Pecados no Inverno vol. 3 - Lisa Kleypas

157 Pages • 83,029 Words • PDF • 1.5 MB
Uploaded at 2021-09-24 07:01

This document was submitted by our user and they confirm that they have the consent to share it. Assuming that you are writer or own the copyright of this document, report to us by using this DMCA report button.


O Diabo do Inverno

Titulo original

THE DEVIL IN WINTER Copyright (c) 2006 by Lisa Kleypas A presente obra e disponibilizada por Star Books Digital, com o objetivo de oferecer conteudo para uso parcial em pesquisas e estudos academicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fim exclusivo de compra futura. E expressamente proibida e totalmente repudiavel a venda, aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteudo Digitalizacao Dedicatoria Para Chistina, Connie, Liz, Mary e Terri, por sua amizade que faz meu coracao cantar Com amor, L.k

Capitulo 1 Londres, 1843 Enquanto observava entrar a jovem que acabava de receber em sua casa de Londres, Sebastian, lorde St. Vincent, lhe ocorreu que talvez se equivocou de herdeira na sua tentativa de rapto na semana anterior. Embora o sequestro figurasse desde fazia pouco em sua larga lista de infamias, deveria ter sido mais inteligente. Para comecar, tendo escolhido uma vitima menos energica. Lillian Bowman, uma briosa herdeira americana, resistiu-se com unhas e dentes ate que seu prometido, lorde Westcliff, tinha-a resgatado. Vendo-o com perspectiva, escolher a Lillian tinha sido uma estupidez, embora naquele momento lhe tivesse parecido a solucao ideal a sua encruzilhada. A familia de Lillian era rica, enquanto que ele, em que apesar de seu titulo nobiliario, so tinha dificuldades financeiras. E, alem disso, prometia ser uma amante entretida, com sua beleza morena e seu carater explosivo. Em troca, a senhorita Evangeline Jenner, aquela moca de aspecto docil, nao podia ser mais distinta. Sebastian repassou rapidamente o que sabia dela. Era a filha unica de Ivo Jenner, proprietario do conhecido clube de jogo londrino. Embora a mae de Evangeline descendia de uma boa familia, seu pai era pouco mais que escoria. Apesar de sua ignominiosa linhagem, Evangeline poderia haver-se casado bem se nao tivesse sido por seu terrivel acanhamento, que lhe provocava uma gagueira mortificante. Sebastian tinha ouvido alguns homens assegurar que prefeririam flagelar as costas a manter uma conversacao com ela. Sebastian, e obvio, fazia todo o possivel por evita-la. Nao tinha sido dificil. A timida senhorita Jenner acostumava esconder-se detras das colunas nos saloes. Nunca tinham cruzado palavra alguma; circunstancia que tinha parecido conveniente a ambos por igual. Mas agora nao tinha escapatoria. Por alguma razao, ela tinha considerado oportuno apresentar-se em sua casa inopinada e escandalosamente tarde. E para que a situacao resultasse ainda mais comprometida, nao ia acompanhada, quando passar mais de um minuto a sos com o Sebastian bastava

para arruinar a reputacao de qualquer garota. Era libertino, amoral e perversamente orgulhoso disso. Destacava na ocupacao que tinha eleito (a de sedutor incorrigivel), e tinha alcancado um nivel ao que poucos libertinos podiam aspirar. Sebastian se ajeitou em sua poltrona enquanto observava com uma ociosidade enganosa como Evangeline Jenner se aproximava. A biblioteca estava as escuras salvo por um pequeno fogo na chamine, cuja luz que piscava acariciava a cara da jovem. Nao aparentava mais de vinte anos, e tinha uma cutis vicosa e uns olhos cheios de inocencia. Sebastian nunca tinha valorado nem admirado a inocencia, antes bem, desdenhava-a. Embora o mais cavalheiresco tivesse sido que se levantasse, nao parecia muito importante mostrar bons maneiras dadas as circunstancias. Assim assinalou a outra poltrona que havia junto a chamine com um movimento da mao. — Sente-se quiser — disse. — Embora eu em seu lugar nao ficaria muito tempo. Aborreco-me rapidamente e voce nao tem fama de conversadora estimulante. Sua grosseria nao alterou a Evangeline. Sebastian nao pode evitar perguntar-se que classe de educacao teria a tornado imune aos insultos, quando qualquer outra garota se teria ruborizado ou se posto a chorar. Ou era tola ou muito valente. Evangeline tirou a capa, deixou-a no braco da poltrona estofada de veludo, e se sentou desgracioso nem artificio. Uma das solteironas pensou Sebastian ao recordar que era amiga nao so de Lillian Bowman, mas tambem de sua irma menor Daisy e de Annabelle Hunt. As quatro mocas tinham permanecido sentadas em numerosos bailes e veladas toda a temporada anterior sem que ninguem as tirasse dancar. Entretanto, parecia que sua ma sorte tinha trocado, porque Annabelle tinha encontrado marido por fim, e Lillian acabava de apanhar lorde Westcliff. Sebastian duvidava que a boa sorte se estendesse a essa mocinha tao desajeitada. Embora tentado de lhe perguntar pelo objeto de sua visita, temeu que isso provocasse uma gagueira prolongada que os atormentaria a ambos. Assim, esperou com paciencia forcada enquanto Evangeline parecia lhe dar voltas ao que ia dizer. Enquanto o silencio se prolongava, Sebastian a contemplou ao agitado resplendor do fogo e se precaveu, com certa surpresa, de seu atrativo. Nunca a tinha observado e so tinha a impressao de que era uma ruiva desalinhada com ma postura. Mas hei aqui que era uma moca preciosa. Apertou a mandibula, mas manteve seu aspecto imperturbavel, embora fincasse os dedos na suave tapecaria de veludo. Resultou lhe estranho nao haver-se fixado nunca nela, ja que havia muito em que fixar-se. Seu cabelo, de um vivo tom avermelhado, parecia alimentar do fogo e brilhava incandescente. Suas magras sobrancelhas e suas densas pestanas eram de um tom mogno, enquanto que sua pele era a de uma autentica ruiva, branca e com sardas no nariz e as bochechas. Fez lhe graca a alegre dispersao daqueles pontinhos dourados, pulverizadas como se as tivesse orvalhado uma fada bondosa. Tinha labios carnudos e uns enormes olhos azuis, bonitos, mas impassiveis, como de boneca de cera. — Me… Hao-me dito que minha amiga, a senhorita Bowman, agora lady Westcliff - comentou Evangeline por fim. — O conde e ela foram a Gre… Gretna Gree e depois de que ele… Livrou-se de voce. — Seria mais correto dizer depois de que me desse uma surra - indicou Sebastian em tom afavel, ja que a moca estava olhando os machucados que os justificados murros do Westcliff lhe tinham deixado na mandibula. — Nao pareceu alegra-lo muito de que tomasse emprestada a sua prometida. — Vo… Voce a ra… raptou — replicou Evangeline. — Toma-la emprestada implicaria que tinha intencao de… Devolve-la. Sebastian esbocou o primeiro sorriso de verdade desde fazia muito

tempo. Ao parecer, a moca nao era nenhuma simploria. — Raptei-a, sim, se o preferir. Veio para ver-me para isso, senhorita Jenner? Para me informar sobre o feliz casal? Ja estou informado. Mais vale que diga logo algo — Voce que… Queria a senhorita Bowman porque herdara uma fortuna - soltou Evangeline. — NE… necessita ca… casar-se com alguem que tenha dinheiro. — Certo - admitiu Sebastian. — Meu pai, o duque, nao cumpriu com sua obrigacao nesta vida: conservar intacta a fortuna familiar para me deixar isso em heranca. Quanto a minha responsabilidade, consiste em me dedicar a ociosidade mais dissoluta e esperar a que ele faleca. Eu cumpri com meu dever as mil maravilhas, mas o duque nao. Administrou muito mal as financas familiares e, hoje em dia, e imperdoavelmente pobre. E, ainda pior, goza de boa saude. — Meu pai e rico - assegurou Evangeline sem nenhuma emocao. — E esta mo… morrendo. — Felicidades - repos ele, e arqueou as sobrancelhas. Nao duvidava que Ivo Jenner tivesse amassado uma fortuna consideravel. O Jenner’s era o local onde os cavalheiros de Londres iam para desfrutar do jogo, da boa comida, de bebida a torrentes e de prostitutas. Nele reinava um ambiente de excesso tingido de um agradavel decadentismo. Vinte anos atras era uma alternativa mediocre ao legendario Craven’s, o clube de jogo mais elegante e de maior exito que tivesse conhecido a Inglaterra. Mas quando o Craven’s se acendeu por completo e seu proprietario recusou reconstrui-lo, o clube do Jenner tinha herdado uma avalanche de clientes enriquecidos e adquirido uma posicao destacada. Nao obstante, nunca poderia comparar-se com o Craven’s. Um clube refletia, em grande parte, o carater e o estilo de seu proprietario, e Jenner carecia de ambas as coisas. Derek Craven tinha sido, sem discussao, todo um cavalheiro. Ivo Jenner, em troca, era um caipira bruto, um ex-boxeador que jamais tinha destacado em nada, mas que, por algum capricho do destino, converteu-se num prospero homem de negocios. E ai estava a filha do Jenner, sua unica herdeira. Se ia fazer lhe a oferta que Sebastian suspeitava, nao poderia permitir-se rejeita-la. — Nao qu… quero que me felicite — disse Evangeline. — O que quer entao, jovenzinha? — repos Sebastian em voz baixa. — Va ao grao, por favor. Isto comeca a resultar aborrecido. — Quero estar com meu p… pai nos ultimos dias de sua vida. A familia de minha mae nao me permite ve-lo. Tentei escapar para ir a seu clube, mas sempre me pegam, e depois me castigam. Esta vez nao Vo… voltarei com eles. Tem planos que quero evitar, embora isso me custe a vida. — Que classe de planos? — Querem me casar com um de meus primos. Eustace Stubbins. N… nao sente nada por mim, nem eu por ele… mas p… participa de bom grau na conspiracao familiar. — Cujo objeto e controlar a fortuna de seu pai quando este mora, verdade? — Sim. Ao principio considerei a ideia porque acreditei que o senhor Stubbins e eu poderiamos viver em nossa propria casa… e pensei que… a vida poderia ser suportavel se conseguia me afastar do resto deles. Mas ele me disse que nao tem nem… nenhuma intencao de transladar-se. Quer seguir sob o teto familiar… e nao acredito que eu sobreviva ai muito tempo mais. — Ante o silencio ao parecer indiferente do Sebastian, acrescentou em voz baixa: — Acredito que querem MA… matarme uma vez que consigam o dinheiro de meu pai. Sebastian nao deixou de observa-la, embora nao alterou o tom:

— Muito desconsiderado por sua parte. Mas a mim o que me importa? Evangeline nao mordeu o anzol. So lhe dirigiu um olhar intenso que evidenciava uma fortaleza inata que Sebastian nunca tinha visto em nenhuma mulher. — Proponho lhe ca… me casar com voce — disse. — Quero seu amparo. Meu pai esta muito doente e debil para me ajudar, e nao quero ser uma carga para minhas amigas. Elas me O… ofereceriam refugio mas, mesmo assim, teria que estar sempre em guarda por medo de que meus parentes o… conseguissem me levar a forca e me obrigar a fazer sua vontade. Uma mulher solteira tem poucos recursos, social ou legalmente. Nao e ju… justo, mas nao posso fazer nada por evita-lo. Necessito um MA… marido. Voce necessita uma esposa rica. E os dois estamos iguais de desesperados. Por isso acredito que aceitara minha pro… proposicao. Se for assim, eu gostaria de partir para a Gretna Green esta mesma noite. Estou segura de que meus parentes ja me estao procurando. Sebastian a olhou com receio em meio de um silencio tenso. Nao confiava nela. E depois do desastre do rapto frustrado de na semana anterior, nao desejava repetir a experiencia. Mas a moca tinha razao em algo: estava realmente desesperado. Gostava de vestir bem, comer bem, viver bem; algo do que podiam dar fe inumeraveis credores. A misera adjudicacao mensal que recebia do duque ia interromper se logo, e em sua conta nao ficavam recursos suficientes para chegar a final de mes. Para alguem que nao tinha inconveniente em procurar a saida facil, aquela oferta era um presente do ceu. Se a moca estava disposta a leva-la a cabo. — A cavalo dado nao se olha os dente — soltou com indiferenca. — Mas quanto tempo de vida fica a seu pai? Ha gente que sobrevive anos no leito de morte. A verdade, sempre considerei que muito ma educacao ter as pessoas esperando. — Nao tera que es… esperar muito — foi crispada resposta. — Quinze dias, possivelmente. — Que garantia tenho de que voce nao mudara de ideia antes que cheguemos a Gretna Green? Ja sabe a classe de homem que sou, senhorita Jenner. Devo lhe recordar que a semana passada tentei raptar e forcar a uma de suas amigas? Evangeline o olhou aos olhos. A diferenca dos do Sebastian, de um azul palido, os dela eram de uma safira escura. — Tentou vi… violar a Lillian? — perguntou com desconfianca. — Ameacei fazendo-o. — Teria completo seu A… ameaca? — Nao sei. Nao o tenho feito nunca mas, como voce ha dito, estou desesperado. E ja que tocamos o tema… Esta-me propondo um matrimonio de conveniencia ou vamos dormir juntos de vez em quando? — Haveria-a fo… forcado ou nao? — insistiu ela sem emprestar atencao a sua pergunta. — Se lhe disser que nao, como sabera que nao minto, senhorita Jenner? — repos ele com sarcasmo. — Nao. Nao a teria violado. E essa a resposta que deseja ouvir? Acredite, entao, se a faz sentir-se mais segura. Quanto a minha pergunta… — Dor… dormirei com voce uma vez. Para que o matrimonio seja legal. E nunca mais… depois. — Estupendo. Eu nao gosto de me deitar mais de uma vez com a mesma mulher. E uma merda quando passa a novidade. Alem disso, nunca seria tao burgues para desejar a minha propria esposa. Isso implica que um nao dispoe de meios suficientes para manter a uma querida. — deteve-se a espera de captar alguma emocao no rosto da jovem. — Claro que tambem esta a questao de me dar

um herdeiro…, mas sempre e quando for discreta, nao acredito que me importe de quem seja o menino. Evangeline nem sequer piscou. — Quero que se separe uma p… parte da heranca para mim num fideicomisso generoso. Os interesses serao so meus, e os gastarei como me parece sem ter que lhe dar explicacoes. Sebastian compreendeu que nao era nada tonta, embora sua gagueira levasse a muitos a pensar o contrario. Estava acostumada a que a menosprezassem, ignorassem-na, a passassem por cima, e ele pressentiu que tirava partido disso sempre que podia. Isso lhe pareceu interessante. — Estaria louco se confiasse em voce — disse. — Em qualquer momento poderia tornar-se atras em nosso acordo. E voce ainda o estaria mais se confiasse em mim. Porque quando estivermos casados, poderia lhe fazer a vida mais impossivel do que jamais tenha sonhado a familia de sua mae. — Pre… prefiro que me faca isso quem eu escolha — respondeu com gravidade. — Melhor voce que Eustace. — Isso nao diz muito a favor do Eustace — comentou Sebastian com um sorriso. Ela nao a devolveu. Ajeitou-se um pouco mais na poltrona, como se por fim se relaxasse, e o observou com uma especie de resignacao obstinada. Seus olhares se encontraram, e Sebastian foi consciente de algo que o estremeceu. Nao era estranho que uma mulher o excitasse facilmente. Mais fogoso que a maioria de homens, algumas mulheres o acendiam e despertavam seu desejo ate um grau inusitado. Por alguma razao, aquela garota desajeitada e gaga, era uma delas. Ou seja, sentiu um subito desejo de deitar-se com ela. Em sua imaginacao buliram visoes de seu corpo, suas pernas, suas curvas e suas arredondadas nadegas. Ansiou que seu aroma intimo lhe alagasse o olfato, sentir o roce de seu comprido cabelo no pescoco e o peito. Desejou fazer coisas indescritiveis com a boca dessa mulher, e com a sua… — Decidido, entao — murmurou. — Aceito sua proposta. Ha muitas coisas que discutir, e obvio, mas teremos dois dias para faze-lo antes de chegar a Gretna Green. — levantou-se da poltrona e se estirou sem poder evitar um sorriso ao ver como a moca o percorria rapidamente com o olhar. — Ordenarei que preparem a carruagem e pedirei a ajudante de quarto que me faca a bagagem. Sairemos em uma hora. Por certo, se durante a viagem decide tornar-se atras em nosso acordo, estrangularei-a. — Nao E… estaria tao nervoso se nao o tivesse tentado com uma vitima relutante a semana p… passada— replicou ela com um olhar ironico. — Touche. Posso considera-la a voce, pois, uma vitima disposta? — Ansiosa — precisou Evangeline, que se referia a partir de imediato. — Essas sao minhas favoritas — comentou Sebastian com dobro intencao, e lhe fez uma reverencia antes de sair da biblioteca.

Capitulo 2 Assim que ficou a sos, Evie soltou um suspiro agitado e fechou os olhos. O lorde nao tinha que preocupar-se de que ela trocasse de parecer. Agora que tinha fechado o acordo, estava cem vezes

mais impaciente que ele por comecar a viagem. Aterrava lhe pensar que era muito provavel que o tio Brook e o tio Peregrine a estivessem procurando nesse mesmo instante. A ultima vez que se escapou de casa, tinham-na apanhado a entrada do clube de seu pai. Na carruagem de volta a casa, o tio Peregrine lhe tinha pego ate lhe partir um labio e lhe deixar um olho arroxeado, alem das costas e os bracos talheres de cardeais. E logo a tinham encerrado duas semanas em seu quarto virtualmente a pao e agua. Ninguem, nem sequer suas amigas Annabelle, Lillian e Daisy, sabiam quanto tinha sofrido. A vida na casa dos Maybrick tinha sido um pesadelo. Toda a familia, formada pelos Maybrick e os Stubbins, unia esforcos para quebrantar sua vontade. Incomodava lhes e surpreendia que lhes custasse tanto, e Evie estava tao surpreendida como eles. Nunca teria imaginado que poderia suportar os castigos severos, a indiferenca e inclusive o odio, sem derrubar-se. Possivelmente se parecia com seu pai mais do que ninguem suspeitava. Ivo Jenner tinha sido um lutador, e o segredo de seu exito, tanto no quadrilatero como fora dele, nao se devia ao talento a nao ser a tenacidade. Ela tinha herdado essa teima. Evie queria ver seu pai. Desejava-o tanto que lhe doia fisicamente. Era a unica pessoa no mundo que a queria. Era um amor negligente, sim, mas ninguem lhe tinha dado mais. Compreendia que a tivesse deixado a cargo dos Maybrick fazia tanto tempo, depois de que sua mae morrera no parto. Um clube de jogo nao era lugar para educar a uma menina. E embora os Maybrick nao pertenciam a nobreza, eram de boa familia. Mas Evie se perguntava se seu pai teria decidido o mesmo de ter sabido como a tratariam, se tivesse imaginado que aquela familia descarregaria num bebe indefeso sua ira pela rebeliao de sua filha menor. Mas ja nao tinha sentido preocupar-se por isso. Sua mae tinha morrido, seu pai estava a ponto de reunir-se com ela e havia coisas que Evie queria lhe perguntar antes que isso ocorresse. A melhor oportunidade de fugir das garras dos Maybrick era o insuportavel aristocrata com quem acabava aceitar casar-se. Estava assombrada de ter podido comunicar-se tao bem com o St. Vincent, que intimidava o bastante, com sua beleza loira, seus olhos azuis claro e uma boca feita para beijar e mentir. Parecia um anjo cansado, com aquele perigoso atrativo masculino que so o diabo podia dispensar. Tambem era um homem egoista e carente de escrupulos, como tinha demonstrado ao tentar raptar a prometida de seu melhor amigo. Mas isso mesmo o convertia num adversario capaz de plantar cara aos Maybrick. Ao menos assim acreditava Evie. St. Vincent seria um marido terrivel, claro. Mas como ela nao se fazia iluda a respeito, isso nao seria nenhum problema. Como nao o queria absolutamente, poderia fazer a vista gorda ante suas indiscricoes e ouvidos surdos a seus insultos. Que diferente seria seu matrimonio do de suas amigas. Ao pensar nelas, sentiu umas repentinas vontades de chorar. Nao havia a menor possibilidade de que Annabelle, Daisy ou Lillian, em especial esta ultima, seguissem sendo amigas suas depois de que se casasse com o St. Vincent. Piscou para conter as lagrimas e tragou saliva. Chorar nao servia de nada. Embora esta nao fosse nem muito menos uma solucao perfeita a seu dilema, era a melhor que lhe ocorria. Ao imaginar a furia de seus tios ao inteirar-se de que ela e sua fortuna estavam fora de seu alcance para sempre, sua tristeza remeteu um pouco. Valia a pena fazer algo com tal de nao viver dominada por eles o resto de sua vida. E tambem para nao ver-se obrigada a casar-se com o pobre e covarde Eustace, que esquecia suas penas comendo e bebendo em excesso. Ultimamente se tinha alargado tanto que logo que passava pela porta de seu proprio quarto. Embora detestasse os seus pais quase tanto como ela, Eustace nunca se atreveria a desobedece-los. Ironicamente, tinha sido ele quem a tinha induzido a fugir essa noite. Tinha ido ver a umas horas

