uma veia distal. Esses retalhos tiveram sucesso na reconstrução da mão. Existe uma limitação na disponibilidade de retalhos finos, pequenos, com influxo arterial definido e escoamento venoso. Dessa forma, quando os retalhos locais não estão disponíveis, os retalhos livres venosos arterializados oferecem uma boa solução para a bem-sucedida reconstrução de tecidos moles (Fig. 24.20).113

FIG. 24.19 Classificação de retalhos venosos. (A) Tipo I. (B) Tipo II. (C) Tipo III.

FIG. 24.20 (A-H) Retalho venoso do polegar.

Transplante de tecidos compostos microvasculares Com a capacidade para reparar vasos com menos de 2 mm de diâmetro, torna-se evidente que é possível realizar o transplante microvascular. O transplante de tecidos compostos microvasculares foi denominado retalho livre, pois o tecido é transplantado de uma parte do corpo para outra. Considerando que os retalhos são planejados atualmente nos pedículos vasculares, o transplante de tecidos de compósitos, a partir do sítio doador para um sítio distante, é possível pelo restabelecimento da circulação do retalho através da anastomose dos pedículos venosos e arteriais do retalho para vasos receptores adequados na proximidade do defeito. A anastomose confiável de vasos com diâmetros do lúmen externo de 0,5-2 mm é possível com taxas de patência de 95% ou superiores.114 A capacidade para transplantar um retalho para um sítio distante elimina a necessidade para selecionar um retalho com um arco de rotação que alcança o defeito. O cirurgião desse modo está apto a transferir o tecido composto pela conformidade do retalho para a cobertura do defeito em vez da proximidade do defeito. Essa técnica é mais adequada para os músculos tipo I, II e V, considerando a natureza

dos pedículos. Os músculos comuns transferidos incluem o latíssimo, reto abdominal, grácil e serrátil. Os retalhos fasciocutâneos e perfurantes comuns transferidos incluem o retalho lateral do braço, retalho anterolateral da coxa, retalho perfurante da artéria epigástrica inferior profunda e retalho da artéria epigástrica inferior superficial. Uma anastomose microvascular usada como parte de um retalho rotacional é denominada supercarregada. Supercarregar é um método que possibilita aumentar o suprimento sanguíneo para um retalho pediculado amplo que pode se estender além do território de um único pedículo. Por exemplo, o TRAM pode ser supercarregado pela anastomose dos vasos epigástricos inferiores para os vasos toracodorsais na axila.115,116

Aplicação do retalho Independentemente de um problema clínico ser considerado simples ou difícil, a abordagem tradicional tem sido utilizar a escada da reconstrução para orientar a reconstrução cirúrgica (Fig. 24.21). A escolha de opções reconstrutivas varia de simples a complexas.

FIG. 24.21 Escada da reconstrução.

O conceito de escada reconstrutiva foi proposto para estabelecer prioridades para a seleção da técnica baseada na sua complexidade e nos requisitos do defeito para o fechamento seguro da ferida. Essa escada reconstrutiva proporciona uma abordagem sistemática para o fechamento da ferida, enfatizando a primeira seleção de técnica simples e posteriormente de técnica complexa, dependendo do arrevesamento e dos requisitos do local da ferida. O fechamento direto representa a técnica mais simples e mais bem definida, podendo ser impedido pelo tamanho da ferida ou pelas consequências de tensão da ferida no sítio de fechamento, resultando no desalinhamento de tecidos adjacentes. Quando isso ocorre, é necessária a introdução de uma técnica de fechamento mais complexa, tal como um enxerto de pele que usa uma porção de pele distante para a cobertura do defeito. As técnicas mais simples, incluindo enxertos de pele e retalhos locais, podem permitir o fechamento do

defeito. Entretanto, essas técnicas não podem proporcionar resultados ideais em termos de forma e função. O procedimento mais complexo alcança com frequência resultados superiores. Os objetivos de forma e função podem ser atingidos de maneira mais adequada por abordagens mais complexas, incluindo retalhos regionais ou distantes, expansão de tecidos e transplante microvascular. Um novo paradigma, o triângulo reconstrutivo, é mais apropriado à luz de opções mais sofisticadas disponíveis atualmente (Fig. 24.22). Isso enfatiza a seleção de uma técnica que alcança seguramente uma reconstrução bem-sucedida e restaura forma e função. O aumento da experiência tem conduzido ao uso seguro de técnicas, tais como a transposição de retalhos, o transplante de tecidos compostos microvasculares e a expansão de tecidos. O cirurgião deve considerar agora o triângulo reconstrutivo para selecionar a técnica ideal a fim de obter os objetivos reconstrutivos pré-determinados sem complicações do sítio doador. Uma abordagem alternativa é o elevador para reconstrução proposto por Gottlieb e Krieger.117 Essa abordagem estabelece o procedimento para a escolha da base mais apropriada, a partir da qual seja selecionada a nossa reconstrução, de acordo com os requisitos específicos do paciente, da ferida e das circunstâncias; para alguns pacientes, a escolha de uma reconstrução mais complexa, apesar de ser um processo mais simples, atingiria o fechamento da ferida.

FIG. 24.22 Triângulo da reconstrução.

A segurança na cirurgia reconstrutiva geralmente é dimensionada em termos de sucesso imediato da cobertura da ferida ou reconstrução do defeito. Com a identificação de pedículos vasculares específicos para músculo e fáscia, a confiabilidade do retalho melhora significativamente. Entretanto, com a introdução de retalhos de perfurantes, estamos liberados dessas restrições, utilizando apenas o tecido necessário para a reconstrução, sem sacrificar o tecido não desejado simplesmente pelo fato de esse tecido atuar como um transportador para o suprimento sanguíneo. Retalhos de músculos seguros e confiáveis, ou retalhos musculocutâneos e faciais ou fasciocutâneos, e retalhos de perfurantes foram descritos para uso em todas as áreas do corpo. Quando o projeto é baseado adequadamente no território vascular definido de seus pedículos vasculares, a maioria dos retalhos sobrevive à transposição para um defeito dentro do arco de rotação do retalho-padrão. Certas situações reduzem a segurança do retalho. A perda de retalho pode ocorrer quando o defeito está localizado além do arco-padrão de rotação, causando tensão excessiva no pedículo vascular. O tamanho do defeito, além do território vascular do pedículo do retalho, pode resultar no aumento inadequado nas dimensões do retalho ou na tensão excessiva do retalho no sítio de inserção. A seleção de um retalho com a localização de um pedículo na área de lesão ou o uso de um retalho em pacientes com comprometimento vascular preexistente pode resultar em fracasso. As modificações de retalho, incluindo desenhos de retalhos baseados em porções segmentares e distais, estão sujeitas também ao comprometimento vascular e perda potencial. Desse modo, a segurança do retalho é determinada com base no projeto anatômico e na avaliação dos requisitos reconstrutivos específicos. A técnica selecionada para o fechamento do defeito ou a reconstrução composta deve restaurar a forma normal ou o contorno. A expansão de tecidos é ideal para esse propósito, considerando que a pele e o tecido mole próximos ao defeito apresentam a mesma espessura, textura e cor. Infelizmente, com frequência esse tecido está danificado ou indisponível para uso tanto como um retalho de avanço quanto de transposição. Embora a experiência inicial com o retalho musculocutâneo tenha resultado no fechamento seguro da ferida,

o volume excessivo muitas vezes foi inestético. Frequentemente, um retalho muscular com enxerto de pele proporciona uma restauração superior de forma no sítio receptor. Com a identificação das unidades fasciais e musculares para o projeto tanto como uma transposição-padrão, como um transplante microcirúrgico de tecidos compostos, o cirurgião pode selecionar o retalho mais adequado para o fechamento do defeito. Quando for necessária uma “ilha” de pele, o cirurgião pode selecionar um retalho com uma camada fina de tecido subcutâneo sobrejacente (ou seja, retalho radial do antebraço) ou pode planejar uma revisão secundária do retalho por excisão ou lipoaspiração para melhorar o contorno dos retalhos mais espessos. A disponibilidade de numerosos sítios doadores de retalhos permite a seleção de uma técnica para a transposição-padrão ou o transplante de tecidos compostos microvasculares que oferecem uma restauração melhor da forma para a cobertura do defeito ou para a reconstrução composta. A preservação da forma da área doadora também deve influenciar a seleção do retalho. Quando possível, a área doadora deve ser fechada diretamente. O uso de um retalho que exija um enxerto de pele para o fechamento do sítio doador é justificável quando o retalho coletado for evidentemente superior aos retalhos alternativos para o defeito. Se for possível escalonar a elevação do retalho com a inserção preliminar de um expansor tecidual, pode ser efetuado um aumento nas dimensões do retalho cutâneo para a cobertura do defeito e do território de pele adjacente, para o fechamento direto do sítio doador. Embora a forma final no sítio receptor do retalho permaneça a base primária para a seleção do retalho, a deformidade devido à perda de forma no sítio doador deve ser evitada quando possível. Desse modo, o equilíbrio reconstrutivo é obtido com a seleção de uma fonte de tecido para restaurar o defeito ou a deformidade, enquanto a forma e a função são preservadas no sítio doador. Em um esforço para minimizar a morbidade do sítio doador, muitos cirurgiões avaliaram a utilidade da coleta endoscópica de retalhos musculares. Foram descritas técnicas minimamente invasivas de diversos músculos. Essas técnicas incluem os músculos latíssimo do dorso, reto abdominal, grácil, reto femoral, oblíquo externo e gastrocnêmio. Em adição ao uso da técnica endoscópica para dissecção de músculos, frequentemente são utilizadas as técnicas laparoscópicas para coletar o omento. Esse procedimento representa um avanço significativo, considerando que os benefícios incluem a redução do processo de cicatrização, menos dor no período pós-operatório e teoricamente menor morbidade no sítio doador.118-120 A estabilidade do fechamento representa a consideração a longo prazo mais importante na área de cobertura do defeito. Por essa razão, a cobertura com o retalho frequentemente é selecionada apesar da simplicidade dos enxertos de pele de espessura parcial para alguns defeitos que posteriormente podem exigir um retalho em uma data posterior. Com a seleção de um projeto de retalho confiável e o uso de uma técnica-padrão para transposição ou transplante microvascular, a cobertura com o retalho proporcionará estabilidade no sítio do defeito sem aumentar necessariamente o risco ou o comprometimento da segurança. Funções especializadas no sítio de reconstrução incluem o crescimento de cabelos ou pelos, sensibilidade, suporte esquelético (osso) e movimento (animação). As técnicas de reconstrução devem considerar esses requisitos especializados. Embora a restauração da função possa exigir procedimentos escalonados, especialmente para um defeito composto, muitas vezes são possíveis todos os requisitos funcionais com um único procedimento. A expansão tecidual pode aumentar a área de superfície de uma porção de pele específica, especialmente o couro cabeludo. A inserção de um expansor tecidual na borda do defeito não interromperá a inervação sensorial do retalho planejado. Tanto a pele como os tecidos subcutâneos do retalho de transposição e de avanço expandido oferecerão as condições adequadas para o fechamento do defeito, resultando em forma e função ideais. Os retalhos de território cutâneo, se forem baseados em músculos, fáscia ou perfurantes, não proporcionarão sensibilidade normal, a menos que um nervo cutâneo específico para esse território seja incorporado no projeto do retalho. Com a exceção de defeitos localizados em superfícies de sustentação de peso e em áreas de função especializada, incluindo a mão, face e a cavidade oral, o retalho sensorial inervado não é decisivo para a estabilidade e função. Nas áreas de sustentação de peso, onde as funções sensoriais e motoras permanecem intactas, exceto na região do defeito, um retalho bem vascularizado sem volume excessivo geralmente oferece uma cobertura estável e restaura a função. Todavia, um retalho bem vascularizado não proporcionará restauração funcional para defeitos localizados em áreas de sustentação de peso onde a função sensorial estiver completamente ausente. Por exemplo, a cobertura com retalho de um defeito causado por úlcera de pressão associado com cirurgia da medula espinhal (ou coluna vertebral) estará condicionada a uma ulceração recorrente, a menos que seja instituído um programa coordenado de educação do paciente e prevenção de

lesões decorrentes de pressão em áreas de apoio. Para a preservação funcional, podem ser necessários esforços para planejar um retalho neurossensorial pela incorporação de um nervo sensorial no território cutâneo do retalho ou por meio de enxertos de nervos interferentes após a transposição ou transplante do retalho. A restauração do suporte esquelético é essencial para a restauração funcional na cabeça, tórax e extremidades. O cirurgião pode oferecer a cobertura com retalho seguida pela reconstrução esquelética escalonada ou proporcionar simultaneamente tanto o retalho como o osso vascularizado. Estudos da anatomia vascular humana relativos aos projetos de retalhos demonstraram conexões aos ossos adjacentes em muitas regiões do corpo. Desse modo, tanto os retalhos musculares como os faciais apresentam pedículos vasculares com ramos de nutrientes diretos ou provenientes dos periósteos para o osso. Embora os materiais protéticos sejam usados com segurança juntamente com os retalhos, o osso vascularizado é preferido, especialmente para a reconstrução de ossos longos e mandíbula. Todavia, as técnicas de enxerto-padrão ósseo são confiáveis também, especialmente se for oferecida uma cobertura estável com retalho. Técnicas envolvendo osteotomia e alongamento ósseo permitirão com frequência a restauração esquelética, especialmente se a cobertura estável da ferida for proporcionada por meio da cobertura com o retalho. Considerando a complexidade do projeto do retalho quando é incluído o osso vascularizado, prefere-se o transplante composto microvascular de retalhos em vez dos retalhos de transposição regional com osso vascularizado. Quando for planejado o uso de um osso vascularizado, devem ser evitadas a instabilidade óssea do sítio doador e a perda associada de forma e função. A restauração da função muscular no sítio de reconstrução também pode ser necessária. Após a liberação de sua origem ou inserção, o retalho muscular não executará mais sua função pretendida. No entanto, a técnica com retalhos pode incluir a preservação do nervo motor para o retalho muscular. A preservação da inervação do nervo motor, juntamente com o restabelecimento da origem muscular, inserção ou ambos, pode manter a tensão muscular através da região do defeito. Quando os retalhos musculares regionais ou locais não estiverem disponíveis, pode ser transplantado um músculo distante por técnicas microvasculares que incluem a coaptação do nervo motor do músculo com um nervo motor receptor adequado no sítio receptor. A seleção adequada de músculos do sítio doador de tamanho e forma apropriados pode restaurar a função muscular na região do defeito. A preservação no sítio doador representa um aspecto importante, principalmente com o uso de um retalho muscular ou um retalho ósseo vascularizado. Um músculo de determinada região não deve ser usado se grupos musculares adjacentes estiverem ausentes ou lesados, em especial se for viável transplantar por microcirurgia um retalho distante. Quando possível, são preconizadas as técnicas preservadoras de funções para a transposição muscular. Frequentemente, é possível usar um retalho muscular segmentar baseado em um pedículo vascular confiável que permita a preservação do músculo remanescente com origem e inserção intactas.

Vantagens e desvantagens de retalhos musculares e musculocutâneos A seleção do método reconstrutivo mais apropriado pode ser difícil. Deve ser realizada uma análise cuidadosa de todas as possibilidades dos métodos de reparo disponíveis e as vantagens e desvantagens de cada técnica devem ser avaliadas adequadamente. As vantagens dos retalhos musculares ou musculocutâneos incluem os seguintes aspectos: 1. Os pedículos vasculares são específicos e confiáveis. 2. O pedículo vascular muitas vezes está localizado fora da região do defeito cirúrgico, o que pode ser particularmente importante para as feridas com uma zona extensa de lesão além da ferida atual (p. ex., após irradiação ou trauma). 3. O músculo proporciona volume para defeitos extensos, profundos, e acolchoamento muscular protetor para as estruturas vitais expostas (p. ex., tendões, nervos, vasos, ossos e próteses). 4. O músculo é maleável e pode ser manipulado (p. ex., dobrado sobre si mesmo) para produzir a forma ou o volume pretendido. 5. O músculo vascularizado de forma adequada é resistente à inoculação e à infecção bacteriana.121 6. A reconstrução pelo uso de retalhos musculocutâneos ou musculares é com frequência um procedimento de um estágio. 7. A restauração de função, motora ou sensorial, é possível com certos retalhos. 8. A confiabilidade e disponibilidade de retalhos musculocutâneos e musculares tornam esses elementos uma alternativa excelente de reconstrução, quando a decisão para eleger o método de escolha para um defeito

específico está indisponível ou se apresenta de forma inadequada. As desvantagens dos retalhos musculocutâneos e musculares incluem as seguintes especificações: 1. O defeito do sítio doador pode manifestar a perda de algum grau de função. 2. O defeito da área doadora pode ser esteticamente indesejável. 3. A reconstrução com retalhos musculocutâneos ou musculares pode proporcionar volume excessivo, deixando um resultado esteticamente inaceitável. 4. Os retalhos musculocutâneos ou musculares podem atrofiar com o passar do tempo, fracassando no oferecimento de cobertura adequada. 5. A remoção do retalho musculocutâneo ou muscular pode resultar em deformidades de contorno no sítio doador. A preservação de função pode ser extremamente importante quando músculos indispensáveis são usados como retalhos. As técnicas de preservação de função envolvem geralmente a transposição de parte do músculo sem interromper por completo a origem ou inserção do músculo doador. Por exemplo, a transposição da metade superior do músculo glúteo máximo para a cobertura da região sacral no paciente ambulatorial pode ser realizada sem a perda de extensão da coxa ou da estabilidade do quadril, considerando que a parte remanescente do glúteo máximo apresenta-se funcionalmente intacta.122,123

Vantagens e desvantagens dos retalhos da fáscia, fasciocutâneos e perfurantes As vantagens e desvantagens desses retalhos são um pouco semelhantes àquelas dos retalhos musculares, embora existam algumas exceções. As vantagens incluem os seguintes aspectos: 1. Esses retalhos são finos e maleáveis ou flexíveis. 2. O suprimento sanguíneo é confiável e eficiente (ou robusto). 3. A morbidade do sítio doador é mínima no que diz respeito à função. 4. Esses retalhos preservam os músculos. 5. Os retalhos em questão apresentam a capacidade de restaurar sensações ou sensibilidades. 6. Existem muitos sítios doadores potenciais. As desvantagens dos retalhos da fáscia, fasciocutâneos e perfurantes incluem as seguintes especificações: 1. Existe uma ausência de volume para os defeitos profundos. 2. Esses retalhos são tecnicamente mais desafiadores (dissecção de pedículos; muitos necessitam de anastomose microvascular ou ao menos técnicas microvasculares). 3. Existem limitações de tamanho. 4. O arco de rotação algumas vezes é limitado, embora com frequência seja melhor do que o retalho muscular semelhante, devido ao pedículo mais longo. 5. O sítio doador pode exigir o fechamento com enxerto de pele, resultando na deformidade do sítio doador.

Transposição de retalhos e arco de rotação Numerosos retalhos pediculados estão disponíveis para transposição a fim de cobrir ou reconstruir defeitos específicos. Quando um retalho de transposição é elevado, o pedículo vascular dominante é preservado. Um fator que pode impedir a transposição bem- sucedida do retalho é seu arco de rotação. O arco de rotação de um músculo é determinado pela dimensão da elevação do músculo a partir do seu leito anatômico, bem como a capacidade do músculo para alcançar as áreas adjacentes sem haver desvascularização. A mobilidade de um músculo depende do número de pedículos vasculares e da localização do pedículo vascular dominante relativo à origem ou à inserção do músculo (Fig. 24.23). A área coberta pelo arco de rotação varia entre os indivíduos. Com base na extensão do retalho para o ponto de rotação distal e na extensão do pedículo vascular, um arcopadrão de rotação seguro é mensurado para cada retalho. Um arco de rotação modificado também está disponível, com base nos aperfeiçoamentos no projeto e nas modificações específicas do retalho. O conhecimento exato do arco-padrão de rotação seguro e modificado é necessário para evitar a perda do retalho por conta da tensão excessiva ou do dano ao pedículo, a partir da dissecção excessivamente zelosa.

FIG. 24.23 Arco de rotação do músculo (músculo latíssimo do dorso).

Em geral, o arco de rotação é inversamente proporcional ao número de pedículos vasculares. Se um músculo tiver um grande número de pedículos, geralmente terá um arco de rotação limitado. Os músculos tipo IV, tais como o sartório e o tibial anterior, são exemplos de músculos com múltiplos pedículos vasculares segmentares e arcos de rotação limitados. Da mesma maneira, o local do pedículo vascular dominante relativo à origem e à inserção do músculo determina consideravelmente o arco de rotação. Quanto mais próximo o pedículo vascular dominante é da origem ou da inserção do músculo, maior o arco de rotação. Os pontos de rotação para os músculos tipos I, II, III e V costumam estar localizados em uma extremidade ou terço proximal do músculo. Por exemplo, os músculos tipo V, tais como o peitoral maior e o latíssimo do dorso, apresentam seus principais pedículos vasculares próximos de suas inserções, também apresentando proporcionalmente um arco de rotação amplo. Certos músculos, tais como os músculos tipo V, apresentam dois arcos de rotação. O primeiro arco de rotação está baseado no suprimento sanguíneo dominante, enquanto o segundo está baseado nos pedículos vasculares segmentares secundários. O arco de rotação reversa refere-se ao grau de transposição de um retalho com base nos seus pedículos vasculares segmentares secundários. O arco-padrão de rotação do retalho fasciocutâneo é determinado pela dimensão da elevação da fáscia profunda, a partir de sua posição anatômica normal para alcançar os defeitos adjacentes. O ponto de rotação é baseado na área de entrada do pedículo vascular dominante na fáscia. O retalho fasciocutâneo ou da fáscia é elevado para o ponto de entrada do pedículo do retalho; a fáscia e a pele sobrejacente distal desse ponto são rotacionadas em direção ao defeito. Em um retalho fasciocutâneo tipo A, o retalho é elevado para incluir o pedículo cutâneo direto. Um arco-padrão de rotação é atingido com o retalho elevado para a borda proximal do território do retalho. Quando o retalho é planejado como uma “ilha” de pele fascial, o arco de rotação pode ser aumentado com a dissecção proximal do pedículo direcionado axialmente. O arco-padrão de rotação para um retalho tipo B é determinado pela elevação do retalho no ponto de entrada do pedículo septocutâneo na base do retalho. A dissecção proximal do pedículo septocutâneo para a sua junção com os vasos regionais aumentará o arco de rotação do retalho. Esse aumento de extensão, entretanto, muitas

vezes não é tão grande como aquele que pode ser obtido com um retalho tipo A, considerando que a dissecção do pedículo geralmente é profunda entre os grupos musculares, o que impede um arco de rotação mais amplo. O retalho tipo C é elevado para a superfície muscular no sítio de penetração do pedículo musculocutâneo. A dissecção do pedículo através do músculo para os vasos regionais aumentará o arco de rotação. É possível também incluir um segmento de músculo no desenho do retalho fasciocutâneo. Embora o retalho perfurante possa ser considerado um retalho fasciocutâneo tipo C, provavelmente é melhor considerá-lo uma entidade separada. O arco de rotação de um retalho perfurante é dependente de forma exclusiva da extensão do pedículo vascular, não depende do músculo ou da fáscia. Por essa razão, os retalhos de perfurantes pediculados são muito versáteis.

Prognóstico de território dérmico O uso bem-sucedido da pele sobrejacente a um retalho musculocutâneo é dependente do suprimento sanguíneo da pele. Os avanços no estudo anatômico do sistema vascular cutâneo revelaram três padrões vasculares distintos suprindo a pele: vasos cutâneos diretos, específicos na gordura subcutânea que percorre em paralelo à superfície da pele; perfurantes musculocutâneos, que surgem a partir do músculo subjacente; e vasos fasciocutâneos, que surgem a partir da vasculatura e se estendem através dos espaços intermusculares na fáscia sobrejacente. O principal suprimento sanguíneo para a pele varia por região. A pele recobrindo os músculos lisos e amplos do tronco (p. ex., o latíssimo do dorso) apresenta uma grande dependência das artérias perfurantes musculocutâneas. A pele recobrindo os músculos estreitos, finos (p. ex., o grácil), depende de forma ampla dos vasos perfurantes fasciocutâneos. Cada artéria perfurante musculocutânea alimenta um determinado território de pele. Saint Cyr denominou essa unidade de perforasome.124 Pode haver muita sobreposição, dependendo do sistema vascular de interconexão da pele. Pela avaliação desse sistema vascular, o cirurgião pode projetar com segurança o território de pele do retalho. Todos os músculos, com exceção do grupo tipo I, exigem a secção dos pedículos vasculares para a transposição do retalho. Os músculos com padrões tipo II ou tipo IV exigem a secção de pedículos segmentares ou menores para a elevação do retalho. Desse modo, pode comprometer o território de pele correspondente. Os músculos tipo III apresentam dois pedículos vasculares amplos surgindo a partir de fontes vasculares separadas. A pele total recobrindo o músculo muitas vezes sobrevive em qualquer um dos dois pedículos. Os músculos tipo V são o mais versáteis, pois as “ilhas” de pele podem ser baseadas em qualquer pedículo dominante proximal ou pedículos segmentares secundários. Os músculos tipo I são confiáveis, pois o suprimento sanguíneo sustenta toda a pele sobrejacente. Em geral, cada músculo superficial supre a pele estendida diretamente sobre ele e o território de pele pode ser expandido com segurança 3-4 cm além das bordas do músculo subjacente. A pele adicional é sustentada por várias redes anastomóticas nos tecidos subcutâneos. Em certos pacientes, parece haver um grau de distribuição axial nas perfurantes musculocutâneas que realizam a anastomose com os vasos cutâneos. Essa disposição anatômica possibilita um território de pele mais amplo e uniforme para ser elevado com segurança. Por exemplo, no retalho musculocutâneo epigástrico inferior profundo e estendido descrito por Taylor et al. em 1983, certos perfurantes musculocutâneos paraumbilicais, a partir da artéria epigástrica inferior, percorrem a área superolateral na linha dos espaços intercostais, realizando a anastomose com os ramos cutâneos laterais do sistema intercostal.125 Esse ajuste permite que a “ilha” de pele se estenda sobre a margem costal em direção à ponta da escápula. Gottlieb et al. declararam que a “ilha” de pele desse retalho pode estender-se tanto quanto a linha axilar posterior, uma distância considerável a partir das bordas do músculo subjacente.126 As modificações e aperfeiçoamentos no retalho musculocutâneo prosseguem e certamente serão descobertos vários outros territórios de pele estendida, sustentados pela anastomose intrincada dos sistemas cutâneos, musculocutâneos e fasciocutâneos.

Seleção de retalhos musculares e musculocutâneos específicos Após a tomada de decisão para usar um retalho muscular ou musculocutâneo, deve ser escolhido o músculo específico. Os parâmetros gerais usados para auxiliar na seleção de um músculo incluem os seguintes aspectos: 1. Preferencialmente, o músculo deve estar adjacente ao defeito.

2. O músculo deve ser de tamanho e volume suficientes para cobrir o defeito. O projeto final do retalho deve ocorrer somente após a definição completa do defeito. Quando houver necessidade de exposição de tumor ou de debridamento de ferida, o defeito com frequência é muito maior e mais profundo do que o previsto inicialmente. Com a elaboração do retalho após o debridamento, podem ser evitados erros dispendiosos na cobertura do defeito. Se o defeito for instável ou as margens estiverem indefinidas (patologia do tumor não disponível), é justificável o curativo especial da ferida ou a cobertura temporária com enxerto de pele. Devese considerar também que uma quantidade significativa de atrofia ocorre se a origem, a inserção ou o nervo motor estiver rompido. 3. O músculo deve ser dispensável. Em geral, existem músculos sinérgicos que podem compensar a perda do músculo selecionado, de modo que o sítio doador não seja prejudicado. Todavia, se não houver a disponibilidade de grupos musculares sinérgicos, devem ser empregadas quaisquer técnicas para preservar a função do músculo doador (p. ex., a divisão muscular) ou selecionar um músculo diferente. 4. A condição do pedículo vascular que sustentará o retalho proposto deve ser identificada no período préoperatório. A arteriografia seletiva deve ser considerada se houver um histórico de cirurgia anterior na proximidade do pedículo vascular do retalho muscular proposto ou se for observada paralisia muscular no exame físico. A divisão prévia do nervo motor também pode incluir a ligação do pedículo vascular. Exemplos de situações clínicas quando a arteriografia é especialmente útil incluem a avaliação da artéria sural (gastrocnêmio) após cirurgia do joelho, da artéria cervical transversa (trapézio) após cirurgia de pescoço e ombro, e da artéria toracodorsal (latíssimo do dorso) após cirurgia axilar.127 5. O defeito do sítio doador deve ser considerado cuidadosamente. Alguns pacientes não aceitam o uso de um enxerto de pele no sítio doador e certos músculos são mais susceptíveis do que outros para exigir enxertos para o fechamento. Do mesmo modo, alguns pacientes preferem um sítio de cicatriz a outro (p. ex., a cicatriz abdominal do TRAM versus a cicatriz das costas do retalho do latíssimo do dorso na reconstrução da mama). 6. O território cutâneo do retalho proposto deve ser de tamanho suficiente e de textura aceitável. A pele coletada deve apresentar uma compatibilidade aceitável para o sítio receptor (p. ex., áreas sem pelos). 7. Se for necessária a restauração de função motora ou de sensações existe a disponibilidade de um número seleto de retalhos musculares, musculocutâneos e fasciocutâneos. Exemplos comuns de músculos que proporcionam sensibilidade ou restauram função incluem o músculo serrátil, reto abdominal e latíssimo do dorso.128-132 8. Os retalhos osteomusculocutâneos estão disponíveis para os defeitos que necessitam de vascularização óssea em complementação ao tecido mole. Exemplos incluem o retalho do trapézio com clavícula vascularizada e espinha escapular,133-135 retalho do peitoral maior com costela vascularizada,136,137 retalho osteomusculocutâneo ilíaco baseado nos ramos ascendentes e transversos do sistema circunflexo femoral lateral138,139 e o retalho osteomusculocutâneo do latíssimo do dorso escapular140,141 9. A cirurgia deve ser tecnicamente simples.

Seleção de retalhos específicos da fáscia As diretrizes gerais na seleção de um retalho fasciocutâneo ou da fáscia são semelhantes àquelas estabelecidas para os retalhos musculocutâneos ou musculares, com poucas exceções. O retalho fasciocutâneo ou da fáscia deve estar na proximidade do defeito se for planejado um retalho rotacional. O retalho planejado deve apresentar volume e tamanho suficientes para reconstruir o defeito. Os retalhos fasciocutâneo e da fáscia são ideais para as áreas que não exigem volume. O suprimento vascular da área deve ser avaliado no período pré-operatório. Se for planejado um retalho fasciocutâneo, os vasos perfurantes devem ser avaliados com um ultrassom Doppler no período pré-operatório, de modo que a ilha de pele possa ser esboçada (ou traçada). A presença ou ausência de vasos perfurantes suficientes determina a possibilidade de usar um retalho fasciocutâneo específico. Os defeitos do sítio doador devem ser considerados. Em geral, esses defeitos podem ser fechados primeiramente (retalho fascial), porém podem exigir enxerto cutâneo se a ilha de pele for ampla. É possível realizar a restauração da sensibilidade com retalhos fasciocutâneos. Exemplos incluem o retalho lateral do braço,142 o retalho radial do antebraço,143 retalho do músculo deltoide,144 retalho anterolateral da coxa145 e o retalho do tensor da fáscia lata.146

Aplicação regional de retalhos musculocutâneos e musculares

Reconstrução de cabeça e pescoço Retalhos regionais dos músculos: 1. Temporal 2. Esternocleidomastóideo 3. Platisma Retalhos distantes dos músculos: 1. Peitoral maior 2. Trapézio 3. Latíssimo do dorso Transplante microvascular: 1. Radial do antebraço 2. Reto abdominal 3. Latíssimo 4. Escapular 5. Vísceras abdominais (omento, jejuno, cólon) 6. Retalhos de perfurantes A cirurgia radical para câncer ou lesão traumática pode produzir defeitos massivos na cabeça e no pescoço. Enquanto muitos defeitos simples podem ser tratados adequadamente com o fechamento direto, retalhos locais do couro cabeludo ou enxerto de pele, os defeitos mais complicados exigem uma reconstrução mais ampla. Os retalhos musculares, musculocutâneos e fasciocutâneos desempenham um papel importante nessas reconstruções. Historicamente, os defeitos cirúrgicos amplos da cabeça e do pescoço foram conduzidos com a reconstrução escalonada. Atualmente, a reconstrução mais comum envolve a transferência de tecidos microvasculares. As principais aplicações do retalho muscular ou musculocutâneo na reconstrução de cabeça e de pescoço incluem o suprimento de volume tecidual para um defeito significativo (p. ex., após a hemimandibulectomia); cobertura protetora de estruturas vitais (p. ex., a artéria carótida); fornecimento de pele para revestimento e cobertura intraoral; e suprimento de pele para defeitos do crânio, região facial e pescoço. Os retalhos musculares e musculocutâneos locais para a reconstrução da cabeça e do pescoço incluem os retalhos dos músculos temporal, esternocleidomastóideo e platisma. O músculo temporal é um músculo tipo III, bipeniforme, em forma de leque. A transposição do músculo como um retalho de rotação é especialmente útil para a cobertura da órbita, maxila superior e orelha. O esternocleidomastóideo é um músculo tipo II, descrito inicialmente na reconstrução de cabeça e de pescoço por Owens em 1955.25 Esse retalho tem sido usado historicamente para a reconstrução intraoral e faríngea. Outros usos incluíram o aumento de defeitos de tecidos moles da parte superior do pescoço e mandíbula, cobertura protetora de grandes vasos sanguíneos e fechamento de fístulas faringocutâneas.147-149 Entretanto, de todos os retalhos musculocutâneos usados para a reconstrução de cabeça e pescoço, o retalho do músculo esternocleidomastóideo é considerado o menos confiável.19,149 O platisma é um músculo tipo II, fino, amplo, semelhante a uma folha, que se estende por completo nas regiões anterior e lateral do pescoço. O uso do platisma como um retalho musculocutâneo foi descrito inicialmente em 1887 por Gersuny, que utilizou esse retalho na reconstrução de um defeito de espessura total da face.150 O platisma tem sido usado para a reconstrução intraoral, lábios, terço médio inferior da face e reconstrução da região anterior do pescoço. Considerando a espessura reduzida do músculo platisma, o cirurgião reconstrutivo deve ser extremamente cuidadoso para evitar a ruptura das fibras musculares durante a dissecção, e deve manter-se atento para não colocar tensão indevida no pedículo vascular após a transposição do retalho. Os retalhos distantes musculares e musculocutâneos usados na reconstrução de cabeça e pescoço incluem os retalhos dos músculos peitoral maior, trapézio e latíssimo do dorso. O peitoral maior é um músculo tipo V, grande e amplo. O uso desse músculo como um retalho musculocutâneo foi descrito inicialmente em 1968 por Hueston e MCConchie como parte de um retalho composto deltopeitoral.151 Em 1977, Brown et al. descreveram o uso do peitoral maior como um retalho na cobertura do mediastino.17 Em 1979, Ariyan introduziu o retalho musculocutâneo do peitoral maior para a reconstrução de cabeça e pescoço (Figs. 24.24, 24.25).19 Durante os anos subsequentes, o retalho musculocutâneo do peitoral maior demonstrou maior importância na utilização do que o retalho deltopeitoral,

e substituiu esse retalho como o retalho primário (exceto no transplante de tecido microvascular) na reconstrução de cabeça e pescoço.

FIG. 24.24 Retalho do músculo peitoral maior. Arco-padrão para o terço médio da face.

FIG. 24.25 (A-C) Retalho do músculo peitoral maior para a reconstrução de cabeça e pescoço.

As aplicações comuns do retalho musculocutâneo do peitoral maior na reconstrução de cabeça e pescoço incluem os seguintes aspectos: renovação externa da pele da face e do pescoço; revestimento intraoral e faríngeo; transporte de pele e costela vascularizadas na reconstrução mandibular; e reconstrução do esôfago.152156 Historicamente, o retalho musculocutâneo do peitoral maior tem sido um dos retalhos mais versáteis na reconstrução de cabeça e pescoço.

O trapézio, um músculo tipo II, é usado com menor frequência do que o músculo do peitoral maior (PM), apesar da sua localização superior e do arco de rotação anterior amplo torná-lo um retalho musculocutâneo valioso.13,157 Modificações no projeto têm possibilitado o uso do músculo trapézio como retalhos musculocutâneos de regiões superiores e inferiores distintamente diferentes.158 As diversas aplicações clínicas do retalho do músculo trapézio incluíram a reconstrução facial inferior, especialmente a orelha e regiões da glândula parótida; reparo (occipital e temporal) do couro cabeludo e da face superior lateral;159 reconstrução anterior e posterior do pescoço;160 reconstrução orbital com o uso de um retalho estendido;161,162 e reconstrução faringoesofágica. Historicamente, o trapézio tem sido usado como um retalho osteomusculocutâneo, incorporando o aspecto lateral da clavícula ou a espinha da escápula (Figs. 24.26, 24.27).163

FIG. 24.26 Retalho do músculo trapézio. Arco para a face e região anterior do pescoço.

FIG. 24.27 (A-E) Retalho musculocutâneo do trapézio vertical.

O latíssimo do dorso é um músculo tipo V descrito originalmente por Tansini, em 1896, como um retalho de base superior.23 Desde a descrição inicial, ocorreram inúmeras modificações e aperfeiçoamentos do retalho. Historicamente, o retalho musculocutâneo do latíssimo do dorso tem sido usado na reconstrução de cabeça e pescoço para defeitos amplos, ou quando a radiação anterior ou cirurgia impossibilitaram o uso de outros retalhos. Desde que Quillen et al., em 1978, relataram o uso do latíssimo do dorso como um retalho de transposição em ilha para cobrir a mandíbula e o pescoço após a ressecção de um tumor, várias outras aplicações clínicas desse músculo foram descritas.164 Na verdade, o retalho musculocutâneo do latíssimo do dorso foi usado frequentemente na reconstrução intraoral e faríngea.165 Outros usos do músculo latíssimo do dorso na reconstrução de cabeça e pescoço incluíram a reconstrução de defeitos da região posterior do pescoço, ombro, região anterior do pescoço, face inferior, couro cabeludo da região occipital, e regiões intraoral e faringoesofágica. O transplante de tecidos microvasculares na reconstrução de cabeça e pescoço tornou-se a reconstrução de escolha na maioria dos centros de cirurgia plástica. O uso da microcirurgia permitiu ao cirurgião obter resultados reconstrutivos superiores no que diz respeito à forma e função. Diversos retalhos musculares, musculocutâneos e fasciocutâneos são usados na reconstrução de cabeça e pescoço, dependendo do defeito bem como da preferência do cirurgião. Defeitos amplos do terço médio da face são reconstruídos muitas vezes com os retalhos musculocutâneos do reto abdominal.166 O músculo reto proporciona um volume muscular para preencher defeitos tridimensionais, além de oferecer uma ilha ampla de pele para a cobertura externa.167 Os defeitos intraorais podem ser fechado com frequência com um retalho radial do antebraço, restaurando uma cavidade oral funcional.168 Defeitos de glossectomia parcial ou total foram reconstruídos com o retalho radial do antebraço, retalho do músculo reto abdominal, retalho do músculo latíssimo do dorso, retalho do músculo grácil, e retalho ântero-lateral da coxa.169,170 Os defeitos amplos do couro cabeludo são conduzidos com eficácia pela transferência do retalho do músculo latíssimo do dorso ou retalho livre de omento combinado com um enxerto de pele de espessura parcial (STSG). O retalho do músculo latíssimo do dorso tem sido amplamente usado devido a sua grande área de superfície, pedículo vascular longo, e confiabilidade (Fig. 24.28).171,172 Embora não seja usado normalmente, o omento pode proporcionar uma cobertura estável dos defeitos amplos do couro cabeludo.64 A laparotomia necessária aumenta a morbidade do sítio doador. Quando o paciente foi submetido a uma laparotomia prévia, as aderências podem complicar a coleta do retalho.

FIG. 24.28 (A-D) Retalho do latíssimo do dorso para defeito do couro cabeludo.

Reconstrução da mama Retalhos regionais: 1. Peitoral maior 2. Serrátil anterior 3. Peitoral menor Retalhos distantes: 1. Reto abdominal 2. Latíssimo do dorso Retalhos microvasculares: 1. Reto abdominal 2. Perfurante da artéria epigástrica profunda inferior 3. Artéria epigástrica inferior superficial 4. Perfurante da artéria glútea superior 5. Perfurante da artéria glútea inferior 6. Glúteo máximo 7. Grácil superior transverso Os retalhos musculares e musculocutâneos apresentaram um impacto excepcional na reconstrução da mama, proporcionando às mulheres resultados estéticos superiores após a mastectomia. Tratamentos cirúrgicos menos agressivos, como a mastectomia radical modificada, a mastectomia de preservação de pele e do mamilo, e a lumpectomia, têm substituído a mastectomia radical clássica como tratamento de escolha para o câncer de mama. Essa alteração na abordagem resultou em defeitos menores e mais tecidos locais disponíveis para usar na reconstrução. Além disso, mais mulheres com doença pré-maligna ou com um histórico familiar de câncer de mama são submetidas à mastectomia profilática e reconstrução imediata. Os músculos locais disponíveis na reconstrução da mama são o peitoral maior, peitoral menor e serrátil anterior. Esses músculos são importantes, especialmente para os pacientes submetidos a implantes de próteses ou inserção de expansores. Para os pacientes com um músculo do peitoral maior intacto e pele sobrejacente adequada, a colocação submuscular (subpeitoral ou subserrátil-peitoral) de um implante de prótese é uma técnica reconstrutiva comum.173 Os músculos peitoral menor e serrátil também podem auxiliar na cobertura do implante e geralmente são usados juntamente com o músculo peitoral maior.174-176 Os músculos distantes disponíveis na reconstrução da mama incluem o latíssimo do dorso, o reto abdominal e uma variedade de outros músculos transferidos microcirurgicamente, incluindo os retalhos de perfurantes fasciocutâneos (perfurante da artéria epigástrica profunda inferior, artéria epigástrica inferior superficial e

grácil superior transverso). Os retalhos musculocutâneos ou fasciocutâneos de áreas distantes são indicados geralmente para pacientes com tecido local inadequado, pele sobrejacente inaceitável ou com danos de radiação. Tanzini descreveu a versão mais precoce do retalho do latíssimo do dorso.23 Desde então, esse músculo tornou-se um dos retalhos mais versáteis na cirurgia plástica e reconstrutiva. As vantagens apresentadas pelo retalho do latíssimo do dorso são o suprimento vascular confiável e a “ilha” de pele, proporcionando um resultado estético aceitável.177 A maior desvantagem na utilização do músculo do latíssimo do dorso para a reconstrução da mama é que costuma ser necessário um implante de prótese para proporcionar a projeção adequada, considerando que o retalho musculocutâneo por si só em geral é muito fino.178 Levando em conta esse aspecto, o retalho do latíssimo do dorso estendido tem sido descrito; esse retalho oferece tecido mole suplementar, eliminando a necessidade de implantes.179 Além disso, a cicatriz do sítio doador do latíssimo do dorso muitas vezes apresenta má aparência e taxas de seroma elevadas.180 O reto abdominal é um músculo tipo III que geralmente fornece uma quantidade generosa de gordura abdominal e pele sobrejacente. Como um retalho musculocutâneo, o reto abdominal demonstrou ser uma das opções mais valiosas para a reconstrução da mama. As variações no projeto do retalho produziram tipos diferentes de retalhos musculocutâneos do reto abdominal (p. ex., retalhos verticais, transversos, bipediculados e com base superior e inferior). O retalho foi descrito inicialmente com base no seu pedículo superior, a artéria epigástrica superior e veias comitantes, com uma “ilha” de pele vertical. Posteriormente, foi relatado o uso desse retalho com base no pedículo inferior, ou seja, a artéria epigástrica profunda inferior.181 Em 1982, Hartrampf et al. descreveram uma técnica que alterou a abordagem integral para a reconstrução da mama.182 Pelo alinhamento da “ilha” de pele em um sentido transversal, entre o umbigo e a pelve, o retalho musculocutâneo do reto abdominal fornece pele e tecido mole para a reconstrução da mama com aperfeiçoamento do contorno abdominal. O retalho transverso musculocutâneo do reto abdominal (TRAM) é considerado atualmente o retalho musculocutâneo de escolha para a reconstrução da mama (Fig. 24.29).

FIG. 24.29 Vários desenhos de retalhos TRAM pediculados na região superior.

As indicações para usar TRAM incluem uma paciente com necessidade de tecido mole suplementar e pele sobrejacente que apresenta uma quantidade moderada de tecido abdominal na região inferior; uma paciente que prefere a reconstrução com tecido autólogo, sem o uso de um implante de prótese; uma paciente que prefere uma cicatriz do sítio doador na região abdominal inferior do que uma cicatriz nas costas; e uma paciente que obteve um resultado inaceitável após ser submetida a outros métodos reconstrutivos (Fig. 24.30).183

FIG. 24.30 (A-C) Retalho transverso do músculo reto abdominal (TRAM).

As contraindicações referentes ao uso do TRAM incluem uma paciente extremamente magra, com pouco tecido na região abdominal inferior; uma paciente nulípara, na idade reprodutiva; uma paciente com um histórico de hérnia da parede abdominal; uma paciente extremamente obesa; uma paciente fumante compulsiva; e uma paciente com cicatrizes na região abdominal inferior. Uma contraindicação absoluta para o uso de um TRAM na transposição com base superior para a reconstrução da mama é a divisão prévia do seu pedículo superior, relacionada geralmente a uma incisão transversal de laparotomia na região superior. As vantagens do TRAM incluem os seguintes aspectos: 1. Esse retalho proporciona volume suficiente, de modo que normalmente não é necessário um implante de prótese. 2. A cicatriz do sítio doador de forma horizontal suprapúbica esteticamente é aceitável. 3. A transposição do retalho pode ser realizada com a paciente em uma posição cirúrgica. 4. As dimensões da pele são mais amplas do que aquelas disponíveis com o retalho do músculo latíssimo do dorso. 5. Uma abdominoplastia simultânea é realizada com o fechamento direto do sítio doador. A maior desvantagem do TRAM é que existe um risco potencial de hérnia abdominal ou fraqueza, após o uso dos músculos reto unilateral ou bilateral para a coleta do retalho.184 O efeito a longo prazo da perda de um ou de ambos os músculos retos abdominais tem sido o alvo de muitas investigações.185 A maioria dos estudos relata dados qualitativos em vez de dados quantitativos no que diz respeito à integridade e resistência da parede abdominal no período pós-operatório. No entanto, alguns estudos estão começando a evidenciar déficits quantitativos de perda da musculatura da parede abdominal.186 De um modo geral, a maioria dos pacientes retoma as atividades normais, sem limitações físicas após a reconstrução da mama com o TRAM. A reconstrução da mama com o transplante de tecido microvascular tornou-se a fonte primária de reconstrução da mama em alguns centros cirúrgicos. Diversos retalhos musculocutâneos têm sido descritos, sendo o reto abdominal o mais comum.187 Além disso, os retalhos musculocutâneos do glúteo máximo superior e inferior têm sido usados para a reconstrução da mama.188,189 Além dos retalhos musculocutâneos, os retalhos fasciocutâneos e de perfurantes estão sendo usados com maior frequência. Os retalhos de perfurantes têm sido preconizados devido ao uso frequente e à vantagem teórica de menor morbidade no sítio doador. Esses retalhos incluem o retalho de perfurante da artéria epigástrica profunda inferior, retalho de perfurante da artéria glútea superior, retalho de perfurante da artéria glútea inferior, e retalho da artéria epigástrica superficial inferior.190-192

Mediastino Retalhos regionais: 1. Peitoral maior Retalhos distantes: 1. Reto abdominal 2. Latíssimo do dorso

3. Omento Retalhos microvasculares: 1. Latíssimo do dorso A razão mais comum para reconstruir o mediastino é o surgimento de infecção após a esternotomia mediana. Embora a incidência de infecção após a esternotomia mediana seja baixa, relatada a partir de 0,4% a 6,9%, a morbidade e a mortalidade são significativas.193 O tratamento de uma ferida infectada proveniente de uma esternotomia mediana depende da grandeza da infecção e da quantidade de necrose tecidual. Historicamente, a terapia-padrão para uma ferida infectada proveniente de uma esternotomia mediana incluía debridamento e irrigação com tubo fechado. O retalho muscular para cobertura geralmente era reservado para as feridas recalcitrantes para a terapia-padrão. Atualmente, existe uma aceitação generalizada de que a transposição precoce do retalho muscular reduz a morbidade e, desta forma, o uso do retalho muscular deve ser sempre considerado para o tratamento de feridas provenientes de esternotomia mediana. O músculo local preferido para a cobertura do mediastino é o peitoral maior. Em 1980, Jurkiewicz et al. descreveram o uso do retalho muscular do peitoral maior para obliterar o espaço morto do mediastino e do esterno.194 O peitoral maior pode ser mobilizado de diversas formas. O músculo pode ser transposto no pedículo toracoacromial dominante ou como um retalho de rotação nos pedículos secundários vasculares segmentares (vasos perfurantes a partir da artéria e veia mamária interna). Nahai et al. descreveram uma técnica modificada do retalho de rotação que preserva um terço lateral do músculo com base no pedículo vascular dominante e seus nervos motores.195 A vantagem dessa técnica é a preservação da linha axilar anterior. O retalho do músculo peitoral permanece como o principal componente do tratamento em adultos e crianças com infecções do esterno.196-198 Dependendo do tamanho do defeito, o cirurgião pode usar um ou ambos os músculos do peitoral maior para a cobertura.199 Se uma cobertura suplementar for necessária, pode ser usado o músculo reto abdominal juntamente com os músculos do peitoral maior para cobrir o aspecto inferior da ferida.200 Usado como um músculo ou retalho musculocutâneo, o músculo reto abdominal é uma fonte segura para a cobertura do mediastino inferior; tal músculo oferece também a possibilidade de preenchimento de uma ampla área de espaço morto.201,202 Se for considerado o uso do músculo reto abdominal, é necessário observar que a artéria epigástrica superior é a continuação da artéria mamária interna inferior ao esterno, que deve ser evitada durante o debridamento da ferida do esterno. Além disso, o uso da artéria mamária interna como um enxerto de revascularização da artéria coronária pode afetar de forma negativa a perfusão do retalho do músculo reto abdominal com base superior, o que impede o uso do retalho do músculo reto naquele lado. A circulação colateral para os vasos mamários internos, distal ao sítio de ligação durante a revascularização coronária, geralmente permitirá a perfusão adequada através da artéria e veia epigástrica superior para a transposição superior do mediastino (Figs. 24.31, 24.32).

FIG. 24.31 Retalho do peitoral maior. (A) Retalho padrão para o mediastino anterior baseado no pedículo toracoacromial. (B) Arco de rotação para o mediastino anterior baseado nos vasos perfurantes da artéria mamária interna e veias associadas.

FIG. 24.32 (A-E) Retalhos bilaterais dos músculos peitorais para a reconstrução do mediastino.

O omento é uma fonte alternativa de tecido disponível para ser transferido para a reconstrução do mediastino; esse tecido pode ser usado de forma isolada ou em combinação com um outro retalho.203 O omento pode ser baseado nos vasos gastroepiploicos da direita ou da esquerda. Tendo em vista o risco de exposição do peritônio a um campo contaminado, no entanto, o omento geralmente é reservado para pacientes nos quais os músculos do peitoral maior e reto abdominal não estão disponíveis.204 A coleta do omento tem sido obtida por laparoscopia para reduzir a morbidade potencial da parede abdominal.205 O latíssimo do dorso proporciona uma outra alternativa de retalho muscular ou musculocutâneo para a cobertura do mediastino superior.206 O uso desse músculo normalmente é indicado quando o peitoral maior está ausente ou danificado por incisões prévias ou terapia por radiação.207 A vantagem do uso do retalho musculocutâneo ou do músculo latíssimo do dorso é que o pedículo vascular e o sítio doador estão distantes da área infectada.208 As desvantagens incluem a inconveniência de obter um retalho muscular a partir das costas e o fato de que o músculo latíssimo do dorso pode ser muito fino para os defeitos mais extensos e mais profundos do mediastino. O latíssimo do dorso também pode ser transferido por microcirurgia para os defeitos de feridas do esterno.209

Parede torácica e cavidade pulmonar Retalhos regionais: 1. Peitoral maior 2. Latíssimo do dorso 3. Serrátil anterior Retalhos distantes: 1. Reto abdominal 2. Omento Transferência de tecido microvascular livre: 1. Latíssimo do dorso 2. Reto abdominal A reconstrução da parede torácica é desafiadora. A cirurgia ablativa para neoplasia, infecção, radiação e trauma pode produzir defeitos abrangentes na espessura total da parede torácica. Além disso, muitos dos

pacientes que necessitam de reconstrução foram submetidos anteriormente a alguma forma de quimioterapia ou alta dose de irradiação para suas doenças primárias. Dessa forma, a cicatrização da ferida pode ser severamente comprometida no período da reconstrução. Historicamente, os métodos de reconstrução da parede torácica consistiam de diversos retalhos aleatórios e de cavidades ou canais que com frequência exigiam vários estágios antes da conclusão. Atualmente, a reconstrução da parede torácica é realizada com êxito sem a necessidade de procedimentos tardios ou escalonados. Defeitos de espessura parcial com musculatura viável no leito da ferida podem ser conduzidos com enxerto de pele; defeitos maiores de espessura total necessitam de reconstrução com retalhos. Além da reconstrução com retalhos, é indicada a sutura cirúrgica de Prolene para a reconstrução da parede torácica a fim de proporcionar estabilidade e apoio para o retalho sobrejacente, quando existe a perda significativa de continuidade da parede torácica.210,211 Os retalhos musculocutâneos e dos músculos do peitoral maior e do latíssimo do dorso são usados mais comumente na reconstrução da parede torácica. Larson e McMurtrey consideraram que o retalho musculocutâneo do peitoral maior é o retalho de escolha para os defeitos da região inferior do pescoço e do terço superior do esterno, enquanto o retalho musculocutâneo do latíssimo do dorso é preferido para as feridas da região anterior da parede torácica, que exigirá a remoção de duas ou três costelas e a ressecção de 0,6 cm e alterações evolutivas – o critério ABCDE. Os quatro principais subtipos histopatológicos do melanoma são: lentigo maligno, disseminativo superficial, nodular e acral lentiginoso. O melanoma desmoplásico é um subtipo menos comum de melanoma que não apresenta pigmento e pode demonstrar invasão perineural. A abordagem inicial da lesão pigmentada deve incluir uma biopsia excisional dentro de uma margem de 1-2 mm de pele com aparência normal. Caso aspectos funcionais ou estéticos impeçam a remoção da lesão por completo, uma biopsia incisional ou com utilização de punch deve ser realizada. A avaliação histológica da lesão primária deve incluir: Profundidade de Breslow em milímetros, presença/ausência de ulceração, taxa mitótica por mm2, estado das margens periféricas e profunda e o nível de Clark (especialmente para lesões ≤1 mm em profundidade). As margens de excisão recomendadas são determinadas pela profundidade de Breslow. Melanomas in situ requerem uma margem de 0,5 cm de pele com aparência normal. Para melanomas invasivos, margens de 1 cm são recomendadas para lesões ≤ 1 mm em profundidade; margem de 1-2 cm é recomendada para lesões de 1,01-2,0 mm em profundidade (dependendo de aspectos funcionais/estéticos); e uma margem de ao menos 2,0 cm é recomendada para lesões >2,0 mm em profundidade. O melanoma subungueal da mão deve ser ressecado ao nível da articulação intrafalangeana distal de modo a preservar a função. A biopsia do linfonodo sentinela é oferecida aos pacientes com melanomas >1 mm em espessura e para os pacientes com melanomas finos (≤1 mm de espessura) que apresentem características de alto risco, incluindo ulceração e/ou alta taxa mitótica. A probabilidade de detecção de focos metastáticos na biopsia dos linfonodos sentinelas aumenta de acordo com a espessura da lesão primária. Para os pacientes com doença no estádio I e II a abordagem recomendada é composta por radiografia torácica e exames de função hepática. Os pacientes com metástases regionais (estádio III) ou sistêmicas (estádio IV) devem ser submetidos a um estadiamento abrangente que pode incluir tomografia computadorizada por meio de tomografia com emissão de pósitrons. A lactato desidrogenase sérica é utilizada no sistema de estadiamento da American Joint Committee on Cancer uma vez que ela prediz um pior prognóstico nos pacientes com doença metastática. Pacientes com tumores primários ou doença metastática de alto risco devem ser considerados para tratamento adjuvante com interferon-alfa ou inclusão em um teste clínico.

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as

Figuras

31.1 e

31.2 em

inglês

no site

Introdução Poucas doenças são fascinantes e problemáticas aos médicos como o melanoma maligno e, talvez, nenhuma outra doença cause tanto medo nos pacientes como este diagnóstico. Apesar de responder por somente cerca de 4% das neoplasias malignas, seu diagnóstico sugere a alguns pacientes uma progressão rápida e agressiva para a morte. O nome, por si só, pode levar alguns pacientes a experimentar uma falta de esperança que frequentemente não é justificável. Apesar de algumas descrições de disseminação rápida, a história natural do melanoma e sua taxa global de cura de 80% são favoráveis quando comparadas à de cânceres como o de mama, cólon, reto e orofaringe, sendo muito melhores dos que as do câncer de pulmão. Estudos epidemiológicos demonstram que a incidência do melanoma tem crescido mais rapidamente do que a de qualquer outro câncer nos Estados Unidos.1 Para o ano de 2010, somente nos Estados Unidos, 68.130 novos casos de melanoma foram diagnosticados e 8.700 mortes foram atribuídas ao melanoma.2 Enquanto o melanoma corresponde a quase 4% de todos os cânceres de pele, ele é responsável por mais de 77% das mortes associadas aos cânceres de pele. Estimativas atuais para o risco de desenvolvimento de melanomas invasivos durante a vida é de 1 em 37 para homens brancos e 1 e 56 para mulheres brancas.2 Nosso conhecimento acerca do melanoma continua a aumentar, sendo que agora somos capazes de diferenciar os pacientes de baixo risco dos de alto risco, baseado em análises multifatoriais de diversas séries com grande quantidade de pacientes. Entretanto, apesar das nossas melhores tentativas em entender a base molecular dessa doença, pouco sucesso foi obtido em termos do desenvolvimento de novos tratamentos, sendo que o sucesso do tratamento está baseado fundamentalmente sobre o cirurgião. AS FIGS. 31.1 E 31.2 ESTÃO DISPONÍVEIS APENAS ON-LINE

Avaliação clínica Diagnóstico clínico Apesar de um médico experiente ser capaz de diagnosticar um melanoma maligno somente por meio de sua aparência, o diagnóstico frequentemente não é realizado até que uma amostra seja avaliada histologicamente. Consequentemente, uma revisão das várias lesões pigmentadas é essencial para se fazer um diagnóstico diferencial. Todas as crianças nascem com nevos, porém as lesões geralmente não são aparentes ao nascimento por que elas não produzem pigmento. Durante as semanas ou meses seguintes os melanócitos produzem pigmento como resposta aos hormônios circulantes. À medida que os nevos se desenvolvem, eles amadurecem, levando à classificação de acordo com as várias formas a seguir.

Nevo juncional Nevos juncionais são pequenas lesões planas que primeiramente aparecem após o nascimento e são macias, não palpáveis e variam de claras a marrom escuras ou pretas (Fig. 31.3A). Eles são chamados de juncionais porque as células do nevo estão localizadas na interface entre a epiderme e a derme. À medida que a pessoa se desenvolve e amadurece, as células do nevo crescem e se direcionam para a derme se tornando um nevo intradérmico adulto comum.

FIG. 31.3 (A) O nevo juncional é plano, liso e não palpável. (B) Nevo composto se desenvolvendo em um nevo intradérmico mais espesso na porção central circundado por nevo juncional plano na periferia. (C) Nevo intradérmico é nevo maduro com elevação dos elementos da superfície devido ao espessamento da camada de células névicas. (D) Nevo azul apresenta depósitos de melanina na derme profunda, refletindo o comprimento de onda azul da luz.

Nevo composto À medida que o nevo amadurece a sua porção central, se direciona para a derme, fazendo com que essa porção se eleve e aparente ser mais espessa (Fig. 31.3B). Este nevo é denominado composto pelo fato de sua porção central ser intradérmica e espessa, ao passo que sua periferia permanece juncional e plana. Nevos compostos frequentemente são observados durante a adolescência, sendo que alterações em tais pintas podem gerar preocupação ao paciente, família ou médico.

Nevo intradérmico O nevo intradérmico é a pinta comum da face ou do tronco do adulto que se apresenta elevada devido à maturação e proliferação do nevo na derme, o qual neste caso empurra para cima a epiderme sobrejacente (Fig. 31.3 C). Ele pode ser claro ou escuro, geralmente é elevado e pode ser séssil ou pedunculado.

Nevo azul A maioria dos nevos é marrom ou preto devido à melanina ser superficial e absorver a luz. Quando o nevo contém melanina que está localizada mais profundamente, comprimentos de onda luminosos azuis passam através da epiderme menos pigmentada e são refletidos de volta para os olhos como um nevo azul (Fig. 31.3D).

Nevo congênito Nevos congênitos diferem de outros devido ao fato dele já produzirem pigmento ao nascimento (Fig. 31.4A). Existem controvérsias se os nevos congênitos são precursores do melanoma. A revisão de literatura de Kaplan12 relatou que a transformação em melanoma ocorre em 2%-42% dos nevos congênitos (Fig. 31.4B). Em um estudo retrospectivo de 234 melanomas feito por Rhodes e Melski,13 algumas das características histológicas dos nevos congênitos eram observadas em 8% das amostras de melanoma. Uma revisão sistemática de todos os estudos que avaliaram o risco de melanoma em nevos congênitos foi realizada por Krengel et al.14 Um total de 6.571 pacientes com nevos congênitos foram seguidos por ao menos 3,4 anos e 46 pacientes (0,7%: intervalo 0,05%-10,7%) desenvolveram 49 melanomas. De nota, melanomas primários surgiram dentro de nevos em 67% dos casos. Utilizando informações com idade pareada provenientes da base de dados do Surveillance, Epidemiology and End Results, eles calcularam que os pacientes com nevos congênitos possuem um risco relativo de desenvolvimento de melanoma durante a infância e adolescência aumentado em aproximadamente 465 vezes. Nevos congênitos gigantes (Fig. 31.5), maiores do que 40 cm em diâmetro foram associados com os maiores riscos de desenvolvimento de melanoma, assim como de morte associada a melanoma.14,15 Entretanto, a verdadeira incidência de desenvolvimento de melanoma nos nevos congênitos é difícil de ser determinada uma vez que o número de pacientes na população total que possuem nevos mas nunca se consultaram com um médico ou que eventualmente não foram submetidos à excisão da lesão é desconhecido.

FIG. 31.4 (A) O nevo congênito é um nevo grande, plano e pigmentado que produziu pigmentação intraútero e estava presente como uma lesão pigmentada no dia do nascimento. Ele pode ter pelos (como neste caso) ou não. (B) Um melanoma invasivo (1,4 mm) se desenvolveu em um nevo congênito no tronco de um homem de 57 anos de idade.

FIG. 31.5 Excisão seriada. Um nevo congênito grande no tronco (A) foi removido da região central da lesão (B) para reduzir o tamanho da lesão pela metade após a primeira operação (C). Um segundo procedimento realizado um ano depois (D) removeu o restante da lesão (E).

Com base nas informações disponíveis sobre o potencial de transformação maligna, é uma boa política a remoção dos nevos congênitos caso isso possa ser realizado sem muita dificuldade (Fig. 31.5). A transformação maligna geralmente não ocorre antes da adolescência e, consequentemente, caso se pretenda que a lesão seja removida, isso deve ser feito antes da adolescência. Dada a dificuldade de remover nevos da pele de crianças com anestesia local e a anestesia geral ser frequentemente necessária para crianças mais jovens do que 12 anos de idade, o risco de complicações geradas pela anestesia geral deve ser levado em conta em relação ao risco de transformação maligna antes da adolescência. Por outro lado, pacientes podem requer a remoção da lesão para melhorar a sua aparência. Apesar das preocupações com a aparência, algumas lesões não podem ser removidas completamente devido ao fato de tal procedimento poder causar uma deformidade maior. Essas lesões podem requerer excisões seriadas.

Nevo atípico (displásico) O nevo atípico é um diagnóstico clínico de um nevo com melanócitos que envolvem a epiderme e a derme e que possui características sugestivas de malignidade. Clinicamente, ele é grande (>6 mm), com superfície macular, borda irregular e coloração variada. Ele pode apresentar um eritema como plano de fundo (Fig. 31.6). Eles constituem lesões benignas com características histológicas anormais. Em diversos momentos eles foram denominados nevos atípicos ou nevos displásicos. Entretanto, uma Conferência de Consenso dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos realizada em 1992 recomendou o termo descritivo “nevo atípico” para o diagnóstico clínico e o termo histológico “nevo displásico” para descrever o grau histológico de atipia e desorganização arquitetural.16

FIG. 31.6 O nevo displásico é uma confirmação histológica da entidade clínica denominada nevo atípico. É um nevo grande (>6 mm) e plano de coloração variada.

Para garantir o diagnóstico correto, a avaliação histológica da lesão é necessária. Microscopicamente, o nevo displásico possui hiperplasia melanocítica com melanócitos arranjados como unidades solitárias ou pequenos ninhos alongados orientados paralelamente ao eixo longitudinal das cristas da rede. Os melanócitos possuem atipia nuclear e citoplasma abundante com um “padrão de poeira” que representa depósitos de melanina.17 Nevos displásicos são frequentemente associados com hiperplasia melanocítica atípica, infiltração linfocitária e algumas evidências de regressão. Consequentemente, acredita-se que pacientes com essas lesões possuem maior risco de transformação para melanomas.

Síndrome do nevo atípico (displásico) Estudos realizados em diversas instituições detectaram nevos atípicos em associação com melanoma que não apresentam padrão familiar. Na Universidade da Pensilvânia, Elder et al.18 descreveram isto pela primeira vez como a síndrome do nevo displásico em seu relato de 1980. No mesmo ano, a Unidade de Melanoma de Yale visitou a Unidade de Melanoma em Sidney na Austrália e documentou a presença de nevos atípicos em 37% de 296 pacientes com melanoma, os quais não apresentavam histórico familiar conhecido.19 Nevos atípicos semelhantes foram descobertos em somente 7% de uma população controle de homens detidos em prisões sem qualquer histórico de melanoma.19 Clinicamente, essas pintas eram grandes e lembravam os nevos displásicos do melanoma familiar. Biopsias demonstraram uma correlação de 90% entre o diagnóstico histológico de nevos displásicos e a aparência clínica dessas pintas atípicas. Presume-se que a tendência ao desenvolvimento de nevos atípicos possui uma base genética e o diagnóstico de “síndrome do nevo atípico” tem sido empregado em diversas expressões fenotípicas,20 incluindo desde a presença de múltiplos nevos atípicos e inexistência de histórico pessoal ou familiar de melanoma até a síndrome de múltiplos nevos atípicos e melanoma familiares.21

Síndrome B-K Alguns estudos prospectivos demonstraram que o melanoma pode estar associado com uma distribuição familiar em 10%-11% dos casos.22 Estes melanomas familiares tendem a surgir mais cedo e são distribuídos entre nevos displásicos pelo corpo, com excesso no tronco e uma deficiência nas extremidades superiores. Clark et al.23 e Reimer et al.24 sugeriram um papel dos nevos atípicos e nevos displásicos no desenvolvimento do melanoma hereditário quando eles descreveram esses nevos em associação com melanomas em sete famílias. Eles aplicaram as iniciais da primeira família, as quais eram BK, para nomear esta entidade clínica como a síndrome B-K.

Diagnóstico diferencial

O clínico é confrontado com a tarefa de diferenciar o melanoma maligno de várias outras lesões que podem se assemelhar clinicamente ao melanoma, tais como a ceratose seborreica (Fig. 31.7A), granuloma piogênico (Fig. 31.7B) e carcinoma basocelular pigmentado (Fig. 31.7C). Essa diferenciação algumas vezes pode ser mais difícil devido a crescimento recente, sangramento na lesão ou inflamação periférica. Nesses casos, somente a avaliação microscópica do tecido fornece o diagnóstico adequado.

FIG. 31.7 Lesões pigmentada que necessitam ser diferenciadas de um melanoma. (A) Queratose seborreica na bochecha é uma queratose aveludada que pode se tornar marrom-escura a preta com o ressecamento da camada de queratina. (B) Granuloma piogênico com tecido de granulação exofítico e escurecimento devido ao ressecamento do sangue e coágulo. (C) Carcinoma basocelular pigmentado com margens “peroladas” elevadas. O pigmento pode representar hemossiderina ou grânulos de melanina provenientes de melanócitos que podem ser incorporados à lesão.

Procedimentos cirúrgicos extensos ou radicais não devem ser realizados sem o diagnóstico apropriado de melanoma devido ao fato das impressões clínicas não serem uniformemente corretas. Epstein et al.25 revisaram 559 pacientes com lesões pretas que eles acreditavam se tratar de melanomas. Eles observaram que seus diagnósticos de melanoma estavam corretos em somente um terço (38,7%) dos casos. Na verdade, os diagnósticos mais comuns foram nevos benignos (35%), carcinoma basocelular pigmentado (30%) e angiomas benignos ou lesões vasculares (13%). Somente 2% de todas as lesões foram melanomas. A dermatoscopia, a utilização de lentes manuais em associação com óleo de imersão, tem demonstrado que melhora a acurácia diagnóstica em mãos treinadas.26,27 Entretanto, ela é rotineiramente utilizada por somente 23% dos dermatologistas.28 Em geral, a abordagem diagnóstica de lesões melanocíticas irá preceder o envolvimento do cirurgião a menos que a lesão esteja localizada em uma região que gere preocupação estética.

Sinal de Hutchinson O sinal de Hutchinson é uma lesão plana, amarronzada e macular que pode crescer em ritmos variados e atingir diferentes variações de pigmentação (Fig. 31.8). Esta lesão ocorre mais comumente na face, pescoço e outras áreas expostas ao sol em adultos de meia idade ou posteriormente. Na avaliação histológica, esta lesão se apresenta como uma maior proliferação melanocíticas na junção dermo-epidérmica. Apesar do lentigo maligno ser um melanoma in situ, um melanoma invasivo pode se desenvolver no interior de um sinal de Hutchinson, sendo denominado lentigo maligno melanoma.

FIG. 31.8 A mancha de Hutchinson é uma lesão plana com vários tons de pigmentação.

Melanoma As lesões de melanoma podem ser planas ou nodulares, com escurecimento, eritema ou sangramento significativos. Na avaliação histológica, as lesões mais precoces apresentam melanócitos atípicos migrando acima da junção dermo-epidérmica e se apresentando no interior das porções superiores dos folículos pilosos e ductos écrinos. Essas alterações são típicas do melanoma in situ.29 Coloração especial para S100 e HMB45 pode ser necessária para confirmar o diagnóstico nos casos com características histológicas que podem ser equivocadas. Entretanto, quando até mesmo um único melanócito atípico invadir, a partir da junção dermoepidérmica em direção à derme, o diagnóstico é de melanoma.30 Existem características clínicas das lesões pigmentadas que são características para melanoma. Esses critérios foram promovidos pela Sociedade Americana de Câncer como as diretrizes do ABCD (Fig. 31.9).

FIG. 31.9 Melanoma com alterações características. (A) Assimetria no formato da lesão. (B) Bordas irregulares. (C) Variação na coloração. (D) Diâmetro maior do que 6 mm.

A assimetria da lesão à medida que ela cresce a partir de uma lesão redonda ou oval B irregularidade na borda, a qual é um resultado de taxas de crescimento irregulares em diferentes partes da lesão C alterações na coloração representando grânulos de pigmento depositados em diferentes profundidades na derme, dependendo da taxa de invasão D diâmetro da lesão se tornando maior do que ¼ de polegada (maior >6 mm). Além dos critérios do ABCD acima, uma revisão de literatura recomendou acrescentar a letra E para “evolução” de modo a enfatizar o significado da evolução de lesões pigmentadas na história natural do melanoma, especialmente dada a existência de melanomas de diâmetro pequeno (≤6 mm).31 Nos tratamentos de pacientes que apresentam lesões pigmentadas suspeitas, os médicos devem estar atentos à mudanças (evolução) no tamanho, forma, sintomas (coceira, sensibilidade), superfície (especialmente sangramento) e tons de cores. Uma pesquisa do processo de reconhecimento do melanoma realizado por 135 dermatologistas revelou que a maioria dos dermatologistas confia mais no padrão geral na lesão, o “sinal do patinho feio” (ou seja, aparência única relacionada aos outros nevos do paciente), e outras alterações relatadas pelo paciente do que no bem conhecido algoritmo ABCD.32 Tal observação dá suporte a adição de uma categoria E para evolução das lesões melanocíticas para os não dermatologistas. Baseado na literatura existente, a maioria dos pacientes que se apresentam ao seu dermatologista não estão cientes da existência de um melanoma. A maioria dos melanomas (56,3%) detectados na prática dermatológica geral é encontrada pelo dermatologista durante uma avaliação física de rotina e não são parte da queixa apresentada.33 Vários estudos34–36 demonstraram que os médicos são mais propensos a diagnosticar o melanoma em um estágio mais fino do que não médicos. Nesses estudos, havia uma diferença significativa entre a espessura dos melanomas detectados pelos médicos (0,23-0,68 mm) e aqueles detectados pelos pacientes ou seus cônjuges (0,9-1,43 mm). Uma característica ocasional e potencialmente confirmatória do melanoma é a despigmentação intralesional (Fig. 31.10). Isto é uma manifestação da regressão imunológica do tumor como resultado da destruição das células do melanoma pela resposta imunológica do paciente. A avaliação histológica de somente uma amostra na área despigmentada pode ser classificada equivocadamente como uma reação inflamatória. Entretanto, depósitos de grânulos residuais de melanina podem existir na região despigmentada (Fig. 31.10B) e avaliação histológica de amostras da porção pigmentada adjacente pode revelar o real diagnóstico de melanoma.

FIG. 31.10 (A) Melanoma com áreas de despigmentação no interior da lesão. (B) Avaliação histológica de secção da amostra através da área de despigmentação demonstra infiltrado linfocítico acentuado associado com ruptura dos grânulos de melanina, levando a manchas incolores no interior.

Apesar disso, a despigmentação nem sempre indica a ocorrência de melanoma: um halo nevo (Fig. 31.11A) é uma lesão benigna com um anel periférico de despigmentação.37 A avaliação histológica da porção em halo demonstra infiltração linfocitária sem grânulos de pigmento (Fig. 31.11B). Avaliações subsequentes da lesão e dos tecidos circunjacentes não demonstram evidências de células de melanoma maligno (Fig. 31.11C).

FIG. 31.11 (A) Nevo halo com anel de despigmentação ao redor da lesão. (B) Avaliação histológica da porção despigmentada demonstra infiltração linfocitária, porém (C) não há evidência de grânulos de pigmento ou células malignas.

Múltiplos melanomas primários Múltiplos melanomas primários têm sido relatados em 3% dos pacientes com melanoma.38 O risco de um segundo melanoma em um paciente com um melanoma chega a 4%-5%.39 Entretanto, com um histórico familiar positivo de melanoma, o risco para múltiplos melanomas primários aumenta para 10% ou mais.40 O maior risco de todos é quando um indivíduo possui um histórico familiar de melanoma em parentes de primeiro ou segundo grau e que possui evidência clínica de nevos displásicos, sugerindo uma probabilidade que chega a 100% com o tempo.41 Apesar dos múltiplos melanomas primários poderem ser encontrados em 10% dos pacientes, Ariyan et al.42 relataram metade desses melanomas subsequentes são in situ, e que a vasta maioria

dos restantes possui menos de 1,0 mm de espessura. Assim, eles não parecem afetar as taxas de cura.

Classificação/estadiamento da doença O melanoma é mais comumente localizado na pele, apesar dele também poder ocorrer na mucosa da cavidade oral, nasofaringe, esôfago, vagina e reto. O sistema de estadiamento desenvolvido para o melanoma se aplica para lesões que surgem na pele e, por conseguinte, a discussão neste capítulo é primariamente limitada ao melanoma cutâneo. O propósito de um sistema de classificação em uma doença maligna é para separar os estádios variantes de severidade de modo a predizer o prognóstico e propor opções de tratamento baseado nessas predições. Consequentemente, todos os sistemas de classificação evoluíram com as informações coletadas ao longo do tempo. A partir disso, cada uma dessas classificações necessita ser reavaliada periodicamente para refinar a separação dos estádios com base nas alterações dos resultados. O estadiamento do melanoma evoluiu de modo a incluir informações adquiridas a partir da avaliação patológica da biopsia inicial (e a potencial biopsia dos linfonodos regionais). O sistema de estadiamento atual (2010), a sétima edição da American Joint Committee on Cancer(AJCC) se baseia em informações relacionadas com o tumor primário (T), linfonodos regionais (N) e metástases (M). Também conhecido como sistema TNM, este sistema de estadiamento foi desenvolvido com base na avaliação de mais de 38.900 pacientes com melanoma cutâneo maligno43,44 (Tabelas 31.2, 31.3).

Tabela 31.2 Estadiamento TNM do melanoma cutâneo Classificação T Espessura

Estado da ulceração

Tis

Não se aplica Não se aplica

T1

≤1,0 mm

a: sem ulceração e mitose 4,0 mm

a: sem ulceração b: com ulceração

Classificação N

N° de linfonodos com metástase

Massa metastática no linfonodo

N1

1 linfonodo

a: micrometástase* b: macrometástase†

N2

2-3 linfonodos

a: micrometástase* b: macrometástase† c: metástase(s) em trânsito/satélite(s) sem linfonodos metastáticos

N3

4 ou mais linfonodos com metástase, ou metástase(s) em trânsito/satélite(s) associada com linfonodos metastáticos

Classificação M

Localização

M1a

Pele à distância, subcutâneo ou metástases em linfonodos Normal

M1b

Metástases pulmonares

Normal

M1c

Quaisquer outras metástases viscerais

Normal

Qualquer metástase à distância

Elevada

Desidrogenase lática sérica

*

Micrometástases são diagnosticadas após linfadenectomia seletiva (BLNS) eletiva.



Macrometástases são definidas como metástases em linfonodos clinicamente detectáveis confirmadas por meio de linfadenectomia terapêutica ou quando metástases em linfonodos exibem grande extensão extracapsular. (Reproduzido a partir de Balch CM, Gershenwald JE, Soong SJ, et al. Final version of 2009 AJCC melanoma staging and classification. J Clin Oncol. 2009; 27:6199 – 6206.)

Tabela 31.3 Grupo de estadiamento/prognóstico do melanoma Estágio 0

Tis

N0

M0

Estágio IA

T1a

N0

M0

Estágio IB

T1b T2a

N0

M0

Estágio IIA

T2b T3a

N0

T3b T4a

N0

T4b

N0

M0

Estágio IIIA T1-4a T1-4a

N1a N2a

M0

Estágio IIIB

N1a N1b N1b N2c

M0

Estágio IIIC T1-4b N1b T1-4b N2b T1-4b N2c Qualquer T N3

M0

Estágio IV

M1

Estágio IIB Estágio IIC

T1-4b T1-4b T1-4a T1-4a

Qualquer T

M0 N0

M0 M0

N0

Qualquer N

M0

M0 M0 M0 M0 M0 M0 M0

(Reproduzido a partir de Balch CM, Gershenwald JE, Soong SJ, et al. Final version of 2009 AJCC melanoma staging and classification. J Clin Oncol. 2009; 27:6199 – 6206.)

Subtipos histológicos de melanoma Enquanto o subtipo morfológico ou histológico não está necessariamente relacionado com o comportamento clínico, a subclassificação é importante para o reconhecimento patológico e para o diagnóstico. O melanoma pode ser classificado morfologicamente em quatro padrões principais de crescimento: lentigo maligno, disseminativo superficial, nodular e acral lentiginoso (Fig. 31.12). O melanoma disseminativo superficial (Fig. 31.12B) representa 50%-80% de todos os tipos e é caracterizado pela fase de crescimento radial (horizontal) por um período de anos antes da evolução para a fase de crescimento vertical. O melanoma nodular (Fig. 31.12C), por outro lado, evolui para a fase de crescimento vertical precocemente durante o seu desenvolvimento e representa 20%-30% do grupo, porém em algumas séries de casos ele pode constituir a maioria das lesões.45 O lentigo maligno melanoma (Fig. 31.12A) se diferencia do melanoma disseminativo superficial e do melanoma nodular devido à sua localização nas superfícies do corpo expostas ao sol e em lesões do tipo lentigo maligno preexistentes (mancha melanótica de Hutchinson). Acreditava-se que este tipo morfológico de melanoma possuía um prognóstico melhor do que os outros tipos em virtude do seu comportamento biológico diferenciado, porém foi demonstrado que ele possui prognóstico idêntico ao do melanoma superficial disseminado com profundidades de invasão comparáveis.46 Foi demonstrado que o lentigo maligno do melanoma cresce principalmente de maneira horizontal mais que de maneira vertical, resultando em lesões mais delgadas que no melanoma disseminativo superficial ou melanoma nodular, razão do seu suposto melhor prognóstico.

FIG. 31.12 Vários tipos morfológicos de melanoma. (A) Lentigo maligno melanoma: lesão plana e fina no meio de uma área despigmentada em uma mancha de Hutchinson. (B) Melanoma extensivo superficial: lesão plana com células proliferando no plano horizontal. (C) Melanoma nodular: lesão mais espessa crescendo no plano vertical. (D, E) Melanoma acral lentiginoso no pé e no leito ungueal.

O melanoma acral lentiginoso surge na palma das mãos, solas dos pés (Fig. 31.12D), regiões subungueais dos dedos das mãos e dos pés (Fig. 31.12E) e espaços interdigitais.47 A importância do melanoma subungueal é que o mesmo é frequentemente confundido com uma infecção fúngica, fazendo com que o tratamento adequado possa ser inadvertidamente tardio devido ao atraso na obtenção de uma biopsia diagnóstica. Presumivelmente devido ao diagnóstico tardio, este tipo de melanoma possui as menores taxas de sobrevida em 5 anos de todas as variedades histológicas, geralmente variando de 10%-20%.22,48 Enquanto estudos mais antigos sugerem que o prognóstico possa estar associado ao subtipo histológico (p. ex., acreditava-se que os pacientes com melanomas nodulares possuíam pior prognóstico do que pacientes com melanomas disseminados superficiais),49 análises multivariadas mais recentes demonstram que essas diferenças prognósticas se dão mais provavelmente devido às outras características histológicas (ou seja, espessura e ulceração do tumor).50 Outra variante clínica menos comum do melanoma, o melanoma desmoplásico, geralmente não produz pigmento e cresce na superfície externa da pele. Ele pode ter a aparência de uma cicatriz hipertrófica (Fig. 31.13A) em uma localização na qual o paciente não se lembra de ter sofrido uma lesão na pele. Ele deve ser diferenciado clinicamente de um dermatofibroma e outros tumores benignos ou malignos da derme. A avaliação histológica revela um crescimento cicatricial da lesão com melanócitos malignos se apresentando como células fusiformes (Fig. 31.13B).51-53 Este subtipo histológico deve ser diferenciado do melanoma amelanótico (Fig. 31.14), o qual é simplesmente uma variedade do melanoma nodular ou disseminativo superficial que não está produzindo grânulos de pigmento em quantidade suficiente para que se apresente como uma lesão pigmentada. Em uma série de casos de melanomas, a incidência do melanoma amelanótico foi

de 1,8%.54

FIG. 31.13 (A) O melanoma desmoplásico frequentemente não é pigmentado e possui a aparência de uma cicatriz hipertrófica. (B) Visualização em menor aumento de um melanoma desmoplásico demonstra a proliferação tumoral de maneira cicatricial. (C) Visualização em maior aumento da lesão demonstra a variante de células fusiformes dos melanócitos malignos com produção de alguns grânulos de melanina.

FIG. 31.14 A falta de produção de pigmento neste melanoma amelanótico pode levar à confusão com uma lesão que possa não ser sugestiva de malignidade.

Fatores histopatológicos de significado prognóstico Em relação à avaliação da lesão primária sozinha, demonstrou-se que a profundidade da invasão do melanoma na derme é o fator prognóstico mais importante. Em 1965, Mehnert e Heard55 relataram a primeira correlação da profundidade com o prognóstico. Alguns anos depois, Clark et al.56 descreveram o seguinte sistema de níveis de classificação de profundidade da invasão na derme (Fig. 31.15):

FIG. 31.15 A classificação de Clark do melanoma depende da determinação qualitativa da extensão da invasão nas várias áreas da derme e tecido celular subcutâneo. A classificação de Breslow é determinada pela leitura micrométrica mensurada em milímetros da profundidade de invasão na derme.

Nível I: melanoma in situ; limitado à junção dermo-epidérmica Nível II: invadindo a derme papilar, porém sem expansão além desta camada Nível III: invadindo e expandindo na derme papilar, porém sem invadir a derme reticular (para a interface da derme papilar – reticular)

Nível IV: invadindo a derme reticular, porém não invadindo a gordura subcutânea Nível V: invadindo a gordura subcutânea ou os tecidos subjacentes. A dificuldade com este sistema de classificação é a natureza qualitativa e um tanto subjetiva da determinação da profundidade de invasão. Vários patologistas avaliando uma lâmina histológica com invasão da região média da derme frequentemente não concordam em relação ao nível de invasão de Clark; alguns podem classificá-la como de nível III, enquanto outros a classificarão como de nível II profunda e outros ainda a classificarão como nível IV inicial. Conforme resultado dessa dificuldade, Breslow57 descreveu um método de mensuração quantitativa que emprega um sistema simples e facilmente reprodutível de microestadiamento. De acordo com Breslow, a profundidade de invasão do melanoma é mensurada em décimos de milímetros como a espessura desde a superfície do tumor na epiderme até a célula tumoral mais profunda identificável por meio de um micrômetro ocular no microscópio. Em diversos estudos utilizando análises multivariadas,43,45 o método de Breslow demonstrou ser o indicador prognóstico mais poderoso para sobrevida para os melanomas em estágio inicial (ou seja, doença limitada ao tumor primário). Fatores adicionais que demonstraram, em análises multivariadas com vários milhares de pacientes, estar associados com a recorrência e a sobrevida incluem: ulceração na lesão, a taxa mitótica da lesão, a idade e o sexo do paciente, a localização da lesão primária e o tipo morfológico do melanoma.43,58

Categoria T do sistema de estadiamento TNM Os fatores histopatológicos incorporados na categoria T no sistema de estadiamento TNM de 2010 são a espessura do tumor primário, ou seja, a profundidade de Breslow,57 a presença ou ausência de ulceração do epitélio sobrejacente e a taxa mitótica.43,44 A espessura do tumor primário (T) define quatro categorias (Tabela 31.2): T1: ≤ 1,0 mm; T2: 1,01-2,0 mm; T3: 2,01-4,0 mm; T4: > 4,0 mm. O aumento na espessura do tumor está intimamente correlacionado a um prognóstico pior. A sobrevida em 10 anos diminui progressivamente, de 96% para pacientes com lesões primárias 1mm de espessura. Seguimento de 7 anos (média de 45 meses)

(Informações provenientes de Stephens, PI, Ariyan S, Ocampo RJ, et al. The predictive value of lymphoscintigraphy for nodal metastases of cutaneous melanoma. Conn Med. 1999;63:387.)

Biopsia de linfonodo sentinela Conforme mencionado previamente, a disponibilidade do mapeamento linfático por meio de BLNS evidenciou um possível papel para a DELN no tratamento do melanoma cutâneo. O conceito do linfonodo sentinela se baseia no princípio de que toda a linfa proveniente de tecidos específicos é filtrada por linfonodos e que o primeiro linfonodo (ou sentinela) filtrante de um local específico pode ser removido e avaliado quanto à presença de metástase de células malignas. A validade de todo este princípio se baseia na doutrina de que: regiões distintas drenam para linfonodos específicos; o linfonodo sentinela pode ser encontrado; um achado negativo na biopsia significa que nenhuma outra metástase existe; e que um linfonodo sentinela negativo é verdadeiramente negativo. Morton et al.59 introduziram a técnica de detecção do linfonodo sentinela com a injeção intraoperatória de corante vital azul na derme ao redor do local do melanoma primário. Ele identificou o linfonodo sentinela em mais do que 80% dos pacientes e relatou que as taxas falso-negativas foram de cerca de 5%. Pesquisadores relataram69-71 subsequentemente a utilização de mapeamento linfático pré-operatório e do uso de radiocoloides em conjunto com corantes vitais azuis com um aumento na identificação e remoção com sucesso do linfonodo sentinela com taxas de 98%-99% nos pacientes com melanoma (Fig. 31.18). Baseado em estudos realizados em pacientes com melanoma que foram submetidos à BLNS e linfadenectomia radical da respectiva base linfonodal, assume-se que caso os linfonodos sentinelas não estejam acometidos, a base inteira deve estar livre de tumor em 96% dos casos.59,69,72

FIG. 31.18 Dissecção de linfonodo sentinela. Corante azul injetado na derme (A) no local do melanoma primário pode ser detectado no interior de vasos linfáticos (B). O radiocoloide injetado na derme é detectado por um contador portátil de radiação gama (C) para localizar o linfonodo sentinela (D). Um segundo linfonodo (E) também foi identificado próximo ao primeiro.

Categoria N do sistema TNM A BLNS se tornou amplamente a conduta padrão na avaliação inicial do melanoma cutâneo, particularmente para pacientes com melanomas mais espessos que 1 mm de espessura. A probabilidade de encontrar uma metástase no linfonodo nos pacientes com tumores com menos de 1 mm de espessura é bastante baixa (menos de 10%).73-75 Entretanto, a presença de certas características de alto risco, incluindo ulceração e/ou uma alta taxa

mitótica, pode justificar a BLNS em melanomas finos.76-79 A probabilidade de detectar focos metastáticos em uma BLNS aumenta com a espessura da lesão primária. Para lesões 4 mm o risco é de aproximadamente 4%-7%, 12%-20%, 28%-33% e 40%-44%, respectivamente (Tabela 31.5).80,81 O exame é particularmente útil para pacientes com melanomas de espessura intermediária, de 1-4 mm. Entretanto, ele também deve ser considerado no algoritmo de tratamento dos pacientes com tumores mais espessos (>4 mm) uma vez que mesmo que este grupo de pacientes possui um risco de metástase à distância entre 65%-70%, a BLNS ainda pode fornecer informações prognósticas importantes e evitar uma linfadenectomia subsequente em muitos pacientes que posteriormente iriam desenvolver linfonodomegalia.82 Tabela 31.5 Risco de detecção de um linfonodo sentinela positivo Profundidade de Breslow Risco de linfonodo sentinela positivo 4,0 mm

40%-44%

(Informações provenientes de Rosseau DL Jr, Ross MI, Johnson MM, et al. Revised American Joint Comitee on Cancer staging criteria accurately predict sentinel lymph node positivity in clinically node-negative melanoma patients. Ann Surg Oncol. 203; 10:569 – 574 e Morton DL, Hoon DS, Cochran AJ, et al. Lymphatic mapping and sentinel lymphadenectomy for early-stage melanoma: therapeutic utility and implications of nodal microanatomy and molecular staging for improving the accuracy of detection of nodal micrometastases. Ann Surg. 2003; 238:548 – 549.)

Baseado nas avaliações do Banco de Dados de Estadiamento do Melanoma da AJCC, o status do linfonodo tem sido demonstrado ser o principal fator prognóstico de sobrevida.83-85 Para pacientes com doença linfonodal clinicamente detectável (macrometástases), as características do tumor primário se tornam essencialmente irrelevantes no que diz respeito à taxa de sobrevida em 5 anos. Isto é, espessura, ulceração e taxa mitótica não apresentam resultados estatisticamente significativos em análises multivariadas.86 Como a maioria dos pacientes se apresenta sem acometimento linfonodal clinicamente detectável, o objetivo da BLNS é identificar os pacientes com metástases microscópicas nos linfonodos tão cedo quanto possível, de modo que eles possam se beneficiar da remoção precoce desses linfonodos com focos metastáticos antes da doença se espalhar mais, além de considerar esses pacientes para tratamento adjuvante. Nos pacientes com doença linfonodal (incluindo aqueles com doença linfonodal microscópica) foi demonstrado que o fator prognóstico mais importante é o número de linfonodos acometidos.86 A categoria linfonodo (N) da edição de 2010 do sistema TNM da AJCC (Tabela 31.2) para melanoma inclui as seguintes designações: Nx: linfonodos não estão acessíveis (p. ex., previamente removidos por outras razões) N0: sem metástase linfática regional N1: um linfonodo acometido N1a: micrometástase N1b: macrometástase N2: dois a três linfonodos acometidos N2a: micrometástases N2b: ao menos um linfonodo com macrometástase N2c: metástase em trânsito ou satelitose sem acometimento linfonodal N3: quatro ou mais linfonodos positivos, linfonodos coalescidos ou metástases em trânsito/satélites associadas a um ou mais linfonodos positivos A presença de metástases em trânsito ou acometimento linfonodal classifica o paciente como de estádio III, com subclassificação (IIIA, IIIB ou IIIC) dependendo da extensão da doença linfática (Tabela 31.3).

Avaliação da doença sistêmica A avaliação do paciente com melanoma maligno requer um exame físico completo do local primário e dos linfonodos regionais de drenagem para detectar quaisquer evidências clínicas de lesões satélites ou em trânsito (metástases) na pele ou metástases linfonodais. O abdome deve ser examinado na busca por evidências de

aumento de volume no fígado ou baço ou por massas que possam sugerir metástases intra-abdominais. A extensão da avaliação e os testes requisitados para tais avaliações são pressupostos de acordo com o estádio ao diagnóstico primário (Tabela 31.6). Uma radiografia torácica pode ser indicada para avaliar a presença de metástases pulmonares e a tomografia computadorizada do tórax pode ser incluída para buscar por lesões iniciais pequenas. Os testes de função hepática são simples, sensíveis e confiáveis para a detecção de metástases hepáticas e, quando os resultados são negativos, podem servir como padrão para os exames de acompanhamento anuais posteriores. A desidrogenase lática sérica (DHL) foi identificada como um fator prognóstico independente importante nos pacientes com melanoma disseminado. A Base de Dados de Estadiamento do Melanoma da AJCC incluiu 7.972 pacientes com metástase à distância e as taxas de sobrevida de 1 e 2 anos foram significativamente menores nos pacientes com DHL sérica elevada (32% contra 65% e 18% contra 40%).43 Consequentemente, a DHL sérica deve ser mensurada no momento em que a doença de estágio IV é documentada, uma vez que ela fornece informação prognóstica importante. Tabela 31.6 Avaliação do estadiamento: exames recomendados para determinação da presença e extensão da disseminação tumoral Tumor primário (sem evidência clínica de outro envolvimento) Exame físico Raio X de tórax Exames de função hepática Linfocintilografia para detectar a localização dos linfonodos sentinela (caso o tumor primário possua 1 mm ou mais de espessura) Doença local e regional (metástase em trânsito ou acometimento linfonodal) Exame físico Exames de função hepática Tomografia computadorizada: do tórax e abdome (para avaliar pulmões e fígado) da pelve caso o tumor acometa extremidades inferiores do pescoço caso o tumor acometa cabeça e pescoço Linfocintilografia para detectar a localização dos linfonodos sentinelas Imagens adicionais se clinicamente indicadas por sinais e sintomas Metástases em órgãos distantes Exame físico Exames de função hepática e nível de desidrogenase lática sérica Tomografia computadorizada, tal qual indicado acima Ressonância magnética caso seja necessário avaliar a extensão da invasão de partes moles Tomografia computadorizada por emissão de pósitrons (PET-CT) para detectar a extensão do acometimento tumoral de órgãos vitais (pulmão, fígado, cérebro)

Tomografia computadorizada Apesar de radiografias tomográficas dos pulmões serem úteis na detecção de metástases pulmonares, a tomografia computadorizada (TC) do tórax e do abdome não oferece uma vantagem significativa como teste de triagem inicial em detrimento de radiografias torácicas e exames de função hepática.87 Mesmo que esta técnica de imagem necessite de uma interpretação habilidosa para utilização ser otimizada, avaliações demonstraram que radiografias torácicas de triagem, uma modalidade de custo muito mais baixo, são tão úteis como imagens de TC para a detecção de lesões metastáticas no momento do diagnóstico inicial. Entretanto, imagens de TC oferecem um potencial superior para uma detecção de lesões metastáticas em vários órgãos e elas são bastante úteis para a avaliação do cérebro (Fig. 31.19).

FIG. 31.19 A tomografia computadorizada do cérebro pode detectar lesões pequenas. Neste paciente, várias lesões são observáveis em ambos os hemisférios.

Enquanto que os pacientes com melanomas primários mais espessos que 1 mm são considerados de risco moderado, aqueles com lesões maiores que 2 mm são considerados de alto risco para metástases. Pacientes com doença no estádio III certamente são candidatos para vigilância intensiva. Estes pacientes de alto risco devem ser examinados na busca por metástase por meio de imagens de TC do tórax e do abdome, as quais permitem que o médico avalie os pulmões, o fígado e o baço em um só exame. As imagens de TC potencializadas do cérebro também devem ser consideradas. Por outro lado, imagens de TC também podem ser úteis para o estadiamento da doença nos pacientes que se apresentam para avaliação clínica com extensão local ou regional da doença. Em alguns pacientes, a extensão da doença detectada por meio da utilização de imagens de TC pode ser elaborada pela utilização de imagens de ressonância magnética (Fig. 31.20). A tomografia por emissão de pósitrons (PET) demonstrou ter valor na avaliação de pacientes no que diz respeito à extensão de sua doença e da atribuição do estádio.88,89 O metabolismo aumentado do tumor é refletido pela captação aumentada de glicose marcada com componentes radioativos, a qual é representada pela atividade de brilho mais intensa no local das metástases (Fig. 31.21). Na ausência de processos infecciosos, a taxa de falso-positivo foi documentada como sendo menor do que 5% com imagens obtidas com PET. As restrições para a utilização de imagens obtidas com PET são a disponibilidade limitada de equipamentos e o alto custo destas avaliações.

FIG. 31.20 Ressonância magnética, neste caso cerebral, demonstra a invasão de partes moles pelo melanoma.

FIG. 31.21 Tomografia por emissão de pósitrons do tórax e do abdome (direita) confirma a atividade aumentada de lesões metastáticas observadas na tomografia pulmonar (superior esquerda) e hepática (inferior esquerda).

Categoria M do sistema TNM O sistema de estadiamento do AJCC categoriza os pacientes com metástases à distância de acordo com o(s) local(is) de acometimento pela doença e o nível de DHL sérica (Tabela 31.2).43,44 M1a, associada com o melhor prognóstico, identifica pacientes com metástases limitadas à pele a distância, subcutâneo ou linfonodos e uma DHL sérica normal. M1b denota pacientes com metástases pulmonares e uma DHL sérica normal. Pacientes M1c possuem o pior prognóstico, com metástases para outras localizações viscerais (ou uma DHL sérica elevada). Em respeito ao estadiamento (Tabela 31.3), qualquer designação de M (ou seja, a presença de qualquer doença metastática além dos linfonodos regionais) aloca o paciente no estádio IV. Apesar de ser um fato raro, pacientes ocasionalmente irão se apresentar para avaliação clínica com melanoma metastático sem um tumor primário identificável. Nessas situações, caso o paciente possua metástases isoladas nos linfonodos, pele ou tecido celular subcutâneo e uma lesão primária desconhecida, o paciente é considerado como de estádio III, na medida em que estudos sugeriram que há uma taxa de sobrevida semelhante (ou até um pouco melhor) quando comparada com aqueles que apresentam acometimento linfonodal e um tumor primário conhecido.90-94 Membros da Força Tarefa de Melanoma do AJCC recentemente desenvolveram uma ferramenta eletrônica de predição para pacientes que se apresentam para avaliação clínica com doença localizada (http://www.melanomaprognosis.org). A ferramenta preditiva pode ser utilizada para predizer as taxas de sobrevida em 1, 2, 5 e 10 anos a partir do diagnóstico inicial (com um intervalo de confiança de 95%) para um único paciente baseando-se na sua relevância clínica e informação patológica. Os modelos preditivos foram desenvolvidos e validados utilizando uma base de dados combinada (n = 28.047) proveniente de 11 grandes instituições e grupos de estudo que participaram do desenvolvimento do Sistema de Estadiamento de Melanoma do AJCC.95

Considerações cirúrgicas e tratamento Biopsia inicial Alguns clínicos questionaram a segurança da biopsia do melanoma maligno por medo de que células tumorais se disseminassem através da circulação sanguínea. Para avaliar este risco, Epstein et al.25 revisaram 170 pacientes com melanoma alocados no Registro de Tumores da Califórnia ao longo de um período de 4 anos, 115 dos quais foram submetidos à biopsia do melanoma antes do tratamento cirúrgico e 55 que não foram submetidos à tal procedimento. As taxas de cura em 5 e 10 anos, assim como as taxas de cura relativa pareadas por meio de avaliação da tabela de vida para eliminar diferenças na distribuição etária entre os dois grupos, foram mais favoráveis para os pacientes que foram submetidos à biopsia prévia. Os resultados deste estudo sugeriram que a biopsia não aumentaria as taxas de cura, mas que uma remoção incompleta do melanoma por meio de uma biopsia cirúrgica seguida da cirurgia definitiva não diminuiria a taxa de cura. Estudos adicionais confirmaram tal observação – um realizado nos EUA com 230 pacientes96 e um estudo subsequente realizado na

Dinamarca97 com 225 pacientes acompanhados por um mínimo de 5 anos. O papel do tipo de biopsia em relação à sobrevida foi especificamente avaliado por Lederman e Sober98 em 472 pacientes: 119 foram submetidos à biopsia incisional (punch ou incisional) e 353 foram submetidos à biopsia excisional. Após parear outros fatores, especialmente a espessura tumoral, não foi demonstrada diferença estatisticamente significativa entre os pacientes dos grupos com tipos de biopsia diferentes. É importante salientar que a biopsia da lesão (incisional ou excisional) irá realizar o diagnóstico do melanoma assim como demonstrar a agressividade da lesão por meio da avaliação do grau de invasão na derme. Nossa recomendação é de que, caso a lesão seja pequena, uma biopsia excisional seja realizada com uma margem de 1-2 mm de pele com aparência normal de modo a permitir ao patologista produzir um diagnóstico confiável e para determinar a profundidade mais espessa de invasão. Entretanto, caso aspectos funcionais ou estéticos impeçam a fácil remoção da lesão por completo, uma biopsia incisional ou uma biopsia por punch é uma alternativa aceitável. A única desvantagem dessa biopsia parcial é que a excisão terapêutica final pode demonstrar uma lesão que seria classificada com uma profundidade de invasão maior do que a que foi inicialmente diagnosticada. Em alguns casos, o paciente seria elegível para a biopsia com linfonodo sentinela, caso a profundidade adequada tivesse sido avaliada antes da excisão ampla e da reconstrução. Nós não preferimos a saucerização, apesar dela ser aceitável quando o índice de suspeita é baixo e a lesão for ampla (p. ex., saucerização ampla em alguns casos de lentigo maligno e melanoma in situ podem aumentar a amostragem diagnóstica), ou nos casos suspeitos de melanoma subungueal. Uma vez que detalhes específicos da amostra biopsiada ditarão os próximos passos na abordagem do paciente, a amostra deve ser avaliada por um patologista com experiência na avaliação de lesões pigmentadas. Detalhes patológicos que devem ser relatados incluem: espessura de Breslow em milímetros, ulceração histológica, taxa mitótica por mm2, estados das margens periféricas e profunda e o nível de Clark (para lesões ≤1 mm de profundidade). Outros detalhes histopatológicos de significado potencial incluem: satelitose microscópica, regressão, linfócitos infiltrados no tumor, neurotropismo e subtipo histológico.

Excisão local ampla O objetivo da excisão local ampla (ELA) do melanoma é diminuir a incidência de recorrência local, relatada na literatura com variação de 3% até 20%. Em grandes séries de casos, o maior risco de recorrência local foi documentado nos tumores primários nas mãos e nos pés, com uma taxa de recorrência de 11%-12%, ao passo que o risco é de somente 5%-6% para tumores na face, couro cabeludo e orelhas.58 Tem sido amplamente aceito que melanomas com menos do que 0,76 mm de espessura são uniformemente curáveis, tal como relatado por Breslow.57 Breslow e Macht99 relataram em uma pequena série de 62 casos de pacientes com lesões menores do que 0,76 mm que não se desenvolveram recorrências locais nem metástases, independentemente da extensão da margem ampliada. Day et al.100 relataram que, apesar de lesões finas possuírem um bom prognóstico, o prognóstico pode ser pior quando o melanoma está localizado na área BANS, um acrônimo em inglês para tórax porterior, braço, pescoço e couro cabeludo posterior. Por outro lado, Woods et al.101 relataram 11 mortes dentre 400 pacientes com melanomas menores do que 0,76 mm tratados na Clínica Mayo: sete dos melanomas não estavam localizados na área BANS. Em uma série menor de casos, Briggs et al.102 relataram que 10% dos pacientes com melanomas menores que 0,76 mm morreram durante seu seguimento de 10 anos. A Organização Mundial da Saúde103 avaliou a importância da ampliação das margens de ressecção do melanoma primário e da pele normal circundante em um estudo com 593 pacientes com doença clínica em estádio I. A cura não foi influenciada pelas margens de ressecção, porém ela diminuiu com o aumento na espessura do melanoma primário. Em um grande estudo com mais do que 3.400 pacientes, Urist et al.58 notaram que a taxa de recorrência de 146 melanomas do pescoço foi menor do que 2% mesmo que a maioria dos pacientes (84%-87%) tenha sido tratada com margens cirúrgicas de somente 1-2 cm. Em um estudo com 598 pacientes com melanoma em estádio I, o Grupo Cooperativo da Clínica de Melanoma do Hospital Geral de Massachusetts – Universidade de Nova York notou que margens de ressecção de 1,5 cm ou menos estavam associados a uma incidência significativamente maior de recorrências do que quando margens de ressecção maiores do que 1,5 cm haviam sido utilizadas. Entretanto, margens maiores do que 3 cm não levaram a uma taxa de recorrência menor.104 De fato, para melanomas maiores do que 2 mm em espessura, informações retrospectivas sugerem que margens com menos de 2 cm podem diminuir as taxas de cura.58, 105-107 A espessura do melanoma é o fator-chave na determinação da margem de tecido normal recomendada a ser

removida. Entretanto, uma revisão sistemática recente e uma meta-análise de estudos randomizados de margens de excisão cirúrgica no melanoma não demonstraram uma diferença estatisticamente significativa na sobrevida global entre margens cirúrgicas estreitas ou amplas.108 No entanto, as margens recomendadas diminuíram progressivamente como resultado dos vários ensaios clínicos amplos que avaliaram o impacto das margens na recorrência local (Tabela 31.7). Tabela 31.7 Ensaios comparando a ampliação das margens para o melanoma cutâneo Estudo: autor, ano

n

Acompanhamento médio

Espessura da lesão

Margens

Recorrência local (%)

Sobrevida global em 10 anos

Organização Mundial da Saúde: Cascinelli, 1998 111

612 12 anos

0-1 mm 1,1-2,0 mm 0-1 mm 1,1-2,0 mm

1 cm 1 cm 3 cm 3 cm

3/186 (1,6) 5/119 (4,2) 1/173 (0,6) 2/134 (1,5)

87% 87%

Sueco: Cohn-Cedamark, 2000 114

989 11 anos

0,8-2 mm

2 cm 5 cm

3/476 (0,6) 5/513 (1)

79% 76%

Grupo de Cooperação da França: Khayat, 2003 115

326 16 anos

2,0 mm em espessura, uma margem de ao menos 2,0 cm é recomendada. Na determinação da extensão da cirurgia, quer seja na face ou no tronco, é importante considerar o impacto da cicatriz na aparência do paciente. O Grupo de Estudo de Lesões Pigmentadas da Universidade da Pensilvânia avaliou a extensão a partir da qual os pacientes se incomodavam com a cicatriz após uma ressecção de melanoma.104 Os dois fatores que apresentaram impacto negativo foram o grau de depressão cirúrgica ou indentação e a percepção pré-operatória do paciente sobre a futura cicatriz. O comprimento da cicatriz não possui tanto efeito como a extensão da depressão na cicatriz. Desse modo, enxertos de pele são aceitáveis para reconstruções de locais submetidos a ressecção ampla, porém eles causam deformidades significativas (Fig. 31.22), as quais geralmente são evitadas com retalhos cutâneos para cobertura. O autor relatou previamente sobre a segurança da cobertura dessas feridas com retalhos cutâneos.121

FIG. 31.22 Enxertos cutâneos fornecem cobertura adequada para ressecções amplas, porém eles podem levar a deformidades importantes, tal como demonstrado na região infraorbital (A) e no couro cabeludo (B).

Cabeça e pescoço Apesar da pele da cabeça e pescoço corresponder a somente 9% da superfície corporal, 15%-30% de todos os melanomas primários se desenvolvem na cabeça e pescoço.122,123 Melanomas de alto risco na face devem ser removidos tal como descrito acima e cobertos com retalhos adjacentes. Apesar da cobertura local ser possível com enxertos cutâneos, os resultados estéticos não são tão aceitáveis como quando utilizando um retalho. Um retalho cutâneo local ou regional cobre uma ferida na face com uma similaridade na coloração muito mais satisfatória do que com um retalho a distância (Fig. 31.23).

FIG. 31.23 Melanoma na bochecha (A) tratado com uma excisão ampla no local primário (B), uma dissecção cervical funcional completa (C), e cobertura com um grande retalho miocutâneo cervicofacial incorporando o músculo platisma (D). Fotografias de 1 ano de procedimento operatório (E e F).

Uma área difícil de ser recoberta é um defeito cirúrgico por sobre o mento uma vez que esta área requer pele que tenha aderência firme à mandíbula, partes moles para contorno e uma boa semelhança do retalho cutâneo com o restante da face. Um retalho a distância simplesmente não fornece uma semelhança de cor satisfatória. Uma excisão ampla desta área pode ser recoberta satisfatoriamente com retalho cutâneo de avanço cervical. Ocasionalmente, o melanoma surge na porção superior da bochecha, requerendo remoção da pele a partir das pálpebras inferiores. Esta área não pode ser recoberta com um retalho cutâneo devido ao fato de necessitar de cobertura fina maleável. A cobertura é melhor obtida por meio de um retalho cutâneo de avanço da bochecha para cobrir a maior parte do defeito e um enxerto de pele de espessura total para as pálpebras. O melhor local para obter este enxerto de pele é a pálpebra superior ipsilateral ou contralateral. A região pósauricular pode constituir uma alternativa aceitável. Em situações nas quais a conservação do tecido é considerada necessária, o exame de congelação pode ser considerado, porém ele possui risco de resultar em falso-negativo.124 Adicionalmente, enquanto investigacional, a cirurgia micrográfica de Mohs pode ser considerada nestas situações ou quando se trata de lesões superficiais de diâmetro grande (p. ex., lentigo maligno). Uma grande série de casos relata que a cirurgia de Mohs125 pode controlar a lesão primária, porém um acompanhamento maior é necessário antes da adoção em larga escala desta técnica.126 O tratamento do lentigo maligno com imiquimod também emergiu como uma terapia efetiva, porém estudos comparativos de longo prazo ainda são necessários.127-130

Extremidades Melanomas finos nas pontas dos dedos das mãos devem ser removidos e o defeito deve ser reconstruído com retalhos cutâneos volares adjacentes (Fig. 31.24) para fornecer cobertura com sensibilidade. Lesões nos dedos das mãos mais espessas que 1mm são mais seguramente tratadas com uma amputação na articulação interfalangeana (Fig. 31.25) ou uma amputação em raio, dependendo da extensão do tumor. O melanoma subungueal dos dedos das mãos deve ser ressecado ao nível da articulação interfalangeana distal para preservar a função.131 De modo semelhante, melanomas subungueais que acometem os dedos dos pés devem ser abordados com a amputação do dedo na articulação metatarsofalangeana.

FIG. 31.24 Melanoma na ponta do dedo (A) removido em conjunto com a unha, matriz e leito ungueais (B). A ferida foi coberta com um retalho volar de avanço (C e D). O polegar permaneceu livre de doença após 4 anos da cirurgia (E).

FIG. 31.25 Melanomas mais espessos nos dedos (A) necessitam ser tratados mais agressivamente com amputação na articulação interfalangeana (B) ou amputação em raio (C-E).

Melanomas no dorso da mão, no antebraço e na perna devem ser tratados com uma excisão ampla. Essas feridas cirúrgicas têm sido tradicionalmente recobertas com enxertos de pele com sucesso. Entretanto, a cobertura dessas incisões amplas com retalhos cutâneos locais (Fig. 31.26) tem sido conseguida controlando com sucesso o sítio primário e com um resultado estético mais aceitável.121 Além disso, estes pacientes não necessitam ter o braço ou perna imobilizados, tendo ainda uma menor estadia hospitalar do que os que são

submetidos à enxertia de pele.

FIG. 31.26 Excisões amplas de melanomas nas mãos, antebraços e pernas (A) podem ser tratados com retalhos locais de transposição (B) de modo a permitir ao paciente utilizar as extremidades precocemente no período pós-operatório (C).

Os melanomas dos pés e dos dedos dos pés geralmente são do tipo acral lentiginoso. Estes tumores se disseminam agressivamente e possuem uma alta incidência de recorrência local e regional. Consequentemente, eles são mais adequadamente tratados utilizando ressecções agressivas (Fig. 31.27). Uma vantagem significativa da utilização de retalhos cutâneos nas extremidades inferiores é de que os pacientes podem ser capazes de deambular no dia seguinte após a cirurgia e deixar o hospital muito mais precocemente do que pacientes tratados com enxertos de pele.

FIG. 31.27 Melanoma na região plantar (A) pode ser recoberto por um retalho fasciocutâneo arterial (B-E).

Tronco Melanomas primários do tronco devem ser removidos com margens mais liberais (de 2-4 cm caso seja necessário) e ainda serem fechados facilmente. Algumas áreas podem ser fechadas por meio de descolamento amplo e grandes retalhos cutâneos de avanço. Por outro lado, essas áreas podem ainda ser facilmente fechadas por um ou mais retalhos cutâneos locais (Fig. 31.28). A fáscia profunda e o músculo podem ser preservados caso não estejam acometidos por invasão tumoral.

FIG. 31.28 Na região do tronco, melanomas espessos podem ser removidos amplamente (A) e ainda assim serem fechados de maneira confiável com amplos retalhos de transposição (B).

Linfadenectomia A decisão de realizar uma linfadenectomia em um paciente com melanoma necessita ser bem pensada. Nos pacientes que se apresentam para avaliação clínica com linfadenopatia palpável, é apropriado confirmar o diagnóstico por meio de punção aspirativa com agulha fina, biopsia do tipo core ou biopsia a céu aberto do(s) linfonodo(s) clinicamente aumentado(s). Na ausência de evidência radiológica de metástase a distância, uma excisão ampla do local primário e uma dissecção completa da base linfonodal acometida são indicados. Para fins de estadiamento, o número de linfonodos positivos, o número total de linfonodos examinados e a presença

ou ausência de extensão tumoral extranodal devem ser registrados.120 De nota, nas extremidades inferiores, quando o PET ou TC pélvica revelarem linfadenopatia ilíaca e/ou obturatória, ou caso o linfonodo de Cloquet seja positivo, a dissecção ilíaca deve ser considerada.132,133 Entretanto, a maioria dos pacientes irá se apresentar para avaliação sem evidências clínicas de doença linfonodal e alguns irão requerer BLNS (com finalidade de estadiamento). A decisão acerca de quais pacientes serão submetidos à BLNS depende do estádio patológico da lesão primária. Tal como citado previamente, a BLNS deve ser considerada nos pacientes com melanomas primários que demonstram agressividade biológica. Especificamente, isto inclui melanomas de estádio IA com características prognósticas adversas (ou seja, espessura ≥1,0 mm, margens profundas positivas, invasão linfovascular ou pacientes jovens), melanomas de estágio IB e II, assim como pacientes com doença em trânsito estádio III ressecável.120 A decisão acerca da realização de uma BLNS é, em última instância, do paciente e do médico responsável pelo tratamento, devendo ser realizada concomitantemente à ampliação de margens.120 Caso o linfonodo sentinela seja negativo, a dissecção de linfonodos regionais não é indicada. Caso o linfonodo sentinela seja positivo, deve ser oferecida ao paciente a dissecção linfonodal radical; 15%-20% destas dissecções irão apresentar melanoma em linfonodos não sentinelas.134,135 Foi demonstrado que fatores relacionados aos linfonodos sentinelas podem ser de auxílio na predição da presença de melanoma em linfonodos não sentinelas: tamanho do foco metastático, número de focos metastáticos e extensão extracapsular.136,137 De nota, estes pacientes de estágio III devem ser avaliados para tratamento adjuvante com interferon-alfa (IFN-α), especialmente se eles não apresentarem qualquer comorbidade grave e possuírem uma expectativa de vida razoável. O Ensaio Multicentro de Linfadenectomia Seletiva (EMLS) foi um amplo ensaio designado para caracterizar o papel do mapeamento linfático com BLNS na determinação do prognóstico e seu impacto na sobrevida.138 O grupo do estudo primário incluiu 1.347 pacientes com melanomas de espessura intermediária (1,2-3,5 mm) que foram randomicamente divididos entre ampliação das margens cirúrgicas e observação ou ampliação das margens cirúrgicas com mapeamento linfático e BLNS. No grupo de observação, caso metástases palpáveis nos linfonodos se tornassem evidentes, o paciente seria submetido a uma linfadenectomia radical. De modo semelhante, no grupo com BLNS, caso a BLNS fosse histologicamente positiva, o paciente seria submetido imediatamente à uma linfadenectomia radical. A terceira de cinco análises interinas planejadas foi publicada em 2006.138 Sob uma média de acompanhamento por 60 meses, os achados no grupo de estudo primário confirmaram o papel da BLNS como uma ferramenta prognóstica. Um benefício na sobrevida não foi demonstrado para toda a população de estudo randomicamente eleita para mapeamento linfático e BLNS. Entretanto, entre os pacientes que apresentavam doença nos linfonodos, os pacientes do grupo de observação que subsequentemente desenvolveram metástases nos linfonodos apresentavam mais linfonodos acometidos no momento da linfadenectomia (3,3 contra 1,4 linfonodos) e uma taxa de sobrevida em cinco anos significativamente menor (52,4% contra 72,3%). Em relação aos pacientes com metástases nos linfonodos provenientes de melanomas com origem desconhecida, Reintgen et al.139 revisaram 124 pacientes e demonstraram que a linfadenectomia regional resultou em uma taxa de sobrevida igual à de pacientes com linfadenectomia e melanomas primários com localização conhecida. Entretanto, não se deve realizar a simples excisão apenas do linfonodo palpável acometido, uma vez que é muito provável que outros linfonodos possuam micrometástases. Esta questão será respondida pelo ensaio EMLS II que está em progresso atualmente. Enquanto isso, o único tratamento aceitável é a linfadenectomia radical da cadeia linfonodal regional.

Linfadenectomia cervical Pacientes com melanoma na face e couro cabeludo anterior (Fig. 31.29) que são selecionados para linfadenectomia cervical devido à presença de linfonodos sentinelas positivos também devem ser considerados para parotidectomia superficial no lado ipsilateral uma vez que os linfonodos pré-parotídeos constituem o primeiro escalão na drenagem linfática. A linfadenectomia cervical (Fig. 31.30) pode ser realizada com ou sem preservação do nervo acessório espinhal, veia jugular interna e músculo esternocleidomastoideo para promover uma aparência mais aceitável e funcionalidade do pescoço e músculos do ombro.140

FIG. 31.29 Melanoma no vértice do couro cabeludo (A) com drenagem linfática para linfonodos parotídeos e cervicais bilaterais (B). O linfonodo sentinela parotídeo (C) foi positivo (D). Retalhos cicatrizados após a operação (E).

FIG. 31.30 Dissecção cervical radical funcional pode ser realizada preservando o músculo esternocleidomastoideo (ECM), a veia jugular interna (JI) e o nervo acessório espinhal (AE). AM, nervo auricular magno; T, trapézio; PB, plexo braquial.

Linfadenectomia axilar O paciente está disposto em decúbito dorsal com o braço em abdução e colocado livremente em uma braçadeira. Todo o braço, incluindo a mão, é preparado para cirurgia e enfaixado, de modo que o braço possa ser movimentado de acordo com a necessidade durante o procedimento. Faça uma incisão proeminente em formato de S com a porção média localizada transversalmente através do ápice da axila, com um braço da incisão descendo ao longo da porção anterior da borda lateral do músculo peitoral maior (Fig. 31.31) e o outro braço descendo ao longo da borda posterior da porção superior do braço. Eleve as duas abas de pele opostamente ao nível da fáscia de Scarpa para expor o conteúdo axilar.

FIG. 31.31 Incisão axilar em forma de S (A) para criar retalhos opostos gerando maior acesso aos conteúdos axilares (B). Ler texto para maiores informações.

Identifique a veia braquial ao longo do braço e a disseque na região proximal da axila a partir da porção anterior da região superior do braço até a porção posterior. Disseque o conteúdo axilar por completo deste modo, movendo em uma direção distal para proximal. Ligue e seccione os ramos da veia braquial. Entretanto, deixe a artéria, veia e nervo toracodorsais intactos. Disseque o conteúdo axilar a partir da borda lateral do músculo peitoral maior, deixando a fáscia muscular para trás junto com a musculatura. Libere o conteúdo a partir da superfície posterior do músculo peitoral maior, o qual é então retraído para expor o músculo peitoral menor. Disseque a gordura e os conteúdos linfáticos a partir da porção traseira dos músculos peitoral maior e menor e retraia este material em direção inferior. Utilizando uma esponja cirúrgica, rebata os conteúdos axilares para fora da parede torácica em direção caudal. Esta manobra geralmente expõe o nervo torácico longo na extensão da parede torácica. Preserve este nervo. Após o conteúdo axilar ser removido, reposicione as abas de pele e suture-as fechando sobre drenos de sucção. Estes drenos permanecem no local por 3-10 dias, dependendo da quantidade drenada acumulada em 24 horas. A decisão de remover o dreno deve ser baseada no padrão e na taxa de diminuição da drenagem ao invés da quantidade atual. Os drenos geralmente são possíveis de serem removidos no quinto ou sexto dia. O paciente é instruído a manter o braço esticado durante as horas de vigília para diminuir as forças de cisalhamento nos tecidos dissecados e, desse modo, diminuir a drenagem.

Linfadenectomia pélvica e inguinofemoral A excisão dos linfonodos inguinofemorais é facilitada pela realização de uma incisão horizontal ao longo da prega de pele 2 cm acima e paralela à região inguinal e de uma incisão vertical por sobre os vasos femorais, iniciando-se na prega de pele inguinal e se estendendo inferiormente por 8-10 cm. Esta abordagem resulta em uma incisão em T “interrompida” (Fig. 31.32). Continue a incisão cutânea na região inguinal até a fáscia do músculo oblíquo externo e separe suas bordas para expor o músculo oblíquo interno. Disseque esta origem do músculo oblíquo interno da crista ilíaca para fornecer acesso ao espaço retroperitoneal. Rebata o peritônio ao longo da superfície inferior da fáscia transversal dos vasos e linfonodos ilíacos externos. Isto possibilita uma excelente visualização dos linfonodos para a linfadenectomia pélvica.

FIG. 31.32 Uma incisão “interrompida” em T (A e B) é utilizada para acessar tanto os linfonodos inguinais como os ilíacos. A fáscia do músculo oblíquo externo é aberta (C) e o oblíquo interno e o transverso são dissecados a partir do ligamento inguinal e da crista ilíaca. O peritônio é rechaçado por manobra digital (D) de modo a conseguir acesso retroperitoneal ao linfonodos ilíacos e obturatórios (E).

Eleve as abas de pele em ambos os lados das incisões femorais ao nível da fáscia de Scarpa, assim como a pele abaixo da incisão horizontal (Fig. 31.33). Eleve a pele completamente desde a incisão inguinal até a porção inferior da incisão femoral. Disseque a gordura e os tecidos linfáticos femorais até a fáscia muscular, porém sem incluí-la na dissecção. Continue a dissecção cranialmente na superfície da fáscia muscular até que a veia safena e a croça da safena sejam alcançados na veia femoral.

FIG. 31.33 Os linfonodos femorais são acessados por meio de uma incisão vertical sobre a região dos vasos femorais. Após os retalhos medial e lateral serem elevados (esquerda), o tecido celular subcutâneo que contém os linfonodos é dissecada de modo a expor a fáscia muscular profunda (direita).

Disseque os conteúdos na região inguinal descendo até a fáscia do músculo oblíquo externo e em direção caudal para comunicar com a dissecção femoral. Não remova a fáscia do músculo ou transponha os músculos adjacentes aos vasos femorais para recobrir estes vasos. Tais procedimentos aumentam o risco de linfedema. Feche as feridas ao longo dos cateteres de sucção que permanecerão no local por 3-10 dias. É permitido aos pacientes a deambular já na noite ou na manhã seguinte à cirurgia.

Tratamento adjuvante para o melanoma A ELA é o procedimento padrão para o melanoma em estádio inicial, sendo que a maioria dos pacientes se apresenta para avaliação clínica com doença nos estádios I-IIA. Entretanto, pacientes de alto risco com doença nos estádios IIB-III geralmente possuem um pior prognóstico. Estes pacientes têm sido alvo primário para o desenvolvimento de tratamentos adjuvantes para o melanoma. Ao longo dos últimos 30 anos, várias tentativas de tratamento realizadas com agentes quimioterápicos (p. ex., dacarbazina141), adjuvantes imunológicos inespecíficos (p. ex., vacina com o bacilo de Calmette-Guérin (BCG)141) e agentes hormonais (p. ex., acetato de megestrol) não demonstraram benefícios em comparação com a observação ou com placebo. Os resultados mais promissores foram demonstrados com a utilização de IFN-α, um modulador da imunidade que pode induzir atividade antitumoral.

Interferon-α Estudos clínicos iniciais com utilização de IFN-α demonstraram atividade antitumoral nos pacientes com melanoma metastático. Uma série de ensaios clínicos foi iniciada para avaliar o papel do IFN-α adjuvante nos pacientes com melanoma de alto risco. Cada um destes ensaios possui doses e protocolos diferentes, sendo que uma abordagem otimizada da administração de IFN-α ainda não foi estabelecida. A revisão de informações combinada com ensaios controlados randomizados múltiplos demonstrou que a administração de IFN-α está associada a uma melhora na sobrevida livre de doença, porém não na sobrevida global.142 O papel do IFN-α adjuvante nos pacientes com melanoma de risco intermediário para alto permanece indefinido.143 O tratamento com IFN-α deve ser individualizado após discussão com o paciente, discutindo-se os potenciais benefícios e efeitos colaterais associados ao tratamento realizado com administração de IFN-α.144 Para os pacientes com estádio IIB até o estádio III e cuja doença foi ressecada, o National Comprehensive Cancer Network (NCCN) dos Estados Unidos recomenda considerar tratamento adjuvante com IFN-α ou a inclusão em ensaio clínico.120

Radioterapia Quando a remoção do melanoma primário com margens adequadas não é possível, o tratamento adjuvante radioterápico pode ser considerado, apesar de geralmente não ser recomendado para o tratamento primário do melanoma cutâneo. Em circunstâncias excepcionais, para pacientes que seriam candidatos ruins para ressecção

cirúrgica, a radioterapia pode oferecer uma alternativa para controlar a doença. Estudos antigos feitos por Barranco et al.145 demonstraram que células de melanoma maligno cultivadas diferem de outros tipos de células tumorais no que diz respeito à sua radiossensibilidade. Eles observaram que a radiorresistência relativa do melanoma pode ser superada pelo aumento na fração da dose individual. Estes estudos auxiliaram a formar a base para a prática clínica e estudos subsequentes auxiliaram a determinar o tamanho ideal da fração e a dose terapêutica total ideal que efetivamente trata o melanoma. Nos pacientes com melanoma extenso do tipo lentigo maligno na face e que não seja passível de ressecção cirúrgica adequada baseando-se em aspectos funcionais ou estéticos, a utilização de radioterapia foi relatada.146 Entretanto, avanços mais recentes em tratamentos tópicos, tais como o imiquimod (Aldara) estão suplantando a radioterapia no tratamento não cirúrgico do melanoma do tipo lentigo maligno. Trabalhos antigos de Habermalz e Fischer demonstraram algum sucesso com radioterapia em alta dose associada a maior fracionamento do que a radioterapia convencional, com regressão parcial ou completa especialmente observada nas metástases subcutâneas.147 Ensaios clínicos prospectivos não randomizados realizados no MD Anderson Cancer Center que trataram grupos de pacientes de alto risco com melanoma utilizando radioterapia auxiliaram a estabelecer as bases do tratamento com radioterapia hipofracionada para o melanoma.148 Enquanto o controle locorregional foi melhorado com a radiação adjuvante, metástases a distância se desenvolveram em um grande número de pacientes (58 de 174 pacientes).148 Estudos posteriores realizados por este grupo avaliaram a sobrevida nos pacientes com metástases clinicamente detectáveis no linfonodo cervical oriundas de melanomas malignos tratados com ressecção cirúrgica ou radiação adjuvante.149 Após acompanhamento por 10 anos, o grupo demonstrou uma taxa de controle regional de 94%. As complicações relacionadas à radiação foram gerenciável nesses pacientes.149 O mesmo grupo avaliou a utilidade da radioterapia exclusiva no tratamento de 36 pacientes com BLNS positiva (em vez da linfadenectomia radical) e demonstrou um controle regional de 93% em 5 anos.150 Entretanto, quando ocorrem recorrências nas regiões irradiadas, a abordagem cirúrgica pode ser muito difícil e evoluir com deiscências e má cicatrização. Estudos recentes têm sido relatados por grupos da Austrália e da Nova Zelândia, incluindo o Grupo de Oncologia Radioativa Trans-tasmânico. Eles estão realizando ensaios prospectivos de radiação versus a observação após a linfadenectomia em pacientes provenientes de 16 diferentes centros.151 Os critérios de inclusão são: ≥1 linfonodos parotídeos, ≥2 linfonodos cervicais ou axilares ou ≥3 linfonodos inguinais positivos; disseminação extranodal do tumor ou linfonodo metastático com diâmetro 3 cm(pescoço ou axila) ou 4 cm (região inguinal). A radioterapia, administrada com dose de 2,4 Gy em 20 frações ao longo de 4 semanas, demonstra uma melhora estatisticamente significativa no controle dos linfonodos na região: 20 de 109 pacientes irradiados e 34 de 108 pacientes observados apresentaram recidiva regional (P= 0,04). Entretanto, apesar da melhora no controle regional, a sobrevida global aparenta ser melhor no grupo em observação (sobrevida média de 47 meses) contra o grupo da radioterapia (sobrevida média de 31 meses), apesar desta avaliação não ser estatisticamente significativa (P= 0,14). Tais informações geraram preocupações acerca dos possíveis efeitos deletérios da radiação como contribuintes para o desenvolvimento de metástases a distância. Essa pergunta ainda não foi respondida. O NCCN recomenda considerar a radioterapia adjuvante para pacientes com múltiplos linfonodos positivos, linfonodos com disseminação extracapsular, recorrência nodal e para metástases em trânsito. Adicionalmente, a radioterapia deve ser considerada após a excisão de melanomas primários que apresentaram neurotropismo (tipo desmoplásico),152 assim como melanomas em mucosas, os quais podem ou não ser responsivos à excisão completa.153,154

Perfusão isolada de membros Recorrências tumorais estão correlacionadas com a espessura da lesão e 60% e 70% destas surgem nos primeiros 18-24 meses após tratamentos cirúrgicos (Tabela 31.8 e Fig. 31.34).155 As recorrências mais precoces ocorrem localmente ou em linfonodos regionais, seguidos por metástases em trânsito. Metástases a distância ocorrem tardiamente.

Tabela 31.8 Momento da recorrência do melanoma após tratamento cirúrgico Localização 18 meses 24 meses 3 anos 5 anos 10 anos Nodal

63%

74%

86%

93%

95%

Local

55%

67%

81%

88%

95%

Em trânsito 55%

67%

80%

90%

97%

Sistêmico

40%

52%

71%

83%

95%

Geral

57%

97%

81%

90%

95%

Modificado a partir de Fusi S, Ariyan S, Sternlicht A. Data on first recurrence after treatment for malignant melanoma in a large patient population. Plast Reconstr Surg. 1993; 91:94)

FIG. 31.34 Padrões e tempos das recorrências no melanoma. As curvas de tempo de recorrência local e metástases em trânsito precedem aquelas de recorrências nodais e metástases em órgãos distantes. (Informações provenientes de Fusi S, Ariyan S, Sternlicht A. Data on first recurrence after treatment for malignant melanoma in a large patient population. Plast Reconstr Surg 1993; 91:94.)

Pacientes com recorrências locais podem ser tratados com ressecções cirúrgicas mais amplas, porém recorrências locais extensas ou metástases em trânsito são mais difíceis de tratar. Metástases em trânsito nas extremidades podem ser tratadas por meio de perfusão isolada de membros utilizando dacarbazina (DTIC),156 cisplatina ou perfusões hipo-osmolares com carboplatina.157 A carboplatina erradica as lesões após a perfusão em alguns pacientes (Fig. 31.35), ao passo que o controle foi temporário em outros pacientes. A vantagem da DTIC é sua baixa incidência de toxicidade hepática e sistêmica, a qual é muito menor do que a gerada após perfusões com mostarda l-fenilalanina. De certo, nós observamos que tais perfusões são mais bem toleradas nos nossos pacientes mais idosos, sem maiores riscos de complicações neste grupo comparado com pacientes mais jovens (Tabela 31.9).158 Em geral, o principal papel da perfusão isolada de membro é a paliação para doença irressecável nos membros.

Tabela 31.9 Complicações da perfusão* Idade

20 anos 30 anos 40 anos

Número

4

7

Edema (pré/pós) Edema (pós)

1

Seroma

1

11

50 anos 60 anos 16

14

6

67

1

2

2

1

6

2

2

Ferida

9

5

1

1

1

4

1

1

1

4

Embolia pulmonar Total

70 anos 80 anos Total

1 2

0

2 14/47 (32%)

2

9

1 2

2

19

4/20 (20%)

*

67 perfusões em 60 pacientes, 1976-1995.

(Proveniente de Ariyan S, Poo WJ. The safety and efficacy of isolated perfusion of extremities for recurrent tumor in elderly patients. A 20-year experience. Surgery. 1998; 123:335.)

FIG. 31.35 Perfusão regional isolada de uma recorrência em extremidade inferior (A) levou a uma resposta significativa e redução do tumor (B, antes da perfusão; C, depois da perfusão), permitindo a ressecção radical da lesão (D) sem comprometer os vasos poplíteos. Após 1 ano, não havia recorrência local (E).

Tratamento do melanoma metastático

É sabido que o prognóstico dos pacientes com melanoma metastático é ruim: aqueles com metástases hepáticas, cerebrais ou ósseas possuem uma sobrevida média de apenas seis meses. Várias opções de tratamento sistêmico estão disponíveis para tratar pacientes com doença metastática, incluindo monoquimioterapia ou poli-quimioterapia, bioquimioterapia ou estratégias utilizando imunomoduladores. Entretanto, existe pouco consenso sobre o tratamento padrão para pacientes com melanoma metastático. Da perspectiva cirúrgica, caso o paciente possua doença localizada em um pequeno foco único no pulmão, fígado ou cérebro, a ressecção deve ser considerada (Tabela 31.10). Entretanto, recorrências múltiplas não podem ser tratadas cirurgicamente e necessitam que seja considerada a quimioterapia sistêmica e/ou radioterapia. Avanços mais recentes demonstraram uma taxa de resposta muito alta ao tratamento com Gamma Knife em metástases únicas ou poucas no cérebro. Tabela 31.10 Cirurgia para melanoma metastático: sobrevida Região da primeira recorrência

Incidência Sobrevida em 5 anos

Sobrevida média

Pele, gordura, linfonodo

50-60%

5-40%

8-50 meses

Pulmão

15-35%

5-30%

8-20 meses

Trato gastrointestinal

2-4%

Minoria dos pacientes

10-20 meses

Intestino delgado (35%-65%)

Principalmente paliativa

Cólon (10-15%) Estômago (5%) Cérebro (à autopsia, 50%-80%)

8-15%

Fígado (raramente metástase única) 5%

Inesperada (5%) 6-8 meses 80%-90% têm melhoria dos sintomas Casos anedóticos



Modificado de Allen PJ, Coit DG. The surgical management of metastatic melanoma. Ann Surg Oncol. 2002; 9:762.)

Agentes quimioterápicos A dacarbazina permanece como tratamento padrão na prática comum e tem sido utilizada como padrão para comparação da eficácia de novos protocolos.120,159 Protocolos de combinação quimioterápica que incluem outros medicamentos citotóxicos tais como bis(2-cloroetil) nitrosureia (BCNU), cisplatina, lomustina e hidroxiureia têm sido relatados. Os ensaios comparando a DTIC sozinha ou em combinação com outros agentes têm demonstrado uma melhora significativa, porém breve, na sobrevida.160 Demonstrou-se que a dacarbazina e a temozolomida possuem taxas de resposta (aproximadamente 10%-20%) e sobrevida semelhantes,161 com duração média da resposta de aproximadamente 3-4 meses.160,161 A temozolomida pode atravessar a barreira hematoencefálica, torando-a um agente interessante para tratar melanoma, o qual possui uma propensão à metástase para o cérebro. Protocolos de quimioterapia combinada tais como o CVD (dacarbazina, cisplatina e vinblastina) ou o protocolo de Dartmouth (dacarbazina, carmustina, cisplatina e tamoxifeno) mostraram taxas de resposta iniciais mais altas,162,163 porém ensaios clínicos subsequentes não reproduziram essas altas taxas de resposta.164 O Paclitaxel, sozinho ou em combinação com carboplatina, pode fornecer benefícios clínicos para alguns pacientes com melanoma metastático, porém a duração do benefício clínico é curto (2-7 meses).165,166

Vacinas tumorais O desenvolvimento de vacinas tumorais específicas para o melanoma tem sido utilizado em várias observações clínicas e linhas de pesquisa básicas que indicam que o sistema imunitário pode erradicar células de melanoma. Apesar de uma ampla revisão das estratégias das vacinas disponíveis estar além do escopo deste capítulo, alguns dos estudos mais encorajadores são revisados. O gangliosídeo GM2, um antígeno superexpresso por várias células do melanoma, administrado em conjunto com o BCG ou outros adjuvantes imunitários, foi desenvolvido como tratamento para melanoma metastático no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center. Ensaios clínicos iniciais sugeriram resultados promissores;167

entretanto, estudos posteriores falharam em demonstrar benefícios clínicos com este tratamento adjuvante. Kirkwood et al.168 relataram sua experiência comparando o IFN-α2b de alta dose com a vacina de gangliosídeo GM2 para pacientes com melanoma ressecado cirurgicamente, demonstrando a vantagem do interferon. Adicionalmente, um ensaio randomizado de fase III (EORTC 18961) com GM2-KLH21 adjuvante utilizado em 1.314 pacientes com melanoma de estádio II foi finalizado precocemente pelo comitê de monitoramento de dados devido à sobrevida inferior no braço com vacinas.169 Uma vacina polivalente com células do melanoma, desenvolvida no John Wayne Cancer Center, demonstrou ser capaz de induzir respostas imunitárias humoral e celular para antígenos específicos do melanoma.170,171 Não obstante, esta vacina demonstrou não gerar benefícios em um ensaio clínico. O Dr. Steven Roserberg e copesquisadores do braço cirúrgico do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos identificaram outras vacinas anticâncer ao utilizar peptídicos antigênicos específicos reconhecidos pela reatividade autóloga com clones de células T tumor-específicos.172 Vacinas peptídicas são mais frequentemente administradas com citocinas ou adjuvantes de resposta imune tais como células dendríticas. DiFronzo et al.173 demonstraram que respostas humorais foram potencializadas nos pacientes tratados com vacinas polivalentes resultantes em uma sobrevida livre de doença limitada porém melhorada. É difícil defender quaisquer estratégias vacinais em detrimento de outras, sendo que nós recomendamos aos pacientes com melanomas de alto risco que participem de ensaios prospectivos para testar essas estratégias terapêuticas.

Interleucina 2 A interleucina 2 (IL-2) foi aprovada pela Food and Drug Administration dos Estados Unidos (FDA) para o tratamento do melanoma metastático em 1998. A administração intravenosa de altas doses de IL-2 resultaram em taxas de resposta objetivas globais de cerca de 17%.174 Em uma população altamente selecionada (n= 270), a IL-2 foi capaz de induzir respostas completas duráveis (duração média da resposta de 59 meses) em aproximadamente 6% dos pacientes e respostas parciais em 10% dos pacientes com melanoma metastático, embora com altos níveis de toxicidade.175,176 Um estudo recente demonstrou aumento na taxa de resposta ao melanoma metastático quando a IL-2 foi administrada em conjunto com vacina para o peptídeo 210M (22%) quando comparado com a administração isolada de IL-2 (13%).177

Bioquimioterapia Dado o sucesso individual de agentes quimioterápicos e de agentes biologicamente ativos (IFN-α e IL-2), protocolos de bioquimioterapia foram desenvolvidos. Por meio da combinação de fármacos quimioterápicos convencionais com agentes biologicamente ativos, pesquisadores foram capazes de demonstrar uma modesta melhora nas taxas de resposta ao melanoma metastático. Em ensaios institucionais isolados de fase II, a bioquimioterapia (cisplatina, vinblastina, dacarbazina, IFN-α e IL-2) produziu uma taxa de resposta global de 27%-64% e uma taxa de resposta completa de 15%-21% nos pacientes com melanoma metastático.178-180 Relato de um ensaio pequeno randomizado de fase III comparando a bioquimioterapia sequencial (dacarbazina, cisplatina, vinblastina com IL-2 e IFN-α administrados em um esquema distinto) em comparação com um combinado de cisplatina, vinblastina e dacarbazina (CVD) demonstrou taxas de resposta de 48% para o protocolo de bioquimioterapia quando comparado com os 25% gerados pelo CVD sozinho. A sobrevida média para pacientes tratados com bioquimioterapia foi de 11,9 meses contra 9,2 meses para o CVD.181 Em ensaio randomizado de fase III (E3695), a bioquimioterapia (cisplatina, vinblastina, dacarbazina, IL-2 e IFN-α2b) produziu uma taxa de resposta e uma sobrevida livre de doença discretamente melhores do que o CVD isolado, porém não foi associada nem com uma melhora na qualidade da resposta ou na sobrevida global nos pacientes com melanoma metastático.182 A bioquimioterapia foi substancialmente mais tóxica do que o CVD. Tentativas adicionais de diminuir a toxicidade da bioquimioterapia por meio de administração subcutânea ambulatorial de IL-2 não demonstrou benefício substancial da bioquimioterapia quando comparado com a quimioterapia isolada.183-185 Uma meta-análise demonstrou que, apesar da bioquimioterapia ter aparentado melhorar as taxas de resposta globais, não houve benefício na sobrevida para pacientes com melanoma metastático.186 Dado o desempenho global ruim dos agentes nesta coorte de pacientes, pesquisas básicas continuadas e translacionais são importantes para identificar agentes ativos para os pacientes desafortunados. Estratégias preemptivas também estão sendo desenvolvidas. Visto que a maioria dos pacientes com melanoma cutâneo possui algum fator de risco identificável (ou seja, exposição solar), quimioprevenção utilizando carotenoides e

inibidores da ciclooxigenase-2, receptor de fator de crescimento de endotélio vascular e citocromo P-450 estão sendo ativamente pesquisadas.187 Os resultados deste trabalho estão bastante antecipados.

Ipilimumab Apesar de muitos estudos pré-clínicos e clínicos terem avaliado múltiplas citocinas, vacinas, anticorpos e outros tipos de imunomodulação isolada ou em combinação com quimioterapia, somente a IL-2 para a doença metastática e o IFN-α para o tratamento adjuvante cirúrgico demonstraram sucesso suficiente para garantir aprovação pelas autoridades reguladoras.142,175 Apesar disso, há um otimismo contínuo sobre o fato que a imunomodulação pode se tornar um tratamento efetivo para pacientes com melanoma, dirigidos amplamente por avanços importantes em imunobiologia tumoral, incluindo o potencial para manipular e quebrar pontoschave dos mecanismos de ativação e defesa tumorais, novas abordagens para a apresentação de antígenos, refinamento nos procedimentos de expansão das células T antígeno específicas, transferência gênica para alterar a especificidade e a função linfocitária, além do potencial para a descoberta de biomarcadores preditivos mais capazes de selecionar pacientes para tratamentos individualizados.188 Dentro dessa linha, Hodi et al. Induziu autoimunidade em pacientes com melanoma metastático utilizando ipilimumab, um anticorpo dirigido contra o antígeno CTLA-4 associado com linfócitos T citotóxicos.189 O CTLA4 é uma molecular sinalizadora que regula a inibição da ativação de células T e o fato de se bloquear esta molécula é conhecido como um promotor da imunidade antitumoral.189 No seu ensaio clínico multicêntrico pacientes com melanoma metastático foram escolhidos randomicamente para receber um agente anti-CTLA-4 (ipilimumab), uma vacina baseada em um antígeno de melanoma ou uma combinação do agente anti-CTLA-4 e a vacina. Uma melhora na sobrevida global, assim como uma melhora na sobrevida livre de doença e uma melhor taxa de resposta global foram observadas nos pacientes que receberam o tratamento anti-CTLA-4 quando comparados com pacientes que receberam somente a vacina.189 Notadamente, o perfil de efeitos colaterais do ipilimumab merece menção, uma vez que 60% dos pacientes sofreram efeitos adversos, a maioria deles relacionados ao sistema imunológico. Entretanto, esse estudo randomizado controlado demonstrou que havia melhora significativa na sobrevida global nos pacientes com melanoma tratado com ipilimumab. Provavelmente será provado que ele é útil nos pacientes com melanoma metastático cuja doença progrediu enquanto recebiam um ou mais tratamentos prévios.

Terapia alvo molecular em melanoma Um estudo inovador recente relatou uma quimioterapia alvo molecular para melanoma. Foi demonstrado em 2002 que aproximadamente 50% dos melanomas humanos possuem uma mutação ativadora no BRAF, um integrante da via de sinalização da proteína quinase ativada por mitógeno (MAP). A mutação é uma substituição do ácido glutâmico por valina (a mutação V600E).190 Células de melanoma contendo a mutação no BRAF são dependentes da via de sinalização da MAP quinase para seu crescimento e sobrevivência.191 Esses achados sugeriram a possibilidade de que o melanoma pudesse ser responsivo à terapia alvo. O PLX4032 (Plexxikon: RG7204, Roche Pharmaceuticals), um inibidor potente de BRAF com mutação V600E, demonstrou ser uma opção terapêutica de grande sucesso em pacientes apropriadamente selecionados.192 Oitenta e um por cento dos pacientes com melanomas metastáticos que possuíam a mutação ativadora no BRAF (V600E) apresentaram resposta ao tratamento – regressão completa ou parcial do tumor – com PLX4032 em um ensaio multicentro de fase I com doses escalonadas. As respostas foram observadas em todos os locais da doença, incluindo ossos, fígado e intestino delgado. O trabalho está sendo realizado para determinar até que ponto o tratamento com o PLX4032 irá melhorar a sobrevida global. Está claro que os melanomas podem ser categorizados por mudanças moleculares específicas que direcionam sua proliferação.193 Ter como alvo as vias de sinalização ativadas em tumores individuais pode levar à regressão tumoral e à uma possível cura. Este tipo de tratamento antineoplásico personalizado provavelmente terá um papel importante no cuidado com os pacientes com melanoma e outros cânceres na próxima década.

Seguimento Pacientes tratados na Unidade de Melanoma de Yale são monitorados frequentemente nos primeiros anos (Tabela 31.11), com intervalos crescentes nos anos subsequentes. A importância da avaliação dermatológica,

documentação fotográfica e acompanhamento de perto não podem ser subestimados. A educação do paciente para a autodetecção precoce da recorrência em conjunto com o acompanhamento médico seriado tem tido sucesso na manutenção de um programa de seguimento efetivo.194 Os pacientes são examinados para metástases locais ou em trânsito em intervalos variados baseando-se no estádio do melanoma no momento do diagnóstico (Tabela 31.12). Tabela 31.11 Orientações para o monitoramento Orientações para o acompanhamento Visitas ao consultório e exame físico Estádio 0

Anualmente por dermatologista ou clínico geral

Estádio I

A cada 6 meses por 5 anos

Estádio II-IV

A cada 3 meses por 2 anos A cada 6 meses por 3 anos

Monitoramento de metástases Nível de lactato desidrogenase e hemograma completo

A cada visita, ao menos anualmente

Raio X de tórax

A cada visita, ao menos anualmente

Tomografia computadorizada ± tomografia por emissão de pósitrons

Quando houver alterações nos exames laboratoriais ou radiografias torácicas, ou sintomas clínicos

Tabela 31.12 Protocolo para o acompanhamento do paciente Exame físico

Radiografia torácica Testes de função hepática Exames de imagem

Estádio I, T1

Semestral × 2 anos, depois anualmente





Estádio I-II, T2-4

A cada 3 meses × 3 anos, depois semestralmente Anual

Anual

Estádio III (linfonodo positivo) A cada 3 meses × 3 anos, depois semestralmente Anual

Anual

Anual ou conforme indicado

Recorrências tumorais estão correlacionadas com a espessura da lesão. Entre 60% e 70% das recorrências aparecem nos primeiros 18-24 meses após o tratamento cirúrgico (Tabela 31.8).155 As recorrências mais precoces são para linfonodos regionais, seguidas por metástases em trânsito. Metástases à distância aparecem por último. O seguimento é feito tipicamente por meio de exame físico, testes de função hepática e radiografias torácicas, os quais detectam a maioria das recorrências. A triagem de rotina com TC de crânio, tórax e abdome não é recomendada, a não ser que haja suspeita clínica relevante de metástase. As radiografias torácicas e os testes de função hepática, apesar de resultado pouco específicos,195 tem baixo custo e são úteis no estabelecimento de valores basais de referência. A utilidade da PET ou PET-TC para o monitoramento destes pacientes ainda está sob pesquisa. Adicionalmente, a utilização de ferramentas de triagem para monitoramento específico no soro tais como o mRNA tirosinase, detectado por meio de reação em cadeia da polimerase com transcriptase reversa, é tanto excitante clinicamente como eticamente desafiador.196 O Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos recomenda que a maioria dos pacientes sem histórico familiar e sem nevos atípicos deva passar por acompanhamento clínico a cada 6 meses nos primeiros 2 anos. Após isso, um acompanhamento clínico anual é considerado adequado. Aqueles com histórico familiar ou nevos atípicos devem ser acompanhados a cada 3 meses.194

Resumo O melanoma ainda é um problema desafiador e clinicamente importante, com um aumento anual rápido em sua incidência. A ELA permanece como a principal modalidade de tratamento primário para a doença primária. A BLNS é indicada para pacientes com linfonodos clinicamente negativos e lesões primárias com características agressivas – geralmente, espessura maior do que 1 mm. Caso o linfonodo sentinela seja positivo, a linfadenectomia radical é indicada para o controle regional da doença. Infelizmente, as taxas globais de cura

para o melanoma avançado não melhoraram significativamente ao longo das últimas décadas devido a sermos incapazes de tratar micrometástases subclínicas que não estão presentes nos órgãos sistêmicos no momento do tratamento do melanoma primário. Quando essas metástases se tornam clinicamente evidentes, há uma pequena chance de cura por meio de nova cirurgia, quimioterapia, radioterapia ou combinação dessas modalidades de tratamento. Ensaios adjuvantes com quimioterapia e bioquimioterapia não demonstraram sucesso uniforme por nenhum período de tempo. Não podemos enfatizar em demasia a importância dos ensaios clínicos e os pacientes com melanoma avançado devem ser encorajados a se incluirem em ensaios clínicos que testam protocolos adjuvantes diferentes sempre que possível. Sucessos recentes no controle de lesões metastáticas utilizando terapias alvo moleculares são promissores no que diz respeito ao tratamento personalizado para mutações genéticas.

Im a ge ns e x t ra s pa ra e st e ca pít ulo e st ã o disponíve is e m h p://www.e x pe rt consult .com Fig. 31.1 Achados de autopsia em paciente com melanoma no tornozelo direito espalhando-se de maneira centrípeta para a virilha direita e restante do corpo enquanto poupa a perna esquerda (Redesenhado a partir de Handley WS. The pathology of melanotic growths in relation to their operative treatment. Lecture I. Lancet 1907; 1:927) Fig. 31.2 Handley recomendou a remoção do melanoma (a) em conjunto com 2,5 cm (f) de pele e (b) 5 cm (g) de gordura subcutânea subjacente (c), fáscia muscular (d) e musculatura (e); (h) incisão de pele. (Redesenhado a partir de Handley WS. The pathology of melanotic growths in relation to their operative treatment. Lecture I. Lancet 1907; 1:927)

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  43. Balch, C. M., Gershenwald, J. E., Soong, S. J., et al. Final version of 2009 AJCC melanoma staging and classification. J Clin Oncol. 2009; 27:6199–6206. As recomendações mais comuns sobre o estadiamento do melanoma foram realizadas com base em uma análise multivariada de 30.946 pacientes com melanoma em estádios I – III e 7.972 pacientes com melanoma em estádio IV. Para os pacientes com melanoma localizado, a espessura do tumor, a taxa mitótica e a presença de ulceração são os fatores prognósticos mais dominantes. Para os pacientes com metástases regionais, os componentes que definem a categoria N são o número de linfonodos com metástase, a carga tumoral e a presença de ulceração do melanoma primário. Todos os pacientes com metástases microscópicas nos linfonodos são classificados como de estádio III independentemente da extensão da carga tumoral. Para os pacientes com metástases à distância, os dois componentes dominantes que definem a categoria M continuam a ser a localização da metástase à distância e o nível de desidrogenase lática sérica.

57. Breslow, A. Thickness, cross-sectional areas and depth of invasion in the prognosis of cutaneous melanoma. Ann Surg. 1970; 172:902–908. Alexander Breslow descreveu pela primeira vez a utilização de um micrômetro ocular para mensurar a espessura máxima dos melanomas e demonstrou uma correlação entre a profundidade de invasão com o prognóstico

59. Morton, D. L., Wen, D. R., Wong, J. H., et al. Technical details of intraoperative lymphatic mapping for early stage melanoma. Arch Surg. 1992; 127:392–399. Morton et al. descreveram pela primeira vez a utilização da biopsia de linfonodo sentinela no tratamento do melanoma. Esta técnica identifica, com um alto grau de precisão, pacientes com melanoma em estágio precoce que apresentam metástases em linfonodos e que podem ser beneficiados com uma linfadenectomia radical.

80. Rousseau, D. L., Jr., Ross, M. I., Johnson, M. M., et al. Revised American Joint Committee on Cancer staging criteria accurately predict sentinel lymph node positivity in clinically node-negative melanoma patients. Ann Surg Oncol. 2003; 10:569–574. 81. Morton, D. L., Hoon, D. S., Cochran, A. J., et al. Lymphatic mapping and sentinel lymphadenectomy for early-stage melanoma: therapeutic utility and implications of nodal microanatomy and molecular staging for improving the accuracy of detection of nodal micrometastases. Ann Surg. 2003; 238:538–549. [discussion 49-50]. 108. Sladden, M. J., Balch, C., Barzilai, D. A., et al. Surgical excision margins for primary cutaneous melanoma. Cochrane Database Syst Rev. (4):2009. [CD004835]. Esta revisão sistemática resume as evidências relacionadas à extensão das margens da ampliação para o melanoma cutâneo primário. De cinco ensaios randomizados controlados, não houve diferença estatisticamente significativa na sobrevida global entre margens de excisão menores (1-2 cm) ou amplas (3-5 cm). Baseado em ensaios individuais e meta-análise, as evidências atuais de ensaios randomizados são insuficientes para precisar as margens ideais de excisão para o melanoma cutâneo primário.

112. Veronesi, U., Cascinelli, N., Adamus, J., et al. Thin stage I primary cutaneous malignant melanoma.

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192. Flaherty, K. T., Puzanov, I., Kim, K. B., et al. Inhibition of mutated, activated BRAF in metastatic melanoma. N Engl J Med. 2010; 363:809–819. Os autores conduziram um ensaio multicentros de fase I com doses escalonadas de PLX4032, um inibidor do BRAF mutado disponível em via oral, seguido por uma fase de extensão envolvendo a dose máxima que poderia ser administrada sem que ocorressem efeitos adversos. Os pacientes receberam o PLX4032 duas vezes ao dia até que apresentassem progressão da doença. O BRAF (homólogo B1 do oncogene viral do sarcoma murino v-raf) é uma molécula de transdução de sinais que possui uma mutação de ativação (ácido glutâmico por valina no aminoácido 600; V600E) em metade de todos os melanomas. Nessa coorte de doses escalonadas, entre os 16 pacientes com melanoma com a mutação V600E do BRAF e que estavam recebendo 240 mg ou mais de PLX4032 duas vezes ao dia, 10 apresentaram resposta parcial e um apresentou resposta completa. Entre os 32 pacientes na coorte de extensão, 24 apresentaram resposta parcial e dois resposta completa. A sobrevida livre de progressão média estimada para todos os pacientes foi de mais do que 7 meses. O tratamento com PLX4032 resultou em uma regressão completa ou parcial do tumor na maioria dos pacientes com tumores que apresentavam a mutação V600E do BRAF.

32

Implantes e biomateriais Charles E. Butler e Timothy W. King

Resumo O que é um biomaterial? Para discutir o tema, precisamos primeiro definir este termo. Há várias definições para “biomaterial”, porém a mais utilizada, do National Institutes of Health, conceitua o termo como “qualquer substância (que não seja uma droga) ou combinação de substâncias sintéticas ou naturais, que pode ser usada por um período de tempo, como um todo ou parte de um sistema que trata, aumenta ou substitui tecido, órgão ou função do corpo.”1 Com o advento, nos últimos anos, da engenharia tecidual e da medicina regenerativa a definição se ampliou, passando a incluir “qualquer material utilizado em um dispositivo médico planejado para interagir com sistemas biológicos”, permitindo que as estruturas e dispositivos combinados interajam ativamente com o corpo no qual são instalados.2 Os biomateriais podem ser sintéticos (ou seja, os feitos por seres humanos) ou biológicos (ou seja, os produzidos por um sistema biológico). Outras classificações baseadas no estágio de desenvolvimento ou características do material também são comuns, mas estão além do escopo deste capítulo.

Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês no site http://www.expertconsult.com

Metais Para que as propriedades mecânicas e biofísicas desejadas para aplicações em medicina fossem obtidas, foram desenvolvidas combinações de metais, denominadas ligas metálicas, as quais são projetadas para ser inertes e suportar o ambiente corrosivo encontrado no interior do corpo humano. Em geral, possuem propriedades mecânicas que excedem as propriedades do tecido natural que suportam, pois, ao contrário deste, não têm a capacidade de se recuperar de deformações.

Aço inoxidável O aço inoxidável tem sido utilizado como implante biológico desde a década de 1920.6 Este material foi desenvolvido para não sofrer corrosão e é formado por mais de 10 componentes distintos que lhe conferem as propriedades químicas e mecânicas desejadas. O aço inoxidável usado em aplicações médicas é uma liga de ferro-cromo-níquel com pelo menos 17%, de cromo (Tabela 32.1). O cromo cria uma superfície protetora, que contribui para a propriedade anticorrosiva da liga. A liga de aço inoxidável mais comumente utilizada em aplicações médicas é a “316L”, a qual, além da composição de cromo, possui baixo teor de carbono, para evitar a formação de carboneto, e alto teor de níquel, para aumentar sua força e resistência.

Tabela 32.1 Composição das ligas metálicas comuns Elemento

Aço inoxidável (ASTM F138)*

Co-Cr Titânio (ASTM F90)† (ASTM F136)‡

Peso %

Peso %

Peso %

Cromo

16-18

27-30



Níquel

10-14

2,5 máx



Molibdênio 2-3

5-7



Carbono

0,03 máx

0,35 máx

0,08 máx

Ferro

Balanço

0,75 máx

0,25 máx

Manganês

2,00 máx

1,00 máx



Fósforo

0,045 máx





Enxofre

0,03 máx





Silício

1,00 máx

1,00 máx



Nitrogênio

0,10 máx





Cobalto



Balanço



Oxigênio





0,013 máx

Alumínio





5,5-6,5

Vanádio





3,5-4,5

Titânio





Balanço

*

ASTM. Especificação padrão para fundição de barras de aço inoxidável e fios para implantes cirúrgicos de 18cromo-14níquel-2,5molibdênio (UNS S31673). West Conshohocken, PA: ASTM International; 2008. †

ASTM. Especificação padrão para fundição de liga de cobalto-20cromo-15tungstênio-10níquel para aplicação como implante cirúrgico (UNS R30605). West Conshohocken, PA: ASTM International; 2009. ‡

ASTM. Especificações padrão para fundição de ligas de titânio-6alumínio-4vanádio ELI (interstício extrabaixo) para aplicação como implante cirúrgico (UNS R56401). West Conshohocken, PA: ASTM International; 2008. (Adaptado de Holmes RE. Alloplastic materials. In: McCarthy JG, ed. Plastic surgery. New York: WB Saunders; 1990:698-731.)

O aço inoxidável possui uma resistência relativamente alta à tração, embora seja facilmente deformável (dobrável). Apesar de essa característica ser útil em algumas aplicações, como na fixação maxilomandibular das arcadas dentárias, de forma geral, essas características mecânicas são menos desejáveis do que a de outros materiais disponíveis, como o cromo-cobalto e o titânio. Além disso, o aço inoxidável pode liberar íons metálicos nos tecidos que o cercam causando uma grave reação inflamatória e dor, e tornando necessária, em alguns pacientes, sua remoção cirúrgica. O aço inoxidável é, atualmente, utilizado em fios cirúrgicos e barras para arcadas dentárias. Historicamente, sistemas de fixação rígida utilizavam aço inoxidável, porém outras ligas o substituíram nessa aplicação.

Cromo-cobalto Historicamente, as ligas de cromo-cobalto têm sido um dos mais significantes materiais utilizados em seres humanos. O vitallium, uma liga de cobalto-cromo-molibdênio (Co-Cr-Mo) (ASTM 75), foi primeiramente descrito em 1932 para relatar alguns problemas experimentados pelo aço inoxidável. Estas ligas substituem o aço pelo cobalto (∼60%, de sua composição), aumentam o cromo para 25%-30%, conferindo maior resistência à corrosão, e contêm 5%-7% de molibdênio, oferecendo resistência adicional (Tabela 32.1). As ligas de Co-Cr-Mo foram usadas em algumas das primeiras miniplacas craniofaciais e parafusos, e ajudaram a revolucionar a área. Sua maior desvantagem é o artefato de dispersão que aparece na imagem de tomografia computadorizada (TC). Por causa disso e por apresentar vários outros benefícios, o titânio substituiu as ligas de Co-Cr-Mo na maioria de suas aplicações biomédicas.7 Contudo, ainda são utilizadas em odontologia.

Titânio As ligas de titânio foram introduzidas em aplicações médicas no início da década de 1980.6,8 A partir daquela

época, substituíram quase que totalmente as outras ligas metálicas utilizadas em tratamentos médicos. Tal fato se deu em razão de as ligas de titânio serem mais fortes, mais leves, mais resistentes à corrosão e geralmente causarem menor inflamação. O titânio também possui um menor efeito de stress shielding (osteopenia localizada secundariamente ao implante que protege o osso das cargas mecânicas normais) comparado a outros implantes metálicos por possuírem menor rigidez. As ligas de titânio possuem menos de 0,5% de ferro (Tabela 32.1), o que lhes confere mais duas propriedades benéficas: não acionam detectores de metal e não criam artefatos significantes em TC ou estudos por imagens de ressonância magnética. Finalmente, o titânio pode formar ligações químicas com o osso mineralizado ao seu redor sem as típicas formações de tecido fibroso entre o implante e o osso. Esta característica única permite que o titânio seja usado para criar implantes osseointegrados. Aplicações em cirurgia plástica dessas ligas incluem placas e parafusos para fixação rígida de ossos e malhas para utilização em procedimentos como a reconstrução de paredes da órbita (Fig. 32.1).

FIG. 32.1 Placas de titânio para reconstrução do terço médio da face. (A) Várias placas e parafusos de 2,0 mm. Os parafusos possuem 7, 5 e 3 mm de comprimento (esquerda para direita). (B) Placa de quatro furos e parafusos para os sistemas de placas de 1,0, 1,5, 2,0 e 2,3 mm. (C) Placa em “L” de 1,0, 1,5 e 2,0 mm. Todos os parafusos possuem 5 mm de comprimento. Note que, por convenção, o tamanho das placas é baseado no diâmetro do parafuso.

Ouro Embora o ouro seja quimicamente inerte, possui, em sua forma pura, propriedades mecânicas pobres. Assim, quando alguma resistência se torna necessária (p. ex., em restaurações dentárias) é utilizada uma liga de ouro. Para uso como peso palpebral em pacientes com lagoftalmia,9 caso em que a resistência não é um problema,

uma liga de ouro de 24 quilates (99,9% de pureza) é utilizada para assegurar a inércia química.