antes com um anel de compromisso de ouro com um jade encravado. — Toma — lhe havia dito com acanhamento. — Mae diz que te de isto. Nao podera comer nada se nao o tem posto a mesa. Disse que a semana que vem se lerao as admoestacoes. Embora nao se surpreendeu, Evie se tinha ruborizado de desconcerto e raiva. Eustace riu ao velo. — minha mae, que pinta tem quando te ruboriza. O cabelo fica mas laranja. Contendo uma resposta mordaz, Evie se esforcou por acalmar-se e concentrar-se nas palavras que se agitavam em seu interior como folhas movidas pelo vento. Recolheu-as com cuidado e conseguiu perguntar sem gaguejar: — Primo Eustace, se aceito me casar contigo, poria-te alguma vez de minha parte ante seus pais? Deixaria-me ir ver meu pai e cuida-lo? O sorriso do Eustace se desvaneceu. Olhou-a fixamente aos olhos e, depois de desviar o olhar, respondeu: — Nao seriam tao duros contigo se nao fosse tao teimosa, sabe? Evie perdeu a paciencia e a batalha contra a gagueira: — Ou seja que so… so te interessa que… ficar com meu dinheiro sem da… me dar nada em troca… — Para que quer voce dinheiro? — repos seu primo com desdem. — E uma moca timida que se esconde pelos cantos. Voce nao gosta da roupa cara nem as joias. Nao te da bem conversar, e muito feia para te levar a Cama e nao tem nenhuma virtude. Deveria estar agradecida de que queira me casar contigo, mas sua estupidez te impede de compreende-lo. — P… p… mas… — A frustracao a deixou impotente. Nao conseguia reunir as palavras para replicar, de modo que ficou olhando-o enquanto se esforcava por falar. — Olhe que e idiota! — resmungou Eustace com impaciencia, e lancou o anel ao chao num arranque de furia. A joia ricocheteou e rodou ate desaparecer sob o sofa. — Va, agora se perdeu. E e tua culpa por me tirar de gonzo. Sera melhor que o encontre ou morrera de fome. Vou dizer lhe a mae que eu cumpri com minha parte. Ja te arrumara com ela. A Evie nao a tinha surpreendido que os Maybrick tivessem decidido casa-la. Acreditavam que nao ficava outra alternativa. Mas, em lugar de procurar o anel perdido, preparou febrilmente uma bolsa de viagem e a lancou ao jardim. Nao era especialmente agil, mas o panico lhe deu a forca necessaria para fugir pela janela do primeiro piso, de onde desceu por uma canaleta. Cruzou correndo o jardim e a grade e, gracas a sorte, conseguiu deter um carro de ponto. Agora, enquanto esperava a seu futuro marido, pensou com satisfacao taciturna que provavelmente nao voltaria a ver nunca ao Eustace. A medida que seu volume aumentava, limitava cada vez mais suas atividades a casa dos Maybrick, e nao estava acostumado a deixar-se ver em sociedade. Dava igual como saissem as coisas, ela jamais ia arrepender-se de ter escapado ao horrivel destino de converter-se em sua esposa. Nao era seguro que Eustace tivesse tentado deitar-se com ela ja que nao parecia possuir suficiente espirito carnal, eufemismo com que se designava o instinto sexual. Dedicava toda sua paixao a comida e os licores. Lorde St. Vincent, em troca, tinha seduzido, comprometido e desonrado a inumeraveis mulheres. Embora parecesse que a muitas isso resultava atrativo, Evie nao figurava entre elas. Nao obstante, depois dos casamentos, ninguem poderia objetar que o matrimonio nao se consumou completamente conforme mandava a lei. Ao pensa-lo, lhe fez um no no estomago. Tinha sonhado que se casaria com um homem sensivel, acaso um pouco infantil, que nunca zombaria de sua gagueira e seria carinhoso e tenro. Sebastian, lorde St. Vincent era a antitese de seu amor sonhado. Nao tinha nada de amavel ou

sensivel, e muito menos de infantil. Era um depredador ao que, sem duvida, gostava de brincar com sua presa antes de mata-la. Com o olhar posto na poltrona que o tinha ocupado, pensou no aspecto do St. Vincent a luz da chamine. Alto e magro, com um corpo que era o cabide perfeito para a roupa elegantemente singela que complementava seu atrativo felino. Cabelo como de um icone medieval velho e dourado, abundante e um pouco encaracolado, salpicado de mechas ambar palido. Olhos que brilhavam como diamantes azuis no colar de uma antiga imperatriz, e que nao refletiam nenhuma emocao quando sorria. Entretanto, seu sorriso bastava para deixar a uma mulher sem folego. Boca sensual e cinica; dente branco brilhantes… OH, St. Vincent era deslumbrante. E ele sabia. Mas, por estranho que parecesse, Evie nao lhe temia. St. Vincent era muito inteligente para usar a violencia fisica quando umas poucas palavras bem escolhidas fulminariam a alguem com um minimo alvoroco. Evie temia mais a brutalidade simploria do tio Peregrine, por nao mencionar as maos desumanas da tia Florence, a quem gostava de dar bofetadas e beliscoes. Nunca mais, jurou-se Evie, enquanto se esfregava distraidamente as manchas do vestido, onde a sujeira da caneleta lhe tinha deixado umas raias negras. Gostava de ficar o vestido limpo que tinha metido na bolsa de viagem. Entretanto, como os rigores da viagem lhe sujariam e enrugariam algo que levasse posta, preferiu nao trocar-se. Um ruido na porta. Elevou os olhos e viu uma criada gordinha, que lhe perguntou com acanhamento se queria refrescar-se. Pensou com tristeza que a garota parecia acostumada a presenca de mulheres sos na casa, e deixou que a levasse ate uma pequena quarto no piso de acima. O quarto, como o resto da casa, estava muito bem mobiliado e arrumado. O encapelado, de cores vivas, tinha um desenho de aves e pagodes chineses. Em um hall anexa havia um lavabo com grifos de agua corrente com chaves em forma de golfinhos, e uma porta que dava a uma privada. Depois de fazer suas necessidades, lavou-se as maos e o rosto, e bebeu agua num copo de prata. Foi a quarto em busca de um pente ou uma escova. Ao nao encontrar nenhum, arrumou-se o coque com as maos. Nao ouviu nada que a advertisse da presenca de alguem, mas de repente, soube que nao estava sozinha. Voltou-se com um pulo nervoso. St. Vincent estava ali de pe, em uma postura relaxada e olhandoa com a cabeca levemente inclinada. Evie sentiu uma sensacao estranha: um calor suave, como a luz que atravessa a agua, e de repente se sentiu desfalecer. Estava muito cansada e pensar em tudo o que lhe esperava — a viagem a Escocia, as casamentos apressada, a consumacao posterior— era exaustivo. Endireitou-se e deu um passo mas, ao faze-lo, uma chuva de estrelinhas lhe nublou a vista. Deteve-se e se Cambaleou. Sacudiu a cabeca para limpar-se e advertiu que St. Vincent estava ao seu lado, sujeitando-a pelos cotovelos. Era a primeira vez que o tinha tao perto e seu aroma e seu contato lhe impregnaram os sentidos: uma suave fragrancia de colonia cara e a pele limpa coberta por objetos de linho e la fina. Irradiava saude e virilidade. Sem duvida, era um homem atrativo e pulcro que sabia cuidar de si mesmo. Evie piscou e se precaveu de que era muito mais alto do que parecia. Surpreendeu lhe ver sua corpulencia, algo que de longe nao se apreciava. — Quando comeu por ultima vez? — perguntou ele. — Ontem pela MA… amanha…., acredito… — Nao me diga que sua familia tambem a matava de fome — comentou arqueando as

sobrancelhas, antes de soprar quando ela assentiu. — Isto sonha cada vez mais melodramatico. Pedirei a cozinheira que prepare uns sanduiches. Agarre-se de meu braco e a ajudarei a baixar. — Nao necessito ajuda, gra… obrigado. — Agarre do braco — repetiu ele com uma voz agradavel mas firme. — Nao quero que caia e se rompa a crisma antes de chegar sequer a carruagem. Nao se encontram herdeiras disponiveis de qualquer jeito. Custaria-me muito encontrar uma substituta. Evie devia estar mais enjoada do que acreditava, porque quando se dirigiram para a escada se alegrou de contar com seu apoio. Em algum momento do trajeto, St. Vincent lhe deslizou um braco pelas costas e tomou a mao livre para guia-la com cuidado degraus abaixo. Tinha uns leves machucados nos nodulos, lembranca da briga com lorde Westcliff. Evie se estremeceu ao pensar no penoso desempenho que teria esse aristocrata mimado em uma briga corpo a corpo com o descomunal tio Peregrine, e desejou estar ja em Gretna Green. St. Vincent, que notou seu tremor, segurou-a com mais forca ao chegar ao ultimo degrau. — Tem frio? — perguntou. — Ou sao nervos? — Qui… quero ir de Londres antes que meus parentes me encontrem. — Tem algum motivo para suspeitar que viesse a minha casa? — OH, nao — assegurou ela. — Na… ninguem conceberia que possa estar tao louca. Se a cabeca nao lhe desse ja voltas, o deslumbrante sorriso do St. Vincent lhe teria provocado esse efeito. — Felizmente tenho uma vaidade muito elevada. Seus sarcasmos nao me afetam. — Certamente ha muitas mulheres que lhe alimentam vai… vaidade. Nao necessita nenhuma mais. — Sempre necessito uma mais. Esse e meu problema. Levou-a a biblioteca, onde a deixou sentada diante a chamine uns minutos. Quando se tinha dormitado, St. Vincent retornou preparado para partir. Ainda aturdida, foi com ele para uma reluzente carruagem negra estacionada diante da casa, e St. Vincent a introduziu no veiculo. A tapecaria de veludo nata, muito pouco pratica mas magnifica, brilhava a tenue luz de um pequeno abajur no interior do carro. Evie sentiu uma estranha sensacao de bem-estar ao recostar-se em uma almofada debruada de seda. A familia de sua mae vivia segundo umas normas estritas que regiam o bom gosto, e nao gostavam de nada que cheirasse a excesso. Pensou que para o St. Vincent, em troca, o excesso era habitual, em especial o relativo a comodidade corporal. No estou acostumado a havia uma cesta feita com fitas de pele trancadas. Continha varios sanduiches de pao branco com fatias de embutido e queijo envoltos em guardanapos. O aroma de carne defumada despertou uma fome voraz, e se comeu dois emparedados com tanta rapidez que quase se engasgou. St. Vincent se sentou frente a ela. Esbocou um leve sorriso ao ve-la comer com avidez. — Melhor agora? — Sim, obrigado. O abriu a porta de um compartimento montado habilmente no tabique interior da cabine e extraiu uma taca de cristal e uma garrafa de vinho branco. Encheu a taca e a deu. Depois de um sorvo prudente, Evie a acabou com rapidez. As jovens nao lhes permitia tomar vinho sozinho; estavam acostumados a rebaixar lhe com agua. St. Vincent voltou a encher lhe A carruagem avancava agora com um ligeiro balanco, e os dentes de Evie golpearam ligeiramente a borda da taca. Temerosa de

derramar o vinho no veludo macio, acabou-se a taca de um gole. St. Vincent soltou uma gargalhada. — Carinho devagar, carinho. Espera-nos uma comprida viajem. — reclinou-se nas almofadas com o aspecto de um pacha ocioso tirado das novelas torridas que tanto gostavam a Daisy Bowman. — me Diga, o que teria feito se nao tivesse aceito sua proposta? Aonde teria ido? — Suponho que teria ido a ca… casa de Annabelle e do senhor Hunt. — Nao teria podido recorrer a Lillian e lorde Westcliff, ja que estavam de lua de mel. E teria sido inutil dirigir-se aos Bowman. Embora Daisy tivesse atravessado veementemente em seu favor, seus pais nao teriam querido ter nada que ver com aquilo. — por que nao foi essa sua primeira opcao? — Teria sido dificil para os Hunt impedir que meus tios me levassem de volta — explicou Evie, carrancuda. — Estarei mais se… segura sendo sua esposa que como convidada em casa de alguem. —O vinho a tinha enjoado um pouco, e se afundou mais no assento. St. Vincent a olhou pensativamente antes de inclinar-se para lhe tirar os sapatos. — Estara mais comoda sem eles — assegurou. — Pelo amor de Deus, nao tenha medo. Nao vou abusar de voce na carruagem. — Desabotoou lhe os cordoes e acrescentou em tom suave— E se o fizesse, nao importaria muito, ja que vamos casar-nos. Ela apartou de repente o pe e ele, com um sorriso, alargou a mao para o outro. Enquanto deixava que lhe tirasse o sapato, Evie se obrigou a relaxar, embora o roce daqueles dedos em seu tornozelo atraves da meia lhe provocava um estranho calafrio. — Deveria afrouxa-las cintas do espartilho — aconselhou ele. — Assim a viagem lhe resultara mais agradavel. — Nao levo es… espartilho — respondeu Evie sem olha-lo. — Nao? Olha, olha — comentou St. Vincent de uma vez que lhe repassava o corpo com olhar perito. — Uma fulana muito bem proporcionada! — Eu nao gosto dessa palavra. — Fulana? Perdoe… E a forca do costume. Sempre trato as damas como fulanas e as fulanas como damas. — E lhe da bom resultado essa tatica? — E claro que sim — respondeu ele com uma arrogancia tao alegre que Evie nao pode evitar sorrir. — E voce ter… terrivel. — Certo. Mas e um fato conhecido que a gente terrivel esta acostumada a terminar muito melhor do que se merece. Enquanto que a boa, como voce… — Fez um gesto dando a entender que sua situacao atual era um exemplo perfeito disso. — Pode ser que nao seja tao bo… boa como voce acredite. — A esperanca e o ultimo que se perde. — Entreabriu os olhos, pensativo. Evie observou que tinha as pestanas, larguissimas para um homem, um pouco mais escuras que o cabelo. Apesar de sua corpulencia e sua largura de ombros, tinha um ar felino. Era como um tigre preguicoso que a primeira podia resultar mortifero. — Que enfermidade padece seu pai? ouvi rumores, mas nada seguro. — Tuberculose — murmurou Evie. — A diagnosticaram faz seis meses e nao o vi apos. E o ti… tempo mais comprido que estive sem visita-lo. Os Maybrick me proibiram isso. Querem que faca como que nao existe.

— Eu gostaria de saber por que — murmurou St. Vincent com ironia, e cruzou as pernas. — Assim nao o ve assiduamente. Entao por que estas vontades repentinas de revoar sobre seu leito de morte? Para assegurar um lugar privilegiado em seu testamento? Sem ter em conta a maliciosa insinuacao, Evie refletiu e respondeu com frieza: — Quando era pequena, deixavam-me ve-lo uma vez ao mes. Entao estavamos unidos. Era, e e, o unico homem que se preocupou por mim. Quero lhe. E nao desejo que morra sozinho. Pode zom… zombar de mim se isso lhe divertir. Da-me igual. Sua opiniao nao significa nada para mim. — Tranquila, encanto. — Sua voz refletiu certa diversao. — Detecto indicios de um carater sem duvida herdado de seu pai. Vi como lhe brilham os olhos quando perde os estribos por alguma insignificancia. — co… conhece meu pai? — perguntou surpreendida. — Claro. Todos os homens amantes do prazer estiveram alguma vez no Jenner’s. Seu pai e um bom tipo, embora tao explosivo como um paiol de polvora. Por certo, como diabos se casou uma Maybrick com um dom ninguem? — Entre outras coisas, minha mae deveu considera-lo um meio para escapar de sua familia. — Quao mesmo em nosso caso. Existe certa simetria, nao? — Espero que a se… simetria termine ai. Porque me conceberam pouco depois de casar-se e minha mae morreu no parto. — Nao a deixarei gravida se nao querer — comentou ele com desfacatez. — E bastante facil evita-lo: capas, esponjas, irrigacoes, alem desses esplendidos dispositivos chapeados que… — deteve-se o ver sua expressao e soltou uma gargalhada. — meu Deus, tem aberto uns olhos como pratos. Alarmei-a? Nao me diga que suas amigas casadas nao lhe falaram que estas coisas. Evie meneou a cabeca. Embora Annabelle Hunt as vezes se mostrasse disposta a explicar alguns dos misterios da vida conjugal, jamais tinha mencionado dispositivos para evitar a gravidez — Duvido que elas os conhecam — disse, e ele riu de novo. — Estarei encantado de ilustra-la quando chegarmos a Escocia. — St. Vincent esbocou um sorriso que as irmas Bowman teria resultado encantador, embora nao teriam advertido o brilho calculador dos olhos. — pensou que possivelmente desfrute do suficiente de nossa consumacao para desejar repetir, ceu? Com que facilidade pronunciava palavras carinhosas. — Nao — respondeu Evie. — Isso nao acontecera. — Mmm… — murmurou ele com um som parecido ao ronrono de um gato. — Eu gosto das provocacoes. — Apodreci… pode ser que eu goste de me deitar com voce — esclareceu Evie olhando-o aos olhos, apesar de que lhe sustentar o olhar a fez ruborizar. — Espero que assim seja. Mas nao mudei de parecer. Porque sei como e voce e do que e capaz. — Ainda nao viu o pior, encanto — repos ele quase com ternura.

Capitulo 3 Para Evie, que na semana anterior se cansou na viagem de doze horas do imovel do Westcliff no Hampshire, o trajeto de quarenta e oito horas a Escocia foi uma tortura. Se tivessem ido a um ritmo

moderado, teria sido mais suportavel. Mas, a insistencia dela mesma, iriam diretamente a Gretna Green e so se parariam para muda de choferes e de tiros. Evie temia que seus parentes tivessem averiguado seu plano e os perseguissem. E, visto o resultado da briga do St. Vincent com lorde Westcliff na semana anterior, tinha poucas esperancas de que pudesse sair gracioso de um enfrentamento a murro limpo com seu tio Peregrine. Embora a carruagem estivesse bem equipada e tinha bom amortecimento, viajar a uma velocidade incessante sacudia sem pausa ao veiculo e Evie comecou a sentir nauseas. Estava exausta e nao encontrava uma postura comoda para dormir. Cada pouco, a cabeca lhe golpeava contra o tabique. E assim que conseguia dormir, ao parecer so passavam uns minutos antes de que a mudanca de cavalos despertasse. St. Vincent nao parecia passa-lo tao mal, embora tambem lhe via desalinhado e cansado. Fazia momento que as tentativas de conversar se acabaram, e viajavam num silencio estoico. Surpreendentemente, St. Vincent nao se queixou deste duro exercicio de resistencia. Evie se deu conta de que tinha a mesma pressa que ela por chegar a Escocia. Interessava lhe tanto como a ela estar casado legalmente o antes possivel. E assim seguiram, enquanto a carruagem dava tombos pelo irregular Caminho, e em ocasioes quase lancava a Evie do assento ao chao. Ela as arrumava para dar alguma que outra cabecadinha. Cada vez que a porta da carruagem se abria e St. Vincent baixava para comprovar o novo tiro, uma baforada de ar gelido entrava no veiculo. Evie, intumescida e dolorida, se acanhou no canto. Depois da noite, amanheceu um dia com temperaturas glaciais e uma chuva geada. St. Vincent a conduziu a uma estalagem, onde em uma sala privada tomou um prato de sopa morna e utilizou o urinol enquanto ele ia fiscalizar a mudanca de cavalos e de chofer. A imagem da Cama quase lhe doeu na alma. Mas ja dormiria mais tarde, uma vez estivesse em Gretna Green e fora do alcance de sua familia para sempre. Ao voltar para carruagem meia hora depois, Evie tratou de tira-los sapatos molhados sem sujar a tapecaria de veludo. St. Vincent subiu ao veiculo depois que ela e se agachou para ajuda-la. Enquanto lhe retirava os sapatos dos pes tidos caibras, Evie tirou lhe em silencio o chapeu empapado e o lancou ao assento em frente. Tinha um cabelo grosso e suave, e seus cachos exibiam todos os tons entre o ambar e o champanha. St. Vincent se sentou a seu lado e, depois de observar o aspecto tenso de seu rosto, tocou lhe a bochecha geada. — Tera que te reconhecer algo — murmurou. — Qualquer outra mulher se estaria queixando a gritos. — Nao… nao apodreci… posso me queixar — disse Evie enquanto se estremecia violentamente. — Fui eu quem pediu viajar dava… diretamente a Escocia. — Ja estamos a meio Caminho. Outra noite e um dia mais, e amanha de noite estarao casados — comentou. E acrescentou com um sorriso: — Seguro que nunca houve uma noiva tao ansiosa por chegar a Cama. Os labios trementes de Evie esbocaram um sorriso pela ironia: ela ansiava dormir, nao fazer o amor. Ao olha-lo a cara, tao perto da sua, perguntou-se como as olheiras e os sinais de cansaco que mostrava podiam resultar tao atrativos. Possivelmente porque assim parecia humano e nao um formoso deus romano sem coracao. Tinha perdido grande parte de sua altivez aristocratica, que sem duvida reapareceria mais tarde, quando tivesse descansado. Mas de momento estava depravado e acessivel. Durante essa viagem horrorosa parecia haver-se estabelecido entre eles um fragil vinculo.

Uma chamada a porta da carruagem interrompeu suas reflexoes. St. Vincent a abriu, e apareceu uma garconete empapada sob a chuva. — Aqui tem, Milorde — disse, e se tirou dois objetos de debaixo da capa lhe jorrem e os entregou. — Um grog e um lava-pes, como pediu. St. Vincent procurou uma moeda no colete e a deu. A mulher lhe sorriu e voltou correndo a refugiar-se na estalagem. Evie piscou surpreendida quando entregou uma tigela de barro cheio de um liquido fumegante. — O que e? — perguntou. — Algo para te esquentar por dentro. — Sopesou o lava-pes envolto em flanela cinza. — E isto e para os pes. Ponha as pernas no assento. Em outras circunstancias, Evie teria impedido que lhe tocasse as panturrilhas, mas guardou silencio enquanto lhe arrumava a saia e lhe punha o lava-pes quente sob os pes. — OH, que delicia! — estremeceu-se de agradar ao notar como o calorzinho lhe reanimava os dedos gelados. — OH! E o me.. melhor que hei sentido nunca… — As mulheres revistam me dizer isso — afirmou St. Vincent com um sorriso. — Veem, te apoie em mim. Apreensiva e tremente, Evie vacilou um momento. Logo, obedeceu devagar e se obrigou a relaxar-se entre seus bracos. Ate entao so a tinha abracado seu pai, e a sensacao lhe suscitou lembrancas da infancia. St. Vincent a estreitou ate que se recostou contra ele, e a firmeza de sua sujeicao contribuiu a conter os tremores de suas doloridas extremidades. Seu peito era firme e duro, mas lhe servia de apoio perfeito para a parte posterior da cabeca. Evie se aproximou a tigela aos labios e sorveu vacilante a bebida quente. Era alguma classe de licor, misturado com agua e temperada com acucar e limao. A medida que bebia, o corpo foi entrando em calor. Soltou um comprido suspiro de alivio. A carruagem arrancou de repente, mas St. Vincent se ocupou de mante-la comodamente apoiada em seu peito. Evie nao alcancava a entender como diabos podia sentir-se no setimo ceu tao de repente. Jamais tinha tido essa cercania fisica com ninguem. E lhe parecia horrivel te-la com um libertino como St. Vincent. Nao obstante, ai estava. A natureza tinha esbanjado beleza masculina em alguem que nao a merecia. Conteve o impulso de aconchegar mais contra ele. Sua roupa era de um tecido delicioso: uma jaqueta de la fina, um colete de seda grosa e uma Camisa de linho suave. O aroma de amido e de colonia, misturado com a fragrancia de sua pele… Nunca se tinha imaginado que um homem pudesse cheirar tao bem. Intuindo que a separaria dele quando se terminasse a bebida, tentou que lhe durasse o maximo possivel. Para seu pesar, esvaziou por fim as ultimas gotas doces da taca. St. Vincent tomou o cachorro das maos e o deixou no chao. Evie ficou tensa, esperando que a devolvesse a seu assento, mas sentiu um enorme regozijo ao notar que ele voltava a estreita-la entre seus bracos. Seu corpo era firme e quente, e muito comodo. Ouviu lhe bocejar. — Dorme — murmurou Sebastian. — Tem tres horas antes da proxima mudanca de tiro. Evie apoiou a planta dos pes com mais forca no lava-pes, voltou-se de flanco e se aconchegou mais contra ele para sumir-se no ansiado sonho.