Platina Como o ouro, a platina é um metal inerte, sendo o material de escolha para pacientes com sensibilidade ao ouro e que precisam de um implante de pálpebra para lagoftalmo. A platina é mais densa do que o ouro, o que torna os implantes palpebrais mais finos e menos perceptíveis do que os implantes de ouro. Algumas formulações contendo platina demonstraram ser imunogênicas e trouxeram preocupação quanto à exposição em longo prazo. Por isso os Centers for Disease Control afirmaram que a exposição, em curto prazo, aos sais de platina pode causar irritação nos olhos, nariz e garganta e, em longo prazo, alergias respiratórias e cutâneas. A norma padrão para solubilização de sais de platina do Occupational Safety and Health Administration é de 2 mcg/m3 de ar em 8 horas. A platina também é utilizada como catalizador na formação de alguns polímeros. A platina negra, um pó fino da platina (1 nm-1 µm) é usada em várias dessas reações.10 A platina negra catalisa a adição de hidrogênio aos compostos orgânicos insaturados e é utilizada na produção de gel de silicone para implantes de mama (a seguir). Complexos de platina também têm sido utilizados como quimioterápicos e demonstraram boa atividade contra alguns tumores. A cisplatina, o mais conhecido agente quimioterápico de platina, possui atividade contra vários tipos de câncer, porém, apresenta alguns efeitos colaterais significativos, incluindo dano cumulativo e irreversível aos rins e anacusia (surdez).11,12

Polímeros Polímeros são moléculas compostas de subunidades que se repetem. Tipicamente são definidas como uma cadeia principal de moléculas com cadeias laterais ligadas a ela por covalência. As propriedades físicas de um polímero são definidas pela estrutura do monômero, pelo número de unidades de monômeros na cadeia polimérica e pelo grau de ligações cruzadas (cross-linking — quantidade de ligações entre duas cadeias de polímeros). Como as cadeias de polímeros possuem ligações cruzadas, a habilidade de se moverem independentemente é diminuída. Por exemplo, um polímero com cadeias livres deve existir como um líquido e, quando seu número de ligações cruzadas aumenta, torna-se um “gel” ou um “sólido”.

Silicone O silicone é, hoje, provavelmente o mais discriminado e mal-entendido biomaterial empregado em medicina. Isto ocorre em razão da controvérsia que cerca a utilização de silicone em implantes de mama. Estes, com conteúdo de silicone foram, primeiramente, introduzidos nos Estados Unidos, em 1962, e consistiam em duas camadas feitas de um elastômero de silicone espesso, de paredes macias, coladas, preenchidas com um gel viscoso de silicone (dimetilsiloxano). Múltiplas variações e modificações deste revestimento e do gel foram feitas ao longo dos anos buscando melhorar os resultados das mamoplastias de aumento e reduzir complicações associadas. Em 1988, o norte-americano Food and Drug Administration (FDA), sem se preocupar com os relatórios de perdas de implantes e alegações de resultar em complicações e doenças, reclassificou os implantes de mama como dispositivos médicos de classe III e pediu aos fabricantes que fornecessem dados demonstrando a segurança e efetividade desses dispositivos.13,14 Em 1992, o FDA alegou que “não havia uma informação adequada que demonstrasse que implantes mamários eram seguros e efetivos” e instaurou a moratória dos implantes de mama de silicone gel para fins cosméticos, permitindo que continuasse a sua utilização apenas para reconstrução pós-mastectomia, correções de deformidades congênitas ou troca de implantes rotos de silicone gel por razões médicas ou cirúrgicas. Para tratar dessa preocupação, o Department of Health and Human Services indicou o Institute of Medicine of the National Academy of Science (IOM) para iniciar uma das pesquisas mais extensas da história da Medicina. Sua função seria examinar complicações potenciais durante ou após cirurgias com implantes de mama que utilizassem silicone. Em 1999, após revisar anos de evidência e pesquisas sobre implantes de mama com preenchimento de silicone gel, o IOM publicou um relatório detalhado, de ambos os implantes de mama preenchidos por solução salina e por silicone gel, intitulado Safety of Silicone Breast Implants (Segurança dos Implantes Mamários de Silicone).15 O IOM descobriu que “a evidência sugere que doenças ou alterações como

doenças do tecido conjuntivo, câncer, doenças neurológicas, outras queixas sistêmicas ou alterações não são mais frequentes em mulheres com implantes de mama do que em mulheres sem implantes.” A maioria dos relatos de caso e revisões de literatura também falharam, posteriormente, em demonstrar uma ligação entre implantes mamários de silicone e doenças.13,14 Em 2006, a proibição imposta pelo FDA foi revogada e a restrição ao uso de implantes de mama preenchidos por silicone gel, produzidos por apenas dois fabricantes, para reconstrução de mama e para mamoplastia de aumento cosmética, chegou ao fim. A aprovação do FDA requereu um estudo de 10 anos com mulheres que receberam implantes e um estudo de 10 anos demonstrando a segurança destes dispositivos em 40 mil mulheres. Também foi recomendado que sejam dados às pacientes panfletos explicando os riscos.13,14 Então, o que é silicone? É importante entender esta pergunta à luz da história dos implantes de silicone. Silicone é uma família de polímeros que consiste em moléculas alternadas de silício (Si) e oxigênio (O). A Tabela 32.2 mostra a nomenclatura do silicone. O siloxano, a unidade repetidora do silicone, consiste em sílica, oxigênio e uma cadeia lateral de um hidrocarboneto saturado (alcano). O dimetil polissiloxano (polidimetilsiloxano) (PDMS) |(CH3)2SiO|n é o polímero utilizado na maioria das aplicações médicas. O PDMS é um polímero muito puro que consiste em uma cadeia principal de silicone (silício e oxigênio) com duas cadeias laterais metil. É um dos biomateriais mais inertes disponíveis para uso médico. A alteração do comprimento e do peso molecular do PDMS altera as propriedades mecânicas e o comportamento do gel de silicone. As moléculas de PDMS com menos de 30 monômeros são definidas como formulações de baixo peso molecular e possuem uma viscosidade semelhante à do óleo para bebês. As formulações de alto peso molecular contêm mais de 3.000 monômeros e são sólidas. Controlar a quantidade de ligações cruzadas, alterar aditivos e ajustar o processo de cura também podem modificar as propriedades mecânicas do silicone. Por exemplo, o silicone gel encontrado nos implantes de mama é resultado de uma reação de hidroxilação, em que algumas das cadeias laterais metil (CH3) são substituídas por cadeias laterais vinila (CH = CH2), o que, posteriormente, permite que as cadeias de silicone estabeleçam ligações cruzadas entre si. Esta reação é catalisada pela platina, e alguns resíduos de platina podem ser encontrados no gel dos implantes de mama. O silicone da cápsula dos implantes de mama é completamente polimerizado com um aditivo de sílica amorfa (não cristalina) para aumentar a resistência (Fig. 32.2). Tabela 32.2 Nomenclatura do silicone Termo

Fórmula química Descrição

Sílica

Si

Elemento mais abundante na Terra Não ocorre naturalmente em sua forma metálica

Silício

SiO2

Areia, mármore ou quartzo

Silicato

Na 2SiO3

Em uma forma é utilizado como desumidificante (p. ex., em máquinas de anestesia)

Siloxano

R2SiO

Monômero de sílica e oxigênio

Silicone

|R2SiO|n

Polímeros de sílica e oxigênio

Dimetil Polissiloxano |(CH3)2SiO|n

Unidade utilizada na produção da maioria dos produtos de silicone de grau médico, incluindo implantes de mama

(Adaptado de Miller MJ, Ogunleye OT. Biomaterials. In: Guyuron B, Eriksson E, Persing JA, et al., eds. Plastic surgery indications and practice. New York: Saunders Elsevier; 2009:57-66.)

FIG. 32.2 Um implante de mama com gel de silicone no seu interior (Mentor).

Outras aplicações em cirurgia plástica incluem os implantes faciais para osso zigomático, nasal, reconstrução ou aumento do queixo e reconstrução do assoalho da órbita. Cirurgiões da mão utilizam implantes de silicone em artroplastia, substituição de tendão flexor e blocos espaçadores para ossos. O silicone é indicado para essas situações porque é relativamente inerte, maleável e deformável. Silicone de baixo peso molecular foi usado no passado como um material de preenchimento injetável para tecidos moles. Contudo, graves reações teciduais e migração do silicone levaram muitos profissionais a evitar essa indicação. O silicone é provavelmente o mais estudado material implantável disponível hoje. Após mais de 35 estudos bem conduzidos de diversos países, não há evidência conclusiva de que esse material cause doença. Além disso, o silicone médico é um material universal, sendo encontrado em mais de 1.000 produtos médicos tanto como componente, quanto como resíduo do processo de fabricação. Por exemplo, toda agulha e seringa descartáveis, bem como cateteres venosos são lubrificados com silicone. Medicamentos com frascos e tampa contêm silicone residual do processo de fabricação. Elastômeros de silicone, na sua forma sólida, são usados para cobrir marca-passos, cateteres, próteses articulares, válvulas de derivação para hidrocefalia e vários implantes faciais e penianos. Assim como os implantes de mama, alguns implantes testiculares e de mento são feitos de gel de silicone em um envelope de silicone. Silicones também são encontrados em alguns medicamentos. Se um medicamento contém um ingrediente com o nome “meticona” (p. ex., simeticona), este é um silicone que foi modificado para consumo humano. Silicones também são usados em itens domésticos como batom, loção para as mãos/bronzeamento, spray para cabelo, alimentos processados e gomas de mascar. Os silicones de grau médico invocam uma resposta inespecífica de corpo estranho, resultando em típica invasão de macrófagos, formação de células gigantes e eventuais cicatrizes.16 Extensas investigações por várias instituições científicas de prestígio (p. ex., o IOM17,18 e o UK Department of Health19) falharam em demonstrar se doenças sistêmicas são definitivamente atribuídas aos silicones.

Politetrafluoretileno O politetrafluoretileno (PTFE), também conhecido como Teflon, foi acidentalmente inventado por Roy Plunkett em 1938, enquanto tentava desenvolver um refrigerante.20 Ele consiste em uma cadeia principal de carbono com cadeias laterais de flúor. O PTFE expandido (ePTFE ou Gore-Tex®) foi criado por Bob Gore em 1969 quando ele rapidamente esticou o PTFE. O material é muito estável quimicamente, não faz ligações cruzadas (o que o torna flexível) e possui uma superfície não aderente. Quando feito com poros de 10-30 µm permitirá um limitado crescimento tecidual através deles. Tem sido empregado em uma grande variedade de situações como em botas para trilha e revestimento de frigideiras. No campo da medicina é utilizado para enxertos vasculares, malhas para reconstrução da parede abdominal e implantes para aumento facial.21 As características não aderentes do ePTFE têm sido empregadas em malhas cirúrgicas para correção de hérnias para reduzir as aderências no local

de reparo. Entretanto, existem limitações significativas da malha de ePTFE usada no reparo de hérnia, incluindo infecção, que requer sua remoção, e limitada força de incorporação às bordas fasciais que o cercam, comparado às malhas macroporosas, como a de polipropileno.

Poliéster O poliéster contém um grupo funcional éster em sua cadeia principal. O Mersilene é uma malha costurada de fibra de poliéster utilizada em herniorrafia. A malha de poliéster é mais macia e mais hidrofílica que o polipropileno e, em estudos com animais, demonstrou permitir melhor crescimento tecidual. O Dacron é outra forma de poliéster que tem sido empregada em enxertos vasculares.

Poliproleno O poliproleno ou polipropileno possui uma cadeia principal de carbono e cadeias laterais de hidrogênio e grupos metil. Ele tem sido utilizado em reparo de hérnia e de prolapso de órgãos pélvicos, sendo raramente rejeitado. Porém, a malha de polipropileno pode sofrer, com o tempo, corrosão pelos tecidos moles. Por isso, o FDA divulgou alerta sobre o uso de malha de polipropileno em prolapso de órgãos pélvicos, especificamente quando em contato com a parede vaginal, devido ao número de erosões da malha reportado por pacientes nos últimos anos.22 Ele também é usado como material de sutura por causa de sua força e baixa indução à reação de corpo estranho. Malhas cirúrgicas costuradas de polipropileno são, frequentemente, utilizadas no reparo de hérnia por sua grande resistência à tensão e forte incorporação fibrovascular na borda do defeito fascial. Sua instalação sobre vísceras abdominais pode causar densas aderências, fístula e erosão. A reoperação através de uma área de reparo de hérnia com malha de polipropileno é geralmente desafiadora, por causa da formação generalizada de fibrose adjacente às vísceras abdominais.

Polietileno O polietileno apresenta uma cadeia principal de carbono com cadeias laterais de hidrogênio (etileno). Uma forma porosa de alta densidade de polietileno (Medpor) é utilizada para implantes faciais (Fig. 32.3). A porosidade permite o crescimento tecidual e vascular através dele. Ele também pode ser esculpido para customizar o implante para cada paciente. Os implantes são mais firmes e rígidos do que os implantes de ePTFE e, devido ao tamanho dos poros, são mais difíceis de se posicionar, pois os tecidos moles aderem a ele mais rapidamente. Além disso, o crescimento de tecido mole através dele torna o implante mais difícil de ser removido. Polietileno poroso isolado ou com malha de titânio no seu interior é encontrado disponível para reconstrução do assoalho orbital. Uma das desvantagens do polietileno isolado para reconstrução do assoalho orbital é que o implante não aparece bem em TC, tornando difícil o diagnóstico quando mal posicionado.

FIG. 32.3 Implantes Medpor utilizados em aumento facial (forma porosa de alta densidade de polietileno).

Polímeros biodegradáveis Polímeros biodegradáveis foram desenvolvidos para tentar superar algumas desvantagens associadas a implantes permanentes. A maioria das biodegradações se inicia com uma reação química, como a hidrólise ou oxidação, e envolve algum tipo de processo biológico (p. ex., processo enzimático ou celular) para eliminar completamente o material. Além do requisito de que o material em si seja biocompatível, todos os metabólitos do também o devem ser.23 Embora haja uma infinidade de materiais que degradam in vivo, poucos são clinicamente relevantes como polímeros biodegradáveis. Em sua maioria são ácidos α-hidroxi, especificamente o ácido polilático (PLA), o ácido poliglicólico (PGA) e combinações ou copolímeros destes polímeros individuais, conhecidos como ácido polilático-poliglicólico (PLGA). Estes polímeros são degradados por hidrólise terminando como ácido lático ou ácido glicólico, um subproduto comum das vias bioquímicas normais. A maioria dos cirurgiões está familiarizada com esse polímero, pois ele é o utilizado na fabricação do Vicryl® (poligalactina 910, Ethicon, Somerville, NJ). Estes polímeros também foram usados para criar uma malha biodegradável para uso em reconstruções da parede abdominal e sistemas de placas para cirurgia craniofacial e de mão. A alteração das proporções de ácido lático ou glicólico ou a adição de fibras de carbono ou outros polímeros podem modificar sua taxa de degradação. Em geral, o aumento da concentração de ácido lático reduz a taxa de degradação (ou seja, o polímero durará mais tempo). Nos últimos 15 anos, fabricantes usaram esses polímeros no desenvolvimento de placas e parafusos biodegradáveis para cirurgia craniofacial e de mão. Cada fabricante modificou a proporção de ácido lático e glicólico, bem como o protocolo específico de fabricação para otimizar a taxa de degradação e resistência do polímero. Por exemplo, LactoSorb (Biomet, Warsaw, IN) contém 82%, de PLA e 18%, de PGA enquanto Resorb-X (KLS Martin, Jacksonville, FL: utilizou no SonicWeld) apresenta 100%, de ácido poli-d,l-lático (PDLLA). Na implantação, sua resistência é igual à da placa de titânio e decresce com o tempo. Tipicamente, a integridade estrutural é preservada pelas primeiras oito semanas para permitir que ocorra o reparo ósseo. Malhas costuradas de Vicryl® são utilizadas no fechamento abdominofascial temporário em reconstruções complexas da parede abdominal, particularmente em feridas contaminadas. A malha auxilia, inicialmente, na contenção das vísceras e, em seguida, resolve criando uma hérnia iatrogênica, que é reparada em um estágio posterior.

Cerâmicas Os materiais cerâmicos têm sido usados por milhares de anos. Entretanto, sua aplicação médica não foi desenvolvida até a década de 1960. Das várias cerâmicas disponíveis, poucas foram aprovadas para implantação

em seres humanos. As cerâmicas possuem uma estrutura cristalina e são feitas de moléculas inorgânicas, não metálicas, onde os elétrons individuais estão fortemente ligados ao seu átomo (conhecido como ligação heteropolar; em contraste, a ligação homopolar, vista nos metais, permite que os elétrons fluam livremente entre átomos). A fabricação de materiais cerâmicos é realizada a partir de um processo denominado sinterização, que requer que o material seja fundido sob alta pressão e temperatura. As cerâmicas possuem propriedades físicas atraentes para uso biomédico, incluindo baixa indução de resposta a corpo-estranho, resistência à colonização bacteriana, alta resistência às forças de compressão e permite crescimento através de seus poros (poros de 100 µm de tamanho para osso e 30 µm para tecido mole). Contudo, seus benefícios são ofuscados diante de suas fraquezas; pois elas são quebradiças e fraturam facilmente quando submetidas a forças de tensão, torção ou cisalhamento. Seus principais empregos em cirurgia plástica são para aumento e substituição de tecido ósseo. Fosfatos de cálcio são as cerâmicas mais comumente usadas em cirurgia plástica. Além disso, foi demonstrado em laboratório que os fosfatos de cálcio são osteoindutores e osteocondutores, embora isto não tenha sido demonstrado clinicamente. Os fosfatos de cálcio apresentam duas formulações para uso médico: a hidroxiapatita (Ca10(PO4)6(OH)2) e o fosfato tricálcico (Ca3(PO4)2). O fosfato tricálcico possui uma maior taxa de reabsorção e substituição por osso quando comparada à hidroxiapatita. Eles estão disponíveis na forma de grânulos para injeção, blocos, ambos sólidos e porosos, sendo que a hidroxiapatita também está disponível como pasta para cimentação. Esses implantes são geralmente empregados em reconstrução de ossos da face e do crânio que não sustentam carga. A pasta de cimentação é indicada em casos selecionados, como em cranioplastia, em razão de sua maleabilidade, podendo ser moldada durante o procedimento.

Adesivos e colas O primeiro adesivo de fibrina para tecidos foi descrito em 1944 e foi utilizado para auxiliar na aderência de enxertos de pele ao leito receptor. O primeiro selante de fibrina chegou ao mercado para comercialização em 1978. O cianoacrilato foi sintetizado em 1949, mas sua primeira versão desencadeava grave reação de corpo estranho. Através de modificações químicas em sua molécula, os engenheiros conseguiram minimizar a reação de corpo estranho e criar um produto de relevância clínica. Existem vários adesivos de tecidos disponíveis para uso clínico. De maneira geral, esses adesivos são utilizados para unir dois tecidos ou para promover hemostasia. Muitos possuem ambas as propriedades. Idealmente, adesivos teciduais deveriam possuir cinco características (Quadro 32.2). Várias classes de adesivos teciduais estão disponíveis e cada uma será discutida nas próximas seções.24 Q uadr o 32. 2 C a ra ct e ríst ica s do a de sivo t e cidua l ide a l Deve ser seguro (ou seja, sem resposta alérgica, transmissão de doença) Deve eliminar potenciais espaços Deve ser fácil de usar Deve ter bom custo-benefício Deve proporcionar benefício clínico

Géis de plaquetas Géis de plaquetas são derivados do plasma rico em plaquetas (PRP). Têm, como matéria-prima, 70 mL de sangue total, que é submetido à centrifugação. A camada de plaquetas que também contém o fibrinogênio é, então, combinada com trombina bovina, resultando em um gel adesivo. Este produto é indicado para os que não desejam utilizar o selante de fibrina disponível comercialmente. Ele também é mais barato para ser fabricado (uma vez contabilizado o equipamento inicial) do que os selantes de fibrina comercializados. Contudo existem algumas desvantagens para este produto. A concentração de fibrinogênio no PRP é significativamente mais baixa do que nos selantes de fibrina disponíveis comercialmente. O PRP é um adesivo menos efetivo, além disso, sua resistência à tração e à capacidade hemostática também são menores do que os produtos comercialmente disponíveis. As aplicações clínicas deste produto incluem indicações onde existe uma grande área de superfície que o cirurgião deseja unir, como por exemplo os liftings de sobrancelha e de face, a

abdominoplastia, o sítio doador do latíssimo dorsal e o sítio doador de retalhos miocutâneos da perfurante epigástrica inferior profunda/transversa do reto abdominal. Os aplicadores em spray ou pulverizador constituem o melhor método de aplicação.

Adesivos teciduais de fibrina Os selantes de fibrina foram os primeiros adesivos teciduais aprovados pelo FDA e consistem em duas partes: fibrinogênio e trombina. Uma pequena quantidade de fator XIII e cálcio foram incluídos para catalisar a reação e formar a fibrina polimerizada. Doadores testados doaram amostras de plasma humano como fonte dos dois ingredientes. O produto disponível comercialmente também contém antifibrinolítico para reduzir a degradação e aprotinina bovina, que atua como um estabilizante. Para se prevenir a transmissão de doenças, os produtos foram submetidos à pasteurização e ultrafiltração. O produto deve ser refrigerado e requer aproximadamente 20 minutos para o preparo. Os dois frascos devem ser colocados em um aquecedor especial por alguns minutos. Uma vez aquecidos, os componentes são aspirados em duas seringas individuais. O sistema de seringa dupla foi projetado para misturar os ingredientes imediatamente antes de sua aplicação. Existem vários mecanismos de entrega disponíveis. O mais simples é o que utiliza uma agulha reta de ponta romba. Também existem aplicadores em spray/pulverizadores e aplicadores para uso endoscópico. Os pulverizadores fornecem a melhor mistura dos dois componentes e produzem a mais fina camada de fibrina polimerizada no ferimento, o que tem demonstrado que possuem as melhores propriedades adesivas.25 A resistência da cola de fibrina é diretamente proporcional à concentração de fibrinogênio na mistura, enquanto a taxa de polimerização é regulada pela concentração de trombina. Em aplicações em que os tecidos necessitam ser manipulados (p. ex., grandes retalhos) deve ser utilizada uma concentração mais baixa de trombina. As aplicações em cirurgia plástica para os selantes de fibrina são semelhantes às indicações para o PRP já descritas. Selantes de fibrina também têm sido usados com sucesso no tratamento de seromas crônicos com injeções percutâneas.26

Cianoacrilato O cianoacrilato original foi o butil-cianoacrilato (uma cadeia pequena com rápida quebra) que resultava em muitos casos de deiscência de ferimentos. Além disso, seus subprodutos (formaldeído e cianoacetato) causavam graves reações inflamatórias caso o butil-cianoacrilato penetrasse na pele. Para corrigir estes problemas, foram desenvolvidos os octil-cianoacrilatos, que possuem cadeias laterais maiores, criando um polímero mais resistente e de maior durabilidade. A polimerização se inicia quando o 2-octil-cianoacrilato é exposto à umidade (existe umidade no ar suficiente para que a polimerização ocorra). Sua aplicação em cirurgia plástica se limita ao fechamento da pele. Por causa da camada superficial da pele, onde o produto é aplicado, não ter nenhuma sutura, é importante suturar as camadas profundas de maneira adequada, propiciando uma região livre de tensões nas duas bordas. Estudos comparando a sutura tradicional e o uso de octil-2cianoacrilato demonstraram que os resultados são equivalentes.27

Substitutos de pele Nos últimos 20 anos, os substitutos de pele desenvolvidos pela bioengenharia se tornaram a principal terapia para o manejo de feridas. Originalmente projetados para substituir os enxertos de pele em pacientes com queimaduras graves, sua utilização foi ampliada incluindo o tratamento de úlceras venosas e diabéticas crônicas. Com os avanços nessa tecnologia, suas aplicações foram ampliadas ainda mais (Quadro 32.3). Q uadr o 32. 3 C a ra ct e ríst ica s do subst it ut o de pe le ide a l Aderir ao leito da ferida rapidamente Apresentar propriedades fisiológicas e mecânicas semelhantes à da pele normal Não ser caro Evitar respostas imunes do hospedeiro Ser altamente eficaz em acelerar a regeneração tecidual e reparo da ferida

Embora o substituto ideal de pele não exista, engenheiros e cientistas desenvolveram, e continuam a aperfeiçoar, vários produtos bastante úteis. A engenharia de substitutos de pele cultivados foi estabelecida sob a premissa de três componentes importantes para sua formação: (1) uma fonte de células; (2) uma substância “indutora de diferenciação tecidual”; e (3) uma matriz.29 Uma variedade de células, mediadores e polímeros têm sido testados em diversas combinações para criar substitutos de pele cultivados. Revisamos, a seguir, os mais comuns e os comparamos na Tabela 32.3. Tabela 32.3 Comparação de substitutos de pele comercialmente disponíveis Produto

Empresa

Tecido de origem

Camadas

Aplicações

Integra

Integra Life Sciences Plainsboro, NJ

Sintético

1. Silicone 2. Colágeno e matriz de GAG

Epicel

Genzyme Cambridge, MA

Autógeno

Queratinócitos autógenos cultivados

Queimaduras profundas de espessura total ou parcial >30%, TBSA

Dermagraft Advanced Biohealing La Jolla, CA

Derme alógena

Vicryl® semeado com fibroblastos neonatais

Feridas crônicas Queimaduras de espessura total com STSG

Apligraf

Organogenesis Canton, MA

Compósito alógeno

Alloderm

LifeCell Branchburg, NJ

Derme alógena

1. Queratinócitos neonatais 2. Colágeno semeado com fibroblastos neonatais Derme acelular

Cobertura de defeitos de tecido mole de espessura total ou profundos

Feridas crônicas Sítios de excisão Usado com STSG para melhorar função/cosmética Queimaduras profundas de espessura total ou parcial Substituição de tecido mole Materiais suspensórios Enxertos interposicionais Adesivo para tecidos

TBSA, área total de superfície corporal; STSG, enxerto de pele com retalho parcial; GAG, glicosaminoglicana. (Adaptado de Shores JT, Gabriel A, Gupta S. Skin substitutes and alternatives: a review. Adv Skin Wound Care. 2007; 20:493-508; quiz 509-510.)

Integra Integra (Integra LifeSciences, Plainsboro, NJ) é substituto de pele de camada dupla. A camada “dermal” (profunda) é uma base de colágeno bovino com a glicosaminoglicana sulfato-6-condroitina, enquanto a camada superficial é uma folha de silicone que age como uma epiderme temporária.30 Conforme o ferimento é curado, a camada dermal é substituída pelas células do próprio paciente.31 Um enxerto de pele de espessura parcial é, então, aplicado sobre a nova derme. Integra é indicado no manejo de feridas complexas, como queimaduras parciais e totais da pele e diversos tipos de ulcerações. Vários estudos têm avaliado a eficácia de Integra, comparando-o com enxerto autógeno, alógeno, xenógeno ou Biobrane. Biobrane (Smith & Nephew, Largo, FL) é um revestimento biosintético construído com um filme de silicone e um tecido de nylon parcialmente embebido no filme, unidos por uma cola de colágeno. Estes estudos mostraram que Integra possui uma maior taxa de infecção comparada a outros produtos testados com relação à infecção do tecido receptor e integração do enxerto. Contudo, Integra aparentemente apresentou-se melhor que enxerto autógeno, alógeno ou xenógeno com relação ao tempo de cicatrização da ferida. Integra também é empregado em ferimentos complexos onde um enxerto de pele não aderiria.30,32,33 A nova derme adere ao tecido subjacente, vascularizando após 10-14 dias e, posteriormente, provê uma superfície para que um enxerto de pele de espessura parcial possa aderir.

Epicel (enxerto autógeno de epiderme) Epicel (Genzyme, Cambrigde, MA) é um enxerto autógeno de epiderme obtido a partir de queratinócitos do próprio paciente. Uma pequena biópsia de pele é colhida do paciente e enviada para a empresa para processamento. Os queratinócitos crescem em cocultura por um método conhecido como proliferation arrested, com fibroblastos 3T3 de murinos. Uma vez que os queratinócitos alcancem de 2-8 camadas celulares de espessura, o enxerto autógeno é retornado ao paciente para enxertia. O enxerto é preso a uma gaze vaselinada por clipes de aço inoxidável e mede aproximadamente 50 cm2. Epicel é indicado para pacientes que tiveram queimaduras da camada profunda da derme ou queimaduras de

espessura total envolvendo uma área de superfície corporal maior ou igual a 30%. Ele também pode ser usado com enxertos de espessura parcial ou sozinho em pacientes em que os enxertos de pele de espessura parcial não são uma opção devido à gravidade e à extensão das queimaduras. Células epiteliais têm sido combinadas com Integra para regenerar com sucesso pele e mucosa oral em modelos animais. Isto tem sido feito através de enxerto autógeno de epiderme posicionado sobre Integra vascularizada34 ou pré-semeando queratinócitos na Integra e aplicando em estágio único.35-38

Dermagraft Dermagraft (Advanced Biohealing, Westport, CT) é uma malha de poligalactina semeada com fibroblastos neonatais. Os fibroblastos produzem colágeno, glicosaminoglicanas, fibronectina e outros fatores de crescimento. Com o tempo a malha é absorvida e substituída pelo tecido do próprio paciente.31 Dermagraft possui aplicações como material de cobertura tanto temporário como permanente, aumentando o índice de sucesso na integração de enxertos de pele de espessura parcial em feridas excisadas de queimadura, úlceras venosas e de pressão.31,39 Em relação à infecção, exsudato, tempo de cicatrização, tempo de fechamento e integração do enxerto, o Dermagraft apresentou-se equivalente ao enxerto alógeno.39-41

Apligraft Apligraft (Organogenesis, Canton, MA) é um equivalente de pele com dupla camada. A camada profunda “dermal” consiste em colágeno bovino tipo I e fibroblastos obtidos de prepúcio neonatal e a camada superficial “epidérmica” é derivada de queratinócitos. Precisa ser aplicada “fresca” e possui uma vida útil de 5 dias à temperatura ambiente, sendo utilizada para cobrir e auxiliar no tratamento de úlceras venosas e em pé diabético.31 Tem sido usado como cobertura temporária de malhas expandidas de enxerto autógeno para feridas por queimadura excisadas.42

Malha bioprotética Para se evitar os possíveis efeitos colaterais da malha protética sintética e prover um material mais biocompatível, os materiais bioprotéticos foram desenvolvidos e utilizados em múltiplas aplicações. As atuais malhas de material bioprotético são derivadas de tecidos descelularizados de mamíferos, tanto humanos (alógenos) como animais (xenógenos). A derme é a fonte mais comum de tecido para malhas bioprotéticas. Os materiais das malhas bioprotéticas são processados para remover as células, debris celulares e outros componentes potencialmente imunogênicos de forma ótima, sem causar rupturas na arquitetura da matriz extracelular nativa (p. ex., colágeno e proteoglicano). A preservação da matriz extracelular nativa é importante para permitir a remodelação e regeneração desses materiais (sendo gradualmente substituídos pelo tecido nativo do hospedeiro) ao invés de se tornar uma cicatriz e ser encapsulado pelo corpo. Uma malha ideal deve possuir as características mostradas no Quadro 32.4. Q uadr o 32. 4 C a ra ct e ríst ica s da m a lha bioprot é t ica ide a l Resistência à colonização bacteriana e à infecção crônica Biocompatibilidade e não ser carcinogênico Disponibilidade imediata a um custo aceitável Habilidade para tolerar estresses fisiológicos em um longo período de tempo Não causar dor adicional após implantação Promoção de crescimento de um forte tecido no interior da malha Não apresentar contração ou expansão consideráveis após implantação Limitar a indução e desenvolvimento de aderências às estruturas viscerais Prover células com uma rede de suporte e sinais necessários para que as células do hospedeiro cresçam, se diferenciem e interajam enquanto, ao mesmo tempo, se remodela conforme a ferida adquire resistência e novos tecidos são formados (Adaptado de Bellows CF, Alder A, Helton WS. Abdominal wall reconstruction using biological tissue grafts: present status and future opportunities. Exp Rev Med Devices. 2006; 3:657 – 675.)

Há um número crescente de materiais para malhas bioprotéticas disponíveis para opção pelos cirurgiões. Muitos destes materiais são utilizados para reconstruções complexas do dorso, incluindo reconstrução da parede torácica e correção de hérnia ventral.43 Geralmente são preferidos às malhas sintéticas em razão de sua capacidade de resistir à infecção.44 Eles suportam aderências no local de reparo45,46 e toleram exposição cutânea, geralmente sem necessidade de remoção da malha bioprotética.

Submucosa de intestino delgado A submucosa de intestino delgado (SIS ou Surgisis, Cook Biotech, West Lafayette, IN) é um biomaterial criado a partir do intestino delgado de porcos. Após a remoção das camadas mucosa, serosa e muscular do intestino delgado, uma resistente matriz colágena permanece. A submucosa do intestino delgado oferece resistência mecânica ao intestino. A forte, e ainda assim, bioquimicamente rica e diversificada matriz extracelular da submucosa a torna uma excelente opção para um biomaterial natural. Descrita pela primeira vez em 1989 como um enxerto vascular,47 a SIS teve seu uso ampliado para mais de 20 aplicações em seres humanos, incluindo vários tipos de reparo de hérnia,48-50 reparo de meninges,51 reconstrução de bexiga,52,53 e tratamento da incontinência urinária por estresse.54

Matriz dérmica acelular humana A matriz dérmica acelular humana (MDAH) (AlloDerm, LifeCell, Branchburg, NJ; Allomax, Bard Davol, Murray Hill, NJ; e FlexHD, Ethicon360, Somerville, NJ) é produzida a partir de derme alógena humana doada. Cada fabricante possui uma técnica para a produção de matriz dérmica acelular. Em geral a epiderme e o tecido subcutâneo são removidos e a derme é processada tanto com congelamento seco quanto por meio de detergentes químicos, resultando na estrutura de colágeno da matriz dérmica. As aplicações de MDAH incluem as reconstruções de mama com implantes, de parede abdominal, de parede torácica, de pelve e aumento labial. Existe também disponível MDAH micronizada (Cymetra, LifeCell, Branchburg, NJ) e tem sido utilizada em laringoplastia e como material de preenchimento de tecidos moles.

Matriz dérmica acelular suína A matriz dérmica acelular suína (MDAS) foi desenvolvida para aplicações semelhantes à MDAH. Materiais suínos são mais abundantes e com controle mais fácil das condições de coleta. Entretanto, em razão de a MDAS ser de origem xenógena, devem ser empregados processamentos adicionais para prevenir reações imunológicas adversas quando implantados em seres humanos. Para inibir imunogenicidade e reduzir a degradação da matriz dependente de colagenase, a primeira geração das MDASs (CollaMend, Davol Bard Cranston, RI e Permacol, Covidien, Norwalk, CT) foi submetida a reações intencionais de cross-linking das fibras de colágeno durante o processo de fabricação. Um efeito colateral secundário desta reação é a alteração da estrutura da matriz extracelular, que tem demonstrado inibir a infiltração celular, a revascularização e o potencial de remodelação da matriz.55 Uma nova geração de MDAS (Strattice, LifeCell, Branchburg, NJ) é processada sem a reação de “cross-link”. Neste caso, o antígeno [galactose-α(1,3)-galactose], que é a principal causa de reação imune associada aos enxertos xenógenos acelulares, é enzimaticamente removido. Ainda não está claro quais desses produtos apresentam um melhor resultado; contudo, em um recente estudo in vivo realizado em animais comparando a utilização de MDAS com e sem reação de ligação cruzada na reconstrução de parede abdominal, foi observado que a MDAS sem ligações cruzadas foi rapidamente infiltrada com células do hospedeiro e vasos enquanto a MDAS com reações cruzadas foi encapsulada. A MDAS sem ligações cruzadas demonstrou adesão mais fraca ao local do reparo enquanto aumentou a resistência mecânica da interface bioprótese-músculo-fáscia em estágios iniciais. Além disso, o estudo concluiu que a MDAS sem ligação cruzada pode apresentar vantagens clínicas iniciais sobre a MDAS com ligação cruzada para reconstrução de parede abdominal.56 Porém, nenhum estudo comparativo foi realizado em humanos até o momento.

Outras malhas bioprotéticas

A matriz colágena de pericárdio bovino (Veritas, Synovis, St. Paul, MN) é um pericárdio bovino sem reação de ligação cruzada. A descelularização e a redução da imunogenicidade são obtidas a partir do capeamento de grupamentos amina por meio de um processo químico patenteado. A derme fetal bovina (Surgimend, TEI, Boston, MA) é uma matriz dérmica acelular derivada de bezerros em estágio fetal. Ela não passa por reação de ligação cruzada podendo facilitar a penetração, a revascularização e a integração aos tecidos receptores.

Materiais do futuro Biomateriais e implantes têm gerado grandes impactos na medicina e na cirurgia. Alguns implantes são projetados para ter o mínimo impacto ou interação possível com o corpo. Outros são projetados para interagir com o corpo de forma passiva (p. ex., polímeros biodegradáveis de PLGA). Os biomateriais mais recentes estão sendo desenhados para modular seu ambiente criando uma resposta tecidual específica. Além disso, biomateriais híbridos contendo células, polímeros e fatores de crescimento estão em desenvolvimento em modelos in vivo. Estes biomateriais irão, eventualmente, ser capazes de “sentir ” o meio que os cerca e alterar suas propriedades bioquímicas e mecânicas em resposta às necessidades do ambiente. Assim como ocorreu com os biomateriais desenvolvidos no passado, o contínuo progresso na área de biomateriais depende da colaboração interdisciplinar entre engenheiros, cientistas, clínicos e indústria. Com cooperação contínua entre esses especialistas em biomateriais, a utilização desses materiais e de implantes em cirurgia plástica deve mudar de forma significativa no futuro. O objetivo deverá ser a fabricação de materiais com propriedades reconstrutoras específicas de cada local defeituoso, atendendo de maneira individualizada suas necessidades biológicas, químicas e funcionais. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  4. Cumberland, V. H. A preliminary report on the use of prefabricated nylon weave in the repair of ventral hernia. Med J Aust. 1952; 1:143–144. 5. Scales, J. T. Materials for hernia repair. Proc R Soc Med. 1953; 46:647–652. Esses manuscritos oferecem uma discussão sobre as propriedades físicas ideais de implantes cirúrgicos sintéticos. A noção de que a resposta do hospedeiro pode ser modulada por meio da alteração dessas propriedades do que é sintetizado.

18. Janowsky, E. C., Kupper, L. L., Hulka, B. S. Meta-analyses of the relation between silicone breast implants and the risk of connective-tissue diseases. N Engl J Med. 2000; 342:781–790. Este trabalho oferece uma meta-análise de estudos investigando nexos causais entre próteses de mama de silicone e doenças de tecido conjuntivo. Nenhuma conexão foi encontrada entre implantes de mama e tecido conjuntivo, doenças reumáticas ou autoimunes identificadas.

26. Butler, C. E. Treatment of refractory donor-site seromas with percutaneous instillation of fibrin sealant. Plast Reconstr Surg. 2006; 117:976–985. 27. Toriumi, D. M., O’Grady, K., Desai, D., et al. Use of octyl-2-cyanoacrylate for skin closure in facial plastic surgery. Plast Reconstr Surg. 1998; 102:2209–2219. O octil-2-cianoacrilato foi comparado às suturas convencionais em 111 cirurgias eletivas realizadas por um único cirurgião. Após um ano, um resultado cosmético significativamente superior foi reportado no grupo que teve a pele colada.

29. Langer, R., Vacanti, J. P. Tissue engineering. Science. 1993; 260:920–926. 30. Pham, C., Greenwood, J., Cleland, H., et al. Bioengineered skin substitutes for the management of burns: a systematic review. Burns. 2007; 33:946–957. Esta revisão examinou 20 testes randomizados para comparar a segurança e eficácia dos substitutos de pele desenvolvidos pela bioengenharia para substituir pele natural. Os autores encontraram que não há na literatura atual evidências suficientes para se extrair conclusões definitivas acerca desse tópico e que outros estudos devem ser realizados urgentemente.

33. Heimbach, D., Luterman, A., Burke, J., et al. Artificial dermis for major burns. A multi-center randomized clinical trial. Ann Surg. 1988; 208:313–320. Esta série detalha o início da utilização de enxertos artificiais de derme. Os autores concluíram que os enxertos de derme artificiais combinados com os enxertos epidérmicos oferecem cobertura comparável aos enxertos de pele convencionais, porém, com menor morbidade da área doadora.

44. Breuing, K., Butler, C. E., Ferzoco, S., et al. Incisional ventral hernias: review of the literature and recommendations regarding the grading and technique of repair. Surgery. 2010; 148:544–558.

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Próteses faciais em cirurgia plástica Gordon H. Wilkes, Mohammed M. Al Kahtani e Johan F. Wolfaardt

Resumo O sucesso da biotecnologia no setor osseointegração tem revolucionado a reconstrução protética facial. O titânio é o material de implante escolhido por ser leve, biocompatível e resistente à corrosão. A técnica de colocar o implante é fundamental, para a produção do contato osso-implante e sucesso da consolidação óssea, sem nenhum tecido fibroso interposto. Seleção do tratamento apropriado requer compreensão de todas as opções disponíveis. É necessário planejamento de uma equipe multidisciplinar. Biotecnologia na área de osseointegração proporciona aos cirurgiões plásticos maiores opções de tratamento às deformidades mais desafiadora da cabeça e pescoço.

Acesse a seção Perspectiva Histórica e Figura 33.1 em inglês no site http://www.expertconsult.com Deformidades na região da cabeça e pescoço podem causar na estética e psique de qualquer indivíduo, um impacto profundo. Sendo assim, tempo, esforço e criatividade foram usados na tentativa de desenvolver eficientes métodos de reconstrução, que pudessem solucionar os mais variados casos de imperfeição craniofacial. A técnica reconstrutiva autógena continua sendo padrão ideal, mas em alguns casos, pode ser contraindicada, por dois motivos: impossível tecnicamente ou resolver apenas, de forma parcial, os problemas de reconstrução. Historicamente, as próteses faciais apresentavam benefícios limitados. A retenção delas era, em muitos casos, malsucedida, devido ao uso de adesivos ou meios mecânicos inapropriados à retenção. Logo, o paciente não tinha confiança no posicionamento da prótese, nem em sua capacidade de permanecer no local. Dor e desconforto juntos, frequentemente, limitavam o tempo e as circunstâncias do uso protético. Por serem aqueles utilizados nas indústrias, os adesivos não eram biologicamente desenvolvidos só para uso humano. Dessa forma, muitos apresentavam efeitos adversos à pele subjacente comprometida pela radioterapia, trauma ou lesões térmicas1. Esses efeitos afetavam a durabilidade da prótese. Por causa do êxito da osseointegração em solucionar problema de retenção protética,2,3 uma nova modalidade de tratamento está, no momento, disponível.4,5 Esse método consiste no aumento da longevidade da prótese, sem necessidade de adesivos.6,7 Sendo assim, próteses faciais retidas pela osseointegração já reúnem critérios fundamentais para o sucesso: (1) aceitabilidade estética; (2) desempenho funcional; (3) biocompatibilidade e; (4) retenção desejada.8 O uso da osseointegração na restauração protética facial tem sido aclamado como o avanço mais significativo, na área das próteses faciais nos últimos 25 anos.9 Estima-se que mais de 90.000 implantes foram colocados extraoralmente em mais de 45.000 pacientes, até o ano de 2007.10 A reconstrução craniofacial osseointegrada oferece ao cirurgião plástico opção de tratamento viável, nos casos mais complicados da cabeça e pescoço.11 Além disso, esse método pode proporcionar a alguns pacientes qualidade de vida mais significativa, já que no passado não havia opções de tratamentos eficazes. Infelizmente, especialistas ou fornecedores concorrentes apresentam técnicas autólogas como opostas à osseointegração

craniofacial.12 Entretanto, cabe ressaltar que, técnicas osseointegradas e autógenas não devem ser vistas como concorrentes, mas sim como procedimentos complementares, que aumentam a capacidade de sucesso, na gestão das principais deformidades da cabeça e pescoço. Em alguns casos, isso não fica muito claro. Muitos não compreendem a técnica de osseointegração e seus benefícios. Dessa forma, a modalidade pode ser vista, apenas, como um procedimento de recuperação, quando todas as opções falharam e ambos, paciente e cirurgião estão desesperados. Esse método não é considerado, de fato, uma cirurgia “real”, mas sim um meio de colocar alguns parafusos no osso. Alguns médicos não entendem como pacientes podem ficar satisfeitos com uma prótese, “um objeto estranho, que nunca faria parte de sua imagem corporal”. Todavia, qualquer cirurgião com experiência na osseointegração, considera essas linhas de pensamento bem falhas. Esse método necessita de um suporte em longo prazo, tanto de quem cuida, como de quem financia para a manutenção dos locais do implante, assim como da futura construção protética. Esse procedimento é semelhante ao tempo e recursos financeiros necessários em transplante de órgãos.

Vantagens da osseointegração craniofacial A osseointegração craniofacial tem muitas vantagens (Quadro 33.1).20 Os procedimentos cirúrgicos são geralmente curtos, com mínima morbidade e são realizados em regime ambulatorial. Há uma curva de aprendizagem curta e os resultados são previsíveis. Os pacientes, normalmente, apresentam um desconforto pós-operatório mínimo. O exame de ressecção do local do tumor é fácil, e permite um diagnóstico precoce de qualquer recorrência do tumor. Q uadr o 33. 1 Va nt a ge ns da osse oint e gra çã o cra niofa cia l7 Curva de aprendizagem curta Dor pós-operatória mínima Estética protética excelente Morbidade mínima Permite a verificação do local de ressecção do tumor Procedimento curto Procedimentos ambulatoriais Recuperação dos fracassos autógenos Utilização em tecidos comprometidos A osseointegração craniofacial pode recuperar, com êxito, um paciente que não obteve sucesso na reconstrução autógena. Pois, a técnica, muitas vezes, oferece uma estética até superior, se comparada às próteses faciais retidas por adesivos. A osseointegração proporciona uma retenção protética previsível, pois aumenta a durabilidade e vida útil da prótese, bem como da estética protética. E ainda, disponibiliza facilidade de deslocamento, sem danos à pele subjacente e boa incorporação da prótese na imagem corporal. Em suma, um paciente mais feliz e satisfeito. A técnica também pode ser considerada para pacientes diabéticos e fumantes. As desvantagens da osseointegração craniofacial são: necessidade de uma equipe multidisciplinar maior que, muitas vezes, não está disponível, pacientes exigem visitas de manutenção regulares e uma nova prótese a cada 2-5 anos (Quadro 33.2).20 Sendo assim, os custos relacionados ao tempo útil podem ser um problema para algumas companhias de seguros. Q uadr o 33. 2 De sva nt a ge ns da osse oint e gra çã o cra niofa cia l7 Custo contínuo para refazer a prótese e visitas de manutenção Não é seu tecido próprio Necessidade de confiança e comprometimento do paciente Necessidade de equipe multidisciplinar

Indicações para osseointegração facial

A osseointegração facial pode ser, particularmente, benéfica à reconstrução de defeitos, que envolvem orelha, órbita, nariz, e defeitos médio-faciais combinados. Os implantes osseointegrados também têm sido utilizados para fixar cabelos postiços.21 Uma aplicação mais recente de interesse ao cirurgião plástico é a utilização de um aparelho auditivo ancorado no osso (BAHA) em crianças com microtia. No passado, havia grande preocupação em combinar um BAHA a uma orelha autógena reconstruída. Houve, por parte dos cientistas, receio que algum posicionamento inadequado do implante fosse prejudicar a reconstrução autógena da futura orelha. Esse fato, impedia, em geral, que pacientes obtivessem benefícios de ambas modalidades. Isto geralmente resulta no BAHA sendo colocado demasiadamente para posterior ou tendo seu uso descartado. Certamente, o BAHA é uma excelente alternativa para restaurar a audição de pacientes com microtia bilateral e, recentemente, tem se mostrado benéfico em pacientes com microtia unilateral (Fig. 33.2). É uma forma mais simples, segura e previsível de melhorar a audição, através de meios autógenos de canalplastia e reconstrução da orelha média.10

FIG. 33.2 Aparelho auditivo ancorado no osso (BAHA) e reconstrução autógena da orelha para microtia.

Reconstrução da orelha A reconstrução autógena de defeitos auriculares teve uma melhora significativa na segunda metade do século XX, graças ao trabalho de pioneiros como Tanzer,22 Brent,23-26 Fukuda e Yamada,27 Cronin,28 Bauer,29 Yanai et al.,30 Isshiki et al.,31 Nagata,32-34 e outros. Entretanto, nem todas as tentativas de reconstrução são bem sucedidas. A escolha do tratamento adequado para os principais defeitos da orelha continua a ser controversa (Tabela 33.1).20 Certos defeitos auriculares limitam as opções autógenas, particularmente, após remoção da orelha, devido o câncer, junto à radioterapia. Temos convicção que essas técnicas reconstrutivas são complementares, e devem ser apresentadas dessa maneira.8,12,20 Indicações definitivas para reconstrução protética auricular osseointegrada incluem: (1) após grande ressecção tumoral; (2) radioterapia do local proposto para a reconstrução auricular; (3) tecido do local gravemente comprometido (Fig. 33.3); (4) preferência do paciente; e (5) procedimento de resgate para reconstrução autógena fracassada. Indicações relativas incluem: (1) microtia; (2) ausência de metade inferior da orelha; e (3) pacientes com cartilagem costal calcificada.

Tabela 33.1 Indicações para reconstrução auricular osseointegrada7 Definitiva

Relativa

Grande ressecção do câncer

Microtia – mais controversa

Radioterapia

Ausência da metade inferior da orelha

Tecido gravemente comprometido

Cartilagem costal calcificada

Preferência do paciente Fracasso da reconstrução autógena Potencial anomalia craniofacial Baixo risco operatório

FIG. 33.3 (A-C) Reconstrução após grave lesão elétrica incluindo cranioplastia, cobertura do couro cabeludo com retalho livre e reconstrução da orelha com prótese implantossuportada.

Provavelmente, a indicação mais controversa para a reconstrução auricular osseointegrada é a microtia em crianças. Embora, seja tecnicamente possível colocar implantes em crianças a partir dos três anos, e os resultados iniciais encorajadores; o acompanhamento nessas situações é curto. Pois, o uso de implantes osseointegrados craniofaciais exige a remoção de toda orelha local remanescente e, de certa forma, produz cicatrizes no campo operatório. Portanto, as futuras opções de reconstrução autógena são bem limitadas. Por esses motivos, o uso de reconstrução auricular osseointegrada na faixa etária pediátrica necessita de uma análise muito cuidadosa pelo médico e pela família (Fig. 33.4). Uma publicação de Zeitoun et al.35 descreve dificuldades encontradas no uso da osseointegração no meio pediátrico; mostrou também um aumento da necessidade de apoio psicológico em muitos desses pacientes. Cabe ressaltar que, nossa abordagem é oferecer reconstrução autógena da orelha aos pacientes pediátricos com microtia. Pois, apesar da grande dificuldade na decisão do tipo de tratamento, nós raramente encontramos esses casos. Os pacientes, em geral, decidem rápido, após serem apresentados a todas as possibilidades. É raro mudarem de ideia, depois de uma discussão mais profunda.

FIG. 33.4 (A, B) Perda da orelha de trauma tecidual local grave, devido a um ataque de cão em criança. Reconstruída com prótese implantossuportada.

A utilização de uma prótese auricular mantida por adesivo é muito limitada. Tem apenas um significado histórico. Certamente, não pode ser considerada um “teste” para a prótese osseointegrada uma vez que, não proporciona as principais vantagens das próteses implantossuportadas, tais como: facilidade de colocação, retenção previsível, melhor estética, aumento da longevidade da prótese, sem insulto contínuo à pele.

Reconstrução nasal osseointegrada As indicações à reconstrução nasal osseointegrada incluem: (1) reconstrução autógena fracassada; (2) cicatrizes significativas em locais doadores de potenciais autógenos (Fig. 33.5)6; (3) recorrência do tumor após reconstrução autóloga inicial; e (4) preferência do paciente (Quadro 33.3). Devido à necessidade de múltiplas fases cirúrgicas e maior variabilidade no resultado final com reconstrução autógena, vários pacientes com perda total do nariz optam por colocar implantes e próteses nasais (Fig. 33.6). Obviamente, existe menos cirurgia envolvida com menor morbidade, quando não há necessidade de outras áreas doadoras, e a vigilância do tumor é fácil com a retirada da prótese.8 Logo, a aplicação de implantes zigomáticos longos “não tradicionais” pode ser útil em situações difíceis de reconstrução nasal.36 Q uadr o 33. 3 Indica çõe s pa ra re const ruçã o na sa l osse oint e gra da1 0 Cicatriz em áreas doadoras autógenas Contraindicação médica para reconstrução autógena em multiestágios Fracasso da reconstrução autógena Preferência do paciente Uso de prótese osseointegrada após reconstrução autógena devido à recorrência do tumor

FIG. 33.5 (A, B) Um estudo SimplantTM pode ser realizado para determinar a quantidade e a qualidade do osso subjacente.

FIG. 33.6 (A-D) Deformidade nasal após ressecção do câncer, reconstruída com prótese nasal implantossuportada.

Reconstrução orbital osseointegrada Pacientes com perda da órbita e conteúdo orbital possuem poucas opções de reconstrução autógena (Quadro 33.4). Embora uma cobertura autógena possa ser necessária para recobrir importantes estruturas neurológicas, em muitos casos, apenas fornece o preenchimento da cavidade orbital residual. No entanto, o “preenchimento do buraco” não cria resultado estético. É nessas situações, que a reconstrução orbital osseointegrada tem mais vantagens sobre a reconstrução autógena. Os resultados estéticos são bem superiores e, novamente, permitem a visualização precoce da recorrência do tumor (Fig. 33.7). Essa abordagem também pode ser considerada para pacientes com enoftalmia grave, e com significativo comprometimento da visão. Entretanto, não é muito recomendada em pacientes com prótese ocular e distorção da pálpebra acentuada, secundária a um trauma ou radioterapia, que não seja passível de correção autógena. A esperança para o futuro seria criar uma prótese orbital, que pudesse imitar o movimento de ambas as pálpebras e do globo do olho normal oposto.13 Q uadr o 33. 4 Indica çõe s pa ra re const ruçã o orbit a l osse oint e gra da Dificuldade com uma prótese ocular e distorção palpebral significativa, devido a um trauma, ou radioterapia que não é passível de correção autógena Enoftalmia grave com visão comprometida Perda da órbita ou do conteúdo orbital

FIG. 33.7 (A-C) Esta paciente teve uma exenteração orbital por uma malignidade e foi reconstruída, com uma prótese orbital implantossuportada.

Reconstrução do terço médio da face Pacientes com defeitos faciais complexos, que podem incluir a órbita, nariz e maxilar também possuem poucas opções autógenas (Fig. 33.8). A osseointegração craniofacial oferece vantagens significativas, pois permite um exame da imperfeição pós-tumor e proporciona um resultado estético bem aceitável. No paciente apresentado na Figura 33.8, foi possível detectar precocemente uma recorrência na parede orbital posterior. O tratamento consistiu em remoção cirúrgica e reconstrução com um retalho fascial temporoparietal e enxerto de pele. O paciente foi capaz de retomar o uso de sua prótese, novamente, em apenas 12 dias após cirurgia de ressecção da recorrência. A osseointegração extraoral combinada à intraoral, também pode resultar em melhora significativa dos resultados funcionais sobre técnicas de próteses convencionais ou autógenas.

FIG. 33.8 (A, B) Este paciente apresentou um extenso carcinoma basocelular invadindo sua órbita, região nasal e maxila. Após extirpação cirúrgica, os implantes foram mais tarde colocados e uma prótese naso-orbital construída. As opções autógenas eram poucas.

Importantes fatores para obter a osseointegração13,37

Escolha do material de implante Muitos materiais têm sido considerados para a osseointegração. Apesar de outros, como o vanádio, tântalo, hidróxido de alumínio e as cerâmicas, como a hidroxiapatita, serem conhecidos para integrar com o osso em certo grau, o titânio é,atualmente, o material preferido.37 Pois, embora seja relativamente leve, é mais rígido que o osso. E isso permite que sua elasticidade se flexione com a parte óssea. O fator mais importante é a capacidade que a camada de óxido de titânio possui, na superfície do implante, em reagir com o osso subjacente (biocompatibilidade). O segredo do sucesso é o que acontece nesta interface implante-tecido. O titânio, comercialmente sem mistura, é o melhor, porque apresenta 99,75% de pureza. Logo, se difere da liga de titânio mais comumente utilizada, que contém 90% de titânio, 6% de alumínio e 4% de vanádio, e exibe menos características satisfatórias de osseointegração.

Interface implante-tecido Exceto por meios mecânicos, todas as interações entre o implante e o local que o mesmo foi colocado ocorrem por forças fisicoquímicas a menos de 1,0 mm da superfície. Quando o implante de titânio é exposto ao oxigênio e entra em contato com o local que foi implantado, uma camada de óxido é formada rapidamente, atuando como uma barreira protetora, que impede o contato direto entre o metal e o seu ambiente. A camada de óxido de titânio continua a crescer com o tempo e cria uma interface dinâmica. Pode-se dizer que é o componente bioativo do implante. As características da microssuperfície do próprio implante, incluindo rugosidade, porosidade e desenho da trama, influenciam em potencial para uma osseointegração bem sucedida. A rugosidade da superfície de 100 µm ou mais é vantajosa. Um implante que possui uma superfície muito lisa resultará em uma menor integração, com menos reabsorção óssea, já uma superfície muito áspera obterá uma rápida integração, mas com inflamação e reabsorção secundária, que pode por em risco a integração posteriormente. A macroestrutura do implante tem importância à integração. Completa as bordas externas e espaços de um implante rosqueado, e isso alivia a concentração de tensões. Um implante em forma de parafuso, muitas vezes, demonstra boa estabilidade primária, enquanto que um em forma de cone pode ser perdido por causa de micromovimentos iniciais e, portanto, tem pouca estabilidade.

Leito ósseo O leito ósseo, no qual o implante é instalado é importante. Há uma diferença quando o implante é instalado em uma criança com osso, relativamente, macio e imaturo, em comparação ao adulto. O paciente mais velho com osteoporose, por exemplo, irá integrá-lo em menor grau, logo haverá grande probabilidade de o implante ser malsucedido. Lembramos que pacientes que foram irradiados ou sofreram queimaduras terão a textura do osso alterada, o que reduzirá a capacidade para integrar implantes.

Preparo ósseo Uma técnica cirúrgica meticulosa e delicada é vital para que ocorra a osseointegração.10 O preparo ósseo deve resultar em uma nova cicatrização óssea ao redor do implante, sem formação de tecido fibroso interposto e mínima necrose óssea (Fig. 33.9). Uma cicatrização óssea apropriada resulta, em última análise, no osso em profundo contato com a camada de óxido de titânio. Brocas afiadas, irrigação salina abundante e velocidades mais baixas são necessárias para o sucesso. Estudos têm mostrado que, em temperatura de 89°C ocorrem alta velocidade com a perfuração, apesar da refrigeração.38-40 Osso exposto em temperaturas superiores a 47°C, durante 1 minuto mostrou diminuição na formação de osso novo. Já uma exposição a 44°C não apresentou nenhum efeito negativo. Cabe lembrar que o equipamento só deve ser manuseado com instrumentos de titânio e nunca tocado por mãos enluvadas. Além disso, é importante que o campo cirúrgico seja protegido de fibras, pó e outras substâncias que possam impedir a osseointegração. Na junção do óxido de titânio e osso, uma camada de substância de base, que consiste de proteoglicanos e glicosaminoglicanos é formada. A espessura dessa camada é inversamente relacionada com a força de integração do osso com o implante. O titânio tem a mais fina camada da substância de base, aproximadamente 200 Å.

FIG. 33.9 Interface osso-titânio com apenas camada de óxido e sem tecido mole interposto.

Cirurgia traumática e um leito de implante com baixo potencial de cicatrização são considerados os principais fatores restritivos ao sucesso da osseointegração. Mobilidade do implante, sobrecarga, e pouca biocompatibilidade do implante são considerados fatores secundários no fracasso da osseointegração. Uma vez que, na osseointegração bem sucedida, a porção mais frágil do complexo osseointegrado, osso-implante, é o próprio osso. Após uma osseointegração com êxito, a tentativa de remoção de um implante ocorrerá ao redor do osso envolvente, e não na interface implante-osso.

Carga do implante A carga do implante deve estar, preferencialmente, na direção longitudinal. É importante evitar forças de rotação e de balanço, uma vez que o implante esteja integrado. Quando as forças são distribuídas na direção longitudinal, mesmo cargas muito elevadas podem ser suportadas pelo implante durante anos de função.

Planejamento do tratamento Proporcionar atendimento à osseointegração craniofacial exige uma equipe multidisciplinar maior que na reconstrução autóloga. A equipe principal deve ter especialidade cirúrgica adequada, incluindo cirurgia plástica, otorrinolaringologia e cirurgia oral, um protético, um técnico dentário, um anaplastologista, enfermagem apropriada e auxiliar de consultório dentário. Visto que, a avaliação pré-operatória cuidados e planejamento são fundamentais para o grande sucesso deste empreendimento clínico. Apenas com o espectro de todos os membros da equipe, o paciente pode ser apresentado a todas as opções adequadas, para que possa tomar uma decisão verdadeiramente consciente. O planejamento do tratamento inicia-se com uma consulta multidisciplinar. Então, os membros da equipe formulam uma abordagem para cada problema do paciente, de maneira individual. Os exames pré-operatórios incluem gráfico, fotografias pré-operatórias padronizadas, perfil psicológico, exames radiológicos como a tomografia computadorizada (TC), incluindo imagens tridimensionais e planejamento do local do implante,41-43 impressões do defeito e do lado normal correspondente, construção de modelos de planejamento cirúrgico e modelagem médica apropriada. O exame pré-operatório permite uma avaliação óssea para a colocação do implante, a presença de estruturas vitais ao redor, qualidade geral do osso e tecidos moles sobrejacentes. O paciente não deve possuir fatores sistêmicos ou locais que possam influenciar, de forma significativa, a capacidade de remodelação óssea.44 A idade não é considerada uma contraindicação. Pacientes, como jovens de três anos ou em seus 80, têm sido tratados com êxito. Não deve haver condições de patologias psiquiátricas ou de droga-adicção. Tabagismo é uma contraindicação relativa,45 como é a radioterapia,10,46,47 ou a quimioterapia.48 Na literatura, a sobrevivência dos implantes ao tabagismo envolve os implantes dentários e não os implantes osseointegrados craniofaciais.49 Um caso de radioterapia necessita de avaliação para tratamento com oxigênio hiperbárico, antes e após a colocação do implante, pois são fatores que aumentam a chance de sucesso da osseointegração.50-52 Os pacientes devem ter certo nível de capacidade cognitiva, visual e destreza para a manutenção dos implantes osseointegrados. Eles também devem apresentar proximidade geográfica razoável a uma unidade de osseointegração. Uma vez que o preparo pré-operatório e o consentimento informado foram

obtidos, o tratamento pode começar. Na reconstrução autóloga, o cirurgião fornece o resultado final. Isso difere da osseointegração. Pois, nessa técnica o cirurgião prepara o local para resultar em prótese definitiva, confeccionada pelo protético ou anaplastologista, tornando o planejamento pré-operatório e a colocação do implante adequado, ainda mais imprescindível, para o sucesso do tratamento final. Uma boa comunicação entre o cirurgião e o protético, ou anaplastologista, durante o pré-operatório e muitas vezes, no intraoperatório é fundamental. Implantes colocados em posição errada comprometerão a estética final e o resultado funcional ou implicarão a necessidade de colocação de novos implantes no futuro.

Técnica cirúrgica A abordagem cirúrgica como a desenvolvida por Brånemark é uma meticulosa técnica que apresenta várias etapas, podendo ser realizada em um ou dois estágios, depende da situação clínica.53 Embora o titânio seja utilizado em várias especialidades em muitas situações clínicas, essa aplicação, que resulta em osseointegração não deve ser confundida com outras aplicações do titânio. A biotecnologia da osseointegração é muito específica em termos de produzir e preparar a fixação da técnica. É uma modalidade cirúrgica que mostra o resultado final. Outros sistemas de implantes (Conexcao, Otorix, Straumann, ITI, Southern) estão disponíveis, mas não são baseados, principalmente, no implante original.10 Comparada à osseointegração intraoral, as fixações para uso extraoral tendem a ser mais curtas (3-5 mm). O comprimento utilizado depende, particularmente, da espessura do osso. Fixações mais longas podem, às vezes, serem usadas no osso frontal, zigomático e no maxilar. De modo ideal, deve-se obter uma colocação bicortical, quando anatomicamente possível. O ambiente extraoral tende a ser mais hostil, menos leniente que o intraoral. A gengiva é construída para ter penetração da mucosa, e a saliva com ação de limpeza da língua são benéficas. A penetração, através da pele com cabelos das proximidades, músculo e glândulas sebáceas desenvolvem mais problemas para os tecidos moles. Visto que a pele não faz ligação ao pilar do implante e é, normalmente, mantida como uma ferida aberta. A capacidade de modular melhor essa interface resultaria em menos problemas locais de pele. A cirurgia pode ser realizada em um ou dois estágios.1,12 O procedimento de um estágio é, geralmente, reservado para pacientes adultos com boa qualidade e quantidade óssea. Dessa forma, pode ser realizada, na maioria dos casos, tanto sob anestesia geral ou com sedação e anestesia local. Um molde do tratamento é usado para escolher o local de aplicação do implante. Um posicionamento adequado é fundamental para o êxito final da prótese. Tecnologias digitais avançadas podem ser úteis para este aspecto do planejamento. Adobe Photoshop ou Freeform tem sido utilizado com mérito para essa finalidade (Fig. 33.10). Na reconstrução auricular, os implantes devem ser colocados sob o futuro local da dobra anti-hélice da prótese da orelha. Isto é, onde há profundidade máxima para esconder a saliência do pilar de fixação no interior da prótese.

FIG. 33.10 Um modelo de orelha é utilizado para escolher o local apropriado à colocação do implante.

Na reconstrução orbital, os implantes devem ser postos no interior do rebordo orbital, em vez de anteriormente, onde na técnica seja mais fácil de colocá-los. Novamente, considerações têm de ser dadas às necessidades de espaço à prótese orbital, em todas as três dimensões. Dentro da órbita, os implantes não devem se alinhar a um ponto central de convergência, pois isso pode dificultar os procedimentos protéticos. Na reconstrução nasal, maior êxito é obtido com a colocação dos implantes no assoalho do nariz, em vez da região da glabela. Em caso de existir preocupações sobre a qualidade ou quantidade óssea subjacente, um estudo SimplantTM deve ser realizado (Fig. 33.5). Esse software, junto a uma TC, permite a avaliação óssea e a simulação cirúrgica da colocação do implante. Então, modelos apropriados podem ser construídos, de modo a auxiliar o cirurgião durante a cirurgia de implante. A área é infiltrada com solução de lidocaína (Xilocaína®) e epinefrina; e um retalho é levantado. O periósteo é exposto e, ou um retalho periosteal é levantado, ou uma abertura circular é realizado no periósteo. Um modelo de localização cirúrgica é valioso em casos difíceis, para melhorar o posicionamento do implante, minimizar o número de furos da broca-guia necessários para encontrar o osso adequado, e diminuir a tempo do procedimento. Uma broca-guia de 3,0 mm é utilizada primeiramente. Se o osso estiver presente na profundidade após a perfuração, aprofunda-se para 4,0 mm. Essa perfuração é realizada a uma velocidade de 2.000 rpm com irrigação salina abundante. A base do buraco guia é verificada para determinar se não ocorreu perfuração de estruturas vitais subjacentes. No segundo estágio, o buraco guia é então alargado com um escareador. Uma broca escareadora nova é utilizada, assim como irrigação salina abundante. Isto também prepara uma área escareada plana na superfície do osso para assentamento da borda do implante. Na órbita, muitas vezes fixação sem bordas são colocadas. Questões com a limpeza e acúmulo de detritos em torno da borda do implante podem ser problemáticas na região orbital. O terceiro estágio envolve a colocação do implante auto-perfurante. Ele é colocado com uma broca na velocidade de 15-20 rpm e 20-40 N-cm de torque. Todas essas precauções são tomadas para minimizar a necrose óssea. Visto que, com a necrose óssea, o tecido fibroso pode se desenvolver, comprometendo a interface tecidoimplante, logo a osseointegração não ocorrerá. Todas as brocas e escareadores são descartadas após cada procedimento. Os implantes craniofaciais possuem 3,75 mm de diâmetro e estão disponíveis em 3,0, 4,0 e 5,5 mm de comprimento (Fig. 33.11). Um implante de 4,0 mm é preferível quando as condições ósseas permitem.

FIG. 33.11 Implante craniofacial e fixação do titânio comercialmente puro.

No quarto estágio, um parafuso de cobertura ou de espaço é colocado no implante. Isso impede o crescimento interno de tecido mole no interior da porção central do implante, onde o pilar acabará por se ajustar. Um parafuso de espaço se adapta no centro do implante, e não aumenta o seu perfil durante a fase de cura. É utilizado quando os implantes são colocados sob uma área de enxerto de pele antigo ou retalho de pele fino, geralmente na região orbital. As incisões cirúrgicas são então fechadas, quando um procedimento de dois estágios estiver planejado. Quando um procedimento de um estágio for desejado, a camada externa do retalho é levantada como um enxerto de espessura parcial anexado, e os tecidos moles subjacentes descartados. As bordas em torno do lado externo do local do retalho são, agressivamente, afinadas e o enxerto é substituído para assumir o periósteo subjacente. As causas mais comuns de problemas futuros com os tecidos moles são o movimento do tecido em torno do pilar e folículos pilosos deixados para trás. Em tecido não irradiados, os implantes são deixados por aproximadamente três meses, tempo em que a cirurgia da fase II pode ocorrer. No terço médio da face ou em paciente com história de radioterapia, esse período de tempo é, em geral, aumentado para 6-9 meses. Normalmente, dois implantes são necessários para a reconstrução auricular e, pelo menos, três para a reconstrução orbital. Implantes extras são, muitas vezes, colocados como dormentes na região orbital, pois as taxas de sucesso em longo prazo, nesta região não são muito altas como em outros lugares. Quando um implante fracassar, um dormente pode ser exteriorizado, e o paciente pode continuar a utilizar prótese sem interrupção. A cirurgia de fase II, quando necessária, envolve: expor o implante, redução radical do tecido sobrejacente e circundante, criação de uma zona sem pelos e imóvel de 1,0 cm em torno de cada pilar, e conexão de um pilar com uma fixação subjacente. Cirurgia de tecido mole impróprio é a causa mais comum de reação tecidual contínua em torno do pilar. Outras considerações cirúrgicas incluem remoção de quaisquer elementos de tecido mole suficiente para produzir uma superfície tecidual plana para a prótese de orelha. Recentemente, houve sucesso na região mastoide com colocação de implante de um estágio em condições ideais.54,55 Critérios clínicos aceitos para procedimentos de um estágio na região mastoide às crianças mais velhas (>10 anos) ou adultos incluem: • Camada cortical do osso maior do que 3,0 mm de espessura. • Cirurgia descomplicada. • Nenhuma história de irradiação. A técnica é, essencialmente, a mesma que para a cirurgia de fase I e II, mas ambas as fases são realizadas na mesma operação. Após a cirurgia de um estágio, o implante deve ser protegido e não sofrer carga por pelo menos 3 meses.

Construção protética A construção protética, geralmente, inicia-se 4-6 semanas após a cirurgia de fase II, quando os tecidos locais apresentam uma cicatrização suficiente para ser uma base estável à construção protética sobrejacente. Os

detalhes da construção da prótese têm sido bem descritos em outras partes do texto.41 Em geral, uma superestrutura em barra é individualmente projetada e conectada aos pilares. As próteses são, primeiramente, esculpidas em cera e relacionadas com uma subestrutura em resina acrílica. Quando a prótese está anatomicamente aceitável, um molde é construído e ela é confeccionada de elastômero de silicone. Tecnologias digitais avançadas têm sido úteis na construção de próteses. A captura de dados do lado “normal” pode ser feita a partir de uma moldagem ou através de varredura da superfície a laser. Com o software para desenho assistido por computador (Mimics, Magice e Freeform), a imagem é manipulada e a forma básica da prótese é facilmente construída (Fig. 33.12). Essa eficiência diminui a quantidade de tempo necessária entre o anaplastologista e o paciente. Construir a prótese, utilizando o tempo e as habilidades do anaplastologista, de forma eficaz, é muito importante, pois elas são em quantidade limitada.

FIG. 33.12 (A-E) Tecnologias digitais avançadas foram utilizadas na construção protética neste defeito orbital.

Outro desafio para protéticos e anaplastologista é a correspondência de cores, com base nos pigmentos e influências extrínsecas normais do paciente, como a época do ano e sua ocupação. Uma das soluções mais recentes, inclui o uso da informática através da tecnologia da espectrofotometria à correspondência de cores da prótese para o paciente.56 Às vezes, o indivíduo terá próteses de verão e inverno para o ajuste das sutis alterações pigmentares. Pequenos detalhes e técnicas são utilizados para adicionar realismo às próteses. Clipes sobre a superfície inferior da prótese fixam ela firmemente à barra, e são mais comuns nas orelhas. Geralmente, duas próteses são feitas no mesmo momento (Fig. 33.13). Isto evita uma situação de crise, quando algo acontecer a uma delas. Um sistema de retenção magnético é mais comum ser utilizado nas próteses orbitais.

FIG. 33.13 Duas próteses são confeccionadas ao mesmo tempo, com coloração variada para estações diferentes, e para prevenir uma crise, quando uma prótese é perdida ou danificada. Existem clipes na superfície inferior da prótese, para garantir fixação à superestrutura da barra implantossuportada.

Programa de manutenção O sucesso em longo prazo da osseointegração necessita de um regime de manutenção contínuo e eficaz, análogo ao acompanhamento de um programa de transplante de órgãos. Um forte compromisso do paciente é necessário para o sucesso. Em particular, um cuidado consciente à área peri-pilar é fundamental. Isso inclui limpeza suave diária, assim como adequada aplicação diligente de agentes tópicos prescritos (Fig. 33.14). Estes podem incluir óleo mineral para lubrificação geral da pele, antibiótico em pomada ou esteroide tópico. Nossos pacientes recebem um cronograma para lembrá-los da manutenção completa, para pressioná-los de seu compromisso, que é vital ao sucesso em longo prazo. Visitas de manutenção incluem avaliação da região peripilar, medindo a altura dos tecidos moles, verificando a reação tecidual e monitorando a integridade mecânica do conjunto implante-pilar. Novas próteses serão construídas no futuro, quando necessário. A vida de uma prótese individual pode variar entre 2 e 5 anos, dependendo de fatores extrínsecos, tais como: cuidados gerais, exposição à luz solar ou fumaça de cigarro.6

FIG. 33.14 Requisitos para os cuidados dos locais do pilar.

Procedimentos autógenos auxiliares Acreditamos que o tratamento do defeito craniofacial do paciente é, muitas vezes, melhor tratado pela combinação da osseointegração com procedimentos autógenos, pois juntos otimizam os resultados finais (Quadro 33.5 e Figs. 33.15, 33.16).57,58 O objetivo dos procedimentos auxiliares pode incluir: diminuição do tamanho da prótese facial, colocação de margens protéticas nas junções das unidades estéticas, diminuição do tamanho do obturador maxilar, melhorar o contorno facial, melhorar a simetria e trazer osso viável à colocação do implante em uma área comprometida pela cirurgia ou radioterapia. Q uadr o 33. 5 Proce dim e nt os a ux ilia re s nos t e cidos m ole s, com bina da s com

osse oint e gra çã o cra niofa cia l Elevação da sobrancelha Enxerto de cartilagem onlay Expansores de tecido mole Reconstrução da sobrancelha Reconstrução do tragus Remodelagem óssea Reparo de ectrópico Reposicionamento alar Reposicionamento do conduto auditivo externo Retalho ósseo livre microcirúrgico Retalho ósseo pediculado Revisão da cicatriz Ritidoplastia Retalho do músculo Suspensão estática da face

FIG. 33.15 (A-D) Quando criança, este paciente foi submetido a uma enucleação do globo direito radioterapia pós-operatória para uma lesão maligna. Ele foi reconstruído com uma combinação de técnicas autógenas e aloplásticas. Ele sofreu uma reconstrução de sobrancelha, enxerto de cartilagem onlay para o zigomático direito, revisão orbital e uma prótese orbital osseointegrada.

FIG. 33.16 (A,B) Tecnologia de modelagem médica é utilizada para auxiliar na construção de um enxerto de cartilagem adequado, e para ajudar a colocação do implante.

Resultados da osseointegração craniofacial Para avaliar o bom resultado da osseointegração craniofacial, vários parâmetros precisam ser estudados.59,60 O êxito, na perspectiva do paciente, é a capacidade de usar a prótese regularmente e ter melhora na qualidade de vida. Esse fator contribui para o sucesso psicológico, tanto quanto o estético e funcional. A avaliação dos resultados deve também incluir uma parte do mérito ao implante individual, e a resposta da pele local.

Taxas de sucesso dos implantes individuais Jacobsson et al.18 propuseram os seguintes critérios para o sucesso de um implante craniofacial osseointegrado: 1. O implante independente deve estar imóvel, quando testado clinicamente. 2. Reações do tecido mole da penetração da pele em torno do pilar deve ser do tipo 0 (livre de reação), ou do tipo I (vermelhidão leve), não exigindo tratamento em mais de 95% das observações. 3. O desempenho do implante individual deve ser caracterizado pela ausência de sinais e sintomas persistentes e/ou irreversíveis, tais como: dor, infecção, neuropatia e parestesia. 4. Um sucesso de 95% no processo mastoide e 90% na região orbital em tecido ósseo não irradiado, no final de um período de observação de cinco anos, deve ser critério mínimo para o êxito. Na literatura, muitos estudos têm documentado bons resultados de implantes. Em 1992, um estudo18 mostrou sucesso de 95% na região mastoide e 72% na região orbital. Foi observado que fracassos no mastoide ocorreram no prazo de 6 meses de inserção, enquanto que na região orbital tenderam a ocorrer bem mais tarde. Uma avaliação adicional revelou que o sucesso para órbitas não irradiadas, dentro deste grupo era de 92,1%, enquanto que o grupo de irradiadas era de 62,7%. Posteriormente, o trabalho de Granström e outros mostraram que terapia com oxigênio hiperbárico, tanto antes como depois da colocação do implante, melhorou significativamente o desempenho de implantes craniofaciais osseointegrados em osso irradiado. Em 1994, Granström e colegas descobriram que na terapia com oxigênio hiperbárico, não ocorreu perda do implante durante um período de 5 anos de acompanhamento, em 48 implantes colocados na região irradiada: orbital, nasal e temporal.47

Resposta da pele Os problemas mais comuns estão relacionados com a resposta da pele em torno dos pilares percutâneos. Embora, isto não costume ameaçar o sucesso em longo prazo do implante individual, se gasta muito tempo, tanto do médico, quanto do paciente para superar esse problema. Ocasionalmente, uma cirurgia adicional pode ser indicada. Tjellström relatou que 15% de seus pacientes responderam por 70% das reações cutâneas.17 Ele relatou uma pontuação, de não reação cutânea, em aproximadamente 90% de seus pacientes. Um fator contribuinte para a reação cutânea adversa era a adolescência, em consequência de problemas de comportamento e baixa adesão com a higiene local (Fig. 33.17).

FIG. 33.17 Reações cutâneas adversas podem ser, intermitentemente, um problema que requer tratamento. Pilar inferior mostra nenhuma reação do tecido mole, enquanto que o pilar superior mostra alguma hipertrofia tecidual.

Sucesso protético Vários estudos têm sido publicados, documentando sucesso protético de uma perspectiva do paciente.17,59,61,62 Em um estudo de 1990,17 apenas dois de 94 pacientes não utilizaram sua prótese no momento da avaliação. Tolman e Taylor 61 avaliaram pacientes com próteses não retidas por implantes, e apenas 50% deles consideraram sua prótese estável. Depois que estes tiveram a reconstrução protética com implante craniofacial, 93% deles consideraram sua prótese implanto-suportada como estável. De 30 pacientes, 19 utilizavam a prótese mais de 12 horas por dia, três usaram entre 8-12 horas por dia, três entre 4-8 horas e cinco em menos de 4 horas. Vinte e quatros dos 30 pacientes viam a prótese como uma extensão de si, como parte de sua imagem corporal. Westin et al. apontou que 95% de seus pacientes usavam suas próteses todos os dias e, na maioria dos casos, mais de 10 horas por dia.62 Em um estudo recente realizado por Korus et al.63 nos pacientes com prótese osseointegrada de orelha, 90% dos pacientes classificaram sua confiança nas próteses como boa, comparada com 16% sem, e 100% sentiram ela como parte deles. Em relação ao sistema de implante, 55% sentiram que tinham uma reação cutânea; entretanto, 83% não consideraram sua reação como grave. Em última análise, a maioria dos pacientes estava satisfeita (97% satisfeitos e 74% muito satisfeitos). No total, 94% foram novamente submetidos ao mesmo procedimento, e 97% recomendaram a outros pacientes.

Conclusão A osseointegração craniofacial tem um importante papel no tratamento dos maiores defeitos da cabeça e pescoço. Em muitas situações, ela oferece opções de tratamento, que não existiam no passado. A satisfação do paciente é muito alta e, frequentemente, tornam-se defensores dessa modalidade de tratamento. A reconstrução protética craniofacial osseointegrada acrescenta outro andar, onde o elevador da reconstrução pode parar. O futuro da osseointegração craniofacial inclui o desenvolvimento de novos implantes e superfícies deles,

para estimular a formação e remodelação óssea, com intuito de melhorar o sucesso em longo prazo. Os fatores de crescimento, as células-tronco e novas drogas, auxiliarão a melhorar o desempenho em tecidos comprometidos. Desenvolvimentos adicionais utilizando tecnologias digitais avançadas, tais como: prototipagem rápida,64,65 tecnologia de aquisição de imagem,66 sistemas de manipulação de softwaree softwarede correspondência de cores,67 farão a reconstrução protética mais precisa, mais rápida e potencialmente com menor custo. Novos métodos de teste não-invasivo permitirão uma melhor avaliação dos implantes, e melhores estratégias para impedir a perda deles serão concebidas.68 Atualmente, a pele não se liga ao pilar percutâneo, então a conexão é mantida, praticamente, como uma ferida aberta. Melhorar o entendimento desta interface de tecido mole, permitirá melhor utilização em outras partes do corpo.69 A combinação da tecnologia da osseointegração com microeletrônicos poderia produzir próteses móveis ou sensoriais70-73, ou algum tipo de prótese orbital com capacidade de enxergar.74 Grandes implantes de titânio garantirão melhores próteses de extremidade grande.75,76 O futuro é promissor para todo o campo, que começou com a observação ao acaso de P I Brånemark sobre um comportamento anormal de um metal, em estudo do fluxo sanguíneo em coelhos! Imagens extras para este capítulo estão disponíveis em http://www.expertconsult.com Fig. 33.1 Histórico do desenvolvimento da biotecnologia da osseointegração. Através da experiência de Brånemark, implantes osseointegrados têm sido submetidos à avaliação científica por mais de 30 anos. Aplicações craniofaciais foram primeiramente introduzidas em 1977.

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  9. Parel, S. M., Brånemark, P. I., Tjellström, A., et al. Osseointegration in maxillofacial prosthetics. Part II: Extraoral applications J Prosthet Dent. 1986; 55:600–606. O papel da fixação osseointegrada na reconstrução facial é discutido. As vantagens sobre os sistemas adesivos são realçados.