O resto da viagem se converteu em uma serie imprecisa de movimento, cansaco e despertar bruscos. A medida que o esgotamento de Evie aumentava, dependia cada vez mais do St. Vincent. Em cada posta, trazia lhe uma taca de cha ou caldo, e reaquecia o lava-pes em cada chamine disponivel. Inclusive encontrou uma manta acolchoada em alguma parte. Convencida de que, a essas alturas, teria se gelado de nao contar com o St. Vincent, Evie esqueceu todas suas reservas sobre pegar-se a ele cada vez que estava na carruagem. — Nao me… estou-me insinuando — lhe disse enquanto se sentava em seu regaco e se recostava em seu peito. — So e uma fo… fonte de calor. — Estraga — respondeu St. Vincent preguicosamente enquanto colocava bem a manta sobre ambos. — Mas o quarto ultimo de hora estiveste rocando partes de minha anatomia que ninguem se atreveu a me tocar ate agora. — O… duvido. — tampou-se ainda mais com a jaqueta do St. Vincent e acrescentou com voz apagada: — Seguro que lhe manusearam mais que as cestas de comida do Fortnum and Macom. — E me pode conseguir a um preco mais razoavel — assegurou ele antes de fazer uma careta e mover-se para ficar a bem no regaco. — Nao ponha o joelho ai, encanto, ou seus planos de consumar o matrimonio correrao perigo. Evie dormitou ate a seguinte parada, e justo quando se estava sumindo num sonho profundo, St. Vincent despertou com delicadeza. — Evangeline — murmurou enquanto lhe arrumava o cabelo despenteado. — Abre os olhos. Estamos na seguinte posta. Tem tempo para entrar uns minutos. — Nao quero — se queixou ela. — Tem que faze-lo — insistiu St. Vincent em voz baixa. — Espera-nos um comprido trecho ao sair daqui. Ve o banho agora, ja que nao podera faze-lo num bom momento. Evie ia protestar que nao precisava ir ao banho quando, de repente, deu-se conta de que sim. A ideia de levantar-se e sair a chuva gelida de novo quase a fez lacrimejar. Inclinou-se para calca-los sapatos umidos e sujos, e brigou com os cordoes. St. Vincent lhe apartou as maos e os atou corretamente. Depois a ajudou a descer da carruagem. Uma vez fora, uma rajada de vento glacial fez que a moca apertasse os dentes. Fazia um frio terrivel. St. Vincent lhe cobriu a cara com o capuz da capa e, depois de lhe rodear os ombros com um braco, cruzaram o patio da estalagem. — Me acredite — disse. — E melhor que va a privada aqui. Ter que baixar depois junto a estrada seria terrivel. Por isso sei sobre as mulheres e sua anatomia… — Conheco minha anatomia — o interrompeu Evie irritada. — Nao faz falta que me explique isso. — E obvio. Perdoa se falar muito; e que tentou me manter acordado. E a ti tambem. Evie se aferrou a sua cintura e, enquanto avancava pelo barro gelado, pensou no primo Eustace e em quao contente estava de nao ter que casar-se com ele. Nunca voltaria a viver sob o teto dos Maybrick. A ideia lhe deu forcas. Uma vez casada legalmente, deixariam de ter poder sobre ela. Por Deus, quanto ansiava que tudo terminasse de uma vez para sempre. Depois de tomar um quarto, St. Vincent tomou a Evie pelos ombros e a observou para avaliar seu estado. — Parece a ponto de te deprimir — comentou. — Temos tempo para que descanse um par de horas, carinho. Por que nao…? — Nem pensar — replicou ela. — Quero seguir adiante. St. Vincent a observou com cenho, mas

repos com calma: — E sempre tao teimosa? — Levou-a a quarto e lhe recordou que fechasse a porta com chave quando ele saisse. — E tenta nao dormir sentada no urinol — brincou. Quando voltaram para carruagem, Evie seguiu o ritual ja familiar: tirou-se os sapatos e deixou que St. Vincent lhe pusesse o lava-pes quente nos pes e a situasse depois entre suas pernas separadas, com um pe perto do lava-pes e o outro no chao para manter o equilibrio. A Evie lhe acelerou o pulso quando tomou uma mao e comecou a brincar com seus dedos frios. Tinha a mao quente e os dedos, suaves, com as unhas curtas e bem limadas. Uma mao forte, mas sem duvida pertencente a um homem ocioso. St. Vincent entrelacou seus dedos com os dela com suavidade, desenhou lhe um pequeno circulo na palma com o polegar e depois deslizou os dedos para que coincidissem com os dela. Sua pele branca era de um tom quente, da classe que absorve o sol com facilidade. Ao final, St. Vincent deixou de brincar, mas nao lhe soltou a mao. Nao podia ser ela, a solteirona, Evangeline Jenner… So em uma carruagem com um libertino irrecuperavel viajando para a Gretna Green. Olhe a que ataste, pensou aturdida. Voltou a cabeca e apoiou a bochecha na Camisa de linho do St. Vincent. — Como e sua familia? — perguntou com modorra. — Tem irmaos? St. Vincent lhe acariciou os cachos com os labios um momento antes de responder: — So ficamos meu pai e eu. Nao recordo a minha mae. Morreu de colera quando eu ainda era um bebe. Tinha quatro irmas maiores. Como era o menor e unico varao, consentiram-me muitissimo. Mas tres de minhas irmas morreram de escarlatina. Lembro me que me enviaram a nossa casa de Campo quando adoeceram, e quando voltei ja nao estavam. Mais adiante, a sobrevivente, minha irma maior, casou-se mas, como sua mae, morreu num parto. O bebe tampouco sobreviveu. Evie, que nao se moveu enquanto ele contava sua historia com naturalidade, sentiu uma enorme tristeza por esse menino. Uma mae e quatro irmas que o adoravam tinham desaparecido num periodo relativamente curto de tempo. Teria sido dificil de compreender para um adulto, muito mais para um menino. — Pergunta-te alguma vez como teria sido sua vida se tivesse tido mae? — quis saber. — Pois nao. — Eu sim. Frequentemente me pergunto que conselho me teria dado. — Dado que sua mae se casou com um patife como Ivo Jenner — respondeu ele com ironia— , eu nao lhe daria muito valor a seus conselhos. — Fez uma pausa maliciosa. — Por certo, como se conheceram? Uma garota de boa familia nao esta acostumada relacionar-se com homens como Jenner. — conheceram-se num acidente de trafico. Minha mae ia em uma carruagem com minha tia. Era um desses dias de inverno em que a nevoa de Londres e tao espessa que, a meio-dia, a visibilidade e de apenas uns metros. O veiculo fez um giro brusco para evitar o carro de um mascate e atropelo a meu pai, que estava de pe na calcada. Ante a insistencia de minha mae, o chofer se deteve para lhe perguntar se tinha feito mal. So tinha uns arranhoes, nada mais. Mas suponho… suponho que meu pai deveu lhe interessar porque ao dia seguinte lhe enviou uma carta para lhe perguntar por sua saude. Comecaram a escrever-se, embora meu pai devia faze-lo atraves de alguem porque era analfabeto. Nao conheco mais detalhes, salvo que ao final se fugiram juntos. — Um sorriso de satisfacao lhe iluminou a cara ao imagina-la ira dos Maybrick ao descobrir que sua mae se escapou com o Ivo Jenner. — Quando ela morreu, tinha dezenove anos — acrescentou

pensativa. — E eu tenho vinte e tres. Parece-me estranho ter vivido mais que ela — comentou antes de voltar-se parar olha-lo a cara. — Quantos anos tem, Milorde? Trinta e quatro? Trinta e cinco? — Trinta e dois. Embora neste momento me sinto como se tivesse cento e dois. O que passou a sua gagueira, ceu? Desapareceu em algum lugar entre Tessdale e aqui. — Serio? — perguntou Evie, um pouco surpreendida. — Suponho que contigo me sinto comoda. Estou acostumado a gaguejar menos com algumas pessoas. — Era estranho, porque nao estava acostumado a deixar de gaguejar por completo salvo que falasse com um menino. Notou como o peito do St. Vincent dava uma especie de pulo de diversao. — Ninguem me havia dito que lhe fizesse sentir comodo. E eu nao gosto nada. Terei que fazer algo diabolico para que troque de opiniao. — Estou segura de que o fara. — Fechou os olhos e se apertou mais contra ele. — Acredito que estou muito cansada para gaguejar. St. Vincent comecou a lhe acariciar o cabelo e a cara para terminar lhe massageando a tempora com a ponta dos dedos. — Dorme — sussurrou. — Ja estamos chegando. Como nos encontramos no quinto inferno, encanto, logo deveria sentir mais calor. Mas nao foi assim. quanto mais viajavam ao norte, mais frio fazia, e Evie chegou a pensar que nao lhe viria mal um pouco de fogo eterno. O povo da Gretna Green se encontrava no condado do Dumfriesshire, ao norte da fronteira de Escocia. Centenas de casais viajavam pela estrada de Londres a Gretna Green, passando por Carlisle, para evitar a estrita legislacao matrimonial da Inglaterra. Foram a pe, em carruagem ou a cavalo e, uma vez conseguiam pronunciar seus votos matrimoniais, voltavam para a Inglaterra convertidos em marido e mulher. Quando um casal cruzava a ponte sobre o rio Sark e entrava em Escocia, podia casar-se em qualquer ponto do pais. Bastava com uma declaracao feita diante de testemunhas. Entretanto, em Gretna Green tinha um surto de prospero negocio casamenteiro, e muitos de seus habitantes competiam por celebrar casamentos em lares particulares, posadas ou, inclusive, ao ar livre. O lugar mais conhecida era a ferraria, onde se tinham efetuado tantas cerimonias rapidas que a todos os matrimonios celebrados em Gretna Green os conhecia como casamentos na bigorna. A carruagem chegou por fim a seu destino: uma estalagem situada ao lado da ferraria. St. Vincent conduziu a Evie rodeando-a com um braco como se fora a desabar-se de cansaco. O hospedeiro, um tal senhor Findley, sorriu encantado ao saber que se fugiram para casar-se, e lhes assegurou com piscadas exageradas que sempre tinha um quarto preparado para situacoes assim. — Nao e legal ate que tenham consumado os casamentos, sabem? — informou lhes com um acento quase ininteligivel. — Em uma ocasiao tivemos que tirar as escondidas a uns noivos pela porta de atras enquanto seus perseguidores esmurravam a de diante. Em outra, entraram na estalagem e encontraram aos dois amantes na Cama; o noivo ainda levava postas as botas, mas nao havia duvida de que o ato se consumou. — Soltou uma gargalhada ao recorda-lo. — O que ha dito? — murmurou Evie, recostada no ombro do St. Vincent. — Nao tenho nem ideia — lhe sussurrou este ao ouvido. Levantou a cabeca e se dirigiu ao hospedeiro: — Eu gostaria de dispor de um banho quente no quarto quando retornarmos da ferraria. — Muito bem, Milorde — confirmou o hospedeiro, e recebeu com entusiasmo as moedas que St. Vincent lhe entregou em troca de uma chave antiquada. — Deseja tambem que lhes subamos o jantar, Milorde?

Sebastian dirigiu um olhar inquisidor a Evie, que sacudiu a cabeca. — Nao — respondeu St. Vincent— , mas espero que possamos tomar um cafe da manha copioso pela manha. — Sim, Milorde. Vao casar se na ferraria, verdade? Ai, caramba. Nao ha melhor casamenteiro em Gretna que Paisley MacPhee. E um homem culto. Fara as vezes de clerigo e lhes emitira um certificado. — Obrigado — disse St. Vincent. Sairam da estalagem e se dirigiram a ferraria, na porta do lado. Um olhar rapido rua abaixo lhes permitiu ver fileiras de casas e lojas bem cuidadas, com luzes acesas para mitigar a crescente escuridao do entardecer. Ao aproximar-se da fachada do edificio caiado, ele murmurou: — Aguenta um pouco mais, carinho. Ja quase estamos. Evie esperou apoiada nele com a cabeca meio afundada em sua jaqueta enquanto ele batia na porta. Abriu-a um homem corpulento, corado, com um atrativo bigode que se unia a suas entupidas costeletas. Seu acento escoces nao era tao marcado como o do hospedeiro, e Evie pode compreender o que dizia. — E voce MacPhee? — perguntou St. Vincent. — O mesmo. Rapidamente, St. Vincent fez as apresentacoes e explicou sua intencao. O ferreiro sorriu de brinca a orelha. — Assim querem casar-se. Passem, por favor — disse, e chamou a suas duas filhas, um par de mocas coradas e morenas as que apresentou como Florag e Gavenia. Logo os conduziu a ferraria, situada no mesmo edificio. Os MacPhee mostraram a mesma alegria constante que o hospedeiro, o que desmentia o que Evie tinha ouvido sempre sobre o famoso carater serio dos escoceses. — Parece lhes bem que minhas duas filhas sejam testemunhas? — sugeriu MacPhee. — Sim — respondeu St. Vincent de uma vez que jogava uma olhada ao redor; o local estava cheio de ferraduras, equipe para carruagens e ferramentas de lavoura. — Como pode ver, mi… — deteve-se um momento como se duvidasse sobre como referir-se a Evie. — Minha noiva e eu estamos bastante cansados. Viajamos de Londres a um ritmo endiabrado, de modo que nos gostariamos de acelerar o tramite. — De Londres? — repetiu o ferreiro, e sorriu a Evie. — por que veio a Gretna, senhorita? Nao lhe deram seus pais consentimento para casar-se? — Me lhe… temo que nao e tao singelo. — Evie lhe devolveu o sorriso languidamente. — Quase nunca o e — concedeu MacPhee enquanto meneava a cabeca sabiamente. — Mas tenho que lhe advertir algo, senhorita. Se for casar-se precipitadamente, o matrimonio escoces e um vinculo irrevogavel e indissoluvel. Assegure-se de que seu amor e verdadeiro para… St. Vincent interrompeu o que prometia ser uma retalia de conselhos paternais. — Nao e um matrimonio por amor — esclareceu. — E um matrimonio de conveniencia, e a calides que existe entre nos nao chega nem a de uma vela de aniversario. Proceda, por favor. Nenhum dos dois dormiu como e devido em dois dias. Fez-se o silencio, e a brutalidade do comentario pareceu horrorizar ao MacPhee e suas duas filhas. — Nao me cai voce bem — anunciou com cenho.

— A minha futura esposa tampouco — replicou St. Vincent, exasperado. — Mas como isso nao vai impedir que se case comigo, tampouco deveria dete-lo voce. Adiante. MacPhee dirigiu um olhar de compaixao a Evie. — A noiva nao tem flores — advertiu, de repente decidido a que a cerimonia tivesse um ar romantico. — Florag, va procurar um ramo de urze branco. — Nao necessita flores — soltou St. Vincent, mas a jovem partiu de todos os modos. — Que a noiva leve urze branco e um velho costume escoces — explicou MacPhee a Evie. — Quer que lhe conte por que? Ela assentiu e conteve um risinho afogada. Apesar de seu cansaco, ou possivelmente devido a ele, comecava a sentir um prazer perverso ao ver como St. Vincent se esforcava por controlar sua irritacao. Naquele momento, o homem mal barbeado e mal-humorado que tinha a seu lado nao guardava nenhum parecido com o aristocrata petulante que tinha assistido a festa em casa de lorde Westcliff. — Faz muito, muito tempo… — comecou MacPhee, sem emprestar atencao ao grunhido do St. Vincent— , havia uma formosa jovem chamada Malvina. Estava prometida a Osear, um valente guerreiro que tinha conquistado seu coracao. Osear pediu a sua amada que o esperasse enquanto ia procurar fortuna. Mas um dia desgracado, Malvina recebeu a noticia de que seu noivo tinha morrido em combate. Descansaria para sempre em umas colinas longinquas… sumido num sonho eterno… — meu deus, como o invejo — afirmou St. Vincent, de uma vez que se esfregava os olhos. — Quando as lagrimas de dor da Malvina empaparam a erva como o rocio — prosseguiu MacPhee— , a urze purpura que havia a seus pes se voltou branco. Por isso todas as noivas escocesas levam urze branco no dia de seu casamento. — Essa e a historia? — perguntou St. Vincent com incredulidade. — O urze procede das lagrimas que derramou uma moca pela morte de seu prometido? — Assim e. — Como diabos pode considerar-se entao sinal de boa sorte? MacPhee abriu a boca para responder mas, nesse momento, Florag voltou e entregou a Evie um raminho de urze branco seco. Depois de lhe murmurar as obrigado, Evie deixou que o ferreiro a conduzisse para a bigorna, no centro do local. — Tem um anel para a senhorita? — perguntou MacPhee ao St. Vincent, que sacudiu a cabeca. Imaginava-me — disse com frieza o ferreiro. — Gavenia, traz o estojo dos aneis. — E aproximando-se de Evie, explicou: — Trabalho metais preciosos alem de ferro. E um trabalho fino, feito com o melhor ouro de Escocia. — Nao necessita nenhum… — St. Vincent se deteve o ver que Evie elevava os olhos para ele. Soltou um suspiro. — De acordo. Escolhe um. MacPhee retirou uma parte de la do estojo, estendeu-o sobre a bigorna e colocou sobre ele com delicadeza uma selecao de seis aneis. Evie se inclinou parar olha-los. Os aneis, todos eles aliancas de ouro de diversos tamanhos e motivos, eram tao intricados e delicados que parecia impossivel que os tivesse criado um ferreiro. — Este mostra cardos e nos — disse MacPhee, e o levantou para que o visse melhor. — Este tem um desenho de chaves, e este, uma rosa do Shetland. Evie escolheu o menor e o provou no dedo anelar esquerdo. Ia perfeito. O aproximou para examinar o desenho. Era o mais singelo; uma alianca de ouro gentil que tinha gravadas as palavras: Tha Gad Agam Ort.