13. Brånemark, P. I., Hansson, B. O., Adell, R., et al. Osseointegrated implants in the treatment of totally edentulous jaws: experience from a 10-year period Scand J. Plast Reconstr Surg Suppl. 1977; 1:16. 16. Albrektsson, T., Brånemark P1, Jacobsson, M. D., et al. Present clinical applications of osseointegrated percutaneous implants. Plast Reconstr Surg. 1987; 79:721–730. Este é o resultado da catalogação de uma grande série de casos em 174 pacientes tratados com implantes percutâneos osseointegrados, para aparelho auditivo externo e epíteses faciais.

17. Tjellström, A. Osseointegrated implants for replacement of absent or defect ears. Clin Plast Surg. 1990; 17:355–366. 20. Wilkes, G. H., Wolfaardt, J. F. Osseointegrated alloplastic versus autogenous ear reconstruction: Criteria for treatment selection. Plast Reconstr Surg. 1994; 93:967–979. Os autores fazem uma revisão de reconstruções auriculares autógenas e protéticas. Os critérios para cada uma das técnicas foram desenvolvidos baseados na experiência dos autores.

26. Brent, B. Technical advances in ear reconstruction with autogenous rib cartilage grafts: personal experience with 1200 cases. Plast Reconstr Surg. 1999; 104:319–334. O autor apresenta sua vasta experiência com a reconstrução auricular à base de cartilagem de costela. Tópicos da técnica poupadora de cartilagem para engenharia do tecido são discutidos.

32. Nagata, S. A new method of total reconstruction of the auricle for microtia. Plast Reconstr Surg. 1993; 92:187–201. O autor apresenta um método em dois estágios para reconstrução total da orelha, dividindo o primeiro procedimento em projeto e colocação da estrutura de cartilagem costal, e o segundo em elevação da construção concluída.

46. Granström, G. Radiotherapy, osseointegration and hyperbaric oxygen therapy. Periodontol. 2000; 33:145– 162. 57. Harris, L., Wilkes, G. H., Wolfaardt, J. F. Autogenous soft tissue procedures and osseointegrated alloplastic reconstruction: their role in the treatment of complex craniofacial defects. Plast Reconstr Surg. 1996; 98:387–392. 62. Westin, T., Tjellstrom, A., Hammerlid, E., et al. Long-term study of quality and safety of osseointegration for the retention of auricular prostheses. Otolayngol Head Neck Surg. 1999; 121:133–143.

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Transplante em cirurgia plástica David W. Mathes, Peter E.M. Butler e P. Andrew Lee

Resumo Os antígenos mais importantes que contribuem para a rejeição de enxertos são os antígenos do complexo principal de histocompatibilidade (MHC). O sistema imunológico tem dois braços principais para mediar tanto a rejeição quanto a tolerância a antígenos estranhos: a resposta humoral (células B e anticorpos) e a resposta mediada por células (células T). Os linfócitos T desempenham papel principal em coordenar a resposta imune, formando o braço mediado por células da reação imunológica. A rejeição aguda ocorre dias ou semanas após o transplante e tem início rápido. Essa reação mediada pela célula T é caracterizada por febre, sensibilidade do enxerto, edema e perda de função. A infiltração intersticial linfocítica é vista no exame microscópico. A rejeição crônica é caracterizada por fibrose e disfunção grave do órgão. O processo geralmente ocorre ao longo dos anos. A medicação imunossupressora deve inibir a capacidade do corpo em rejeitar um órgão transplantado, mas não à custa da rede de defesa contra patógenos. Apesar do uso de medicação imunossupressora poderosa, a maioria dos pacientes transplantados vivencia episódios de rejeição aguda. No transplante de mão, as duas maiores questões são a necessidade de se manter a imunossupressão e a avaliação dos resultados funcionais dos transplantes. Atualmente, o transplante clínico de mão permanece como um procedimento experimental, e os resultados em longo prazo desse procedimento inovador ainda estão para ser definidos.

Os campos de transplantes e cirurgia plástica sempre estiveram intimamente ligados. Na verdade, a era de transplantes de órgãos nos Estados Unidos começou em 1955, quando Joseph E. Murray, cirurgião plástico, transplantou um rim entre irmãos gêmeos.1 Tal “cirurgia reparadora”, usando enxertos de órgãos, foi uma das grandes conquistas da medicina no século XX. Frequentemente, os cirurgiões plásticos reconstroem defeitos de tecidos por meio do transplante de tecido autólogo de outras partes do corpo. Enxertos de pele não vascularizada, de osso e de cartilagem isolados ou combinados com retalhos axiais e ao acaso são procedimentos comuns diários empregados na reconstrução dos defeitos de tecidos. No entanto, todas essas técnicas cirúrgicas apresentam limitações significativas, frequentemente exigindo revisões, e deixam o paciente com uma área doadora. Progressos no desenvolvimento de substitutos da pele (preparados de fontes alogênicas ou xenogênicas) e aplicação de aloenxertos de ossos congelados têm mostrado a possibilidade de reconstrução sem uma área doadora, mas sua aplicação atual é limitada. Apesar dos avanços na cirurgia plástica e reconstrutora, inclusive com o aperfeiçoamento de técnicas microvasculares e o delineamento da anatomia vascular do retalho, lesões muito complexas, principalmente aquelas da face central, ainda estão fora do campo da possibilidade de reconstruir forma e função. A incapacidade de reconstruir tecidos faltantes com precisão ocorre quando o cirurgião precisa desviar-se do princípio de substituir “o igual pelo igual” devido à falta de fontes doadoras autólogas apropriadas. Portanto, a

função de uma extremidade gravemente lesionada não pode ser devidamente reconstruída, a aparência de uma face gravemente desfigurada não pode ser melhorada de forma satisfatória, e tanto a função quanto a aparência de uma extremidade amputada não podem ser reconstruídas. É compreensível que a tendência para o transplante de tecido tenha levado os pesquisadores de cirurgia plástica a buscar fontes não autógenas de materiais de reconstrução.2-4 Contudo, a capacidade de manipular tecidos de fontes celulares únicas ainda tem de dar lugar a uma técnica que proporcione a construção de tecidos complexos necessários. Uma das técnicas com o potencial de proporcionar acesso a construções de tecidos vascularizados complexos sem a necessidade de áreas doadoras é via processo de alotransplantes. A viabilidade clínica de alotransplante de tecido composto (CTA) foi demonstrada com o transplante bemsucedido de mais de 50 mãos e nove faces.5-9 Esse campo emergente de transplante reconstrutivo pode representar uma mudança de paradigma na área da cirurgia reconstrutiva. A aplicação desses transplantes em pacientes com lesões complexas forneceria ao cirurgião reconstrutivo a oportunidade de reconstruir com os exatos tecidos perdidos. Contudo, ao contrário dos transplantes tradicionais de órgãos sólidos (rim, fígado e coração), que consistem de tecido parenquimatoso relativamente homogêneo, o aloenxerto de tecido composto é formado por vários tipos de tecidos heterogêneos (pele, osso e músculo). Cada um desses diferentes tipos de tecidos apresentou diversos graus de antigenicidade, sendo a pele e a mucosa os mais antigênicos.10 Enquanto o transplante de órgãos sólidos é o padrão-ouro para o tratamento de falência terminal do órgão, ainda é necessário haver um verdadeiro consenso sobre o uso e a aplicação de aloenxertos de tecidos compostos.11-12 A sobrevivência dos transplantes de mão e parciais de face depende do uso de imunossupressão crônica, e hoje sua aplicação ainda é limitada a protocolos experimentais institucionalmente aprovados. Para que o campo de transplante reconstrutivo expanda suas indicações além da área experimental, é preciso que se delineiem técnicas que reduzam significativamente ou eliminem a necessidade de imunossupressão crônica. A direção futura desse campo depende, em grande parte, do desenvolvimento de abordagens inovadoras ao uso de agentes imunossupressores e protocolos indutores de tolerância.

Nomenclatura Um enxerto é um tecido não vascularizado (tal como a pele) que é colhido de um leito doador e transferido para um local recipiente. Sua sobrevivência depende do crescimento de novos vasos do leito receptor para restaurar seu suprimento sanguíneo. Em contraste, um retalho envolve a transferência de tecido vascularizado (como, por exemplo, um músculo ou pele) através da preservação de um vaso sanguíneo axial ou de anastomoses microvasculares daquele vaso aos vasos recipientes localizados em área adjacente à lesão. Um autoenxerto é o tecido transplantado de uma área para outra, no mesmo indivíduo. Um isoenxerto é transplantado de um doador genético idêntico ao receptor, como, por exemplo, o transplante entre camundongos singênicos e gêmeos humanos monozigotos. Um aloenxerto ou homoenxerto é o transplante de tecidos entre indivíduos da mesma espécie. Um xenoenxerto é o transplante entre espécies diferentes. Os transplantes também podem ser descritos em função dos locais para os quais o tecido é transplantado. O ortotópico diz respeito ao transplante para uma área anatomicamente similar. O heterotópico, por sua vez, refere-se ao transplante para uma área anatômica diferente da área de origem.

Imunologia dos transplantes Complexo principal de histocompatibilidade Os antígenos mais importantes que contribuem para a rejeição dos aloenxertos são aqueles do complexo principal de histocompatibilidade (MHC). As proteínas MHC estão codificadas no complexo de genes no braço curto do cromossomo 6 e têm nomenclatura diferente entre as espécies: antígenos leucocitários humanos (HLA) nos humanos, antígenos leucocitários suínos (SLA), H-2 nos camundongos e RT1 nos ratos. Os genes MHC são expressos de forma codominante, com um haplótipo ou um conjunto de alelos, herdado de cada um dos pais (pai e mãe). Há duas principais classes de genes MHC. Os genes MHC Classe I codificam um complexo glicoproteico transmembrana com uma cadeia pesada 44-kDa que consiste de três domínios extracelulares (α1, α2 e α3). O domínio α1 é altamente variável e contém locais para ligação a antígeno. A cadeia pesada é estabilizada através de ligação não covalente a uma cadeia mais leve, chamada de β2-microglobulina. Há três locais genéticos

diferentes para os antígenos classe I no homem: HLA-A, HLA-B e HLA-C. Os antígenos classe I são expressos em praticamente todas as células nucleadas e servem como alvo primário para os linfócitos T citotóxicos (CD8 +). Os genes MHC classe 2 codificam duas proteínas transmembranas não covalentes ligadas a cadeia 34-kDa α e uma cadeia 29-kDa β. Há três locais de classe II no humano: HLA-DR, HLA-DP e HLA-DQ.13 Os antígenos classe II são expressos primariamente no endotélio vascular e em células de origem da célula-tronco hematopoética, como, por exemplo, linfócitos e macrófagos. Ambas as moléculas classe I e II têm um local específico no qual antígenos peptídeos estranhos podem ser apresentados depois de terem sido processados pela célula.14-17 A distribuição do tecido não é a mesma em toda as espécies: humanos, cães, porcos e macacos expressam antígenos classe II nas células endoteliais, enquanto os roedores e muitas outras espécies não.18 A combinação de HLA-A, HLA-B e HLA-DR tem sido considerada fator determinante na sobrevivência do aloenxerto renal em longo prazo.19

Outros antígenos de transplante Além dos antígenos MHC, há três outras classes de proteínas de superfície: as do grupo sanguíneo ABO, os antígenos de menor histocompatibilidade e os antígenos específicos de pele. Os antígenos do grupo sanguíneo são importantes no transplante clínico porque são expressos nas células endoteliais vasculares. Pacientes com sangue tipo A ou B desenvolvem anticorpos naturais a outra proteína, enquanto pacientes com o sangue tipo O desenvolvem anticorpos naturais a ambas as proteínas A e B. Embora os antígenos ABO não estimulem a rejeição mediada pela célula, um ataque veloz mediado por anticorpos pode rapidamente levar à falência do enxerto.20 Os antígenos de histocompatibilidade menor são peptídeos de auto-origem que não são apresentados pelos complexos MHC. Ainda assim, irmãos (que não sejam gêmeos idênticos) com um perfil MHC totalmente combinante diferirão com relação a antígenos menores por causa da variação de alelos dos genes que codificam essas proteínas. Embora os antígenos menores estimulem uma reação mediada pela célula, não o farão em um teste primário in vitro. A rejeição de enxerto devido aos antígenos menores sozinhos, portanto, com frequência prossegue em um índice mais lento.21 Antígenos específicos de pele (antígeno Sk) são proteínas específicas de tecido que podem causar a rejeição do enxerto por uma reação mediada pela célula. Em consequência, a pele é um dos tecidos mais difíceis de criação de tolerância ao transplante.22

Sucessão de rejeição imunológica Células de resposta imunológica Um número de células com funções variadas, mas interconectadas, participam do processo de rejeição de enxerto. Elas agem juntas para manter os dois braços principais da reação imune, a resposta humoral (células B e anticorpos) e a resposta mediada pela célula (células T). Macrófagos Os macrófagos realizam a função mais antiga de defesa celular: a fagocitose. Têm origem no mesênquima, considerando-se que surgem na célula-tronco da medula óssea. Eles podem circular livremente através do corpo, migrar através dos gânglios linfáticos ou permanecer estacionários dentro dos tecidos. As células de Kupffer são macrófagos especializados que residem no fígado. A célula de Langerhans é um macrófago específico da pele. O macrófago expressa antígenos classe I em sua superfície celular e, como ocorre com uma célula imune altamente especializada, o macrófago também expressa moléculas MHC classe II. Além da simples destruição das células, a finalidade principal do macrófago é reprocessar os produtos decompostos de células ingeridas. Esses fragmentos de proteína estranha podem, então, ser reunidos em uma nova molécula do antígeno classe II e, durante o processo de aglutinação, fragmentos da proteína estranha vão residir no encaixe de ligação do peptídeo da molécula da classe II. Quando o fragmento é exteriorizado, está de frente, voltado para fora, e é facilmente reconhecido como estranho pelo sistema imunológico. Esse processo é conhecido como apresentação do antígeno. Os macrófagos também secretam citocinas23,24 importantes, tais como a interleucina-1 (IL-1). Esse polipeptídeo pode, de forma hormonal, estimular a função imunológica das células reativas. Essas células são essenciais para a apresentação do antígeno estranho.

Células destruidoras naturais Outra célula primitiva derivada da célula-tronco da medula óssea é o linfócito (não T, não B), chamado de célula assassina natural (NK). As células NK são consideradas ativas na reação antitumoral,25 e são capazes de demonstrar propriedades tumoricidas espontâneas na exposição a células tumorosas. Essa célula não requer o reconhecimento das moléculas MHC ou do antígeno que processa (como as células T e as células B).26 No entanto, o método exato que essa célula adota para reconhecer células estranhas permanece obscuro. Eles também são capazes de destruir células ao incorporarem uma proteína lipofílica na membrana celular alvo, o que leva ao aumento da permeabilidade e da lise celular. As células NK também secretam várias citocinas, inclusive o interferon-γ, interferon-α e o fator de crescimento célula-B. Também servem para eliminar células que falham em expressar as proteínas normais auto-MHC e, através desse processo, ser autorreativas. Finalmente, aparecem servindo como barreira ao enxerto da medula óssea doadora depois do transplante de medula óssea não combinante MHC.27 Granulócito O granulócito desempenha papel importante na homeostase imunológica. Assim denominado por suas propriedades histológicas de coloração, as três principais linhas celulares são as células polimorfonucelares, os eosinófilos e os basófilos. Todas as cadeias celulares derivam do mesmo precursor da medula óssea. Tal como ocorre com as células nucleadas, todas expressam moléculas MHC classe I, mas não expressam antígenos MHC classe II. Além disso, essas células expressam um número de moléculas importantes para sua função (inclusive a adesão à interação com outras células imunológicas) em sua superfície celular. Esses leucócitos levam grânulos de substâncias tóxicas (peroxidases) e substâncias que atraem outros leucócitos e elementos celulares da cascata de coagulação. Quando estimulado, o granulócito secreta outros grânulos, dando início à inflamação local de maneira relativamente indiscriminada. Linfócito B Batizadas por seu local de origem na galinha, a bursa de Fabricius, essas células têm papel central na defesa imunológica. No homem, o equivalente da bursa é considerado como o fígado fetal ou a medula óssea. Uma vez que essas células são produzidas, migram para a linfa e para o baço, e parecem permanecer nesses órgãos. Essas células expressam antígenos MHC classes I e II. Também apresentam uma variedade de marcadores específicos de célula B, conhecidos como B1-B8 (podendo ser identificadas através dessas linhas de células B). Finalmente, mostram imunoglobulina em sua superfície. Quando estimulado, o linfócito B se diferencia em células plasmáticas. Essas células menores servem como fábricas para produzir anticorpos específicos. Tais corpos solúveis apoiam o braço humoral da resposta imunológica. Através de rearranjo de uma região altamente variável durante o desenvolvimento imunológico, são produzidos anticorpos que podem ligar-se a incontáveis milhões de diferentes epitopos. Imunoglobulina Os anticorpos produzidos pelos linfócitos B e células plasmáticas assumem a forma de imunoglobulinas. As imunoglobulinas são proteínas de estrutura única, compostas de cadeias peptídicas leves e pesadas. A “raiz” do complexo da cadeia pesada é chamada de fragmento constante. A parte de uma molécula de imunoglobulina na qual cadeias leves formam complexos com as cadeias pesadas, no local em que o anticorpo se ligará a seu alvo, é designada de fragmento (Fab) de ligação ao anticorpo. Há uma miríade de possibilidades para a criação de um antígeno para um anticorpo especíifico porque o meio Fab é altamente variável em sua estrutura discreta. São mais de 100 códigos genéticos para segmentos específicos das partes variáveis das cadeias pesada e leve, levando a milhões de potenciais especificidades de imunoglobulina. Existem cinco classes gerais de imunoglobulina: IgM, IgG, IgE, IgA e IgD. IgM é o primeiro anticorpo formado depois da exposição a antígenos microbianos comuns, seguido pelo mais durável IgG. A IgE está envolvida na reação de hipersensibilidade, ao se ligar e ativar eosinófilos especializados (mastócitos). IgA é secretada na saliva, nas lágrimas e no leite materno, e por isso aumenta a resistência à infecção nesses fluidos. A IgD é encontrada na superfície dos linfócitos B imaturos; sua função permanece pouco clara. As imunoglobulinas podem ser solúveis ou ligar-se à superfície de uma célula. A principal função das imunoglobulinas é fornecer opsonização e ativação do complemento. A opsonização ocorre quando o fragmento Fab de uma imunoglobulina se liga a seu antígeno associado, como um organismo

invasor. A fagocitose macrofágica e monocítica posterior do micro-organismo coberto pelo anticorpo é, então, marcadamente aumentada. A fixação do complemento ocorre quando o complexo anticorpo-antígeno aciona um efeito cascata de complemento. Complemento Um complexo antígeno-anticorpo pode iniciar o efeito cascata de complemento através de um trajeto clássico. Substâncias como endotoxinas podem, sem imunoglobulinas, dar início à cascata por meio de um trajeto alternativo. Ambos os trajetos convergem com a ativação de C3. A ativação sequencial das proteases que definem a cascata de complemento resulta em um grupamento coeso de proteínas, conhecido como o complexo de ataque da membrana. Esse complexo é capaz de romper as membranas de células estranhas. No hospedeiro normal, essa cascata é verificada pelo inibidor regulador proteico C1. Células dendríticas Essas células derivam dos progenitores da célula-tronco da medula óssea e são altamente especializadas, apresentando antígenos. Parece que têm pouca ou nenhuma função efetora. Residem no espaço intercelular e intersticial, mas, quando ativadas, migram através das linfáticas e para o baço. Ali, apresentam seus antígenos para as áreas ricas em células T. Linfócitos T Os linfócitos T têm papel central na coordenação da reação imune, formando o braço mediado pela célula da reação imunológica. O linfócito T é assim chamado por seu local de origem, o timo, e é um dos elementos centrais do sistema imunológico. As célula T derivam de células-tronco fetais do timo e sofrem um extenso processo de educação e de deleção antes de ser liberadas no corpo. As células T maduras são selecionadas a reconhecer antígenos MHC próprios e se tornam tolerantes a eles. As células que demonstram elevada afinidade ao homogêneo são eliminadas por deleção clonal. Eventual falha nesse processo parece levar à autoimunidade. Essas células expressam antígenos das classes I e II. Além de marcadores de superfície HLA, os linfócitos também possuem marcadores de superfície de célula que servem para distinguir uma subpopulação de outra no mesmo indivíduo. Essas são glicoproteínas, sendo descritas pela nomenclatura determinante comum (CD) (p. ex., CD3). Três amplas classes de células T são as auxiliares (TH), as citotóxicas T e supressoras T. Todas as células T expressam CD3 na superfície celular. As células T citotóxicas (células que causam a morte da célula-alvo) expressam CD8. As células supressoras T que podem abafar e regular para baixo a reação imunológica também expressam CD8.28,29 A célula TH, no entanto, expressa CD4 e serve para ampliar a reação imunológica através de sua interação com outras células e da secreção de citocinas essenciais. Cada célula T expressa um receptor de célula T (TCR) capaz e um antígeno ligador. O TCR é um heterodímero 90-kDa composto de uma cadeia α codificada em um cromossomo 14 e uma cadeia β codificada no cromossomo 7, localizada perto do antígeno CD3 e do antígeno CD28. O TCR é relativamente plano e tem a superfície voltada para fora. Essa “plataforma de reconhecimento de antígeno” é a interface essencial para o peptídeo estranho na ranhura de ligação. Assim como o desenvolvimento da célula B, as células T sofrem um rearranjo na codificação de genes para uma região hipervariável nas proteínas receptoras, o que permite que uma população de células T no corpo reaja a um arranjo quase ilimitado de antígenos estranhos, com cada célula T capaz de se ligar a um antígeno específico. Ligação e ativação da célula T Embora o TCR seja capaz de reconhecer um antígeno de ligação, não reconhece a molécula alvo por si só.30 O TCR pode ligar-se a um antígeno somente se este tiver sido processado e apresentado por uma célula apresentadora de antígeno junto com uma molécula MHC. Assim, reconhece o MHC junto com o antígeno-alvo. Essa limitação de ligação é conhecida como restrição MHC. Células T CD4 (ajudantes) podem ligar-se a um antígeno apresentado com moléculas MHC classe II. As células (citotóxicas) CD8 reconhecem o antígeno junto com as proteínas MHC classe I. A célula TH é a mais essencial para a reação imune porque sua ativação resulta na produção das citocinas necessárias à função de muitas outras células imunológicas. A ligação de uma célula CD4 a uma célula apresentando um antígeno que expresse um antígeno-alvo junto com moléculas MHC classe II dá início a um ciclo previsível de comunicação intercelular. A célula que apresenta o antígeno é estimulada a

produzir citocina IL-1, um poderoso elemento de atração química, além de mediador primário na reação da fase água e potente ativador das células linfoides. A célula T, por sua vez, secreta IL-2, que é um estimulante necessário à diferenciação e à proliferação das células T. O IL-2 produzido pela célula T ligada tem função autócrina ao se ligar a receptores IL-2 homogêneos recentemente expressos. O IL-2 secretado também tem uma função parácrina que afeta as outras células T na região, como, por exemplo, as células CD8, que necessitam de IL-2 para sua ativação, mas não o produzem por si mesmas. Como as células CD-4 são também ativadas, secretam IL-4 e IL-5, que estimulam a maturação e a proliferação dos linfócitos B. Além disso, há evidência de que dois subconjuntos de células CDM, TH1 e TH2, funcionam para aumentar a alorreatividade e estimular a produção de anticorpos pelas células B, respectivamente. Com esse papel central das células CD4 na sinalização celular, é fácil entender a reação imunológica gravemente comprometida da perda da função celular hospedeira CD4 secundária à infecção por HIV.31-34 Reconhecimento de antígeno e rejeição de enxerto No caso de tecido de aloenxerto, antígenos estranhos poderiam ser reconhecidos pelas células T hospedeiras depois de processados por células hospedeiras apresentando antígenos no contexto de MHC homogêneo. Essa é uma apresentação indireta com prazo. Além disso, as células T hospedeiras podem reconhecer diretamente o doador MHC em células antígenas apresentando doador, na apresentação direta com prazo. Esse mecanismo ajuda a explicar a reação mais vigorosa ao tecido de aloenxerto do que a peptídeos estranhos em si.35 Clinicamente, a rejeição do tecido de aloenxerto pode seguir diferentes níveis de intensidade para diferentes tecidos. O componente comum para a rejeição de qualquer enxerto é a inflamação. Isso pode ser manifesto como perda de função de enxerto com sinais locais ou sistêmicos de inflamação. Várias síndromes distintas de rejeição de enxerto com cursos diferentes de tempo foram notadas. Essas síndromes diferem com relação ao processo imunológico primário subjacente. A rejeição hiperaguda ocorre quase imediatamente após a perfusão do aloenxerto com o sangue do hospedeiro, e resulta dos anticorpos pré-formados para o grupo proteico sanguíneo ABO ou moléculas MHC realizando um ataque rápido no tecido doador. Ativação complementar acarreta a destruição de células endoteliais vasculares e induz à rápida trombose de vasos, assim como ao aumento do sinal inflamatório. Uma avaliação padrão antes do transplante deve detectar os anticorpos pré-formados, tornando a rejeição hiperaguda uma entidade clínica rara. Muitos mamíferos possuem anticorpos pré-formados a outras espécies que se interpõem como principal obstáculo ao xenotransplante.36 A rejeição aguda ocorre dias a semanas após o transplante e tem início rápido. Essa reação mediada por células T é caracterizada por febre, sensibilidade do enxerto, edema e perda de função. A infiltração intersticial linfocítica é vista no exame microscópico. Além disso, graves formas de rejeição aguda podem incluir um ataque humoral no enxerto, resultando em vasculite.37 A rejeição crônica é um processo indolente que ocorre meses a anos depois do transplante. Caracteriza-se pela perda progressiva da arquitetura do tecido com fibrose e infiltração celular mononuclear. A etiologia da rejeição crônica não é bem entendida e pode ser multifatorial. O processo pode ser retardado por causa da imunossupressão. Também pode resultar do efeito cumulativo do dano ao enxerto por isquemia durante o transplante, infecção do enxerto ou toxicidade medicamentosa.

Mediadores inflamatórios no transplante Além da interação celular direta observada durante uma resposta imunológica, há vários mediadores inflamatórios envolvidos na ativação e na regulação imunológica, incluindo moléculas de adesão celular (CAM), citocinas e quimiocinas, todas essenciais para um sistema imunológico funcionante. As citocinas são proteínas reguladoras transientes que uma ampla variedade de células pode produzir em resposta à estimulação. Essas proteínas podem agir localmente pela ligação a uma célula da mesma linhagem celular (autócrina) ou à célulaalvo na vizinhança (parácrina).38 As citocinas estão divididas em pró-inflamatórias (IL-1α, IL-1β, IL-6; fatores de necrose tumoral: TNF-α, TNF-β), citocinas envolvidas na diferenciação da célula T (IL-2, IL-4, IL-5, IL-10, IL-12, IL-13, e interferona-γ) e aquelas de função imunorregulatória pertencentes à família do fator de crescimento transformante-β, que, primariamente, promove cicatrização de lesões e fibrose.38 As quimiocinas são um subconjunto de citocinas atualmente definidas como pequenas citocinas quimiotáticas. As quimiocinas, que são expressas de forma constitutiva, estão envolvidas no tráfego homeostático dos linfócitos para os órgãos linfoides e na ligação ao componente celular por um receptor de

quimiocina específico. O papel principal das quimiocinas pró-inflamatórias (proteína macrofágica inflamatória 1α [MIP-1α], MIP-1β, proteína monócita quimiotática 1 [MCP-1] e RANTES) é atrair os neutrófilos para um local inflamatório e incitar os linfócitos T a criar uma reação inflamatória adicional.39 No homem, as células CCR1-positivas estão aumentadas no sangue periférico dos recipientes de aloenxerto renal antes da rejeição aguda.40 Além disso, encontrou-se CCR1 mNRA expresso em células derivadas e biópsias de aloenxertos renais.41 Ruster et al. descreveram um número crescente de células CCR1-positivas em glomérulos durante a rejeição.42 Mayer et al. informaram que a expressão mRNA de CCR1 estava associada à diminuição da função renal em aloenxertos com um episódio de rejeição aguda.43 Assim, fica claro que as quimiocinas desempenham importante papel na rejeição de aloenxertos, e a interrupção dessas interações poderia afetar a sobrevivência do aloenxerto. CAMs têm papel releavante na migração de leucócitos da circulação para os tecidos. Três tipos de CAM estão envolvidos no processo de transmigração: seletinas (L, E e seletinas P), mediando a rolagem de leucócitos ao longo do endotélio vascular, integrinas (molécula de adesão intercelular [ICAM-1], CAM-1 vascular [VCAM-1], molécula adressina de adesão celular de mucosas-1 [MAd-CAM1]), levando à adesão de leucócitos ao endotélio, e, finalmente, a imunoglobulina endotelial superfamília das plaquetas CAM-1 (PECAM-1), responsável pela transmigração dos leucócitos.44 A específica e complexa migração de leucócitos para o tecido-alvo requer um processo coordenado de mediadores pró-inflamatórios. Citocinas pró-inflamatórias, IL-1α e TNF-α, podem levar à expressão de quimiocinas pró-inflamatórias. As quimiocinas têm papel importante na ativação das integrinas necessárias à adesão dos leucócitos rolantes para o endotélio dos vasos, e esse processo leva a transmigração de leucócitos para o tecido circundante, dando início ao processo inflamatório.

Triagem imunológica Há métodos disponíveis para se prever a compatibilidade do tecido doador em um recipiente em especial. O valor maior desses exames clínicos é o de excluir recipientes dos quais se espera uma manifestação de rejeição hiperaguda ao órgão de um doador específico. A tipagem de grupo sanguíneo é o primeiro passo importante ao estabelecimento de compatibilidade de transplante. Uma combinação malsucedida ABO resultará em eventual falha por causa dos anticorpos préformados.45 Embora seja possível transplantar tecido de doador tipo O em um recipiente tipo A ou B, o suprimento limitado de órgãos de doadores nos Estados Unidos torna essa prática incomum. A tipagem HLA é usada para se combinarem órgãos com potenciais receptores. Métodos serológicos são empregados para tipificar HLA-A, HLA-B e HLA-DR. Um indivíduo heterozigoto com uma combinação completa de todos esses locais é considerado uma combinação de seis antígenos. Para aloenxertos renais, a combinação HLA provado afetar a sobrevivência do enxerto. Os rins transplantados de irmãos idênticos HLA têm um índice de êxito de 3 anos que excede 90%, enquanto os enxertos de pai para filhos têm uma sobrevivência de 82%. Enxertos de rins de cadáveres têm um índice de sobrevivência de 70% em 3 anos.46 A combinação MHC classe II foi considerada mais importante do que a combinação classe I para o transplante renal. O contrário parece ser verdadeiro para o transplante de fígado. Isso sugere algumas diferenças nos mecanismos de rejeição de enxertos para diferentes tecidos.47 A tipagem sorológica de tecido apresenta certas limitações. Um antígeno HLA pode ser identificado somente se for pesquisado com um anticorpo específico. Por exemplo, se apenas um único fenótipo HLA-DR for identificado no tecido doador, o indivíduo pode ser homozigoto para aquela alela ou heterozigoto com um antígeno HLA-DR não reconhecido. Esse método de testagem deixa de tipificar os outros antígenos classe II, HLA-DP e HLA-DQ. A combinação cruzada é um teste que detecta a presença de anticorpos pré-formados de doador específicos no soro de um receptor em especial e eepresenta a medida de seleção final definitiva antes do transplante. Nesse ensaio de linfotoxicidade, os linfócitos do doador são incubados com soro e complemento do receptor. Então, a viabilidade celular é avaliada por meio de uma técnica de exclusão por corante. Uma combinação cruzada positiva, indicada por uma lise dos linfócitos do doador, sugere a provável ocorrência de uma reação hiperaguda. Uma armadilha do teste, no entanto, é a possibilidade de anticorpos específicos de órgão não serem detectados nos antígenos que não estejam expressos nos linfócitos em avaliação. A pesquisa de anticorpo é outra modalidade adotada no transplante clínico. O soro dos receptores para o potencial transplante é rotineiramente testado em um ensaio de linfocitotoxicidade em relação a um painel de células de diferentes doadores com antígenos HLA conhecidos. A percentagem das células do painel que sofrem lise reflete o grau de anticorpo painel-reativo (PRA), demonstrando os anticorpos HLA no soro de um

indivíduo. Um PRA elevado sugere que é improvável que o paciente apresente uma combinação cruzada negativa. Essa informação é usada para se determinar a alocação do órgão quando o tecido precisa ser rapidamente transplantado. Os indivíduos têm probabilidade de apresentar um PRA elevado se tiverem sido sensibilizados por um transplante prévio, gravidez ou transfusões de sangue.

Imunossupressão atual Os múltiplos trajetos e mecanismos empregados pelo sistema imunológico para defender o corpo contra os patógenos, tanto extra como intracelulares, apresentaram uma barreira significativa à sobrevivência dos aloenxertos transplantados. Medicações imunossupressoras devem inibir a capacidade do corpo em rejeitar um órgão transplantado, mas não à custa da rede defensiva contra patógenos. O uso de vários agentes imunossupressores permitiu a inibição do sistema imunológico que maximiza a proteção do aloenxerto com o menor custo à capacidade geral do corpo de combater infecção e tumores (Tabela 34.1). Tabela 34.1 Medicações mediadas por anticorpos Agente

Mecanismo

Ação

Efeitos colaterais

Antilinfócito Globulina Anticorpos direcionados contra antígenos em antilinfócito linfócitos

Promove a liberação das células T através da lise mediada por complemento

Trombocitopenia, leucopenia, maior risco de reativação viral, reação do soro

Globulina Anticorpos direcionados contra antígenos em antitimócito antitimócito

Promove a liberação das células T através da lise mediada por complemento

Trombocitopenia, leucopenia, risco maior de reativação viral, reação do soro

Alemtzumab

Anticorpo contra CD-52

Elimina as células T por anticorpos dependentes, citoxicidade celular

Trombocitopenia, leucopenia, maior risco dependente de reativação, reação do soro

OKT3

Anticorpo monoclonal de roedor murino direcionado contra a subunidade CD3 em células T humanas

Elimina as células T pelo sistema reticuloendotelial; bloqueia a atividade citotóxica de células T ativadas

Significativa síndrome citoquina, reativação dos vírus, pós-transplante de doença linfoproliferativa

Bloqueia a ligação a CD25 (cadeia de alta afinidade do receptor IL-2)

Limita a expansão de célula T; age apenas em células ativadas

Nenhuma

Anti-IL-2 Daclizumab, Basiliximab

IL-2, interleucina-2.

Em todos os órgãos transplantados, inclusive nos transplantes de mão e face, é primordial prevenir o reconhecimento do aloenxerto no período peritransplante. Atualmente, faz-se isso através dos chamados protocolos de indução. Hoje, vários agentes estão acostumados a proteger o transplante nesse período de excesso de citocina, observado depois da cirurgia (Tabela 34.2). Depois que os agentes indutores são usados, medicamentos de “manutenção” são empregados para se manter o transplante. Finalmente, quando ocorre rejeição em andamento, frequentemente é necessário usar agentes de “resgate” para impedir a rejeição em andamento e salvar um transplante que, de outra forma, seria perdido.

Tabela 34.2 Medicações imunossupressoras Agente

Mecanismo

Ação

Efeitos colaterais

Inibidores de calcineurina Ciclosporina

Liga-se à ciclofilina, bloqueia o fator de transcrição NF-AT, inibe a produção de IL-2 e promove a produção de TGF-β

Evita a transcrição de citoquina e paralisa a ativação da célula T

Tacrolimus (FK506)

Liga-se à proteína de ligação FK, bloqueia o Evita a transcrição da citoquina e paralisa a ativação de célula T fator de transcrição NF-AT, inibe a produção de IL-2 e promove a produção de TGF-β

Nefrotoxicidade, hipertensão, neurotoxicidade Nefrotoxicidade, neurotoxicidade e diabetogenicidade

Agentes antiproliferativos Azatioprina (Imuran)

Inibe a síntese de DNA, interfere nos mecanismos de reparo do DNA e inibe a conversão de IMP em AMP e GMP

Bloqueia a reação proliferativa (células T e B)

Supressão da medula óssea, hepatoxicidade

Micofenolato mofetil

Inibidor não competitivo e reversível de IMP dehidrogenase; interrompe a produção de GTP e dGTP, evitando um passo crítico na síntese de RNA e DNA

Bloqueia a reação proliferativa (células T e B), inibe a formação de anticorpos e evita a expansão clonal de células T citotóxicas

Toxicidade gastrointestinal, supressão da medula óssea

Bloqueia a produção de IL-1 e TNF-α por células apresentando antígenos, bloqueia a regulação para cima do MHC, inibe a produção de interferona-g pelas células T e enzimas lisossômicas e migração por células polimorfonucleares

Osteonecrose, osteoporose, supressão do crescimento, intolerância à glicose, hipertensão, efeitos no sistema nervoso central

Interrompe a ativação do trajeto da célula T

Hipertrigliceridemia, supressão da medula óssea

Corticosteroides Corticosteroides Liga-se ao receptor intracelular, aumenta a transcrição do gene IkBα e evita a transcrição de NF-kB (ativador essencial de citocinas próinflamatórias) Inibidores de macrolídeos Sirolimus (rampacina)

Liga-se à proteína de ligação FK, impede a transdução do sinal pelo receptor IL-2 e paralisa o ciclo celular dos linfócitos

IL-2, interleucina 2; TGF-β, fator de crescimento transformante-β; IMP, monofosfato de inosina; AMP, monofosfato de adenosina; GMP, monofosfato de guanosina; GPT, trifosfato de guanosina; dGTP, trifosfato de deoxiguanosina; TNF-α, fator de necrose tumoral-α; MHC, complexo principal de histocompatibilidade.

Corticosteroides Esses agentes ainda representam uma ferramenta primordial tanto para a prevenção quanto para o tratamento da rejeição de aloenxerto. Apesar de os corticosteroides não serem eficazes como agentes isolados para evitar a rejeição, comprovadamente melhoram a sobrevivência do enxerto em combinação com outros agentes. Quando usados em alta dosagem, também podem tratar rejeição celular aguda em andamento. Além dessas utilidades, os corticoides também contribuem para a morbidade associada à imunossupressão moderna. Os glicocorticoides se ligam a um receptor intracelular depois de uma absorção não específica no citoplasma. O complexo receptor-ligante entra, então, no núcleo, onde age como uma proteína de ligação DNA, aumentando a transcrição de vários genes.48 O gene mais importante é o IκBα, que se liga e evita a função de NF-κB (uma citocina pró-inflamatória essencial que funciona como um fator de transcrição importante para a ativação da célula T). Os corticosteroides bloqueiam a produção de IL-1 e TNF-α por células que apresentam antígenos. Também bloqueiam a produção de interferona-γ pelas células T e a migração e a liberação de enzima lisossômica pelos neutrófilos. Além disso, os corticoides diminuem a regulação para cima do MHC e, com a diminuição das reações inflamatórias, reduzem o grau de coestimulação no ambiente. Os corticosteroides não afetam a produção do anticorpo.

Agentes antiproliferativos Azatioprina Esse foi o primeiro agente imunossupressor empregado em transplantes e agora funciona, de forma ampla,

como uma medicação histórica de transplantes. A azatioprina sofre conversão no fígado para 6-mercaptopurina e depois para monofosfato 6-tioinosina. Esses derivados inibem a síntese do DNA através da ação de alquilato de precursores do DNA, induzindo quebras de cromossomos através da interferência com os mecanismos de reparo de DNA. Além disso, inibe a conversão de monofosfato de inosina (IMP) em monofosfato de adenosina e monofosfato de guanosina (GMP), que retira adenosina das células. Os efeitos da azatioprina não são específicos, e ela age não apenas na divisão das células T, mas também em todas as divisões celulares rápidas. O efeito tóxico principal é na medula óssea, nas células do fígado e nos intestinos. A azatioprina é ineficaz como agente único e não pode ser usada como agente de resgate. Foi usada para a manutenção quando associada a corticoides e inibidores da calcineurina.

Mofetil micofenolato O mofetil micofenolato (MMF), aprovado para uso depois de transplante de aloenxerto em 1995, age por meio da inibição não competitiva e reversível da desidrogenase IMP.49 Essa alteração melhora a biodisponibilidade do ácido microfenólico. O metabolismo da purina fisiológica requer que o GMP seja sintetizado para a produção posterior do trifosfato de guanosina (GTP) e do trifosfato de deoxiguanosina (dGTP). O GTP é necessário para a síntese do RNA, enquanto o dGTP o é para a síntese do DNA. O GMP é formado por IMP por dehidrogenase de IMP. O MMF evita um passo essencial tanto na síntese do RNA como na do DNA. No entanto, o MMF não afeta o “trajeto de salvamento” para a produção de GMP que estará presente na maioria das células. Esse trajeto não está presente nos linfócitos, e o MMF aproveita essa diferença e poupa a maioria das células do corpo, incluindo os neutrófilos. O MMF bloqueia a reação proliferativa das células T e B, inibindo a formação de anticorpos e evitando a expansão clonal das células T citotóxicas. O MMF reduz o nível de rejeição comprovada por biópsia e a necessidade de agentes antilinfócitos na terapia de resgate em comparação com a a aziotioprina.50-52 O MMF substituiu a aztioprina no transplante clínico. No entanto, o MMF não pode ser usado como agente imunossupressor único e deve ser combinado com outros corticoides ou, mais comumente, com inibidores da calcineurina (tracrolimus e ciclosporina).

Inibidores da calcineurina Ciclosporina A ciclosporina é um endecapeptídeo cíclico que foi isolado do fungo Tolypocladium inflatum gams em 1972.53,54 O medicamento age como imunosupressor específico da célula T, e seu mecanismo de ação é primariamente através de sua capacidade de se ligar à proteína citoplasmática ciclofinina.53 O complexo ciclospoina-ciclofilina estabelece uma ligação de alta afinidade com o complexo calcineurina-almodulina, bloqueando a fosforilação dependente de cálcio e a ativação do NF- AT. A interferência com o NF-AT evita a transcrição subsequente do gene ao codificar IL-2. Esse processo também interrompe outros genes essenciais à ativação da célula T. Além disso, a ciclosporina aumenta a transcrição do fator de crescimento transformante-β (TGF-β), que surge para maior regulação para baixo da ativação da célula T, diminuição do fluxo sanguíneo para a área e ativação de trajetos essenciais à cicatrização de lesões.54,55 O efeito da ciclosporina é reversível porque bloqueia a transdução do sinal TCR, mas não inibe os sinais de coestimulação.56 Se a medicação for retirada, a célula T não fica anérgica, sendo novamente capaz de montar um ataque a seu alvo. Os efeitos da ciclosporina podem ser superados com a administração exógena do IL-2. Isso pode explicar a razão pela qual a ciclosporina não é eficaz quando a rejeição está em curso, só se revelando útil como agente de manutenção, não sendo eficaz como agente de resgate. A ciclosporina também apresenta toxicidade significativa associada à sua administração. Tem efeito vasoconstritor significativo (mediado pela TGF-β) nas arteríolas renais proximais, e isso aumenta o fluxo sanguíneo renal em 30%. Seu efeito nos rins pode promover fibrose e hipercalcemia, interferindo, algumas vezes, na resolução de necrose tubular aguda. A medicação também tem efeitos colaterais neurológicos, como, por exemplo, tremores, parestesias, dor de cabeça, depressão, confusão e convulsões. Também pode causar hipertricose e hiperplasia gengival. O uso da ciclosporina em protocolos de transplante de órgão sólido tem sido amplamente substituído pelo tacrolimus.

Tacrolimus

Tacrolimus (FK506), um macrolídeo produzido pelo Streptomyces tsukubaensis, foi descoberto em 1986. O Tacrolimus, como a ciclosporina, bloqueia os efeitos do NF-AT, evita a transcrição da citocina e paralisa a ativação da célula T. O alvo intracelular é uma proteína imunofilina distinta da ciclofilina, conhecida como proteína de ligação FK.56,57 O efeito é aditivo ao da ciclosporina, e esses medicamentos não podem ser administrados em conjunto, por causa da toxicidade proibitiva. O Tacrolimus também aumenta a transcrição do TGF-β e, portanto, compartilha tanto os efeitos benéficos como os tóxicos vistos na administração da ciclosporina. No entanto, é 100 vezes mais potente em sua inibição da produção de IL-2 e interferona-γ. Os efeitos colaterais renais são similares aos da ciclosporina. Tem efeitos colaterais neurológicos mais acentuados e efeito diabetogênico. Os efeitos colaterais cosméticos são menores do que os da ciclosporina. Esse medicamento mostrou-se eficaz como droga de manutenção tanto para o transplante de fígado quanto de rim. Tem utilização mínima como agente de resgate.58 Recentemente, foi desenvolvida e aprovada uma preparação tópica de tacrolimus para uso em dermatite atópica. Seu mecanismo de ação e rota de administração local fornecem uma alternativa atrativa ao tratamento de várias condições dermatológicas autoimunes, revelando-se de uso potencial em CTA. Também tem sido amplamente usado nos protocolos imunossupressores de transplantes clínicos de mão e de face tanto para manutenção quanto para tratamento de rejeição.5 Também houve evidência de que pode ser usado na doença de enxerto contra o hospedeiro (GvHD).59 O mecanismo através do qual o Tacrolimus tópico pode ser eficaz na GvHD é a supressão da citocina local tal como a IL-2, a interferona gama e a TNF-α na pele.60 Os únicos efeitos colaterais relatados em suas aplicações dermatológicas foram irritação local, prurido, eritema e queimação.61,62 A maior parte desses sintomas é relatada no início do tratamento e não foram observados efeitos sistêmicos.

Rapamicina A Rapamicina é um antibiótico macrolídeo derivado do Streptomyces hygroscopicus, sendo estruturalmente similar ao Tacrolimus.63,64 No entanto, eles se antagonizam em sua atividade biológica. Ambos os medicamentos se associam à mesma proteína de ligação FK, mas a rapamicina não afeta a atividade da calcineurina.65,66 Ao invés disso, a interação da rapacimina com o complexo de proteína de ligação FK impede a transdução do sinal pelo receptor IL-2 através de sua interação com a proteína citoplasmática (RAFT-1). Ao fazer isso, o efeito cascata da quinase p70 S6 é interrompido e as células T são impedidas de entrar na fase S de divisão celular.67 Desse modo, a Rapamicina é capaz de interromper a ativação da célula T e sua proliferação, mesmo na presença de IL-2.68 Outros receptores afetados são o IL-4, o IL-6 e o fator de crescimento derivado de plaquetas. A Rapamicina também demonstrou prolongar a sobrevivência de aloenxerto em vários modelos animais e está sendo usada em vários regimes clínicos de medicamentos.69 Esse medicamento é o mais comumente usado após o período peritransplante para substituir o Tacrolimus.70 Também foi aplicado em pacientes humanos em transplantes de mão que sofreram toxicidade renal secundária ao Tacrolimus.71 Esse medicamento tem pouca ou nenhuma nefrotoxicidade. No entanto, demonstra toxicidade à medula óssea e causador de hipertrigliceridemia. Finalmente, parece interromper o processo de cicatrização das lesões, devendo ser administrado com cautela imediatamente depois da cirurgia.

Preparações antilinfócitas Globulina antilinfócito/antitimócito A globulina antilinfócita (ATG) é produzida pela inoculação de espécies heterogêneas com linfócitos humanos, coleta do plasma e depois purificação da fração IgG. O resultado é uma preparação de anticorpo policlonal que contém anticorpos contra muitos dos antígenos de linfócitos humanos. Quando os timócitos são usados como o inoculador no lugar dos linfócitos, o produto é conhecido como ATG. Os mais comuns empregados em transplantes são feitos no cavalo (ATGAM, Pharmacia & Upjohn, Kalamazoo, MI) e no coelho (ATG (Timoglobulina), SangStat Medical, Fremont, CA). O mecanismo por trás da eficácia desses medicamentos é a cobertura das células T pelos anticorpos.72,73 Essas células T recobertas são então eliminadas pela lise mediada por complemento e pela fagocitose induzida por opsonina. A mera presença de anticorpos na superfície da célula T reduz sua capacidade de expressar um sinal TCR eficaz. Funcionalmente, o impacto geral dos anticorpos é a retirada das células efetoras primárias

necessárias à rejeição aguda depois do transplante. Essas medicações foram usadas como agentes de indução no momento do transplante, a fim de reduzir a possibilidade de reconhecimento de antígeno mediado pela célula T quando o enxerto se apresenta em seu estado mais vulnerável. Esses medicamentos também são usados como agentes de resgate, e sua eficácia se baseia tão somente na capacidade de destruir as células T citotóxicas. A maioria dos efeitos colaterais se deve à origem heteróloga e ao fato de que também pode ligar-se a outras células. Portanto, podemos observar trombocitopenia, anemia e leucopenia. A reação mais comum é uma síndrome de liberação de citocina. Calafrios e febres ocorrem em até 20% dos pacientes. Um rash consistindo de pústulas eritematosas elevadas no tronco e no pescoço é visto em 15% dos pacientes. O uso de medicamentos antilinfócitos foi associado à reativação de doença viral. A extensão da depleção de linfócito periférico no sangue parece ser dependente da dose. Embora esses agentes se liguem, preferencialmente, a células T, também podem ligar-se a células B, células dendríticas e outras linhagens de células não linfoides, principalmente em altas dosagens. De fato, dois estudos-piloto demonstraram que a indução de altas doses de ATG pode facilitar a imunossupressão de manutenção de monoterapia em pacientes selecionados, com enxerto e sobrevivência de pacientes comparáveis aos padrões atuais.74,75 Está comprovado que o tratamento com ATG está associado a alterações em períodos curtos e longos na população de células T, gerando homeostase alterada, caracterizada pela expansão de subconjuntos específicos de células T que demonstraram exigir funções supressoras regulatórias. Comprovadamente, o uso da indução de ATG resulta em menor incidência de rejeição aguda e melhor sobrevivência do enxerto durante o primeiro ano após o transplante. No entanto, como se observou na maioria dos agentes indutores, a sobrevivência do paciente e do enxerto após um acompanhamento de 20 anos não foi afetada.76

OKT3 Esse é o anticorpo monoclonal murino que é direcionado contra a subunidade de transdução de sinal nas células T do homem (CD3). Considera-se que o OKT3 se liga à subunidade CD3 encontrada em todas as células T maduras, resultando na internalização do receptor e, assim, prevenindo o reconhecimento do antígeno e a transdução do sinal TCR.77,78 Além disso, ocorrem a opsonização da célula T e a liberação do sistema reticuloendotelial. Depois da administração de OKT3, há uma rápida diminuição das células CD3+ T circulantes. Há pouco ou nenhum efeito nas células do baço e da linfa ou no timo. Depois de vários dias, há retorno das células T que são CD4+ e CD8 +, mas que também não expressam CD3. Essas células T “cegas” permanecem incapazes de se ligar ao antígeno e de interferir no processo e no reconhecimento do antígeno, bem como na geração de células T citotóxicas. Finalmente, o OKT3 bloqueia a atividade citotóxica das células T já ativadas por uma desgranulação inadequada quando o CD3 é ligado por OKT3. Esse mecanismo é essencial para a eficiência, mas também representa um de seus efeitos colaterais mais significativos. A administração de OKT3 pode levar a uma reação profunda de citocina que, eventualmente, resulta em hipotensão, edema pulmonar e miodepressão cardíaca. Em aproximadamente 2% dos pacientes, essa síndrome é manifestada como uma inflamação asséptica da meninge. A metilprednisolona deve ser administrada antes do emprego de OKT3, a fim de impedir essa reação adversa. Essa síndrome é reduzida com doses posteriores. O OKT3 tem sido usado como agente de resgate para tratar a rejeição aguda de aloenxerto renal. O OKT3 também tem sido empregado como agente indutor. A medicação é superior aos corticoides quando se trata de interromper a evolução da rejeição em andamento. No entanto, também se demonstrou que provoca elevado índice de reativação viral do citomegalovírus, do vírus Epstein-Barr e de outros vírus. Também está associado a elevados índices de doença linfoproliferativa pós-transplante. Devido à sua associação com essas complicações significativas, atualmente seu uso é bem mais limitado. Isso é especialmente verdadeiro depois do lançamento de novos agentes indutores, como, por exemplo, alemtuzumab, e drogas de manutenção como a rapamicina.

Anti-IL-2 Dois anticorpos monoclonais se tornaram disponíveis para uso em transplante renal e também foram empregados em alguns transplantes de mão. Ambos os agentes (daclizumab e basiliximab) são direcionados contra o CD25, a cadeia de alta afinidade do receptor IL-2.79,80 Esses agentes foram projetados para ter as mesmas indicações de tratamento que o ATG e o OKT3, sem os efeitos colaterais significativos desses agentes. A cadeia de alta afinidade no receptor IL-2 é necessária para a expansão e o direcionamento da célula T. Esse

receptor oferece a vantagem de que o receptor CD25 esteja presente somente nessas células T ativas. Em tese, esse agente deveria afetar apenas as células ativadas contra um novo aloenxerto. Esse agente também é útil no sentido de não levar à ativação da célula T e, portanto, a uma potencial liberação de citocina, como visto no OKT3. Esses agentes também tiveram vários pares murinas da molécula substituídos por IgG humano, eliminando, assim, muitas das reações não específicas observadas nos anticorpos heterogêneos. Esses agentes podem ser usados na fase de indução, mas, como o IL-2 é necessário somente para a ativação inicial das células T, não parece ser útil em interromper a rejeição em andamento. Estudos precoces do uso como agentes indutores demonstraram incidência mais baixa de rejeição aguda, mas nenhum resultado em longo prazo em ambos os aloenxertos cardíacos e renais.81 Atualmente, é usado como terapia indutora em duas doses (dia 0 e dia 4), como integrante de regimes duplos ou triplos de imunoterapia em receptores de transplante renal adulto, parecendo reduzir os episódios de rejeição aguda sem aumentar a incidência de rejeição aguda provada por biópsia, como ocorre com a indução com Alemtuzumab. Basiliximab está genericamente associado a um perfil de tolerabilidade similar ao reportado com placebo, e melhor do que o informado com ATG.82 O medicamento parece permitir dosagem reduzida de corticosteroides ou de inibidores de calcineurina, enquanto mantém a imunossupressão adequada, reduzindo, portanto, o potencial de efeitos adversos associados a esses agentes coadministrados. No entanto, seu uso como agente indutor está limitado àqueles pacientes que não toleram Alemtuzumab ou ATG.

Alemtuzumab Alemtuzumab é um anticorpo anti-CD52 que tem sido cada vez mais utilizado em transplantes de órgãos sólidos como agente indutor de linfodepleção. O CD52 está expresso na maioria dos linfócitos T e B, células NK e monócitos. O Alemtuzumab esvazia totalmente as células T do sangue periférico por vários meses, com efeito um tanto reduzido nas células B, células NK e monócitos (em ordem descendente).83-87 Ele tem efeito mínimo nas células tronco hematopoéticas CD34 + . O entusiasmo inicial de sua aplicação em transplantes de órgão sólido foi baseado na pesquisa realizada por Calne et al., em que 33 receptores renais foram tratados com Alemtuzumab em combinação com ciclosporina em baixa dosagem. Esses pacientes foram então comparados com o controle do histórico da unidade do paciente em terapia de padrão triplo.88,89 A sobrevivência de 5 anos desses dois grupos foi similar, e esse achado levou à sugestão inicial de que o uso desse agente poderia levar a uma tolerância “prope” (aceitação de enxerto com imunossupressão reduzida).89 No entanto, tentativas posteriores de uso do medicamento sozinho ou em combinação com deoxispergualina levaram à rejeição aguda de 100% dos casos, demonstrando que o medicamento em si não era tolerável. Isso pode dever-se à falta da expressão CD52 nas células plasmáticas e um efeito reduzido nas células de memória T. Alemtuzumab combinado com um único agente de manutenção (baixa dose de inibidores de calcineurina) demonstrou eficácia e segurança, mas apresenta elevado índice de não tolerabilidade (28%) e de rejeição aguda precoce celular e humoral. Atualmente, a medicação é usada com Tacrolimus e MMF. Vários grupos a usaram como agente indutor de escolha nos transplantes clínicos de mão.

Tolerância imunológica O objetivo final da ciência do transplante é fazer com que órgãos ou tecidos geneticamente muito diferentes sejam aceitos e considerados como próprios. Isso tornaria a imunossupressão crônica obsoleta e permitiria que o receptor mantivesse o sistema imunológico intacto para a proteção contra infecções e neoplasmas malignos. Se a verdadeira tolerância imunológica fosse “funcionalmente completa”, a expectativa de vida do órgão não estaria limitada pela rejeição crônica. Esta seção fornece uma visão geral dos vários mecanismos de tolerância das células T e B e o que é conhecido sobre seu papel nos modelos de tolerância ao transplante. No ambiente de transplante, parece que as reações imunológicas dependentes da célula T são vistas como a causa primária de rejeição do enxerto. Assim, a tolerância da célula T é importante para a geração de tolerância a aloenxertos do órgão. Os mecanismos de tolerância de células T e B podem ser divididos em três amplas categorias: deleção clonal, anergia e supressão. A deleção clonal é o processo no qual as células T com especificidade particular a antígeno são eliminadas do repertório. A anergia é um estado no qual as células T podem reconhecer um antígeno estranho, mas se mostram funcionalmente inativas e não geram reação imunológica. A supressão implica a presença de células capazes de evitar ativamente que outras células T gerem uma reação. O pensamento atual sobre o mecanismo de supressão se baseia, em parte, na ação direta

das células reguladoras T (T regs). Esses mecanismos não são mutuamente exclusivos, e o estabelecimento de tolerância pode depender de mais do que um desses trajetos. A aplicação desses mecanismos na indução da tolerância poderia oferecer ao cirurgião plástico e reconstrutor do futuro o transplante de tecidos estranhos sem a consequência de uma imunossupressão prolongada.

Deleção clonal A deleção clonal é o processo por meio do qual as células T que expressam um TCR específico para determinado antígeno são eliminadas. A deleção dessas células pode ocorrer no timo (deleção central) ou fora do timo nos tecidos periféricos (deleção periférica). O timo é o maior local de geração de T linfócitos imunocompetentes. Os progenitores da célula T migram da medula óssea para o timo, onde seguem um trajeto bem definido de maturação. Uma vez que as células T expressam seus respectivos TCRs, sofrem um processo de seleção. Nesse processo, as células com TCRs de baixa afinidade não são estimuladas a progredir. A isso, chama-se seleção positiva. As células T no timo com alta afinidade por antígenos homogêneos são eliminadas por um processo chamado seleção negativa. Quando esse processo termina, as células T remanescentes deverão ser capazes de reconhecer o homogêneo e criar uma reação apenas quando encontram um antígeno estranho. A deleção clonal fora do timo foi descrita em vários modelos experimentais usando antígenos exógenos,90-92 assim como autoantígenos,93-95 o que demonstra que a eliminação de antígenos autorreagentes pode ocorrer depois da maturação no timo. Esse mecanismo pode assegurar a tolerância de autoantígenos não expressos no timo. Várias estratégias tentam influenciar esse processo. A aceitação ou tolerância dos próprios tecidos se desenvolve inicialmente in utero, junto com a capacidade imunológica de reconhecer um tecido estranho. Esse fenômeno foi explorado com êxito por Medawar95a em seus experimentos originais, nos quais roedores recém-nascidos com cepas específicas foram injetados com células doadoras e prosseguiram para a aceitação de enxertos de pele. A produção do estado de tolerância em um adulto pode ser experimentalmente obtida através de vários métodos. Uma combinação da irradiação de todo o corpo para a remoção de células T maduras do recipiente, seguida pela infusão da medula óssea do doador antes do transplante, induz um estado de quimerismo. (O termo quimera deriva da figura da mitologia grega composta de partes de diferentes animais). Então, o hospedeiro quimérico desenvolve um sistema imunológico tolerante tanto a antígenos do doador quanto aos próprios. Um refino maior é o uso da irradiação linfoide total. As cavidades da medula de ossos longos são protegidas durante a irradiação, produzindo, assim, um estado de quimerismo misto.96 Esses animais prosseguiram aceitando aloenxertos de coração e de rins de doadores. Outro método para se obter tolerância ao transplante envolve a injeção intratímica de células do doador. Essas células sobrevivem ao timo imunologicamente “privilegiado” e levam à produção de células T maduras e tolerantes ao aloantígeno do doador.97,98 Todos esses métodos aproveitam o mecanismo central de indução de tolerância e se apoiam no fenômeno de deleção clonal.

Anergia Para uma célula T se tornar ativada ao estado ótimo, requer um sinal secundário coestimulador independente, além do sinal primário que é gerado através do contato entre TCR e MHC. Quando, na ausência desses sinais, as células T são estimuladas, podem tornar-se funcionalmente não reagentes a uma estimulação repetida ao antígeno e são chamadas anérgicas.99 Duas principais interações coestimuladoras que ocorrem entre uma célula T e a célula apresentando o antígeno envolvem trajetos CD28/B7 e CD40L/CD40.100-101 Recentemente, houve considerável interesse em tentar bloquear esses trajetos. A anergia não é automaticamente mantida quando é induzida, e a presença contínua do antígeno demonstrou-se necessária para manter a tolerância.102,103 A tolerância que depende da anergia pode também ser um estado precário e, eventualmente, é rompida por infecção ou inflamação.104,105 O bloqueio desses segundos sinais usa anticorpos (CD40, CTLA4) a receptores específicos (CD40R, B27) para induzir uma forma periférica de tolerância. O conceito de que, em certas situações, a apresentação de um antígeno poderia regular para baixo o sistema imunológico não é novo. Antes da descoberta desses receptores, os pesquisadores notavam que transfusões de sangue de doadores específicos pareciam aumentar a sobrevivência do enxerto, teoricamente pela apresentação de antígenos MHC de forma limitada, induzindo um estado de anergia da célula T, e não sua ativação.106 A interrupção dos trajetos CD40 e CD28 (bloqueio coestimulador) no momento do transplante foi considerada indutora de um estado de tolerância em vários

modelos de roedores sem quaisquer infecções significativas ou complicações malignas. No entanto, a aplicação ao modelo primata duplicou esses resultados e revelou apenas prolongamento da sobrevivência do enxerto em vez de tolerância. Várias modificações dessa técnica estão sob estudo e podem levar a um estado mais duradouro de anergia doador-específica de célula T. Outros métodos de indução de tolerância periférica incluem a depleção de célula de doador apresentando antígeno ou a alteração e o anticorpo anti-CD4 para o bloqueio da função da célula TH.107 Esses métodos periféricos de indução de tolerância não se revelaram tão eficazes quanto os mecanismos centrais.

Regulação imunológica por células reguladoras Vários estudos apontaram um papel relevante para a supressão ativa na indução e na manutenção da tolerância. No entanto, houve incapacidade de propagar essas células in vitro ou de identificar essas células in vivo, o que dificultou a identificação do mecanismo envolvido. Desse modo, o mecanismo de supressão ainda é controverso, apesar do número de modelos de transplante que proporcionaram evidência funcional para a existência dessas células.108-110 Um progresso significativo foi obtido na caracterização dessas células supressoras/reguladoras com a identificação de uma população de células T que coexpressa antígenos de superfície CD4 e CD25.111 Essas células T CD4+ e CD25+ ocorrem naturalmente no timo e representam uma subpopulação de células T de funcionalidade distinta. Essas células se caracterizaram como uma população de células T supressoras que promovem tolerância a antígenos homogêneos e estranhos.112 Em 2003, três grupos independentes mostraram que a proteína Forkhead box (Foxp3), um fator de transcrição nuclear defectivo na doença autoimune multissistêmica IPEX I (desequilíbrio imunológico, poliendocrinopatia, enteropatia, síndrome X-linked)113 foi expressa em regs CD4 + CD25+ T.17-19 O Foxp3 foi considerado correlacionado com a atividade supressora e parece regular a expressão de várias moléculas de superfície de células previamente usadas para identificar regs T, como, por exemplo, CTLA-4, GITR e CD25.18 Os T regs também podem ser definidos por sua origem e, atualmente, são divididos em dois grupos fisiologicamente distintos. São os chamados T regs (n), que são gerados no interior do timo mediante a apresentação do autoantígeno por células epiteliais tímicas. A outra categoria são os T regs (i) adaptativos ou induzidos, que parecem ser produzidos na periferia, depois de um encontro com os antígenos próprios ou estranhos. Vários grupos confirmaram que as células T humanas e animais podem ser convertidas de CD25– em CD25+ ou Foxp3– em Foxp3+ em diferentes ambientes experimentais.28-32 Embora ambos os tipos de T regs compartilhem similaridades, os nT regs parecem ter uma expressão mais estável de Foxp3.33 Um achado adicional foi o de que populações individuais de T regs podem não apenas ter diferentes origens, como também exibir plasticidade significativa na expressão de seu fenótipo (bem similar a células TH), dependendo do meio de citocina. Dados recentes sobre roedores mostraram que, depois da manipulação ex vivo de T regs CD4+ CD25 +, com citocinas Th1 ou Th2, a função das células pode ser bem diferente.34 Em determinadas circunstâncias, esses T regs (CD25 + Foxp3 +) não apenas podem acionar a expansão das células T produtoras de Th-17, como também diferenciar-se em células in vitro mediante a estimulação por células alogênicas apresentando antígenos.35.36,114 Vários artigos informaram alta proporção de T regs circulantes e intraenxerto em pacientes tolerantes/estáveis de transplantes renais, de fígado e pulmão. Ao contrário, receptores com rejeição crônica apresentaram significativamente menos T regs e níveis menores de transcrição e Foxp3 do que pacientes clinicamente tolerantes e indivíduos saudáveis. Estudos mecânicos realizados em receptores de transplante renal confirmaram que a hiporreatividade do doador foi anulada pela depleção de células T CD4 + CD25+ elevada. Dessa forma, uma técnica adotada para produzir T regs pode aumentar a durabilidade da tolerância e talvez ser empregada em conjunto com outras técnicas de indução de tolerância.

Transplante na cirurgia plástica Pele Autoenxerto de pele Enxertos autólogos de pele podem ter espessura total ou parcial. O enxerto de pele de espessura total oferece excelente resultado cosmético, com contração limitada de enxerto, mas apresenta a desvantagem de um

“aceite” de enxerto não confiável. A quantidade de enxerto de pele de espessura total também está limitada pela disponibilidade do local do doador. Nos casos em que há necessidade de se cobrirem grandes áreas, usa-se o enxerto de pele de espessura parcial, o que representa a prática mais comum de transplante de tecido na cirurgia plástica. Essa opção proporciona áreas amplas disponíveis do doador e melhor aceite do enxerto, mas apresenta a desvantagem de aumentar a contração do enxerto. A expansão do enxerto de pele de espessura parcial através da combinação com expansão em malha na proporção de 1:1,5 a 1,9 é útil e frequentemente essencial em grandes queimados. A coleta de locais de doador para o enxerto de pele de espessura parcial pode ser limitada em pacientes com grandes queimaduras. Essa falta de tecido disponível impulsionou o desenvolvimento de alternativas ao enxerto de pele convencional. Queratinócitos podem ser cultivados em cultura com a capacidade de expandir o tecido em até 10 mil vezes.115 Essa técnica foi aplicada no tratamento de grandes lesões térmicas, assim como em úlceras de perna e outras condições benignas.116 As vantagens relatadas com os queratinócitos de cultura foram sua maior sensibilidade à contaminação bacteriana do que os enxertos de espessura parcial, e a aceitação foi relatada como menor, em comparação com o enxerto em malha.117 Eles também tem bolhas espontâneas e são mais suscetíveis a traumas menores, contraindo mais do que os enxertos de pele de espessura parcial.118 Esses efeitos estão relacionados com uma diferença na junção de derme-epiderme.119 A falta de um componente dérmico nesses enxertos autólogos foi superada pela combinação de queratinócitos autólogos cultivados e derme alogênica.120 A técnica teve relatos favoráveis em grandes queimados, mas o problema de uma derme alogênica permanece. O desenvolvimento de uma pele acelular ou “artificial” (íntegra), composta por elementos dérmicos, colágeno e glicosaminoglican sobrepostos com uma folha de Silastic, ofereceu uma solução a esse problema.121 Uma das desvantagens dessa abordagem é a necessidade de se realizar enxerto de pelo da “derme” depois da retirada do curativo de Silastic. Isso foi substituído pela colocação de queratinócitos no enxerto no início da aplicação.122 Também se descreveu um substituto da pele contendo proteínas estruturais alogênicas ou xenogênicas e substâncias de fundo criadas com células autólogas. Esse substituto é composto de fibroblastos autólogos cultivados populando a derme e queratinócitos autólogos cobrindo a derme.123 Esses curativos de gel de colágeno apresentam a desvantagem da cultura autóloga de células porque as células requerem tempo na cultura para expansão em um número utilizável. Um alógrafo dérmico acelular comercialmente disponível é o AlloDerm® (LifeCell, Branchburg, NJ). Um produto criado com tecido vivo dérmico alogênico, o Dermagraft® (Advanced Tissue Sciences, La Jolla, CA), é composto por fibroblastos dérmicos humanos recém-nascidos espalhados em uma malha sintética.124 Esse produto foi favoravelmente comparado com o alógrafo de pele como uma cobertura temporária para queimaduras graves.125 Outro substituto é o Grafskin® (Organogenesis, Canton, MA), composto de matriz de colágeno bovino tipo I semeado com fibroblastos alogênicos humanos e sobrepostos com queratinócitos alogênicos humanos.126

Aloenxerto de pele Os aloenxertos de pele foram considerados benéficos em grandes queimados quer em combinação com autoenxerto, quer em isolamento.127-131 Técnicas como o uso de enxertos de pele de espessura parcial amplamente entrelaçados com sobreposição de alógrafo demonstraram melhor cicatrização do que a malha autóloga sozinha. A disponibilidade de aloenxertos de pele aumenta com a formação de bancos regionais de tecidos. A pele alogênica pode ser congelada e guardada em bancos, de modo a permitir sua viabilidade por um período prolongado. A preservação com glicerol reduz a antigenicidade aos aloenxertos de pele e prolonga sua sobrevivência.132 Enxertos tratados com glicerol foram usados em centros de queimados como cobertura de lesões por queimadura antes do autoenxerto133 ou como enxertos compostos e sobrepostos em autoenxertos amplamente combinados.129 No entanto, relatou-se que o uso desses enxertos levou à produção de anticorpos que podem inibir a capacidade de futuro CTA. Fatores que limitam o uso generalizado são os serviços de colheita e de armazenamento não disponíveis de forma uniforme, demandando fornecimento a mais, com risco significativo, embora pequeno, de transmissão de doença. Relatou-se infecção por citalomegavírus, hepatite e por vírus da imunodeficiência humana em pacientes queimados nos quais foi usada pele de cadáver.134 Queratinócitos alogênicos cultivados também foram usados como cobertura temporária, sobrevivendo com o uso de drogas imunossupressoras.135 O crescimento em cultura é, preventivamente, possível no tratamento de queimaduras, mas os aloenxertos de pele estão suscetíveis a rejeições, além de problemas associados a autoenxertos cultivados.

Xenoenxerto de pele Xenoenxerto de suínos foi usado como curativo temporário em grandes queimados com a semeadura de enxertos autólogos abaixo dele.136 A aplicação de derme xenogênica também foi considerada valiosa na preparação de uma lesão para enxerto posterior pela estimulação da formação de tecido de granulação. A pele artificial acelular descrita por Bure et al.121 usa uma derme de colágeno bovino, que é repopulado pelos fibroblastos do receptor. O tecido xenogênico tem uso limitado no enxerto de pele porque seus componentes celulares são suscetíveis a uma rejeição precoce.

Osso Autoenxerto ósseo Uma série de eventos histológicos básicos segue o transplante de um enxerto ósseo.137 Após transplantá-lo, o enxerto é cercado por hematoma. O efeito em cascata inflamatória segue, com a infiltração de células inflamatórias seguida pelo crescimento de novos vasos diante da retirada e da substituição de qualquer tecido morto ou necrótico. Enxertos não vascularizados sofrem necrose, a maioria dos osteócitos no enxerto morre e somente os da superfície restabelecem o suprimento sanguíneo e sobrevivem. O restante do enxerto é infiltrado por vasos sanguíneos do sítio receptor e repopulado por células-tronco mesenquimais de osteócitos. O crescimento vascular no osso cortical ocorre através de canais haversianos preexistentes. Há aumento inicial na atividade de reabsorção do osteoclasto, o que acentua a porosidade e reduz a força do enxerto. Enxertos de estrutura porosa são mais rapidamente revascularizados em virtude de sua estrutura aberta dentro de 2-3 dias. Em comparação, a revascularização de enxertos corticais pode levar até 2 meses. O processo por meio do qual o tecido vascular invade o enxerto, trazendo consigo osteoblastos que depositam um novo osso, foi chamado de substituição gradativa. O osso cortical revela absorção incompleta do osso necrótico, e a mescla do enxerto final do osso morto e vivo não se aproxima da potência de um enxerto de osso de estrutura porosa.137 [Enxertos ósseos vascularizados neutralizam a fase de reparação dos enxertos não vascularizados e não demandam um leito bem vascularizado. Biomecanicamente, enxertos ósseos vascularizados são superiores a enxertos não vascularizados.] A reconstrução de defeitos de ossos maiores está limitada pela disponibilidade de sítios autólogos doadores. Uma alternativa experimentalmente investigada é a dos osteócitos autólogos expandidos em cultura e crescidos no receptor em esqueletos de polímero.29,139

Aloenxerto ósseo O advento de bancos de tecidos bem organizados, de métodos aprimorados de esterilização de enxerto ósseo e de preservação permitiu o uso clínico de aloenxertos de grandes ossos.140-143 O uso de aloenxerto de osso congelado se tornou uma prática comum na reconstrução de defeitos em grandes ossos, com um volume anual estimado de mais de 200 mil procedimentos nos Estados Unidos.144 MacKewen tem o crédito para o primeiro uso clínico do aloenxerto ósseo em 1881, seguido por Lexer, Parrish e outros.137,144a,145-147 Poucas ou nenhuma das células doadoras no enxerto ósseo não vascularizado sobrevivem. O osso remanescente age como um esqueleto para o crescimento de células-tronco mesinquemais do receptor (precursores dos osteócitos) que, pela substituição gradativa, preenchem novamente o esqueleto do doador. Os enxertos maiores agem como um espaçador mecânico. Por causa da união lenta, exige-se a fixação em longo prazo e, como resultado, o enxerto fica suscetível à fratura por estresse e à soltura dos dispositivos metálicos de fixação. A substituição de grandes articulações foi realizada na prática clínica com resultados diversos. Em 21 casos, Parrish relatou 50% de falhas com o uso de terminais ósseos completos congelados.146 Foram relatados resultados diversos com o uso de enxertos de esqueleto maiores ou menores para recapeamento de articulações ou substituição após excisão cirúrgica.148-150 Em cirurgia craniofacial, foram usados aloenxertos de osso congelado seco em avanços do terço médio da face.151 O índice de infecção foi elevado, de 22%, mas as osteotomias cicatrizaram em todos os pacientes. Relatou-se enxerto ósseo com lascas autógenas de osso na reconstrução mandibular.152,153 Na cirurgia de mão, foi usado enxerto ósseo para reconstruir defeitos depois da retirada de tumores benignos e por defeitos traumáticos ou congênitos.154,155 Não foi relatada nenhuma complicação maior, como infecções, fraturas ou falta de união. O osso alogênico vascularizado está suscetível a uma rejeição imunológica.156-159 A reação humoral e celular é gerada por uma sequência de tempo similar àquela gerada por outro tecido alogênico.10 Embora células ósseas

individuais expressem antígenos, considera-se que a célula imunogênica predominante num aloenxerto ósseo deriva da medula óssea.145 A retirada da medula como na irradiação ou substituição pela medula do receptor foi experimentalmente demonstrada como fator de prolongamento da sobrevivência do aloenxerto.160,161 Houve uma série limitada de transplantes ósseos clínicos alogênicos vascularizados (transplantes de joelho) realizados primeiro sob imunossupressão por agente único (ciclosporina) e depois empregando imunossupressão com três agentes.162,163 Todos esses enxertos foram perdidos nos primeiros 56 meses, independentemente da imunossupressão escolhida. Um fator de confusão pode ser a adição de uma pele vascularizada para monitoramento imunológico, que, na verdade, tem o potencial de aumentar a imunogenicidade do transplante.

Cartilagem Cartilagem autóloga A cartilagem é composta de condrócitos com lacunas dispersas através da matriz imersa na água. Há três tipos histológicos: cartilagem hialina, cartilagem elástica e fibrocartilagem. A matriz é composta predominantemente por proteoglicanos e colágeno tipo II. A cartilagem não tem suprimento sanguíneo e depende da difusão de nutrientes e oxigênio através da matriz. Os condrócitos, em contraste com os osteócitos, têm pouca capacidade reparadora e cicatrizam formando um tecido fibroso.164 As propriedades viscoelásticas da matriz fornecem uma “memória” à cartilagem, no sentido de que ela volta a seu formato original depois da deformação. O conteúdo variável de água na matriz causa tensão equilibrada dentro dela e, dessa forma, mantém sua forma tridimensional. O autoenxerto de cartilagem é regularmente usado em reconstrução nasal, auricular, craniofacial e das articulações.165-167 As áreas doadoras são limitadas. O desenvolvimento de técnicas experimentais e produção de tecido permitiu a expansão dos condrócitos em cultura para aumentar seu número. Essas células são semeadas em polímeros biodegradáveis para formar uma nova cartilagem autóloga.29,139,168,169 Sistemas de polímeros injetáveis permitem o aporte de cartilagem autóloga via agulha, de forma transcutânea, ou por artroscopia.170-172

Aloenxerto de cartilagem Os condrócitos expressam antígenos HLA em sua superfície e são imunogênicos.148 A matriz é apenas levemente antigênica.173 Comprovou-se que cirurgia ou corte com exposição resultante e de células alogênicas apressam a reabsorção de cartilagem alogênica.174 Aloenxertos de cartilagem foram usados em aplicações similares às da cartilagem autóloga. 175 A cartilagem alogênica utilizada pode ser preservada ou recém-obtida. A cartilagem preservada apresenta a vantagem de um fornecimento mais abundante, sem o risco de infecção associada ao uso da cartilagem recém-obtida.176-178 O alotransplante de cartilagem, geralmente com prétratamento por irradiação, tem sido usado para aumentar volume no esqueleto da face. Apesar dos bons resultados iniciais em um grande número de pacientes,178 dados em longo prazo sugerem alto nível de reabsorção.179 A questão é se isso se deve à base imunológica ou ao fato de enxertos preservados tenderem a não conter células viáveis.180 Também se observou que enxertos menores são menos suscetíveis a uma grande perda de volume do que os maiores.

Xenoenxerto de cartilagem Xenoenxertos de cartilagem derivada de bovinos são suscetíveis a mecanismos xenogênicos de rejeição, o que gera resultados piores em comparação com enxertos de cartilagem alogênicos ou autógenos. Tentativas de modificar essas reações xenogênicas por meio da alteração da estrutura imunológica estereostática do enxerto foram relatadas como benéficas.181

Nervo Autoenxerto de nervo O melhor resultado clínico depois da transecção é obtido com reparo primário. Lesões extensas com um vão de nervo requerem um enxerto de nervo para fazer o reparo do nervo sem tensão. O enxerto de nervo sofre o mesmo processo degenerativo que ocorre no nervo distal recipiente depois da divisão.182 O que permanece do enxerto de nervo é uma capa de mielina com células Schwann que agem como um condutor biológico para os axônios em regeneração. O tipo mais comum de enxerto de nervo é o do nervo interfascicular, que une grupos

fasciculares para seus grupos combinantes distais em um enxerto de nervo interposicional.183 Na prática moderna, outros tipos são os enxertos fasciculares de nervos (limitados a um fascículo combinante proximal a distal) e enxertos de nervo vascularizados, que, em tese, foram considerados vantajosos, embora não se tenham provado clinicamente benéficos.184 Outros “condutores” foram usados como enxertos nervosos,185 como tubos de silicones semeados com células Schwann, veia autóloga, músculo autólogo fraturado congelado e tubos de pH.186 Condutores artificiais demonstraram um resultado melhor quando foram semeados com células Schwann autólogas. Até agora, nenhum dos condutores foi considerado superior ao autoenxerto nervoso.

Aloenxerto de nervo O autoenxerto de nervo conta com um número limitado de sítios doadores. Em grandes defeitos de nervos, o aloenxerto tem sido experimentado em um número pequeno de pacientes. A rejeição imunológica do aloenxerto de nervo pode ser experimentalmente evitada com drogas imunossupressoras,187,188 e axônios imunossuprimidos atravessam o enxerto alogênico em roedores189,190 e primatas não humanos.191 A imunossupressão precisa ser administrada somente enquanto os axônios receptores atravessam o aloenxerto e podem ser finalizados.192-194 Mackinnon et al. relataram uma série de sete pacientes que receberam aloenxerto de nervo nas extremidades superiores e inferiores.185,195 A imunossupressão foi concluída 6 meses após a regeneração do nervo através dos aloenxertos. Todos, menos um paciente, tiveram o retorno de suas funções motoras e sensoriais.

Membro e tecidos compostos A transferência de tecido autógeno microvascular é uma modalidade reconstrutiva bem estabelecida. A disponibilidade de sítios doadores limita os transplantes autólogos de tecidos. Além disso, esses sítios doadores podem estar associados a um nível significativo de morbidade. A capacidade de usar um membro alogênico ou tecidos compostos como pele, tecidos subcutâneos, músculo, osso, vasos sanguíneos e nervos ampliou, de forma relevante, o campo da cirurgia reconstrutiva. Defeitos esqueléticos e de tecidos moles ou mesmo membros inteiros poderiam ser então substituídos. No entanto, o tecido não autógeno fica suscetível a uma rejeição imunologicamente mediada com perda subsequente do enxerto, e a imunossupressão é a única forma, na atualidade, de se alcançar sobrevivência de aloenxerto no longo prazo. Para tornar o transplante de tecido composto clinicamente possível, deve-se levar em consideração seus aspectos técnicos, funcionais e imunológicos.

Considerações técnicas O transplante de membro vascularizado ou de tecidos compostos foi possibilitado pelas técnicas microcirúrgicas inicialmente desenvolvidas por Carrel e Guthrie em 1906.196,197 As anastomoses microvasculares e a revascularização se tornaram prática rotineira nos grandes centros, com índices de êxito indo além de 90%.198,199 Em oposição a casos traumáticos agudos, como reimplante, o transplante alogênico foi realizado em ambientes eletivos depois de uma adequada preparação, como, por exemplo, a angiografia pré-operatória e a seleção do doador. As técnicas operatórias se baseiam nos avanços atuais em reparo de ossos, tendões e nervos.

Considerações funcionais A cicatrização normal de lesões e o crescimento ósseo ocorrem em aloenxertos transplantados de tecidos compostos depois do transplante experimental em vários modelos animais.24,200 Observou-se retorno da função neuromuscular em aloenxertos de animais tratados com imunossupressão,201,202 inclusive em primatas,203–205 nos transplantes de mãos, tanto com a recuperação motora quanto com a sensorial relatadas.5,206,207 Assim, a recuperação funcional depois de um transplante alogênico parece seguir os mesmos princípios de situações de não transplante e é influenciada pela idade do receptor, por fatores sistêmicos e lesões locais associadas.

Considerações imunológicas Aloenxerto composto de membro consiste de múltiplos componentes de tecidos, como pele, músculo e osso, e cada um desses tecidos mostrou-se fortemente antigênico.102 Tanto dados animais quanto a experiência clínica humana confirmaram a necessidade de imunossupressão significativa do hospedeiro para evitar rejeição do aloenxerto. Os potenciais efeitos adversos da imunossupressão indefinida dos múltiplos agentes, dificultam a

justificativa de opiniões quanto ao procedimento cirúrgico objetivando a melhora a qualidade de vida.12,208 Esse debate relativo ao equilíbrio do risco-benefício não cessou desde o primeiro transplante de mão humana realizado com êxito. No entanto, ambos, proponentes e críticos dos transplantes atuais, concordam que a redução significativa da imunossupressão do hospedeiro e, especialmente, a indução de tolerância aos aloenxertos ajudariam a obter uma aplicação clínica mais ampla dos aloenxertos de tecidos compostos.

Transplante experimental de membro O transplante de aloenxerto de membro é possível com regimes imunossupresores diferentes (Tabela 34.3).200202,204,209-217 Técnicas de imunomodulação que diminuem a antigenicida e de componentes específicos de um aloenxerto de membro foram demonstradas como propiciadores do aumento da sobrevivência.161 Embora acidentes esporádicos de tolerância tenham sido relatados, depois da cessação dos imunossupressores,211,218 a imunossupressão em longo prazo foi, de modo geral, necessária para evitar a rejeição do aloenxerto. A terapia combinada de ciclosporina e MMF revelou-se mais eficaz do que a monoterapia.219 Embora os modelos de camundongos forneçam informações importantes sobre o transplante de aloenxerto de membro, o sistema imunológico dos roedores é fundamentalmente diferente do sistema do homem. Um modelo animal grande como, por exemplo, um canino, um suíno ou um primata oferece uma analogia bem mais próxima do sistema imunológico humano. Tabela 34.3 Transplante experimental de enxerto de membro Agente imunossupressor 6-Mercaptopurina, azathioprina

Modelo animal Sobrevivência (dias) Autor Cão

Azatioprina, hidrocortisona, globulina antilinfócita Cão 6-Mercaptopurina, azatioprina, prednisolona Ciclosporina (25 mg/kg/dia) Ciclosporina (8 mg/kg/dia) Ciclosporina (15 mg/kg/dia) 15-Deoxyspirgualin FK506 FK506 Ciclosporina (10 mg/kg/dia) Ciclosporina (5-10 mg/kg/dia)

Camundongo Camundongo Camundongo Coelho Camundongo Camundongo Camundongo Camundongo Camundongo

18 112 – 100 > 400 90 18 50 102 14 365

Ano

Goldwyn 214

1966

216

Lance Doi

1971

212

1979

211

Black

Hewitt Siliski

1985

272

1985

273

1984

Walter

274

1989

Kuroki

275

1989

Arai

210

1989

10

Lee

1991

2

Lee

1995 3

FK506 or ciclosporina

Camundongo

300

Buttemeyer

Ciclosporina, MMF

Camundongo

231-257

Benhaim 219

1996

Ciclosporina, MMF, corticoide

Suíno

90

Ustuner 218

1998

FK506, MMF, corticoide

Suíno

90

Jones 220

1999

Ciclosporina + combinação MHC

Suíno

175 – 329

Lee221

2001

Ciclosporina, corticoide

Primata

304

Daniel204

1986

Ciclosporina (20 mg/kg/dia)

Primata

296

Stark87

1987

Ciclosporina (25 mg/kg/dia) FK-506 (0,5-1,0 mg/kg IV)

Primata Primata

179 177

Hovius Barth

205

224

1996

1992 2009

MMF, mofetil micofenolato; MHC, complexo principal de histocompatibilidade; IV, intravenoso.

Ustuner et al. relataram o transplante de um retalho de membro dianteiro radial osteomiocutâneo entre porcos e raças diferentes e tamanhos iguais com o uso diário de um regime oral e ciclosporina, MMF e prednisona oral.218 Dos oito suínos, dois apresentaram grave rejeição, três demonstraram rejeição leve a moderada e três ficaram livres da rejeição no término do experimento, aos 90 dias. Não ficou evidente toxicidade medicamentosa no soro hematológico e nos parâmetros químicos dos animais imunossuprimidos. O grupo Louisville também examinou o uso de FK506, MMF e prednisona no mesmo modelo suíno.220 Cinco dos nove animais que sobreviveram ao estudo no final de 90 dias revelaram-se livres de rejeição. No entanto, essa

combinação de imunossupressores resultou em significativa mortalidade e morbidade, inclusive abcessos, diarreia, perda de peso e pneumonia. Lee et al. acharam que haviam descoberto a tolerância a aloenxertos musculoesqueléticos através da combinação de antígenos MHC entre o doador e hospedeiro e suíno hospedeiro em apenas um tratamento de 12 dias de ciclosporina.221 Aloenxertos de doadores não combinantes MHC tratados com ciclosporina e aloenxertos e doadores combinantes MHC (sem combinação e antígeno sem significância) não tratados com ciclosporina foram rejeitados. No entanto, aloenxertos de MHC combinantes tratados com 12 dias de ciclosporina não apresentaram evidência de rejeição até o sacrifício, no prazo de até 47 semanas do transplante. Assim, a combinação genética pode aliviar a necessidade de imunossupressão após o transplante de membro. A combinação MHC pode ser estendida para além dos membros familiares, por exemplo, mediante o registro nacional de medula óssea para combinar MHC de indivíduos não aparentados. Mais recentemente, Kuo et al. demonstraram que o uso de células-tronco mesenquimais combinadas com transplante de medula óssea, irradiação e terapia imunossupressora pode prolongar a sobrevivência CTA (>200 dias) em um modelo de membro traseiro suíno.222 Os autores sugeriram que a atividade reguladora das célulastronco mesenquimais pode contribuir para o prolongamento observado nesse modelo. O modelo primata oferece a imitação mais próxima ao transplante de membro humano em anatomia e sistema imunológico. Em 1980, quatro estudos do transplante aloenxerto primata foram realizados em primatas não humanos.204,205,217,223 Todos envolveram o transplante de uma mão ou de parte neurovascularizada de uma mão com uso de alta dosagem de ciclosporina e corticoides. Muitos dos animais sofreram complicações infecciosas, com alguns sucumbindo a neoplasmas malignos fatais resultantes de altos níveis de imunossupressão. Não obstante, poucos primatas tiveram sobrevivência prolongada de seus aloenxertos. Esses estudos confirmaram os dados existentes sobre caninos e roedores, no sentido de que a monoterapia com ciclosporina é ineficaz na prevenção de rejeição do aloenxerto, mesmo em doses tóxicas. Poucos aloenxertos sobreviveram o suficiente para a recuperação funcional ser avaliada. Mais recentemente, Barth et al. realizaram transplantes heterotópicos de subunidades faciais compostas de pele, músculo e osso em macacos Cynomolgus não combinantes.224 Tentou-se empregar alta dosagem de monoterapia com Tacrolimus através de infusão endovenosa por 28 dias, o que, em seguida, foi trocado por doses intramusculares diárias. Inicialmente, esperava-se que esse tratamento limitado de alta dosagem de tacrolimus levasse à tolerância, conforme observado no modelo de rim suíno. Embora esse protocolo de monoterapia de Tacrolimus tenha proporcionado sobrevivência prolongada sem rejeição dos aloenxertos, isso foi associado ao desenvolvimento de alta frequência de distúrbios linfoproliferativo de tumores pós-transplante derivados do doador. Nenhum estudo foi realizado em primatas em combinação com a terapia imunossupressora. A aplicação desse regime pode proporcionar conhecimento da regeneração nervosa, da cicatrização óssea e da função de recuperação.

Transplante de mão Atualmente, o transplante clínico de mão ainda é um procedimento experimental, e os resultados no longo prazo desse procedimento inovador ainda estão sendo avaliados. Na era atual de imunossupressão, 70 transplantes de mão foram realizados em 45 pacientes.5,206,207,225-229 Até agora, os resultados revelaram que o transplante de mão é tecnicamente possível e que os resultados são promissores, com os pacientes relatando vários graus de retorno da função. O suporte para a aplicação do transplante de mão pelos cirurgiões de mão foi mais forte para aqueles pacientes que perderam ambas as mãos.12 Enquanto a maior parte dos programas continue a realizar transplantes sob as normas das juntas de revisão locais, vários programas propuseram transplante bilateral de mãos como o padrão para o cuidado de amputação bilateral. O suporte para transplante unilateral foi bem mais baixo na comunidade cirúrgica. No entanto, os pacientes que sofreram transplantes unilaterais de mão informaram recuperação da função. Assim, enquanto a função representa um resultado essencial para a medida do êxito, a recuperação do bem- estar do paciente também é considerada na avaliação do transplante de mão. As maiores questões quanto ao transplante de mão são a necessidade de manutenção de imunossupressão e a avaliação dos resultados funcionais dos transplantes.230,231 Há riscos bem conhecidos para o receptor de transplantes relativos ao uso de imunossupressão crônica. Esses riscos incluem complicações como maior suscetibilidade a infecções oportunistas, disfunção renal relacionada ao uso de medicações inibidoras baseadas em calcineurina (tacrolimus e ciclosporina) e incidência aumentada de malignidades. Além disso, apesar do uso de regimes modernos de imunossupressão, a maioria dos episódios de experiência de transplantes com

rejeição aguda possivelmente enfrentará rejeição crônica. Os resultados funcionais foram, em sua maioria, favoráveis, mas o desafio atual permanece no sentido de melhorar a recuperação dos nervos e a função dos músculos intrínsecos da mão.

Imunossupressão e sobrevivência do transplante A emergência dos transplantes de mão e de todo o campo de transplante reconstrutor não correspondeu a qualquer descoberta recente na imunologia dos transplantes. Examinando-se os dados de sobrevivência de 1 ano desses transplantes altamente antigênicos como os de pulmões e intestinos, fica claro que as potentes drogas imunossupressoras atuais podem evitar a rejeição fulminante e até mesmo tecidos altamente antigênicos, desde que doses suficientemente elevadas de diferentes agentes sejam usadas.232,233 Isso foi repetido na literatura de transplante de mão, na medida em que houve excelente sobrevivência de 1 ano dos transplantes.5 Assim, a questão essencial continua a ser quanto de imunossupressão e de morbidade para toda a vida pode ser justificada em um procedimento que não seja o de salvar a vida. O pequeno número de transplantes de mãos atuais e a variabilidade nas medicações empregadas tornam difícil concluir a superioridade de um regime imunossupressor sobre outro. Esse tipo de evidência conclusiva só poderá ser extraído de ensaios clínicos randomizados e prováveis. Dessa forma, à medida que essa técnica for se expandindo, será importante organizar ensaios multicêntricos para estabelecer a melhor prática no uso de imunossupressão depois do transplante de mão. Atualmente, a maioria dos programas de transplantes empregou o uso do agente indutor como um bloqueador de receptor IL-2 (basiliximab), ATG ou o anticorpo monoclonal anti-CD52 (alemtuzumab). Parece haver uma tendência recente no sentido de se utilizarem mais anticorpos monoclonais anti-CD52 em pacientes de transplante de mão.234 Inicialmente, o grupo Louisville usou o bloqueador de receptor IL-2 (basiliximab) em seus dois primeiros pacientes como o único agente indutor, mas modificou para Alemtuzumab em todos os pacientes que vieram depois,206 enquanto o grupo Lyons usou apenas ATG em todos os seus pacientes.207 Mais recentemente, grupos da Universidade John Hopkins e da Universidade de Pittsburgh implantaram um programa para seguir além do regime atual de três medicamentos. Foi empregada a terapêutica de indução como parte integrante de seu “protocolo de Pittsburgh”, que usa a infusão de medula óssea do doador em combinação com a monoterapia de Tacrolimus, em uma tentativa de reduzir a quantidade de imunossupressão crônica necessária e, portanto, de melhorar o equilíbrio do risco-benefício. O regime imunossupressor de manutenção mais usado no transplante de mão foi a administração contínua de baixa dose de corticoide com tacrolimus e MMF. No entanto, com o tempo, várias equipes alteraram o tratamento de Tacrolimus para Sirolimus, a fim de evitar efeitos colaterais como hiperglicemia ou insuficiência renal.5 Em alguns casos, as equipes tentaram diminuir as medicações imunossupressoras e fazer o desmame ou a eliminação dos regimes. No entanto, enquanto essas estratégias tiveram êxito na literatura de transplantes, observou-se, nesses transplantes de mão, evidência de hiperplasia miointimal. Além disso, um dos transplantes de mão em Louisville foi perdido devido ao que pareceu rejeição crônica depois de ter sido mantido em um protocolo de imunossupressão reduzida.225,235 Assim, talvez não seja possível simplesmente transferir protocolos que demonstraram resultados em transplante renal diretamente para o transplante de mão.

Avaliação de resultados no transplante de mão A avaliação precisa do resultado funcional do paciente com transplante de mão é essencial para se estabelecer o valor do transplante que não seja para salvar a vida. Atualmente, há uma variação nas ferramentas que são empregadas para quantificar a função do transplante de mão. Enquanto o grupo Louisville relatou muitos dos resultados funcionais em publicações baseadas no teste de Carroll (um teste validado que avalia a capacidade de o paciente realizar atividades da vida diária que envolvam o membro superior),236 o Registro Internacional sobre Transplante de Mão e Tecido Composto baseia seus resultados funcionais no próprio Sistema de Pontuação de Transplante de Mão (HTSS).5,206 Esse sistema avalia seis aspectos do transplante de mão: (1) aparência (15 pontos); (2) sensibilidade (20 pontos); (3) motilidade (20 pontos); (4) aceitação psicológica e social (15 pontos); (5) atividades diárias e condição de trabalho (15 pontos); e (6) satisfação do paciente (15 pontos). Um resultado total de 81-100 pontos é graduado como um resultado excelente, 61-80 como bom, 31-60 como razoável e 0-30 como ruim. A Universidade de Pittsburgh baseia sua avaliação de pacientes na medição de

alcance ativo de movimento, de alcance passivo de movimento, força de pegada, força de pinçamento e discriminação de dois pontos. Usa também a avaliação de Semmes-Weinstein para documentar o retorno sensorial dos transplantes. Resultados precoces desse grupo revelam que todos os pacientes demonstram melhora mantida nas funções motora e sensorial de forma correlata ao tempo pós-transplante e nível de amputação. Todos os programas de transplante de mão usaram a pontuação do teste de Deficiências do Braço, Ombro e Mão (DASH) para avaliar os pacientes pós-transplante.237 A Medida de Resultado DASH é um questionário de autorrelato de 30 itens feito para medir a função física e os sintomas em pessoas com quaisquer disfunções musculoesqueléticas do membro superior. A ferramenta é um instrumento único confiável que pode ser usado para avaliar quaisquer das articulações da extremidade superior. O mais longo acompanhamento disponível é de um segundo transplante de mão realizado pelo grupo em Louisville. Agora, o paciente está com mais de 11 anos de pós-operatório com uma mão funcionante. Em artigo recente, o grupo de Louisville relatou resultados detalhados dos dois primeiros receptores de transplantes nos Estados Unidos, com 8 e 6 anos de pós-transplante.206,225 Ambos os pacientes têm uma sobrevivência do aloenxerto, com melhora na atividade muscular intrínseca, total movimento ativo e retorno da pegada funcional e sensibilidade. As últimas pontuações do teste Carroll, que afere a capacidade dos pacientes na realização de tarefas que requeiram a combinação de mobilidade, função motora e sensibilidade, são aceitáveis para o paciente 1 (72/99) e o paciente 2 (55/99). Esse resultado de pontuação do teste Carroll excede aqueles esperados de 20-30 em 99, que seriam conseguidos com uma prótese de mão. O teste de sensação de monofilamento do primeiro paciente Semmes-Weinstein está na faixa normal para todas as pontas dos dedos, e o paciente demonstrou melhora em ambos os pontos de testes anteriores. Localização de toque, estereognose, temperatura e sensação de vibração também retornaram. O segundo paciente não demonstrou retorno similar de sensibilidade durante o 6o ano, mas, em 2008, sua sensação de proteção foi notada como tendo retornado. Em uma atualização mais recente, foram informados resultados de seu terceiro paciente, com a pontuação no teste de Carroll de 57 em um exame anual. O alcance de movimento com movimento digital ativo foi de aproximadamente 45% do normal. A avaliação sensorial mostrou melhora do sinal de Tinel nas pontas dos dedos, com a função protetora diminuída e a localização de toque leve apenas no indicador, no anular e no dedo mínimo. O Registro Internacional informou que, com base na escala HTSS, a maioria dos pacientes obteve bons resultados no procedimento de transplante de mão.5 Notou-se que, do ponto de vista funcional, houve boa recuperação na maioria das mãos transplantadas. No entanto, a recuperação da função motora ficou limitada a grupos de músculos mais longos, mas, com frequência permitiu que os pacientes realizassem a maior parte das atividades diárias. O nível de satisfação foi ligeiramente mais elevado nos pacientes com transplante bilateral em comparação com pacientes unilaterais. Todos os pacientes desenvolveram a sensação de proteção (31 pacientes analisados com um mínimo de acompanhamento de 1 ano) e 90% recuperaram a sensibilidade tátil. O tempo e o desenvolvimento da recuperação distal sensorial e motora foram correlacionados ao nível de amputação. Observou-se que, quanto mais distal era o nível da amputação, mais rápida se revelava a recuperação da mão transplantada. Esse achado questiona o nível em que se deve oferecer um transplante de mão, mas atualmente não há recomendações consistentes de qualquer grupo ativo. Vários dos grupos incluídos na análise do Registro Internacional também publicaram relatórios individuais. Recentemente, o grupo da Polônia publicou o acompanhamento de dois pacientes que sofreram transplante de mão com êxito.227 No momento da publicação, o primeiro paciente estava com 3 anos de transplante e tinha movimento ativo pleno dos dedos, correspondente a 63% de sua mão não afetada. Sua pontuação DASH foi relatada como de 95, e o paciente retornou ao trabalho 20 meses depois do transplante. O segundo paciente estava com apenas 6 meses pós-transplante e marcou 85 pontos no questionário DASH. Os cirurgiões informaram que o teste de monofilamento Semmes-Weinstein documentou uma discriminação de 15 mm de dois pontos e força de pegada de mão transplantada atingindo 4 kg. Esse paciente também voltou ao trabalho em tempo integral. O grupo Lyons documentou os resultados mais recentes de dois pacientes de transplantes bilaterais de mão.207,238 Ambos recuperaram a sensação de dor e frio, sem disestesia ou intolerância ao frio. O primeiro receptor, que, no momento da publicação, contava com 6 anos de transplante, tinha um teste de SemmesWeinstein demonstrando recuperação de sensibilidade na mão direita usando 2,83-3,61 monofilamentos e, na mão esquerda, usando monofilamentos entre 3,22 e 4,08. A discriminação média do teste de dois pontos foi de 6 mm na mão direita e de 9 mm na mão esquerda. Em contraste, o teste Semmes-Weinstein do segundo paciente

demonstrou recuperação de sensibilidade do lado direito usando 3,22-3,61 monofilamentos e, no lado esquerdo, usando monofilamentos entre 3,22 e 3,84. No entanto, a força muscular ficou diminuída em ambos os pacientes. O primeiro paciente tinha uma força de pegada bimanual de 12 kg, enquanto o segundo apresentava força de pegada de 4 kg no lado direito e de 8 kg no lado esquerdo. Enquanto os autores do grupo Lyons comentaram que a destreza manual usando os testes Minnesota e Carroll demonstrou capacidade normal de alcance, pegada, movimentação, posicionamento e de virar objetos, não forneceram pontuação para esses testes. Comentaram que o primeiro receptor continuou a ter pinçamento lateral e pegada bimanual. Os pacientes, de acordo com os autores, eram capazes de realizar a maior parte de suas atividades diárias no primeiro ano depois do transplante. Um dos dois pacientes retornou ao trabalho. Finalmente, o grupo Innsbruck publicou um acompanhamento de oito anos depois do transplante de mão.239 Um dos achados mais significativos desse grupo foi que os pacientes podem continuar a observar melhora de sua função e sensação até mesmo 4 a 5 anos depois do transplante. O primeiro paciente teve uma recuperação excelente depois do transplante bilateral das mãos. Oito anos depois do transplante, a função da mão desse paciente foi notória. Ele é capaz de usar as mãos de forma simétrica, realizando todas as atividades cotidianas. A pontuação atual de DASH é de 34. O segundo paciente teve um transplante de antebraço que apresentou melhora contínua da função motora nos primeiros 3 anos e, de acordo com os autores, tem função manual satisfatória. O paciente notou que a função da mão é superior à obtida com as próteses mioelétricas. Enquanto o paciente notou a recuperação da discriminação entre quente e frio (com 6 meses de pós-transplante), sua sensibilidade geral permanece baixa, sem discriminação detectável de dois pontos. A força de pegada medida foi de 6,8 kg no lado direito e 5,5 kg no lado esquerdo. No entanto, em comparação com os resultados póstransplante de mão, as habilidades nos movimentos motores finos mostraram-se levemente inferiores no paciente com transplante de antebraço. O terceiro paciente ainda estava em processo intensivo de terapia de paciente externo no momento da publicação. A experiência mundial em transplante de mão demonstra a utilidade clínica dessa técnica emergente. No entanto, há mais questões que, atualmente, ainda não foram respondidas. Essas questões dizem respeito ao melhor uso da imunossupressão e dos regimes imunossupressores, acentuando a importância de futuras colaborações entre os centros quanto à melhor prática no regime de imunossupressão. Essa crítica também revela a necessidade de haver colaboração contínua entre os grupos, a fim de padronizar a forma como os resultados funcionais são aferidos, com vistas à comparação mais fácil entre os resultados de caso.

Futuro do transplante na cirurgia plástica A estratégia atual para o tratamento pós-transplante de aloenxerto de tecido composto é tratá-lo com regimes bem estabelecidos de imunossupressão usados em transplantes de órgãos sólidos. A maioria dos pacientes de transplante CTA foi tratada com um agente indutor (como, por exemplo, o ATG ou Alemtuzumab) e, em seguida, mantida com até três imunossupressores (Tacrolimus, MMF e corticoides). Isso conduziu ao elevado nível de êxito em termos de UHF inicial de enxerto. Não evitou episódios de rejeição aguda. No entanto, para que o campo de transplante reconstrutor expanda suas indicações para além do campo experimental, as técnicas precisam ser projetadas, quer para reduzir significativamente, quer para eliminar a necessidade de imunossupressão crônica. A direção futura desse campo depende, em grande parte, do desenvolvimento de abordagens inovadoras no uso de agentes imunossupressores e protocolos de indução de tolerância. Muitos consideram difícil justificar clinicamente o uso de uma alta dosagem crônica de imunossupressão para obter transplante do aloenxerto de membro.240 O desenvolvimento de regimes eficazes para induzir a tolerância do hospedeiro sem a imunossupressão em longo prazo, portanto, é essencial para alterar o equilíbrio de risco-benefício. Esses regimes podem envolver imunossupressão específica do local direcionado ao enxerto, possivelmente combinada com antígenos MHC entre anticorpos monoclonais de doador e receptor que bloqueiam um passo característico do processo de reconhecimento do antígeno ou são expostos ao antígeno do doador com a introdução de células-tronco hematopoeicas antes do transplante, para estabelecer um estado de quimerismo misto.241 As terapias de esvaziamento de células T mostraram-se eficazes na promoção da aceitação do enxerto e na tolerância em vários modelos animais.242,243 No entanto, a tradução clínica desses protocolos não deu lugar a um progresso significativo até a introdução do anticorpo monoclonal CD52 Alemtuzumab (Campath-1H). O CD52 está expresso na maioria dos linfócitos T e B, nas células NK e nos monócitos, e o Alemtuzumab rapidamente esvazia essas células com variadas cinéticas de repopulação. Os relatórios clínicos iniciais elaborados por Calne

et al.88,89 sugeriram que o uso de Alemtuzumab em combinação com baixa dose de ciclosporina no transplante de rim pode levar a um estado de tolerância “adequada” (aceitação do enxerto com imunossupressão reduzida). No entanto, o uso de Alemtuzumab apenas ou em combinação com eoxispergualina levou a 100% de rejeição aguda.244,245 Isso demonstrou que o Alemtuzumab não foi em si tolerogênico. Recentemente, seu uso como agente indutor foi capaz de reduzir significativamente os episódios de rejeição aguda (14% versus 26%), em comparação com a timoglobulina. No entanto, não houve diferença na sobrevivência, extensão inicial de permanência e manutenção de imunossupressão (inclusive com a eliminação precoce de corticoide).246 Tentativas de se usarem agentes de esvaziamento de células T como o Alemtuzumab ou ATG no campo de CTA deram lugar a resultados similares e enfatizam a necessidade de estratégias adicionais que permitam reduzir a imunossupressão. No que diz respeito à oportunidade dos protocolos inovadores de tratamento, CTA também oferece vantagens singulares, como, por exemplo, o monitoramento contínuo e a amostragem adequada de biópsia do enxerto através da simples inspeção visual da pele, permitindo intervenções em tempo hábil, além de tratamento e ajustes precisos de imunossupressão em base individualizada. Além disso, alguns CTAs podem conter várias quantidades de medula óssea de doador e um nicho individualizado de medula óssea vascularizada, o que pode servir de fonte contínua de células doadoras, inclusive células-tronco derivadas da medula óssea. Isso foi demonstrado em certos modelos animais experimentais, a fim de modular favoravelmente a reação imunológica do hospedeiro. Assim, as estratégias novas baseadas em células para minimizar a imunossupressão ou reduzir a tolerância imunológica são particularmente atraentes em CTA. Recentemente, o grupo da Universidade de Pittsburgh introduziu uma estratégia que aproveita a depleção celular proporcionada pelo Alemtuzumab, combinando-a a uma infusão de células de medula óssea. Essa técnica teve relato de sucesso em transplantes de rim vivo relacionado, permitindo também minimizar a manutenção de imunossupressão depois de transplantes de pâncreas, coração e pulmão e até mesmo o desmame total de alguns pacientes da imunossupressão em longo prazo. Até agora, foram fornecidos relatórios precoces em oito transplantes de mão/antebraço realizados em cinco pacientes que estão sob o protocolo. Atualmente, todos os receptores são mantidos com uma droga imunossupressora única (Tacrolimus) em níveis baixos e continuam a apresentar melhora das funções motoras e sensoriais em suas mãos transplantadas. Apesar da combinação de indução de Alemtuzumab e de infusão de células de medula óssea de doador, todos os transplantes sofreram pelo menos um episódio de rejeição aguda que exigiu tratamento adicional. No entanto, episódios agudos de rejeição aguda observados com esse protocolo reagiram a terapias tópicas apenas em cerca de 50% dos casos ou aplicações curtas de corticoides. Ambas as biópsias de tecido superficial e profundo, assim como o ultrassom de alta resolução, não mostraram evidências de proliferação vascular miointimal como sinal indireto de rejeição crônica. Esse protocolo imunomodulador baseado em células de medula óssea foi comprovado como bem tolerado e eficaz, permitindo o transplante de mão/antebraço com monoterapia de baixa dosagem de Tacrolimus, mas parece não permitir a retirada completa de toda a imunossupressão. Dados em longo prazo confirmam esses achados. O uso de um anticorpo único pode ter a capacidade de levar à tolerância do antígeno do doador. Assim, a adição de outros anticorpos monoclonais, como, por exemplo, o ligante CD40, pode ser necessária para produzir um estado de anergia de células T a esses antígenos. Observou-se a ativação total e simultânea de aporte dos sinais coestimuladores. Uma célula T que encontra um antígeno estranho, na ausência de citocinas necessárias, falha em ser ativada, o que pode levar a um estado de tolerância.247 Esse mecanismo se baseia no bloqueio de CD28/CTLA4-CD80 e de caminhos CD40-CD40 ligante (CD154).248,249 Vários modelos de tolerância primata não humana para avaliar o efeito de se interromperem esses caminhos essenciais demonstraram sobrevivência prolongada de aloenxertos renais.250,251 Resta saber se essas estratégias permitem que os transplantes de membros sejam realizados com a cessação total da imunossupressão. No entanto, atualmente, parece que a depleção da célula T apenas (com ou sem medula óssea) ou a dependência em outros anticorpos não conduzem a uma tolerância aos aloenxertos de órgãos. Regimes que levam à indução de quimerismo hematopoeico misto, contudo, demonstraram conduzir à tolerância a aloenxertos de órgãos em vários estudos pré-clínicos.96,252-254 A estratégia envolve o uso de células-tronco de medula óssea para induzir um estado de quimerismo misto. Há mais de um século, Owen observou que é possível induzir tolerância expondo a medula óssea do doador ao sistema imunológico do receptor antes de sua maturidade.255 Essa indução fetal ou neonatal da tolerância a aloenxertos musculoesqueléticos foi obtida em modelos experimentais suínos e roedores, respectivamente.256-258 A adaptação bem-sucedida dessa abordagem pode apresentar potencial terapêutico em condições congênitas. A aplicação similar de protocolos de

quimerismo misto também pode conduzir à indução de tolerância em adultos.96,259 Foster et al. constataram que quimerismos mistos em roedores aceitam aloenxertos singeneicos de doadores de membros.260 Huang et al. adotaram um protocolo minimamente tóxico para gerar quimeras em miniaturas de suínos com tolerância específica de doador in vitro enquanto preserva a imunocompetência a antígenos de terceiros.261,262 Ao empregarem uma estratégia similar ao mesmo modelo, Hettiaratchy et al. demonstraram tolerância a partes de músculo e osso de aloenxertos CTA através de uma barreira maior MHC.263 Além disso, relatórios de casos demonstraram tolerância a um aloenxerto de rim em pacientes que receberam transplante de medula do mesmo doador, às vezes com anos de diferença.264-266 No entanto, frequentemente a combinação de regimes mais condicionadores com a infusão de medula óssea resulta em GvHD. Quanto maior for a disparidade genética entre o receptor de medula óssea e o doador, mais provável é que o receptor desenvolva GvHD. Esses achados levaram Sachs e colaboradores a realizarem um ensaio clínico usando essa abordagem, a fim de induzir tolerância em pacientes com doença renal terminal e mielomas múltiplos avançados usando doadores irmãos HLA idênticos.267 Seis pacientes receberam ciclofosfamida, ATG e irradiação tímica, assim como ciclosporina (que foi diminuída depois de 2 meses), subsequentemente seguidas de infusões de leucócitos de doador, a fim de melhorar o enxerto contra eventuais efeitos de tumores.268,269 Todos os pacientes manifestaram efeitos iniciais de enxerto da medula do doador, mas o quimerismo celular do doador foi perdido em todos os pacientes, exceto dois deles. Esses dois pacientes converteram o quimerismo de doador total e tiveram de ser tratados por GvHD. Os outros quatro mantiveram a função renal no longo prazo (até >9 anos) na ausência de imunossupressão. Um dos quatro pacientes apresentou um episódio de rejeição única que foi controlado através do uso transitório de imunossupressão. Recentemente, o grupo modificou seu protocolo para lidar com a indução de tolerância em rins de receptores de doadores vivos não combinantes HLA. A fim de reduzir o risco de GvHD, agora eles usam o anticorpo monoclonal anti-CD2 (siplizumab ou MEDI-507) para a depleção de célula T, em vez de ATG. Cinco pacientes receberam ciclofosfamida, MEDI-507, irradiação tímica e ciclosporina.270 Ocorrências de rejeição humoral e síndrome de rejeição humoral e de enxerto levaram ao acréscimo de Rituximab e corticoides nos últimos dois pacientes.271 O quimerismo misto foi obtido transitoriamente em todos os pacientes, mas as células de doadores não puderam ser detectadas após o 21o dia, e o GvHD não se desenvolveu. Um paciente perdeu o enxerto de rim como resultado de uma rejeição precoce e irreversível mediada por anticorpos. Em outros quatro pacientes, a imunossupressão foi retirada com êxito durante o 1o ano pós-transplante, e a função renal normal foi mantida por mais de 3-6 anos, até a presente data. Os mecanismos subjacentes a essa tolerância operacional não são plenamente elucidados. Esse modelo também é projetado para transplantes relacionados a vivos e, em sua forma atual, não seria possível em transplantes CTA. O transplante de tecido composto oferece soluções potenciais para muitos problemas reconstrutivos, mas não está limitado à amputação de membro. Ao mesmo tempo que os receptores de transplante de mão tiveram sobrevivência de aloenxertos enquanto recebiam imunossupressão crônica, o equilíbrio de risco-benefício permanece precário no caso de transplantes com o objetivo de melhorar sua qualidade de vida. A adaptação bem-sucedida das modalidades de indução de tolerância, reduzindo ou eliminando a necessidade de imunossupressão crônica, pode lançar uma nova fronteira de transplante na cirurgia reconstrutora. Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

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6. Siemionow, M., Papay, F., Alam, D., et al. Near-total human face transplantation for a severely disfigured patient in the USA. Lancet. 2009; 374:203–209. Um caso quase total (80%) de transplante facial humano é relatado com melhoras funcionais significativas, isento de maiores complicações. Os autores defendem que o transplante de face deve ser considerado uma opção precoce reconstrutora no caso de pacientes com lesões faciais desfigurantes graves.

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61. Guo, S., Han, Y., Zhang, X., et al. Human facial allotransplantation: a 2-year follow-up study. Lancet. 2008; 372:631–638. 89. Calne, R., Friend, P., Moffatt, S., et al. Prope tolerance, perioperative campath 1H, and low-dose cyclosporin monotherapy in renal allograft recipients. Lancet. 1998; 351:1701–1702. 252. Kawai, T., Poncelet, A., Sachs, D. H., et al. Long-term outcome and alloantibody production in a nonmyeloablative regimen for induction of renal allograft tolerance. Transplantation. 1999; 68:1767–1775. 266. Sayegh, M. H., Fine, N. A., Smith, J. L., et al. Immunologic tolerance to renal allografts after bone marrow transplants from the same donors. Ann Intern Med. 1991; 114:954–955. 270. Kawai, T., Cosimi, A. B., Spitzer, T. R., et al. HLA-mismatched renal transplantation without maintenance immunosuppression. N Engl J Med. 2008; 358:353–361. Cinco pacientes com doença renal terminal foram tratados com haplotipo único HLA de combinação mista de vivos relacionados a transplantes combinados de medula óssea e rim. Quatro desses pacientes mantiveram a função renal preservada depois da total descontinuidade da imunossupressão.

272. Hewitt, C. W., Black, K. S., Fraser, L. A., et al. Composite tissue (limb) allografts in rats. I. Dosedependent increase in survival with cyclosporine. Transplantation. 1985; 39:360–364. 273. Siliski, J. M., Simpkin, S., Green, C. J. Vascularized whole knee joint allografts in rabbits immunosuppressed with cyclosporin A. Arch Orthop Trauma Surg. 1984; 103:26–35. 274. Walter, P., Menger, M. D., Thies, J., et al. Prolongation of graft survival in allogeneic limb transplantation by 15-deoxyspergualin. Transplant Proc. 1989; 21:3186. 275. Kuroki, H., Ikuta, Y., Akiyama, M. Experimental studies of vascularized allogeneic limb transplantation in the rat using a new immunosuppressive agent, FK-506: morphological and immunological analysis. Transplant Proc. 1989; 21:3187–3190.

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Inovação tecnológica em cirurgia plástica: um guia prático para o cirurgião inovador Leila Jazayeri e Geoffrey C. Gurtner

Resumo Os cirurgiões plásticos distinguem-se historicamente pela sua capacidade de inovar e devem continuar a manter essa vantagem competitiva. Este capítulo irá familiarizar o cirurgião-inovador com uma abordagem sistemática para a inovação. Este processo inclui a formação de ideia, avaliação, financiamento, propriedade intelectual, transferência de tecnologia institucional, o processo de regulamentação da FDA, e os conflitos de interesse. Terapia de feridas por pressão negativa, matriz dérmica acelular, e contorno corporal não invasivo são usados para discutir o impacto da inovação na cirurgia plástica e reconstrutiva.

Introdução A inovação estimula o avanço da medicina. Aperfeiçoamentos médicos recentes – de uma medicina baseada em evidências para um tipo de cirurgia robótica e endoscópica – revolucionaram a sua prática médica. Na área cirúrgica, as mudanças conduziram a terapias cada vez mais eficazes e menos invasivas, resultando em melhor cuidado ao paciente. O que separa invenção de inovação? Invenção é a formulação de novas ideias para produtos ou processos, enquanto a inovação cria a aplicação de novas invenções. Nos negócios, a invenção usa o dinheiro para criar um produto e a inovação toma um produto e cria dinheiro. Na medicina, a invenção é uma tentativa de originar uma solução para um problema clínico e a inovação impulsiona a solução para a cabeceira – análogo ao processo pelo qual a pesquisa translacional aplica a ciência básica em problemas clínicos.1 Cirurgiões plásticos, pelo comércio, são inovadores. Nós concebemos soluções inovadoras para problemas difíceis. Nossa vantagem competitiva reside na inovação. Ao contrário do neurocirurgião ou cardiologista, não reivindicamos parte alguma do corpo.2 No hospital, somos chamados por nossas soluções criativas para as necessidades do neurocirurgião para a reconstrução da calvária; as necessidades do cirurgião cardíaco para a reconstrução da parede torácica; e da necessidade do ortopedista de cobertura das ferragens. Nosso espírito inovador transcende os métodos cirúrgicos inovadores e engloba a inovação de tecnologias originais. Historicamente, a microcirurgia, a distração osteogênica, a expansão do tecido, a cirurgia plástica endoscópica, a lipoaspiração e a tecnologia laser servem todas como plataformas para expandir o alcance da nossa prática, bem como ampliar o escopo do que podemos oferecer aos nossos pacientes.3 O fôlego expansivo da cirurgia plástica expõe nosso campo para vários subespecialistas concorrentes. Dermatologistas, otorrinolaringologistas, oftalmologistas, obstetras e internistas estão cada vez mais envolvidos em cirurgia estética. Da mesma forma, cirurgiões gerais estão competindo pela reconstrução da parede abdominal, a reconstrução da mama e a cicatrização de feridas. Otorrinolaringologistas competem pela reconstrução da cabeça e pescoço. Os cirurgiões ortopédicos competem pelos casos de mão. Cada um desses campos envolve importantes inovações e, posteriormente, oportunidades para o atendimento ao paciente, pesquisa e receita. A cirurgia estética é cheia de novas tecnologias, incluindo técnicas de rejuvenescimento

cutâneo, contorno corporal não invasivo, injetáveis e terapia laser. O fluxo de caixa atraente de receita nesse campo é óbvio e atrai mais e mais concorrência. Da mesma forma, a reconstrução da parede abdominal foi revolucionada pela introdução de novos biomateriais. A reconstrução mamária está mudando com a introdução de novos implantes mamários. O campo da cicatrização de feridas mudou drasticamente com o tratamento por pressão negativa. A reconstrução de cabeça e pescoço tem evoluído com a introdução de placas bioabsorvíveis, parafusos e substitutos ósseos aloplásticos, enquanto a artroplastia por meio de pirocarbono e conduítes de nervo artificial continuam a expandir as ofertas de cirurgia da mão. Inovação é a vantagem competitiva sustentável para cirurgiões plásticos nesta realidade clínica competitiva. Hoje, porém, a área da inovação médica é muito mais complexa do que era há 50 anos. Há maior pesquisa minuciosa da Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos, um crescimento exponencial no número de patentes arquivadas tornou mais complexa as vias regulatórias para novos produtos médicos. No cenário de crise de saúde e econômica, é mais difícil justificar maiores despesas de desenvolvimento com o aumento da concorrência para fundos limitados de investimento. Quando o cirurgião é convidado a inovar, também enfrenta uma infinidade de desafios únicos incluindo conflito de interesses, preocupações e fronteiras das reivindicações de propriedade intelectual das universidades.4 Os desafios enfrentados pelo cirurgião inovador de hoje são bem capturados por O príncipe, de Maquiavel: “Não existe nada mais difícil de fazer, nada mais perigoso de conduzir, ou de êxito mais incerto do que tomar iniciativa de introduzir uma nova ordem de coisas, porque a inovação tem inimigos em todos aqueles que têm se saído bem sob as condições antigas, e defensores não muito entusiásticos entre aqueles que poderiam sair-se bem na nova ordem de coisas.” A empresa de inovação cirúrgica pode receber pouco apoio e enfrentar muitas barreiras, no entanto, pode criar novas tecnologias que podem revolucionar o campo e impactar milhões de pacientes. Para superar as barreiras na inovação cirúrgica, devemos criar e usar uma abordagem sistemática para traduzir ideias baseadas em um problema humano para um produto que pode mudar a prática clínica.5 Este capítulo se propõe a discutir a abordagem sistemática à inovação cirúrgica e dá alguns exemplos de novas tecnologias em nosso campo.

A ideia Mark Twain disse: “O nome do maior dos inventores: acaso.” Em 1957, Mason Sones acidentalmente injetou corante na artéria coronária direita, ele imediatamente reconheceu o problema e puxou o cateter para fora, enquanto a injeção de corante continuou. Mais tarde, Mason disse: “Naquele dia eu percebi que eu tinha descoberto algo muito importante.” Ele então passou a refinar a técnica que levou à angiografia coronária. Por outro lado, provérbio de Platão frequentemente citado, “a necessidade é a mãe da invenção”, sugere que a inovação certamente não precisa contar com uma descoberta acidental. Hoje, há paradigmas de inovação calculados e sistemáticos que começam com a identificação de um problema clínico. O problema deve ser uma necessidade clínica não atendida. O conhecimento científico na área e as limitações das soluções atuais devem ser explorados. O problema clínico pode ser levado para o laboratório ou em caixas multidisciplinares de reflexão, onde a solução é desenvolvida de forma sistemática, com a esperança de traduzi-la de volta para a sala de cirurgia. Robert Frost pensou que ideias são proezas de associação: “Ter algo diante de você traz algo a sua mente que você quase não sabia que sabia.” Esse paradigma da descoberta pode descrever porque a maioria dos dispositivos cirúrgicos está enraizada nas ideias de cirurgiões observadores. A história intemporal do Dr. Thomas Fogarty, do desenvolvimento do cateter de Fogarty, começou com um problema clínico definido e foi assistida com “proezas de associação”. Fogarty era um técnico estagiário e testemunhou uma perda aguda de um membro, como resultado de uma cirurgia para remover coágulos sanguíneos. Como estudante de medicina da Universidade de Cincinnati, ele começou a trabalhar em uma solução para o problema clínico que ele havia identificado há anos anteriormente. Em sua garagem, ele desenvolveu um balão na ponta de um cateter que pode ser inserido através de uma pequena incisão de acesso e passou através da artéria além da obstrução. Uma vez passado o bloqueio, o balão pode ser inflado e o coágulo arrastado para fora da artéria. Sua capacidade de inventar e prototipar esse novo dispositivo, talvez, foi facilitada por sua associação prévia com instrumentos cirúrgicos como técnico estagiário. Ele recebeu muitas críticas de seus mentores, mas seguiu em frente para patentear o cateter balão. Construiu o dispositivo em sua garagem e trabalhou incansavelmente para ter o cateter adaptado por cirurgiões vasculares. Desde então, o cateter de Fogarty revolucionou a cirurgia vascular e elevou as inovações a uma plataforma superior em técnicas minimamente invasivas. Seja a ideia por trás de uma inovação criada de modo acidental ou sistêmica, pode levar ao desenvolvimento

de duas grandes categorias de inovações: um novo método ou um novo dispositivo. Devido a maior parte dos capítulos discutirem dispositivos médicos, vamos discutir resumidamente o aperfeiçoamento dos métodos originais. Delos Cosgrove descreve sua ideia de um método cirúrgico original: “Há alguns anos, em preparação para realizar a troca da valva aórtica, encontrei a aorta ascendente inteiramente calcificada e ambas as artérias femorais ocluídas. Reconhecendo o perigo de canular qualquer um desses vasos, eu levantei o braço do paciente para expor a artéria axilar, que usei como o local de canulação. A troca da valva aórtica foi bem sucedida e realizada.”6 Bruce Lytle expandiu essa ideia e refinou o processo de canulação da artéria subclávia para esse problema. Mudanças substanciais em uma intervenção cirúrgica são revistas pelo Conselho de Revisão Institucional (IRB), financiado através de fontes acadêmicas e descritas em novas publicações acadêmicas e apresentações. A comunidade cirúrgica geralmente compartilha novos métodos para o benefício dos pacientes sem recuperar royalties, mesmo que esses métodos cirúrgicos originais possam ser patenteados 7

Determinando o valor Valor é a relação subjetiva entre o benefício percebido e o custo percebido de um produto ou serviço.

Como médicos, estamos constantemente atribuindo valor a nossas terapias como meio de decidir a forma de fornecer cuidados médicos. Nós definimos o valor de uma dada intervenção terapêutica tendo em vista o potencial benefício para o paciente e em relação ao risco potencial. Com base na proporção risco-benefício, decidimos preceder ou abandonar uma determinada terapia, adotar ou não adotar uma inovação. Do mesmo modo, como cirurgiões, nós definimos o valor de uma inovação cirúrgica como o benefício potencial para o paciente em relação ao risco potencial. Hoje, na área da saúde, antes de qualquer novo dispositivo cirúrgico estar disponível para uso clínico do paciente, seu valor comercial deve ser demonstrado. O retorno comercial de um dispositivo deve superar os seus riscos de desenvolvimento, a fim de ter uma chance realista de o dispositivo tornar-se disponível para o uso do paciente. Para entender o valor de uma inovação, é importante compreender o benefício percebido que a mesma tem sobre (1) o atendimento ao paciente, (2) a tecnologia, e (3) o impacto comercial. Iremos rever alguns dos termos usados para descrever o benefício percebido de uma inovação nessas áreas. O impacto de uma inovação no cuidado ao paciente pode ser descrito como revolucionário ou incremental. Uma inovação revolucionária tem um impacto significativo no cuidado ao paciente onde uma inovação incremental tem um efeito menor. Considere o impacto revolucionário da endoprótese para reparação de aneurismas da aorta abdominal (AAA). A técnica de usar um enxerto intraluminal transfemoral para reparação de AAA foi publicada pela primeira vez por Balko e associados em 1986; a experiência humana foi publicada pela primeira vez por Parodi, em 1991; e o primeiro dispositivo fabricado foi projetado por Harrison M. Lázaro e desenvolvido por Endovascular Technologies Company.8-10 Em setembro de 1999, a FDA concedeu a aprovação a dois dispositivos para a comercialização. Agora a reparação endovascular de AAA oferece menor tempo de internação, diminuição da mortalidade operatória e morbidade e uma vantagem indiscutível para pacientes com múltiplas ou significativas comorbidades. Por outro lado, considere as reiterações de múltiplos dissectores laparoscópicos. Esses instrumentos foram desenvolvidos na tentativa de melhorar a dissecção laparoscópica, mas nenhum com um impacto significativo nos resultados ou cuidados ao paciente. O impacto de uma inovação sobre a tecnologia pode ser definido como habilitador ou refinado. Uma tecnologia habilitadora é a que permite que uma inovação sirva como plataforma para outros desenvolvimentos dentro de um campo. Em 1976, os Fischers introduziram a era moderna da lipoaspiração, que é hoje um dos procedimentos de cirurgia plástica mais comumente realizados.11 Essa inovação serviu como plataforma para muitos outros desenvolvimentos, incluindo lipoaspiração assistida por ultrassom e a vibrolipoaspiração. Ambas – tanto a por ultrassom e a vibrolipoaspiração – representam tecnologias refinadas. A tecnologia refinada é uma inovação que apenas melhora marginalmente a tecnologia disponível e não a uma mudança significativa. Finalmente, para ajudar a descrever o impacto comercial de uma inovação são usados os termos de mercado “tecnologia disruptiva” e “tecnologia sustentada” (Fig. 35.1). A tecnologia disruptiva é uma inovação que

substitui os líderes da indústria e assume as suas quotas de mercado. Quando tecnologias disruptivas são introduzidas, muitas vezes elas são inferiores ao dispositivo líder existente e ignoradas pela indústria em exercício. Na cirurgia, a inferioridade dos dispositivos é geralmente secundária à curva de aprendizado do dispositivo, à falta de informações de segurança e tecnologia inferior. No entanto, conforme os médicos aprendem a utilizar o dispositivo, seu perfil de segurança expande e, conforme a tecnologia melhora, a sua quota de mercado supera a do seu principal concorrente. O “líder do setor ” pode ser aplicado à empresa que produz a tecnologia líder, ou de forma mais ampla, a subespecialidade que usa a tecnologia. Por exemplo, quando se introduziu a angioplastia percutânea transluminal com balão, o perfil de segurança não foi bem compreendido e era inferior à cirurgia de revascularização do miocárdio. Com o tempo, provou-se ser uma tecnologia disruptiva que mudou de longe a quota de mercado para pacientes de cirurgiões cardiotorácicos (os líderes da indústria incumbente) para cardiologistas intervencionistas. O stent coronário, por outro lado, é uma tecnologia sustentada. A mudança da tecnologia sustentada é uma melhoria, geralmente feita pela indústria líder atual para manter o crescimento no mercado. A tecnologia ainda pode ser habilitada (levando a uma maior alteração de tecnologia) ou revolucionária (levando a significativas melhorias na assistência ao paciente), mas, por definição, não é perturbadora para as forças do mercado. Nesse caso, o stent coronário levou a um maior avanço tecnológico e melhorou os resultados do paciente, mas não substitui os líderes industriais ou clínicos. O cardiologista intervencionista utiliza desta tecnologia para manter o seu crescimento no mercado.1

FIG. 35.1 Mudança da tecnologia disruptiva versus a sustentada.

Geralmente, quanto maior o benefício esperado de uma inovação, maior o potencial para o retorno financeiro. No entanto, tende também a ter mais risco envolvido em todas as fases do seu desenvolvimento.

Com uma inovação revolucionária, existe um risco significativo para o desenvolvimento de tecnologia não comprovada, um caminho mais arriscado de aprovação da FDA normalmente exigindo a aprovação prémercado, e mais recursos necessários para criar uma grande e experiente equipe de desenvolvimento que possa lidar com os desafios envolvidos no desenvolvimento uma tecnologia revolucionária. A inovação revolucionária, como a endoprótese para correção de AAA, irá também ter um grande impacto no paciente e grande potencial de mercado que justifique o aumento dos recursos e riscos exigidos para desenvolver o dispositivo. Uma inovação incremental, tal como o “projétil” de dissecção endoscópica, tem um menor impacto no paciente e, em última análise, menos potencial de receita. Para justificar o seu valor, tem de haver menos risco e recursos envolvidos no seu desenvolvimento. Na verdade, existe menos risco na viabilidade tecnológica das tecnologias incrementais porque elas geralmente dependem de tecnologias comprovadas. A regulamentação FDA geral cai em “via 510(k)”, com a aprovação mais rápida com base em dispositivos de qualidade, bem como a equipe de desenvolvimento pode ser um pequeno grupo de indivíduos focados. É importante compreender em que categoria geral uma inovação se insere de modo que os riscos e, posteriormente, os benefícios esperados possam comumente ser compreendidos.

Financiamento Uma ideia inovadora desenvolve passo a passo desde a concepção até o produto, para utilização pelo paciente. Conforme cada etapa é cumprida, a inovação cria valor e reduz o risco (Fig. 35.2). O financiamento ao longo deste processo é adquirido com base nos progressos realizados para a construção do valor. O menor investimento inicial usado para provar o conceito inovador é denominado capital semente. Este investimento é geralmente entre 50 mil e 500 mil dólares e pode vir de uma variedade de fontes: amigos e familiares, investidores, empresas de concessão de subsídios, pesquisa de inovação das pequenas empresas (SBIR) e subvenções de transferência de tecnologia (STTR). Os investidores vêm de indivíduos ricos ou de um grupo de indivíduos, muitas vezes com experiência no setor, geralmente em troca de equivalência patrimonial na empresa. Em 2009, os investidores foram estimados em 17,6 bilhões de dólares de 259.480 investidores ativos, com um total de 57.225 empreendimentos empresariais que recebem financiamento. Serviços de saúde, dispositivos médicos e equipamentos representaram 17% dos investimentos atrás apenas dos programas de computador, que respondeu a 19%.12 Subvenções de transferência de tecnologia (STTR) de pequenas empresas reservam uma porcentagem específica de Pesquisa Federal e Financiamento para o desenvolvimento das parcerias entre pequenas empresas e instituições de pesquisa sem fins lucrativos. A intenção é combinar as ideias inovadoras, que tendem a sair de pequenas empresas ou centros acadêmicos que não têm os meios para apoio sério, à pesquisa e desenvolvimento, com a capacidade de laboratórios de pesquisa sem fins lucrativos para desenvolver inovações de alta tecnologia. O objetivo dessas parcerias é transferir as tecnologias do laboratório para o mercado, com as pequenas empresas lucrando com a comercialização e estimulando, assim, a economia dos Estados Unidos. A cada ano, o Departamento de Defesa, o Departamento de Energia, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos, a NASA e a Fundação de Ciência Nacional são obrigados por STTR a reservarem uma parte dos recursos de pesquisa e desenvolvimento a essas parcerias.

FIG. 35.2 Estágios de financiamento.

Investimentos maiores podem vir de financiamento de risco ou corporativo. Fundos de venture capital minam juntos investimentos de investidores institucionais e indivíduos de alta renda. Esses investidores tornam-se limitados investidores a terça parte do fundo de risco. O fundo em seguida investe em novas tecnologias, que têm o potencial para gerar retornos comerciais elevados à custa de riscos muito altos para os mercados de capital padrão. Em troca dos fundos de capital de alto risco, fundos de venture capital compram uma quantidade significativa de controle e de propriedade da empresa. Para garantir a realização dos investimentos de alto risco, as empresas procuram companhias com tecnologia inovadora e potencial de crescimento rápido com um modelo de negócio bem desenvolvido, equipe de gestão impressionante, e os mercados no valor de mais de 500 milhões de dólares. Venture capital é oferecido em estágios de financiamento que se sincronizam ao crescimento da empresa. À medida que a nova empresa move-se de conceito a empresa, a produto e, finalmente, a aquisição ou Oferta Pública Inicial (IPO), ganha valor e perde risco. Os venture capitalistas exigem uma análise detalhada da via de desenvolvimento com foco na redução de risco e construção de valor em marcos críticos de crescimento. Exemplos de marcos críticos estão assegurando Propriedade Intelectual, construção de um protótipo de trabalho, testes bem-sucedidos em animais, aprovação da FDA e em uso no homem pela primeira vez. Em paralelo com cada uma desses marcos de crescimento estão os benchmarks de financiamento. O primeiro benchmark de financiamento é a fase semente, como discutido acima, pode vir de amigos e familiares ou angels investments. Muitos fundos de capital venture não podem investir na fase semente, porque os riscos são muito elevados e o conceito não foi totalmente realizado nesse momento. O segundo benchmark é conhecido como fase de arranque, na qual o venture está pronto para lançar; esses fundos são necessários para o desenvolvimento da empresa, para o marketing e para o desenvolvimento de produtos. O terceiro benchmark, o qual pode ser ainda dividido em várias etapas, é a fase de expansão. Aqui os fundos são usados para fabricação e vendas, levando a empresa a um estágio em que começa a gerar lucro. Muitas vezes, a rodada final de financiamento é o mezanino ou ponte rolante, que é anterior à aquisição final, compra ou IPO. Nesta etapa, o débito de curto prazo é geralmente utilizado para apoiar as oportunidades de crescimento durante a preparação para uma aquisição, uma compra ou um IPO. A primeira rodada de fundos externos é geralmente chamada “Série A” e a segunda rodada “Série B”. O veículo de investimento é geralmente “Ações preferenciais Série A” ou “Preferenciais Série B”. Esta é a participação acionária preferida na empresa, ou seja, em troca de seu investimento, o grupo Venture Capital terá primeiro direito aos dividendos, no caso de sucesso, e ativos liquidados, no caso de insucesso. A participação acionária em cada rodada é determinada pelo valor da empresa nessa fase ou “valorização pré-money” em relação ao investimento da Empresa VC.

Propriedade intelectual O órgão americano de Registro de Marcas e Patentes (PTO) emite vários tipos de documentos de patentes que cobrem diferentes tipos de assunto. Dispositivos médicos são na maioria das vezes protegidos por patentes de utilidade. Aproximadamente 90% dos documentos de patentes emitidos pelo PTO nos últimos anos têm sido desse tipo. As patentes de utilidade protegem qualquer invenção nova ou melhorias funcionais em invenções existentes. Isso pode ser em um produto, a máquina, um processo, um método de fazer as coisas, ou composição da matéria. Uma patente não concede o direito de usar ou vender uma invenção, mas sim concede o direito de excluir outros de produzir, usar, vender, oferecer para venda ou importar a invenção nos Estados Unidos por até 20 anos a partir da data de preenchimento do pedido de patente. Assim, se um inventor tem uma pinça laparoscópica patenteada, adiciona um projeto para torná-la mais ergonômica e depois obtém uma nova patente sobre essa melhoria, ele pode excluir outros de usar a sua melhoria. No entanto, o novo inventor precisa da autorização do pinça laparoscópica original para fabricar a dele. Para ser considerado passível de patente, a invenção deve ser original, não óbvia e útil. Para ser original, a invenção não pode ter sido de conhecimento ou usada por outros, ou mesmo descrita em uma publicação impressa. Especificamente, uma patente americana não pode ser obtida antes de 1 ano a partir do momento em que uma invenção foi revelada por uso público ou publicação. Em muitos países, a carência de 1 ano não é concedida. Assim, os inventores do ambiente acadêmico devem obter a propriedade intelectual antes da publicação de seu trabalho e cirurgiões inventores devem também obter a propriedade intelectual antes de uso público. A invenção também deve ser não óbvia aos envolvidos no campo relevante. Finalmente, deve ser útil, no caso de um inovador cirurgião, ele deve atender a uma necessidade de um paciente ou cirurgião. Para certificar-se que uma invenção ou ideia é original, o cirurgião inovador pode pesquisar a literatura e o banco de dados do PTO americano. Pode-se começar por meio das pesquisas de palavras-chave para encontrar um dispositivo semelhante em qualquer mecanismo de busca publicamente disponíveis.13,14 Uma vez que o dispositivo mais próximo ou a invenção é encontrado(a), deve-se explorar a patente existente intimamente para entender quais aspectos da inovação são protegidos e quais não são. Há três partes principais de uma patente: as figuras, as especificações escritas e as reivindicações. As figuras de patente ou desenhos são necessários para quase todas as patentes de utilidade. Os desenhos devem mostrar cada característica da invenção especificada nas reivindicações e são obrigados, pelas regras do órgão americano de patentes, a ser de uma forma particular. As especificações escritas são uma descrição escrita da invenção, como fazê-la e como usá-la. O PTO determina que as especificações devam ser “em termos completos, claros, concisos e exatos de modo a permitir que qualquer perito na área a que pertence, ou com o qual é mais ligada, possa fazer e utilizar a mesma, e deve estabelecer o melhor modo contemplado pelo inventor no exercício da sua invenção.” Finalmente, a seção de reivindicações é usada para descrever o alcance da proteção que o requerente está solicitando. Essa seção é crítica e forma as bases para o litígio e acusação de violação. Aqui, a língua técnica deve ser usada para realmente definir a forma de realização da sua inovação que a diferencia de invenções que anteriores. Em linguagem de patentes, invenções anteriores são chamadas de arte anterior. A seção de reivindicações realmente define a invenção. A maioria das patentes contém cerca de 10-20 reivindicações, apesar de existirem algumas patentes com apenas uma reivindicação e outras com centenas de reivindicações. Existem dois tipos de reivindicações: as independentes e as dependentes. As primeiras são autônomas e as outras, por outro lado, referem-se à outra alegação a qual dependem, e que devem ser lidas em conjunto com o intuito de entender o alcance da afirmação. Um pedido completo de patente de utilidade inclui as figuras, especificações escritas e reivindicações, como especificado acima. Aconselha-se assessoria jurídica, especializada em propriedade intelectual nesta fase, pois o cirurgião inventor normalmente não tem os conhecimentos necessários para garantir que a patente de utilidade atenda tanto aos inventores quanto às expectativas do PTO. Desde 8 de junho de 1995, o PTO ofereceu aos inventores a opção de apresentação de um pedido provisório de patente para proporcionar menor custo (110220 dólares) de primeiro pedido de patente nos Estados Unidos. A patente provisória protege uma invenção em seus estágios iniciais. Esse documento descreve a invenção com desenhos pertinentes, sem fazer qualquer reivindicação. Uma vez que é submetido, o PTO arquiva as informações, porém não as revê até que um pedido completo de patente de utilidade esteja pronto para revisão. A patente provisória é válida por 1 ano, enquanto o inventor aperfeiçoa a invenção e o pedido de patente de utilidade. A patenteabilidade é então avaliada como se arquivada na data da aplicação provisória, no entanto, o prazo da patente de 20 anos seria medido a partir da data da aplicação não provisional.

Enquanto uma patente provisória oferece proteção documentada de uma invenção em seus estágios iniciais, patentes nos Estados Unidos são, teoricamente, emitidas para o “primeiro a inventar ” em oposição ao “primeiro a arquivar ” seguida por outros países. Assim, é muito importante ter prova adequada da data de invenção por meio de uma caderneta de laboratório que é datada, assinada e testemunhada regularmente. Esta documentação de uma invenção pode, em última análise, alterar um destinatário de patente. Um inventor cirurgião deve, portanto, documentar cuidadosamente todas as invenções, uma vez que uma invenção é considerada original, não óbvia e útil; realizar uma pesquisa inicial de patentes e, em seguida, apresentar uma patente provisória. Além da patente provisória, deve-se obter conselho adicional. Em uma instituição acadêmica este conselho pode ser obtido por meio do escritório de licenciamento de tecnologia.

Transferência de tecnologia institucional Em 1980, a Lei Bayh-Dole permitiu pequenas empresas, bem como organizações públicas e sem fins lucrativos, incluindo universidades, a reter a propriedade intelectual desenvolvida durante a busca de pesquisa e desenvolvimento patrocinada pelo governo federal. Desde então tem havido uma explosão de novas relações entre universidades, indústria e o governo federal. As universidades de pesquisa não apenas desenvolveram vínculos cada vez mais estreitos com a indústria, mas também por meio do licenciamento, e outras formas de transferência de tecnologia, tornaram-se uma força importante no desenvolvimento da tecnologia que, em última análise, contribuiu significativamente para o progresso da economia regional local.15-18 Nas últimas duas décadas, o prestígio institucional para as universidades de pesquisa tem sido cada vez mais definido em termos de sucesso comercial, adicionalmente às ciências acadêmicas.16 A maioria das universidades criaram escritórios de licenciamento de tecnologia (TLO) para gerenciar seus portfólios de patentes. Cirurgiões inovadores devem familiarizar-se com as políticas de Propriedade Intelectual (PI) da sua instituição específica. A maioria das universidades tem contrato de trabalho que afirma a PI em qualquer invenção criada com recursos da universidade. Sob a Lei Bayh-Dole, no entanto, as universidades são também obrigadas a compartilhar uma porção das receitas de novas tecnologias com o inventor. O cirurgião inovador assim, geralmente, começa o processo da invenção com a divulgação da presente invenção para o TLO. O TLO, em seguida, avalia a tecnologia e quase invariavelmente opta por manter a propriedade intelectual. Nesse ponto, dependendo das competências e cultura do TLO, um papel ativo ou passivo é feita na comercialização de uma tecnologia para a indústria e potenciais desenvolvedores com o objetivo inicial de compreender o verdadeiro valor da invenção. Uma vez que a tecnologia e o seu potencial financeiro são entendidos, novamente dependendo da cultura do TLO, são tomadas várias medidas para desenvolver e licenciar a tecnologia. Uma oportunidade justa de licenciar a tecnologia geralmente é atribuída ao inventor. Há um enorme espectro de acordos de licenciamento e estipulações que pode ou não pode ser incluído em um acordo de licenciamento. Alguns termos gerais de licenciamento são apresentados na Tabela 35.1. Tabela 35.1 Termos básicos de licenciamento Taxa de emissão

Taxa paga ao órgão licenciador para a emissão da licença

Exclusividade

Uma estipulação garantindo que nenhum outro grupo pode licenciar a tecnologia pelo prazo da licença

Prazo

O período de uma licença

Campo de uso

Uso de patente concedido para campos específicos, ou seja, médico, industrial e educacional

Território Licenciado

A região específica concedida ao licenciado

Pagamento anual de royalty Taxa anual para o uso da licença Equidade

Equidade da empresa do licenciado pode ser concedida como parte do pagamento de uma licença

Royalty adquirido

Uma porcentagem das receitas dos produtos que se apoiam na patente licenciada, pago ao órgão licenciador

Taxa de Subconcessão

A taxa paga ao órgão licenciador, se o licenciado sublicenciar

Processo regulamentar de aprovação da FDA Nos Estados Unidos, os dispositivos médicos são regulados pelo Centro para Dispositivos e Saúde Radiológica

(CDRH), um ramo da FDA. O CDRH é responsável por promover e proteger a saúde pública fazendo dispositivos médicos seguros e eficazes disponíveis em tempo hábil. Para determinar a segurança e a eficácia de um dispositivo médico, o CDRH desenvolveu três principais vias de aprovação: Isenção, 510(k) notificação pré- mercado e aplicação de aprovação pré-mercado (PMA) (Tabela 35.2). A via de aprovação é determinada pelo grau de risco associado ao dispositivo e à medida em que ele representa novas preocupações de segurança e eficiência. Dispositivos também são classificados de acordo com sua percepção do risco e do grau de controle necessário para garantir segurança e eficácia com um sistema de três níveis: classe I, classe II ou classe III. O controle regulamentar aumenta da classe I para a classe III. Tabela 35.2 Termos básicos de licenciamento Classificação do dispositivo

Processo de aprovação regulamentar da FDA

Exemplos

Classe I

Isenção: sujeito a controles gerais

Instrumentos cirúrgicos portáteis

Classe II

Notificação 510(k) pré-mercado: demonstra equivalência de classe I ou dispositivos de classe II com aprovação 510(k) existente

Materiais de sutura

Classe III

Aprovação pré-mercado (PMA): extensos dados com estudos pré-clínicos e clínicos em humanos

Implantes mamários

Em geral, a classe do dispositivo vagamente se correlaciona com vias de aprovação da FDA. A maioria dos dispositivos de classe I está isenta de notificação pré-mercado (PMN) ou a aprovação pré-mercado (PMA); a maior parte dos dispositivos de classe II exige a notificação pré -mercado 510(k), e a maior parte dos dispositivos de classe III necessita de aprovação pré-mercado. Dispositivos de classe I são considerados os dispositivos de mais baixo risco. Eles estão sujeitos a controles gerais. Controles gerais são normas publicadas em relação à rotulagem, à fabricação, à vigilância pré-mercado e à elaboração de relatórios. Os dispositivos são colocados nessa classe quando os controles gerais por si só são suficientes para garantir segurança e eficácia. Exemplos de dispositivos de classe I são instrumentos cirúrgicos portáveis. Um total de 47% dos dispositivos médicos se enquadra nessa categoria e 95% dos dispositivos classe I estão isentos de notificação pré-mercado (PMN) e das vias 510(k) de aprovação do FDA.19 Os dispositivos da classe II são dispositivos de maior risco. Controles gerais por si só não são suficientes para fornecer uma garantia de segurança e eficácia. Não há, no entanto, informações suficientes disponíveis para garantir a segurança e eficácia com controles especiais, incluindo os padrões de desempenho, controles de projeto e de vigilância pós-mercado. A maioria dos dispositivos médicos é considerada dispositivos de classe II. Exemplos de dispositivos de classe II incluem cadeiras de rodas, campos cirúrgicos, agulhas cirúrgicas e material de sutura, e alguns kits de teste de gravidez. Um total de 43% de dispositivos médicos se enquadra nesta categoria. A aprovação da maior parte dos dispositivos de classe II exige a notificação pré-mercado 510(k). Há cerca de 60 dispositivos genéricos de classe II que estão isentos de notificação pré-mercado, enquanto satisfazem as exigências de controles gerais e controles especiais. Os dispositivos de classe I e II, que exigem mais que controles Gerais e Especiais, requerem revisão de prémercado pelo FDA com PMN ou 510(k). Sob 510(k), um fabricante deve demonstrar que um dispositivo médico está substancialmente equivalente na utilização prevista, tecnologia, segurança e eficácia para: (1) um dispositivo de classe I ou II com aprovação 510(k) existente ou (2) um dispositivo comercializado antes das Alterações de Dispositivos de Medicina de 1976, dando-lhe o status de grandfather marketing (o que há de melhor entre os dispositivos disponíveis). Pode-se pesquisar o banco de dados FDA 510(k) para os dispositivos já existentes no mercado ou com status de grandfather marketing.20 Uma vez que o PMN é submetido, o FDA tem 90 dias para responder. Se a FDA concorda que o aparelho é “substancialmente equivalente”, o fabricante pode comercializar o dispositivo. A FDA, por outro lado, pode exigir mais dados ou determinar que o dispositivo não é substancialmente equivalente e reclassificar o dispositivo como um dispositivo de classe III. Os dispositivos da Classe III representam o maior risco potencial. Estes dispositivos normalmente sustentam ou dão suporte de vida, são implantados, ou apresentam risco significativo de doença ou lesão. Além disso, eles têm uma nova utilização ou tecnologia que não é equivalente a um dispositivo anterior. Dado o potencial para a segurança preocupações dos dispositivos de classe III, controles Gerais e Especiais por si só fornecerão uma

garantia suficiente de segurança e eficácia. Exemplos incluem marca-passos implantáveis e os implantes mamários. Um total de 10% dos dispositivos médicos se enquadra nesta categoria e estes dispositivos geralmente necessitam de aprovação pré- mercado (PMA) da FDA antes de poderem ser comercializados legalmente. A aplicação PMA é muito mais complexa do que a 510(k). A aprovação pré- mercado exige dados extensos com estudos pré-clínicos, ensaios clínicos em humanos e uma descrição completa do dispositivo, incluindo os detalhes de fabricação e rotulagem. Uma vez que o PMA é submetido, o FDA tem 180 dias para executar uma revisão detalhada. O FDA pode conceder a PMA, exigir mais dados, negar a reclamação ou aceitar a exigência de vigilância pós-comercialização. Qualquer alteração substancial a um dispositivo PMN ou PMA requer nova liberação. Os testes clínicos de um dispositivo não aprovado que representa risco significativo ou dispositivos aprovados usados para um propósito distinto da sua indicação aprovada, requer aprovação da FDA na forma de Isenção de um Dispositivo de Investigação (IDE). A aplicação da IDE inclui informações do dispositivo e do protocolo de estudo proposto.21 Ambos os IRBs e a FDA podem fazer a determinação de exigência ou não de IDE para um dispositivo. Se um IRB determina que o risco do dispositivo não é significativo, a notificação da FDA não é necessária e o IRB supervisionará os ensaios. Se o pedido de determinação é inicialmente submetido à FDA, o resultado é vinculativo.21 As aplicações e aprovação levando a primeira utilização clínica são importantes, porque o primeiro uso clínico é um marco importante para a empresa de dispositivo novo. Em muitos casos, se uma empresa falha em atingir este marco dentro de um período razoável de tempo, o seu financiamento e a viabilidade serão ameaçados. A aprovação da FDA para iniciar os estudos clínicos nos Estados Unidos é estimada em 3-6 meses com revisão por CRI com um adicional de 3-6 meses. Devido a esse período de atraso, muitas empresas optam por realizar seus testes clínicos iniciais fora dos Estados Unidos. Quando testes clínicos iniciais são realizados dentro dos Estados Unidos, apenas cerca de um quarto dos ensaios são realizados em instituições acadêmicas, em grande parte atribuídos à burocracia associada aos IRBs e negociações de contratos em grandes instituições acadêmicas.22

Conflito de interesse Há um evidente conflito de interesses quando um cirurgião torna-se também um inovador de dispositivos cirúrgicos. O cirurgião inovador serve para beneficiar os frutos vindos tanto da melhoria dos cuidados ao paciente e ganhos financeiros como de possível inventor e desenvolvedor de uma determinada inovação. No entanto, para ajudar a trazer uma invenção para a cabeceira, o inventor clínico muitas vezes torna-se integralmente envolvido na concepção e desenvolvimento da inovação, realizando a maioria dos estudos precoces com animais, e eventualmente, assumindo um papel de liderança e segurando uma posição no capital da empresa a desenvolver o dispositivo. Esses conflitos de interesses devem ser atendidos para garantir segurança ao paciente. Não há um processo de regulamentação abrangente para resolver todos os conflitos de interesse presentes no processo de inovação cirúrgica. No entanto, existem alguns processos que ajudam a garantir cheques de terceiros e saldos em testes com humanos. Os estudos exigidos para aprovação PMA são tipicamente grandes estudos multicêntricos randomizados. O patrocinador do estudo normalmente deve utilizar uma organização de pesquisa de contrato (CRO), os laboratórios centrais, o conselho de monitoramento de segurança de dados (CMDS), e uma comissão executiva, para ajudar a resolver potenciais conflitos de interesse. O CRO ajuda a recrutar, qualificar e auditar locais. Laboratórios centrais avaliam dados primários de forma cega. O DSMB é composto por um grupo de investigadores clínicos e estatísticos seniores com nenhum outro envolvimento no estudo. Eles analisam os dados em intervalos específicos com mandato para parar ou modificar o estudo caso torne-se evidente algum mal aos participantes do estudo, incluindo um benefício óbvio a um lado do estudo. Em última análise, cabe ao cirurgião inovador avançar a tecnologia se sente poder beneficiar seus pacientes. Para isso, ele/ela deve tentar afastar-se, tanto quanto possível, de atividades em que o ganho financeiro supere a vontade da análise como objetivo. Para ajudar a identificar e evitar conflitos de interesse, o cirurgião inovador também deve fornecer a colegas e pacientes a divulgação completa das relações de indústria.

Inovações em cirurgia plástica A inovação em cirurgia plástica continua a avançar o nosso campo. Há uma grande lista de inovações recentes que abrange todos os campos dentro da cirurgia plástica. O impacto das várias novas tecnologias é tão diverso

como as tecnologias em si. Terapia de feridas por pressão negativa (TFPN) continua a emergir como inovação revolucionária que introduziu uma nova abordagem para o tratamento de feridas. Matriz dérmica acelular (MDA) está sendo usada em mais e mais aplicações em cirurgia plástica e pode tornar-se uma tecnologia disruptiva que substitui prévios substitutos sintéticos ou tecidos vivos. Finalmente, a lipoaspiração era uma tecnologia que serviu de plataforma para novas tecnologias refinadas, incluindo lipoescultura não invasiva. Essa pequena amostra de inovações recentes é discutida a seguir e tocamos brevemente no espectro do seu impacto no atendimento ao paciente, no mercado e mais inovação.

Terapia de feridas por pressão negativa No final de 1980, os Drs. Louis Argenta, mestre e Michael Morykwas, doutor, ambos professores de cirurgia plástica na Universidade de Wake Forest, desenvolveram uma abordagem inovadora para o tratamento de feridas agudas e crônicas através da utilização de pressão subatmosférica conhecida hoje como terapia de ferida pressão negativa (TFPN). Em 1993, uma parceria entre a KCI e Wake Forest permitiu que a KCI comercializar o que se tornou o sistema KCI de terapia VAC patenteado. Dois anos mais tarde, o sistema foi aprovado pela FDA e lançado. Depois, em 2000, recebeu a aprovação da KCI para Medicare Part B e reembolso de Terapia VAC, tornando-o disponível para pacientes idosos com cuidados domiciliares e deficientes nos Estados Unidos. Essa tecnologia revolucionária mudou a maneira como muitas feridas agudas e crônicas são tratadas. Hoje a KCI VAC já atendeu mais de 3 milhões de pacientes em todo o mundo, em 21 mil hospitais e instalações de enfermagem qualificadas e 11 mil agências de saúde em casa, e agora mais de 1 milhão de americanos têm acesso ao dispositivo de VAC em casa. TFPN, também conhecida como fechamento de ferida vácuo-assistida, é o sistema de curativo para feridas que aplica pressão subatmosférica intermitente contínua na superfície de uma ferida (Fig. 35.3). Obras TFPN através de uma combinação de mecanismos. O sistema fechado reduz o edema da ferida por meio da geração de uma pressão gradiente entre a ferida e uma caixinha de sucção que promove o transporte de fluidos do leito da ferida e espaço intersticial. Ao remover esse fluido transudativo e exsudativo, TFPN melhora a oxigenação das células. TFPN Também diminui mediadores da resposta inflamatória. Nos seres humanos, demonstrou diminuir a metaloproteinase da matriz. MMPs inibem a angiogênese por meio da geração inibidores tais como angiostatina e endostatina.23 TFPN também se pensa que atue via mecanotransdução, a conversão de estímulo mecânico em atividade química. In vitro, a deformação mecânica aumenta o crescimento de fibroblastos humanos e a migração em modelos de fechamento de ferida em animais, a deformação mecânica correlacionase com o aumento da organização do colágeno e da expressão do fator de crescimento endotelial vascular e fator de crescimento de fibroblastos.24,25 Essas modificações de microambiente do ferimento o torna mais propício para a cura.

FIG. 35.3 Terapia de ferida por pressão negativa.

TFPN é utilizado para o tratamento de um espectro de feridas incluindo feridas agudas, feridas diabéticas, feridas de abdome aberto e do esterno, úlceras de pressão, e em conjunto com enxertos e retalhos. No entanto, evidências de alta qualidade apoiam a sua utilização em relação às técnicas convencionais, mais claramente no contexto das feridas de pés diabéticos. Quando comparado com as trocas secas e úmidas de curativos em úlceras do pé diabético, TFPN reduz o tempo de fechamento da ferida, o tempo de internação, as complicações e os custos. 26-34 Há níveis mais baixos de evidência para mostrar que TFPN tem eficácia superior na cura de feridas, quando comparada com tradicionais curativos úmidos salinos no contexto de feridas agudas, enxertos de pele e fixação de enxertos, úlceras de decúbito e feridas abertas de abdômen e esterno. Nessas configurações, a TFPN atende as necessidades adicionais do usuário cirurgião e ilustra a importância da inovação na adaptação baseada em necessidade. Em um estudo randomizado prospectivo, 54 pacientes com feridas agudas e crônicas, a TFPN foi associada com as feridas de aparência mais saudável e significativamente com a redução mais rápida da superfície da área ferida, porém nenhuma diferença significativa foi encontrada no tempo necessário para chegar a uma intervenção cirúrgica para a cura por intenção terciária. 35 Na configuração traumática, existem estudos observacionais que mostram sua eficiência, que é comparável, mas não superior, a mudanças normais de curativos.36 No entanto, as vantagens citadas na população com trauma, são: facilidade de aplicação, diminuição do número de trocas de curativos, e redução da complexidade da cirurgia reconstrutiva subsequente.37,38 No tratamento de úlceras de pressão, não houve diferença estatisticamente significante na área de superfície da ferida, mas as vantagens citadas foram a melhora do conforto do paciente e a menor intensidade de trabalho.39,40 Na configuração de fixação de enxerto de pele, estudos observacionais e randomizados de TFPN e ensaios têm melhorado a pele de enxerto quando comparada com curativos de reforço, com o benefício adicional de facilidade da aplicação e remoção.41-43 Evidências de alto nível mostrando a superioridade da TFPN comparada aos tradicionais curativos úmidos salinos ainda faltam. Porém, é claro que a TFPN atende às necessidades muito específicas do cirurgião usuário. A TFPN é fácil de usar, diminui o número de trocas de curativos tanto para o doente e o prestador de cuidados médicos e, em última análise, prepara a ferida para o fechamento cirúrgico por intenção terciário. Ao compreender e atender às necessidades da comunidade cirúrgica, o cirurgião plástico e o engenheiro que desenvolveram a TFPN mudaram o arsenal de abordagem do cirurgião geral abdome aberto, a abordagem dos cirurgiões cardiotorácicos para mediastinite pós-esternotomia, a abordagem dos os cirurgiões vasculares às feridas de virilha e, em última instância, a abordagem do cirurgião plástico a todas essas feridas, bem como do enxerto e a reconstrução com retalho. TFPN é um exemplo de rápida adaptação de uma tecnologia desenvolvida com a ajuda de um cirurgião em última análise, abordando várias necessidades clínicas.

Matriz dérmica acelular

Nos últimos anos, a matriz dérmica acelular (MDA) emergiu como uma tecnologia disruptiva, em ambas as cirurgias reconstrutiva e estética. A MDA é um enxerto dérmico em que a derme é separada da epiderme e de todos os elementos celulares para evitar a rejeição de tecidos e falência do enxerto (Fig. 35.4). Essas próteses biológicas são colhidas a partir de cadáveres humanos, doadores suínos ou bovinos. A matriz dérmica atua, em seguida, como uma estrutura de suporte que permite a regeneração de tecidos com revascularização e repovoamento com fibroblastos. Pensa-se que a MDA incorpora o tecido circundante que, eventualmente, é substituído por colágeno receptor.44,45

FIG. 35.4 Matriz dérmica acelular.

A sua utilização tem sido descrita na literatura de queimadura há mais de 20 anos, inicialmente como um substituto, e agora como um complemento ao enxerto de pele. Além do uso de MDA como um enxerto de pele, a MDA fornece um tecido substituto que é flexível, fácil de moldar e de suturar, e pode ser utilizada no contexto da infecção. Essas propriedades a tornam uma ferramenta desejável em cirurgia plástica. Uma antiga MDA, AlloDerm®, foi colocada no mercado em 1994 e foi usada em mais de 1 milhão de casos. Recentemente, cirurgiões plásticos inovadores popularizaram o uso de MDA na base de implante de reconstrução da mama. MDA é usada para fornecer uma cobertura adicional de base a implantes de reconstrução, o apoio para a expansão do polo inferior mais rápido, bem como, com a assistência na colocação precisa de sulco inframamário.46,47 No geral, os estudos ainda conflitam em seu perfil de risco para complicações pósoperatórias. A análise retrospectiva de 415 reconstruções de mamas à base de implante imediato mostrou que a MDA está associada com altas taxas de seromas pós-operatórios e infecções.48 No entanto, como matriz dérmica acelular aumenta as opções cirúrgicas de reconstrução à base de implante, cirurgiões plásticos rapidamente se

adaptaram a esta tecnologia. Da mesma forma, a MDA substitui em grande parte o uso de malhas sintéticas em defeitos da parede abdominal contaminados. Pensa-se que estas biopróteses incorporaram o tecido contaminado sem se infectarem.49 Essa é uma importante vantagem competitiva quando comparada a malha sintética, o que é contraindicada nesse cenário. Ainda resta uma questão da longevidade da integridade mecânica que a MDA fornece à reconstrução da parede abdominal. No entanto, devido à MDA necessitar de um grande substituto facial que pode ser utilizado no contexto de uma ferida contaminada, muitos cirurgiões plásticos rapidamente se adaptaram a essa nova tecnologia, apesar das questões não respondidas. Curiosamente, abraçando a parede abdominal da base de reconstrução na MDA, cirurgiões plásticos estão expandindo seu papel entre os cirurgiões gerais nesta arena. Como outras tecnologias disruptivas, essa emergente tecnologia necessita de longo prazo de seguimento, familiaridade e um perfil de segurança completo. No entanto, é um substituto do tecido mole que não precisa ser colhido, pois preenche um princípio preciso do cirurgião de reconstrução. Essa tecnologia pode, assim, continuar a expandir as suas indicações, substituindo outras tecnologias sintéticas, e substituir mais opções invasivas de reconstrução atuais.