— O que significa? — perguntou ao MacPhee. — Meu amor e teu. St. Vincent permaneceu imaculavel e se produziu um silencio incomodo. Evie se tirou a alianca lamentando haver-se interessado pelos aneis. O sentimento daquela frase estava tao desconjurada nessa cerimonia imposta que realcava a farsa das casamentos. — Acredito que nao quero anel depois de tudo — resmungou, e voltou a deixa-lo no tecido. — Nos ficamos — disse entao St. Vincent. Aniquilada, Evie o viu agarrar a alianca de ouro e, quando o olhou com os olhos exagerados, ele acrescentou com secura: — Sao so palavras. Nao significa nada. Ela assentiu e agachou a cabeca. MacPhee os observou com cenho e alisou a barba incipiente. — Meninas, cantem uma cancao — pediu a suas filhas com resolvida alegria. — Uma cancao… — protestou St. Vincent, mas Evie lhe puxou da manga. — Deixa-os — murmurou. — quanto mais discuta, mais demoraremos. St. Vincent amaldicoou entre dentes e fixou a vista na bigorna, enquanto as irmas entoavam em perfeita harmonia. OH, meu amor e como uma rosa vermelha, vermelha, recem brotada em junho. OH, meu amor e como uma melodia que se entoa docemente. Meu amor por ti e tao imenso como sua beleza. E te seguirei amando, meu amor, ate que os mares se sequem… O ferreiro escutou a suas filhas com orgulho ate que acabou a ultima nota e entao as elogiou generosamente. Voltou-se para o casal que estava ante a bigorna e indicou, dando-se importancia: — E agora lhes farei umas perguntas. Sao os dois solteiros? — Sim — respondeu St. Vincent. — Tem um anel para a noiva? — Acaba de… — Vincent se deteve com uma imprecacao entre dentes ao ver que MacPhee arqueava as sobrancelhas, impaciente. Era evidente que se queria que a cerimonia concluisse, devia lhe seguir a corrente. Assim grunhiu: — Sim, tenho-o. — Coloque o da sua prometida no dedo e tome a mao. Evie se sentiu estranha e enjoada quando olhou ao St. Vincent. Assim que lhe deslizou a alianca no dedo, o coracao comecou a lhe pulsar depressa, e lhe percorreu o corpo algo que nao era nem entusiasmo nem temor, a nao ser uma emocao nova que agucava os sentidos. Nao tinha palavras para definir esse sentimento. A tensao a atendeu enquanto seu pulso recusava acalmar-se. Sua mao descansava sobre a do St. Vincent, cujos dedos eram mais largos e sua palma suave e calida. Ele inclinou um pouco a cabeca para lhe ver a cara. Embora estivesse inexpressiva, uma nota de cor lhe cobria as macas do rosto e a ponte do nariz. E respirava mais rapido do habitual. Ela desviou o olhar, surpreendida de que ja conhecesse algo tao intimo como sua respiracao normal. O ferreiro tomou uma fita branca e a entregou a uma de suas filhas. Evie se estremeceu um pouco quando a garota rodeou com ela no pulso dos noivos. Notou que St. Vincent tinha aproximado a mao livre a seu pescoco e o acariciava como se fora um animal nervoso. O suave contato de seus dedos fez que se relaxasse. MacPhee terminou de lhes rodear os pulsos com mais fita. — E agora o no — disse enquanto o fazia com um floreio. — Repita depois de mim, senhorita:

Eu te tomo por marido. — Eu te tomo por marido — sussurrou Evie. — Milorde? — animou-o o ferreiro. St. Vincent a olhou com uns olhos frios e brilhantes que nao revelavam nada. Mesmo assim, ela sentiu de algum modo que ele tambem sentia aquela tensao estranha, tao forte como a de um relampago. — Eu tomo por esposa — disse em voz baixa. — Ante Deus e estas testemunhas, eu lhes declaro marido e mulher — disse MacPhee com tom de satisfacao. — Que o que Deus uniu, nao o separe o homem. Sao oitenta e duas libras, tres coroas e um xelim. St. Vincent apartou com dificuldade o olhar de Evie e a dirigiu para o ferreiro com uma sobrancelha arqueada. — O anel vale cinquenta libras — explicou MacPhee em resposta a sua pergunta implicita. — Cinquenta libras por um anel sem pedra? — replicou St. Vincent acidamente. — E ouro escoces — disse MacPhee, a quem parecia lhe indignar que questionasse o preco. — E dos arroios das colinas do Lowther. — E o resto? — Trinta libras pela cerimonia, uma libra pelo uso do local, uma guineu pelo certificado de matrimonio, que lhes terei amanha preparado, uma coroa por cada testemunha… — Fez uma pausa para assinalar a suas filhas, que riram e fizeram uma reverencia. — Outra coroa pelas flores… — Uma coroa por um punhado de ervas secas? — soltou St. Vincent, indignado. — A cancao e cortesia da casa — concedeu MacPhee gentilmente. — OH, e um xelim pela fita, que nao devem desatar ate que o matrimonio se consumou ou a ma sorte lhes perseguira. St. Vincent abriu a boca para replicar, mas depois de um olhar a esgotada Evie, colocou a mao no bolso da jaqueta em busca do dinheiro. Movia-se com estupidez, ja que era destro e agora so podia usar a mao esquerda. Tirou um maco de bilhetes e umas moedas e os lancou sobre a bigorna. — Tenha — disse com brutalidade. — Fique com a mudanca. De lhe a suas filhas. — Sua voz adquiriu uma nota ironica. — junto com minha gratidao pela cancao. MacPhee e suas filhas deram as gracas a coro e os seguiram ate a porta enquanto as mocas repetiam uma estrofe: E te seguirei amando, meu amor, ate que os mares se sequem…

Capitulo 4 Quando sairam da ferraria, a chuva aumentava como uma densa cortina chapeada. Evie reuniu as forcas que ficavam para acelerar o passo em sua volta a estalagem. Sentia-se como se Caminhasse em sonhos. Tudo parecia desproporcionado, custava lhe concentrar o olhar e o estou acostumado a enlameado parecia mover-se caprichosamente sob seus pes. Para seu desgosto, seu flamejante marido a deteve junto ao edificio, a talher sob um beiral lhe jorrem. — O que acontece? — perguntou aturdida. Ele alargou a mao para seus pulsos atadas e comecou a desfazer o no da fita. — vou tirar-nos isto. — Nao. Espera. — O capuz da capa lhe escorregou para tras ao tentar impedir lhe Cobriu lhe a

mao com a sua e ele a olhou. — Por que? — perguntou St. Vincent com impaciencia. Inclinou a cabeca para olha-la aos olhos, e a agua comecou a lhe escorregar pela aba do chapeu. Tinha escurecido e a unica iluminacao que havia era o brilho tenue das luzes. Embora a luz fosse pouca, parecia prender em seus olhos, que mostravam como se possuissem uma luz interior. — Ja ouviste o senhor MacPhee: traz ma sorte desatar a fita. — E supersticiosa? — disse St. Vincent em tom incredulo. Evie assentiu como se desculpando. Nao custava muito dar-se conta de que a furia do St. Vincent poderia desatar-se muito antes que seus pulsos. Ai de pe, juntos, em meio da escuridao e o frio, com os bracos estendidos num angulo estranho, Evie sentia sua mao sobre a dele. Era a unica parte de seu corpo que experimentava calor. O falou com uma paciencia exagerada que teria impulsionado a Evie, em circunstancias normais, a retirar imediatamente suas objecoes. — De verdade quer entrar assim na estalagem? Era irracional, mas Evie estava muito exausta para pensar com sensatez. So sabia que ja tinha tido toda a ma sorte do mundo, e nao queria buscar-se mais. — Estamos em Gretna Green. Ninguem lhe dara nenhuma importancia. E acreditava que nao lhe importavam as aparencias. — Nunca me importou parecer depravado ou vil. Mas me nego a parecer idiota. — Nao, por favor — insistiu ela quando St. Vincent voltou a atacar o no. Lutou com ele e seus dedos se entrelacaram. De repente, St. Vincent tomou a boca com a sua e a empurrou contra o edificio, onde a segurou com seu corpo. Com a mao livre, tomou a nuca por debaixo do cabelo molhado. A pressao de seus labios a aturdiu. Nao sabia beijar e nao tinha ideia do que fazer com a boca. Perplexa e tremente, ofereceu lhe os labios fechados enquanto o coracao lhe pulsava com forca e as pernas lhe fraquejavam. St. Vincent queria coisas que ela nao sabia lhe dar. Ao notar sua confusao, ele cedeu um pouco e comecou a lhe dar beijos breves e insistentes enquanto lhe rocava com suavidade a cara. Comecou a lhe acariciar a mandibula, o queixo, e, com o polegar, incitou lhe a separar os labios. Assim que o conseguiu os cobriu com a boca. Evie podia saborea-lo: uma essencia sutil e sedutora que a afetou como se tratasse de um elixir exotico. Notou como lhe introduzia a lingua, como lhe explorava brandamente a boca, como a deslizava mais e mais dentro sem que ela opusesse resistencia. Depois deste beijo exuberante, St. Vincent reduziu a pressao ate que suas bocas apenas se tocavam e seu folego, que o frio da noite convertia em bafo, mesclava-se de modo visivel. Beijou-a com suavidade uma, duas vezes. Percorreu lhe a bochecha com os labios ate o oco da orelha. Entao, ao sentir como a acariciava com a lingua e como tomava o lobulo entre os dentes, Evie soltou um gritinho afogado. Estremeceu-se e uma calida sensacao lhe invadiu os peitos ate suas partes intimas. Procurou as cegas sua boca, a caricia delicada de sua lingua. E ele as ofereceu com um beijo tenro mas firme. Evie lhe rodeou o pescoco com o braco livre para nao cair, enquanto ele mantinha a outra boneca contra a parede, o que provocava que seus pulsos pulsassem juntos sob a fita branca. Outro beijo apaixonado, rude e doce de uma vez, com o que lhe devorou a boca e lhe saboreou e lambeu o paladar. Ela sentiu um prazer tao intenso que quase se deprimiu. Nao e estranho…, pensou atordoada. Nao, nao era estranho que tantas mulheres tivessem sucumbido a aquele homem, estragado sua reputacao e sua honra por ele. Haviam inclusive, se terei que dar credito aos rumores, ameacado com suicidar-se quando as abandonou. Sebastian era a sensualidade personificada.

Quando se separou dela, surpreendeu lhe nao desabar-se. Ele ofegava tanto como ela, mais inclusive, e seu torax se movia com forca. Ambos guardaram silencio enquanto ele alargava a mao para desatar a fita com os olhos totalmente fixos nisso. Tremiam lhe as maos. Nao a olhou, embora nao soube se era para evitar lhe ver a expressao ou para lhe impedir de ver a sua. Uma vez retirada a cinta branca, Evie se sentiu como se seguissem atados. Sua boneca conservava a sensacao de esta-lo. Ele, que por fim se atreveu a olha-la, desafiou-a em silencio a que protestasse. Assim que ela se conteve e tomou o braco para percorrer a curta distancia que os separava da estalagem. A cabeca lhe dava voltas e logo que ouviu as felicitacoes joviais do senhor Findley quando entraram. Ao subir a escada, escura e estreita, pesavam lhe as pernas. A viagem concluia finalmente num esforco titanico por por um pe diante do outro. Chegaram a uma porta no corredor de acima. Apoiada contra a parede, viu como St. Vincent introduzia a chave na fechadura. Quando teve aberto, Cambaleou-se para a soleira. — Espera — disse ele, e se agachou para carrega-la. — Nao tem que… — soltou ela. — Por deferencia a sua natureza supersticiosa, acredito que sera melhor que sigamos uma ultima tradicao. — E a levantou com a mesma facilidade que se fosse uma menina e cruzou de lado a porta com ela em bracos. — Traz ma sorte que a noiva tropece na soleira. E vi homens Caminhar melhor que voce depois de uma bacanal de tres dias. — Obrigado — murmurou Evie quando a deixou no chao. — Sera meia coroa — replicou St. Vincent, e o aviso ironico das tarifas do ferreiro a fez sorrir. Mas seu sorriso se desvaneceu ao jogar uma olhada a quarto. A Cama de matrimonio se via amaciada e poda, e a colcha, puida de incontaveis lavagens. A armacao era de metal, com arremates em forma de bola. Um brilho rosado emanava de um abajur de azeite com tulipa de cristal vermelho que havia na mesinha de noite. Manchada de barro, geada e intumescida, Evie observou em silencio a banheira de cobre colocada diante da chamine. St. Vincent fechou a porta, aproximou-se dela e lhe desabotoou a capa. Seu rosto refletiu um pouco parecido a lastima quando se precaveu de que tremia de cansaco. — Deixa que te ajude — disse em voz baixa de uma vez que lhe tirava a capa dos ombros, e aproximou uma cadeira ao fogo. Evie tragou saliva e tratou de esticar os joelhos, que pareciam querer dobrar-se. Ao olhar a Cama, um pavor frio lhe golpeou o estomago. — Vamos A…? — comecou com uma voz que lhe voltou aspera. — Vamos A…? — repetiu St. Vincent de uma vez que comecava a lhe desabotoar a parte dianteira do vestido. Seus dedos se moveram com rapidez pela abotoadura do corpete. — Nao, Por Deus. Apesar da deliciosa que e, meu amor, estou muito cansado. Jamais havia dito isto em toda minha vida mas, neste momento, prefiro mais dormir a fuder. Evie suspirou aliviada. Teve que agarrar-se a ele para nao perder o equilibrio quando lhe passou o vestido pelos quadris para tirar lhe. — Eu nao gosto dessa palavra — disse em voz baixa. — Pois mais vale que acostume a ela — respondeu ele com mordacidade. — E uma palavra que se usa com frequencia no clube de seu pai. Nao entendo como nao esta acostumada para ouvi-la. — Ouvi-a — replicou indignada enquanto dava um passo para sair do circulo que formava o vestido no chao. — So que, ate agora, nao sabia o que significava.

St. Vincent se agachou para lhe desabotoar os sapatos. Um ruido estranho, como de sufoco, lhe escapou dos labios. Evie acreditou, angustiada, que lhe tinha dado um ataque, mas logo compreendeu que se estava rendo. Era a primeira gargalhada autentica que lhe ouvia, embora nao sabia o que lhe resultava tao gracioso. De pe ante ele, em regata e culote, cruzou-se de bracos e franziu o cenho. Sem deixar de desfrutar-se, St. Vincent lhe tirou os sapatos e os deixou no chao. Baixou lhe as medias com rapida eficiencia. — Toma um banho, ceu — conseguiu dizer por fim. — Esta noite nao corre perigo comigo. Poderei olhar, mas nao tocar. Adiante. Como nunca se despiu diante de um homem, Evie se ruborizou de pes a cabeca enquanto se soltava os lacos da regata. St. Vincent, com tato, voltou-se e se dirigiu para o lavabo com um aguamanil cheio de agua quente que havia na chamine. Enquanto tirava os uteis para barbear-se, Evie se tirou com estupidez a roupa interior e se meteu na banheira. A agua estava deliciosamente quente e, ao inundar-se, sentiu um aperto nas pernas, como se lhe cravassem milhares de agulhas. Em um tamborete junto a banheira havia um pote com um sabao gelatinoso de cor marrom e aroma acre. Verteu-se um pouco nos dedos e o estendeu pelo peito e os bracos. Tinha as maos muito torpes e os dedos se negavam a obedecer suas ordens. Depois de afundar a cabeca na agua, alargou a mao para tomar um pouco mais de sabao e quase derrubou o pote. Lavou-se o cabelo, resmungou quando comecaram a lhe arder os olhos e com as maos se verteu agua na cara. St. Vincent se aproximou da banheira com o aguamanil. Evie lhe ouviu falar atraves da agua. — Joga a cabeca para tras — ordenou antes de lhe verter o resto de agua limpa sobre o cabelo ensaboado. Com destreza, secou lhe o rosto com uma toalha limpa mas aspera, e lhe disse que se levantasse. Evie tomou a mao que lhe oferecia e o fez. Deveria haver-se morto de vergonha de estar nua ante ele, mas tinha chegado a tal limite de esgotamento que era incapaz de sentir pudor. Tremente e curvada, deixou que a ajudasse a sair da banheira. Inclusive permitiu que a secasse, sem fazer outra coisa que nao fora esperar languidamente a que terminasse, sem lhe importar nem dar-se conta de se a estava olhando. St. Vincent era mais eficiente que qualquer donzela, e lhe pos com rapidez a Camisola de flanela branca que tinha encontrado em sua bolsa de viagem. Com a toalha lhe escorreu a agua do cabelo e depois a conduziu ate o lavabo. Evie observou, indiferente, que tinha encontrado sua escova de dentes na bolsa e lhe tinha jogado pos dentifricios. Escovou-se os dentes, os esclareceu com movimentos energicos e cuspiu na bacia de ceramica. A escova lhe escorreu entre os dedos intumescidos e repicou no chao. — Onde esta a Cama? — sussurrou com os olhos fechados. — Aqui, carinho. Tome a mao — respondeu ele, e a guiou. Assim que chegou, Evie se tombou como um animal ferido. O colchao era fofo, e o peso dos lencois e as mantas de la, secas e quentes, delicioso para suas extremidades doloridas. Afundou a cabeca no travesseiro e gemeu lhe suspire. Sentiu um ligeiro puxao no cabelo e compreendeu que St. Vincent lhe estava penteando as mechas molhadas. Aceitou passivamente seus cuidados e deixou que lhe desse a volta para fazer o mesmo com o outro lado. Quando teve terminado, ele foi tomar seu banho. Evie conseguiu manter-se acordada o suficiente para ver seu corpo esbelto e dourado a luz do fogo. Fechou os olhos quando se metia na banheira e, quando ele se sentou, ela ja estava dormida. Nenhum sonho a perturbou de noite. Nao existia nada salvo a escuridao doce e densa, a Cama

amaciada e a tranquilidade de um povo escoces em uma noite fria de finais de outono. So se moveu a alvorada, quando os ruidos do exterior penetraram no quarto: os gritos alegres do vendedor de paodoces e de um Camelo, os sons de animais e carros que passavam pela rua. Entreabriu os olhos, e na luz tenue que entrava atraves das asperas cortinas beges, viu com surpresa que havia outra pessoa na Cama. St. Vincent. Seu marido. Estava nu, ao menos de cintura para acima. Dormia de barriga para baixo, e rodeava com seus musculosos bracos o travesseiro em que apoiava a cabeca. As linhas de seus ombros e costas eram tao perfeitas que pareciam gravadas em ambar palido do Baltico e lixadas ate obter um acabamento brilhante. Seu rosto parecia muito mais suave que quando estava acordado. Tinha fechados seus calculadores olhos, e a boca, relaxada, via-se sensual. Evie fechou os olhos e pensou que era uma mulher casada, e que poderia ver seu pai e ficar com ele todo o tempo que quisesse. E, como era provavel que ao St. Vincent nao importasse muito o que fizesse ou aonde fora, gozaria de certa liberdade. Apesar de que seguia preocupada, sentiu um pouco parecido a felicidade e, com um suspiro, voltou a dormir. Esta vez sonhou que avancava por um Caminho banhado pelo sol e bordejado de aster e espigas douradas. Era um Caminho do Hampshire que tinha percorrido muitas vezes e que atravessava Campos umidos cheios de reina dos prados e ervas largas de finais do verao. Andava sozinha ate aproximarse do poco dos desejos onde ela e suas amigas tinham arrojado uma vez moedas a agua e formulada seus desejos. Como conhecia a supersticao local sobre o espirito do poco que vivia clandestinamente, Evie nao tinha querido aproximar-se muito ao bordo. Segundo a lenda, o espirito esperava capturar a alguma donzela inocente para que vivesse com ele no poco. Em seu sonho, entretanto, nao tinha medo e se atrevia inclusive a tira-los sapatos e a colocar os pes na agua. Para sua surpresa, nao estava fria, a nao ser deliciosamente quente. Sentava-se no bordo do poco, inundava as pernas na agua e levantava a cara para o sol. Sentia que algo lhe rocava os tornozelos. Ficava muito quieta, sem sentir nenhum medo apesar de notar que algo se movia sob a superficie da agua. Outro roce… uma mao… uns dedos largos lhe acariciavam os pes e lhe massageavam com ternura os doloridos arcos ate que ela suspirava de prazer. Umas grandes maos masculinas foram subindo pelas panturrilhas e os joelhos enquanto um corpo corpulento e bem formado emergia das profundidades do poco. O espirito tinha adotado a forma de um homem para corteja-la. Rodeava-a com seus bracos e seu contato era estranho, mas tao agradavel que seguia com os olhos fechados, temerosa de que, se tentava olha-lo, pudesse desaparecer. Tinha a pele calida e sedosa, e os musculos das costas lhe esticavam sob seus dedos. Seu amante sonhado lhe sussurrava palavras carinhosas ao abraca-la e lhe acariciava o pescoco com a boca. Notava uma sensacao agradavel em qualquer lugar que a tocasse. — Faco-te minha? — murmurou enquanto lhe tirava com cuidado a roupa e deixava sua pele exposta a luz, ao ar e a agua. — Nao tenha medo, meu amor… E quando ela se estremecia e o abracava as cegas, lhe beijava o pescoco e os peitos, e lhe rocava os mamilos com a lingua. Deslizava lhe as maos pescoco abaixo para lhe acariciar os peitos enquanto com os labios meio separados lhe tocava os mamilos. Incitava-a com a lingua uma e outra vez ate que a ela lhe escapava um gemido de prazer e lhe afundava os dedos no cabelo. O espirito do poco lhe cobria com a boca um mamilo e atirava com suavidade. Acariciava-o depois com a lingua e voltava a atirar dele para lambe-lo e chupa-lo. Evie arqueava as costas, gemia e nao podia evitar separar as coxas quando ele se situava entre eles, e entao…

Abriu os olhos de repente. Despertou confundida e ofegante, cheia de desejo. O sonho se desvaneceu e compreendeu, aturdida, que nao estava no Hampshire a nao ser no quarto da estalagem de Gretna, e que o ruido de agua nao procedia de nenhum poco dos desejos mas sim da chuva que caia nesse momento. Tampouco havia luz do sol, a nao ser o brilho de um fogo recem aceso na chamine. E o corpo que a cobria nao era nenhum espirito do poco, a nao ser um homem que tinha a cabeca em seu ventre e lhe percorria a pele com a boca. Evie ficou tensa e choramingou surpreendida ao dar-se conta de que estava nua, que St. Vincent lhe estava fazendo o amor e que levava nisso varios minutos. O elevou os olhos para ela. Com o ligeiro rubor que lhe cobria as bochechas, seus olhos pareciam mais claros e impressionantes do habitual. Seus labios esbocaram um sorriso relaxado mas picasse. — E dificil despertar — murmurou com voz rouca antes de voltar a agachar a cabeca enquanto lhe percorria furtivamente uma coxa com a mao. Evie, escandalizada, protestou e se moveu sob seu corpo, mas ele a tranquilizou lhe acariciando as pernas e os quadris e voltou a coloca-la na posicao adequada. — Te esteja aquieta. Nao tem que fazer nada, meu amor. Deixa que eu me encarregue. Sim. Pode me tocar se lhe… Mmm… Sim… — sussurrou ao notar os dedos trementes de Evie em seu cabelo, em sua nuca, na curva de seus ombros. Descendeu, e Evie sentiu como suas pernas nuas se deslizavam entre as dela ate que se precaveu de que ele tinha o rosto justo em seu pelo intimo. Envergonhada, alargou uma mao para tampar-se. A erotica boca do St. Vincent se deslizou para seu quadril, e notou que sorria contra sua pele suave. — Nao deveria fazer isso — lhe sussurrou. — Se me esconde algo, desejo-o mais. Temo-me que me esta enchendo a cabeca de ideias lascivas, assim sera melhor que aparte a mao, carinho, ou poderia te fazer algo realmente depravado. Quando Evie apartou a mao tremente, St. Vincent passeou a ponta de um dedo pelo pelo encaracolado para procurar com delicadeza sua cavidade. — Assim eu gosto, que obedeca a seu marido — prosseguiu com picardia em voz baixa enquanto a acariciava ate lhe separar os cachos do pelo. — Especialmente na Cama. Que bonita e. Separa as pernas, carinho. Vou tocar-te por dentro. Nao, nao tenha medo. Ira melhor se antes te beijar aqui. Nao te mova… Evie solucou ao notar como a boca de seu marido lhe explorava o pubis de pelo ruivo. Sua lingua, calida e paciente, encontrou o pequeno monticulo meio oculto sob o vulneravel capuz. Sitiou um dedo, comprido e agil, na entrada da vagina, mas ela o deslocou ao mover-se de repente, surpreendida. St Vincent lhe sussurrou palavras tranquilizadoras e voltou a lhe deslizar o dedo no interior de seu corpo, mais profundamente esta vez. — Minha menina inocente — murmurou em voz baixa enquanto lhe excitava com a lingua aquele ponto tao sensivel. Evie se estremeceu e gemeu. De uma vez, o dedo lhe acariciava o interior da vagina seguindo um ritmo languido. Ela apertava os dentes para nao fazer ruido, mas nao podia evitar gemer de prazer. — O que acredite que aconteceria seguisse fazendo isto sem parar? — perguntou St. Vincent. Seus olhares se cruzaram e a Evie lhe nublou a vista. Sabia que tinha a cara contraida e ruborizada.

Abrasava lhe ate o ultimo centimetro de pele. St. Vincent parecia esperar uma resposta, e com muita dificuldade obteve que as palavras lhe saissem da garganta. — Nao sei — disse fracamente. — Vamos provar o, parece-te? Nao pode responder, nao pode fazer nada salvo observar assombrada como lhe pressionava o pelo encaracolado com a boca e a acariciava com destreza. Evie jogou a cabeca atras e seu coracao se acelerou. Notou um ligeiro ardor quando lhe deslizou um segundo dedo e os moveu com ternura de uma vez que lhe chupava a vulva, lambendo lhe devagar ao principio e aumentando o ritmo enquanto ela se retorcia. Seguiu assim, efetuando movimentos controlados com os dedos e tocando a de modo imperioso com a boca ate que o prazer a invadiu em feitas ondas cada vez mais rapidas e, de repente, ficou paralisada. Arqueou o corpo em tensao, gritou, gemeu e voltou a gritar. St. Vincent suavizou o contato com a lingua, mas seguiu seu jogo com destreza para alimentar seu climax e lhe acariciar o sexo enquanto ela tremia violentamente. De repente a invadiu um enorme cansaco e, com ele, uma euforia fisica, como se estivesse bebada. Incapaz de controlar suas extremidades, retorceu-se tremente sob seu corpo e nao ofereceu nenhuma resistencia quando St. Vincent a voltou de barriga para baixo. Continuando, deslizou lhe uma mao entre as coxas e voltou a lhe introduzir os dedos no sexo. Tinha suas partes intimas sensiveis e, para sua vergonha, empapadas. Isso, entretanto, parecia excitar ao St. Vincent, que lhe ofegava na nuca. Sem lhe retirar os dedos, beijou-a e a mordiscou costas abaixo. Evie sentiu o roce de seu sexo entre as pernas, duro, inchado e ardente. Nao lhe surpreendeu a mudanca, ja que Annabelle lhe tinha contado bastante sobre o que lhe passava ao corpo de um homem durante o ato amoroso. Mas Annabelle nao lhe havia dito nada sobre as demais intimidades que faziam que a experiencia nao fora meramente fisica, mas sim de uma classe que podia te transformar a alma. St. Vincent, agachado sobre ela, provocou-a e a acariciou ate que elevou tentativamente os quadris. — Quero te penetrar — sussurrou, e lhe beijou o lado do pescoco. — Quero estar muito dentro de ti. Serei muito tenro, meu amor. Deixa que te de a volta e… meu deus, e tao formosa… — situou-se entre suas coxas abertas e lhe disse com voz tensa: — Toque-Me, carinho… Ponha a mao aqui. Inspirou com forca quando Evie lhe rodeou o turgente membro com os dedos e o acariciou vacilante, reconhecendo pela aceleracao de sua respiracao que gostava. St. Vincent fechou os olhos com as pestanas trementes e os labios um pouco separados devido a seus ofegos. Evie se colocou com estupidez o membro entre as coxas. Mas a ponta lhe deslizou pelo sexo umido e St. Vincent gemeu como se lhe doesse. Evie voltou a tenta-lo, insegura. Uma vez no lugar adequado, St. Vincent o introduziu com forca. Doeu lhe muito mais que quando a havia meio doido com os dedos e ficou subitamente tensa. Ele a rodeou com os bracos e empurrou com forca uma e outra vez ate que a penetrou totalmente. Evie se retorceu para evitar a dolorosa invasao mas parecia que cada movimento seu so servia para aumentar a profundidade da penetracao. Assim que se obrigou a permanecer quieta entre seus bracos. Fincou lhe os dedos nos ombros e, obstinada a ele, deixou que a acalmasse com a boca e as maos. St. Vincent a beijou com os olhos fechados e, ao notar a calidez de sua lingua, ela quis introduzir lhe mais com uma succao ansiosa. O soltou um som de surpresa e se estremeceu com uma serie de espasmos ritmicos de seu membro de

uma vez que um gemido lhe vibrava no peito e soltava o folego entre dentes. Evie lhe deslizou as maos pelo peito coberto de pelo dourado. Com os corpos ainda unidos, lhe tocou o flanco, o contorno das costelas e as costas suave. St. Vincent deixou que lhe explorasse o corpo sem mover-se ate que por fim lhe exageraram os olhos e deixou cair a cabeca no travesseiro junto a ela com um grunhido enquanto a investia com forca e se estremecia como extasiado. Beijou-a com um anseia primaria. Evie separou mais as pernas e lhe pressionou as costas para apressa-lo e tentar, a pesar da dor, que a penetrasse mais profundamente e com mais forca. Apoiado nos cotovelos para nao esmaga-la, St. Vincent lhe pos a cabeca no peito e Evie sentiu seu folego quente e suave sobre o mamilo. Sua barba incipiente lhe arranhava um pouco e a sensacao lhe contraiu os mamilos. O seguia dentro dela, embora seu sexo se suavizou. Estava acordado, mas imovel. Evie tambem permaneceu quieta enquanto lhe rodeava a cabeca com os bracos e lhe acariciava o cabelo. Notou que ele movia a cabeca e procurava o mamilo ate rodea-lo com os labios e seguir devagar com a lingua o contorno da aureola, uma e outra vez ate que ela se moveu impaciente sob seu corpo. Lambeu lhe o mamilo brandamente e sem descanso, e o desejo lhe abrasou os peitos, o ventre e a virilha ate que a dor desapareceu sob uma nova quebra de onda de desejo. St. Vincent passou ao outro peito e o mordiscou e jogou com ele, gozando, ao parecer, com seu prazer. Levantou um pouco o corpo para deslizar uma mao entre ambos e lhe acariciar seu pubis umido e incita-la com destreza. Provocou lhe um novo climax, e com seu corpo esfregou voluptuosamente a virilha de Evie. Logo, ofegante, levantou a cabeca para olha-la como se fora uma variedade de ser vivo desconhecida. — Meu deus — sussurrou com uma expressao que nao era de satisfacao mas sim de um pouco parecido ao alarme.

Capitulo 5 Sebastian se levantou e se dirigiu ao lavabo com pernas trementes. Sentia-se aturdido, inseguro, como se fora ele quem acabava de perder a virgindade. Depois de tantas aventuras amorosas, acreditava que ja nao ficava nada por experimentar. Estava equivocado. Para um homem para quem fazer o amor era uma mescla perita de tecnica e coreografia, tinha sido toda uma surpresa encontrarse a merce de sua propria paixao. Tinha intencao de retirar-se no ultimo momento, mas o desejo o tinha cegado tanto que se esqueceu. Merda. Isso nao lhe tinha passado nunca. Tomou com estupidez uma toalha de linho para molha-la na agua fria da bacia. Para entao, sua respiracao tinha recuperado a normalidade, mas nao estava nada tranquilo. Depois do que acabava de passar, deveria esquecer-se do sexo por umas horas. Mas nao tinha tido suficiente. Tinha tido o orgasmo mais largo, persistente e espetacular de sua vida, e mesmo assim nao tinha repleto sua necessidade de possui-la, de penetra-la. Era uma loucura. Mas por que? por que com ela? Ela tinha a aula de figura que sempre lhe tinha gostado, voluptuosa e firme, com umas coxas bem torneadas que o rodeassem. E sua pele era tao suave como o veludo, com sardas douradas pulverizadas como faiscas festivas. O pelo pubico tao vermelho e encaracolado como o cabelo…

Sim, isso tambem era irresistivel. Mas as bondades fisicas de Evangeline Jenner nao explicavam do todo o extraordinario efeito que exercia nele. Excitado de novo, Sebastian se esfregou bem com a toalha fria e tomou outra para levar lhe a Evangeline, que jazia meio recolhida de costas. Para seu alivio, parecia que nao ia haver lagrimas nem queixa virginais. Parecia mais pensativa que afetada. Olhava-o intensamente, como se tentasse resolver um misterio. O lhe murmurou que se voltasse de barriga para cima e lhe lavou o sangue e os fluidos entre as pernas. Nao lhe resultava facil estar nua diante dele. Sebastian viu o rubor que subiu as bochechas em uma rapida quebra de onda. Tinha conhecido muito poucas mulheres que se ruborizassem por esse motivo. Sempre tinha eleito mulheres peritas, ja que nao gostava muito das ingenuas. Nao por uma questao de moralidade, e obvio, mas sim porque as virgens eram, por norma, bastante insipidas na Cama. Aquela era uma notavel excecao. Deixou a toalha e apoiou as maos a cada lado dos ombros do Evangeline. Estudaram-se com curiosidade. Precaveu-se de que nao lhe incomodava o silencio; nao tentava enche-lo como a maioria de mulheres. Um ponto mais a seu favor. Inclinou-se para ela sem deixar de olha-la aos olhos, mas ao agachar a cabeca, uma especie de grunhido interrompeu o silencio. Era o estomago de seu flamejante esposa, que protestava de fome. Mais rosada ainda, se isso era possivel, ela se cobriu o ventre com as maos para sossegar o teimoso ruido. Um sorriso iluminou o rosto do Sebastian, que lhe beijou o umbigo e anunciou: — Pedirei o cafe da manha, carinho. — Evie — murmurou Evangeline de uma vez que se tampava com os lencois ate as axilas. — Assim e como me chama meu pai. — Me chame Sebastian — repos ele com um sorriso. Evie alargou a mao devagar, como se ele fora um animal selvagem que fora a por-se a correr se assustava, e o tocou os cachos do peito com suavidade. — Agora somos realmente marido e mulher. — Sim. Que Deus te ajude — disse Sebastian, baixando um pouco a cabeca, encantado com suas caricias. — Saimos hoje para Londres? Ela assentiu. — Quero ver meu pai. — Sera melhor que escolha as palavras com tato quando lhe explicar que sou seu genro — disse. — Se nao, a noticia poderia acabar com ele. — Nos temos pressa — insistiu Evie de uma vez que lhe apartava a mao do cabelo. — Se o tempo melhorar, possivelmente possamos ir mais rapido. Quero ir diretamente ao clube de meu pai e… — Chegaremos logo — disse Sebastian com calma— , mas nao viajaremos a velocidade endemoninhada com que o fizemos ao vir. Passaremos pelo menos uma noite em uma estalagem de posta. — Evie foi protestar, mas ele acrescentou: — A seu pai nao servira de nada que chegue a seu clube meio morta de cansaco. Era o inicio do exercicio da autoridade do marido, e da obrigacao de obedecer da esposa. Era evidente que Evie ansiava discutir, mas se limitou a olha-lo com cenho. — Esperam lhe tempos dificeis, carinho — murmurou Sebastian. — Ter-Me por marido ja sera

bastante arduo. Mas cuidar de um tuberculoso na ultima fase de sua enfermidade… Necessitasse todas suas forcas. Nao tem sentido que as esbanje antes de chegar. Ela o observou com uma intensidade renovada que lhe fez sentir incomodo. Que olhos tinha! Era como se alguem tivesse reunido capas de cristal azul para fazer passar por elas um raio de sol. — Ti preocupa meu bem-estar? — perguntou. — Claro que sim, princesa. Convem-me te conservar viva e sa ate que possa cobrar seu dote. Evie averiguou logo que Sebastian se sentia tao comodo nu como vestido. Tentou atuar com naturalidade ante um homem que se movia pelo quarto sem nada de roupa. Mas, sempre que pode, dirigiu lhe olhadas discretas ate que tirou um traje do bau. Tinha pernas largas e esbeltas, e amplas zonas do corpo tonificadas mediante a pratica de exercicios de cavalheiros como a equitacao, o pugilismo e a esgrima. Tinha as costas e os ombros muito desenvolvidos, com musculos que se flexionavam sob a pele tensa. Por diante era mais fascinante ainda, e incluia um peito nao imberbe como o das estatuas de marmore ou bronze, a nao ser ligeiramente talher de pelo. O pelo peitoral, e o de outros lugares, tinha-a surpreso. Era outro dos muitos misterios do sexo oposto que lhe tinham revelado, em sentido literal. Incapaz de andar pelo quarto nua, envolveu-se com um lencol antes de dirigir-se a sua bolsa de viagem. Extraiu dela um vestido de la marrom, uma muda e, o melhor de tudo, um par de sapatos secos e limpos. O outro par estava tao sujo e umido que se estremecia de so pensar em ficar o Enquanto se vestia, notou o olhar do Sebastian fixa nela. Baixou-se com rapidez a regata para ocultar seu torso. — E preciosa, Evie — comentou ele em voz baixa. Como tinha crescido rodeada de parentes que se lamentavam da cor estridente de seu cabelo e da proliferacao de sardas em sua pele, dirigiu lhe um sorriso cetico. — A tia Florence sempre me dava uma locao descolorante para eliminar as sardas. Mas nao ha forma de livrar-se delas. Sebastian se aproximou dela com um sorriso. Tomou os ombros e lhe percorreu o corpo meio nu com um olhar apreciativo. — Nao te tire nenhuma so sarda, carinho. Encontrei algumas em lugares do mais encantadores. Ja tenho minhas favoritas. Quer saber onde estao? Evie, desconcertada, sacudiu a cabeca e fez um movimento para liberar-se de sua sujeicao. Mas ele nao o permitiu. Aproximou-a mais para ele, agachou a cabeca e lhe beijou o lado do pescoco. — Desmancha-prazeres — sussurrou sorridente. — Vou lhe dizer isso de todos os modos. — Subiu lhe a regata devagar. Ela conteve o folego ao notar como lhe acariciava as pernas nuas enquanto lhe dizia com os labios no pescoco: — Como descobri antes, tem umas quantas na parte interna da coxa direita que conduzem para… Interrompeu-os uma chamada a porta. Sebastian levantou a cabeca com uma exclamacao de irritacao. — O cafe da manha — resmungou. — E nao me atreveria a te dar a escolher entre minhas artes amorosas ou uma comida quente, ja que o mais provavel e que a resposta fora pouco aduladora para mim. Ponha o vestido. Uma vez ela o teve feito o mais rapido que pode, Sebastian abriu a porta a duas garconetes com um par de bandejas cheias de pratos tampados. Ao ver o atrativo hospede de rosto angelical e cabelos cor trigo, soltaram uma exclamacao afogada e risinhos picaros. Nao melhorou as coisas que vissem que ia so parcialmente vestido, com os pes descalcos, o pescoco da Camisa branca desabotoado e um lenco de seda pendurando a ambos os lados do pescoco. Alteradas mocas quase

derrubaram duas vezes as bandejas antes de conseguir deixar os pratos na mesa. Observaram a Cama revolta e lhes custou conter chiados de regozijo ao especular sobre o ocorrido ali durante a noite. Evie, zangada, despachou-as sem cortesias e fechou a porta. Olhou a Sebastian para comprovar sua reacao ante a admiracao das garconetes, mas parecia nao haver-se dado conta. Era evidente que o comportamento daquelas mocas lhe resultava tao habitual que lhe acontecia inadvertido. As mulheres deviam contemplar e perseguir um homem de seu atrativo e posicao. Evie nao tinha nenhuma duvida de que seria terrivel para uma esposa que o amasse. Ela, entretanto, nao ia permitir se nunca ter ciumes nem temer uma traicao. Sebastian a fez sentar a mesa e serve a ela primeiro. Havia batatas amassadas com sal e manteiga, ja que para os escoceses era um sacrilegio as adocar com melaco. Tambem havia paozinhos, fatias de bacon cozido frio, presunto defumado e uma terrina com ostras defumadas, assim como fatias de pao torrado cobertas de geleia e cha forte. Evie comeu com avidez. Era um cafe da manha singelo, dificilmente comparavel aos opiparos cafes da manha ingleses do imovel de lorde Westcliff no Hampshire, mas estava quente e era abundante, e ela tinha muita fome para criticar nada. Seguiu tomando o cafe da manha um pouco mais enquanto Sebastian se barbeava e terminava de vestir-se. Depois de colocar um estojo de pele com os uteis de barbear no bau, fechou a tampa e disse: — Faz a bagagem, ceu. Vou abaixo a pedir que nos preparem a carruagem. — O certificado de matrimonio do senhor MacPhee… — Tambem me encarregarei disso. Fecha a porta com chave quando sair. Em aproximadamente uma hora voltou para recolher Evie. Um moco musculoso transportou o bau e a bolsa de viagem ate a carruagem. Sebastian esbocou um leve sorriso ao ver que sua mulher tinha pegado um de seus lencos de seda para recolher o cabelo na nuca. Evie tinha perdido a maioria de forquilhas durante a viagem da Inglaterra, e nao levava outras de recambio na bolsa. — Parece muito jovem para te casar — murmurou. — Isso acrescenta uma nota de libertinagem a situacao. Eu gosto. Como comecava a acostumar-se a seus comentarios indecentes, lhe dirigiu um olhar resignado. Desceram ao andar inferior e se despediram do senhor Findley. Quando se dirigiam para a entrada, o hospedeiro soltou com alegria: — Que tenha boa viagem, lady St. Vincent! Surpreendida ao dar-se conta de que se converteu em viscondessa, Evie lhe deu as obrigado gaguejando. Sebastian a ajudou a subir a carruagem, enquanto os cavalos davam coices e soltavam bafo pelos olhares alargados. — Sim-comentou ironicamente. — Apesar de quao manchado esta, o titulo tambem e teu agora. — Ajudou-a a por um pe no degrau ao entrar no veiculo. Uma vez sentado a seu lado, acrescentou: — Alem disso, algum dia nos elevaremos ainda mais, ja que sou o primeiro na linha de sucessao do ducado. Embora haja de ter paciencia. Os homens de minha familia sao infelizmente idosos, o que significa que nao herdarei nada ate que ambos estejamos muito decrepitos para desfruta-lo. — Se voce… — comecou Evie, e se deteve surpreendida ao ver um vulto no chao. Era um recipiente grande de ceramica, com uma abertura em um lado. Era arredondado, mas plano por debaixo. Olhou desconcertada a Sebastian enquanto tocava timidamente o objeto com a sola do sapato e era recompensada com uma rajada de calor que lhe subiu pelas pernas. — Um esquenta-pe! — exclamou. O calor da agua fervendo que continha o recipiente de ceramica duraria muito mais que

o lava-pes quente. — Onde o conseguiu? — O comprei do MacPhee quando o vi em sua casa — respondeu Sebastian, a quem parecia lhe divertir sua mescla de agitacao e desconcerto. — Como e logico, esteve encantado de poder me cobrar o dobro de seu valor. Impulsivamente, Evie meio se levantou do assento para lhe beijar a bochecha. — Obrigado. E todo um detalhe. Sebastian lhe sujeitou a cintura para impedir que se separasse dele, ate que tiveram as caras tao juntas que quase se tocavam. Ela notou seu folego quando lhe murmurou: — Parece-me que me mereco um agradecimento melhor. — E so um esquenta-pe — protestou Evie. — Devo te recordar, carinho, que este traste acabara esfriando-se — comentou ele com um sorriso. — E entao voltarei a ser sua unica fonte de calor disponivel. E eu nao compartilho meu calor corporal indiscriminadamente. — Conforme dizem, sim o faz. — Evie estava descobrindo um prazer desconhecido naquele intercambio. Jamais tinha brincado assim com um homem, nem se tinha divertido lhe negando algo que desejava, provocando-o com isso. Pelo brilho de seus olhos, viu que tambem gostava. Parecia querer despi-la ali mesmo. — Esperarei — assegurou Sebastian. — O maldito esquenta-pe nao pode durar toda a vida. Deixou que se sentasse bem de novo e a olhou enquanto distribuia o vestido sobre o esquenta-pe. Quando a carruagem arrancou, Evie se recostou feliz no assento enquanto a deliciosa sensacao de calor lhe subia pelas pernas das calcas do culote lhe penetravam atraves das meias. — Milorde… Quero dizer, Sebastian… — Sim, ceu? — Se seu pai for duque, como e que e visconde? Nao deveria ser marques, ou conde pelo menos? — Nao por forca. E uma pratica relativamente moderna conceder varios titulos menores quando se cria um novo. Por norma, quanto mais antigo e o ducado, menos provavel e que o filho maior seja marques. Meu pai o converte em uma virtude, claro. Nao te ocorra lhe tirar o tema, em especial quando estiver bebado, ou recebera um discurso insuportavel sobre quao feia e a palavra marques, e como o titulo em si e somente um penoso degrau inferior ao ducado. — E arrogante seu pai? — Antes pensava que era arrogancia — comentou com um sorriso amargo. — Mas bem e que se mantem alheio a tudo o que nao pertenca a seu mundo. Ate onde sei, nunca se pos ele mesmo as meias tres-quartos, nem os pos na escova de dentes. Duvido muito que pudesse sobreviver a uma vida sem privilegios. De fato, acredito que morreria de fome em um quarto cheia de comida se nao houvesse um criado que a levasse a mesa. Para ele nao tem importancia usar um vaso valioso como branco para fazer praticas de tiro nem apagar o fogo da chamine cobrindo-o com um casaco de pele de raposa. E sempre tem tochas e abajures acesos nos bosques que rodeiam o imovel se por acaso gosta de dar um passeio noturno. — Nao sente saudades que tenha dividas — soltou Evie, horrorizada portanto esbanjo. — Espero que nao seja igual de esbanjador. — Nunca me acusaram que gastar em excesso. Rara vez jogo, e nao mantenho nenhuma amante. Mesmo assim, tenho varios credores me pisando os calcanhares. — Pensaste alguma vez em te dedicar a alguma profissao?