Contorno corporal não invasivo O impulso para tratamentos médicos não invasivos é uma importante força motriz do mercado pacienteconsumidor para intervenção médica. No seu início, há mais de três décadas atrás, a própria lipoaspiração foi um grande passo para uma forma menos invasiva do contorno corporal em comparação com as abordagens cirúrgicas tradicionais. A introdução da lipoaspiração, como outras tecnologias habilitadoras, serviu de plataforma para a inserção contínua de inovações refinadas. Os Fischers introduziram pela primeira vez técnicas de sucção precisas para remoção de gordura em 1974.50 Illouz, em seguida, refinou a técnica com a introdução de alta sucção de pressão de energia negativa ligada à cânulas sem ponta bem como o desenvolvimento da “técnica molhada” utilizada para hidrodissecção a fim de ajudar com a remoção de gordura.51 Em 1980, o Dr. Jeffrey Klein introduziu a técnica tumescente que teve um impacto importante sobre a segurança e eficácia da lipoaspiração. Os grandes volumes de lidocaína diluída e epinefrina diminuíram a necessidade de anestesia geral e minimizaram a perda de sangue.52 Para tratar das questões de fadiga cirúrgica com maior eficácia, especialmente em áreas mais fibrosas, várias inovações refinadas foram introduzidas, nenhuma das quais fizeram uma mudança significativa nesse campo.53 A lipoaspiração assistida por ultrassom foi desenvolvida por Zocchi na década de 1980. Ondas ultrassônicas foram introduzidas para romper adipócitos criando microcavitações de gordura liquidificada. Existem controvérsias quanto à possibilidade de a UAL reduzir complicações ou melhorar a eficácia quando comparada com técnicas tradicionais.54,55 Da mesma forma, a lipólise de cavitação assistida por laser foi um refinamento da lipoaspiração tradicional, que não mostrou diferença significativa no resultado clínico.53 Contorno corporal ultrassônico focado é uma inovação recente que introduz uma potencial nova fronteira no contorno do corpo que pode ou não se provar eficaz. Essa tecnologia utiliza a energia do ultrassom focalizada entregue através de uma sonda portátil (Fig. 35.5). As ondas de ultrassom são focadas na gordura subcutânea, causando a interrupção permanente das células de gordura com o objetivo de não danificar a epiderme, derme ou tecidos e órgãos subjacentes. Os adipócitos interrompidos então devem ser metabolizados pelo fígado. O procedimento é uma mudança de refinamentos anteriores, uma vez que não requer incisões ou injeções. Essa tecnologia não é aprovada pela FDA para uso nos Estados Unidos. Pequenos ensaios clínicos preliminares e a utilização fora dos Estados Unidos demonstraram que o tratamento é seguro e eficaz em pequenas áreas.56-58 Desde a sua criação na década de 1970, a lipoaspiração tem provado ser uma tecnologia que continua a servir como uma plataforma para várias tecnologias de refinamento. Ultrassom focalizado transdérmico não invasivo, como o LipoSonix® e o Ultrashapr contour I ®, pode vir a ser outro refinamento na tecnologia de lipoaspiração ou nova fronteira neste campo.

FIG. 35.5 Contorno corporal não invasivo.

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com.

  1. Riskin, D. J., Longaker, M. T., Gertner, M., et al. Innovation in surgery: a historical perspective. Ann Surg.. 2006; 244(5):686–693. 2. Gurtner, G. C., Rohrich, R. J., Longaker, M. T. From bedside to bench and back again: technology innovation in plastic surgery. Plast Reconstr Surg. 2009; 124(4):1355–1356. Em 2005 o Dr. Longaker e o Dr. Rorich destacaram a inovação como a vantagem competitiva do cirurgião plástico. Em seguida, ampliou esse conceito, discutindo a adaptação das novas tecnologias como um importante determinante do avanço de diversas áreas dentro da cirurgia.

3. Longaker, M. T., Rohrich, R. J. Innovation: a sustainable competitive advantage for plastic and reconstructive surgery. Plast Reconstr Surg. 2005; 115(7):2135–2136. 5. Zenios, S., Makower, J., Yock, P., et al. Biodesign: The Process of Innovating Medical Technologies. Cambridge, New York: Cambridge Univesity Press; 2010. Estes autores projetaram seu livro como um modelo para ensinar inovação e empreendedorismo. Eles detalham o processo de Biodesign usado pelo Grupo Biodesign interdisciplinar da Universidade de Stanford. Essa abordagem de três fases envolve a identificação de uma necessidade médica, inventando um dispositivo ou serviço, e a implementação de seu uso.

6. Cosgrove, D. M. Developing new technology. J Thorac Cardiovasc Surg.. 2001; 121(suppl 4):S29–S31. 13. United States Patent and Trademark Office Official Site. Available from: www.uspto.gov/patft/index.html. Recursos publicamente disponíveis para busca de patentes, gratuitos, incluem o site oficial do United States Patent and Trademark Office. Online. Disponível em: www.uspto.gov/patft/index.html. Recursos adicionais inclusos, mas não estão limitados, os bancos de dados pesquisados de todas as patentes norte-americanas publicados. Online. Disponível em: www.freepatentsonline.com e www.google.com/patents.

20. U.S. Food and Drug Administration database of devices with existing 510(k) approval. Online. Available at: www.accessdata.fda.gov/scripts/cdrh/cfdocs/cfPMN/pmn.cfm. A Food and Drug Administration tem um site informativo e publicamente disponível em: www.fda.gov/MedicalDevices/default.htm. O banco de dados 510(k) da FDA está disponível em: www.accessdata.fda.gov/scripts/cdrh/cfdocs/cfPMN/pmn.cfm.

22. Kaplan, A. V., Baim, D. S., Smith, J. J., et al. Medical device development: from prototype to regulatory

approval. Circulation. 2004; 109(25):3068–3072. Opinião do especialista Thomas Fogarty é fornecida nesta revisão de desenvolvimento de dispositivos médicos. A complexidade da aprovação de dispositivos nos Estados Unidos é discutida e identificada como um atraso na introdução de novos dispositivos para a prática clínica em contraste com o processo na Europa.

46. Spear, S. L., Parikh, P. M., Reisin, E., et al. Acellular dermis-assisted breast reconstruction. Aesthetic Plast Surg. 2008; 32(3):418–425. 50. Fischer, A., Fischer, G. First surgical treatment for molding body’s cellulite with three 5-mm incisions. Bull Int Acad Cosmet Surg. 1976; 3:35.

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Robótica, simulação e telemedicina na cirurgia plástica Joseph M. Rosen, Todd E. Burdette, Erin Donaldson, Robyn Mosher, Lindsay B. Katona e Sarah A. Long

Resumo Este capítulo descreve as mais recentes inovações nas tecnologias não biológicas – robótica, simulação e telemedicina – e sua integração com o campo da cirurgia plástica. A robótica oferece aos cirurgiões plásticos próteses personalizadas e membros robóticos, que ajudam os pacientes a obter um melhor resultado estético e funcional; ela também fornece ferramentas cirúrgicas que reduzem o erro humano e aumentam a visibilidade, a precisão e a segurança na cirurgia. A simulação é usada para treinar residentes e pós-graduandos em todos os processos de uma cirurgia, bem como para treinar cirurgiões mais experientes em novos procedimentos. Assim como a robótica, a simulação fornece aumento da segurança e redução dos erros médicos, visto que aprendizes “cometerão equívocos” no simulador, ao invés de cometê-los em pacientes efetivamente. A telemedicina pode fazer uso tanto da robótica como da simulação, para oferecer assistência médica a uma população distante, seja no dia a dia, em tempos de guerra ou após um desastre. Este capítulo possibilitará aos cirurgiões plásticos um entendimento básico de como aplicar as tecnologias atuais para aprimorar seus conhecimentos profissionais, com soluções para problemas clínicos e cirúrgicos.

Acesse a seção Perspectiva Histórica e a Fig. 36.1 em inglês no site http://www.expertconsult.com

Introdução A tecnologia médica visa ajudar os profissionais a diagnosticar, tratar e transcender as limitações tradicionais do corpo humano por meio de ferramentas, como marca-passos, respiradores, quadris artificiais, imagiologia tridimensional (3D) do corpo e até membros superiores robóticos. A cirurgia plástica, uma especialidade que se orgulha de tratar de problemas complexos com soluções inovadoras, tem a oportunidade de conduzir a comunidade médica ao uso criativo e responsável das novas tecnologias. Os cirurgiões podem aprimorar o exercício de suas atividades com as tecnologias biológicas, tais quais transplantes e engenharia de tecidos, assunto abordado nos Capítulos 13, 19, 32, 34 e 35, ou com as tecnologias não biológicas. Este capítulo discute as mais recentes inovações nas tecnologias não biológicas – robótica, simulação e telemedicina – e sua ampla integração com o campo da cirurgia plástica. Os cirurgiões plásticos podem implantar próteses personalizadas fabricadas por robôs, fornecer membros robóticos a pacientes amputados e usar robôs cirúrgicos, que reduzem o índice de erro humano e aumentam a visibilidade, a precisão e a segurança na cirurgia. A simulação é usada para treinar residentes em procedimentos comuns de cirurgias plásticas e também treinar cirurgiões mais experientes em novos procedimentos. Assim como a robótica, a simulação promove a segurança, visto que os aprendizes poderão cometer os erros iniciais em um simulador, antes de operar pacientes. E, finalmente, a telemedicina pode fazer uso tanto da robótica quanto da simulação, a fim de oferecer assistência médica a uma população distante, seja no dia a dia, em tempos de guerra ou após um desastre.

Este capítulo oferece aos cirurgiões plásticos um entendimento básico de como aplicar as tecnologias atuais para aprimorar seu instrumental, com soluções para problemas clínicos e cirúrgicos. As ferramentas tecnológicas pode solucionar necessidades que não são atendidas com os padrões atuais de assistência médica (p. ex., um membro robótico que restaure a função após uma amputação com salvamento quase total do membro). No entanto, é fundamental que tanto os resultados como os custos sejam ponderados sempre que se avalie uma nova tecnologia. Os resultados devem ser demonstráveis, e a relação custo-benefício, viável. (Consulte a seção sobre cirurgia robótica: a evidência básica para melhores resultados, a seguir, e também o Cap. 10.)

Robótica Introdução Definição de um robô 1. Uma máquina que se parece com um ser humano e executa diversas ações complexas (...) de um ser humano. 2. Um dispositivo que executa automaticamente tarefas complicadas e frequentemente repetitivas. 3. Um mecanismo guiado por controles automáticos.16 Desde a segunda metade do século passado, os robôs vêm evoluindo do conceito de ficção científica para a realidade. Hoje, eles realizam operações básicas do dia a dia (aspirar a casa, montar carros) e executam tarefas altamente especializadas (de exploração e reparos espaciais, operações militares com resgates não tripulados de vítimas feridas, administração de medicamentos e cirurgias).

O papel da robótica na cirurgia plástica: planejamento e desempenho Atualmente, os robôs são usados na cirurgia plástica em três situações, todas as quais envolvem o planejamento e o desempenho. Na primeira delas, os robôs industriais podem gerar produtos médicos utilizando a fabricação assistida por computador (Computer-aided Design and Manufaturing – CAD/CAM),17 incluindo próteses personalizadas para contorno e preenchimento de defeitos cranianos. No futuro, os robôs poderão fabricar uma prótese facial completa. Na segunda, membros superiores e mãos artificiais mais avançados18-25, que possuem inteligência e autonomia suficientes para serem considerados robôs por si sós. E, na terceira, os robôs cirúrgicos já são usados em endoscopias e cirurgias guiadas por imagem, como na glossectomia parcial de via transoral, e podem ser adaptados para uso futuro em procedimentos de cirurgia plástica minimamente invasivos.

O uso da robótica na cirurgia plástica: próteses e ferramentas cirúrgicas Robôs cirúrgicos na sala de operação A cirurgia assistida por robô é comumente praticada em diversas especialidades nas salas de operações de grandes hospitais e centros de excelência. O sistema cirúrgico intuitivo da Vinci® da empresa Intuitive Surgical, o primeiro sistema cirúrgico robótico autorizado pela Food and Drug Administration (FDA), agora tem autorização para ser usado em cirurgias cardíacas, gerais, torácicas, urológicas, ginecológicas, pediátricas e otorrinolaringológicas (ORL) transorais (Fig. 36.2).26 A FDA ainda não autorizou o uso do sistema da Vinci para cirurgias plásticas. No entanto, como o sistema já foi autorizado para cirurgias de orelha, nariz e garganta (ORL), acredita-se que ele tenha potencial para ser usado, no futuro, em técnicas de cirurgia plástica. O recurso de filtração de tremor do sistema da Vinci, por exemplo, seria bastante útil em microcirurgias altamente complexas, pois permitiria que os cirurgiões plásticos costurassem vasos ainda menores do que os de atualmente. Cirurgiões plásticos já deram início a estudos preliminares para investigar o uso da cirurgia robótica em duas técnicas. Patel et al. testaram a remoção robótica do músculo reto do abdome, primeiramente em dois cadáveres e, depois, em uma mulher de 30 anos de idade.26a Eles descobriram que a técnica é possível e disseram que ela também pode “fornecer uma abordagem para a reconstrução transperitoneal minimamente invasiva”. Do mesmo modo, Selber testou a remoção robótica do músculo grande dorsal usando 10 cadáveres e concluiu que “a remoção robótica do músculo grande dorsal é factível e reproduzível. Ela oferece vantagens técnicas em comparação à remoção endoscópica e vantagens estéticas em comparação à técnica aberta.”26b

FIG. 36.2 Sistema cirúrgico robótico de alta definição da Vinci Si mostrando dois consoles do cirurgião, o carro do paciente e o carro de visão. (Cortesia da Intuitive Surgical ©2012 Intuitive Surgical, Inc.)

Recursos de design e uso da cirurgia robótica Na cirurgia robótica, o cirurgião não manipula diretamente os instrumentos endoscópicos, mas, em vez disso, controla remotamente um robô que os manipula. No sistema da Vinci, o cirurgião segura um dispositivo que imita os movimentos de sua mão – como uma versão altamente precisa do videogame Wii™. O sistema da Vinci proporciona aos cirurgiões: (1) variedade de movimentos e bom controle de tecidos dispostos na cirurgia aberta; (2) diversas vantagens da cirurgia endoscópica, dentre elas, pequenas incisões e menor perda de sangue; e (3) melhorias, tais como a filtração de tremor e a ampliação em 3D da visão do campo de operação por meio de um par de olhos estereoscópicos robotizados. Dentre todos os robôs cirúrgicos, o sistema da Vinci é o líder no mercado, com mais de 2 mil sistemas instalados no mundo todo.26 Outro sistema cirúrgico robótico, o ViKY™, é fabricado pela EndoControl Medical, na França.27 O ViKY, em comparação ao da Vinci, é “mais simples, menor e especializado”, de acordo com o diretor executivo da fabricante, e custa menos de US$ 200.000 por quatro componentes, incluindo um compacto suporte de endoscópio robótico e um manipulador de útero.28 Um cirurgião realizou uma histerectomia com uma única mão usando dois componentes do ViKY para controlar uma câmera e segurar o útero, substituindo efetivamente a função de dois assistentes cirúrgicos.28 Na cirurgia plástica, uma aplicação semelhante poderia ser feita na reconstrução mamária com retalho miocutâneo transverso do músculo reto do abdome, na qual se requer a presença de um assistente. Recentemente, um cirurgião usou ambos os sistemas, da Vinci e ViKY, em uma histerectomia laparoscópica total e uma salpingooforectomia bilateral, para as quais foram necessárias somente quatro incisões.29 Vantagens e desvantagens da cirurgia robótica em comparação à cirurgia endoscópica A cirurgia robótica oferece diversos benefícios, dentre os quais a visualização em 3D com alta capacidade de ampliação, filtragem de tremores involuntários das mãos, gravação digitalizada, melhor ergonomia cirúrgica e (no caso do sistema da Vinci) instrumentos articulatórios em miniatura com sete graus de liberdade. (De acordo com a literatura referente ao sistema da Vinci, há três graus de liberdade externos – desvio externo, inclinação externa e inserção externa [mover o instrumento para cima ou para baixo ao longo do eixo vertical] – e quatro graus de liberdade internos – desvio interno, inclinação interna, rolagem e pinçamento). Em contraposição, a cirurgia endoscópica limita-se a um alcance reduzido de movimentos e visualização bidimensional afetada pelo efeito fulcro. Os recursos robóticos possibilitam maior precisão e destreza; menores incisões; facilidade na dissecação do tecido, na sutura e na ressecção do tumor; amenização do trauma e da perda de sangue; e, portanto, maior segurança e qualidade. A lâmina de um robô pode ser programada para cortar somente até certa profundidade no tecido e evitar falhas cirúrgicas. Dessa forma, os robôs reduzem o erro humano e promovem uma cirurgia “mais lenta, porém mais segura”. Veja a primeira lei da robótica de Isaac Asimov: “um robô não pode ferir um ser humano.”30,31 As desvantagens dos robôs cirúrgicos incluem o alto preço e os altos custos de manutenção, resultados incertos e litígio, e adequação dos sistemas para cirurgiões, o que inclui a curva de aprendizado e a falta de resposta em relação ao tato ou à força (isto é, o cirurgião não consegue sentir se está penetrando muito fundo no tecido ou se o ponto está muito apertado).32-34 Além disso, os robôs cirúrgicos são projetados para trabalhar em pequenas regiões individuais, e os recursos instrumentais disponíveis atualmente para a cirurgia plástica

são grandes demais. Como em qualquer nova tecnologia, a relação risco–benefício deve melhorar com o tempo, com a experiência e com os novos modelos. Uso futuro de robôs cirúrgicos na cirurgia plástica Os robôs cirúrgicos não são usados com frequência na cirurgia plástica, e um dos principais motivos é o custo. A maioria das cirurgias plásticas é realizada em clínicas particulares, que raramente têm condições financeiras de adquirir um robô cirúrgico que custa de US$ 1,0-2,3 milhões. No entanto, com o aumento do uso desses robôs, o custo deles poderá diminuir; os fornecedores poderão desenvolver instrumentos robóticos dentro de todas as faixas de preço, e os sistemas existentes poderão ser personalizados e aprovados para os procedimentos de cirurgia plástica. O fato de que os robôs economizam em termos de trabalho humano pode ser controverso (como no caso de quando os robôs substituíram operários em linhas de produção), mas, essencialmente, essas economias podem compensar e justificar o investimento nesses sistemas. Os robôs cirúrgicos ficam disponíveis 24 horas por dia, 7 dias por semana e, embora precisem de manutenção periódica, não precisam dormir, comer ou tirar férias. E eles aprimoram as habilidades humanas: um cirurgião usando o sistema da Vinci opera como se estivesse trabalhando com quatro braços simultaneamente.35

A robótica em cirurgias de membros e mãos De forma geral, o objetivo da cirurgia plástica reparadora é maximizar tanto a função como a estética. Embora retalhos e enxertos autólogos sejam o método mais comum para esse procedimento, o uso de partes robóticas pode, às vezes, resultar em uma aparência e função melhores e ainda minimizar a convalescença e o trauma psicossocial. Para a recuperação de um membro, podem ser necessárias diversas operações dispendiosas, após as quais o paciente poderá ficar com um mínimo funcionamento do membro, diversas morbidades da área doadora, bem como perder meses de trabalho.36 Portanto, os cirurgiões podem considerar o uso de partes robóticas unido às opções reparadoras desde o início de uma avaliação clínica, para garantir melhor resultado.

A robótica como um degrau na escada reconstrutiva: exemplo de membro superior Os cirurgiões plásticos usam o conceito de “escada reconstrutiva” para descrever as cirurgias conforme o aumento da complexidade (Fig. 36.3). Por exemplo, após uma amputação, a reconstrução do tecido autógeno avança da cura secundária e do fechamento primário para o enxerto na pele, cobertura com retalho local, cobertura com retalho distante e transferência do tecido livre. A prótese robótica pode ser incluída em qualquer ponto da escada reconstrutiva. No coto do membro, pode ser necessário realizar um fechamento simples ou enxerto na pele, para uma cobertura de tecido mole, antes de adaptar a prótese ao paciente. Ou ainda, o cirurgião pode realizar uma transferência de tecido livre com osso vascularizado para alongamento do membro, otimizando, assim, a função final da prótese robótica.

FIG. 36.3 Escada reconstrutiva, século XXI. As novas tecnologias na robótica, nos transplantes e na regeneração aprimoram a escada no século XXI. A simulação cria uma ponte entre as técnicas e treinamentos em cirurgia plástica do século XX para o século XXI. (Cortesia de Joseph Rosen, M.D.)

Opções protéticas atuais de extremidade superior Há sete categorias de próteses de membro superior (MS) que variam conforme a complexidade e a função (Figs. 36.4 e 36.5):

FIG. 36.4 Há sete categorias de próteses que variam conforme a complexidade e a função. (1) As próteses de MS passivas atendem a uma função estética. Os seis tipos de próteses de MS ativas são: (2) prótese de MS acionada pelo corpo. (3-5) MMSS acionados externamente, incluindo: (3) MMSS robóticos atuais com controle mioelétrico; (4) MMSS robóticos atuais com reinervação muscular dirigida; (5) MMSS robóticos futuros com controle neurológico; (6) próteses de MMSS híbridas, que normalmente combinam componentes robóticos e acionados pelo corpo; e (7) próteses de MS de atividade específica. Para ver fotos das próteses classificadas aqui, consulte a Fig. 36.5. (Cortesia do médico Joseph Rosen, M.D. e Erin Donaldson, M.S.)

FIG. 36.5 As imagens mostram exemplos dos seis principais tipos de prótese de MS. (A) Prótese de MS passiva/estética. Nesta imagem, a prótese de MS está à direita do leitor (à esquerda do paciente). (Touch Bionics, livingskin.) (B) Prótese de MS acionada pelo corpo com fixação corporal à esquerda e gancho de trabalho/cultivo à direita. (C) Close-up do gancho de trabalho/cultivo. (Reproduzido de Burdette TB, Long AS, Ho O, et al. Early delayed amputation: A paradigm shift in the limb salvage time line for patients with major upper-limb injury. J Rehabil Res Dev 2009; 46:38 – 94.) (D) Prótese de MS ativa mioelétrica externamente acionada, usada em uma paciente que passou pelo processo de reinervação muscular dirigida. (Cortesia do Chicago Rehabilitation Institute.) (E-G) O MS robótico do futuro: uma prótese de MS neurológica, ativa e acionada externamente. Os MMSS robóticos neurologicamente controlados (ou “controlados pela mente”) estão atualmente em desenvolvimento e na fase III de testes em humanos pela FDA. Neste modelo, o usuário pensa para iniciar o movimento da mesma forma que acontece com um MS biológico, os sinais neurológicos são coletados nos implantes colocados no cérebro do paciente e convertidos em movimentos controlados do cotovelo, do punho ou da mão. As fotos mostradas aqui são de protótipos da prótese de membro modular (MPL, do inglês modular prosthetic limb), que proporciona aos usuários 22 graus de movimento e controle independente de todos os cinco dedos, além de ter o mesmo peso de um MS humano real (cerca de 4 kg). Ela pode até mesmo conceder aos pacientes tetraplégicos a recuperação do uso dos membros, possivelmente contornando a lesão na medula espinhal. (E) Primeiro protótipo da MPL. (F, G) Protótipos da MPL atuais que estão sendo testados em humanos. (Cortesia da DARPA/JHUAPL/HDT Engineered Technologies (Defense Advanced Research Projects Agency, Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory e HDT Engineered Technologies.) (H, I) Prótese de MS híbrida ativa. A prótese de MS híbrida é leve e barata e normalmente combina um

braço e cotovelo acionados pelo corpo com componentes robóticos distais para o punho e para a mão, permitindo que o paciente articule e segure objetos com precisão. O MS mostrado aqui, um DynamicArm ® da Otto Bock, possui um esquema de controle híbrido no qual o cotovelo é controlado por um servomecanismo com movimento do corpo por trás dos ombros, e a mão é controlada por sinais mioelétricos do bíceps e tríceps. Nesse paciente, a fixação foi feita em dois locais. (H) Um antebraço/mão feitos de uma prótese de silicone estética que se encaixa no braço híbrido e é ativa – a mão se abre e fecha conforme o comando. (I) Um acessório de mão que fica exposto para o uso no trabalho e também é ativo. (J-L) Prótese de MS ativa de atividade específica. O MS não robótico de “atividade específica” permite que o usuário participe ativamente de esportes como surfe, escalada, golfe, natação, ciclismo e muitos outros, e também possa tocar instrumentos musicais. (J) Foto de Aron Ralston tirada da capa do livro Between a Rock and a Hard Place, publicado pela Atria Books (tradução brasileira: 127 Horas). (Cortesia da Atria Books.) Próteses de mãos/braços usadas para (K) jogar golfe e (L) tocar guitarra. (Cortesia da TRS, Inc.)

1. A prótese de MS passiva, que serve a uma função estética e pode oferecer uma função passiva, como estabilizar, puxar, apertar e balançar (Fig. 36.5 A). 2. A prótese de MS acionada pelo corpo, que possui um sistema de cabo e polia, ativado pelos movimentos musculares do paciente para possibilitar o ato de segurar e de soltar (Fig. 36.5 B e C). Dispositivos acionados pelo corpo também podem proporcionar o controle do cotovelo. A prótese de MS (robótica) acionada externamente pode ser de três tipos: 3. O MS robótico/totalmente mioelétrico, cujo usuário contrai os músculos do membro residual, gerando sinais eletromiográficos de superfície, os quais, por sua vez, são convertidos em movimentos controlados do cotovelo, do pulso ou da mão. 4. O MS robótico baseado em uma técnica cirúrgica chamada reinervação muscular dirigida (TMR, do inglês targeted muscle reinnervation), que é atualmente a tentativa mais moderna de controle de prótese. Os cirurgiões (plásticos, gerais ou neurologistas) transplantam os nervos residuais do membro amputado para regiões musculares alternativas, os quais, por sua vez, produzem sinais eletromiográficos na superfície da pele, que podem ser processados por computador para controlar o membro protético (Fig. 36.5 D).19 5. O MS robótico neurologicamente controlado, ao uso do qual, com a mente, o paciente inicia o movimento da mesma forma que acontece com o MS biológico. Os sinais neurológicos percorrem desde os implantes localizados no cérebro do paciente até o software de computador externo, que os converte em movimentos controlados do cotovelo, do punho ou da mão (Fig. 36.5 E-G). Este é um projeto futuro de MS robótico que agora está em desenvolvimento. 6. A prótese de MS híbrida, é leve e barata; combinando braço e cotovelo acionados pelo corpo com componentes robóticos distais para o punho e a mão, possibilitando que o paciente articule e segure objetos com precisão (Fig. 36.5 H e I). As novas próteses robóticas podem realizar funções ativas avançadas, como manusear uma vara de pescar, flexionando o MS, enquanto gira o punho e segurando a vara com a mão. No entanto, essas novas tecnologias não substituem a necessidade das outras seis categorias de próteses. 7. O MS não robótico de “atividade específica”, que possibilita que o usuário segure uma palheta de violão, lance uma bola de boliche ou participe de esportes, como surfe, golfe, natação e escalada (Fig. 36.5 J-L). Por exemplo, uma prótese para surfe assemelha-se a uma nadadeira e pode ser completamente submersa na água. Próteses robóticas de mão e próteses neurológicas de membro superior A mão robótica mais avançada disponível atualmente é a i-LIMB ultra, fabricada pela Touch Bionics. Trata-se de uma prótese de mão mioelétrica com cinco dedos acionados individualmente (Fig. 36.6).20 Em virtude de motores independentes, a mão possui seis padrões de aperto, o que é um avanço em comparação ao padrão único disponível nos sistemas anteriores. A mão i-LIMB ultra tem a aparência e a função de uma mão real em diversos aspectos: é leve, firme e atrativa tanto para os pacientes como para os clínicos. Além disso, ela representa um avanço geracional na biônica e no atendimento ao paciente.20 Quando é necessário recorrer a uma mão parcial por conta de uma amputação não total ou pela perda de vários dedos, a Touch Bionics oferece um produto chamado i-LIMB digits, que possui até cinco dedos (mioelétricos) acionados individualmente, proporcionando uma maior habilidade na função de aperto para pacientes com perda parcial da mão (Fig. 36.6 C).20 A Touch Bionics também oferece uma mão estética bastante real com restauração funcional e estética, possibilitando a correspondência precisa do tom de pele, chamada de Livingskin™ (Figs. 36.5A e 36.7). Outra mão biônica disponível no mercado é a prótese bebionic, uma mão mioelétrica completamente articulada, com superfície estável e diversos padrões de aperto que oferecem precisão ao segurar objetos. A luva bebionic é oferecida como uma cobertura estética realista para a mão (Fig. 36.8).21

FIG. 36.6 (A) Ultra mão i-LIMB da Touch Bionics – a mão robótica mais avançada disponível atualmente: uma prótese de mão mioelétrica com cinco dedos totalmente articulados e acionados individualmente. Graças aos motores independentes, esta mão oferece seis padrões de aperto. A função de aperto da mão robótica funciona como uma mão real, com um dedão que pode girar e dedos articulados que podem se fechar firmemente ao redor de objetos. (B) Uma versão um pouco mais antiga da i-LIMB segurando uma xícara. (C) A i-LIMB digits da Touch Bionics possui até quatro dedos (mioelétricos) acionados individualmente, que proporcionam uma maior habilidade na função de aperto para pacientes com perda parcial da mão (que tenham sofrido uma amputação não total da mão) ou para aqueles que tenham perdido vários dedos. (Cortesia da Touch Bionics, www.touchbionics.com.)

FIG. 36.7 Mão estética livingskin da Touch Bionics com restauração funcional da estética. A restauração estética da livingskin oferece “uma prótese de silicone de alta definição criada para simular a pele humana ao copiar as três camadas dérmicas naturais. Para garantir a coloração e o tamanho adequados, cada dispositivo protético é criado para cada indivíduo de forma personalizada”. (Cortesia da Touch Bionics, www.touchbionics.com.)

FIG. 36.8 (A) Mão bebionic mioelétrica totalmente articulada e (B) luva bebionic, uma capa estética modelada para simular a anatomia da mão humana.

A Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA) realizou um projeto de pesquisa colaborativa no valor de US$ 49 milhões e duração de 6 anos, chamado Revolutionizing Prosthetics (Protética Revolucionária), cujo objetivo era criar duas próteses de MMSS, extremamente avançadas, que restaurariam as funções sensoriais e motoras das extremidades superiores amputadas. Além disso, elas deveriam ter a aparência, a

sensação e a função de um membro real. Um dos dispositivos poderia envolver uma tecnologia invasiva, e o outro teria que ser completamente não invasivo.22 A tarefa do projeto não invasivo foi atribuída à DEKA Research and Development23 e a tarefa invasiva foi submetida a um consórcio liderado pela Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory (JHUAPL). O MS da DEKA, chamado de “Luke”, que agora está passando por experimentos clínicos, possui um design modular e é formado por uma mão com função semelhante à função da i-LIMB, com seis padrões de aperto e controle mioelétrico (e não neurológico).23 O consórcio da John Hopkins colaborou com diversos parceiros acadêmicos e corporativos na difícil tarefa de extrair sinais neurológicos motores e resposta sensorial para controlar um braço e uma mão unicamente pela intenção do usuário.24 O projeto especificava a criação de uma mão com cinco dedos, um polegar opositor, pulso, cotovelo e ombro, que juntos poderiam gerar mais de 22 tipos de movimento, e acabou resultando na criação da prótese de membro modular (MPL, do inglês modular prosthetic limb) (Fig. 36.5 E-G). Após o programa Revolutionizing Prosthetics, a DARPA, a JHUAPL e os membros do consórcio continuaram com a pesquisa, e o MS atualmente está na fase III de testes em humanos pela FDA. Este produto pode até mesmo conceder aos pacientes tetraplégicos a recuperação do uso dos membros, possivelmente contornando a lesão na medula espinhal ao conectar seus pensamentos diretamente com o membro biônico.25 Escolhendo um membro superior robótico: benefícios e limitações Um membro robótico poderá beneficiar o paciente ao proporcionar resultados estéticos e funcionais melhores do que os alcançados com a reconstrução cirúrgica do membro. Geralmente, para lesões mais graves e mais próximas à região anterior do braço, o MS robótico será a escolha mais adequada (Fig. 36.9). Dependendo do paciente, uma prótese de braço pode ser o diferencial entre a dependência existente e um retorno efetivo da independência à sociedade.

FIG. 36.9 Escolha da prótese de membro robótico em comparação com o reimplante, com base na severidade e no local da lesão. Os robôs são a melhor opção para amputações nas regiões mais próximas da metade do MS, mas não são adequadas quando a lesão ocorre em uma das extremidades, seja distal ou proximal. Os reimplantes são a melhor escolha para ferimentos de corte limpo na extremidade distal. Se a amputação estiver na porção medial do ombro, não haverá uma solução robótica satisfatória, pois é difícil montar a prótese nessa área. Um reimplante também não será possível nesse caso. (Cortesia do médico Joseph Rosen.)

Dentre as vantagens do MS robótico para o paciente, há a economia de tempo, dinheiro e menos complicações relacionadas à cirurgia de reimplante, à reabilitação e à perda de trabalho; melhorias na função e na estética em comparação com um MS reimplantado e a possibilidade de executar funções especializadas. Já as desvantagens do MS robótico incluem o peso, a fonte de alimentação para o sistema, a suscetibilidade aos elementos, a necessidade de reparos frequentes e a falta de resposta e de controle. Os MMSS robóticos também não dispõem de estereognosia (isto é, a capacidade de saber a posição do membro no espaço, o que pode, por exemplo, possibilitar seu uso no escuro) e não são adequados para todos os pacientes; sendo assim, os cirurgiões plásticos devem levar em consideração os objetivos do possível usuário, sua compreensão, maturidade, motivação e suas limitações físicas, como força, destreza, mobilidade articular, qualidade do coto e

controle da dor. Um MS robótico é um ajuste e, para muitos pacientes, implica uma mudança na autoimagem, no controle e nas expectativas. A função do cirurgião plástico, além de ajudar o paciente a escolher e a adquirir a prótese adequada, é acompanhá-lo durante a reabilitação, com a ajuda de um anaplastologista e/ou um protésico, que podem ser encontrados por meio da International Anaplastology Association e da American Academy of Orthosis and Prosthetists.37,38 O cirurgião deve entrar em contato com um protésico imediatamente após o trauma, antes do fechamento final da ferida, para conversar sobre o design e a fabricação do encaixe e do dispositivo terminal da prótese. O protésico informará ao cirurgião que, às vezes, comprimento de mais pode ser prejudicial para a aplicação dos componentes da prótese, porém, comprimento de menos também pode prejudicar a suspensão do encaixe. O cirurgião precisará dar ao protésico uma prescrição para a prótese, e ambos discutirão o plano de tratamento do paciente. Se o paciente precisar de um membro de substituição com cobertura realista, um anaplastologista será chamado para colaborar com o protésico e proporcionar tanto a estética como a função, criando uma pele realista para cobrir a prótese. Próteses de membro inferior As próteses de membro inferior que dispõem de tecnologia informatizada, robótica ou ativa ainda estão em desenvolvimento, inclusive com projetos tanto para a perna como para o pé.39 O Massachusetts Institute of Technology criou uma prótese mioelétrica de pé e tornozelo que é capaz de andar sobre um solo nivelado ou subir escadas. Futuramente, eles esperam conseguir fazer com que sinais neurológicos acionem automaticamente um comportamento específico para o terreno em questão.40 A C-leg® da Otto Bock Healthcare possui um joelho robótico que faz uso de um microprocessador, de um software e recebe respostas de 50 sensores para antecipar os movimentos do usuário e ajustar o deslocamento em tempo real, mantendo o joelho estável enquanto o usuário anda e suportando-o, mesmo que ele tropece.41

A robótica na cirurgia craniofacial e em cirurgias de ORL O Dr. Paul Tessier, da França, foi pioneiro na cirurgia de reconstrução craniofacial, tendo desenvolvido diversas operações para corrigir defeitos da linha média da face em crianças no início do século XX.42,43 O campo foi reinventado em 2005, quando o Dr. Jean-Michel Dubernard, também na França, realizou o primeiro transplante parcial de face. Em 2008, a Dra. Maria Siemionow e uma equipe cirúrgica da Cleveland Clinic, nos Estados Unidos, realizaram o primeiro transplante quase total da face em um humano,44 e, em 2009, também nos Estados Unidos, o Dr. Bohdan Pomahac e uma equipe do Brigham and Women’s Hospital conduziram o segundo transplante facial45. Depois disso, outros cirurgiões conduziram transplantes deste tipo no mundo todo, chegando, em 2010, a alcançar o transplante facial total. O transplante de tecidos compostos vai além do conjunto de habilidades do cirurgião craniofacial, e a robótica tem o potencial para conseguir progredir ainda mais nesse campo. Grandes operações de remodelagem craniofacial poderiam ser feitas de forma minimamente invasiva, usando apenas algumas pequenas incisões, caso os instrumentos articulatórios em miniatura e remotamente controlados, do sistema da Vinci, fossem adaptados para tais procedimentos. Outros especialistas em cirurgia estão explorando esta área. Selber et al. conduziram uma investigação préclínica para explorar a viabilidade da reconstrução robótica de defeitos orofaringeais. Eles declararam que “a reconstrução robótica transoral com retalho microcirúrgico é o próximo passo lógico na direção da cirurgia robótica transoral.”46 Os otorrinolaringologistas agora fazem a tireoidectomia por meio de incisões nas axilas para evitar cicatrizes evidentes no pescoço. E os otorrinolaringologistas oncológicos usam os instrumentos articulados do sistema da Vinci para alcançar boca e a garganta e realizar cirurgias de ORL. De acordo com o Dr. Joseph Paydarfar (Comunicação Pessoal), cirurgião otorrinolaringologista (ORL) do Dartmouth-Hitchcock Medical Center: O sistema da Vinci é bastante animador e acho que ele resultará em uma mudança de paradigma no modo como tratamos os cânceres de garganta (...). O robô, com sua câmera 3D de alta definição, permite que tenhamos uma visão aproximada da garganta de uma forma nunca antes possível. Além disso, os braços manipuladores do robô melhoram significativamente nossa habilidade de manipular tecidos e trabalhar próximo aos cantos. Com as tecnologias mais antigas, às vezes podíamos ver o que queríamos manipular, mas, como éramos limitados à natureza linear de nossos instrumentos, não conseguíamos alcançar o tecido. A curva de aprendizagem é rápida (ou seja, é fácil aprender a usar o sistema), especialmente para a geração do videogame. Usamos instrumentos de 5 mm que são um

pouco menores que os instrumentos padrão de 8 mm. No entanto, conforme a especialidade da cirurgia ORL evolui, cada vez mais serão disponibilizados instrumentos específicos para ela. Em uma série de casos de 17 pacientes, Aubry et al. estudaram o uso da cirurgia robótica transoral (TORS, do inglês transoral robotic surgery) para câncer de cabeça e pescoço. Eles concluíram que a TORS “(ampliava) as indicações para a ressecção endoscópica em casos selecionados de cânceres de cabeça e pescoço” e permitia uma “ressecção eficaz do câncer sob excelentes condições de operação com baixa morbidez e melhor recuperação funcional”. Ainda assim, eles preveniram que mais estudos devessem ser realizados para comparar essa nova modalidade cirúrgica com técnicas de cirurgia aberta, laser endoscópico e quimiorradioterapia.46a Em uma revisão sistemática da literatura sobre o uso da robótica na otorrinolaringologia e cirurgia de cabeça e pescoço (OHNS, do inglês otolaryngology-head and neck surgery), Maan et al. concluíram que a evidência básica sugere que os benefícios da cirurgia robótica na OHNS incluem o acesso, a precisão e o tempo da operação, mas recomendaram que fossem realizados mais estudos prospectivos controlados com os resultados objetivos e afirmaram que o custo ainda é a maior desvantagem da cirurgia robótica para OHNS.46b Quando não é possível reconstruir a face por cirurgia, são usadas próteses faciais que incluem olhos, orelhas e até mesmo próteses da face inteira.47,48 As próteses faciais disponíveis atualmente são inanimadas e com funções passivas que podem: (1) restaurar a estética passiva e a aparência, a fim de melhorar a qualidade de vida psicossocial; (2) proteger uma região de ressecção ou trauma; (3) melhorar a audição ao restaurar o hélix (a hélice) da orelha; e/ou (4) fornecer uma estrutura para suporte, como uma prótese de orelha na qual será colocado um aparelho auditivo, ou uma prótese de nariz ou olho para apoiar os óculos. Pode-se imaginar que no futuro as próteses faciais tornar-se-ão ativas e animadas – usando componentes robóticos para restaurar a função e ajudar um paciente a, realmente, ver, cheirar, comer e falar.49 Um olho biônico (prótese de retina) criado pela Second Sight49a desperta uma percepção visual em indivíduos cegos com retinite pigmentosa severa a profunda. O Argus® II está sendo avaliado em um estudo clínico conduzido nos Estados Unidos e na Europa, e, em 2011, recebeu autorização para ser comercializado na Europa.

A robótica na cirurgia torácica e abdominal (tronco) No tronco, alguns cirurgiões plásticos tratam as grandes hérnias ventrais com procedimentos endoscópicos de separação de componentes.50 Essa operação possivelmente poderia ser feita totalmente por técnicas minimamente invasivas com o uso dos robôs cirúrgicos. Além disso, para tratar anomalias torácicas congênitas, pós-ablação ou pós-traumáticas, os sistemas de fabricação robótica usam a tecnologia CAD/CAM e imagens em 3D para criar uma prótese personalizada que repare precisamente o defeito. Essa tecnologia reduz os custos e o tempo de operação ao minorar os ajustes do implante durante o procedimento.17,51

Robôs na cirurgia urológica (próstata) Os cirurgiões plásticos e urologistas corrigem defeitos urológicos congênitos e reconstroem a anatomia após um trauma ou doença. A robótica poderia desempenhar um papel importante na fabricação de implantes urológicos que restaurassem a função; por exemplo, implantes penianos para corrigir defeitos congênitos, trauma ou disfunção erétil, ou ainda, para a cirurgia de transgenitalização. Qualquer operação urológica ou ginecológica feita endoscopicamente poderia ser realizada com a cirurgia robótica. A prostatectomia radical (PR) foi inicialmente realizada por laparoscopia, em 1997. Hoje, cerca de metade dos cânceres de próstata é tratada por cirurgia, seja aberta, laparoscópica ou robótica. Aproximadamente 85% dos 81 mil homens americanos, que optaram pela cirurgia para tratar o câncer de próstata, escolheram o sistema da Vinci, segundo a Intuitive Surgical.26 A quantidade de cirurgias de próstata, rim e ureter assistidas por robô aumentaram rapidamente.52 Esses procedimentos são altamente promovidos no mercado, de forma que foram levantadas questões a respeito dos benefícios reais da robótica.53 Esse problema ilustra um dos dilemas que envolve a cirurgia assistida por robô, que é a relação custo-benefício. É importante evitar usar tecnologias cujos resultados não tenham sido comprovadamente maiores, a menos que se esteja estudando e comparando a tecnologia com o procedimento padrão no momento.

Cirurgia robótica: a evidência básica de melhores resultados

Há algumas evidências de melhores resultados na cirurgia robótica em comparação à cirurgia endoscópica e à cirurgia aberta, mas até o momento não há ensaios clínicos controlados e randomizados, somente estudos baseados na população e estudos que normalmente são baseados em uma única instituição e/ou especialidade médica. A cirurgia robótica de próstata normalmente é usada como referência para examinar os resultados. Para a cirurgia de PR, o objetivo principal é remover o câncer. Dentre as preocupações secundárias estão a potência e a continência urinária, embora a potência seja afetada por fatores externos ao método cirúrgico (isto é, se houver tumores no nervo, ele não poderá ser poupado). A perda de sangue, o tempo médio de operação e alguns outros fatores também são considerados como resultados mensuráveis. Berryhill et al.54 conduziram uma revisão de 22 estudos baseados em população, com 40 pacientes ou mais, comparando a PR robótica (PRR) usando o da Vinci, a PR laparoscópica (PRL) e a PR aberta. Eles descobriram que a cirurgia robótica apresentava menor perda de sangue, melhor controle do câncer e menores complicações gerais. Em relação ao tempo médio da operação, a PRR (164 min) superou a PRL (227 min), mas não a PR aberta (147 min). A continência urinária e a potência foram difíceis de serem avaliadas devido aos diferentes métodos de medição usados nos estudos revisados e à falta de ensaios clínicos controlados e randomizados. Em setembro de 2009, uma meta-análise de mais de 100 estudos, os quais incluíam mais de 30 mil pacientes, foi publicada pelo Institute for Clinical Economic Review. Concluiu-se que, embora a prostatectomia laparoscópica assistida por robô (RALP, do inglês robotic-assisted laparoscopic prostatectomy) ainda não tenha sido comprovada, ela tem potencial para oferecer um benefício líquido de pequeno a substancial, em comparação com as formas de tratamento tradicionais, incluindo a cirurgia aberta.55 O principal motivo pelo qual ela foi considerada como não comprovada foi devido ao número menor de pacientes de RALP incluídos. Os gráficos e a tabela de dados desse estudo levaram a duas conclusões lógicas: 1. A RALP foi potencialmente superior tanto em relação à cirurgia aberta como em relação à laparoscopia convencional. 2. Houve uma maior consistência nos resultados dos pacientes de RALP. Os resultados médios foram superiores para a RALP, e os intervalos dos resultados relatados nos estudos examinados eram mais próximos. Coelho et al.56 revisaram 16 estudos com pelo menos 100 pacientes, entre 2006 e 2009. Eles relataram que a cirurgia assistida por robô era provavelmente comparável e possivelmente superior à cirurgia aberta, e que os estudos mostravam a segurança e a eficácia da RALP, com resultados de menor perda de sangue e menor risco de transfusão em comparação com a PR aberta. No entanto, concluíram que não haviam sido realizados ensaios clínicos de boa qualidade, de forma que não foi possível tirar conclusões definitivas. Como ocorre com qualquer nova tecnologia, a cirurgia robótica será aprimorada com o passar do tempo. Esperam-se melhorias no sistema, mais treinamento, mais centros de excelência e melhores simulações, que, por sua vez, trarão melhores resultados, possibilitando que eles sejam medidos com maiores estudos prospectivos randomizados.

Dispositivos robóticos da próxima geração e o futuro da robótica na cirurgia Em suma, a robótica causa impacto na cirurgia plástica em duas grandes áreas: ferramentas cirúrgicas e criação de próteses. No futuro, existirão próteses avançadas, como faces robóticas ativas com animação inteligente, olhos biônicos e implantes auriculares completos.49 Praticamente qualquer parte do corpo humano poderá ser auxiliada ou substituída por uma cópia robótica que poderá ultrapassar os limites das funções biológicas. Os robôs cirúrgicos irão evoluir e adquirir o sentido do tato, e poderão ser mais baratos, menores e personalizados para procedimentos plásticos com pequenas incisões e alcance limitado. Os componentes robóticos serão menores, incluindo pequenos sistemas telemanipuladores, robôs intracorporais totalmente móveis33 e até mesmo dispositivos em nanoescala. Os centros de excelência serão expandidos, bem como a simulação e o treinamento, tornando a tecnologia robótica cirúrgica mais disponível e, possivelmente, melhorando os resultados em todos os procedimentos. A fusão de dados e os modelos específicos de pacientes57 permitirão que os cirurgiões vejam imagens de tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética sobrepondo-se à anatomia real durante a cirurgia. Os robôs cirúrgicos poderão ser mais ativos e autônomos, servindo cada vez mais como auxiliares médicos, entregando materiais ou segurando retratores.

As ferramentas cirúrgicas passivas também serão robotizadas e tornar-se-ão ativas. Os Drs. Court Cutting e Barry Grayson, da New York University (NYU), conduzem uma modelagem nasoalveolar usando um dispositivo que modela a mandíbula e os dentes antes da cirurgia de reparação da fissura labiopalatina (FLP).58 Conceitualmente, esse dispositivo pode evoluir para um dispositivo robótico inteligente, programado para mudar a anatomia da configuração errada para a certa ao longo do tempo. Ao trabalhar com engenheiros biomédicos e especialistas em computação, os cirurgiões plásticos estarão na vanguarda das mudanças tecnológicas, moldando o futuro para o benefício dos pacientes.

Simulação Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês no site http://www.expertconsult.com

Introdução e definição de simulação A simulação está sendo cada vez mais usada na cirurgia, conforme o campo vem reagindo à pressão contínua de padronização do treinamento. A principal motivação para a padronização vem do desejo de melhorar a segurança do paciente. A simulação pode ser definida como “a representação imitativa do funcionamento de um sistema ou processo por meio do funcionamento de outro.”63 Isso inclui o uso de um modelo, seja físico ou lógico, ao longo do tempo, para obter uma percepção da forma como o sistema ou processo opera, para poder avaliá-lo e analisá-lo.64 Esta seção do capítulo é voltada para os simuladores informatizados, que empenham o aprendiz e testam o conhecimento cognitivo. A animação é um novo recurso que acompanha alguns simuladores informatizados. Primeiro, os aprendizes assistem a filmes animados, para ver um procedimento específico e se familiarizar com a anatomia relevante. Em seguida, eles praticam o procedimento no simulador; essa prática é análoga ao método see one, do one (“ver um, fazer um”) do treinamento cirúrgico tradicional. A simulação pode ser implementada em três fases, com base no plano da American College of Surgeons (ACS) para alunos de cirurgia geral. Ela pode ser usada para aprender as habilidades, praticar e entender os procedimentos, e para praticar o treinamento da equipe na sala de operação.64 Os simuladores, dispositivos físicos que manifestam a simulação na área médica, podem ter diversos formatos, dentre os quais estão os modelos de bancada, os modelos de animais, cadáveres, manequins e simuladores de computador.64 As oficinas de habilidades cirúrgicas especializadas reduziram a taxa de complicações nos procedimentos endoscópicos de túnel do carpo.65 Dessa forma, quando aplicada aos procedimentos médicos, do ponto de vista ético e prático, a simulação converte-se em uma ferramenta eficaz tanto para a educação como para o planejamento de diversas especialidades cirúrgicas. Na cirurgia plástica, a simulação pode ser aplicada no treinamento da residência, na manutenção da certificação e no planejamento de procedimentos específicos de um paciente. A simulação permite que os cirurgiões plásticos melhorem e verifiquem suas habilidades técnicas, seu conhecimento cognitivo e o trabalho em equipe de forma segura e consistente.

Argumentos lógicos para usar a simulação na cirurgia plástica e evidências de sua utilidade nos paradigmas de treinamento cirúrgico Tanto o Accreditation Council for Graduate Medical Education como o American Board of Medical Specialties aprovam as seis principais competências comuns para todos os cirurgiões: (1) conhecimento médico; (2) atendimento ao paciente; (3) habilidades de comunicação e interpessoais; (4) profissionalismo; (5) aprendizado e melhoria baseados na prática; e (6) prática baseada em sistemas.66 Apesar de todos esses objetivos, o Institute of Medicine reportou que cerca de 44 mil a 98 mil mortes nos Estados Unidos ocorrem a cada ano como resultado de erros médicos – um valor significativo o suficiente para ser considerado um risco à saúde pública.67 Essa estatística espantosa gerou uma maior preocupação em relação à segurança do paciente em todo o campo. Além disso, o aumento nos custos do atendimento criou uma pressão para que os centros médicos aliviem os custos. Enquanto o tempo em uma sala de operação gera gastos reais de milhares de dólares por hora,68 a simulação proporciona uma maneira segura para que os cirurgiões pratiquem os procedimentos a um custo reduzido.64 Ao usar a simulação e a realidade virtual, os residentes e cirurgiões encarregados podem praticar habilidades

e procedimentos sem qualquer risco ao paciente. Trata-se de um complemento para o paradigma see one, do one, teach one (“ver um, fazer um, ensinar um”). Se um aluno puder praticar certas habilidades e procedimentos em um simulador, os tempos na sala de operação poderão ser reduzidos e, possivelmente, os erros cometidos por ele também, aumentando assim a segurança do paciente.

O papel da simulação na cirurgia plástica Simuladores de treinamento A simulação para o treinamento está se difundindo na cirurgia plástica, sendo inicialmente usada em programas de residência. Enquanto a ACS atuava como pioneira na estrutura fundamental para o uso de simuladores para o treino por meio de seu consórcio com os Accredited Educational Institutes (AEIs), a comunidade da cirurgia plástica se concentrou principalmente em desenvolver simuladores de procedimentos específicos para a área. As habilidades técnicas são normalmente ensinadas em um treinamento de cirurgia geral. Os AEIs auxiliam esse processo com simuladores de habilidades, como caixas pretas para suturas.69 Conforme a cirurgia robótica minimamente invasiva vai ganhando força, os simuladores são usados da mesma forma para treinar o uso de ferramentas de operação específicas, a exemplo do sistema da Vinci. O dVTrainer™ da Mimic Technologies, um simulador para o sistema da Vinci, é um ambiente de simulação virtual com um dispositivo tátil de dois controles manuais e de resposta à força (Fig. 36.10). Um estudo de Kenney et al. revelou que o dV-Trainer tinha conteúdo, fidegnidade e validade aparente, o que representa uma avaliação positiva do realismo do simulador pelo usuário iniciante.70 A Intuitive Surgical também oferece o da Vinci Skills Simulator™, lançado em 2011. Criado para oferecer uma experiência virtual envolvente por meio do console do cirurgião, o simulador da Vinci permite que os usuários meçam e monitorem as habilidades avaliadas, sem a necessidade de outros componentes do sistema, instrumentos ou modelos de habilidades. O simulador intuitivo da Vinci e o dV-Trainer da Mimic são produtos complementares, desenvolvidos pelas empresas de forma colaborativa e direcionados para diferentes necessidades do cliente. O dV-Trainer serve para ser usado como um produto independente, isto é, ele não depende do console. Já o simulador da Vinci deve ser usado com o console, pois utiliza o software de simulação da Mimic, mas o aloja em um hardware diretamente compatível com um sistema da Vinci existente.

FIG. 36.10 O simulador dV-Trainer da Mimic para cirurgia robótica foi criado para treinar os cirurgiões em como usar o sistema cirúrgico da Vinci e para ensinar a cognição do sistema, a manipulação dos instrumentos e as habilidades básicas, como manuseio da agulha e controle de energia. (A) O exercício de percorrer com o anel, que ajuda a aprimorar a destreza, consiste em mover um objeto com uma barreira linear usando a câmera para navegar pelo campo cirúrgico. Ele também ensina como usar a garra com os instrumentos. (B) O exercício de dissecação por energia orienta o usuário a aplicar o uso da cauterização e da coagulação como parte da dissecação, bem como para controlar a perda de sangue. (Cortesia do Doutor Jeff Berkley, PhD, e Gordon Nealy; © 2012 Mimic Technologies, Inc.)

O Comitê Ad Hoc sobre Realidade Virtual e Simulação para Educação em Cirurgia Plástica do American Council of Academic Plastic Surgeons (ACAPS) tem o compromisso de ajudar a desenvolver e distribuir simuladores para treinar residentes em procedimentos de cirurgia plástica. O Comitê é dividido em grupos de especialistas em quatro subespecialidades de cirurgia plástica: (1) craniofacial; (2) estética; (3) reconstrutiva; e (4) cirurgia de mão. Uma pesquisa respondida por 85 membros do ACAPS, em fevereiro de 2009, indicou que 93% dos entrevistados tinham interesse em usar um sistema de simulação cirúrgica em 3D para treinar residentes em cirurgia plástica. O Comitê tem o objetivo de adaptar essa tecnologia avançada de simulação de cirurgia virtual para um ensino padronizado e para procedimentos nas quatro áreas de especialidades mencionadas acima. Ao usar um processo chamado análise de tarefa cognitiva, procedimentos como liberação do túnel do carpo e mamoplastia redutora são divididos em etapas ponderadas de acordo com sua relevância para o resultado do procedimento. Por exemplo, o procedimento do músculo grande dorsal, o posicionamento do retalho e o fechamento da cavidade torácica são ponderados em 20%, enquanto as bandagens têm o peso de 5%. Dessa forma, os principais pontos de aprendizado são enfatizados no simulador desenvolvido. A BioDigital Systems e o Institute of Reconstructive Plastic Surgery da NYU conduziram o desenvolvimento de animadores e simuladores para ensinar os residentes nos procedimentos de cirurgia plástica. Recorrendo a

uma equipe multidisciplinar de cirurgiões plásticos como especialistas médicos, artistas (para dar realismo), e cientistas da computação para o desenvolvimento técnico. A equipe criou uma biblioteca de programas de treinamento para ensinar procedimentos de reconstrução mamária e craniofacial. A Tabela 36.1 resume os procedimentos para os quais as animações já foram concluídas. Tabela 36.1 Animações cirúrgicas concluídas para diversos procedimentos técnicos Procedimento

Procedimento animado

Genoplastia

Genoplastia por deslizamento

Prognatismo

Osteotomia por separação sagital bilateral

Micrognatismo

Osteotomia vertical do ramo

Anquilose articular temporomandibular Distração mandibular:

Vetor V Vetor H Vetor O

Hipoplasia maxilar

Distração de transporte

Hipoplasia do terço médio da face

Le Fort I

Hipoplasia dos dois terços superiores

Le Fort III

Craniossinostose

Monobloco

Reconstrução mamária

Avanço orbital frontal/abóbada craniana Reconstrução por TRAM pediculado Reconstrução por retalho DIEP Reconstrução por retalho do músculo grande dorsal Reconstrução por TRAM livre Expansor de tecido

TRAM (do inglês transverse rectus abdominis myocutaneous) – miocutâneo transverso do reto abdominal; DIEP (do inglês deep inferior epigastric perforator) – perfurante da artéria epigástrica inferior.

O simulador de fissura lábio palatina da BioDigital, desenvolvido sob a direção do médico Court Cutting, está atualmente disponível em versão beta e sendo transferido para a plataforma on-line BioDigital Human™ (Fig. 36.11). Seu modelo de paciente baseado em TC permite que o aluno pratique, grave, e revise a cirurgia em tempo real, explore a anatomia de cada camada de tecido e faça cortes nas superfícies, crie retalhos e transponha tecidos.71,72 Os simuladores do Interactive Craniofacial Surgical Atlas, criado sob a direção do médico Joseph McCarthy, incluem o simulador de avanço fronto-orbital, o simulador de avanço/distração em monobloco e o simulador de avanço/distração Le Fort III. Esses novos simuladores incluem diversos recursos, como vídeos de cirurgias ao vivo, para ajudar a ilustrar o procedimento que está sendo simulado, voiceover, para facilitar o aprendizado enquanto o aluno pratica e visualização em 3D.

FIG. 36.11 Simulador de fissura labiopalatina (FLP) o BioDigital/SmileTrain mostrando a aparência do paciente (A) antes e (B) durante a cirurgia. (Cortesia de SmileTrain, do médico Court Cutting, e BioDigital Systems, LLC. © 2012 BioDigital Systems.)

Dentre os simuladores disponíveis para outros procedimentos especializados, há o simulador para o retalho miocutâneo do músculo grande dorsal com expansor de tecido para reconstrução mamária após a mastectomia (Fig. 36.12).

FIG. 36.12 Simulador do músculo grande dorsal da BioDigital. (Cortesia da Biodigital Systems, LLC. © 2012 BioDigital Systems.)

O simulador em monobloco Le Fort II para correção da fissura lábio palatina, desenvolvido sob a direção do médico Alexes Hazen, com análise de tarefa cognitiva definida pelo Comitê do ACAPS, inclui os recursos presentes no Interactive Craniofacial Surgical Atlas. Ad Hoc a NYU e os membros do Comitê do ACAPS testaram a eficácia do treinador do músculo dorsal (versão 1) em um estudo piloto com quatro institutos nos Estados Unidos. O simulador agora está sendo ativamente usado na NYU, na Case Western Reserve University, na University of Wisconsin e no DartmouthHitchcock Medical Center, enquanto o Comitê planeja conduzir as fases II e III dos testes também em outras instituições. O benefício dos simuladores para treinamento tem sido demonstrado em outras disciplinas cirúrgicas, e o objetivo desse estudo piloto é fornecer os dados para a cirurgia plástica. Os residentes e alunos de medicina serão testados quanto ao conhecimento do procedimento, antes e depois da exposição ao simulador. Atualmente, estão sendo estabelecidos planos para incorporar a realidade virtual e a simulação para fins de treinamento no currículo dos residentes em cirurgia plástica. A American Society of Plastic Surgeons e o ACAPS estão envolvidos em um esforço conjunto para desenvolver um novo “veículo educacional padronizado e abrangente para cirurgia plástica” on-line (J. Locee, Diretor, Comunicação Pessoal). O campo da cirurgia plástica foi dividido em sete seções ((1) cabeça e pescoço; (2) extremidade superior; (3) tronco; (4) extremidade inferior; (5) mama; (6) cirurgia estética; e (7) competências não clínicas). Cada módulo irá abranger diversas ferramentas de aprendizado, inclusive a leitura didática, a discussão de casos e os componentes multimídia, a exemplo dos procedimentos simulados. Desse modo, a simulação será complementar a outros instrumentos educacionais para proporcionar aos residentes o conhecimento básico de todos os procedimentos da cirurgia plástica fora da sala de operação. Os pesquisadores da Thayer School of Engineering de Dartmouth, atualmente, conduzem uma pesquisa de treinamento em equipe para ajudar a melhorar a comunicação e garantir uma transferência segura do paciente entre a equipe da sala de operação e os demais profissionais do hospital. O sistema idealizado – uma simulação computadorizada de treinamento em equipe – irá monitorar as operações médicas com perfeição para reduzir ou impedir erros médicos catastróficos e melhorar a segurança do paciente (E. Santos, Comunicação Pessoal). Entre um dos cenários simulados inclui-se o caso de mamoplastia redutora, na qual a placa aréolo-papilar da paciente é descartada por engano, seja devido à inexperiência do cirurgião plástico ou por conta de um malentendido quanto às preferências da paciente. Ao usar esse caso, bem como outros cenários, a equipe de Santos criará um modelo para alcançar um entendimento comum entre os médicos, enfermeiros e pacientes73, e simulará a tomada de decisão e os acordos entre a equipe antes, durante e após os procedimentos cirúrgicos, analisando assim as inconsistências ou lacunas no procedimento – um indicador chave de erros médicos – com o objetivo de alertar a equipe quando houver qualquer discrepância.

Simuladores de planejamento cirúrgico Os cirurgiões plásticos podem usar a simulação não apenas para praticar novos procedimentos em um paciente virtual, mas também para o planejamento de uma cirurgia específica. Antes do primeiro procedimento de transplante facial quase total, realizado nos Estados Unidos por uma equipe cirúrgica coordenada pela Dr. Maria Siemionow, na Cleveland Clinic, em 2008, os cirurgiões usaram, como parte do planejamento cirúrgico, modelos anatômicos estereolíticos feitos a partir das imagens de TC do paciente que mostravam o defeito facial (Fig. 36.13)44 (M. Siemionow, Comunicação Pessoal).

FIG. 36.13 (A, B) O modelo anatômico estereolítico baseado nas imagens de tomografia computadorizada do paciente que teve o primeiro transplante facial nos Estados Unidos, realizado por uma equipe de cirurgiões coordenados pela Dra. Maria Siemionow, na Cleveland Clinic, em 2008. (A) Visão frontal do defeito craniofacial após um ferimento por arma de fogo no rosto do paciente, indicando dano do esqueleto frontal e do terço médio da face, incluindo o infraorbital e os ossos nasal, zigomático e maxilar, misturados com pedaços de metal. (B) O lado esquerdo do defeito, com um defeito tridimensional significativo mostrando a perda do nariz e dos ossos nasais, e suporte ósseo da maxila. (C) Visão frontal, seis meses após o transplante, mostrando a restauração completa do defeito craniofacial pela substituição de todos os componentes ósseos danificados do esqueleto facial e tecidos moles do paciente com o aloenxerto facial composto do doador. (D) Visão do lado esquerdo após o transplante, confirmando a restauração do defeito tridimensional do esqueleto craniofacial, incluindo as estruturas do nariz e óssea que suportam o esqueleto do terço superior e médio da face. (Reproduzido com a autorização de Siemionow MZ, Papay F, Djohan R, et al. First. U.S. near-total human face transplantation: a paradigm shift for massive complex injuries. Plast Reconst Surg 2010; 125: 111-122.)

Antes do segundo transplante facial nos Estados Unidos, realizado por microcirurgiões do Brigham and Women’s Hospital, em 2009, sob a direção do Dr. Bohdam Pomahac, a equipe também usou imagens de TC de deformidades da cabeça e da face do paciente recebedor do transplante, a fim de gerar um modelo em 3D de acrílico e no tamanho real do crânio. Em seguida, a equipe criou um segundo modelo facial em 3D, com base em imagens de TC de uma anatomia facial normal, a partir das quais as peças foram removidas e transferidas para o modelo do receptor. Isso possibilitou que os cirurgiões planejassem a quantidade de osso necessária do doador, bem como antecipassem a logística anatômica do procedimento de recuperação do doador (B. Pomahac, Comunicação Pessoal).

Futuras aplicações da simulação A visão para o futuro deve incluir instrutores de simulação nos planos de cirurgia plástica em todos os casos, além de fornecer treinamento para os novos procedimentos como parte de uma educação continuada, de forma segura, eficiente e eficaz. Ad Hoc o Comitê sobre Realidade Virtual e Simulação para Educação em Cirurgia Plástica do ACAPS, em parceria com a BioDigital Systems e a NYU, planeja lançar em 2012 um simulador de procedimentos de reconstrução craniofacial. Já que os centros de simulação são desenvolvidos em um número crescente de centros médicos, e o currículo da especialização cirúrgica continua a incorporar a simulação como uma ferramenta benéfica para o treinamento, a simulação tornar-se-á cada vez mais arraigada ao campo da cirurgia plástica para o treinamento de residentes, manutenção da certificação e práticas específicas a cada paciente. Conforme os simuladores tornam-se cada vez mais avançados, eles serão usados em diversos níveis de atividade e poderão até mesmo incorporar um modelo físico-comportamental-genômico de um ser humano, um modelo que combine as informações sobre as células, os tecidos e os órgãos de uma pessoa, sinais vitais, biomecânica, fisiologia, comportamento e traços genéticos, e a epidemiologia de uma maior população. Um modelo abrangente como esse poderia simular e prever o comportamento e a saúde de um indivíduo (Fig. 36.14).

FIG. 36.14 Modelo físico-comportamental-genômico. Ainda não há um modelo abrangendo o corpo físico, o comportamento e os biomarcadores de um indivíduo, mas o Dr. Joseph Rosen e seus colegas estão desenvolvendo um modelo deste tipo. Um modelo totalmente humano poderia incluir as células, os tecidos e os órgãos de uma pessoa, bem como sinais vitais, biomecânica, psicologia, comportamento e traços genéticos, combinados à epidemiologia de uma população maior. Um modelo abrangente como esse poderia simular e prever o comportamento e a saúde de um indivíduo. (Cortesia do médico Joseph Rosen.)

Telemedicina Acesse a seção Perspectiva Histórica em inglês no site http://www.expertconsult.com

Introdução No futuro, a telemedicina levará a robótica e a simulação para o campo da cirurgia plástica, tornando-a mais segura, simples, eficaz e acessível. A relação médico–paciente e a assistência médica serão transformadas pela telemedicina, levando-se em conta que os médicos poderão não mais estar fisicamente presentes para tratar os pacientes. Esta seção do capítulo define a telemedicina como uma ferramenta clínica; explica a função das redes sociais na telemedicina; apresenta possíveis desafios em sua utilização para a cirurgia plástica; e explica as aplicações atuais e futuras na cirurgia plástica.

Definição e métodos A telemedicina refere-se à aplicação das tecnologias de telecomunicação no contexto médico. Ela pode ser definida como uma “troca de informações médicas de um local a outro por meio de comunicações eletrônicas” com o objetivo geral de melhorar o atendimento ao paciente.83 A telemedicina pode ser algo tão simples como enviar uma cópia de um raio X por fax ou tão complicado como fazer uma videoconferência de vários pontos em diversos continentes com transferência de imagens de alta resolução. Um residente pode pedir orientação a um médico em serviço, um médico pode pedir a opinião de outro, ou ainda, um paciente pode pedir a orientação de um médico. Há diversos componentes presentes nas atuais consultas de cirurgia plástica que podem ser convertidos para um formato digital, inclusive a triagem à longa distância, consultas remotas, telecirurgia,84,85 avaliações pós-operatórias, orientações ao paciente, educação médica continuada para prestadores de serviços médicos e educação de saúde pública. No mundo todo, a necessidade da telemedicina só tem aumentado, visto que a lacuna no acesso à tecnologia também aumenta entre os que vivem em áreas rurais e os que vivem em áreas urbanas. As pessoas que vivem

em áreas rurais têm menos acesso ao atendimento médico de forma geral e, em muitos casos, a atendimento médico especializado, com exceção de quando há grupos de médicos voluntários, como ReSurge International (antes chamado de Interplast).86 A ReSurge International é um dos diversos grupos que oferecem atendimento médico especializado temporário a regiões remotas durante viagens internacionais humanitárias para atendimento cirúrgico, e complementa a ação com os educadores visitantes, que oferecem treinamento prático direto para os médicos locais. A interação com os prestadores de serviços médicos locais é de tal ordem que os cirurgiões nos países anfitriões podem publicar casos em um site seguro, para receber conselhos quando as equipes da ReSurge International não estiverem no local. Médicos especialistas, como cirurgiões plásticos, normalmente são uma pequena parcela da mão-de-obra geral e tendem a ficar concentrados em centros urbanos. Por meio desse mecanismo de assistência médica pela internet, estamos caminhando em direção a um uso mais eficiente do trabalho dos especialistas, visto que seu tempo e conhecimentos estão disponíveis em qualquer lugar, a qualquer momento. Diversas tecnologias são usadas comumente nas aplicações de telemedicina. A primeira, chamada de “armazenar-e-encaminhar ”, é usada para transferir imagens digitais de um local para outro. Os locais podem ser no mesmo povoado ou na mesma cidade ou a milhares de quilômetros de distância. A imagem é feita com uma câmera digital (armazenar) e enviada (encaminhar) a outro local para sua interpretação e análise. Esse método é usado em situações não emergenciais, quando uma consulta pode esperar até o próximo dia ou por alguns dias, e o bem-estar do paciente não depende de uma resposta imediata do médico consultado. Outra tecnologia usada com frequência nas aplicações de telemedicina é chamada de televisão interativa bidirecional. Essa tecnologia é usada quando se deseja ter uma interação face a face entre um paciente/médico em um local e um especialista em outro. Na maioria dos casos, a dupla paciente/médico está em um ambiente rural, e o especialista, em um centro urbano. O uso de equipamentos de videoconferência em ambos os locais permite uma consulta em tempo real para o paciente, sem que ele precise viajar (Tabela 36.2). Tabela 36.2 Comparação entre duas tecnologias de telemedicina Tipo

Armazenar e encaminhar

Interação bidirecional

Situações de uso

Não emergenciais

Face a face, normalmente urgente

Aplicações atuais

Telerradiologia, ultrassonografia, telepatologia, teleanestesia, teledermatologia

Tempo real, videoconferência para consultas de pacientes usando otoscópios, estetoscópios

Vantagens

Precisa de menor largura de banda

Tempo real

Desvantagens

Demora mais tempo

Mais caro, precisa de maior largura de banda

Redes sociais A assistência médica no futuro não será mais limitada às interações face a face. As redes sociais, como PatientsLikeMe.com e CarePlace.com, já conectam pacientes em condições semelhantes. Clayton Christensen, em seu livro “Inovação na Gestão da Saúde”, discute as redes facilitadoras como uma importante parte do sistema de atendimento médico futuro.87 As redes facilitadoras podem ser usadas especificamente por cirurgiões plásticos, criando um espaço no qual eles possam compartilhar suas melhores práticas e ajudar uns aos outros nas suas linhas de trabalho. Elas também podem ser usadas pelos pacientes, de forma que aqueles com condições semelhantes tenham a chance de compartilhar suas terapias ou cirurgias que deram certo, ou ainda, como estão lidando com determinada situação. No caso da cirurgia plástica, o site obesity.com é um exemplo de local onde os pacientes encontram recursos relacionados à cirurgia de perda de peso, inclusive uma calculadora de índice de massa corporal, recurso de pesquisa, fóruns, assistência para seguros, fotos, indicações de médicos e histórias de casos reais.

Cirurgia plástica e telemedicina Os cirurgiões plásticos têm usado a telemedicina predominantemente para a comunicação de casos individuais no campo médico internacional. A telemedicina pode ser usada nas fases pré-operatória, operatória e pós-

operatória de determinada cirurgia plástica. Por meio de organizações como a ReSurge International, os cirurgiões plásticos de qualquer lugar do mundo recebem diariamente as atualizações sobre casos em nações emergentes nas quais as consultas são solicitadas. Esses cirurgiões podem optar por acessar o sistema on-line e oferecer seu conhecimento em determinado caso. Eles podem visualizar o diagnóstico do paciente e seu histórico médico, bem como escrever um relatório do caso. Esse é um dos exemplos principais de atendimento médico à distância. Outra grande área na qual a telemedicina causa impacto na cirurgia plástica é a telecirurgia – com ela, os cirurgiões podem operar pacientes em regiões remotas. Um caso típico é de um paciente que não tem condições financeiras ou físicas de se deslocar até o local onde o médico está.84 No futuro, os cirurgiões poderão operar remotamente, por exemplo, no caso de um soldado ferido em campo de batalha85 ou uma vítima de terremoto, furacão, pandemia ou outro desastre (Figs. 36.15, 36.16). Uma grande vantagem da telecirurgia, bem como de outras formas de telemedicina, é que o paciente pode permanecer em seu próprio ambiente, onde poderá receber assistência e suporte de sua comunidade ou de familiares.

FIG. 36.15 A telecirurgia e a telepresença são duas formas pelas quais um cirurgião em um local remoto pode auxiliar e/ou direcionar procedimentos em uma sala de operação em qualquer lugar do mundo. Na telecirurgia, o cirurgião de um local distante controla um robô que efetivamente conduz a cirurgia. Na telepresença, o cirurgião de um local distante serve como instrutor para orientar os cirurgiões na sala de operação real usando a videoconferência bidirecional (ou, como alternativa, um instrutor cirúrgico simulado ou animado gerado por computador é projetado na sala de operação real). Tanto na telepresença como na telecirurgia, os cirurgiões à distância podem ver a sala de operação real com as imagens geradas pela câmera e transmitidas em tempo real.

FIG. 36.16 Telecirurgia via satélite usando háptica e robótica. A imagem mostra a conceituação de como os cirurgiões poderão em algum dia conduzir a cirurgia da Terra para o espaço. (Cortesia do médico Joseph Rosen.)

Uma breve descrição dos “teletermos” específicos relacionados à telecirurgia pode ajudar o leitor. O termo “teleoperação” significa fazer o trabalho à distância. A “telecirurgia” refere-se a fazer uma cirurgia à distância. Por exemplo, um cirurgião em determinada região pode controlar um robô cirúrgico que esteja em um local remoto (isso é conhecido como telerrobótica). A telerrobótica é ilustrada na Figura 36.15 com um cirurgião robótico traçado em linhas gerais, embora, na prática, o sistema telerrobótico possa parecer mais com o sistema da Vinci (Fig. 36.2). O cirurgião aparece usando um console de controle e um sistema de visualização no local, e controlando o robô, que realiza efetivamente a operação. O local remoto também deve dispor de uma câmera para enviar as imagens da visão do robô de volta para o cirurgião. A telepresença é a sensação de estar em um local onde não se está fisicamente presente. O melhor exemplo atual disso é a videoconferência, que possibilita que as pessoas estejam “presentes” através de dois sentidos: visão e audição. No exemplo cirúrgico, a telepresença pode ocorrer no caso em que um cirurgião especializado estaria projetando sua imagem em uma sala de operação remota por meio de uma teleconferência bidirecional, orientando outros cirurgiões em tempo real. Os cirurgiões da sala de operação veriam o orientador através do monitor na sala cirúrgica e o orientador veria igualmente uma imagem da sala de operação e do campo cirúrgico. Outra possibilidade seria o emprego da telepresença virtual, em que um orientador cirúrgico gerado por computador (talvez uma animação ou um simulador) seria projetado na sala de operação real para ajudar os cirurgiões (Fig. 36.15).

Telemedicina móvel ubíqua Há ainda enormes barreiras a serem superadas antes que a telemedicina possa ser incorporada de forma ubíqua. Devemos comprovar que essa prática apresenta uma boa relação custo-benefício, resolver questões de reembolso de planos de saúde, solucionar questões jurídicas relacionadas à concessão de licença para médicos que trabalham em diversos estados e fora da fronteira nacional e proporcionar uma conectividade e largura de banda suficientes para a prática. A tecnologia da telemedicina ainda será importante nos debates contínuos relacionados ao atendimento médico, visto que ela promete oferecer uma maior qualidade dos cuidados com um custo reduzido. A telemedicina tem potencial para transformar o papel do cirurgião como prestador de serviços médicos ao tornar o acesso ao atendimento mais barato e mais rápido como parte de um sistema de atendimento médico.88 Os provedores de serviços médicos não terão que receber as teleimagens por e-mail ou estar fisicamente presentes em uma sala com equipamentos caros de videoconferência, mas estarão conectados a uma rede por dispositivos portáteis que lhes permitirão ter acesso a dados e diagnósticos de um caso, formular um plano para o paciente, supervisionar cirurgia e realizar consultas em tempo real.

Convergência tecnológica Na escada reconstrutiva para o século XXI, o cirurgião plástico é capaz de ponderar os riscos e os benefícios associados à correção de uma deformação da face ou do membro com diversas opções: por meio da cirurgia reconstrutiva, usando técnicas de microcirurgia, ou ainda, por meio da substituição usando uma prótese robótica, transplante de tecido humano, medicina regenerativa ou engenharia de tecido. Os diagnósticos, as terapias e as redes de comunicação estão todos sendo auxiliados pela robótica, pela simulação e pela telemedicina. Essas tecnologias dependem da potência e velocidade do processador e da largura de banda utilizada na tecnologia/comunicação da informação/gestão da informação, todos as quais no futuro serão mais rápidas, mais baratas e melhores. Isso favorecerá a tomada de decisões de diagnóstico por meio de dispositivos menores e mais inteligentes ligados a uma rede maior, cujos recursos estarão cada vez mais convergidos. Agora é possível acessar o Plastic and Reconstruction Surgery Journal pelo computador, notebook e até mesmo pelo celular. No futuro, seremos capazes de colocar simuladores em um celular para ver e participar remotamente de uma telecirurgia através desse ou de outro dispositivo portátil.

Conclusão A revolução das informações está transformando a medicina, a cirurgia e, essencialmente, a cirurgia plástica em três grandes áreas – robótica, simulação e telemedicina. O objetivo deste capítulo foi dar um entendimento básico de todas as tecnologias atuais e futuras nessas três áreas, a fim de ajudar os cirurgiões plásticos a aprimorarem seu instrumental com uma maior variedade de soluções para problemas clínicos e cirúrgicos. Os robôs trazem novas tecnologias para a cirurgia e aceleram a introdução de inovações cirúrgicas. A simulação treina os cirurgiões no uso da robótica e permite que os médicos transformem novas tecnologias cirúrgicas em conhecimento e habilidades de procedimentos. A telemedicina possibilita o uso da simulação à distância e usa a robótica para a execução da telerrobótica e da telecirurgia. Todas essas áreas estão evoluindo mutuamente e, no futuro, essas três tecnologias misturar-se-ão cada vez mais às novas tecnologias em uma tentativa contínua de reduzir os custos e os riscos e de aumentar os resultados e a qualidade de vida.

Agradecimentos Os autores agradecem às médicas Carolyn L. Kerrigan e Phoebe Arbogast, pela ajuda especializada na revisão e edição deste capítulo. Agradecemos também aos diversos médicos e desenvolvedores de produtos que nos ajudaram a revisar o capítulo e nos forneceram comentários, conteúdo e imagens.

Im a ge ns e x t ra s pa ra e st e ca pít ulo e st ã o disponíve is e m h p://www.e x pe rt consult .com Fig. 36.1 Mão mecânica de armadura. (Reproduzido de Paré A. Instrumenta chyrurgiae et icones anathomicae, 1564. Publicado em Arnold K., Olsen D., Medicine Man, The Forgotten Museum of Henry Wellcome. London, British Museum Press, 2003:236.)

Acesse a lista completa de referências em http://www.expertconsult.com

  25. Hopkins Applied Physics Lab Awarded DARPA Funding to Test Thought-Controlled Prosthetic Limb System. July 14, 2010 Press Release of The Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory. Available online at: http://www.jhuapl.edu/newscenter/pressreleases/2010/100714.asp. Accessed 17/11/11. 26. Sistema cirúrgico robótico da Vinci. Disponível on-line em: http://www.davincisurgery.com/davincisurgery/. Também em: http://www.intuitivesurgical.com/products/. Acesso em 17 de nov. 2011.Estes sites descrevem o que é a cirurgia robótica e o principal sistema cirúrgico robótico disponível atualmente, o sistema da Vinci, incluindo as

perspectivas dos cirurgiões, os tipos de procedimentos e os resultados clínicos. 36. Burdette, T. B., Long, S. A., Ho, O., et al, Early delayed amputation: A paradigm shift in the limb salvage timeline for the patient with major upper extremity injury. J Rehabil Res Dev 2009; 46:385–394 Available online at: http://www.rehab.research.va.gov/jour/09/46/3/pdf/burdette.pdf. Accessed 17/11/11 Disponível online em: http://www.rehab.research.va.gov/jour/09/46/3/pdf/burdette.pdf. Acesso em 17 de nov. 2011. Este artigo descreve um cronograma para ajudar o cirurgião plástico a decidir entre a amputação e o salvamento do membro, e fornece informações sobre as próteses de membros.

54. Berryhill, R., Jr., Jhaveri, J., Yadav, R., et al. Robotic Prostatectomy: A Review of Outcomes Compared with Laparoscopic and Open Approaches. Urology. 2008; 72:15–23. Esta é uma análise baseada em população de 22 estudos, com 40 pacientes ou mais, que compara a prostatectomia radical robótica (PRR), usando o sistema da Vinci, a prostatectomia radical laparoscópica (PRL) e a prostatectomia radical aberta (PR).

64. Rosen, J. M., Long, S. A., McGrath, D. M., et al. Simulation in Plastic Surgery Training and Education: The Path Forward. Plast Reconstr Surg. 2009; 123:729–738. Este artigo descreve o programa de treinamento de residentes da American College of Surgeons para simulação em cirurgia geral e como ela pode ser aplicada aos programas de treinamento em cirurgia plástica.