— Para que? — repos com um olhar perplexo. — Para ganhar dinheiro. — Por Deus! Como te ocorre! Trabalhar seria uma distracao inoportuna em minha vida privada. Poucas vezes estou em disposicao de me levantar antes do meio-dia. — Isso nao gostara a meu pai. — Se minha ambicao na vida fora gostar a outros, preocuparia me. Por sorte, nao o e. A medida que a viagem prosseguia, Evie foi consciente de uma mescla contraditoria de sentimentos para seu marido. Embora possuisse um notavel encanto, nao encontrava nele muitas coisas dignas de respeito. Era evidente que tinha uma mente muito acordada, mas nao a usava para nada util. Alem disso, o fato de que tivesse traido a seu melhor amigo fugindo-se com o Lillian, sua prometida, deixava claro que nao era de confiar. Mesmo assim, de vez em quando era capaz de mostrar uma amabilidade que ela valorava. Em cada posta, Sebastian se ocupava de suas necessidades e, apesar de suas ameacas de deixar esfriar o esquenta-pe, tinha-o feito preencher com agua fervendo. Quando Evie se cansou, permitiu lhe jogar um cochilo apoiada em seu peito para sujeita-la cada vez que as rodas da carruagem encontravam um buraco. Enquanto dormitava entre seus bracos, lhe ocorreu que aquilo lhe permitia forja-la ilusao de algo que nao tinha tido nunca. Refugio. Passava lhe uma e outra vez a mao pelo cabelo com ternura e ouviu como lhe murmurava: — Descansa, meu amor. Eu velarei por ti.

Capitulo 6 Embora Sebastian tivesse vontades de chegar a Londres e adaptar-se a suas novas circunstancias, nao lamentou sua decisao de viajar mais devagar no Caminho de volta. Evie estava palida e pouco comunicativa, com as reservas de energia esgotadas. Precisava descansar. Depois de encontrar uma estalagem de posta apropriada onde pernoitar, Sebastian tomou o melhor quarto disponivel e pediu que lhes subissem comida e um banho quente. Assim, Evie pode meter-se em uma reduzida mas reparadora tina de agua quente, enquanto Sebastian dispunha a mudanca de cavalos pela manha e se encarregava de hospedar ao chofer. Quando voltou para o quarto, que era pequena, mas poda, com umas puidas cortinas azuis nas janelas, sua mulher tinha terminado de banhar-se e tinha posto a Camisola. Aproximou-se da mesa, levantou o guardanapo que tampava seu prato e deixou ao descoberto uma racao de frango assado, umas quantas verduras murchas e um pequeno pudim. Ao ver que o prato de Evie estava vazio, olhou-a com um sorriso ironico. — Como estava? — Melhor que ficar sem jantar. — A verdade, comeco a ver com outros olhos o talento de meu cozinheiro de Londres. — sentouse a mesa e se colocou o guardanapo no regaco. — Acredito que voce gostara de suas criacoes. — Nao espero comer muitas vezes em sua casa — replicou Evie com cautela. Sebastian se deteve com o garfo a meio Caminho da boca. — vou estar no clube de meu pai. Como ja te disse, quero cuidar dele. — De dia, sim. Mas nao dormira ai. De noite voltara para mi… a nossa casa. Ela o olhou sem

pestanejar. — Sua enfermidade nao desaparecera ao anoitecer para reaparecer a alvorada. Precisara cuidados constantes. — Para isso estao os criados — soltou Sebastian, irritado, antes de tomar o primeiro bocado. — Pode contratar a uma mulher para que o atenda. Evie sacudiu a cabeca com uma obstinacao que o zangou ainda mais. — Nao e igual a que te cuide um familiar que te quer. — Por que deveria te importar a qualidade de seu cuidado? Apenas o conhece. Esse bode tem feito muito pouco por ti. — Eu nao gosto dessa palavra. — E uma lastima — repos ele. — Porque e uma de minhas favoritas, e tenho intencao de seguir usando-a sempre que for aplicavel. — Pois e uma sorte que vamos ver-nos tao pouco uma vez estejamos em Londres. Sebastian ficou olhando a sua mulher, cujo doce rosto escondia um carater inesperadamente teimoso, e compreendeu que estava disposta a tomar medidas drasticas para obter seus propositos. Ou seja o que faria se a pressionava muito. Obrigou-se a sujeitar o garfo e a faca com suavidade e seguiu comendo. Dava igual ao frango estivesse insipido. Se tivesse estado banhado em um delicioso molho frances, tampouco o tivesse notado. Sua mente ardilosa estava ocupada procurando alguma estrategia para tratar com ela. — Nao posso permitir que fique em um lugar cheio de patifes, jogadores e bebados — murmurou por fim com expressao preocupada. — Seguro que compreende os perigos inerentes a semelhante situacao. — Assegurarei me de que recebe meu dote o antes possivel. E entao ja nao tera que preocupar-se por mim. — Maldita seja! Nao estou preocupado por ti — explorou Sebastian, incapaz de conter-se. — E so que… nao esta bem, Evie. A viscondessa do St. Vincent nao pode viver em um clube de jogo e mulheres da vida, nem sequer uns dias. — Nao sabia que fosse tao convencional — repos ela e, por alguma razao, ve-lo franzir o cenho furioso lhe provocou um ligeiro sorriso. Apesar do sutil que foi o gesto, Sebastian o viu, e passou imediatamente do aborrecimento ao desconcerto. Que o pendurassem se ia po-lo em um apuro uma moca de vinte e tres anos virgem… quase virgem… que era tao ingenua para acreditar que podia lhe plantar cara. — E enquanto voce faz de anjo da bondade, quem imagina que te protegera nesse antro, ceu? — repos com um olhar gelido e desdenhoso que deveria have-la intimidado. — Dormir sozinha no Jenner’s e um convite a ser violada. E nao penso ficar ai contigo. Tenho melhores coisas que fazer que estar em um clube de jogo de segunda esperando a que o velho Jenner a palme. — Nao te pedi que velasse por mim — respondeu Evie com calma. — Posso-Me arrumar isso sozinha. — Claro que sim — resmungou Sebastian com ironia. De repente, tinha perdido o interesse no jantar frio que tinha diante, assim deixou o guardanapo sobre o prato meio terminado, levantou-se e se tirou a jaqueta e o colete. Estava cansado e sujo da viagem, e queria dar um banho. Com um pouco de sorte, a agua ainda estaria quente. Enquanto se despia e lancava os objetos a uma cadeira, nao pode evitar pensar em todas as

mulheres que tinham pretendido casar-se com ele ao longo dos anos. Mulheres formosas, bem dotadas fisica e economicamente. Mulheres que ate teriam matado por agrada-lo. Mas ele tinha preferido seguir com suas atividades libertinas, sem sequer fazer uma proposta de matrimonio a alguma delas. E agora, devido a uma combinacao de circunstancias no momento mais inoportuno, tinha terminado casado com uma mulher de escassas aptidoes sociais, pessima linhagem e carater obstinado. Ao ver que Evie evitava olhar seu corpo nu, Sebastian esbocou um sorriso desdenhoso. Dirigiuse para a pequena banheira e colocou-se dentro com as panturrilhas pendurando para fora. Ensaboouse a fundo e logo se enxaguou o peito e os bracos com a agua morna sem deixar de observar a sua mulher com os olhos entreabertos. Adorou ve-la perder um pouco de compostura enquanto ele se banhava. Estava ruborizada e mostrava um interesse excessivo no estampado da colcha da Cama. Enquanto ela erguia uma o indicador, Sebastian se fixou no brilho do anel de ouro escoces. Entao sentiu um subito impulso de lancar a sua mulher sobre a Cama e possui-la sem preliminares. De domina-la e obriga-la a admitir que lhe pertencia. Esse desejo tao primario era mais que alarmante para alguem que sempre se considerou um ser civilizado. Preocupado e excitado, terminou de lavarse, agarrou a toalha umida que ela tinha usado e se secou rapidamente. A prova de sua excitacao nao passou inadvertida a Evie, ja que o ouviu respirar com brutalidade. Envolveu-se o corpo com a toalha e se dirigiu ao bau. Agarrou um pente e foi ao lavabo para pentear o cabelo molhado. A esquina do espelho que havia sobre a bacia lhe oferecia uma vista parcial da Cama, e viu que Evie o estava olhando. — Esta noite me toca fazer de cao do acougueiro? — murmurou sem voltar-se. — De cao do acougueiro? — repetiu Evie, confundida. — O cao que esta no canto da loja e nao lhe permite tocar a carne. — A comparacao nao e muito aduladora para nem… nenhum de os dois. Sebastian fez uma pausa ao detectar que voltava a gaguejar. Estupendo, pensou com crueldade. Nao estava tao tranquila como aparentava. — Nao vai responder? — insistiu. — Sinto muito, mas pre… preferiria nao voltar para… ter relacoes intimas contigo. Atonito, Sebastian deixou o pente e se voltou para olha-la. As mulheres jamais o rechacavam. E o fato de que Evie o fizesse depois dos prazeres dessa manha lhe tocou o amor proprio. — Disseme que voce nao gostava de te deitar com uma mulher mais de uma vez — lhe recordou ela meio desculpando-se. — Disse que seria muito aborrecido. — Pareco-te aborrecido? — repos ele sem que a toalha fizesse grande coisa por dissimular o contorno de sua erecao. — Suponho que isso depende da parte de seu corpo que alguem olhe — balbuciou Evie, e baixou os olhos para a colcha. — Le re… lembra que temos um acordo. — Isso sempre pode modificar-se. — Mas nao o farei. — Temo-me que seu rechaco cheira a hipocrisia, ceu. Ja te hei possuido uma vez. Repetir nao afetaria em nada a sua virtude. — Nao te estou rechacando por uma questao de virtude. — Sua gagueira desapareceu ao recuperar a compostura. — O motivo e outro. — Morro de curiosidade. — Autoprotecao — disse Evie, e se esforcou para olha-lo aos olhos. — Nao tenho nenhum inconveniente em que tenha amantes. E so que nao quero ser uma delas. O ato sexual nao significa

nada para ti, mas sim para mim. Nao quero que me machuque, e acredito que isso seria inevitavel se aceitasse me deitar contigo. Sebastian fervia por dentro. — Nao vou desculpar-me por meu passado. Supoe-se que um homem deve ter experiencia. — Segundo seu historico, adquiriste a de dez homens. — Por que deveria te importar isso? — Porque voce… sua historia romantica, por dize-lo educadamente, e como a do cao que vai a porta traseira das casas para que lhe deem sobras de comida. E eu nao quero ser uma porta mais. E incapaz de ser fiel a uma mulher, ja o demonstraste. — Que nunca o tenha tentado nao implica que nao possa faze-lo, cadela suscetivel. So significa que nao quis faze-lo. Evie ficou tensa. — Agradeceria te que nao dissesse grosserias. — Pareceu-me oportuno, dada a proliferacao de analogias com caninos — espetou Sebastian. — E, por certo, esse nao e exatamente meu caso, porque as mulheres me suplicam e nao ao contrario. — Pois vai com elas. — Fardei-o — disse com crueldade. — Quando voltar a Londres, vou montar uma orgia que nao terminara ate que detenham alguem. Mas enquanto isso, de verdade espera que durmamos juntos esta noite, e amanha de noite, e sejamos tao castos como umas freiras? — Nao me supora nenhum problema — disse Evie com cautela, consciente de que o ofendia gravemente. O olhar incredulo do Sebastian poderia ter perfurado os lencois. Resmungou uma retalia de palavras que ampliaram grandemente a lista de blasfemias que sua esposa conhecia, deixou cair a toalha e se voltou para apagar o abajur. — Nao o prestes atencao — disse ao meter-se na Cama em referencia a sua erecao, consciente de que Evie a olhava intranquila. — A partir de agora, te ter perto afetara a minhas partes intimas tanto como nadar um bom momento em um lago siberiano.

Capitulo 7 O tempo melhorou bastante durante a viagem de volta a Londres, ja que deixou de chover e a temperatura glacial remeteu. Entretanto, essa melhora exterior se via rebatida pela frieza surta entre os recem casados. Embora Sebastian fosse preenchendo a contra gosto o esquenta-pe, ja nao voltou a convidar a Evie a aconchegar entre seus bracos ou a dormir apoiada em seu peito. Ela sabia que era para bem. Quanto mais o conhecia, mais se convencia de que qualquer intimidade entre eles acabaria em desastre. Sebastian era perigoso de formas que ele nem sequer sabia. Tranquilizou-se pensando que, quando chegassem a cidade, separariam-se. Ela ficaria no clube e ele se iria a sua casa e seguiria com suas atividades habituais ate que tivesse noticia da morte de seu sogro. Entao, era provavel que vendesse o clube e usasse o dinheiro obtido para encher as arcas vazias de sua familia. A ideia de vender o Jenner’s, que tinha sido o centro da vida de seu pai, entristeceu a Evie. Entretanto, seria o mais sensato. Poucos homens sabiam dirigir bem um clube de jogo. Seu

proprietario devia ter carisma para atrair clientela e habilidade para faze-la gastar muito dinheiro. E tambem, e obvio, visao empresarial para investir as lucros. Ivo Jenner tinha tido uma quantidade moderada das duas primeiras qualidades, mas nada da terceira. Nos ultimos tempos tinha perdido uma fortuna no Newmarket, ja que na velhice lhe tinha entrado debilidade por quao enganadores povoavam o mundo das carreiras. Por sorte, o clube ganhava tanto dinheiro que pode absorver as quantas perdas. O sarcasmo do Sebastian sobre que o Jenner’s era um clube de segunda nao era do todo falsa. De conversacoes com seu pai, que nao estava acostumado a andar-se pelos ramos, Evie sabia que, embora seu clube tivesse exito, nunca tinha alcancado o nivel desejado. Tinha querido igualar ao Craven’s, o clube rival que se incendiou muitos anos atras. Mas Ivo Jenner jamais tinha alcancado o estilo e a astucia do Derek Craven. Dizia-se que Craven tinha ganho o dinheiro de toda uma geracao de ingleses. O fato de que o Craven’s tivesse desaparecido em pleno apogeu o tinha consolidado como lenda na lembranca coletiva da sociedade britanica. Se o Jenner’s nao se aproximou da gloria do Craven’s nao foi por nao tenta-lo. Ivo Jenner tinha transladado seu clube do Covent Garden ao King Street, no passado uma mera passagem para a popular zona residencial e comercial do St. James mas por entao uma rua normal. Depois de comprar uma grande parte da rua e de derrubar quatro edificios, Jenner construiu um clube amplo e elegante, e anunciou que dispunha dos bancos de jogo maior de Londres. Quando os cavalheiros desejavam jogar forte, foram ao Jenner’s. Evie recordava o clube das vezes em que, de menina, tinham lhe permitido acontecer o dia com seu pai. Tratava-se de um local bem equipado, embora um pouco recarregado, e adorava estar com ele no balcao interior do primeiro piso observando o que ocorria na planta baixa. Com um sorriso indulgente, Jenner acompanhava a sua filha ao St. James Street, onde entravam em qualquer loja que ela quisesse. Foram a perfumaria, a chapelaria, a livraria e a padaria, onde sempre davam de presente a Evie um pao-doce recem assado. Com o passo dos anos, as visitas de Evie ao King Street se foram restringindo. Embora sempre tivesse culpado aos Maybrick disso, agora se dava conta de que seu pai tambem tinha tido parte de culpa. Tinha lhe sido mais facil quere-la quando era uma menina e podia faze-la feliz lancando-a ao ar e apanhando-a com seus bracos musculosos. Quando podia lhe despentear o cabelo ruivo, do mesmo tom que o seu, e lhe aliviar as lagrimas lhe dando um doce ou um xelim. Mas quando se converteu em uma jovem e ja nao pode trata-la como a uma menina, sua relacao se tornou incomoda e distante. — Este clube nao e lugar para ti, bonita — lhe havia dito com um carinho brusco. — Tem que te manter afastada de um tipo ordinario como eu e encontrar um bom frango para te casar com ele. — Papai — tinha suplicado, gaguejando desesperadamente— , nao me MA… mande ai de novo. Me deixe que… ficar contigo, por favor. — Minha pequena gaguinha, seu lugar esta com os Maybrick. E nao te ocorra escapar e voltar aqui porque te enviarei com eles de novo. Suas lagrimas nao tinham servido de nada. Os anos seguintes, as visitas de Evie a seu pai se reduziram a uma cada seis meses. Tanto se era por seu proprio bem como se nao, a sensacao de nao ser querida lhe tinha impregnado fundo. Sentia-se tao incomoda quando estava perto de algum homem, tao segura de que ia aborrecer o que era o que acabava ocorrendo. Sua gagueira piorou; quanto mais se esforcava por pronunciar as palavras, mais incoerentes eram, ate que lhe resultou mais facil guardar silencio e confundir-se com a parede. Converteu-se em uma das solteironas do

baile. Jamais a tinham tirado dancar, jamais a tinham beijado, jamais a tinham cortejado. A unica oferta de matrimonio que tinha recebido era a de seu primo Eustace, feita a contra gosto. Maravilhada por como lhe tinha trocado a sorte, Evie observou a seu marido, que tinha estado calado as duas horas anteriores. Com sua expressao fria e sua boca cinica, nao se parecia absolutamente ao desavergonhado sedutor que tinha compartilhado a Cama com ela fazia dois dias. Voltou-se para o guiche para contemplar a paisagem londrino. Logo estariam no clube. Fazia seis meses que nao via seu pai, e Evie se preparou para encontra-lo muito trocado. A tuberculose era uma enfermidade frequente, e todo mundo conhecia seus estragos. Provocava uma morte lenta da malha pulmonar, acompanhada de febre, tosse, perda de peso e fortes suores de noite. O mal avancava ate que o paciente comecava a expectorar mucosidade e sangue. Quando chegava a morte, o doente e todos seus seres queridos estavam acostumados a agradece-la porque supunha o final de um sofrimento terrivel. Evie nao podia imaginar-se a um homem corpulento como seu pai reduzido a tal estado. Temia ve-lo tanto como ansiava cuida-lo. Entretanto, ante a suspeita de que Sebastian zombaria dela, guardou-se seus pensamentos e sentimentos. Quando a carruagem percorreu St. James e tomou King Street, lhe acelerou o pulso. Por fim pode ver a fachada alta de lava-pes e marmore do Jenner’s, recortada contra os amarelos e vermelhos de um por-do-sol esplendido que brilhava atraves da eterna neblina que cobria Londres. Sem deixar de olhar pelo guiche, Evie soltou um suspiro tenso quando o veiculo passou por um dos muitos becos que levavam da rua principal as quadras e os patios situados depois da fileira de edificios. A carruagem se deteve na entrada traseira, o que era preferivel a entrar pela fachada dianteira. O Jenner’s nao era um lugar que frequentassem as mulheres de bem. Um cavalheiro podia levar a seu amante ou a uma prostituta, mas jamais lhe ocorreria ir com uma dama respeitavel. Evie era consciente de que seu marido a observava com o interesse de um entomologo que estuda uma nova especie de escaravelho. Sem duvida viu sua palidez repentina e seu visivel tremor, mas nao lhe ofereceu nenhuma palavra nem um gesto de consolo. Sebastian baixou o primeiro e ajudou a Evie a apear-se. O beco de atras ainda conservava o mesmo aroma de quando Evie era uma menina: esterco, lixo, alcool e fumaca de carvao. Sem duvida, era a unica jovem de boa educacao de Londres que considerava que cheirava como em casa. Pelo menos, resultava lhe mais agradavel que o ambiente da casa dos Maybrick, com sua fragrancia de tapetes puidos e colonia troca. Evie se dirigiu a porta sentindo os musculos intumescidos depois do comprido tramo final. A entrada da cozinha e demais habitacoes do servico se encontravam mais adiante, mas esta dava a uma escada que conduzia aos aposentos de seu pai. O chofer tinha chamado ja varias vezes a porta com o punho. Apareceu um homem jovem, e Evie se sentiu aliviada ao reconhece-lo. Era Joss Bullard, uma figura muito conhecida no clube, onde tinha trabalhado como cobrador de morosos e encarregado da seguranca. Era corpulento, fornido, moreno e de mandibula quadrada. Dado seu carater aspero, Bullard sempre a tinha tratado com a minima cortesia. Entretanto, Evie tinha ouvido seu pai elogia-lo por sua lealdade, e o apreciava por isso. — Senhor Bullard — disse. — vim a ve… ver meu pai. Deixe-me p… passar, por favor. — O nao a mandou chamar — respondeu com brutalidade o homem, sem mover-se. E, depois de jogar uma olhada a Sebastian e ver sua roupa cara, disse lhe: — Va pela porta principal se for membro do clube, senhor. — Idiota — resmungou Sebastian, mas ela o interrompeu:

— Correio… poderia falar com o senhor Egan? — perguntou. Egan era socio do clube desde fazia dez anos. Era um homem jactancioso e fanfarrao que nao lhe caia muito bem, mas nao se atreveria a lhe negar a entrada ao clube de seu pai. — Nao. — Pois com o senhor Rohan entao. Por favor, lhe diga que a se… senhorita Jenner esta aqui. — Ja lhe disse que… — Va procurar ao Rohan — soltou Sebastian de uma vez que punha o pe contra a porta para impedir que a fechasse. — Esperaremos dentro. Ou quer deixar a minha esposa esperando na rua? Aquilo pareceu sobressaltar ao empregado, que balbuciou algo e desapareceu rapidamente. Sebastian fez cruzar a soleira a Evie e jogou uma olhada a escada. — Subimos? — perguntou. Evie sacudiu a cabeca. — Preferiria falar antes com o senhor Rohan — disse. — Ele podera me dizer algo sobre o estado de minha p… pai. Ao notar sua ligeira gagueira, Sebastian lhe deslizou uma mao sob o cabelo e lhe apertou a nuca com suavidade. Embora sua expressao seguia fria, sua mao era calida e tranquilizadora, e Evie se relaxou sem querer. — Quem e Rohan? — quis saber Sebastian. — O chefe de crupiers. Trabalha aqui desde que era um moco. Meu pai o iniciou na supervisao das mesas. Se o viu alguma vez, seguro que te lembra. Nao e facil esquece-lo. — E o cigano? — perguntou Sebastian detras pensar um instante. — Meio cigano, acredito, por parte de mae. — E a outra metade? — Ninguem sabe. — Dirigiu lhe um olhar cauteloso e acrescentou em voz baixa: — Sempre me perguntei se poderia ser meu meio-irmao. — O perguntaste a seu pai? — Os olhos claros do Sebastian brilhavam de interesse. — Sim, e o negou. — Mas nao a tinha convencido de tudo. Seu pai sempre tinha mostrado uma atitude vagamente paternal com o Cam. E nao era tao ingenua para acreditar que nao tinha tido filhos ilegitimos. Era um homem conhecido por seus apetites carnais e, alem disso, jamais lhe tinham preocupado as consequencias de seus atos. perguntou-se poderia dize-lo mesmo de seu marido. — Sebastian, alguma vez ha…? — perguntou com cautela. — Nao que eu saiba — respondeu sem necessitar mais palavras para entende-la. — Sempre usei borrachas, nao so para evitar a concepcao mas tambem para acautelar as doencas exoticas que sofrem os despreparados. — Borrachas? — repetiu Evie, perplexa. — Como? E o que quer dizer com doencas? Quer dizer que fazer… isso… pode te adoecer? Mas como… — Por Deus — resmungou Sebastian, e lhe pos um dedo sobre os labios para sossegar suas perguntas. — Ja lhe explicarei isso depois. Nao e a classe de coisas que revistam comentar-se na soleira de uma casa. A chegada do Cam Rohan distraiu a Evie. Assim que a viu, Cam esbocou um sorriso e fez uma graciosa reverencia. Em que apesar a que sua atitude e movimentos eram comedidos, projetavam um carisma fisico invisivel. Era com muito o melhor crupier do Jenner’s, embora seu aspecto de pirata pudesse despistar ao principio. Tinha uns trinta anos e o corpo esbelto da juventude. Sua pele morena

e seu comprido cabelo negro delatavam sua origem, por nao falar de seu nome de pilha, que era corrente entre os romanies. Evie sempre tinha gostado daquele jovem de voz suave que, ao longo dos anos, tinha demonstrado uma grande lealdade a seu pai. Cam ia bem vestido, com roupa escura e sapatos limpos, mas, como de costume, necessitava um corte de cabelo e seus espessos cachos lhe caiam sobre o engomado pescoco branco. Varios aneis de ouro lhe adornavam os dedos largos e magros. Evie viu o brilho de um diamante em uma orelha: um toque exotico que lhe favorecia. Cam a observou com seus extraordinarios olhos cor avela, que estavam acostumados a fazer esquecer as pessoas a mente agil que havia atras deles. As vezes seu olhar era tao penetrante que parecia te atravessar, como se olhasse um pouco situado detras de ti. — Gaji — disse Cam em voz baixa, o modo cordial dos romanis de referir-se a uma mulher nao cigana. Tinha um acento estranho, culto mas com matizes de classe baixa, e uma especie de cadencia estrangeira. — Bem-vinda — acrescentou com um breve sorriso deslumbrante. — Seu pai estara encantado de ve-la. — Obrigado, Cam. Tinha mi… medo de que ja houvesse… — Nao — murmurou Cam. — Segue vivo. — Vacilou antes de acrescentar: — A maioria do tempo dorme. Come muito pouco. Nao acredito que dure muito. perguntou por voce. Tentei avisa-la semana passada, mas… — Os Maybrick nao me permitiam vir — sussurrou Evie com a boca tensa de irritacao. Nao se tinham incomodado em lhe comentar que seu pai a tinha mandado chamar. — Bu… bom, ja me afastei que eles para sempre, Cam. Casei-me. E ficar aqui ate que meu pai… ja nao me NE… necessite. O olhar do Cam se desviou para o Sebastian. — Lorde St. Vincent… — murmurou ao reconhece-lo. Se se formou alguma opiniao sobre o enlace de Evie com aquele nobre, nao a revelou. — Esta acordado meu pai? — perguntou Evie. — Posso subir a ve-lo? — E obvio. — O cigano tomou as maos com suavidade. — Me assegurarei de que ninguem os incomode. — Obrigado. De repente, Sebastian tomou uma mao de Evie e a apoiou com decisao em seu braco. Embora o fizesse com indiferenca, a pressao que exerceu com os dedos impediu que ela se soltasse. Evie franziu o cenho, perplexa ante essa demonstracao de posse. — Conheco o Cam desde que era uma menina — comentou arqueando as sobrancelhas. — Sempre foi amavel comigo. — A um marido gosta que sejam amaveis com sua esposa — respondeu Sebastian com frieza. — dentro de certos limites, claro. — Claro — corroborou Cam em voz baixa. E a Evie : — A acompanho acima, milady? — Nao; conheco o Caminho — respondeu Evie de uma vez que sacudia a cabeca. — Se… segue com o que estava fazendo, por favor. Cam fez outra reverencia e intercambiou um olhar rapido com o Evie, com a que ambos expressaram tacitamente que ja encontrariam uma ocasiao para falar depois. — Cai-te mal porque e romani? — perguntou Evie a seu marido enquanto subiam a escada. — Nao esta acostumado a cair mal a gente por coisas que nao pode mudar — respondeu ironicamente Sebastian. — Normalmente me dao motivos suficientes para cair mal por outras causas. Evie separou a mao de seu braco para recolhe-la saia.

— Eu gostaria de saber onde esta o factotum — acrescentou Sebastian, e lhe pos uma mao na cintura enquanto subiam a escada. — E primeira hora da noite. A sala de jogos e o sala de jantar estao abertos. Deveria estar ocupado. — E um bebedor — comentou Evie. — Isso explica muitas coisas sobre a forma em que esta dirigido o clube. Suscetivel a qualquer insulto ao clube de seu pai, e consciente da pressao suave da mao de seu marido nas costas, Evie teve que morde-la lingua para conter uma resposta mordaz. Que facil era para um nobre mimada criticar a forma como os profissionais faziam as coisas. Se ela tivesse que dirigir um local como esse, Deus nao o quisesse, respeitaria muito mais o que seu pai tinha conseguido. No primeiro piso percorreram uma galeria que rodeava toda a planta. Bastava aparecendo a balaustrada para ver toda a planta baixa. Esta, a area maior do clube, estava dedicada por completo ao jogo de azar. Tres mesas ovais cobertas com toalhas de mesa verdes com marcas amarelas estavam rodeadas por dezenas de homens. Os sons que se elevavam delas (o ruido dos jogo de dados, as exclamacoes baixas mas intensas dos atiradores e os crupiers, o deslizamento suave das raquetes quando aproximavam o dinheiro da mesa ao crupier figuravam entre as primeiras lembrancas de infancia de Evie. A jovem dirigiu um olhar ao magnifico escritorio esculpido do canto, onde seu pai estava acostumado a sentar-se para conceder creditos, aceitar membros temporarios e elevar os bancos se as apostas aumentavam muito. Nesse momento, ocupava-o um homem ao que nao conhecia, com bastante ma pinta. Os olhos de Evie se dirigiram para o canto oposto, onde outro desconhecido fazia as vezes de supervisor geral, regulando os pagamentos e controlando o jogo. Sebastian apareceu a balaustrada para contemplar a planta baixa. Como tinha pressa por ver seu pai, Evie lhe puxou com impaciencia do braco. Mas ele nao se moveu. De fato, logo que pareceu darse conta, tao absorto estava em sua contemplacao. — O que acontece? — perguntou Evie. — Viu algo estranho? Sebastian meneou a cabeca e deixou de emprestar atencao a planta baixa. Jogou uma olhada ao redor e viu os paineis descoloridos da parede, as molduras desprendidas, os tapetes puidos. Tempo atras o Jenner’s tinha estado decorado magnificamente, mas com os anos tinha perdido grande parte de seu esplendor. — Quantos membros tem o clube? — perguntou. — Sem contar os temporais. — Estava acostumado a ter uns dois mil. Nao sei as cifras atuais. — Voltou a lhe atirar do braco. — Quero ver meu pai. Se tiver que ir sozinha… — Voce nao vai sozinha a nenhuma parte — replicou Sebastian, e a olhou com uma penetracao que a sobressaltou. — Algum bebado, ou inclusive algum empregado, poderia te colocar em uma das habitacoes para casais e te violar antes de que ninguem reparasse em sua ausencia. — Nao corro nenhum perigo — replicou irritada. — Conheco muitos dos empregados, e sei me mover pelo clube muito melhor que voce.

— Nao por muito tempo — murmurou Sebastian, e seu olhar voltou de uma forma quase compulsiva a planta baixa. — Penso percorrer ate o ultimo centimetro deste lugar e conhecer todos seus segredos. Evie o olhou perplexa. Seu marido tinha experiente uma mudanca sutil desde que tinham entrado no clube. Sua frouxidao habitual se transformou em uma atitude de alerta, como se estivesse absorvendo a energia inquieta do ambiente. — Miras o clube como se nunca o tivesse visto — murmurou. Sebastian passou um dedo pelo corrimao, olhou o po que ficou aderido e o sacudiu. Respondeu com expressao pensativa: — Ve-se diferente agora que e meu. — Ainda nao o e — replicou Evie, ao dar-se conta de que estava valorando o local para sua venda futura. Era muito proprio dele pensar no dinheiro enquanto seu sogro jazia em seu leito de morte. — Pensa alguma vez em alguem alem de ti? A pergunta pareceu atingir seu interior, e sua cara se voltou inescrutavel. — Estranha vez, meu amor. Ficaram olhando-se. Os olhos dela eram acusadores; os dele, impenetraveis. Evie compreendeu que nao podia esperar nada decente daquele homem sou pena de experimentar uma decepcao atras de outra. Com amabilidade e compreensao nao corrigiria sua alma perdida. Sebastian nunca seria um dos libertinos reformados que apareciam nas escandalosas novelas de Daisy Bowman. — Espero que obtenha logo o que quer — disse com frieza. — Enquanto isso, vou a quarto de meu pai. Avancou pela galeria sem ele, mas aos poucos passos o tinha a seu lado. Quando chegaram aos aposentos do Ivo Jenner, Evie sentiu um enorme desassossego. Sentia tanto medo e desejo de uma vez que lhe suavam as maos e notava uma estranha sensacao no estomago. Ao sujeitar o pomo para abrir a porta, a palma lhe escorregou pelo metal deslustrado. — Permite — disse Sebastian com brutalidade de uma vez que lhe apartava a mao do pomo. Abriu a porta, segurou-a para que passasse e entrou atras dela em uma escura sala. A unica luz procedia da porta aberta do dormitorio, onde um abajur pequeno emitia um brilho regular. Evie cruzo a seguinte soleira e se deteve, piscando ate que seus olhos se adaptaram a penumbra. Aproximou-se da Cama, apenas consciente da presenca do homem que tinha a seu lado. Seu pai dormia com a boca meio aberta. Tinha a pele palida e com um brilho estranho, como se fora uma figura de cera. Umas rugas marcadas lhe sulcavam o rosto. Parecia haver-se encolhido na metade, com os bracos incrivelmente magros. Evie se esforcou por conciliar aquela silhueta desconhecida, com o pai corpulento e fornido que tinha conhecido sempre. Ao ver como seu cabelo, antes ruivo, estava salpicado de cas que recordavam a plumagem arrepiadas de um frango, assaltou-a uma infinita ternura. A quarto cheirava a fechamento, enfermidade, velas queimadas e remedios. Cheirava a uma morte proxima. Viu um montao de lencois sujos no canto e lencos manchados de sangre no chao. A mesinha de noite estava cheia de colheres sujas e frascos de medicamento. Evie se agachou para recolher um lenco do chao, mas Sebastian a agarrou pelo braco. — Nao tem que fazer isso — resmungou. — Pode encarregar uma criada. — Sim — sussurrou Evie com amargura. — Ja vejo quao bem o fazem. — soltou-se dele, recolheu os lencos sujos e os deixou cair sobre o montao de lencois desprezados.

Sebastian se aproximou da mesinha de noite e contemplou o corpo consumido do Jenner. Tomou um frasco de medicamento e o passou pelo nariz. — Morfina — murmurou. Por alguma razao, ve-lo junto a seu pai necessitado e examinando seus remedios irritou a Evie. — Tenho-o tudo controlado — disse em voz baixa. — Te agradeceria que fosse. — O que pensa fazer? — vou arrumar a quarto e muda os lencois. E depois sentarei a seu lado. — Deixa dormir a este pobre diabo — disse ele com os olhos entreabertos. — Tem que comer e te muda de roupa. Do que acredite que lhe servira que se sente na penumbra e…? — deteve-se e resmungou uma maldicao ao ver sua expressao teimosa. — Muito bem. Darei-te uma hora, depois comera comigo. — Penso ficar com meu pai — replicou ela com propriedade. — Evie. — Sua voz baixa continha uma advertencia inflexivel. Aproximou-se dela, fez lhe da-la volta e a sacudiu brandamente para que o olhasse aos olhos. — Mandarei chamar e vira. Entendesteo? Ela tremeu de raiva. Dava lhe ordens como se fora propriedade dele. Por Deus, passou-se toda a vida obedecendo as ordens de seus tios, e agora teria que submeter-se a um marido insofrivel. Entretanto, reconheceu que Sebastian ainda tinha longo caminho que percorrer para igualar o empenho dou os Maybrick e os Stubbins em lhe amargurar a vida. E nao cabia considera-lo irracionavel ou cruel por lhe pedir que comesse com ele. Assim que se tragou a raiva e assentiu. Quando Sebastian lhe repassou os rasgos tensos com o olhar, seus olhos possuiam um brilho estranho, como as faiscas que saltam do martelo do ferreiro ao golpear uma lamina de metal candente. — Assim que eu gosto — murmurou com um sorriso zombador, e se foi.

Capitulo 8 Sebastian esteve tentado de deixar a Evie no clube com seu pai e ir-se a sua casa, situada a pouca distancia do St. James. Era dificil resistir ao estimulo de sua tranquila e confortavel residencia. Queria comer em sua propria mesa, e relaxar-se diante da chamine com uma de suas batas de seda forradas de veludo. Ao corno com a teimosa de sua esposa; que tomasse suas proprias decisoes e aprendesse a viver com as consequencias. Entretanto, enquanto perambulava pela galeria do primeiro piso, com cuidado de que nao o vissem da planta baixa, sentiu uma curiosidade molesta, como quando se tem uma pedra no sapato. Situou-se junto a uma coluna para observar o trabalho dos crupiers e o do supervisor geral para, desde seu canto, controlar o jogo e obter que tudo seguisse o ritmo adequado. A atividade nas tres mesas de jogo parecia um pouco lenta. Faltava alguem que animasse as coisas e criasse um ambiente que incitasse aos clientes a jogar mais e mais depressa. Desalinhadas prostitutas da casa se passeavam devagar pela sala e se detinham aqui e la para enrolar aos clientes. Ao igual as comidas do aparador lateral e o bar, as mulheres eram uma opcao gratuita para os socios. Se um homem necessitava uma mulher para consolar-se ou para celebrar, subia com uma

prostituta a uma das habitacoes do piso de cima. Sebastian observou com atencao as mesas de jogo e o bar. Havia indicios de que era um negocio em decadencia. Sebastian supos que, ao cair doente, Jenner nao tinha renomado a um substituto digno de confianca, salvo seu factotum Clive Egan, que era inepto, desonesto ou ambas as coisas de uma vez. Sebastian queria ver os livros contaveis, os ganhos e gastos, os dados financeiros dos socios, as listas de pagamentos, as dividas, os emprestimos, os creditos…, tudo o que contribuira a completar um retrato da situacao economica do clube. Ao voltar-se para a escada, viu o cigano Rohan na penumbra de um canto. Sebastian ficou calado para obriga-lo a falar primeiro. Rohan o fez com educacao e sem desviar o olhar. — Posso ajuda-lo, Milorde? — Pode comecar por me dizer onde esta Egan. — Em sua quarto. — Em que estado? — Indisposto. — Sei. Indispoe-se frequentemente? O cigano nao disse nada, mas seus olhos azeviche se encheram de receio. — Quero a chave de seu escritorio — pediu Sebastian. — Darei uma olhada aos livros contaveis. — So ha uma chave, Milorde — repos Rohan, escrutinando-o com curiosidade. — E a tem o senhor Egan. — consiga-me isso O outro arqueou as sobrancelhas. — Quer que roube a um homem que esta bebado? — Sera mais facil que se estivesse sobrio — comentou Sebastian com ironia. — E nao e nenhum roubo, ja que a chave, a todos os efeitos, e minha. — Eu sou leal ao senhor Jenner. E a sua filha. — Sua expressao se endureceu. — Eu tambem. — Nao era certo, e obvio. Sebastian era leal basicamente a si mesmo. Evie e seu pai figuravam num longinquo segundo e terceiro lugar da lista. — Traga-me a chave, ou prepare-se a seguir os passos do Egan quando se for amanha. O ar estava carregado de desafio masculino. Entretanto, passado um instante, Rohan lhe dirigiu um olhar de aversao e curiosidade. Quando se dirigiu para a escada a pernadas rapidas, nao foi por obediencia, mas sim mas bem pelo desejo de averiguar o que se propunha Sebastian. Quando Sebastian mandou ao Cam Rohan para que acompanhasse a sua esposa a planta baixa, Evie ja tinha arrumado a quarto de seu pai e chamado a uma criada para que a ajudasse a muda os lencois. Os que havia estavam umidas de suor. Embora seu pai se moveu e resmungou quando o giraram com cuidado a um e outro lado, nao despertou do torpor induzido pela morfina. Assustou-a comprovar o pouco que pesava seu ossudo corpo, talher por uma Camisa de dormir. Quando o tampou com os lencois e mantas podas ate o peito sentiu uma grande compaixao por ele. Molhou um pano frio e o pos na fronte. Seu pai suspirou e, por fim, abriu uns olhos que pareciam frestas entre os sulcos da cara. Olhou-a sem reconhece-la um comprido instante ate que seus labios secos esbocaram um sorriso que deixou ao descoberto uns dentes amarelados pelo tabaco. — Evie — disse com voz rouca. Ela se agachou sorridente embora com muita dificuldade conseguiu conter as lagrimas. — Estou aqui, papai — sussurrou por fim as palavras que tinha desejado pronunciar toda sua

vida. — Estou aqui para ficar contigo. Seu pai emitiu um som de satisfacao e fechou os olhos. — Onde quer que vamos primeiro, princesa? — soltou justo quando Evie acreditava que se dormiu. — Suponho que a padaria, verdade? — Claro — respondeu ela e, depois de seca-las lagrimas dos olhos, acrescentou: — quero um sonho, e um pacote de bolachas, e depois quero jogar ao jogo de dados contigo. Seu pai riu entre dentes e tossiu um pouco. — Deixa que papai de uma cabecadinha antes de sair. Seja uma menina boa. — Sim, dorme — murmurou Evie de uma vez que lhe dava a volta ao pano da fronte. — Posso esperar, papai. Enquanto observava como voltava a dormir, tragou saliva e se relaxou na cadeira, situada junto a Cama. Nao desejaria estar em nenhum outro lugar. Se ajeitou no assento e baixou os ombros como se fora uma boneco ao que tivessem solto os fios. Era a primeira vez que se sentia necessitada, que sua presenca parecia lhe importar a alguem. E, embora o estado de seu pai a afligia, dava obrigado por poder acompanha-lo em suas ultimas horas de vida. Nao disporia de tempo para conhece-lo, de modo que sempre seriam uns desconhecidos, mas estar ali a compensava de sobra. Um golpezinho na porta interrompeu seus pensamentos. Elevou os olhos e viu o Cam na soleira, cruzado de bracos e em postura relaxada. Evie lhe dirigiu a imitacao de um sorriso. — Seu… suponho que te envia para me buscar. — Nao fazia falta dizer a quem se referia, claro. — Quer que coma com ele num das sala de jantar privadas. Evie sacudiu a cabeca e seu sorriso se voltou ironica. — Seus desejos sao ordens para mim. — Parodiou a uma esposa obediente. Levantou-se e alisou as mantas sobre os ombros de seu pai. Cam nao se moveu da soleira quando ela se aproximou. Era um homem alto, embora nao tanto como Sebastian. — Como terminou casada com lorde St. Vincent? — quis saber. — Sei que tem problemas financeiros porque estivemos a ponto de lhe negar credito a ultima vez que esteve aqui. Propos um matrimonio de conveniencia? — Como sabe que nao estamos casados por amor? — replicou Evie. — St. Vincent so se quer a ele mesmo — disse Cam com um olhar ironico. Evie teve que esforcar-se por conter um sorriso. — Em realidade fui ver o eu. Foi o unico mo… modo que me ocorreu para escapar dos Maybrick. — Seu sorriso se desvaneceu ao pensar em seus familiares. — Vieram aqui em minha busca? — Seus dois tios — assentiu Cam. — Tivemos que lhes deixar registrar o clube para que se convencessem de que nao te escondia aqui. — Pombas! — exclamou Evie, tomando emprestada o palavrao favorito de Daisy Bowman. — Seguro que depois foram a casa dos Hunt e os Bowman. A noticia de meu desaparecimento tera preocupado as minhas amigas. Entretanto, saber o que tinha feito ia preocupar as muito mais. Teria que avisar a Annabelle e Daisy de que se encontrava bem. Lillian estava de viaje pelo continente, assim nao se teria informado de seu desaparecimento.