66. Sachdeva, A. K., Pellegrini, C. A., Johnson, K. A. Support for Simulation-based Surgical Education through American College of Surgeons-Accredited Education Institutes. World J Surg. 2008; 32(2):196– 207. 72. BioDigital SmileTrain Cleft and Palate Viewer. Disponível on-line em: http://www.biodigital.com/smiletrain/download.html. Acesso em 17 de nov. 2011. 84. Marescaux, J., Leroy, J., Gagner, M., et al. Transatlantic robot-assisted telesurgery. Nature. 2001; 413:379– 380. 87. Christensen, C. M., Grossman, J. H., Hwang, J. The Innovator’s Prescription: A Disruptive Solution for Health Care. New York: McGraw Hill; 2009. [24]. 88. Koop, C. E., Mosher, R., Kun, L., et al. Future delivery of health care: Cybercare. IEEE Eng Med Biol Mag. 2008; 27:29–38. Este artigo descreve quantos dos problemas associados ao atual sistema de atendimento médico dos Estados Unidos poderiam ser solucionados ao proporcionar atendimento médico através de redes distribuídas (“Cybercare”) baseadas em telemedicina e tecnologias relacionadas.

Índice Nota: Números de páginas seguidos por f referem-se a figuras; números de páginas seguidos por t referem-se a tabelas; e números de páginas seguidos por q indicam quadros. A abdome cirurgia robótica, 863 classificação de retalhos de vísceras abdominais, 521 classificação de retalhos, 553t, 555f complicações cuidados pós-operatórios e acompanhamento retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 553–554 considerações anatômicas defeitos da parede abdominal em crianças onfalocele e gastrosquise diretrizes fotográficas, 110f, 115–116 infiltração, 143, 144f reparo de aneurismas da aorta abdominal (AAA), 843 abdominoplastia clássica abdominoplastia com pequena/minicicatriz abdominoplastia com tensão lateral (HLT) manejo pré/intra/pós-operatório, 537–538 seleção de pacientes zonas reconstrutivas, 553f abrasões, 241 Academia Americana de Cirurgiões Ortopédicos acantomas, 720 ácido ascórbico, 282 ácido desoxirribonucleico (DNA) características, 177, 182 expressão gênica, 179–180 mecanismos epigenéticos, 181, 182 organização genômica do DNA, 178, 179 regulação gênica, 180, 181 acrocórdon, 730 activina, 270t, 274 adenina, 177, 182 adenite tuberculosa cervical (Scrofula) adenovírus, 186–188 adesivos e colas adesivos teciduais de fibrina, 793 características, 792q cianocrilatos, 793 gel de plaquetas, 793

pesquisas, 792–793 adolescentes cirurgia estética, 45, 46 agências, 98 agentes anticoagulantes, 582 agentes antiproliferativos azatioprina, 821–823, 833t micofenolato de mofetil, 822, 823, 833t Albucasis® (Abu-l-Qasim), 14–15 alemtuzumab, 821t, 825–826 alfa-hidroxiácidos (AHAs) alginato, 289t AlloDerm ® cartilagem, 831 definição, 815 enxertos de pele, 325t, 829 osso, 830 reparo e enxerto de nervos, 473, 475, 831 American Joint Committee on Cancer (AJCC) Staging Manual, 749–761 amniocentese, 199 amostras de vilos coriônicos (CVS), 198 amputações dedos, 766–768, 769f feridas agudas, 241 inovação cirúrgica, 5 reinervação (TMR) bactéria anaeróbica, 249–250 análise custo-benefício (CBA), 167 análise custo-eficiência (CEA), 167 análise custo-utilidade (CUA), 167 análise de raio X tumores de tecido mole e cutâneos, 710 análise do equilíbrio, 73f anestesia anestesia local, 137–149 absorção, 147 anestesia carbonatada, 140, 140f, 148 complicações discussão geral, 137 efeitos preventivos, 148–149 efeitos vasocontritores, 147 epinefrina, 139, 140f, 147–148 escolha de sedação, 138 infiltração abdominoplastias, 143, 144f aumento de mama, 142–143 características, 140–144 lifting facial, 140, 141f lipoaspiração, 143–144 redução de mama, 141–142 medicamentos de sedação, 138–139

agentes vasoconstritores, 139–140 anestesia carbonatada, 140 características, 139–140 drogas anestésicas, 139 pré-medicação, 138 resumo da pesquisa, 149 seleção de pacientes, 137–138 roxicidade, 147–148 variabilidade de ações, 146–147 cirurgia microvascular sem retalho, 611 sistema de classificação de risco da Sociedade Americana de anestesiologia (ASA), 125, 125–126 anestesia carbonatada, 140, 148 aneuploidia, 184 aneurismas, 677t angiogênese aumento da viabilidade do retalho pediculado, 579 células-tronco específicas do tecido, 230, 231f cicatrização de feridas, 250–251, 252, 260 cicatrização de feridas de pele, 271 efeitos da expansão do tecido, 624 angiografia tumores de tecidos moles e cutâneos, 170 angioleiomioma, 731–732 angioma cavernoso, 676–678 angioma racemoso, 676–678 angioma simples, 676–678 angiossarcomas, 671, 741, 742 angiossomo angiografia por tomografia computadorizada, 483f artérias cutâneas, 482f características, 480–482 perfurantes arteriais, 482, 483f rede de vasos, 483f animação, 865, 867f anorexia nervosa, 49q anos de vida ajustados pela qualidade (QALYs), 164–165 antígeno associado ao linfócito T citotóxico (CTLA-4), 783 antígenos dos grupos sanguíneos, 816 anti-IL-2, 821t, 825 antitrombina, 243f apligraf, 337, 794t, 795 apoptose, 661–662 articulações digitais, 421–423 aspirina caso V (hipoplasia grave mamária bilateral e deformidade tuberosa) aspirina, 67–68, 71f, 582, 615–617 Associação Americana de Cirurgiões Plásticos e Cirurgiões-Dentistas, 24 ateroma, 719, 720f atresia, 677t aurículas acessórias, 732–733 autoenxertos

cartilagem, 830–831 definição, 815 enxertos de nervos, 831 enxertos de pele, 325t, 828–829 osso, 829–830 autoenxertos de epitélio em cultura (CEA), 336–337 avulsões feridas agudas, 241 lesões nervosas, 466t, 467–468 axonotmese, 464–465 azatioprina, 821–822, 833t B bacilo Calmette-Guérin (BCG), 205–206 balancete, 67–68, 71f Baronio, Giuseppe, 19 basiliximab, 821t Bell, Sir Charles, 1 schwanoma, 727, 728f tumores benignos de origem da crista neural fibroma, 728 mancha mongólica, 726–728 melanose de Becker, 725 neuromas, 727 nevo azul, 727 nevo de células pigmentadas características, 723–725 lentigo simples, 723–724 melanoma juvenil, 724–726 nevo congênito de células pigmentadas, 724, 725f nevo de células pigmentadas adquirido, 724 nevo displásico, 724 nevo de Ito, 726, 727f nevo de Ota, 725–726 nevo lentiginoso salpicado (nevo spilus), 725, 726f tumores benignos de origem de apêndices cistadenoma apócrino, 722–723 cisto triquilemal, 722 esteatocistoma múltiplo, 723, 724f nevo sebáceo, 721 pilomatricoma, 721, 722 siringoma, 722 siringoma condroide, 723 tumores benignos de origem epitelial ceratoacantoma, 719 ceratose seborreica, 719 cisto dermoide, 720, 721f cisto epidermoide, 719, 720f mílio, 719–720 nevo epidérmico, 718 tumores benignos de origem mesenquimal

acrocórdon, 730 aurículas acessórias, 732–733 cicatrizes hipertróficas, 730 cicatrizes queloides, 730 cisto mucoso da mucosa da cavidade oral, 736 dermatofibroma, 729 fibroma de tecido mole, 730 fibroma pêndulo, 730 granulomas, 733–734 hemangioma cavernoso, 735 leiomioma, 731–732 lipoma, 731, 731–733 malformação arteriovenosa e fístula arteriovenosa (AVM), 735, 736f malformação capilar hemangioma moriforme, 734–735 hemangioma simples, 734, 734–735 malformação linfática, 736 malformação venosa, 735 rabdomioma, 732 tumor do glomo, 734 tumores osteocondrogênicos, 732, 733f xantogranuloma juvenil, 729–730 xantoma, 729 biglicana (BGN), 432 BioDigital Systems, 867, 867–868 bioengenharia enxertos de pele, 337–338 reparo do nervo e enxertos, 476 substitutos de pele, 289t, 290 substitutos de pele fabricados por bioengenharia, 793–795 biofilmes, 250 biomateriais células-tronco, 233, 234 reparo, reconstrução e regeneração tecidual, 187–189 biomedicina, 212–213 bioprotéticos, 795, 796 biópsias detecção de melanoma, 764 bis(2-cloroetil)nitrosoureia (BCNU), 779 Blair, Vilray, 23–24, 27 bleomicina, 309–310, 692–693 bochechas excisão de melanoma, 766, 767f retalhos de bochechas, 22–23 Bone Anchored Hearing Aide (BAHA), 799–800 BoneSource®, 461 Borges, Albert F, 316 bradicardia, 145 bradicinina, 268–269 braquiterapia, 656–657 braquiterapia biológica, 6

Brava bra, 7 BREAST-Q, 162–164, 171 aspectos psicológicos, 41–42 atrasado versus imediato diagrama esquemático, 548f manipulação cirúrgica, 578 cirurgia estética no adolescente, 45t diretrizes fotográficas, 110f, 113f enxertos de gordura, 342–346, 346–347 expansão tecidual áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 princípios básicos, 640–647 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 infiltração, 141–142 mama imatura, 648 mama tuberosa, 647 princípios básicos, 647–648 síndrome de Poland, 648, 649f pesquisa dos serviços de saúde e medicina com base em evidências, 160–161 reconstrução da mama pós-mastectomia princípios básicos, 640–647 reconstrução secundária da mama, 644, 646f retalhos miocutâneos transversos do músculo reto do abdome (TRAM) procedimento básico, 546–549 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 546–549 técnica cirúrgica e tratamento enxertos de pele, 342 inovação cirúrgica, 851, 852 Brophy, Truman, 23–24 bulbo (folículo piloso), 321, 322f bulimia nervosa, 49q bupivacaína, 139, 140f, 147–148 segurança do paciente, 129–130 Burian, Frantisek, 23 Burke, Jack, 368 considerações psicológicas, 42–43 expansão tecidual, 629, 638f C cabeça ácido hialurônico, 270–271, 376f ácido hipocloroso (HOCl), 256 anestesia local, 145 anomalias estruturais, 681 anomalia vascular associada a PTEN (homólogo da tensina e fosfatase)- (PTEN-AVA) antígeno leucocitário humano (HLA), 815–816

apresentação do paciente e diagnóstico, 747–748, 749 aspectos psicológicos, 43–44 características, 680–681 células-tronco hematopoiéticas (HSCs), 263, 369–371 cicatrização da ferida, 265, 283–284, 293f, 302, 303f, 307–308 cicatrização da ferida, 242–243, 245 cicatrização da ferida, 256–257, 260 cininogênio de alto peso molecular, 243f, 244 cirurgia árabe, 14–15 cirurgia estética e reconstrutora, 13 cirurgia estética facial, 131–132 cirurgia estética pós-guerra, 28 cirurgia plástica moderna, 20–23 cirurgia plástica pós-guerra, 25, 25–26 cirurgias, 15–17 cirurgiões plásticos, 26–28 cisto associado ao papilomavírus humano, 720 complexo saúde-industrial, 64–65 complicações do enxerto de pele, 334 correlações clínicas, 216–217 corticosteroides intralesionais, 682 corticosteroides sistêmicos, 682–684 corticosteroides tópicos, 682 cuidado da ferida, 682 declínio da cirurgia, 18 definição, 214–215 diagnóstico, 681 egípcios, 11–12 estratégias de tratamento, 687–688 excisão de melanoma, 766, 767f expansão tecidual áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 princípios básicos, 640–647 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 fase de involução (final da infância), 684 fase de involução (infância), 678f, 684–685 fase de proliferação (infância), 677f, 684 fator de crescimento epidérmico ligado à heparina (HB-EGF), 270t, 275 fator indutor de hipóxia 1 (HIF-1), 260 fator indutor de hipóxia 1 α (HIF-1α), 441–442 Health Insurance Portability and Accountability Act (HIPAA, 1996), 92–93 Heister, Lorenz, 18 hemangioendotelioma, 677–678 hemangioma infantil (HI), 680 hemangioma simples, 734, 734–735 hemangiomas de cabeça e pescoço, 680

hemangiomas hepáticos, 680–681 hemangiomas múltiplos, 680 hemangiomatose, 680 hemangioma verrucoso (VH), 677t, 695 Henry of Mondeville, 15 heparina, 582, 615–617 heteroenxerto, 325t hidrocoloides, 289t hidrogel, 289t, 376–377, 627 hidroxiureia, 779 hiper-rejeição aguda, 819 hipertensão hipocondríacos, 33 hipotensão, 145 hipoxantina, 575 hirudina, 617 Hirudo medicinalis, 617 histamina, 573–574 histiocistoma, 736 histórico da cirurgia plástica, 11–28 homoenxertos, 325t hormônio de crescimento humano (hGH), 189–190 Idade Média Império Bizantino, 14 Índia, 12–13 jornais/revistas científicas, 24–25 laserterapia, 684 mama hipoplásica mama imatura, 648 mama tuberosa, 647 princípios básicos, 647–648 síndrome de Poland, 648, 649f mama imatura, 648 mama tuberosa, 647 manejo da ferida, 11 manejo de recursos humanos, 83–84 manifestações clínicas, 687, 688 marcadores hematopoiéticos (CDs), 370 matriz dérmica acelular humana (HADM), 796 Mesopotâmia, 12 observação, 681 origens, 25–26 patogênese, 678–680 peróxido de hidrogênio (H2O2), 256, 575 personalidade histriônica, 36 pesquisa atual e aplicações, 215, 216 pesquisas, 214–215 princípios básicos, 647–648 programas de treinamento, 23–24 Projeto Genoma Humano, 191–192 proteoglicana de sulfato de heparina (HSPG), 180f

radical hidroxila (OH), 575 radioterapia, 668–669 reconstrução do nariz, 16–18 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 542–546 rinoplastia, 26f Roma, 13–14, 14 sarcoma histiocítico, 742 sarda de Hutchinson, 747, 748f século XIX, 19–20 século XVIII, 18–19 síndrome de Poland, 648, 649f sistema de classificação patológica, 714f sistemas de classificação, 677t sociedades científicas, 24 tecnologia de informação em saúde (HIT), 171 telangiectasia hemorrágica hereditária (HHT), 677t, 696–698 terapia embólica, 684 terminologia, 678t textos impressos, 15 tumores benignos de origem mesenquimal, 730, 731f universidades, 15 via de sinalização Hedgehog, 428–429 vírus da hepatite B, 459 vírus da hepatite C, 459 vírus da imunodeficiência humana (HIV), 459 vírus herpes simples, 186–188 cálcio (Ca) alginato de cálcio, 289t fosfato de cálcio (CaP), 445, 460–461 sobrecarga Ca2+ intracelular, 576, 577 calicreína, 243f, 244 calvície padrão masculino de calvície, 633–635 câmera digital de reflexo por lente única (dSLR), 117–119 câmeras, 117–119 câmeras digitais, 117–119 Camper, Petrus, 18 Canadian Institutes for Health Research (CIHR), 168–169 carcinoma de células basais análise dermoscópica, 709 características, 737 classificação histológica, 738q coloração dos tumores, 709 margens cirúrgicas, 717q carcinoma de glândula de Zeis, 738 Carpue, Joseph Constantine, 18–19 cartilagem aloenxertos, 831 autoenxertos, 830–831 características, 397–398 cartilagem auricular, 413–419

células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC), 226–227 condrossarcoma, 741 contorno facial, 419–421 controle de estrutura tridimensional (3D), 423 discussão geral, 398–408 engenharia da cartilagem baseada nas células-tronco, 423 engenharia da cartilagem in vitro, 423–424 enxertos de cartilagem auricular, 398–404, 405f enxertos de cartilagem da costela, 407–411 enxertos de cartilagem nasal, 404–407 enxertos pericondriais autólogos, 408–413 estudos histológicos, 398f perspectivas futuras, 423–424 pesquisas, 413 princípios básicos, 413 reconstrução, 421–423 reparo e enxerto, 397–424 reparo e reconstrução da cartilagem articular, 421–423 rinoplastia, 419–421 rinoplastia endonasal, 393–394 xenoenxertos, 831 cartilagem auricular, 398–404, 413–419 Integração osteocraniofacial, 800–802 cascata do complemento, 816 desafios no transplante de tecidos, 815, 831–834, 837–839 inovação cirúrgica, 2–3 microcirugia vascular, 620 reabilitação e avaliação funcional, 835–837 CATCH, 22, 195 Celsus, Aulus Cornelius, 13–14 células de determinantes comuns, 816–819, 827–828 células dendríticas, 818 células-tronco estromais/células-tronco derivadas de tecido adiposo (ASCs) ASCs humanas versus camundongos, 219 características, 217, 218 células-tronco pluripotentes induzidas, 236 engenharia de tecidos, 369–371 enxertos de gordura, 345–346 métodos de colheita, 218, 219 métodos de liberação, 220 modelos in vivo correlações clínicas, 223 defeito de calvária de 4 mm em camundongo atímico nu (nude), 221–223 perspectivas futuras, 223, 224–225 protocolos de diferenciação in vitro diferenciação adipogênica, 221, 222f diferenciação condrogênica, 221 diferenciação osteogênica, 220–221 receptores de superfície celular, 219–220 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) cicatrização da ferida, 262

correlações clínicas, 228 definições, 223–224 modelos in vivo, 226–228 pesquisa atual e aplicações, 224–226 protocolos de diferenciação e colheita de tecido in vitro, 226 tendões de engenharia/substitutos de tendões, 352–353 terapia genética, 190 células-tronco sanguíneas, 261, 264 Center for Devices and Radiological Health (CDRH), 847–849 cerâmicos, 375, 792 ceratose actínica, 736 césio (Cs), 656 Chauliac, Guy, 15 cianocrilato, 793 cicatrização da ferida, 240–266 ácido microrribonucleico (miRNA) angiogênese, 260 características, 259–260 células-tronco, 260–261 resposta à hipoxia, 260 resposta inflamatória, 259–260 aspectos históricos, 241 biofilmes, 250 células-tronco ácido microrribonucleico (miRNA), 260–261 características, 261–262, 264 células-tronco pluripotentes induzidas, 264 cicatrização da ferida da pele, 296 processos de regeneração, 261, 264 cicatrização da ferida da pele, 267–296 aspectos históricos, 267 cicatriz excessiva características, 283–285 cicatrizes hipertróficas, 283–284 cicatrizes queloides, 284t, 284–285 comparações entre o reparo da ferida em adultos e o reparo no feto diferenças celulares, 277 diferenças na matriz extracelular (MEC), 278 diferenças no expressão gênica, 278 diferenças no reparo, 277–278 expressão do fator de crescimento, 278 curativos classificações, 287–289 dispositivo de vestimenta subatmosférica, 288, 289t terapia de compressão, 288, 289t estratégias de tratamento algoritmos de tratamento, 290–291, 293f cicatrizes hipertróficas de queimaduras abrangentes, 293, 294 cicatrizes hipertróficas imaturas, 291–293 cicatrizes hipertróficas lineares, 292–293 efeitos da cirurgia plástica, 294–295

feridas abertas crônicas, 287 perspectivas futuras, 295–296 queloides maiores, 293f, 294 queloides menores, 293f, 294 tecido necrótico, 287 tratamentos emergentes, 294–295 fase de proliferação angiogênese, 271 contração da ferida, 271–272 formação da matriz extracelular (MEC), 269–271 formação do tecido de granulação, 271 resurfacing epitelial, 272–273 feridas que não cicatrizam características, 279–283 fatores que influenciam, 280t feridas da extremidade inferior, 279–281 feridas isquêmicas, 279–281 infecção da ferida, 281–282 lesões por radiação, 281 pacientes obesos, 282 subnutrição/desnutrição, 282 tratamento médico, 282–283 úlceras de pressão, 279 úlceras diabéticas, 281 úlceras venosas, 279 manejo clínico da ferida curativos das feridas, 287–289 discussão geral, 285–295 feridas abertas, 286–287 feridas excisionais, 286–287 feridas fechadas, 285–286 feridas incisionais, 285–286 substitutos de pele, 289t, 290 tratamento da cicatriz excessiva, 290–291 tratamento da ferida, 284 tratamento farmacológico, 290 patologia das feridas do adulto cicatriz excessiva, 283–285 feridas que não cicatrizam, 279–283 perspectivas futuras terapia com protease, 295 terapia genética, 295 tratamento com células-tronco, 296 tratamento com fator de crescimento, 295 regulação do fator de crescimento características, 273–275 fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), 274 fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), 275 fator de crescimento epidérmico ligado à heparina (HB-EGF), 275 fator de crescimento fibroblástico (FGF), 274–275 interações de fatores de crescimento e matriz extracelular, 275

superfamília do fator de crescimento transformador β (TGF-β), 274 reparo da ferida em adultos características, 268, 273 comparação com o reparo da ferida no feto, 277–278 fase de inflamação, 268, 269 fase de proliferação, 268f, 269–273 fase de remodelamento, 268f, 273, 276f formação de cicatriz, 276f reparo da ferida no feto cicatrização da ferida, 276–278 comparações com reparo da ferida no adulto, 277–278 expressão do fator de crescimento, 278 transição de formação de cicatriz a cicatrização sem cicatriz, 277 tratamento da cicatriz excessiva classificação da ferida, 290, 291t prevenção e tratamentos de redução, 291, 292t tratamentos, 290–291 cicatrização de feridas, 240–266 cicatrizes biologia e formação de cicatriz, 300, 301–302 características e funções, 264–266, 301–302, 304 cicatrização fetal regenerativa, 265–266 cicatrizes hipertróficas, 265, 283–284, 302, 303f, 307–308 cicatrizes imaturas, 302t cicatrizes maduras, 302t cicatrizes queloides, 265, 284t, 284–285, 302–304, 308–309 correção de cicatriz, 316, 317f cuidado pós-operatório e acompanhamento, 316–317 estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 fechamento da ferida contração e reepitelização, 252–253 fase de proliferação, 253 tecido de granulação, 253 feridas agudas, 241, 242 feridas crônicas definição, 253–256 estratégias de tratamento, 287 infecção da ferida, 249–250 úlceras arteriais, 253–254 úlceras de pressão, 255–256 úlceras diabéticas, 254, 255 úlceras venosas, 253 hemangioma infantil (HI), 682 hemostasia, 242–243, 245 hipóxia, 257f infecção da ferida, 249–250, 281–282, 306 isquemia da ferida desequilíbrio do oxigênio, 257–258

hipóxia, 256–259 oxigenação do tecido, 256–257, 259 sinalização redox, 258–259 síntese de óxido nítrico (NO), 259 manejo cirúrgico manejo da ferida aspectos históricos, 11 reparo do tecido, 189–190 processo de cicatrização de feridas, 242 reparo do tecido, 189–190 resposta inflamatória ácido microrribonucleico (miRNA), 259–260 ativação plaquetária, 245 características, 245, 249 diapedese, 245, 246f infiltração de neutrófilos, 245–247, 256–257, 268–269, 271f macrófagos, 245f, 248, 256–257, 268, 269, 271f mastócitos, 245f, 247–248 migração de leucócitos, 245, 246f receptores toll-like (TLRs), 247 resolução da inflamação, 248–249 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 571–572 tratamento da ferida com pressão negativa (NPWT), 850, 851 úlceras diabéticas, 281 vascularização, 250–252 cicatrizes de acnes, 311–312 ciclo-oxigenase-2 (COX-2), 433 ciclosporina, 822t, 823, 833t cimento em pasta BoneSource, 461 fosfato de cálcio (CaP), 460–461 materiais osteoatrativos, 461–462 Medpor, 462 metilmetacrilato, 462 Norian SRS/CRS, 461 cirurgia árabe, 14–15 cirurgia estética aspectos psicológicos, 39 cirurgia estética em adolescentes, 45, 46 cirurgia estética pós-guerra, 28 cirurgiões plásticos, 26–28 origens, 25–26 rinoplastia, 26f segurança do paciente, 131–132 cirurgia estética facial aspectos psicológicos, 39 segurança do paciente, 131–132 cirurgiões plásticos, 26–28 cisplatina, 779 cistadenoma apócrino, 722–723 cisteína, 269–271

cisto dermoide, 720, 721f citalopram, 51 citocinas células-tronco mesenquimais (MSCs), 225–226 cicatrização da ferida, 244–245 cicatrização da ferida da pele, 270t, 275 cicatrizes, 309–310 macrófagos, 816 mediadores inflamatórios, 819–820 radioterapia (RT), 662 citosina, 177, 182 Claoué, Charles, 24 classificação Breslow do melanoma, 753–756 classificação de Clark de melanoma, 753–756 clomipramina, 51 cloro (Cl) cobalto (Co) composições de ligas metálicas, 786–787 ligas de cobalto e cromo, 787 cobre (Cu) distúrbios por deficiências, 282 código de ética, 57–58 Coelst, Maurice, 24 colagenases, 269–271 colágeno bovino colágenos, 243f, 270–271, 289t, 320, 431–432 colheita da calvária, 454, 455 colheita do ílio, 449–452 abdominoplastias, 143, 144f aço inoxidável, 786–787 adesivos teciduais de fibrina, 793 anergia, 827 anestesia local, 143–144 anomalias estruturais, 681 anormalidades cromossômicas hereditárias, 184 aplicações in vitro Apligraf®, 337, 794t, 795 aspectos históricos, 789–790 aumento da mama, 142–143 bioprotéticos mesh, 795, 796 características, 140–144, 213f, 235, 237, 626–627, 680–681, 789–790, 792q, 788–792 carga do implante, 805 cascata do complemento, 817 células dendríticas, 818 células natural killer (NK), 816–817 células-tronco mesenquimais (MSCs), 225–226 cerâmicas, 792 cianocrilatos, 793 cicatrização da ferida, 244–245, 264 cicatrização da ferida da pele, 270t, 275, 279–281 cicatrizes imaturas, 291t, 302t

cobertura muscular, 643–645 comparações de produtos comerciais, 794t complicações de expansão tecidual, 652 composição, 787t condicionamento pós-isquêmico, 584–585 condicionamento pré-isquêmico, 583 condicionamento pré-isquêmico remoto, 583–584 Conselhos de Revisão Institucional (IRBs), 8–9 correlações clínicas, 238–239 corticosteroides intralesionais, 682 corticosteroides sistêmicos, 682–684 corticosteroides tópicos, 682 cuidado da ferida, 682 declaração de renda, 67, 70f Dermagraft®, 337, 794t, 795 derme fetal bovina, 796 desequilíbrio do oxigênio, 257–258 diagnóstico, 681 discussão geral, 786–788, 816–819 engenharia de tecidos, 370–371 Epicel®, 794t, 795 expansão tecidual áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 princípios básicos, 640–647 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 expansores autoinfláveis, 627 expansores com portas distais, 627 expansores com portas integradas, 627 expansores de silicone, 627 expansores diferenciais, 627 fase de involução (final da infância), 684 fase de involução (infância), 678f, 684–685 fase de proliferação (infância), 677f, 684 fator de crescimento de insulina-1 (IGF1), 189–190, 234, 270t, 275, 428 fator de regulação do interferon 6 (IRF6), 194 fatores de transcrição, 235f feiura imaginária, 50, 51 feridas incisionais, 285–286 fisiopatologia da falha do retalho, 575–576, 617–618 função, 816–819 garantia implícita, 94–95 gel de plaquetas, 793 gene IRF6 (fator regulador de interferon), 194 gene Indian hedgehog, 428–429 granulócitos, 817 hemangioma infantil (HI)

hemangiomas da cabeça e pescoço, 680 hemangiomas hepáticos, 680–681 hemangiomas múltiplos, 680 hipóxia, 256–259 implante e posicionamento distal da porta, 628 implantes, 786–796 implantes com base em biomateriais, 786–796 imunoglobulinas, 817 imunoterapia, 204–206, 718 Índia, 12–13 infecção da ferida, 249–250, 281–282, 306 informações, 583–585 infundíbulo, 321, 322f inosina monofosfato (IMP), 821–822 inositol 1, 626f inositol 1, 4, 5-trifosfato (IP3), 5f inovações tecnológicas de imagem, 6 Institute for Healthcare Improvement, 170 Integra®, 794 integrinas, 270–271 intelectualização, 33 Interactive Craniofacial Surgical Atlas, 867 interface implante-tecido, 804–805 International Clinic of Oto-Rhino-Laryngology and Facio-Maxillary Surgery, 23–24 Internet e lei de difamação para blog, 98–99 Interplast®, 870 iodo (I), 656–657 ipilimumab, 782–783 irezumi, 297–298 irídio (Ir), 656 isoenxertos, 325t, 815 istmo, 321, 322f Ivy, Robert, 23 laserterapia, 684 leito ósseo, 805 lifting facial, 140, 141f ligação de célula T e ativação, 818 ligas de cobalto e cromo, 787 ligas de ferro (Fe), 786–787 ligas de ouro, 787 ligas de titânio, 787, 788f linfadenectomia inguinofemoral, 772–777 linfócitos B, 817 macrófagos, 816 mama imatura, 648 materiais de implante, 804 matriz dérmica acelular humana (HADM), 796 matriz dérmica acelular suína (PADM), 796 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 mediadores inflamatórios, 819–820 modelos in vivo, 238–239

mucosa de intestino delgado, 796 necrose isquêmica, 573 nevo intradérmico, 744 observação, 681 oxigenação do tecido, 256–257, 259 patogênese, 678–680 pericárdio bovino, 796 perspectivas futuras, 796–797 pesquisas, 792–793 platina (Pt), 788 poliéster, 791 polietileno, 791 polímeros biodegradáveis, 791–792 polipropileno, 791 politetrafluoretileno (PTFE), 790 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 preparo ósseo, 805 produção de lentivírus e transdução, 237 propriedade intelectual, 846–847 protocolos de diferenciação de fibroblastos, 237 protocolos de diferenciação in vitro, 237–238 questões médico-legais, 93–94, 105–106 radiação ionizante, 202–204 radioterapia modulada por intensidade (IMRT), 658, 659f radioterapia (RT), 662 receptor de célula T (TCR), 816–819, 826–827 reconhecimento do antígeno e rejeição do enxerto, 819 redução da mama, 141–142 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 571–572 riscos potenciais, 237, 237–238 seleção do implante, 628 silicone, 789, 790 sinalização redox, 258–259 síntese de óxido nítrico (NO), 259 sistemas de classificação, 677t substitutos de pele fabricados por bioengenharia, 793–795 técnica, 806–808 técnica cirúrgica do implante intramuscular, 806–808 técnica e estratégia de inflação do implante, 629 terapia embólica, 684 terminologia, 678t transferência de tecnologia institucional, 847, 848t transplante de tecido, 821t, 825 tratamento da cicatriz, 294–295, 309–310 tratamento do melanoma, 776–777, 782 condrossarcoma, 741 consultas clínicas, 151 contratransferência, 34 cirurgia robótica, 862–863 inovação cirúrgica, 8

cooperativas, 97 cornificação, 320 corporações, 85 corpos de Barr, 181 Cortesi, GB, 18 corticosteroides aspectos históricos, 27 hemangioma infantil (IH) corticosteroides intralesionais, 682 corticosteroides sistêmicos, 682–684 corticosteroides tópicos, 682 imunologia dos transplantes, 821, 822t craniossinostose características, 195–196 craniossinostose tipo Boston, 197t crioterapia, 308–309, 718 cromatina, 181, 182 cromo (Cr) composição com ligas metálicas, 786–787 ligas cobalto-cromo, 787 Curativos antimicrobianos, 289t cútis marmorata e telangiectasia congênita (CMTC), 677t, 689 D dacarbazina (DTIC), 778–779 daclizumab, 821t Dartigues, Louis, 24 defeitos congênitos e adquiridos, 44 Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA), 860–861 deficiência de zinco (Zn), 282 deformação, 192 DEKA Research and Development, 860–861 Delpech, Jacques Mathieu, 19 demora do retalho bipediculado, 513f depoimentos e narrativas, 93 Dermagraft®, 337, 794t, 795 dermatofibroma, 729 dermatofibrossarcoma protuberante (DFSP), 739 derme, 320, 322f derme fetal bovina, 796 dextrana, 582, 615–617 diabetes células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC), 226 úlceras diabéticas, 254, 255, 281 diacilglicerol (DAG), 626f diapedese, 245, 246f dipiradimol, 617 direito a garantias, 94–95 disceratoma verrucoso, 720 displasia, 193 dispositivos de acoplamento carregados (CCDs), 117–119

dissecção de cadáver, 15f características, 725, 726f distração óssea, 5–7 doença cardiovascular, 226 doença de Bowen, 736–737 E Egito antigo, 11–12 engenharia de tecido ósseo, 392–393 engenharia de tecidos adiposos, 387f, 389, 390 engenharia genética, 6 enxerto autólogo de nervo, 272–274 enxerto autólogo de veia, 472–473 enxerto de gordura autóloga Ver enxerto de gordura enxerto de osso esponjoso, 449 enxerto dérmico e reparação Ver enxertos de pele enxertos de Blair-Brown, 325–326 enxertos de Padgett, 325–326 enxertos de tecido composto, 365f, 366 enxertos de Wolfe-Krause, 325–326 enxertos ósseos xenogênicos, 460 epitelioma calcificante, 721, 722 espaço branco, 66 estratégia do oceano azul, 66 estudos de caso casos em série/relatos de caso, 156 estudos de casos controles, 155–156 inovação, 80q manejo de recursos humanos, 84q ética e publicidade, 59–60 exposição acidental à radiação, 673–674 F Facebook, 98–99 5-fluorouracil (5-FU), 309–310 abertura da artéria estrangulada, 579–580 abordagens de manejo, 618–620 agentes anticoagulantes, 582 agentes antiespasmódicos, 583 agentes trombolíticos, 582–583 analogia da escada reconstrutora, 534–536, 541 anestesia microvascular, 611 angiogênese, 580 aplicação clínica, 342–346, 347f, 348–350, 532f aplicações clínicas, 523–524, 528 arcabouço de tecido conjuntivo, 493–494 arco de rotação, 539–540 artérias, 497 aspectos históricos, 798 aspectos psicológicos, 39 atraso na cirurgia, 577–578

atraso vascular, 578 aumento da viabilidade do retalho pediculado, 580–582 avaliação do local doador e receptor, 609 avaliação do paciente, 608–609 avaliação pré-operatória, 500 avanço V-Y do tendão, 562–566, 568f Bone Anchored Hearing Aide (BAHA), 799–800 calvária vascularizada, 457–459 características, 68–69, 501–502, 516f, 557–560, 577–578 características gerais e resumo, 512–521 carga do implante, 805 cateter de Fogarty, 842 cavidade pulmonar, 552–553 células-tronco estromais/células-tronco derivadas de tecido adiposo (ASCs), 219, 344-347 células-tronco pluripotentes induzidas, 237 cicatrização da ferida, 234, 244 cicatrização da ferida da pele, 268f, 269–270, 270t, 271f, 274–275 cicatrizes, 264–265 cirurgia com retalho livre microvascular, 611, 612f cirurgia reconstrutora da extremidade inferior, 557–561 cirurgiões plásticos, 27, 28f classificação das vísceras abdominais, 521 classificação de Mathes-Nahai, 516–519 classificações, 513f, 519–521 colheita da fíbula, 452 colheita endoscópica, 611 complicações, 571–572 complicações no local doador, 618 conceitos anatômicos, 492, 500 condicionamento pós-isquêmico, 584–585 condicionamento pré-isquêmico, 583 condicionamento pré-isquêmico remoto, 583–584 conexão veia-músculo, 499 considerações sobre a pele, 540–541 considerações sobre o local doador, 537 considerações sobre o tempo, 610–611 construção protética, 808–810 convergência venosa, 494–495 correção de cicatriz, 316 costela vascularizada, 456–457 custo de oportunidade, 71 de avanço V-Y do tendão, 562–566, 568f definição, 342–350, 815 depleção de substâncias, 579 desenho do retalho, 577 desvantagens, 799q diagrama esquemático, 503f dimensões do retalho cutâneo, 502–504 diretrizes fotográficas, 114 diretrizes para seleção, 541–542 discussão geral, 499, 582–583, 810–812

empresas com fins lucrativos, 85 engenharia de tecidos, 381 enxertos de gordura, 345 escapular circunflexa e pedículos toracodorsais, 530f escapular circunflexa e pedículos toracodorsais, 530f escápula vascularizada, 455–456, 458f espumas, 289t estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 excisão de melanoma, 766–769, 770f, 771f expansão da área vascular, 579–580 expansão tecidual áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 princípios básicos, 640–647 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 expansão tecidual, 522, 630, 635, 648 fabricação do retalho, 6 Facial Cripples, 21 falha anastomótica, 614 falha do retalho, 614–618 Fallopio, Gabriele, 18 fatores causais, 582–585 fenômeno de atraso, 507–508 fenômeno sem refluxo, 577, 617–618 fibrina, 243f, 244, 793 fibrinogênio, 243f, 244 fibrocartilagem, 397, 398f fibroma pendulum (fibroma mole), 730 fibronectina, 243f, 244, 270–271 fibroxantoma, 736 fíbula vascularizada, 455, 457f Filatov, Vladimir, 21–22 filmes, 289t Fioravanti, Leonardo, 16, 17f flumazenil, 145 fluoxetina, 51 fluvoxamina, 51 fluxo de caixa descontado, 72–73 Food and Drug Administration (FDA), 847–849 fraude e abuso, 95–96 Fricke, Johann, 19 Fry, William, 21–22 funções especializadas, 537 histiocitoma fibroso, 729

índices de alavancagem, 69 índices de eficiência, 69 índices de liquidez, 69 índices de rentabilidade, 69 inervação cutânea, 255f infiltração, 140, 141f informações, 521–534, 583–585, 607–611 abas do retalho, 614 avaliação pré-operatória, 608–611 colheita endoscópica, 611 falha do retalho, 614–618 manejo pós-operatório, 613–620 resultados do retalho, 614 retalhos de estilo livre, 611 retalhos perfuradores, 611, 612f retalhos pré-fabricados/pré-laminados, 612–613 retalhos quiméricos, 612 informações, 607–611 abas do retalho, 614 avaliação pré-operatória, 608–611 colheita endoscópica, 611 falha do retalho, 614–618 manejo pós-operatório, 613–620 resultados do retalho, 614 retalhos de estilo livre, 611 retalhos perfuradores, 611, 612f retalhos pré-fabricados/pré-laminados, 612–613 retalhos quiméricos, 612 inovação cirúrgica, 7 interface implante-tecido, 804–805 lei do equilíbrio, 498 Lei Federal para Falsas Queixas (Federal False Claims Act), 96 leito ósseo, 805 lesão por isquemia-reperfusão, 575–576, 617–618 luz fluorescente, 107 manejo pós-operatório, 613–620 manejo pré-operatório e pós-operatório, 565–570 manipulação cirúrgica, 578 materiais de implante, 804 mediastino, 549–552 metas, 69–73 métodos de colheita, 342f músculo glúteo máximo aplicações clínicas, 523–524 características, 516f reconstrução perineal, 557 úlceras de pressão, 562–568 músculo glúteo máximo, 523–524, 562–568 músculo grácil, 562–565 músculo peitoral maior, 524, 525f músculo reto do abdome, 552–553

músculo sartório, 516f, 554–557 músculo serrátil anterior, 552 músculos tipo III (dois pedículos dominantes), 516–517 músculos tipo II (pedículo dominante vascular e pedículo menor), 516, 517t músculos tipo I (um pedículo vascular), 516, 517t músculos tipo IV (pedículos vasculares segmentares), 517 músculos tipo V (um pedículo vascular dominante e pedículos secundários vasculares segmentares), 517 necrose isquêmica, 573 omento, 553 origem e destino dos vasos, 499 parede abdominal, 553 perfuradores cutâneos, 496, 497 perspectivas futuras, 346–350, 585, 812–813 pés, 560–563 pesquisa anatômica vascular, 504–507 plástica facial Ver lifting facial posicionamento do paciente, 569–570 preparo ósseo, 805 procedimentos autógenos ancilares, 810, 811f processo de planejamento do tratamento, 805–806 proteínas citocinas angiogênicas, 581–582 radiação arterial, 494–495 radicais livres, 573–575 reação a corpo estranho, 306, 375 reconstrução, 799–804 reconstrução da cabeça e do pescoço, 542–546 reconstrução da mama, 546–549 reconstrução da orelha, 800–802 reconstrução da parede abdominal, 553, 553t, 555 reconstrução da parede torácica, 552–553 reconstrução da virilha, 554–558 reconstrução de queimaduras, 630 reconstrução do pé, 563f reconstrução do terço médio facial, 803–804 reconstrução facial, 798–813 reconstrução nasal osteointegrada, 802, 802–803 reconstrução orbitária osteointegrada, 802, 803 reconstrução perineal, 554–557 redução do fluxo do shunt (desvio) arteriovenoso (AV), 578–579 regeneração óssea, 435t, 437–438, 441–444 regime de manutenção, 809, 810f regulação gênica, 180, 181 relação de diferenciação e crescimento do tecido e orientação e crescimento dos vasos, 496, 497 relação nervo-vaso sanguíneo, 495–496 resposta da pele, 812 restauração da função muscular, 538 restauração do apoio esquelético, 538 resultados do retalho, 614 resumo de pesquisa, 508, 585 retalho bipediculado, 513f retalho composto da artéria ilíaca circunflexa profunda, 529f

retalho de avanço, 513f retalho de padrão axial, 515f retalho do músculo gastrocnêmio, 557–560 retalho do músculo latíssimo do dorso (LD), 552–553 retalho do músculo sóleo, 557–560, 561f retalho do radial do antebraço, 532f retalho padrão, 514 retalho padrão tardio, 514 retalho perfurador da artéria glútea superior (SGAP), 562–565 retalhos, 512–586 retalhos colabados, 614 retalhos com base distal, 531 retalhos combinados, 528–530 retalhos compostos, 508 retalhos da coxa, 557 retalhos de avanço V-Y e Y-V retalhos de estilo livre, 611 retalhos de fluxo reverso, 531, 532f retalhos delgados, 612 retalhos de pele com base distal, 501–503 retalhos do músculo flexor curto dos dedos, 560–562 retalhos do músculo tibial anterior, 526f retalhos fasciais, 630 retalhos fasciais/fasciocutâneos, 539 retalhos fasciocutâneos, 504 retalhos fasciocutâneos tipo A, 518, 519t retalhos fasciocutâneos tipo B, 518, 519t retalhos fasciocutâneos tipo C, 518, 519t retalhos livres, 630 retalhos miocutâneos, 630 retalhos miocutâneos transversos do músculo reto do abdome (TRAM) procedimento básico, 546–549, 578 retalhos musculares funcionais, 528 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 538–539, 552–553, 560–563 retalhos musculocutâneos, 504–505, 562–565 retalhos ósseos vascularizados, 524, 526f, 528 retalhos perfuradores, 505–507, 519–521, 539, 611, 612f retalhos pré-fabricados e pré-laminados, 530–531, 612–613 retalhos quiméricos, 612 retalhos sensitivos, 528 retalhos venosos, 533, 534f retorno do investimento, 72 rotação de retalhos classificações, 513f século XX, 20–23 segurança do paciente, 131–132, 536 seleção do retalho, 609–610 separação de células ativada por fluorescência (FACS), 219–220, 389–390 sistema da enzima mieloperoxidase (MPO), 575–576 sistema da enzima nicotinamida adenina difosfato (NADPH), 575–576 sistema da enzima xantina oxidase/xantina desidrogenase, 575

sobrecarga de Ca2+intracelular, 576, 577 sucesso protético, 812 taxa de divisão, 61–62 taxas de sucesso de implante individual, 810–812 técnica cirúrgica, 348, 806–808 técnicas de monitoramento do retalho, 570 tensor da fáscia lata (TFL), 562–565 terapia farmacológica, 580–581 terapia genética, 581–582 tolerância isquêmica, 617–618 transferência ilíaca vascularizada, 455, 456f transplante, 533–534 transposição de retalho segmentar, 522–524 transposição do retalho, 539–540 transposição reversa do retalho, 531–533 tríade de fogo, 132–133 triângulo de reconstrução, 536 trombogênese, 615–617 tumores de gordura Ver lipoma úlceras de pressão, 562–565, 568f úlceras de pressão isquiais, 562–566, 568f úlceras diabéticas, 254 valor líquido, 72–73 valor temporal do dinheiro, 70–71 vantagens, 455–459, 799 vantagens/desvantagens, 538–539, 608 vasoconstrição e redução da trombose, 580–581 vasoespasmo e trombose, 573–574, 615 veias, 497–498 veias avalvulares oscilantes, 498f, 499 veias direcionais, 498f, 499 veias profundas, 499–500 veias superficiais, 499–500 virilha, 554–558 família branca, 16–18 fator de crescimento do tecido conjuntivo (CTGF), 270t, 284 fator de Hageman, 268–269 análise de caligrafia, 95–96 avaliação de resultados, 835–837 ceratoacantoma, 719 ceratose actínica, 736 ceratose seborreica, 719 condrossarcoma, 741 defeitos adquiridos no trauma, 42 dermatofibroma, 729 diretrizes fotográficas, 114, 118f estado atual, 834–837 excisão de melanoma, 766–768 expansão tecidual, 648 folículos pilosos células-tronco específicas do tecido, 229

cicatrização da ferida da pele, 262, 263 efeitos da expansão tecidual, 631–633 enxertos de pele, 321, 322f imunossupressão, 834–835 mastectomia radical de Halsted, 202 osteossarcoma, 741 pacientes com ódio, 36–37 reabilitação e avaliação funcional, 835–837 schwanomas, 727, 728f sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 712f sistema haversiano, 42, 426 sobrevida do transplante, 834–835 técnica cirúrgica e tratamento enxertos de pele, 342 inovação cirúrgica, 851, 852 fator neutrófico derivado do cérebro (BDNF), 232 feridas agudas, 241, 242 feridas crônicas definição, 253–256 estratégias de tratamento, 284 infecção da ferida, 249–250 úlceras arteriais, 253–254 úlceras de pressão, 255–256 úlceras diabéticas, 254, 255 úlceras venosas, 253 feridas fechadas, 285–286 fístula arteriovenosa e malformação arteriovenosa (AVM), 735, 736f fluxo de caixa descontado, 72–73 fosfatase alcalina (ALP), 428, 432t, 434f

G Gastrosquise gelatinases, 269–271 gene Desert hedgehog, 428–429 gene mutado da ataxia telangiectasia (ATM) gene, 662 genética, 176–200 anormalidades cromossômicas hereditárias, 184 aplicações clínicas, 523–524 biomateriais, 187–189 características, 177, 182–185, 192–198, 273–275, 516f cicatrização da ferida, 234 cicatrização da ferida da pele, 295 cirurgia estética e reconstrutora, 24f colheita do trocanter maior, 452 craniossinostose, 195–196 craniossinostose sindrômica, 196–198 diretrizes fotográficas, 108, 110f dissomia uniparental, 183 doenças genéticas características, 192–198 craniossinostose, 195–196 nomenclatura, 192–193 engenharia de tecido ósseo, 393 engenharia de tecidos, 380–381 enxertos de gordura, 345 enxertos de pele, 21–22 ética, 191–192 expressão gênica, 179–180 fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), 274 fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), 275 fator de crescimento epidérmico ligado à heparina (HB-EGF), 275 fator de crescimento fibroblástico (FGF), 274–275 fator de estimulação de colônias de macrófagos-granulócitos (GM-CSF), 275, 369–371 fenda labial e palatina não sindrômica, 193–194 fenda labial e palatina sindrômica, 194–195 fendas orofaciais, 193 função, 198–199

glicocorticosteroides, 821 glicosaminoglicanas, 270–271, 320 Gore-Tex®, 790 Gorneygram®, 103 granulócitos, 817 granulomas, 733–734 guanina, 177, 182 guanosina monofosfato (GMP), 821–822 guanosina trifosfato (GTP), 822–823 herança autossômica, 182, 183 herança ligada ao sexo, 182, 183f herança mitocondrial, 183–184 informações, 176–177 inovação cirúrgica, 4–5 interações de fatores de crescimento e matriz extracelular, 275 leiomioma genital, 731–732 liberação do gene, 186–188 ligas de ouro, 787 linha geométrica, 316, 317f malformação venosa do glomo (GVM), 677t, 693–694 mecanismos epigenéticos, 181, 182 músculo glúteo máximo aplicações clínicas, 523–524 características, 516f reconstrução perineal, 557 úlceras de pressão, 562–568 mutações, 184 nomenclatura, 192–193 organização genômica do DNA, 178, 179 ouro (Au) perspectivas futuras, 199 polia de Gillies, 304 princípios básicos, 185–186, 191 questões éticas, 191–192 radionuclídeos, 656–657 reconstrução da virilha, 554–558 reconstrução de mama, 292 reconstrução do pé, 563f

reconstrução e regeneração do tecido, 190–191 reconstrução perineal, 554–557 regulação gênica, 180, 181 reparo do tecido, 189–190 reparo fetal da ferida, 278 síndrome de Gorlin, 194 superfamília, 274 tecido de granulação, 253 terapia genética mediada por células-tronco, 234 testes invasivos, 199 tipos e características, 270t tumores de células gigantes, 736 úlceras de pressão, 562–568 ultrassonografia, 198 unidade de medida gray (Gy), 664 vacina de gangliosídeo GM2, 779–782 volume tumoral macroscópico (GTV), 663 glândulas apócrinas, 322 globulina antilinfocitária, 821t, 824 globulina antitimócito, 821t, 824 guinea bisturi de Gulian, 326–327 cirurgia estética em adolescentes, 45t Guinea Pig Club, 5 Guy Chauliac, 15 H hemangioendotelioma kaposiforme (KHE) características, 730 células de Kupffer, 816 células-tronco pluripotentes induzidas, 236 ceratoacantoma, 719 ceratocistos, 720 cetamina, 138–139 cicatrização da ferida, 265, 284t, 284–285, 302–304, 308–309 cicatrização da ferida da pele, 270t, 271f culturas de ceratinócitos, 336–337 doença de Kimura, 736

epiderme, 319–320 estratégias de tratamento, 687–688 fator de crescimento de ceratinócitos (KGF), 189–190, 270t, 274–275 fenômeno de Kasabach-Merritt (KMP), 687 hemangioma simples, 734 implementação de barreiras, 169 informações, 168–169 Kazanjian, Varaztad, 23 kickbacks, 61–62 Kilner, Pomfret, 23, 24f malformação venosa, 735 manifestações clínicas, 687 modelo Knowledge To Action (modelo Conhecimento para Ação), 169 patogênese, 703 sarcoma de Kaposi, 742 sistemas de classificação, 677t transplante de rim, 2–3 tumores benignos de origem mesenquimal acrocórdon, 730 aurículas acessórias, 732–733 cicatrizes hipertróficas, 730 cicatrizes queloides, 730 cisto mucoso da mucosa da cavidade oral, 736 dermatofibroma, 729 fibroma de tecido mole, 730 fibroma pêndulo, 730 granulomas, 733–734 hemangioma cavernoso, 735 leiomioma, 731–732 lipoma, 731, 731–733 malformação arteriovenosa e fístula arteriovenosa (AVM), 735, 736f malformação capilar hemangioma moriforme, 734–735 hemangioma simples, 734, 734–735 malformação linfática, 736 malformação venosa, 735 rabdomioma, 732 tumor do glomo, 734

tumores osteocondrogênicos, 732, 733f xantogranuloma juvenil, 729–730 xantoma, 729 hemangioma arteriovenoso, 678t hemangioma capilar, 678t hemangioma cavernoso, 678t, 735 hemangioma congênito (CH) estratégias de tratamento, 687 manifestações clínicas, 687 sistemas de classificação, 677t supercrescimento de lipomatose congênita, malformações vasculares, nevo epidérmico e síndrome de escoliose See síndrome de Cloves hemoglobina, 573–574 herança autossômica, 18, 182 higroma cístico, 678t I i-LIMB Pulse, 858–861 imagem corporal definição, 30–31 estágios de desenvolvimento adolescência, 31 adultos, 31 crianças em idade escolar, 31 efeitos da cirurgia plástica, 31–32 primeira infância, 31 resposta emocional e comportamento, 31 imagem de Doppler colorido imagem de Doppler colorido dúplex, 501 pesquisa anatômica vascular, 501 tumores de tecido mole e cutâneos, 709–710 Império Bizantino, 14 implantes com base em biomateriais, 786–796 bioprotéticos, 795, 796 derme fetal bovina, 796 matriz dérmica acelular humana (HADM), 796 matriz dérmica acelular suína (PADM), 796 mucosa de intestino delgado, 796

pericárdio bovino, 796 perspectivas futuras, 796–797 implantes de silicone complicações perioperatórias aspectos psicológicos, 40–41 infiltração, 142–143 mastopexia comparações pré-operatórias/pós-operatórias, 143f dicas cirúrgicas, 142 procedimento básico, 139–143 técnica operatória, 142–143 medições e análises, 16–17, 19f, 25f segurança do paciente, 132 imunoterapia adotiva, 204–205 imunoterapia ativa, 205–206 inativação do cromossomo X, 181–182 Índice de pressão tornozelo-braquial (ABPI), 279–281 inibidores de calcineurina, 822t, 823 interações medicamentosas adversas, 145 L Laboratório de Física Aplicada (APL), 860–861 lacerações feridas agudas, 241 La Chirurgie Esthétique pure, 27, 28f La Chirurgie Esthétique. Son Rôle Sociale, 27 células de Langerhans, 320, 816 estudos multicêntricos, 154–155 histiocitose das células de Langerhans, 736 laminina, 270–271 Langenbeck, Bernard von, 19 linha de Langer, 283–285, 306 sarcoma das células de Langerhans, 742 laser de alexandrita Q-switched, 718, 725–726 laser de cor (dye), 718 lasers abdominoplastias, 143, 144f absorção, 147

acelerador linear (linac), 655 agentes vasoconstritores, 139–140 anestesia carbonatada, 140, 148 anestesia local, 137–149 aplicações clínicas, 528 aumento da mama, 142–143 aumento da viabilidade do retalho livre, 582 avanço de Le Fort III, 867t bradicardia, 145 características, 139–144, 516f, 731 cicatrização da ferida da pele, 293, 294 cirurgia estética em adolescentes, 45t comando, 88–90 contorno do corpo não invasivo, 852 correção de cicatriz, 308 diagnóstico de toxicidade e tratamento, 146 diretrizes fotográficas, 110f, 111f, 112, 117f diretrizes para seleção, 139, 140f discussão geral, 137 efeitos de reversão, 145 efeitos preemptivos, 148–149 efeitos vasoconstritores, 147 enxertos de gordura, 342–345, 346 epinefrina, 139, 140f, 147–148 escolha da sedação, 138 estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 estudos de pesquisas, 768–771 excisão de melanoma, 766–768, 770f expansão tecidual, 648 fármacos anestésicos, 139 fármacos sedativos, 138–139 feridas isquêmicas, 279–281 hemangioma infantil (HI), 684 hemangioma moriforme, 734–735 hipertensão, 145

hipotensão, 145 índice de alavancagem, 69 índices de liquidez, 69 interações medicamentosas adversas, 145 leiomioma, 731–732 leiomiossarcoma, 740 Lemaître, Fernand, 23–24 lentigo simples, 723–724 leucotrienos, 573–574 lifting facial, 140, 141f linfadenectomia axilar, 771–776 linfadenectomia cervical, 771, 773–774 linfadenectomia pélvica e inguinofemoral, 772–776, 777f linfangioma, 678t linfocintigrafia (mapeamento linfático), 757–759 linfócitos, 268, 269 lipoaspiração, 143–144 lipossarcoma, 740 lipossomos, 186–188 LIVINGSKIN, 858–861 lomustina, 779 lorazepam, 138 lumpectomias, 43 Luzzi, Mondino de, 15 malformação venosa-linfática (LVM), 677t manifestações clínicas, 690–692 melanoma lentigo maligno, 750–754 membros, 831–834 Ver também extremidades inferiores; extremidades superiores microcirugia vascular, 593 náusea e vômito, 145 obrigações, 67–68, 71f parte inferior do tronco, 110, 115–116 patogênese, 690 plastia em Z de Limberg, 315 pré-medicação, 138 processo de tomada de decisão, 768–771 produção e transdução de lentivírus, 237 proteína associada à latência (LAP), 275

radioterapia (RT), 288, 672 reações alérgicas, 145 reconstrução da cabeça e pescoço, 545, 546f reconstrução da parede abdominal, 553t reconstrução da parede torácica, 552–553 redução da mama, 141–142 respiração, 144–145 resumo de pesquisa, 149 sanguessugas, 617 século XIX, 20 segurança do paciente, 129–131 seleção do paciente, 137–138 síndrome de Leser-Trélat, 719 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 714f sistemas de classificação, 676–677 substitutos de pele viva, 336f taquicardia, 145 técnica cirúrgica e tratamento, 731, 731–733 terminologia, 678t toxicidade, 147–148 toxicidade cardiovascular, 146 toxicidade do sistema nervoso central, 146 tumores benignos de origem mesenquimal, 736 tumores de tecido mole e cutâneos, 718 úlceras diabéticas, 281 úlceras venosas, 279 variabilidade de ações, 146–147 Lei Bayh-Dole (Bayh-Dole Act) (1980), 847 lei contratual, 97 lei de difamação do blog, 98–99 lei de Wolff, 433 lesões de Bockenheimer, 695 lesões por compressão/esmagamento, 466, 467 ligas de alumínio (Al), 786–787 ligas de carbono (C), 786–787 linfadenectomia axilar, 771–776 linfadenectomia cervical, 771, 773–774 linfócitos B, 817

linfócitos T CD25, 827–828 linfócitos T CD4/CD8, 47–48, 818–819, 827–828 lipossomos catiônicos, 186–188 lipotransferência auxiliada por células (CAL), 344–347 ácido desoxirribonucleico (DNA) características, 177–177, 182 expressão gênica, 179–180 mecanismos epigenéticos, 181, 182 organização genômica do DNA, 178, 179 regulação gênica, 180, 181 ácido microrribonucleico (miRNA), 259–260 aço inoxidável, 786–787 adesivos e colas, 593 ampliação, 588–593 instrumentos microcirúrgicos características, 589–591 coagulador bipolar, 591 fórceps, 590 grampos vasculares, 590–591 irrigação e sucção, 591 porta-agulhas, 590 tesouras, 590 lupas características, 588–589 diretrizes para seleção, 589 tipos, 589 microscópios cirúrgicos, 588, 589q análise dermoscópica, 709 anatomia vascular músculos tipo I, 489–491 músculos tipo II, 489–491 músculos tipo III, 489–491 músculos tipo IV, 489–491 padrões de inervação, 489f sistemas de classificação, 488–489, 491 anestesia microvascular, 611 angiossarcomas, 741, 742 anticorpos monoclonais, 204–206

antígenos de histocompatibilidade menor, 816 aplicações clínicas, 533–534 apresentação do paciente e diagnóstico, 695 áreas legais consentimento informado, 93–94, 105–106 direito civil, 93 discussão geral, 93–95 garantias, 94–95 lei de privacidade, 94 negligência e má prática, 93 aspectos psicológicos, 43 autogestão, 101 avaliação da doença sistêmica categoria M do sistema TNM, 752t, 763–764 exame físico e testes, 761–762, 764 imagem de ressonância magnética (IRM), 762–764 tomografia computadorizada (TC), 762–762, 764 tomografia por emissão de pósitron (PET), 762–764 avaliação do local doador e receptor, 609 avaliação do paciente, 608–609 avanço em V-Y, 562–566, 568f biologia e formação de cicatriz, 300 características, 737 características do cirurgião, 593–594 carcinoma da glândula de Montgomery, 738 carcinoma de células de Merkel, 716t, 739 carcinoma de células escamosas (SCCs) câncer de cabeça e pescoço, 668–669 características, 737 carcinoma de glândula Meibomian, 738 carcinoma de glândulas sudoríferas, 738 carcinoma sebáceo, 738 carcinoma triquilemal, 738 células de Merkel, 320, 671 células-tronco específicas do tecido, 230–232 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) cicatrização da ferida, 262 correlações clínicas, 228

definições, 223–224 modelos in vivo, 226 pesquisa atual e aplicações, 224–226 protocolos de diferenciação e colheita de tecido in vitro, 226 terapia genética, 190 células-tronco mesenquimais (MSCs) células-tronco multipotentes, 213f células-tronco pluripotentes induzidas, 236 ceratose actínica, 736 cicatrização da ferida, 245f, 248, 256–257 cicatrização da ferida da pele, 263, 268–273, 296 cicatrizes maduras, 291t, 302t cinase ativada por mitógeno (MAPK), 626f cirurgia árabe, 14–15 cirurgia estética em adolescentes, 45t cirurgia plástica moderna, 20–23 cirurgia reconstrutora da extremidade inferior, 559–560 cisto mucoso da mucosa da cavidade oral, 736 classificação de Mathes-Nahai, 516, 517 classificação histológica, 738q classificação/sistemas de estadiamento epidemiologia, 743–744 estadiamento do melanoma/grupos prognósticos, 753t melanoma desmoplásico, 753, 755f sistema de classificação clínica TNM, 749–752, 761 subtipos histológicos, 750–755 vantagens, 749–761 colheita endoscópica, 611 colimadores multifolhas (MLCs), 658 complicações, 571–572 composição, 787t condrossarcoma, 741 considerações sobre o tempo, 610–611 definição, 587–588 dermatofibrossarcoma protuberante (DFSP), 739 detecção de melanoma, 762–764 diagrama de corte transversal, 597f dilatação luminal, 598f

direito civil, 93 direitos, 98 diretrizes para seleção, 541–542 discussão geral, 786–788 dismorfia muscular, 51 dispositivos anastomóticos doença de Bowen, 736–737 doença de Paget extramamária, 739 doença do linfonodo regional biópsia do linfonodo sentinela, 758–761 características, 756–761 categoria N do sistema TNM, 752–753, 760–761 linfocintigrafia (mapeamento linfático), 757–759 efeitos da expansão tecidual, 623 engenharia de tecidos, 390–391 engenharia de tecidos, 369–371, 380f enxerto muscular e reparo aplicação clínica, 364 definição, 364–366 perspectivas futuras, 364–365, 366 enxertos de pele, 320 estética, 100–101 exames de avaliação diagnóstico clínico desenvolvimento do nevo, 744–747 nevo atípico (displásico), 745–747 nevo azul, 744f, 745 nevo composto, 744 nevo intradérmico, 744 nevo juncional, 744 nevos congênitos, 745, 745–746 síndrome da mola B-K, 747 síndrome do nevo atípico (displásico), 746–747 diagnóstico diferencial características da lesão de melanoma, 747–751 carcinoma de células basais pigmentado, 747–749 ceratose seborreica, 747–749 desafios, 747–749

granuloma piogênico, 747–749 lesões pigmentadas, 747–749 melanomas primários múltiplos, 749 sarda de Hutchinson, 747, 749f família do gene MSX, 180–181 fatores histopatológicos significativos categoria T do sistema de estadiamento TNM, 752–753, 755–756 classificação e correlação, 753–756 fator estimulador de colônias de macrófagos (M-CSF), 431 fios de rede mista See matriz dérmica acelular (ADM) fisiopatologia da falha do retalho, 573–574 flexor profundo dos dedos (FPD) aplicações clínicas, 523–524 características, 516f reconstrução perineal, 557 úlceras de pressão, 562–568 fraude e abuso, 95–96 função, 816 guia de ação abusiva, 99–100 herança mitocondrial, 183–184 histiocitoma fibroso maligno (MFH), 739–740 homeostasia e renovação óssea, 425–434 imagem de ressonância magnética (IRM) impacto tecnológico, 873 informações, 92, 587–588, 607–611 abas do retalho, 614 avaliação pré-operatória, 608–611 colheita endoscópica, 611 falha do retalho, 614–618 manejo pós-operatório, 613–620 resultados do retalho, 614 retalhos de estilo livre, 611 retalhos perfuradores, 611, 612f retalhos pré-fabricados/pré-laminados, 612–613 retalhos quiméricos, 612 inibidores de macrolídeos, 822t interações legais depoimentos e narrativas, 93

interações advogado-cirurgião, 92–93 interferon- α, 776–777 internet e lei de difamação do blog, 98–99 íntima solta, 596f irrigação intraluminal, 596f juramento MBA, 88q lei de contrato, 97 leiomiossarcoma, 740 lentigo melanoma maligno, 750–754 lesões melanocíticas See tumores de tecido mole e cutâneos ligas de cobalto e cromo, 787 ligas de manganês (Mn), 786–787 ligas de molibdênio (Mo), 786–787 ligas de ouro, 787 ligas de titânio, 787, 788f lipossarcoma, 740 MacDermol S/MacDermol R, 48q malformação, 192–193 malformação venosa (VM), 686f Malgaigne, Joseph, 19 Maliniak, Jacques, 24, 27 mancha mongólica, 726–728 Manchot, Carl, 25 manejo pós-operatório, 613–620 manejo pré-operatório e pós-operatório, 565–570 Manuzzi, Nicolò, 12 mãos mutiladas Ver mãos mutiladas/laceradas mãos mutiladas/laceradas técnica cirúrgica, 364 MAPK cinase (MEK), 626f marcadores de histocompatibilidade principal (MHC), 370 Marcaine, 147–148 margens cirúrgicas, 717q mastocitose, 736 Matriderm®, 336 Matrigel®, 386f, 389, 390 McIndoe, Archibald, 5f mediastino, 549–552

Medpor®, 462 melanócitos melanoma, 743–785 melanoma amelanótico, 753, 755f melanoma juvenil, 724–726 melanoma lentiginoso acral, 750–754 melanoma metastático agentes quimioterapêuticos, 779 avaliação de resultados, 781t bioquimioterapia, 782 interleucina 2 (IL-2), 782 ipilimumab, 782–783 prognóstico, 779–783 tratamentos com alvos moleculares, 783 vacinas de tumor, 779–782 melanoma nodular, 750–754 melanomas malignos, 671 melanomas primários múltiplos, 749 melanoma superficial expansivo, 750–754 meloplastia Ver lifting facial mento, 110, 112f Mesopotâmia, 12 metatarsalgia de Morton, 727 metilmetacrilato, 462 metilparabeno, 146 microcirurgia, 8 microcirurgia vascular, 587–620 microdispersão, 186, 188t midazolam, 138–139 mília, 719–720 Mimic dV-Trainer, 865–866, 869 miofibroblastos, 270t, 272 Mirault, Germanicus, 19 mofetil micofenolato, 822, 823, 833t Mondeville, Henry of, 15 monitoramento pós-operatório, 783–784 Morestin, Hippolyte, 21 Morrison, Wayne, 6

mucosite, 668–669 Multicenter Selective Lymphadenectomy Trial (MSLT), 770 Murray, Joseph, 2–3 músculos tipo III (dois pedículos dominantes), 516–517 músculos tipo II (pedículo vascular dominante e pedículo menor), 516, 517t músculos tipo I (um pedículo vascular), 516, 517t músculos tipo IV (pedículos vasculares segmentares), 517 músculos tipo V (um pedículo vascular dominante e pedículos vasculares segmentares secundários), 517 mutações, 184 neuroma de Morton, 727 obrigações no cuidado, 101 ontogênese, 707, 708f osteossarcoma, 741 padrão masculino de calvície, 633–635 parasitas medicinais, 617 parcerias médicas, 101–102 perfusão do membro isolado, 778–781 perspectivas futuras, 620 pesquisa anatômica vascular, 504–505 piloleiomioma múltiplo, 731–732 planejamento e posicionamento cirúrgico, 594 plastia em Z com retalho múltiplo, 315, 315–316 posicionamento do paciente, 569–570 preparação do vaso adventícia, 597f fórceps arterial, 598f procedimento básico, 596–597 dispositivos sem sutura, 592–593 lasers, 593 microssuturas, 591–592 princípios básicos, 815–816 querelantes manipulativos que rejeitam ajuda, 38–39 questões de regulação, 97–98 questões de responsabilidade, 101 questões médico-legais, 92–103 rabdomiossarcoma, 741 radiação pós-mastectomia (PMRT), 664 radioterapia (RT), 778

reconstrução da mama pós-mastectomia princípios básicos, 640–647 reconstrução da parede abdominal, 554 reconstrução de cabeça e pescoço, 545–546 reconstrução do pé, 562, 563f reconstrução secundária da mama, 644, 646f recorrências, 778, 779f, 783–784 responsabilidade do produto, 95 resultados e complicações resumo de pesquisa, 103, 784 retalho de rotação de Mustardé expandido, 635–637 Retalho em zetaplastia de mustardé, 315 Retalho oculto, 614 retalhos de cirurgia de inserção, 594 retalhos de estilo livre, 611 retalhos delgados, 612 retalhos fasciais/fasciocutâneos, 517–519 retalhos miocutâneos, 630 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 516, 517 retalhos ósseos vascularizados, 527–528 retalhos perfuradores, 611, 612f retalhos pré-fabricados/pré-laminados, 612–613 retalhos quiméricos, 612 rinoplastia de defeito mínimo, 40 RNA mensageiro (mRNA), 179–180 robótica definição, 855 ferramentas cirúrgicas e próteses cirurgia abdominal e torácica/peitoral, 863 cirurgia craniofacial, 862–863 cirurgia de mãos e membros, 857–862 cirurgia de ouvido, nariz e garganta, 862–863 cirurgia urológica/próstata, 863–864 dispositivos de próxima geração, 864–865 perspectivas futuras, 864–865 resultados avançados, 864 salas cirúrgicas, 855–857 resumo de pesquisa, 873

sarcoma de Kaposi, 742 seleção do paciente, 102–103 seleção do retalho, 609–610 sequência anastomótica, 598 simulação função simuladores de planejamento cirúrgico, 869, 870 simuladores para treinamento, 865–869 implementação, 865 modelo genômico-comportamental-físico, 869f, 870 perspectivas futuras, 870 princípios básicos, 865 resumo de pesquisa, 873 uso racional, 865 simulador de distração/avanço em monobloco, 867 síndrome de Muenke, 197 sistema da enzima mieloperoxidase (MPO), 575–576 sistema de classificação McFontzl, 299, 300t subnutrição/desnutrição, 282 taxa de mortalidade, 125–126, 157f técnica cirúrgica e tratamento enxertos de pele, 342 inovação cirúrgica, 851, 852 técnicas de anastomose microvascular anastomose microvascular pouco encontrada anastomose orientada verticalmente, 605 enxertos microvasculares, 605–607 íntima solta, 605, 607f vasos ateroscleróticos, 605 vasos com tamanhos discrepantes, 604–606 discussão geral, 598–607 teste de enchimento e esvaziamento, 607, 608f técnicas de monitoramento do retalho, 570 técnicas de suturas anastomose em luva, 603f anastomose lateroterminal, 601–604 anastomose terminoterminal, 598–601, 603f dispositivos de acoplamento anastomótico, 604

sutura contínua, 601f sutura em alça aberta, 603f tipos de nó, 599f tecnologia médica, 854–873 tecnologias inovadoras não biológicas, 854–855 telemedicina aplicações da cirurgia plástica, 871–872 definição, 870–871 discussão geral, 870 redes sociais, 871 resumo de pesquisa, 873 tecnologias, 870, 871t telecirurgia, 871, 872f telemedicina ubíqua, 873 teste de patência, 607, 608f textos impressos, 15 tomografia computadorizada de multidetector (MDCT) tumores de tecido mole e cutâneos, 710 carcinoma de células basais   análise dermoscópica, 709 características, 737 classificação histológica, 738q coloração dos tumores, 709 margens cirúrgicas, 717q tumores malignos de origem epitelial carcinoma de células escamosas (SCCs), 737 ceratose actínica, 736 doença de Bowen, 736–737 tumores malignos de origem mesenquimal angiossarcomas, 741, 742 condrossarcoma, 741 dermatofibrossarcoma protuberante (DFSP), 739 histiocitoma fibroso maligno (MFH), 739–740 leiomiossarcoma, 740 lipossarcoma, 740 osteossarcoma, 741 rabdomiossarcoma, 741

sarcoma de Kaposi, 742 tumores malignos originados em apêndices carcinoma de células de Merkel, 716t, 739 carcinoma de glândulas sudoríferas, 738 carcinoma sebáceo, 738 carcinoma triquilemal, 738 doença de Paget extramamária, 739 úlceras de pressão, 562–565 universidades, 15 vantagens/desvantagens, 538–539, 608 vasos receptores, 594–596 M maçã, 79 malformação arterial (AM), 677t malformação arteriovenosa (AVM) estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 manifestações clínicas, 698–699 patogênese, 696–698 sistema de classificação, 676–677 sistema de estadiamento de schobinger, 698–699 terminologia, 678t malformação arteriovenosa e capilar (CAVM), 677t malformação arteriovenosa linfática e capilar (CLAVM), 677t malformação capilar-malformação arteriovenosa (CM-AVM) patogênese, 692f, 696–698, 700 sistemas de classificação, 677t malformação capilar (MC) estratégias de tratamento, 679f, 689–690 hemangioma moriforme, 678t, 734–735 hemangioma simples, 734, 734–735 manifestações clínicas, 688–689 patogênese, 688 sistemas de classificação, 676–677 terminologia, 678t

malformação cavernosa central (CCM), 677t, 693–694 malformação linfática e capilar (CLM), 677t malformação venosa capilar (CVM), 677t malformação venosa cutaneomucosa (CMVM), 677t, 693–694 malformação venosa linfática e capilar (CLVM), 677t malformações vasculares combinadas sistemas de classificação, 677t manejo das vias aéreas, 132 manejo do câncer abordagens de manejo, 208–210 aspectos históricos, 201–207 aspectos psicológicos, 43–44 biológicos, 206 biopatologia classificações dos tumores, 208 margens dos tumores, 207–208 massa crítica, 207 resumo de pesquisa, 210 cirurgia, 202, 203f imunoterapia, 204–206 informações, 201 quimioterapia, 204 radiação ionizante, 202–204 radioterapia, 668–669 terapia fotodinâmica, 206–207 terapia neoadjuvante, 201–207 matriz dérmica acelular (ADM) técnica cirúrgica e tratamento enxertos de pele, 342 inovação cirúrgica, 851, 852 matriz dérmica acelular xenogênica (ADM), 342 médicos charlatães, 27 medidas de qualidade de vida (QoL), 161–162 melanocitose dérmica congênita, 726–727 melanoma amelanótico, 753, 755f melanoma desmoplásico, 753, 755f melanoma lentiginoso acral, 750–754 melanose de Becker/nevo piloso pigmentado de Becker, 725

mento/queixo aumento do mento/queixo cirurgia estética em adolescentes, 45t mixoma cutâneo, 736 modelo Breakthrough Series, 170 áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 radioterapia conservação da mama, 665 irradiação da área de drenagem nodal, 665–666 radiação pós-mastectomia (PMRT), 664 sequenciamento de quimioterapia, 668 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 reconstrução secundária da mama, 644, 646f aspectos históricos, 789–790 aspectos psicológicos, 40–41 cirurgia estética em adolescentes, 45t complicações perioperatórias aspectos psicológicos, 40–41 enxertos de gordura, 342–347 implantes de mama implantes de gel de silicone, 789–790 implantes de silicone características, 789–790 infiltração, 142–143 reconstrução da mama pós-mastectomia princípios básicos, 640–647 segurança do paciente, 132 técnicas de radioterapia, 666–668 mastectomias características, 202, 203f implantes de gel de silicone aspectos históricos, 789–790 características, 789–790

inserção da prótese tratamento e reconstrução, 43 pesquisas, 664–668 modelo P4P, 173–174 modelos de competição, 66 moléculas de adesão celular (CAMs), 819–820 monofosfato de adenosina (AMP), 575f, 821–822 monofosfato de adenosina cíclico (cAMP), 626f morte celular, 661–662 mutilações facias da Primeira Guerra Mundial, 20–23 N NADPH oxidase (nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato-oxidase), 258–259 aspectos psicológicos, 39–40 câncer de pele não melanoma, 670–671 características, 279–283, 728 células natural killer (NK), 816–817 cicatrização da ferida, 245–247, 256–257 cicatrização da ferida da pele, 268–269 cirurgia com retalho livre microvascular, 617 cirurgia robótica, 862–863 composições de ligas metálicas, 786–787 condução nervosa, 473, 474f contorno do corpo não invasivo, 852 cuidado pós-operatório e acompanhamento, 476–477 defeito de calvária de 4 mm em camundongo atímico nu, 221–223 diretrizes fotográficas, 108, 110, 111f, 112f egípcios, 11–12 empresas sem fins lucrativos, 85 engenharia da cartilagem, 419–422 engenharia de tecidos, 391–392 enxertos de cartilagem auricular, 401–402, 405f enxertos de cartilagem nasal, 404–407 enxertos pericondriais autólogos, 408–413 exames de avaliação diagnóstico clínico desenvolvimento do nevo, 744–747 nevo atípico (displásico), 745–747

nevo azul, 744f, 745 nevo composto, 744 nevo intradérmico, 744 nevo juncional, 744 nevos congênitos, 745, 745–746 síndrome da mola B-K, 747 síndrome do nevo atípico (displásico), 746–747 diagnóstico diferencial características da lesão de melanoma, 747–751 carcinoma de células basais pigmentado, 747–749 ceratose seborreica, 747–749 desafios, 747–749 granuloma piogênico, 747–749 lesões pigmentadas, 747–749 melanomas primários múltiplos, 749 sarda de Hutchinson, 747, 749f excisão de melanoma, 766 expansão tecidual áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 princípios básicos, 640–647 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 expansão tecidual, 637, 639f fatores de crescimento neurotróficos (NGFs), 232 fatores que influenciam, 280t fatores relacionados aos resultados, 471 fator nuclear κB, 431 fenda labial e palatina não sindrômica, 193–194 fisiopatologia da falha do retalho, 573–574, 576 hemangioma congênito não involutivo (NICH), 677t, 685 hemangioma infantil (HI), 680 Índia, 12–13 infecção da ferida, 281–282 lasers de neodímio-ítrio-alumínio e granada (YAG), 718, 734–735

lesão do plexo braquial no adulto técnicas de enxertamento atuais, 473t, 474–476 classificações, 464–466 exames de avaliação, 468–469 lesões por avulsão, 466t, 467–468 lesões por compressão/esmagamento, 466, 467 trauma penetrante, 465–467 lesões por estiramento, 466t, 467–468 lesões por radiação, 281 ligas de níquel (Ni), 786–787 melanoma nodular, 750–754 Nasenplastik und sonstige Gesichtsplastik (rinoplastia e outras cirurgias de face), 25–28 National Comprehensive Cancer Network (NCCN), 158, 159, 665, 777–778 National Surgical Quality Improvement Program (NSQIP), 158t, 173 náusea, 145 negligência, 93 negociação, 86–87 neovascularização, 230–232 nervos, 473, 475f neurilemomas, 727 neurofibromas características, 728 neuromas, 727 neuropraxia, 464–465 neurotmese, 464–465 neurotrofinas, 232 nevo cartilaginoso, 732–733 nevo de células névicas, 723–725 nevo de Ito, 726, 727f nevo de Ota, 725–726 nevo de Unna, 734 nevo fuscocerúleo oftalmomaxilar, 725–726 nevo lentiginoso salpicado (nevo spilus), 725, 726f nevo sebáceo, 721 nifedipina, 583 Noël, Suzanne, 27, 28f norepinefrina (NE), 573–574, 580–581 Norian SRS/CRS, 461

óxido nítrico (NO) fisiopatologia da falha do retalho, 573–574 síntese de óxido nítrico (NO), 256, 259 óxido nitroso (NO), 429–430 pacientes obesos, 282 personalidade narcisista, 35 reconstrução do nariz cirurgia estética, 25–26, 28 cirurgia estética em adolescentes, 45t reconstrução nasal osteointegrada, 802, 802–803 recuperação do nervo, 464 Renascença, 16–18 reparo do nervo considerações sobre tensão, 469 momento cirúrgico, 469 reparo epineural versus fascicular, 469–470 reparo terminoterminal versus reparo terminolateral, 470–471 reparo do nervo e enxertos, 464–477 resumo de pesquisa, 477 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 542–546 schwanomas, 727, 728f século XIX, 19–20 sistema da enzima nicotinamida adenina difosfato (NADPH), 575–576 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 714f subnutrição/desnutrição, 282 taquicardia não sinusal, 145 técnicas de bioengenharia, 476 técnicas de enxertagem recentes aloenxertos, 473–475, 831 cobertura dos nervos, 473, 475f condução nervosa, 473, 474f enxertos autólogos de nervos, 472–474, 831 enxertos autólogos de veias, 472–473 transferência de nervos, 473t, 474–476 técnicas de enxertamento atuais, 473t, 474–476 teoria da utilidade de Neumann-Morganstern, 165 terapia com nêutron, 656 terapia da mão

estimulação nervosa intraoperatória, 471 terapia neoadjuvante, 201–207 transferência negativa, 33–34 tratamento da ferida com pressão negativa (NPWT), 850, 851 tratamento médico, 282–283 úlceras de pressão, 279 valor líquido, 72–73 via de sinalização Notch, 428–429 século VIII, 18–19 negação, 32, 37–38 neuroma proeminente abdome, 110, 115–116 abordagem do problema do paciente, intervenção, comparação e resultado (PICO), 151 abordagem PICO, 151 aloenxertos, 473–475 aplicação de aprovação pré-mercado (PMA), 847–849 apresentação do paciente e diagnóstico, 747–749 áreas irradiadas da parede torácica, 645–647 dispositivo expansor, 642–643 radioterapia conservação da mama, 665 irradiação da área de drenagem nodal, 665–666 radiação pós-mastectomia (PMRT), 664 sequenciamento de quimioterapia, 668 reconstrução imediata da mama pós-mastectomia cobertura muscular, 643–645 matriz dérmica alogênica acelular (ADM), 644, 645 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 reconstrução secundária da mama, 644, 646f armazenamento e preservação, 105 aspectos psicológicos, 30–54 associação PHACE, 681 atributos da imagem, 120–121 aumento da viabilidade do retalho pediculado, 581–582 avanço em V-Y, 562–566, 568f câmeras, 117–119 características, 197, 721–725, 788–792

carcinoma de células basais pigmentado, 747–749 cartões de memória, 119–120 cavidade pulmonar, 552–553 células de Paneth, 262f células-tronco específicas do tecido correlações clínicas diferenciação de osteoblastos, 232 músculos, 232 regeneração da pele, 232 reparo de nervo periférico, 233 vasos sanguíneos, 232 definições, 228–229 pesquisa atual e aplicações diferenciação de osteoblastos, 230 músculos, 230–231 regeneração da pele, 229 reparo de nervo periférico, 231, 232 vasos sanguíneos, 230, 231f células-tronco específicas do tecido, 231, 232 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) cicatrização da ferida, 262 correlações clínicas, 228 definições, 223–224 modelos in vivo, 226 pesquisa atual e aplicações, 224–226 protocolos de diferenciação e colheita de tecido in vitro, 226 terapia genética, 190 células-tronco pluripotentes, 213f, 261, 264 células-tronco pós-natais e somáticas ASCs humanas versus camundongos, 219 características, 217, 218 células-tronco pluripotentes induzidas, 236 engenharia de tecidos, 369–371 enxertos de gordura, 345–347 métodos de colheita, 218, 219 métodos de liberação, 220 modelos in vivo correlações clínicas, 223

defeito de calvária de 4 mm em camundongo atímico nu, 221–223 perspectivas futuras, 223, 224–225 protocolos de diferenciação in vitro diferenciação adipogênica, 221, 222f diferenciação condrogênica, 221 diferenciação osteogênica, 220–221 receptores de superfície celular, 219–220 cicatrização da ferida, 234 cicatrização da ferida da pele, 268–270, 274 cirurgia com retalho livre microvascular, 611, 612f cirurgia de próstata, 863–864 cirurgia estética em adolescentes, 45, 46 cirurgia estética e reconstrutora, 15–16 cirurgia estética facial, 39 câncer e reconstrução câncer de cabeça e pescoço, 43–44 câncer de mama, 43 defeitos adquiridos no trauma queimaduras, 42–43 transplante de mãos, 42 mamoplastia de aumento, 40–41 mamoplastia de redução, 41–42 rinoplastia, 39–40 cirurgia estética facial, 131–132 cirurgia estética pós-guerra, 28 cirurgia plástica pediátrica cirurgia estética em adolescentes, 45, 46 defeitos congênitos e adquiridos, 44 deformidades craniofaciais, 44–45 expansão tecidual, 629 cirurgia plástica pós-guerra, 25, 25–26 cisto epidérmico proliferativo, 720 classificações, 464–466, 519–521 código de ética, 57–58 complicações da cirurgia de mama, 132 composições de ligas metálicas, 786–787 condução nervosa, 473, 474f conhecimento, 107

considerações sobre tensão, 469 contraindicações psicológicas, 52q cuidado pós-operatório e acompanhamento, 476–477 defeitos congênitos e adquiridos, 44 deformidades craniofaciais, 44–45 demandantes de direitos, 38 negadores autodestrutivos, 37–38 pacientes detestáveis, 36–37 querelantes manipulativos que rejeitam ajuda, 38–39 detecção de melanoma, 762–764 diagnóstico pré-natal doença arterial periférica (PAD), 257–258 efeitos da expansão tecidual, 625f embolia pulmonar, 781t engenharia da cartilagem, 413–419, 421–423 engenharia de tecidos, 375, 376f enxertos autólogos de nervos, 472–474 enxertos autólogos de veias, 472–473 equilíbrio, 107 estilos de personalidades/transtorno de personalidade características, 34–36 personalidade dependente, 35 personalidade histriônica, 36 personalidade narcisista, 35 transtorno de personalidade borderline, 36 transtorno de personalidade obsessivo-compulsivo, 34–35 transtorno de personalidade paranoico, 35–36 estimulação nervosa intraoperatória, 471 estudos de preferência dos pacientes, 154 exames de avaliação, 468–469, 747–749 expansão tecidual, 629 extremidade inferior, 112, 117f fagocitose, 816 fatores de risco cirúrgico, 124–126 fatores relacionados aos resultados, 471 fator plasmático, 242–243, 245 feridas que não cicatrizam, 279 formação de caráter, 32–33

formatos de arquivos, 120 fosfato de cálcio (CaP), 445 fosfolipase C (PLC), 626f fosfolipídeos, 243f fotografia, 104–106 fracassos da política, 135 função, 198–199 gel de plaquetas, 793 glabela, 108, 110f imagem corporal definição, 30–31 efeitos da cirurgia plástica, 31–32 estágios de desenvolvimento adolescência, 31 crianças em idade escolar, 31 idosos, 31 infância, 31 resposta emocional e comportamento, 31 imagem tridimensional (3D), 121–122 imunoterapia passiva, 204–206 incêndios em salas cirúrgicas, 132–133 inconsistências e variabilidades, 106–107 índices de rentabilidade, 69 injeções de parafina, 27 lábios, 110, 112f lei de privacidade, 94 Lei de Proteção do Paciente e Tratamento Acessível (Patient Protection and Affordable Care Act), 86 Lei de Proteção do Paciente e Tratamento Acessível (Patient Protection and Affordable Care Act), 2010), 86 lentigo simples, 723–724 lesão do plexo braquial no adulto técnicas de enxertamento atuais, 473t, 474–476 lesões de avulsão, 466t, 467–468 lesões de nervos classificações, 464–466 exames de avaliação, 468–469 lesões por avulsão, 466t, 467–468 lesões por compressão/esmagamento, 466, 467 trauma penetrante, 465–467

lesões penetrantes, 465–467 lesões por compressão/esmagamento, 466, 467 lesões por estiramento, 466t, 467–468 linfadenectomia pélvica, 772–777 lipoaspiração, 129, 131 mancha em vinho do porto, 678t, 734, 734–735 manejo intraoperatório, 128–130 manifestações clínicas, 688 mãos e pés, 114, 118f materiais de implante, 791–792 matriz dérmica acelular suína (PADM), 796 mecanismos de defesa, 32–33 melanoma juvenil, 724–726 mento, 110, 112f modelo de 5 forças de Porter de competição, 66 modelos in vivo correlações clínicas, 223 defeito de calvária de 4 mm em camundongo atímico nu (nude), 221–223 perspectivas futuras, 223, 224–225 momento cirúrgico, 469 nádegas, 110, 115–116 nariz, 108, 111f neuropatia periférica, 254–255 nevo congênito de células pigmentadas, 724, 725f nevo de células pigmentadas adquirido, 724 nevo displásico, 724 notificação prévia do mercado (PMN), 847–849 olhos, 107–109 orelhas, 110 osteoblastos, 428 paciente errado/paciente mal posicionado, 133–134 pacientes com apneia, 126–128 pacientes insatisfeitos, 52, 53q pacientes obesos, 126–128 padrões moleculares associados a patógenos (PAMPs), 249 paládio (Pd), 656–657 papaverina, 583 paralisia, facial Ver paralisia facial

parceiros, 85 paroxetina, 51 parte inferior do tronco, 110, 115–116 Passot, Raymond, 27, 28f patentes, 846–847 patentes provisórias, 846–847 Patient and Observer Scar Assessment Scale (POSAS), 264–266, 299 patogênese, 694f, 697f, 703–705 Paulus of Aegina, 14 Pavilion for Facial Cripples, 22–23 peito e mamas, 110, 113f pentoxifilina, 617 perfil, 67, 70f pericôndrio, 397 pesquisa anatômica vascular, 505–507 Physician Quality Reporting Initiative, 173 Pickerill, Henry, 21–22 pilomatricoma, 721, 722 piridoxina, 282 plasmacitose, 736 plasma rico em plaquetas (PRP), 793 plastia em Z planimétrica, 314 Plastic and Reconstructive Surgery Journal, 24 platina (Pt), 788 PLX4032, 783 poli(ácido lático-glicólico) (PLGA), 375, 790–791 poli(ácido lático) (PLA), 375, 376f, 421–423, 790–791 polidimetilsiloxano (PDMS), 789t polidioxanona, 376f poliéster, 791 polietileno, 791 poli(hidroxivalerato), 376f polímeros biodegradáveis, 791–792 poli(PCPP-SA anidro), 376f Poli[(p-metil-enoxi) (etil glicinato) fosfazeno], 376f polipropileno, 791 politetrafluoroetileno (PTFE), 790 poli (β-hidroxibutirato), 376f

poli ( -caprolactona), 376f poroma folicular, 723 posição submuscular, 643–644 posição subpeitoral (plano duplo), 644 pré-calicreína, 243f, 244 prega nasolabial, 110, 112f princípios básicos, 640–647 princípios-chave, 106, 117 processamento da imagem medições e análise, 121 planejamento e simulação, 121 ProDigits, 858–861 projeção, 32 pró-opiomelanocortina (POMC), 284–285 propofol, 139 prostaciclina, 573–574 prostaglandina E1 (PGE 1), 433, 617 prostaglandina E2 (PGE 2), 626f proteases, 269–271 Protected Health Information (PHI), 121 proteína cinase A (PKA), 626f proteína cinase C (PKC), 624–626 Proteus spp, 249–250 protocolos de diferenciação in vitro diferenciação adipogênica, 221, 222f diferenciação condrogênica, 221 diferenciação osteogênica, 220–221 pró-trombina, 243f, 268–269 provedores e terceiros pagadores, 61–62 Pseudomonas aeruginosa, 249–250 PubMed, 151 punção, 241 queixas éticas, 57t reações psicológicas perioperatórias, 33 receptor do paratormônio (PTH-R), 428 receptores de padrões de reconhecimento (PRRs), 249 reconstrução da cabeça e pescoço, 543, 543–544 reconstrução da mama

mama hipoplásica, 648, 649f reconstrução da mama pós-mastectomia princípios básicos, 640–647 reconstrução do mediastino, 549–552 reconstrução secundária da mama, 644, 646f recuperação do nervo, 464 regeneração óssea, 435t, 438, 443–444 registros em vídeo, 122 relação médico-paciente, 33–34 reparo do nervo considerações sobre tensão, 469 momento cirúrgico, 469 reparo epineural versus fascicular, 469–470 reparo terminoterminal versus reparo terminolateral, 470–471 reparo do nervo periférico e enxertos, 464–477 reparo epineural versus fascicular, 469–470 reparo ósseo primário, 439, 439–440 reparo terminoterminal versus reparo terminolateral, 470–471 responsabilidade do produto, 95 resultados clínicos, 134–135 resumo de pesquisa, 53, 477 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 554–557 retalhos pré-fabricados e pré-laminados, 530–531 retalhos pré-fabricados/pré-laminados, 612–613 século XIX, 19–20 segurança do paciente, 124–136 Seleção do procedimento retalhos musculocutâneos, 562–565 silicone, 789, 790 síndrome de Parkes-Weber síndrome de Pfeiffer síndrome de Prader-Willi, 183 Síndrome de Proteus síndrome de tumor-hamartoma PTEN (PHTS), 704–705 síndrome pterígio (PPS), 195 sistema de classificação clínica pTNM, 711, 712–715 sistemas de classificação, 677t taxa de mortalidade, 125–126

técnicas de bioengenharia, 476 técnicas de enxertamento atuais, 473t, 474–476 tendões de engenharia/substitutos de tendões, 352–353, 358f, 360f terapia com fóton, 655–656 terapia com prótons, 655–656 terapia fotodinâmica, 206–207 terapia genética, 189–190, 193 testes invasivos, 199 textos impressos, 15 traços de personalidade, 32–33 transferência de nervos, 473t, 474–476 transferência positiva, 33 transposição de retalho segmentar, 524, 525f transtorno de personalidade paranoica, 35–36 transtornos de pânico, 48, 49 trauma penetrante, 465–467 tromboembolismo venoso, 130–131 tumores benignos de origem mesenquimal, 735 tumores de tecido mole e cutâneos, 710 úlceras de pressão, 255–256, 279 ultrassonografia, 198 vantagens/desvantagens, 539 vista oclusal dos dentes, 110 vista padrão, 107, 108f vista total da face, 107, 108f wrap de nervos, 473, 474–476 nevo apócrino, 723 nevo azul, 727, 744f, 745 nevo composto, 744 nevo congênito de células pigmentadas, 724, 725f nevo da pele animal, 724, 725f nevo de células pigmentadas adquirido, 724 nevo de Clark, 724 estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 fenda labial e palatina não sindrômica, 193–194

fenda labial e palatina sindrômica, 194–195 fenda número, 30 fendas orofaciais, 193 Renascença, 15–16 século XIX, 19–20 simuladores para treinamento, 867 nevo displásico, 724 nevo (displásico) atípico, 745–747 nevo epidérmico, supercrescimento vascular-capilar-linfático (CLOVE) nevos congênitos, 745, 745–746 características, 427t, 429 características e funções, 427t, 428, 430–431 cirurgia estética em adolescentes, 45t colheita do olécrano, 452 custo de oportunidade, 71 ética, 61 exposição ocupacional à radiação, 673–674 fator de transcrição Osterix (Osx), 429, 434f fendas orofaciais, 193 feridas abertas, 241, 242, 286–287 feridas que não cicatrizam, 282 função, 427t, 429–430 histologia, 429 iluminação, 107 ligas com base de oxigênio, 786–787 materiais osteoatrativos, 461–462 mecanismos de diferenciação, 431 mecanismos regulatórios regulação transcricional, 429 vias de sinalização principais, 428–429 mecanotransdução, 433 melanocitose oculodérmica, 725–726 Occupational Safety and Health Administration (OSHA), 97–98 OK-432, 692–693 OKT3, 821t, 825 oligodendrócitos, 217 Ollier, Louis Leopold, 20 órgãos de risco (OAR), 663

Oribasius, 14 ornipressina, 140 osteocalcina, 428, 431–432, 434f osteoclastos osteocondução, 445 osteoindução, 444–445 osteointegração, 445 ósteon, 426f osteonectina, 428, 431–432, 434f osteopontina, 428, 431–432, 434f osteoprotegerina (OPG), 431 osteossarcoma, 741 pacientes ambulatoriais, 60–61 personalidade obsessivo-compulsiva, 34–35 processos de diferenciação, 230, 232 radioterapia (RT), 671–672 receptor da, 1, 428 receptor da 1, 25-di-hidroxi-vitamina D (1, 25-(OH)2 D3-R), 428 reconstrução da parede torácica, 553 segurança do paciente, 126–128 tríade, 132–133 tumores osteocondrogênicos, 732, 733f

O olhar, 289t orelhas abordagem PICO, 151 análise de resultados por volume, 159–160 anos ajustados pela qualidade de vida (QALYs), 164–165 aplicações na cirurgia plástica, 160–161 Aprendizagem, 170 apresentação do paciente e diagnóstico análise dermoscópica, 709 angiografia, 710 cintigrafia, 710 diagnóstico patogênico, 710–711 imagem de ressonância magnética (IRM), 710 imagem Doppler, 709–710 inspeção e palpação, 707–709 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 711, 712–715, 750–752, 761 sistema de estadiamento clínico, 711, 716t tomografia computadorizada (TC), 710 tomografia por emissão de pósitron (PET), 710 associações profissionais, 57–58 avaliação da literatura existente, 150–151 biologia e formação de cicatriz, 300 características, 153–156 cartilagem elástica, 397, 398f casos em série/relatos de caso, 156 células endoteliais, 270t, 678–680 células progenitoras endoteliais (EPC), 190–191, 230, 369–371 células-tronco embrionárias (ESCs), 213f, 260–261, 369–371 células-tronco epidérmicas, 262, 263, 296 cicatrização da ferida, 242, 250–252 cicatrização da ferida da pele, 269–271, 278, 288 cirurgia estética em adolescentes, 45t cirurgia robótica, 862–863 cisto epidermoide, 719, 720f composição óssea, 431–432 conceito de “uso significativo”, 171

conceitos-chave, 164–166 conceito “uso significativo”, 171 consultas clínicas, 151 dados administrativos, 159–160 decisão do paciente, 174 decisões morais e consequências, 55 demandantes intitulados, 38 desenhos de estudos, 167 diretrizes de desenvolvimento, 162–164 diretrizes fotográficas, 107–109, 110f diretrizes para seleção, 139, 140f discussão geral, 150–153 displasia ectodérmica, 195 dissecção eletiva de linfonodos (ELND), 756–761 doença de Paget extramamária, 739 ectasia, 677t efeitos do tamanho da amostra, 157, 158 efeitos vasoconstritores, 147 efetividade versus eficiência, 156–157 eficiência, 69 Egito See Egito antigo elastinas, 320 eletroporação, 186, 188t Ely, Edward, 25–28 empreendedorismo, 80–82 endotelina-1 (ET-1), 573–574, 580–581 engenharia de tecidos, 368–369, 388 Enterococcus faecalis, 249–250 enxertos de cartilagem auricular, 398–405 Epicel®, 794t, 795 epidemiologia, 160 epiderme, 319–320, 322f eritema, 652 Esser, Johannes, 22–24 estratégias de consultas na literatura estudos clínicos controlados randomizados, 153–154 estudos de casos controles, 155–156 estudos de coortes grandes, 160

estudos de preferência dos pacientes, 154 estudos multicêntricos, 154–155 estudos observacionais, 155 etanol, 692–693, 696 ética, 55–62 expansão das extremidades, 648 expansão tecidual, 637–638 fator de crescimento epidérmico (EGF), 189–190, 270t, 275, 625f fatores de contração derivados do endotélio (EDCFs), 573–574 fatores de relaxamento derivados do endotélio (EDRFs), 573–574 feridas excisionais, 286–287 garantia expressa, 94–95 glândulas écrinas, 322 implementação de barreiras, 169 informações, 168–169 integração de dados, 170–172 interações de fatores de crescimento e matriz extracelular, 275 juramento de MBA, 88q leis de privacidade, 121 limitações, 167–168 linfedema, 672 mecanismos epigenéticos, 181, 182 medicina regenerativa, 368 medidas de confiabilidade e validade, 162 medidas de desempenho, 172–173 metanálise, 151–152 métodos psicométricos modernos, 164 misturas eutéticas de anestésicos locais (EMLA), 682 Modelo Knowledge To Action (Modelo de Conhecimento para Ação), 169 nevo écrino, 723 nevo epidérmico, 718 níveis de evidência, 153t ossificação endocondral, 440 osteointegração craniofacial, 800–802 pacientes ambulatoriais, 60–61 perspectivas, 166 pesquisa, 171–172 pesquisa dos serviços de saúde e medicina com base em evidências, 150–175

pesquisa/questionário PRO (patient-reported outcomes), 171–172 politetrafluoretileno expandido (ePTFE), 790 princípios dos negócios, 87–88 prioridade em pesquisa nacional, 166 provedores e terceiros pagadores, 61–62 publicidade, 59–60 qualidade dos serviços de saúde, 172–174 queixas éticas, 57t questionários, 161–162 reconstrução da parede abdominal, 553t, 554 reconstrução orbitária osteointegrada, 802, 803 reconstrução osteointegrada da orelha, 800–802 rede multicêntrica de estudos clínicos, 168 registros clínicos, 158, 159 registros médicos eletrônicos, 171–172 relação paciente-cirurgião, 58–59 relações monetárias, 61–62 relatórios públicos, 173–174 resumo de pesquisa, 62, 168, 174–175 revisões sistemáticas, 152–153 salas cirúrgicas, 61 sarcoma de Ewing extraesquelético, 742 sarcoma epitelioide, 742 século XIX, 20, 21f segurança do paciente, 129–130 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 715q sistema de estadiamento clínico, 716t substâncias poliméricas extracelulares (EPS), 250 taxa de mortalidade, 157f tecnologia, 843 terapia com eletrocoagulação, 718 terapia eletrônica, 655–656 terapia embólica, 684 terapia genética, 191–192 terminologia e definições, 161–162 teste Electrostatic Detection Apparatus (ESDA), 95–96 testemunho de especialistas, 62, 92–93 tipos de estudos econômicos, 167

toxicidade, 148 transtornos alimentares, 49q tratamento do melanoma, 781t utilidades e valores, 164–165 variações de área pequena, 159 Organização Mundial da Saúde (OMS) (World Health Organization — WHO) considerações sobre segurança, 134 osso aloenxertos, 830 autoenxertos, 829–830 composição celular composição celular da matriz extracelular (ECM), 431–432 composição química fase inorgânica, 427 fase orgânica, 427 microanatomia osso esponjoso versus osso cortical, 425–426 ósteon, 426f processo de formação, 425–432 sistema haversiano, 426 osteoblastos características e funções, 427t, 428 regulação transcricional, 429 vias de sinalização principais, 428–429 osteócitos características, 427t, 429 função, 427t, 429–430 histologia, 429 mecanotransdução, 433 osteoclastos características e funções, 427t, 430–431 mecanismos de diferenciação, 431 efeitos da expansão tecidual, 623–624 homeostasia e renovação óssea lei de Wolff, 433 mecanotransdução, 433 princípios básicos, 432–438 regeneração óssea

angiogênese, 443–444 células-tronco mesenquimais (MSCs), 425–434 fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), 435t, 438, 443–444 fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), 435t, 438, 443–444 fator de crescimento fibroblástico (FGF), 435t, 437–438, 441–444 mecanismos moleculares, 434–435, 438 proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs), 434–436, 443–444 superfamília do fator de crescimento transformador β (TGF-β), 435t, 436–437, 443–444 osteossarcoma, 741 reparo e enxerto, 425–463 cimento em pasta BoneSource®, 461 fosfato de cálcio (CaP), 460–461 materiais osteoatrativos, 461–462 Norian SRS/CRS, 461 enxertos ósseos, 425–463 cicatrização de fraturas, 438–444 cicatrização do enxerto ósseo e sobrevida do enxerto, 448–449 colheita da calvária, 454, 455 colheita da costela, 452–454 colheita da fíbula, 452 colheita da tíbia, 452 colheita do ílio, 449–452 colheita do olécrano, 452 colheita do trocanter maior, 452 enxertos de osso esponjoso versus osso cortical, 449 enxertos ósseos alogênicos, 459–460 enxertos ósseos xenogênicos, 460 fatores relacionados à idade, 444 fixação de fraturas, 442 métodos de colheita, 449–455 remodelação óssea, 444–448 reparo ósseo primário, 439, 439–440 reparo ósseo secundário (calo ósseo), 439, 441 substitutos ósseos, 460 suprimento sanguíneo, 441–442 transferência de osso, 448 enxertos ósseos alogênicos

formulações de enxerto ósseo, 460 imunogenicidade, 460 incorporação do aloenxerto ósseo, 460 risco de transmissão de doenças, 459 técnicas de processamento e preservação, 459 vantagens, 459–460 osteogênese de distração histologia, 446–447 princípios básicos, 446–447 polímeros pré-fabricados Medpor®, 462 metilmetacrilato, 462 remodelação óssea fatores que influenciam, 447–448 fatores relacionados à idade, 448 fatores relacionados ao paciente, 448 osteocondução, 445 osteogênese de distração, 446–447 osteoindução, 444–445 osteointegração, 445 radioterapia (RT), 448 suprimento sanguíneo, 448 retalhos ósseos vascularizados calvária vascularizada, 457–459 costela vascularizada, 456–457 escápula vascularizada, 455–456, 458f fíbula vascularizada, 455, 457f transferência ilíaca vascularizada, 455, 456f vantagens, 455–459 transferência de osso cicatrização do enxerto ósseo e sobrevida do enxerto, 448–449 cimento em pasta, 460–462 colheita da calvária, 454, 455 colheita da costela, 452–454 colheita da fíbula, 452 colheita da tíbia, 452 colheita do ílio, 449–452 colheita do olécrano, 452

colheita do trocanter maior, 452 considerações clínicas, 449 enxertos de osso esponjoso versus osso cortical, 449 enxertos ósseos alogênicos, 459–460 enxertos ósseos xenogênicos, 460 indicadores, 448 métodos de colheita, 449–455 polímeros pré-fabricados, 462 princípios básicos, 459 retalhos ósseos vascularizados, 455–459 substitutos ósseos, 460 osso cortical, 425–426, 449 osso esponjoso (trabecular), 426 P p53 (gene supressor de tumor), 661–662 pacientes difíceis demandadores de direitos, 38 dependência, 37 negadores autodestrutivos, 37–38 pacientes detestáveis, 36–37 querelantes manipulativos que rejeitam ajuda, 38–39 pacientes insatisfeitos, 52, 53q curativos, ferida, 287–289 distorção, 33 doxiciclina, 692–693 Drucker, Peter, 79, 88–89 estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 Embolização, 700 ressecção, 689f, 700 histologia, 446–447 imagem Doppler, 500–501, 709–710 modelo DMAIC (definir, medir, analisar, melhorar, controlar) da melhora do processo, 77–78 princípios básicos, 446–447 Reforma Dodd-Frank Wall Street e Lei de Proteção ao Consumidor (Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act, 2010), 86 retalhos com base distal, 531

papila dérmica, 321, 322f pedículos toracodorsais e escapular circunflexo, 530f pênis escondido See pênis escondido pericárdio bovino, 796 personalidade dependente, 35 planejamento dos negócios, 80–82 polímeros biodegradáveis, 791–792 pós, pastas e fibras absorvíveis, 289t prática na estética, 100–101 pressão positiva das vias aéreas (CPAP), 127 princípios de contabilidade geralmente aceitos (GAAP), 67–69 princípios dos negócios, 64–91 características, 68–69 categorias de propriedades de negócios, 84–86 cirurgia de implante intramuscular técnica cirúrgica do implante intramuscular, 806–808 comando, 88–90 complexo industrial de saúde, 64–65 contabilidade análise do equilíbrio, 73f balancete, 67–68, 71f resumo do fluxo de caixa, 68, 72f custo de oportunidade, 71 declaração de renda, 67, 70f diretrizes fotográficas, 110f, 115–116 economia, 73–74 empreendedorismo, 80–82 empresa sustentável, 82–83 estratégia de marketing, 75, 76 estudo de caso do programa Six Sigma, 78q ética, 87–88 fluxo de caixa descontado, 72–73 índices de eficiência, 69 índices de influência, 69 índices de liquidez, 69 índices de rentabilidade, 69 inovação, 78–80 Lei de Proteção do Paciente e Tratamento Acessível (Patient Protection and Affordable Care Act, 2010), 86

Lei de Recuperação e Reinvestimento Americano (American Recovery and Reinvestment Act, 2009), 85 Lei Sarbanes-Oxley (Sarbanes-Oxley Act, SOX, 2002), 85 manejo de recursos humanos, 83–84 metas, 69–73 músculo glúteo máximo aplicações clínicas, 523–524 características, 516f reconstrução perineal, 557 úlceras de pressão, 562–565, 566–568 negociação, 86–87 operações/eficiência das operações, 76–78 princípios de contabilidade geralmente aceitos (GAAP), 67–69 princípios estratégicos, 65–67 Reforma Dodd-Frank Wall Street e Lei de Proteção ao Consumidor (Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act, 2010), 86 retorno do investimento, 72 teoria suprimento-demanda, 73–74 valor líquido, 72–73 valor temporal do dinheiro, 70–71 processos de diferenciação, 261, 264 proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs) cicatrização da ferida da pele, 274 engenharia de tecido ósseo, 393 homeostasia e renovação óssea lei de Wolff, 433 mecanotransdução, 433 princípios básicos, 432–438 regeneração óssea angiogênese, 443–444 células-tronco mesenquimais (MSCs), 425–434 fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), 435t, 438, 443–444 fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), 435t, 438, 443–444 fator de crescimento fibroblástico (FGF), 435t, 437–438, 441–444 mecanismos moleculares, 434–435, 438 proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs), 434–436, 443–444 superfamília do fator de crescimento transformador β (TGF-β), 435t, 436–437, 443–444 osteoblastos, 428 pesquisa atual e aplicações, 225f

potenciais aplicações, 213–214 regulação gênica, 180–181 Q quimiocinas cicatrização da ferida, 244–245 cicatrização da ferida da pele, 275 mediadores inflamatórios, 819–820 quimioterapia câncer de mama, 668 cirurgia estética em adolescentes, 45, 46 cirurgia plástica pediátrica cirurgia estética em adolescentes, 45, 46 defeitos congênitos e adquiridos, 44 deformidades craniofaciais, 44–45 expansão tecidual, 629 cirurgia robótica, 863 defeitos congênitos e adquiridos, 44 diretrizes fotográficas, 110f, 113f músculo reto do abdome, 552–553 músculo serrátil anterior, 552 retalho do músculo latíssimo do dorso (LD), 552–553 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 552–553 tumores de tecido mole e cutâneos, 717–718 quitosana, 376f R reação de Haber-Weiss (Fenton), 575 reações alérgicas à anestesia, 145 recuperação e reinvestimento (2009), 85 regeneração óssea células-tronco específicas do tecido, 230, 232 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC), 226 reinervação do músculo alvo (TMR) aplicação clínica, 353–354 aplicações da cirurgia plástica, 871–872 características, 516f características do tendão, 351f

cirurgia de garganta, 862–863 definição, 350–364, 870–871 discussão geral, 654–655, 870 engenharia da cartilagem, 421–423 enxertos de Thiersch-Ollier, 325–326 escritórios de licenciamento (TLO), 847, 848t pedículo toracodorsal, 530f perspectivas futuras, 364, 674 protease ácida resistente ao tartarato (TRAP), 430–431 radioterapia aplicações clínicas intenção de tratamento, 664 seleção do paciente, 664 unidades de radiação, 664 câncer de cabeça e pescoço, 668–669 câncer de mama conservação da mama, 665 irradiação da área de drenagem nodal, 665–666 pesquisas, 664–668 radiação pós-mastectomia (PMRT), 664 sequenciamento de quimioterapia, 668 técnicas de radioterapia, 666–668 câncer de pele não melanoma, 670–671 distúrbios benignos, 671 melanoma, 778 planejamento e processos, 662–664 sarcomas de tecido mole, 669–670 radioterapia, 654–675 reconstrução da parede abdominal, 553t, 554 reconstrução da virilha, 554–557 reconstrução perineal, 554–557 redes sociais, 871 resumo de pesquisa, 674, 873 retalhos da coxa, 557 retalhos delgados, 612 tatuagens, 297–298 técnica cirúrgica, 352–354 tecnologias, 870, 871t

Teflon, 790 telangiectasias, 677t telecirurgia, 871, 872f telemedicina aplicações da cirurgia plástica, 871–872 definição, 870–871 discussão geral, 870 redes sociais, 871 resumo de pesquisa, 873 tecnologias, 870, 871t telecirurgia, 871, 872f telemedicina ubíqua, 873 telemedicina móvel ubíqua, 873 temozolomida, 779 tenascina, 270–271 tendões de engenharia/substitutos de tendões bainhas, 362f estudos histológicos, 356–357, 359–361, 363f macroscopia, 355f, 358f, 360f modelos in vivo, 355f princípios básicos, 351–364 tensor da fáscia lata (TFL) terceiros pagadores, 61–62 Tessier, Paul, 3–4, 25, 862–863 Thiersch, Carl, 20 tiamina, 282 tomografia computadorizada (TC) tridimensional (3D), 662–664 toxicidades e complicações exposição acidental e ocupacional à radiação, 673–674 transferência de tecnologia, 844–848 trombina, 242–243, 245, 268–269 trombospondina, 244 tromboxano A 2(TXA 2), 573–574, 580–581 úlceras de pressão, 562–565 rejeição aguda, 819 rejeição crônica, 819 resultados do Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand (DASH), 835 resumo do fluxo de caixa, 68, 72f

retalho composto da artéria ilíaca circunflexa profunda, 529f retalho de avanço classificações, 513f retalho de padrão axial, 515f retalho do músculo gastrocnêmio cirurgia reconstrutora da extremidade inferior, 557–560 retalho do radial do antebraço ácido retinoico, 282 ácido ribonucleico (RNA), 179–180 alterações de registros, 95–96 analogia da escada reconstrutora aplicações de retalho, 534–536, 541 cirurgia da mão e membros, 857, 862 cirurgia reconstrutora de queimaduras, 857–862 aplicação clínica, 532f aspectos psicológicos, 39–42 ativador do receptor para o fator nuclear κB (RANK), 431 braquiterapia, 656 cicatrização fetal regenerativa (CRPS), 265–266 cirurgia estética, 25–26, 28 cirurgia estética em adolescentes, 45t cirurgias, 15–17 colheita da costela, 452–454 complicações teciduais normais, 659–660, 662 considerações sobre a reconstrução da mama discussão geral, 654–655 perspectivas futuras, 674 tumores de tecido mole e cutâneos, 715 declínio da cirurgia, 18 efeitos da remodelação óssea, 448 egípcios, 11–12 engenharia da cartilagem, 419–422 enxertos de cartilagem da costela, 407–411 enxertos de cartilagem nasal, 404–407 enxertos pericondriais autólogos, 408–413 espécies reativas do oxigênio (ROS), 256 estudos clínicos controlados randomizados, 153–154, 307 excisão de pele, 156, 157f

expansão do tecido, 637, 639f exposição, 673–674 desenvolvimento ósseo pediátrico, 672 lesões ósseas, 671–672 linfedema, 672 tumores e doenças malignas induzidas pela radiação, 673 Grécia, 13 hemangioma congênito de involução rápida (RICH), 677t, 685 hemangioma reticular, 681 história da cirurgia estética e reconstrutora, 11–28 Império Bizantino, 14 Índia, 12–13 infiltração, 141–142 lesões por radiação, 281 liberação do gene retroviral, 186–188 ligante do ativador do receptor para o fator nuclear κB (RANK) (RANKL), 431 manejo da ferida, 11 mastectomia radical, 202, 203f medicina regenerativa, 367–368 medida Rasch, 164 Mesopotâmia, 12 pesquisas, 160–161 rabdomioma, 732 rabdomiossarcoma, 741 racionalização, 33 radioterapia aplicações clínicas intenção de tratamento, 664 seleção do paciente, 664 unidades de radiação, 664 câncer de cabeça e pescoço, 668–669 câncer de mama conservação da mama, 665 irradiação da área de drenagem nodal, 665–666 pesquisas, 664–668 radiação pós-mastectomia (PMRT), 664 sequenciamento de quimioterapia, 668 técnicas de radioterapia, 666–668

câncer de pele não melanoma, 670–671 distúrbios benignos, 671 melanoma, 778 planejamento e processos, 662–664 sarcomas de tecido mole, 669–670 radioterapia (RT), 654–674 RANK, 431 RANKL, 431 rapamicina, 822t, 824 reconstrução da parede abdominal, 553t, 553–555 reconstrução da parede torácica, 552–553 reconstrução da virilha, 554–558 reconstrução do nariz, 16–18 reconstrução nasal osteointegrada, 802, 802–803 reconstrução perineal, 554–557 regras de alerta/bandeira vermelha (red flag rules), 94, 97–98 regressão, 32 Renascença, 16–18 repressão, 33 respiração, 144–145 resposta do tumor, 659–660, 662 resumo de pesquisa, 674 retalhos de fluxo reverso, 531, 532f retículo-histiocitoma, 736 retorno do investimento, 72 Reverdin, Jacques, 20 Revue de Chirurgie Plastique, 24–25 riboflavina, 282 Ritidoplastia Ver lifting facial ritual de cicatrização, 297–298 RNA ribossomal (rRNA), 179–180 Roma, 13–14 século XIX, 19–20 século XVIII, 18–19 tecnologia de refinamento, 843 toxicidade da radiação, 660, 661–662 toxicidades e complicações exposição acidental e ocupacional à radiação, 673–674

transposição reversa do retalho, 531–533 triângulo de reconstrução, 536 retalhos quiméricos, 612 revisões sistemáticas em base de dados Cochrane (Cochrane Database of Systematic Reviews), 152–153 robótica cirurgia urológica/de próstata, 863–864 classificações, 513f definição, 855 dispositivos da próxima geração, 864–865 fator de transcrição relacionado ao Runt 2 (Runx2), 429, 434f ferramentas cirúrgicas e próteses cirurgia abdominal e torácica, 863 cirurgia craniofacial, 862–863 analogia da escada reconstrutora, 857, 862 cirurgias reconstrutoras, 857–862 opções protéticas para extremidade superior, 857–860 prótese da mão robótica, 858–861 prótese de braço neural-prótese de mão, 858–861 prótese de membro inferior, 862 cirurgia de ouvido, nariz e garganta, 862–863 perspectivas futuras, 864–865 resultados baseados em evidência, 864 prostatectomia laparoscópica auxiliada por robótica (RALP), 864 resumo de pesquisa, 873 Roe, John Orlando, 25–28 Roma, 13–14 Rosselli, Gustavo Sanvenero, 22–24 rotação de retalhos classificações, 513f Roux, Philibert, 19 vantagens/desvantagens de próteses robóticas das mãos, 861–862 i-LIMB Pulse, 860f LIVINGSKIN, 861f mãos robóticas, 858–861 ProDigits, 861f rompimento, 192–193 S

Sabattini, Pietro, 20f abuso de substâncias, 50 aço inoxidável, 786–787 adenoma sebáceo, 723 alotransplante de tecido composto (CTA), 2–3 análise SIPOC (fornecedores, entrada, metódo, saída e clientes), 77–78 anatomia e fisiologia células-tronco, 321 derme, 320, 322f epiderme, 319–320, 322f estruturas glandulares, 322–323 folículos pilosos, 321, 322f funções da pele, 319–323 glândulas sebáceas, 322 regeneração da pele, 321 suprimento de vasos sanguíneos, 321 antígeno leucocitário suíno (SLA), 815–816 antígenos específicos da pele, 816 antiporter de isoforma 1 de troca de Na +/H+ (NHE-1), 576, 577 aplicações clínicas prospectivas células-tronco pluripotentes induzidas aplicações in vitro, 237–238 características, 235, 237 correlações clínicas, 238–239 fatores de transcrição, 235f modelos in vivo, 238–239 produção de lentivírus e transdução, 237 protocolos de diferenciação de fibroblastos, 237 protocolos de diferenciação in vitro, 237–238 riscos potenciais, 237, 237–238 estrutura de biomateriais, 233, 234 terapias de indução genética, 234 área periorbitária, 638–642 avaliação clínica, 264–266, 298–300 biologia e formação de cicatriz, 300, 301–302 biópsia do linfonodo sentinela (SNLB), 758–761 biópsias sistema de estadiamento clínico, 716t

câncer de cabeça e pescoço câncer de pele, 670–671 características, 196–198, 737, 742 características e classificações, 212–214 características e funções, 250–252, 301–302, 304 carcinoma de células escamosas (SCCs) câncer de cabeça e pescoço, 668–669 características, 737 carcinoma sebáceo, 738 Care Improvement Project (SCIP), 172–173 células de Schwann, 231–232, 707 células-tronco, 212–239 células-tronco derivadas de hemangioma (HemSC), 678–680 células-tronco epidérmicas, 262, 263 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) cicatrização da ferida, 262 correlações clínicas, 228 definições, 223–224 modelos in vivo, 226 pesquisa atual e aplicações, 224–226 protocolos de diferenciação e colheita de tecido in vitro, 226 terapia genética, 190 células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC) cicatrização da ferida, 262 correlações clínicas, 228 definições, 223–224 modelos in vivo, 226 pesquisa atual e aplicações, 224–226 protocolos de diferenciação e colheita de tecido in vitro, 226 terapia genética, 190 células-tronco pós-natais e somáticas ASCs humanas versus camundongos, 219 características, 217, 218 células-tronco pluripotentes induzidas, 236 engenharia de tecidos, 369–371 enxertos de gordura, 345–347 métodos de colheita, 218, 219 métodos de liberação, 220

modelos in vivo correlações clínicas, 223 defeito de calvária de 4 mm em camundongo atímico nu, 221–223 perspectivas futuras, 223, 224–225 protocolos de diferenciação in vitro diferenciação adipogênica, 221, 222f diferenciação condrogênica, 221 diferenciação osteogênica, 220–221 receptores de superfície celular, 219–220 Center for Devices and Radiological Health (CDRH), 847–849 ceratose seborreica, 719, 747–748, 750 cicatrização da ferida, 262 cicatrização da ferida da pele, 263, 267–296 aspectos históricos, 267 cicatriz excessiva características, 283–285 cicatrizes hipertróficas, 283–284 cicatrizes queloides, 284t, 284–285 comparações entre o reparo da ferida em adultos e o reparo no feto diferenças celulares, 277 diferenças na matriz extracelular (MEC), 278 diferenças no expressão gênica, 278 diferenças no reparo, 277–278 expressão do fator de crescimento, 278 curativos classificações, 287–289 dispositivo de vestimenta subatmosférica, 288, 289t terapia de compressão, 288, 289t estratégias de tratamento algoritmos de tratamento, 290–291, 293f cicatrizes hipertróficas de queimaduras abrangentes, 293, 294 cicatrizes hipertróficas imaturas, 291–293 cicatrizes hipertróficas lineares, 292–293 efeitos da cirurgia plástica, 294–295 feridas abertas crônicas, 287 perspectivas futuras, 295–296 queloides maiores, 293f, 294 queloides menores, 293f, 294

tecido necrótico, 287 tratamentos emergentes, 294–295 fase de proliferação angiogênese, 271 contração da ferida, 271–272 formação da matriz extracelular (MEC), 269–271 formação do tecido de granulação, 271 resurfacing epitelial, 272–273 feridas que não cicatrizam características, 279–283 fatores que influenciam, 280t feridas da extremidade inferior, 279–281 feridas isquêmicas, 279–281 infecção da ferida, 281–282 lesões por radiação, 281 pacientes obesos, 282 subnutrição/desnutrição, 282 tratamento médico, 282–283 úlceras de pressão, 279 úlceras diabéticas, 281 úlceras venosas, 279 manejo clínico da ferida curativos das feridas, 287–289 discussão geral, 285–295 feridas abertas, 286–287 feridas excisionais, 286–287 feridas fechadas, 285–286 feridas incisionais, 285–286 substitutos de pele, 289t, 290 tratamento da cicatriz excessiva, 290–291 tratamento da ferida, 284 tratamento farmacológico, 290 patologia das feridas do adulto cicatriz excessiva, 283–285 feridas que não cicatrizam, 279–283 perspectivas futuras terapia com protease, 295 terapia genética, 295

tratamento com células-tronco, 296 tratamento com fator de crescimento, 295 regulação do fator de crescimento características, 273–275 fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), 274 fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), 275 fator de crescimento epidérmico ligado à heparina (HB-EGF), 275 fator de crescimento fibroblástico (FGF), 274–275 interações de fatores de crescimento e matriz extracelular, 275 superfamília do fator de crescimento transformador β (TGF-β), 274 reparo da ferida em adultos características, 268, 273 comparação com o reparo da ferida no feto, 277–278 fase de inflamação, 268, 269 fase de proliferação, 268f, 269–273 fase de remodelamento, 268f, 273, 276f formação de cicatriz, 276f reparo da ferida no feto cicatrização da ferida, 276–278 comparações com reparo da ferida no adulto, 277–278 expressão do fator de crescimento, 278 transição de formação de cicatriz a cicatrização sem cicatriz, 277 tratamento da cicatriz excessiva classificação da ferida, 290, 291t prevenção e tratamentos de redução, 291, 292t tratamentos, 290–291 cicatrização de fraturas características, 438–444 fatores relacionados à idade, 444 fixação de fraturas, 442 reparo ósseo primário, 439, 439–440 reparo ósseo secundário (calo ósseo), 439, 441 suprimento sanguíneo, 441–442 cicatrizes, 297–317 cicatrizes excessivas classificação da ferida, 290, 291t prevenção e tratamentos de redução, 291, 292t tratamentos, 290–291

biologia e formação de cicatriz, 273, 276f, 300, 301–302 características e funções, 264–266, 301–302, 304 cicatrização fetal regenerativa, 265–266 cicatrizes hipertróficas, 265, 283–284, 302, 303f, 307–308 cicatrizes imaturas, 302t cicatrizes queloides, 265, 284t, 284–285, 302–304, 308–309 diagnóstico adequado, 307–309 cicatrizes queloides, 730 cimento em pasta BoneSource®, 461 fosfato de cálcio (CaP), 460–461 materiais osteoatrativos, 461–462 Norian SRS/CRS, 461 cintigrafia, 710 cirurgia estética em adolescentes, 45t cirurgia plástica pós-guerra, 26f cirurgia reconstrutora da extremidade inferior, 557–561 colaborações, 3–4 composições de ligas metálicas, 786–787 condições não tomadas, 334 contração da ferida, 334 seromas, 334 conflitos de interesse, 849 contorno do corpo não invasivo, 852 corporação S, 85 correção de cicatriz correção da cicatriz, 311–312 estratégias de planejamento, 311 excisão seriada, 311f indicadores, 310 princípios básicos, 310 rearranjo do tecido, 312 técnica de plastia em Z ganho em altura, 313t linha geométrica, 316, 317f plastia em Z com retalho múltiplo, 315, 315–316 plastia em Z oblíqua, 314, 315 plastia em Z planimétrica, 314

plastia em Z simples, 313, 314 plastia W, 316, 317f princípios básicos, 312–313, 316 retalhos de avanço V-Y e Y-V, 316 tempo cirúrgico, 310 tratamentos com laser, 308 cuidado pós-operatório e acompanhamento, 316–317 definição, 319, 339–342, 815 dermatofibroma, 729 determinação etiológica, 298 determinações de valor, 843–844 diagrama esquemático, 340f discussão geral, 1 documentação e dados, 8–9 efeitos da expansão tecidual, 623 empresa sustentável, 82–83 engenharia da cartilagem baseada nas células-tronco, 423 engenharia de tecidos, 369–371, 380f, 388–389, 394–395 enxertos de pele, 319–338 enxertos de pele de tecido de espessura total expandido, 630 enxertos ósseos, 425–463 enxertos ósseos alogênicos formulações de enxerto ósseo, 460 imunogenicidade, 460 incorporação do aloenxerto ósseo, 460 risco de transmissão de doenças, 459 técnicas de processamento e preservação, 459 vantagens, 459–460 enxofre (S) escleroterapia, 683f, 692–693, 695, 718 esteatocistoma múltiplo, 723, 724f estenose, 677t estomelisinas, 269–271 estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 estrato córneo, 320

estreptocinase, 617 estruturas anexas da pele, 320 estudo de caso do programa Six Sigma, 78q exame físico, 298 excisão de melanoma, 765–766 expansão tecidual, 630–634, 638–639, 641–642 expansores de silicone, 627 fenda labial e palatina sindrômica, 194–195 feridas agudas, 241, 242 fibroma de tecido mole, 730 forças condutoras, 4–5 fusão espinal, 227 gêmeos siameses Ver gêmeos siameses gene Sonic hedgehog (Shh) glândulas sebáceas, 321–322 glândulas sudoríferas, 322, 738 hemangioma moriforme, 678t, 734–735 herança ligada ao sexo, 182, 183f ideias inovadoras, 842–843 impactos tecnológicos, 843, 844f implantes, 789–790 implementação, 865 influências externas, 8 informações, 841–842 inibidores seletivos da receptação seletiva de norepinefrina, 51 inovação cirúrgica, 1–9, 841–852 Inovação tecnológica em pequenas empresas (SBIR), 844–846 inovações na cirurgia plástica, 850 jornais/revistas científicas (século XX), 24–25 lâminas de gel de silicone, 289t, 292t, 293f, 307 Lei Sarbanes-Oxley (Sarbanes-Oxley Act)(SOX, 2002), 85 lesões de estiramento, 466t, 467–468 linhas de Sappey, 757–758 marcas na pele, 730 matriz dérmica acelular (ADM), 851, 852 mecanismos de enxertamento embebição no soro, 325f maturação, 325f

revascularização, 325f melanoma de disseminação superficial, 750–754 modelo genômico-comportamental-físico, 869f, 870 mucosa de intestino delgado, 796 músculo sartório, 516f, 554–557 negadores autodestrutivos, 37–38 nevo de Spitz, 724–726 nomenclatura, 789t ontogênese, 707, 708f osteoblastos, 428–429 osteointegração craniofacial, 810, 812f pacientes com apneia do sono, 126–128 pedículos escapulares e toracodorsais, 530f perspectivas futuras, 870 placa em salmão, 734 plastia em Z oblíqua, 314, 315 plastia em Z simples, 313, 314 pleioleiomioma solitário, 731–732 polímeros pré-fabricados calvária vascularizada, 457–459 costela vascularizada, 456–457 escápula vascularizada, 455–456, 458f fíbula vascularizada, 455, 457f Medpor®, 462 metilmetacrilato, 462 transferência ilíaca vascularizada, 455, 456f vantagens, 455–459 polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs), 184–185 potenciais aplicações, 213–214 prevenção fatores específicos do paciente, 306 infecção da ferida, 306 reação a corpo estranho, 306 técnica cirúrgica, 304, 305–306 terapia auxiliar, 306–307 princípios básicos, 5–7, 865 processo de enxertamento de pele apêndices cutâneos, 325

embebição no soro, 323 estruturas funcionais, 325 maturação, 324 procedimentos operacionais, 323–325 revascularização, 323–324 processos de financiamento, 844–846 processos regulatórios, 847–849 propriedade, 85 propriedade intelectual, 846–847 questões de regulação, 8–9 radioterapia, 668–670 reconstrução da parede torácica, 552 reconstrução secundária da mama, 644, 646f redes sociais, 98–99, 871 regeneração da pele, 229, 232, 321 registros Surveillance Epidemiologia and End Results SEER, 158, 159 relação cirurgia plástica-inovação, 2 relação pesquisa-inovação, 2 remodelação óssea fatores que influenciam, 447–448 fatores relacionados à idade, 448 fatores relacionados ao paciente, 448 osteocondução, 445 osteogênese de distração, 446–447 osteoindução, 444–445 osteointegração, 445 radioterapia (RT), 448 suprimento sanguíneo, 448 reparo ósseo secundário (calo ósseo), 439, 441 resumo de pesquisa, 873 retalho padrão, 514 retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 571–572 Saliceto, William of, 15 Salmon, Michel, 482–484 Schireson, Henry J, 27 schwanomas, 727, 728f século XIX, 20, 21f seio pericraniano, 695

semear dinheiro, 844–846 sensibilidade nervosa, 320 serina, 269–271 serotonina, 573–574, 580–581 sertralina, 51 Sheehan, Eastman, 23–24, 27 significado social e pessoal, 297–298 sílica, 789t silicatos, 789t siloxano, 789t simulação função simuladores de planejamento cirúrgico, 869, 870 simuladores para treinamento, 865–869 implementação, 865 modelo genômico-comportamental-físico, 869f, 870 perspectivas futuras, 870 princípios básicos, 865 resumo de pesquisa, 873 uso racional, 865 síndrome de Sturge-Weber, 679f, 688–689, 701–702, 734 síndrome Saethre-Chotzen, 196–198 siringoma, 722 sirolimo, 822t sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 715q sistema de estadiamento de Schobinger, 698–699 Smith, Ferris, 27 Smyth papyrus, 11–12 sobrecarga de Na2 + intracelular, 576, 577 sociedades científicas (século XX), 24 Société Européenne de Chirurgie Structive, 24 Société Française de Chirurgie Réparatrice Plastique et Esthétique, 24 somatização, 33 somatostatina C (Sm-C), 270t Staphylococcus aureus, 249–250 Stony Brook Scar Evaluation Scale (SBSES), 264–266, 299 Streptomyces hygroscopicus, 824 Streptomyces tsukubaensis, 823–824

sublimação, 33 sulfato de tetradecil sódico (STS), 692–693, 696 superóxido (O2), 575 taquicardia supraventricular, 145 taxas de sobrevida, 340, 341f tecnologia de transmissão e armazenamento, 870, 871t tecnologia sustentável, 843–844 transferência de osso cicatrização do enxerto ósseo e sobrevida do enxerto, 448–449 cimento em pasta, 460–462 colheita da calvária, 454, 455 colheita da costela, 452–454 colheita da fíbula, 452 colheita da tíbia, 452 colheita do ílio, 449–452 colheita do olécrano, 452 colheita do trocanter maior, 452 considerações clínicas, 449 enxertos de osso esponjoso versus osso cortical, 449 enxertos ósseos alogênicos, 459–460 enxertos ósseos xenogênicos, 460 indicadores, 448 métodos de colheita, 449–455 polímeros pré-fabricados, 462 princípios básicos, 459 retalhos ósseos vascularizados, 455–459 substitutos ósseos, 460 transferência institucional de tecnologia, 847, 848t transplante de tecido aloenxertos, 829 autoenxertos, 828–829 xenoenxertos, 829 transposição de retalho segmentar, 522–524 tratamento do melanoma, 781t tratamentos emergentes, 294–295, 309–310 tumores características, 737 ceratose actínica, 736

tumores benignos de origem da crista neural fibroma, 728 mancha mongólica, 726–728 melanose de Becker, 725 neuromas, 727 nevo azul, 727 nevo de células pigmentadas características, 723–725 lentigo simples, 723–724 melanoma juvenil, 724–726 nevo congênito de células pigmentadas, 724, 725f nevo de células pigmentadas adquirido, 724 nevo displásico, 724 nevo de Ito, 726, 727f nevo de Ota, 725–726 nevo lentiginoso salpicado (nevo spilus), 725, 726f tumores benignos de origem de apêndices cistadenoma apócrino, 722–723 cisto triquilemal, 722 esteatocistoma múltiplo, 723, 724f nevo sebáceo, 721 pilomatricoma, 721, 722 siringoma, 722 siringoma condroide, 723 tumores benignos de origem epitelial ceratoacantoma, 719 ceratose seborreica, 719 cisto dermoide, 720, 721f cisto epidermoide, 719, 720f mília, 719–720 nevo epidérmico, 718 tumores benignos de origem mesenquimal acrocórdon, 730 aurículas acessórias, 732–733 cicatrizes hipertróficas, 730 cicatrizes queloides, 730 cisto mucoso da mucosa da cavidade oral, 736 dermatofibroma, 729

fibroma de tecido mole, 730 fibroma pêndulo, 730 granulomas, 733–734 hemangioma cavernoso, 735 leiomioma, 731–732 lipoma, 731, 731–733 malformação arteriovenosa e fístula arteriovenosa (AVM), 735, 736f malformação capilar hemangioma moriforme, 734–735 hemangioma simples, 734, 734–735 malformação linfática, 736 malformação venosa, 735 rabdomioma, 732 tumor do glomo, 734 tumores osteocondrogênicos, 732, 733f xantogranuloma juvenil, 729–730 xantoma, 729 tumores de tecido mole e cutâneos, 707–742 carcinoma de células basais análise dermoscópica, 709 características, 737 classificação histológica, 738q coloração dos tumores, 709 margens cirúrgicas, 717q tumores de tecido mole e cutâneos, 715 úlceras de estase, 253 uso racional, 865 verrugas senis, 719 sarcoma ósseo estratégias de tratamento diretrizes de intervenção, 699–700 embolização, 700 ressecção, 689f, 700 sensores do semicondutor de óxido metálico complementar (CMOS), 117–119 sialoproteína óssea (BSP), 428, 431–432 simulação baseada na computação cirurgia plástica na infância, 44 craniossinostose sindrômica, 196–198

doenças genéticas características, 192–198 craniossinostose, 195–196 nomenclatura, 192–193 fenda labial e palatina não sindrômica, 193–194 fenda labial e palatina sindrômica, 194–195 fendas orofaciais, 193 implementação, 865 modelo genômico-comportamental-físico, 869f, 870 perspectivas futuras, 870 princípios básicos, 865 simuladores de planejamento cirúrgico, 869, 870 simuladores para treinamento, 865–869 uso racional, 865 sinalização de β-catenina, 428–429 síndrome da mola B-K, 747 síndrome de Angelman, 183 síndrome de Apert craniossinostose sindrômica, 197 síndrome de Beare-Stevenson, 197t síndrome de CLOVES patogênese, 698f, 705 síndrome de Crouzon características, 197 síndrome de Jackson-Weiss, 197 cinase aminoterminal c-jun (JNK), 626f Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory (APL), 860–861 Joseph, Jacques, 25–26, 28 melanoma juvenil, 724–726 nevo juncional, 744 reparo e reconstrução da cartilagem articular, 421–423 xantogranuloma juvenil, 729–730 síndrome de Kallman, 194 síndrome do nevo bolhoso borrachoide azul (BRBS)/síndrome do nevo azul, 695 síndrome do nevo (displásico) atípico, 746–747 siringoma condroide, 723 sistema da Vinci aprovação pela FDA, 855–857

características do desenho, 855–856 cirurgia craniofacial, 862 simuladores para treinamento, 865–869 vantagens/desvantagens, 856 sistema de classificação, 125, 125–126 sistema nervoso central efeitos da anestesia local, 146 Sociedade de Cirurgia Plástica (ASPS) Código de Ética, 57–58 antecedentes históricos, 24 Sociedade de Cirurgia Plástica Estética (ASAPS), 57–58 Sociedade de Terapia Genética e Celular, 192 Staphylococcus coagulase negativo, 249–250 substitutos dérmicos Apligraf®, 337, 794t, 795 cicatrização da ferida da pele, 289t comparações de produtos comerciais, 794t Dermagraft®, 337, 794t, 795 enxertos de pele, 335, 336f Epicel®, 794t, 795 Integra®, 794 substitutos de pele fabricados por bioengenharia, 793–795

T tacrolimo, 822t, 823–824, 833t Tagliacozzi, Gaspare reconstrução do nariz, 11, 17–18 Tansini, Iginio, 26f taquicardia, 145 técnica de plastia em Z cicatrizes hipertróficas de queimaduras abrangentes, 293–294 ganho em altura, 313t linha geométrica, 316, 317f plastia em W, 316, 317f plastia em Z com retalho múltiplo, 315, 315–316 plastia em Z oblíqua, 314, 315 plastia em Z planimétrica, 314 plastia em Z simples, 313, 314 princípios básicos, 312–313, 316 retalhos de avanço V-Y e Y-V, 316 tecnologia disruptiva, 843–844 telemedicina ubíqua, 873 territórios arteriais, 482–484 testes de Carroll, 835–837 timina, 177, 182 agentes antiproliferativos antígenos dos grupos sanguíneos, 816 azatioprina, 821–822, 833t células da resposta imune cascata do complemento, 817 células dendríticas, 818 células natural killer (NK), 816–817 discussão geral, 816–819 granulócitos, 817 imunoglobulinas, 817 linfócitos B, 817 linfócitos T, 816–819 macrófagos, 816 inibidores de calcineurina ciclosporina, 822t, 823

rapamicina, 822t, 824 tacrolimo, 822t, 823–824 métodos imunossupressores recentes, 820–822 mofetil micofenolato, 822, 823, 833t anergia, 827 anormalidades cromossômicas hereditárias, 184 antígenos de histocompatibilidade principal, 816 antígenos específicos da pele, 816 aparência de construção, 415f aplicações da cirurgia plástica cartilagem aloenxertos, 831 autoenxertos, 830–831 xenoenxertos, 831 considerações funcionais, 832 considerações imunológicas, 832 considerações técnicas, 832 discussão geral, 831–834 membros e tecido composto nervos aloenxertos, 831 autoenxertos, 831 osso aloenxertos, 830 autoenxertos, 829–830 pele aloenxertos, 829 autoenxertos, 828–829 xenoenxertos, 829 transplante de mãos avaliação de resultados, 835–837 estado atual, 834–837 imunossupressão, 834–835 sobrevida do transplante, 834–835 transplante experimental de membros, 832–834 avaliação da forma, 417f contorno facial, 419–421 perspectivas futuras

terapia com protease, 295 terapia genética, 295 tratamento com células-tronco, 296 tratamento com fator de crescimento, 295 pesquisas, 413 princípios básicos, 413 reparo e reconstrução da cartilagem articular, 421–423 rinoplastia, 419–422 biológicos, 206 abordagens de manejo, 208–210 biopatologia classificações dos tumores, 208 margens dos tumores, 207–208 massa crítica, 207 resumo de pesquisa, 210 volume clínico (CTV), 663 volume macroscópico do tumor (GTV), 663 biomedicina, 212–213 características biológicas atrofia muscular, 623 bases celulares e moleculares, 624–626 cápsulas fibrosas, 623 discussão geral, 623–626 osso, 623–624 pele, 623 vascularidade, 624, 624–625 vias de transdução de sinal, 626f carcinoma triquilemal, 738 cascata de rejeição imunológica, 816–819 casos especiais crianças, 629–630 enxertos de pele de espessura total expandidos, 630 queimaduras, 629 retalhos fasciais, 630 retalhos livres, 630 retalhos miocutâneos, 630 células de amplificação (TA), 262f células reguladoras, 827–828

células-tronco específicas do tecido correlações clínicas diferenciação de osteoblastos, 232 músculos, 232 regeneração da pele, 232 reparo de nervo periférico, 233 vasos sanguíneos, 232 definições, 228–229 pesquisa atual e aplicações diferenciação de osteoblastos, 230 músculos, 230–231 regeneração da pele, 229 reparo de nervo periférico, 231, 232 vasos sanguíneos, 230, 231f células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea (BMSC), 225–226 células-tronco mesenquimais (MSCs), 225–226 células-tronco totipotentes, 261, 264 cicatrização da ferida, 244–245 cicatrização da ferida da pele, 268, 269, 270t, 275 cirurgia plástica moderna, 20–23 cirurgia plástica pós-guerra, 25, 25–26 cirurgias reconstrutoras, 647 cisto de inclusão traumático, 720 cisto triquilemal, 722 colheita da tíbia, 452 complexo de histocompatibilidade principal (MHC), 815–816 componentes biomateriais biomateriais cerâmicos, 375 biomateriais naturais, 375 biomateriais sintéticos, 375, 376f critérios gerais, 374–375, 377 hidrogel, 375–377 características, 369–386 células aplicações, 373–374 biorreatores, 372–373 coculturas, 372

cultura bidimensional/tridimensional (2D/3D), 371, 372 fontes de células, 369–371 sinalização bioquímica, 371 matriz biomateriais, 374–377 construção de tecidos por engenharia, 377–380 sistemas adaptados de entrega, 380–381 composições de ligas metálicas, 786–787 correlações clínicas diferenciação de osteoblastos, 232 músculos, 232 regeneração da pele, 232 reparo de nervo periférico, 233 vasos sanguíneos, 232 corticosteroides, 821, 822t deficiência em metais-traço, 282 definição, 367 definições, 228–229 desafios, 814 direito penal, 93 discussão geral, 367–369 embriologia, 368–369 engenharia de tecidos, 367–396 enxerto dérmico e reparo aplicação clínica, 340–342 definição, 339–342 diagrama esquemático, 340f perspectivas futuras, 342 sobrevida, 340, 341f substitutos dérmicos, 342 técnica cirúrgica, 340 enxerto de tecido, 339–366 enxerto e reparo do tendão aplicação clínica, 353–354 características do tendão, 351f definição, 350–364 perspectivas futuras, 364 técnica cirúrgica, 352–354

tendões de engenharia/substitutos de tendões engenharia de bainha, 362f estudos histológicos, 356–357, 359–361, 363f macroscopia, 355f, 358f, 360f modelos in vivo, 355f princípios básicos, 351–364 enxerto e reparo muscular aplicação clínica, 364 definição, 364–366 perspectivas futuras, 364–366 técnica cirúrgica, 364 enxerto fascial e reparo aplicação clínica, 348, 349–350 definição, 348–350 perspectivas futuras, 348–350 técnica cirúrgica, 348 enxertos de gordura aplicação clínica, 342–347 definição, 342–347 métodos de colheita, 342f perspectivas futuras, 346–348 enxertos de tecido, 339–366 enxerto de músculo e reparo aplicação clínica, 364 definição, 364–366 perspectivas futuras, 364–366 técnica cirúrgica, 364 enxerto dérmico e reparo aplicação clínica, 340–342 definição, 339–342 diagrama esquemático, 340f perspectivas futuras, 342 substitutos dérmicos, 342 taxa de sobrevida, 340, 341f técnica cirúrgica, 340 enxerto de tendão e reparo aplicação clínica, 353–354 características do tendão, 351f

definição, 350–364 perspectivas futuras, 364 técnica cirúrgica, 352–354 tendões de engenharia/substitutos de tendões, 351–364 enxerto fascial e reparo aplicação clínica, 348, 349–350 definição, 348–350 perspectivas futuras, 348–350 técnica cirúrgica, 348 enxertos de gordura aplicação clínica, 342–347 definição, 342 métodos de colheita, 342f perspectivas futuras, 346–348 enxertos de tecido composto, 365f, 366 informações, 339 enxertos de tecido composto, 365f, 366 estrutura em forma de orelha, 416f estudos histológicos, 418f ética, 388 excisão de melanoma, 767–768, 772f exemplos naturais, 369 expansão das extremidades, 648 expansão do tronco, 648–651 expansão tecidual, 622–652 explosão biomédica, 212–213 família do fator associado ao receptor deTNF (TRAF), 431 fator de crescimento transformador-α (TGF-α), 270t, 275 fator tecidual, 242–243, 245 função, 816–819 gene supressor de tumor p53, 661–662 informações, 339, 622, 814 Inibidores teciduais e metaloproteinases (TIMPs), 300 inovação cirúrgica, 5–7 interatividade da televisão (via de duas mãos), 870–871 jornais/revistas científicas, 24–25 ligação de célula T e ativação, 818 ligas de titânio, 787, 788f

linfócitos T CD25, 827–828 linfócitos T CD4/CD8, 47–48, 818–819, 827–828 macroscopia, 416f mama hipoplásica mama imatura, 648 mama tuberosa, 647 princípios básicos, 647–648 síndrome de Poland, 648, 649f manejo do risco, 388 manejo do tumor, 201–210 informações, 201 tratamentos do câncer aspectos históricos, 201–207 cirurgia, 202 imunoterapia, 204–206 quimioterapia, 204 radiação ionizante, 202–204 terapia fotodinâmica, 206–207 manipulação cirúrgica, 578 mediadores inflamatórios, 819–820 medicina regenerativa, 367–368 melanoma, 749–752, 761 modelo de vascularização modelo de vascularização extrínseca, 381–382 modelo de vascularização intrínseca angioblasto humano, 385f brotamento angiogênico, 385f câmara de policarbonatos, 384–385 câmara de silicone, 385f câmaras de modelos suínos, 387f cardiomiócitos neonatais, 386f princípios básicos, 382–386 retalhos pré-fabricados, 383f vascularização baseada em Matrigel, 386f nutrição celular e tecidual, 381 nomenclatura, 815 oxigenação do tecido, 256–257, 259 perspectivas futuras, 837–839

pesquisa atual e aplicações diferenciação de osteoblastos, 230 músculos, 230–231 regeneração da pele, 229 reparo de nervo periférico, 231, 232 vasos sanguíneos, 230, 231f pesquisa de perspectiva futura, 837–839 preparações antilinfócitos alentuzumab, 821t, 825–826 anti-IL-2, 821t, 825 globulina antitimócitos, 821t, 824 OKT3, 821t, 825 tolerância imunológica, 826 princípios básicos, 367 processos de transdiferenciação, 261, 264 processos regulatórios de aprovação, 388 programas de treinamento, 23–24 queimaduras, 42–43 radioterapia (RT), 662 rearranjo tecidual, 312 receptor de célula T (TCR), 816–819, 826–827 receptores Toll-like (TLRs), 247, 249 reconhecimento do antígeno e rejeição do enxerto, 819 reconstrução da cabeça e pescoço área periorbitária, 638–642 couro cabeludo, 631–634 nariz, 637, 639f orelhas, 637–638 padrão masculino de calvície, 633–635 princípios básicos, 631–640 região lateral da face e pescoço, 635–638 testa, 635 reconstrução da cabeça e pescoço, 544, 544–545 reconstrução da mama, 546–549 reconstrução da mama pós-mastectomia princípios básicos, 640–647 reconstrução e regeneração do tecido, 190–191 reconstrução secundária da mama, 644, 646f

reparo do tecido, 189–190 retalhos do músculo tibial anterior, 526f retalhos musculares/retalhos musculocutâneos, 522 RNA de transferência (tRNA), 179–180 semeadura de condrócitos, 414f sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 713–714 sistema de classificação TNM de tumores de tecido mole e cutâneos, 711, 712–715 sociedades científicas, 24 stents externos, 415f superfamília do fator de crescimento transformador β (TGF-β) cicatrização da ferida, 244–245 cicatrização da ferida da pele, 270t, 274, 294–295 efeitos da expansão tecidual, 625f osteoblastos, 428 radioterapia (RT), 662 regeneração óssea, 435t, 436–437, 443–444 regulação gênica, 180–181 tratamento da cicatriz, 309–310 sustentação de biomateriais, 187–189 tecidos específicos bexiga urinária, 394–395 cartilagem, 393–394 engenharia de tecido ósseo, 392–393 engenharia de tecidos adiposos, 387f, 389, 390 engenharia de tecidos cutâneos da pele, 388–389 engenharia de tecidos musculares, 390–391 engenharia de tecidos nervosos, 391–392 regeneração de órgãos, 394–395 vasos sanguíneos, 392 técnica cirúrgica e tratamento enxertos de pele, 342 inovação cirúrgica, 851, 852 técnicas e testes de geração, 413–421 testes e caracterização, 386–388 testes mecânicos macroscópicos, 419f tiamina, 177, 182 ticlopidina, 617 tipos de implantes

características, 626–627 expansores autoinfláveis, 627 expansores com portas distais, 627 expansores com portas integradas, 627 expansores de silicone, 627 expansores diferenciais, 627 Tolypocladium inflatum gams, 823 Touch Bionics, 858–861 Tracking Operations and Outcomes for Plastic Surgeons (TOPS), 158, 159 transferência, 33 transplante de mãos, 42 transplante de tecido, 814–839 triagem imunológica, 820 tricoepitelioma, 723 tricofoliculoma, 723 triquilemoma, 723 tumescência, 140-144 tumores de tecido mole e cutâneos, 707–742 carcinoma de células basais análise dermoscópica, 709 características, 737 classificação histológica, 738q coloração dos tumores, 709 margens cirúrgicas, 717q tumores nervosos schwanomas, 727, 728f Twitter, 98–99 valor temporal do dinheiro, 70–71 volume de tumor (GTV), 663 tomografia computadorizada (TC) detecção de melanoma, 762, 764 estudos de angiossomos, 480–483 pesquisa anatômica vascular, 501, 502f tumores de tecido mole e cutâneos, 710 função, 869, 870 pesquisa anatômica vascular, 501, 502f tomografia computadorizada (TC) tridimensional (3D), 662–664 toxicidade cardiovascular, 146

transtorno de personalidade borderline, 36 transtorno dismórfico do corpo (BDD), 50, 51 transtornos de pânico e ansiedade generalizada, 48–49 transtornos depressivos, 47–48 triângulo de Burow, 304 trifosfato de adenosina (ATP), 256f, 258, 575, 575–576 trifosfato de desoxiguanosina (dGTP), 822–823 tumor desmoide, 736 tumores de tecido mole e cutâneos, 707–742 análise de raios X, 710 apresentação do paciente e diagnóstico análise dermoscópica, 709 angiografia, 710 cintigrafia, 710 diagnóstico patogênico, 710–711 imagem de ressonância magnética (IRM), 710 imagem Doppler, 709–710 inspeção e palpação, 707–709 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 711, 712–715, 750–752, 761 sistema de estadiamento clínico, 711, 716t tomografia computadorizada (TC), 710 tomografia por emissão de pósitron (PET), 710 cirurgias reconstrutoras, 715 coloração dos tumores, 709q crioterapia, 718 dissecção de linfonodos axilares, 714–715 dissecção de linfonodos inguinais, 715 escleroterapia, 718 excisão ampla, 711–712, 717q imagem de ultrassonografia, 709–710 imunoterapia, 718 quimioterapia, 717–718 radioterapia (RT), 717 terapia com eletrocoagulação, 718 tratamentos com laser, 718 tumores benignos de tecido mole e cutâneos tumores benignos de origem da crista neural lentigo simples, 723–724

mancha mongólica, 726–728 melanoma juvenil, 724–726 melanose de Becker, 725 neurofibroma, 728 neuromas, 727 nevo azul, 727 nevo congênito de células pigmentadas, 724, 725f nevo de células pigmentadas, 723–725 nevo de células pigmentadas adquirido, 724 nevo de Ito, 726, 727f nevo de Ota, 725–726 nevo displásico, 724 nevo lentiginoso salpicado (nevo spilus), 725, 726f schwanoma, 727, 728f tumores benignos de origem de apêndices cistadenoma apócrino, 722–723 cisto triquilemal, 722 esteatocistoma múltiplo, 723, 724f nevo sebáceo, 721 pilomatricoma, 721, 722 siringoma, 722 siringoma condroide, 723 tumores benignos de origem epitelial ceratoacantoma, 719 ceratose seborreica, 719 cisto dermoide, 720, 721f cisto epidermoide, 719, 720f mília, 719–720 nevo epidérmico, 718 tumores benignos de origem mesenquimal acrocórdon, 730 aurículas acessórias, 732–733 cicatrizes hipertróficas, 730 cicatrizes queloides, 730 cisto mucoso da mucosa da cavidade oral, 736 dermatofibroma, 729 fibroma de tecido mole, 730 fibroma pêndulo, 730

granulomas, 733–734 hemangioma cavernoso, 735 hemangioma moriforme, 734–735 hemangioma simples, 734, 734–735 leiomioma, 731–732 lipoma, 731, 731–733 malformação arteriovenosa e fístula arteriovenosa (AVM), 735, 736f malformação capilar, 734–735 malformação linfática, 736 malformação venosa, 735 rabdomioma, 732 tumor do glomo, 734 tumores osteocondrogênicos, 732, 733f xantogranuloma juvenil, 729–730 xantoma, 729 tumores malignos de tecido mole e cutâneos carcinoma de células basais análise dermoscópica, 709 características, 737 classificação histológica, 738q coloração dos tumores, 709 margens cirúrgicas, 717q tumores malignos de origem epitelial carcinoma de células escamosas (SCCs), 737 ceratose actínica, 736 doença de Bowen, 736–737 tumores malignos de origem mesenquimal angiossarcomas, 741, 742 condrossarcoma, 741 dermatofibrossarcoma protuberante (DFSP), 739 histiocitoma fibroso maligno (MFH), 739–740 leiomiossarcoma, 740 lipossarcoma, 740 osteossarcoma, 741 rabdomiossarcoma, 741 sarcoma de Kaposi, 742 tumores malignos originados em apêndices carcinoma de células de Merkel, 716t, 739

carcinoma de glândulas sudoríferas, 738 carcinoma sebáceo, 738 carcinoma triquilemal, 738 doença de Paget extramamária, 739 U úlceras apresentação do paciente e diagnóstico, 747–749 cirurgia urológica/de próstata, 863–864 dissomia uniparental, 183 excisão de melanoma, 766–770 granuloma piogênico, 747–749 publicidade não ética, 59–60 reabilitação e avaliação funcional, 835–837 sangue do cordão umbilical, 236 sistema de classificação clínica TNM/sistema de classificação patológica pTNM, 714f úlceras arteriais, 253–254 úlceras de pressão, 255–256 úlceras diabéticas, 254, 255 úlceras venosas, 253, 279 ultrassonografia, 198 universidades, 15 uracila, 179–180 urocinase, 617 US Patent and Trademark Office (USPTO), 846–847 úlceras arteriais, 253–254 úlceras de leito (escaras), 279 agentes vasoconstritores, 139–140 anatomia vascular, 479–510 anomalias vasculares, 676–706 aplicações clínicas, 524–528 arquitetura vascular, 479–480 aspectos históricos, 676–678 aumento da viabilidade do retalho pediculado, 580–582 calvária vascularizada, 457–459 capital de risco, 843 cicatrização da ferida, 234, 244, 250–252 cicatrização da ferida da pele, 270t, 275, 282

classificações, 528t comportamento violento, 51–52 correção de cicatriz, 316 costela vascularizada, 456–457 cútis marmorata telangiectática congênita (CMTC), 677t, 689 doença de von Recklinghausen, 725, 726f engenharia de tecidos, 373–374 enxertos de gordura, 345 escápula vascularizada, 455–456, 458f Estudo de Prevenção do Tromboembolismo Venoso (Tromboembolismo venoso Prevention Study), 168 fechamento auxiliado por vácuo (VAC), 7, 622 fíbula vascularizada, 455, 457f hemangiomas anomalia vascular associada ao PTEN (homólogo da tensina e fosfatase) (PTEN-AVA), 677t granuloma piogênico, 687 estratégias de tratamento, 687–688 manifestações clínicas, 687 sistemas de classificação, 677t hemangioma infantil (HI) diagnóstico, 681 manejo não operatório, 681–684 manejo operatório, 684–685 manifestações clínicas, 680–681 patogênese, 678–680 sistemas de classificação, 677t terminologia, 678t hemangioma verrucoso (VH), 677t, 695 hemangioma simples, 734 malformação venosa, 735 malformação arteriovenosa (AVM), 677t malformação capilar (CM), 677t malformação linfática (LM), 677t hemangioma verrucoso (VH), 677t, 695 insuficiência venosa, 258 lesões vasculares See tumores de tecido mole e cutâneos liberação de gene viral, 186–188 ligas de vanádio (V), 786–787 malformação arteriovenosa (AVM)

diretrizes de intervenção, 699–700 ressecção, 689f, 700 embolização, 700 estratégias de tratamento algoritmos de tratamento, 290–291, 293f cicatrizes hipertróficas de queimaduras abrangentes, 293, 294 cicatrizes hipertróficas imaturas, 291–293 cicatrizes hipertróficas lineares, 292–293 efeitos da cirurgia plástica, 294–295 feridas abertas crônicas, 287 perspectivas futuras, 295–296 queloides menores, 293f, 294 tecido necrótico, 287 tratamentos emergentes, 294–295 manifestações clínicas, 698–699 patogênese, 696–698 sistema de estadiamento de Schobinger, 698–699 sistemas de classificação, 676–677 terminologia, 678t malformação arteriovenosa (AVM) diretrizes de intervenção, 699–700 ressecção, 689f, 700 embolização, 700 estratégias de tratamento algoritmos de tratamento, 290–291, 293f cicatrizes hipertróficas de queimaduras abrangentes, 293, 294 cicatrizes hipertróficas imaturas, 291–293 cicatrizes hipertróficas lineares, 292–293 efeitos da cirurgia plástica, 294–295 feridas abertas crônicas, 287 perspectivas futuras, 295–296 queloides maiores, 293f, 294 queloides menores, 293f, 294 tecido necrótico, 287 tratamentos emergentes, 294–295 manifestações clínicas, 698–699 patogênese, 696–698 sistema de estadiamento de Schobinger, 698–699

sistemas de classificação, 676–677 terminologia, 678t malformação arteriovenosa e capilar (CAVM), 677t malformação arteriovenosa linfática e capilar (CLAVM), 677t malformação capilar (CM) estratégias de tratamento, 679f, 689–690 manifestações clínicas, 688–689 patogênese, 688 sistemas de classificação, 676–677 terminologia, 678t malformação capilar (CM) estratégias de tratamento, 679f, 689–690 manifestações clínicas, 688–689 patogênese, 688 sistemas de classificação, 676–677 terminologia, 678t malformação capilar-malformação arteriovenosa (CM-AVM) patogênese, 692f, 696–698, 700 sistemas de classificação, 677t malformação cavernosa central (CCM), 677t, 693–694 malformação linfática e capilar (CLM), 677t malformação venosa cutaneomucosa (CMVM), 677t, 693–694 malformação venosa do glomo (GVM), 677t, 693–694 malformação venosa e capilar (CVM), 677t malformação venosa linfática e capilar (CLVM), 677t malformação venosa-linfática (LVM), 677t malformações vasculares anomalia vascular associada ao PTEN (homólogo da tensina e fosfatase) (PTEN-AVA), 697f, 704–705 cútis marmorata telangiectásica congênita (CMTC), 677t, 689 síndrome de Klippel-Trenaunay, 703 malformação arteriovenosa (AVM) estratégias de tratamento, 699–700 manifestações clínicas, 698–699 patogênese, 696–698 sistema de estadiamento de Schobinger, 698–699 malformação capilar (CM) sistemas de classificação, 676–677 estratégias de tratamento, 679f, 689–690 manifestações clínicas, 688–689

patogênese, 688 terminologia, 678t malformação capilar-malformação arteriovenosa (CM-AVM), 692f, 700 malformação linfática (LM) estratégias de tratamento, 692–693 manifestações clínicas, 690–692 patogênese, 690 malformação venosa (VM) estratégias de tratamento, 695–696 manifestações clínicas, 685–686, 694–695 patogênese, 693–694 resumo de pesquisa, 705 síndrome de CLOVES, 698f, 705 síndrome de Parkes-Weber, 694f, 703 síndrome de Sturge-Weber, 701–702 sistemas de classificação, 676–677 manifestações clínicas, 685–686, 694–695 patogênese, 693–694 pesquisa anatômica vascular do angiossomo aplicações clínicas intenção de tratamento, 664 seleção do paciente, 664 unidades de radiação, 664 área arterial, 482–484 área neurovascular, 487–488 arteriossomos, 491 avaliação pré-operatória desenho do retalho, 500 imagem de Doppler colorido dúplex, 501 imagem Doppler, 500–501 tomografia computadorizada (TC), 501, 502f canais de drenagem venosa, 484–487 conceito de angiossomo, 491, 492–494, 500–508 desenho do retalho arcabouço de tecido conjuntivo, 493–494 avaliação pré-operatória, 500 conceitos anatômicos, 492, 500 conexão veia-músculo, 499

convergência venosa, 494–495 interconexões de redes, 497–498 irradiação arterial, 494–495 lei do equilíbrio, 498 origem e destino dos vasos, 499 perfuradores cutâneos, 496, 497 rede venosa, 499 relação de diferenciação e crescimento do tecido e orientação e crescimento dos vasos, 496, 497 relação nervo-vaso sanguíneo, 495–496 veias avalvulares oscilantes, 498f, 499 veias direcionais, 498f, 499 veias profundas, 499–500 veias superficiais, 499–500 eixos do retalho da pele características, 501–502 diagrama esquemático, 503f interconexões de rede artérias, 497 veias, 497–498 musculatura músculos tipo I, 489–491 músculos tipo II, 489–491 músculos tipo III, 489–491 músculos tipo IV, 489–491 padrões de inervação, 489f sistemas de classificação, 488–489, 491 resumo de pesquisa, 508 venossomos, 491, 494f regeneração óssea, 435t, 438, 441–444 retalhos venosos, 533, 534f segurança do paciente, 130–131 hemangioma congênito (CH) patogênese, 698f, 705 síndrome de Cloves hemangioma congênito (CH) patogênese, 698f, 705 síndrome de Klippel-Trenaunay – tumores benignos de origem mesenquimal patogênese, 703

síndrome de Sturge-Weber, 701–702 síndrome de Van der Woude (VWS), 194–195 sistema robótico cirúrgico ViKY, 856 sistemas de classificação, 676–678 telangiectasia hemorrágica hereditária (HHT), 677t, 696–698 terapia genética, 189–190 terminologia, 678t transferência ilíaca vascularizada, 455, 456f tumores benignos de origem mesenquimal, 735 tumores vasculares granuloma piogênico, 687 hemangioendotelioma kaposiforme (KHE) estratégias de tratamento, 687–688 manifestações clínicas, 687 sistemas de classificação, 677t hemangioma infantil (HI) diagnóstico, 681 manejo não operatório, 681–684 manejo operatório, 684–685 manifestações clínicas, 680–681 patogênese, 678–680 sistemas de classificação, 677t terminologia, 678t úlceras de pressão isquiais, 562–566, 568f úlceras venosas, 253, 279 Valadier, Charles Auguste, 21 Vancouver Scar Scale (VSS), 264–266, 298–299 vantagens, 455–459 vasculogênese, 250–252 Vesalius, Andreas, 15–16, 161–164 Vianeo, Vincenzo, 16 Visual Analog Scale (VAS), 299 vitallium®, 787 vitamina A, 282 vitamina B1, 282 vitamina B2, 282 vitamina B6, 282 vitamina C, 282

vitronectina, 244 VOC (voz do cliente), 78q vômitos, 145 von Bruns, Victor, 20 von Gräfe, Carl Ferdinand, 19–20 von Langenbeck, Bernard, 19 V vacina de gangliosídeo, 779–782 vascularização dérmica, 321 vasos sanguíneos células-tronco específicas do tecido, 230–232 engenharia de tecidos, 392 enxertos de pele, 321 verruga atípica, 724 cirurgia estética do adolescente, 45t enxerto de gordura, 342–347 implantes de mama implantes de silicone, 789–790 Ver também câncer de mama; tumores via de sinalização Wnt, 428–429, 527–530 vista oclusal dos dentes, 110 volume clínico alvo (CTV), 663 W Webster, Jerome P, 27 Weir, Robert, 25–28 William Saliceto, 15 Wolfe, John Reissberg, 20 X xantogranuloma juvenil, 729–730 xantoma, 729 xenoenxertos cartilagem, 831 definição, 815 enxertos de pele, 325t, 829
1 - Cirurgia Plastica Volume Um - Principios - 3 ed

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