Amanha, pensou. Sim, amanha plantaria cara as repercussoes de sua infame fuga. Exposse enviar a alguem a casa dos Maybrick a recolher o resto de sua roupa, mas certamente nao lhe permitiriam ficar a Uma coisa mais para a larga lista de coisas por fazer: encarregar em seguida alguns vestidos e sapatos. — Quando meus familiares descubram que estou aqui — disse— , ve… virao a me buscar. Pode que tentem anular meu matrimonio. Me… — uma breve pausa para controlar a voz— me da muito medo o que possa me passar se me obrigarem a voltar com eles. — Nao o impedira St. Vincent? — perguntou Cam, e lhe pos uma mao no ombro para tranquilizala. Foi um contato leve, com a palma apoiada na fragil curva do ombro, mas a acalmou. — Se estiver aqui. Se estiver sobrio. Se pode — respondeu com um sorriso forcado. — Se, se, se.. — Eu estarei aqui— murmurou Cam. — Estarei sobrio e poderei impedi-lo. por que acredite que St. Vincent nao? — E um matrimonio de conveniencia. Nao lhe importo absolutamente. Nao espero ve-lo muito uma vez receba meu dote. Disseme que tem coisas melhores que fazer que sentar-se num clube de jogo de segunda a esperar a que… a que… — Titubeou e voltou a cabeca para olhar a seu pai na Cama. — Pode que tenha trocado de parecer com o respeito — comentou Cam com ironia. — Quando lhe dava a chave do escritorio, tirou todos os livros e comecou a revisa-los pagina por pagina. Daqui a que termine, tera examinado todo o clube com lupa. Evie sentiu saudades. — O que pode estar procurando? — perguntou. Sebastian estava atuando de uma forma estranha. Nao havia razao para que revisasse os livros do clube com tanta urgencia depois de uma viagem extenuante. Nada teria trocado entre esse dia e o seguinte. Pensou no olhar compulsivo de seu marido quando observava a atividade da planta baixa, e em suas palavras: Penso percorrer ate o ultimo centimetro deste lugar e conhecer todos seus segredos. Como se fora algo mais que um edificio cheio de tapetes puidos e mesas de jogo. Desconcertada, Evie seguiu ao Cam pela serie de corredores e Caminhos que constituiam a rota mais direta a sala de jantar da planta inferior. Como a maioria de clubes de jogo, o Jenner’s tinha lugares secretos onde esconder-se, onde observar, onde passar desapercebida pessoas e objetos. Cam a conduziu ate um pequeno salao privado, sustentou lhe a porta e fez uma reverencia quando ela se voltou para lhe dar as obrigado. Ao entrar no quarto, Evie ouviu a porta fechar-se brandamente atras dela. Sebastian, ajeitado em uma cadeira com a confianca relaxada de Lucifer em seu trono, estava fazendo notas a lapis na margem de um livro contavel. Estava sentado ante uma mesa meio cheia de fontes e pratos para o sala de jantar principal. Apartou o olhar do livro, deixou-o a um lado e se levantou para apartar uma cadeira da mesa. — Como esta seu pai? — despertou um momento — respondeu Evie com cautela enquanto se sentava. — Pareceu acreditar que eu era pequena de novo. Viu uma fonte com cortes de ave assada e outra com pessegos e uvas de estufa, e comecou a servir-se. A fome imperiosa, unida a fadiga, fazia que lhe tremessem as maos. Sebastian observou suas dificuldades e, sem dizer nada, serve lhe aprimoramentos num prato: ovos de codorna fervidos, nata de verduras, fatias de queijo, cortes de carne fria, pescado e pao.

Logo lhe encheu uma taca de vinho. — Obrigado — disse Evie, tao cansada que logo que sabia o que estava comendo. Levou o garfo a boca e fechou os olhos enquanto mastigava e tragava o bocado. Quando voltou a abri-los, viu que Sebastian a olhava. Parecia tao cansado como ela, com umas ligeiras olheiras. Tinha as macas do rosto tensas e estava palido. A barba, que tendia a lhe crescer depressa, estava dourada nas bochechas. De algum modo, o endurecimento de seus rasgos acrescentava seu atrativo ao conferir uma graca irregular ao que, de outro modo, poderia ter sido a perfeicao esteril de uma obra professora de marmore. — Segue pensando ficar aqui? — perguntou enquanto cortava com habilidade um pessego e lhe tirava o osso. Passou lhe uma metade limpa. — Claro que sim. — Evie agarrou o pessego e, ao morde-lo, notou como lhe deslizava o suco pela lingua. — Me temia — respondeu isso ele com secura. — E um engano, sabe? Nao tem ideia do que te espera, as obscenidades e comentarios lascivos, olhadas luxuriosas, roce-os e beliscoes… — Me arrumarei — disse isso Evie, e o olhou sem saber se franzir o cenho ou sorrir. — Estou seguro disso, carinho. — O que ha nesse livro? — perguntou ela detras observa-lo enquanto bebia um sorvo de vinho. — Um exemplo de contabilidade criativa. Egan esteve desfalcando dinheiro. Retoca um pouco as cifras aqui e la para que nao se note. Mas, com o passar do tempo, a soma sobe a uma importancia consideravel. Vai ou seja quantos anos leva fazendo-o. ate agora, todos os livros contaveis que revisei contem enganos deliberados. — Como pode estar seguro de que sao deliberados? — Seguem um patrao evidente. — Abriu um livro e o empurrou brandamente por volta dela. — O clube obteve uns beneficios de vinte mil libras o ano passado. Se comparar as cifras com o registro de emprestimos, ganhos bancarios e saidas de caixa, vera as discrepancias. Evie leu as notas que ele tinha feito na margem segundo ia assinalando com o dedo. — Ve? — murmurou. — Estas sao as quantidades que deveriam aparecer. Inflou muito os gastos. O custo dos jogos de dados de marfim, por exemplo. Inclusive se admitirmos que os jogos de dados so se usassem uma noite, o cargo anual nao deveria superar as duas mil libras, segundo Rohan. — Mas aqui poe que se gastaram quase tres mil libras em jogo de dados. — Exato. — Sebastian se recostou na cadeira e sorriu devagar. — Enganava a meu pai do mesmo modo quando era jovem e eu necessitava mais dinheiro do que ele me dava. — Para que o necessitava? — Temo-me que, para lhe explicar isso teria que usar palavras que lhe ofenderiam muito — assegurou ainda sorridente. Evie cravou um ovo de codorna com o garfo e o levou a boca. — O que vamos fazer com o senhor Egan? — Despedi-lo assim que esteja o bastante sobrio para andar — disse Sebastian de uma vez que se encolhia de ombros. Evie se apartou uma mecha que lhe caia sobre a bochecha. — Mas nao tem substituto. — Sim que o tem. Ate que nao se encontre o diretor adequado, eu dirigirei o clube. O ovo de codorna pareceu atravessar-se o no pescoco e Evie se engasgou. Agarrou a taca de vinho, bebeu um sorvo, respirou fundo e logo o olhou com olhos exagerados. Como podia dizer algo

tao absurdo? — Nao pode fazer isso. — Nao o farei pior que Egan. Nao dirigiu nada ha meses. Em pouco tempo o clube se vira abaixo. — Disse que detestava trabalhar! — E certo. Mas me parece que deveria tenta-lo ao menos uma vez, para me assegurar. — Fara as vezes de dava… diretor uns dias e lhe… cansara-te. — Gaguejava de ansiedade. — Nao posso me permitir o cansaco, meu amor. Embora o clube segue sendo rentavel, seu valor vai a baixa. Seu pai tem uma importante divida pendente de cancelar. Se seus devedores nao podem pagar em dinheiro, teremos que ficar propriedades, joias, obras de arte, o que seja. Como conheco o valor das coisas, posso negociar umas liquidacoes aceitaveis. E ha outros problemas que ainda nao mencionei. Seu pai possui uns desafortunados pura sangue que lhe tem feito perder uma fortuna no Newmarket. E tem feito algumas investimentos insensatos, como as dez mil libras que pos em uma suposta mina de ouro do Flintshire, um fraude que ate um menino teria detectado. — meu deus — murmurou Evie e se esfregou a fronte. — Estava doente e a gente se aproveitou dele. — Assim e. E agora, embora queriamos vender o clube, nao poderiamos faze-lo sem po-lo antes em ordem. Se houvesse uma alternativa, a encontraria, me acredite. Mas o clube e uma peneira, e ninguem pode ou quer lhe tampar os buracos. Salvo eu. — O que sabera voce de tampar buracos! — exclamou ela, horrorizada por sua arrogancia. Sebastian sorriu com uma sobrancelha arqueada, mas antes de que respondesse com mordacidade, ela se tampou os ouvidos com as maos e acrescentou: — OH, nao diga! — Ele conteve sua replica, embora seus olhos seguiam despedindo um brilho diabolico, e ela baixou as maos com cautela. — Se dirigir o clube, onde dormira? — Aqui, e obvio — disse ele. — Mas eu me instalei no unico quarto de hospedes disponivel. Outros estao ocupados. E nao penso compartilhar a Cama contigo. — Amanha havera muitas habitacoes livres. Vou me desfazer das prostitutas da casa. As coisas estavam trocando muito depressa para que Evie pudesse as assimilar. O encargo de autoridade do Sebastian sobre o negocio de seu pai se produziu a uma velocidade alarmante. Tinha a sensacao de ter levado um gato manso ao clube para ve-lo transformar-se num tigre selvagem. E ela so poderia observar impotente como fazia uma matanca indiscriminada. Desesperada-se, pensou que se o agradava uns dias possivelmente se aborreceria. Enquanto isso, devia tentar reduzir ao maximo os danos. — Jogara as prostitutas da ca… casa a rua? — perguntou com uma calma forcada. — Irao-se com uma liquidacao generosa, como recompensa por sua lealdade ao clube. — Quer contratar outras? — Nao e que tenha nada contra a prostituicao. De fato, estou totalmente a favor dela. Mas que me crucifiquem se me converto num cafetao. — No que? — Em um cafetao. Um patrocinador. Um alcoviteiro. Caramba, levava algodao nas orelhas quando foi pequena? Alguma vez ouviu nada, nem te perguntou por que umas mulheres de roupas coloridas subiam e desciam pela escada do clube a todas as horas? — Sempre vinha de dia — esclareceu Evie, muito digna. — Estranha vez as via trabalhar. E depois, quando era o bastante maior para entende-lo, minhas visitas se espacaram bastante por

desejo de meu pai. — Pode que fora uma das poucas coisas boas que fez por ti. — Sebastian moveu a mao com impaciencia para descartar o tema. — Bem, respeito ao assunto que nos ocupa, nao so nao quero ter prostitutas mediocres, mas tambem tampouco temos espaco para as alojar. As vezes, quando todas as Camas estao ocupadas, os membros do clube se veem obrigados a gozar de seus favores nas quadras. — Seriamente? Diz-o a serio? — E as quadras sao muito incomodas, ha muita corrente. Asseguro lhe isso. — Voce…? — Mas ha um bordel excelente duas ruas mais abaixo. Espero que possamos chegar a um acordo com sua proprietaria, madame Bradshaw. Quando um membro de nosso clube deseje companhia feminina, podera ir ao local do Bradshaw, receber seus servicos com um desconto no preco e voltar uma vez aliviado. — Parecia esperar que sua esposa elogiasse a ideia. — O que te parece? — Parece-me que tem alma de alcoviteiro. So que as escondidas. — A moralidade e so para a classe media, encanto. A classe baixa nao pode permitir lhe e a classe alta tem muito tempo livre para preencher. Evie sacudiu devagar a cabeca. Observava-o com os olhos exagerados, e nem sequer se moveu quando se inclinou para ela para lhe por uma uva entre os labios. — Nao faz falta que diga nada — murmurou com um sorriso. — E evidente que emudeceste que gratidao diante da perspectiva de me ter aqui para te cuidar. Evie franziu o cenho e ele sorriu malicioso. — Se o que se preocupa e que num momento de debilidade, presa de ardor viril, possa me equilibrar sobre ti… e possivel. Evie segurou a uva entre os dentes e lhe tirou as sementes com os dentes e a lingua. O sorriso do Sebastian se desvaneceu um pouco. — Mas tranquila, de momento e muito novata para valer a pena— acrescentou detras recostar-se na cadeira. — Possivelmente te seduza no futuro, depois de que alguns homens se encarregaram de te educar. — Duvido-o — replicou Evie com rudeza. — Nunca seria tao burguesa para me deitar com meu marido. Sebastian soltou uma gargalhada. — meu deus! Certamente morria por dize-lo. Felicidades. Nao temos casados nenhuma semana e ja aprendeste a mostrar as unhas.

Capitulo 9 Evie nunca soube onde tinha dormido seu marido a primeira noite, mas suspeitava que em algum lugar comodo. Seu proprio descanso tinha distado muito de ser aprazivel, ja que a preocupacao a tinha despertado com uma regularidade metodica. Tinha ido varias vezes a ver como estava seu pai, tinha lhe dado sorvos de agua, arrumado os lencois, administrado medicina quando a tosse lhe piorava. Cada vez que despertava, Jenner olhava a sua filha com renovada surpresa. Estou sonhando, bonita? perguntava lhe, e lhe respondia com palavras carinhosas e lhe acariciava a cabeca. Com os primeiros raios de sol, Evie se lavou, vestiu-se e se fez uma tranca que se recolheu num coque na nuca. Chamou uma criada e lhe pediu ovos escaldados, caldo, cha e toda a comida especial

para um doente que pudesse tentar o apetite de seu pai. As manhas eram tranquilas e silenciosas no clube, ja que a maioria de empregados dormia depois de ter trabalhado ate altas horas da madrugada. Entretanto, sempre havia um pessoal minimo para as tarefas ligeiras. Quando nao estava o cozinheiro, ficava um crave na cozinha para preparar comidas singelas a quem as solicitasse, Ouviu a tosse aspera de seu pai. Correu ate sua quarto e o encontrou tossindo espasmodicamente num lenco. As convulsoes angustiosas de seu peito lhe doeram como se fossem proprias. Rebuscou entre os frascos da mesinha de noite o xarope de morfina e o verteu em uma colher. Ao passar um braco pela nuca suada de seu pai para incorpora-lo, voltou a surpreende-la o pouco que pesava, e notou como o corpo lhe esticava para tentar conter outro acesso de tosse. Os estremecimentos posteriores lhe sacudiram a colher e a medicina caiu sobre os lencois. — Desculpa — murmurou Evie, e secou o xarope pegajoso antes de voltar a encher a colher. — Vamos, papai, pouco a pouco. O pescoco venoso de seu pai se moveu ao tragar a medicina, Depois, arrumou lhe os travesseiros enquanto ele tossia um pouco mais. Evie o recostou e lhe pos um lenco limpo na mao. Contemplou sua cara descarnada e sua barba grisalha em busca de algum signo de seu pai naquela figura irreconhecivel. Sempre tinha sido robusto e corado, incapaz de manter uma conversacao sem o uso expressivo das maos com gestos proprios de um ex-boxeador. Agora era a sombra palida desse homem, com a cutis cinzenta e fofa devido a perda rapida de peso. Entretanto, os olhos azuis eram os mesmos: redondos e escuros, do tom do mar da Irlanda. A familiaridade desses olhos a tranquilizou. — pedi o cafe da manha — murmurou sorrindo. — Em seguida o trarao. Jenner meneou a cabeca para indicar que nao tinha fome. — OH, sim— insistiu sua filha, meio sentada na Cama. — Tem que comer algo, papai. Secou lhe uma gota de sangue da comissura dos labios com um lenco. Seu pai franziu o cenho. — Os Maybrick — disse com voz aspera. — Virao a te buscar, Evie? — Deixei-os para sempre — respondeu ela com satisfacao. — Faz uns dias me fugi para a ca… me casar em Gretna Green. Ja nao tem nenhum poder sobre mim. — Com quem? — Com lorde St. Vincent. Bateram na porta e entrou a criada com uma bandeja carregada de pratos. Evie se levantou para ajuda-la e retirou algumas coisas da mesinha de noite. Viu como seu pai fugia o aroma da comida, apesar do insipida que era, e o compadeceu. — Sinto muito, papai, mas tem que tomar um pouco de caldo. Po lhe um guardanapo sobre o peito e lhe aproximou a tigela quente aos labios. Depois de tomar uns sorvos, seu pai se recostou nos travesseiros e a observou enquanto lhe secava a boca, a espera de uma explicacao. Evie sorriu com tristeza. Tinha-o pensado: nao havia nenhuma necessidade de fingir um romance. Seu pai era um homem pratico, e e provavel que nunca tivesse esperado que sua filha se casasse por amor. Desde seu ponto de vista, tinha que tomar a vida como vinha e fazer o que fora necessario para sobreviver. Se encontrava algo de agradar pelo Caminho, devia aproveita-lo, e nao te queixar depois quando tivesse que pagar o preco por have-lo feito. — Quase ninguem sabe ainda — comecou. — De fato, nao e umas mas casamentos. Levamo-nos

bastante bem e nao me faco ilusoes respeito a ele. Jenner abriu a boca para que sua filha lhe desse uma colherada de ovos escaldados. Ponderou a informacao, tragou a comida e aventurou: — Seu pai, o duque, e um bobo de pedra que nao sabe fazer nadica de nada. — Lorde St. Vincent, em troca, e bastante inteligente. — Um tipo frio — observou Jenner. — Sim, mas nao sempre. Quer dizer… — deteve-se de repente, ruborizada ao recordar a Sebastian na Cama lhe fazendo o amor. — E um mulherengo — comentou Jenner com simplicidade. — Isso nao me importa — respondeu sua filha com igual franqueza. — Jamais esperaria que me fora fiel. Consegui o que queria do matrimonio. Quanto ao que ele quer… — Sim, tera seu dote — disse seu pai, antecipando-se. — Onde esta agora? — Seguro que ainda dormindo. — Deu lhe outra colherada de ovos escaldados. A criada a corrigiu: — Perdoe, mas nao esta dormindo, senhorita… quero dizer, milady. Lorde St. Vincent despertou ao senhor Rohan a alvorada e o esta levando acima e abaixo lhe fazendo perguntas e lhe dando listas. O senhor Rohan esta furioso. — Lorde St. Vincent esta acostumado a transtornar assim as pessoas — comentou Evie com secura. — Listas do que? — quis saber Jenner. Evie nao se atreveu a lhe dizer que Sebastian pretendia misturar-se na direcao do clube. Era muito provavel que isso alterasse a seu pai. Podia encaixar com naturalidade o matrimonio sem amor de sua filha, mas algo que afetasse a seu negocio o preocuparia muito. — OH, acredito que quer muda algumas cortinas — comentou vagamente. — E lhe ocorreu melhorar o menu do aparador. Essa classe de coisas. — Mmm… — Jenner franziu o cenho. — Diga que nao toque nada sem que Egan lhe de permissao. — Sim, papai — disse enquanto lhe aproximava a tigela de caldo a boca. Evie dirigiu um olhar dissimulado a criada e entreabriu os olhos para lhe advertir que fechasse o pico. A moca assentiu com a cabeca. — Ao falar nao te entope tanto como antes — observou Jenner. — Como e isso, princesa? Evie era consciente de que sua gagueira tinha melhorado a ultima semana. — Nao estou segura. Possivelmente me haver afastado dos Maybrick me permitiu me sentir mais tranquila. Dava-me conta pouco depois de que deixassemos Londres… E lhe ofereceu uma versao expurgada da viagem de ida e volta a Gretna Green, que lhe provocou algumas risadas e tosses. Enquanto falavam, observou como lhe relaxava a cara, efeito da morfina. Comeu-se uma parte de uma torrada intacta de seu pai, bebeu uma taca de cha e deixou a bandeja do cafe da manha junto a porta. — Papai — disse— , antes de que durma, ajudarei-te a lavar e barbear. — Nao faz falta — respondeu ele com os olhos frageis devido a morfina. — me deixe te cuidar — insistiu Evie, e se dirigiu para ao lavabo, onde a criada tinha deixado uma bacia com agua Quente. — Depois dormira melhor, ja o vera. O parecia muito apatico para discutir. Limitou-se a suspirar e tossir enquanto contemplava como sua filha aproximava a bacia de porcelana e os uteis de barbear a mesinha de noite. Po lhe uma toalha sobre o peito e a ajustou ao redor do pescoco. Como nunca tinha barbeado a um homem, tomou

a broxa, afundou-a na agua e logo na saboneteira. — Uma toalha quente primeiro, bonita — murmurou Jenner -suaviza a barba. Evie seguiu suas instrucoes. Passado um minuto, tirou lhe a toalha e com a broxa lhe ensaboou um lado da cara. Decidida a barbea-lo por partes, abriu a navalha, olhou-a receosa e se inclinou para seu pai. Antes de que a navalha lhe tocasse a bochecha, chegou lhe uma voz ironica da porta. — Pelos pregos de Cristo, Jenner. — Evie voltou a cabeca e viu o Sebastian. Nao falava com ela, a nao ser com seu pai. — Nao sei se elogiar sua valentia ou lhe perguntar se tiver perdido o julgamento. — aproximou-se da Cama com passo pausado. — De-me isso, carinho. A proxima vez que seu pai tussa, lhe vais fatiar o nariz. Evie lhe entregou a navalha sem duvida-lo. Essa manha seu marido parecia mais fresco. Ia impecavelmente barbeado, com o cabelo lavado e penteado com esmero. Levava um traje esplendido, com uma jaqueta cinza grafite escuro que lhe realcava a compleicao. O contraste entre os dois homens, um tao velho e doente, e o outro tao corpulento e saudavel, era notavel. Quando Sebastian se aproximou mais a seu pai, Evie sentiu o impulso de situar-se entre ambos. Seu marido parecia um depredador a ponto de acabar com uma presa indefesa. — Traz o suavizador, carinho — pediu com um ligeiro sorriso. Ela foi ate o lavabo e, quando voltou com o suavizador, ele tinha ocupado seu lugar junto a Cama. — Tera que afia-la antes e depois de um barbeado — explicou de uma vez que passava a navalha pelo suavizador. — Parece bastante afiada — comentou Evie. — Nunca o esta muito. Ensaboa toda a cara antes de comecar. Dessa maneira se suaviza a barba. — apartou-se para que ela o fizesse e depois a fez a um lado. Com a navalha na mao, perguntou ao Jenner: — Posso? Para seu assombro, seu pai assentiu sem vacilar. Evie se situou ao outro lado da Cama para ve-lo melhor. — Deve deixar que a navalha faca o trabalho em lugar de fazer pressao com a mao — seguiu explicando Sebastian. — Barbeia na direcao do cabelo, assim. E nunca passe a folha perpendicular a pele. Comeca pelos lados da cara, segue pelas bochechas e depois pelos lados do pescoco, assim. — Enquanto falava, Sebastian barbeava a barba grisalha com movimentos limpos. — E esclarece folha frequentemente. Tratava a cara de seu pai com suavidade, variando o angulo, estirando zonas de pele para barbea-la mais eficazmente. Seus movimentos eram destros e ligeiros. Evie sacudiu a cabeca, incapaz de assimilar que estava vendo o Sebastian, lorde St. Vincent, barbear a seu pai com a pericia de um ajuda de camara perito. Depois de terminar o ritual, Sebastian limpou os restos de sabao da cara reluzente do Jenner. So havia um pequeno corte no bordo da mandibula. — O sabao necessita mais glicerina — murmurou Sebastian, e pressionou o corte com a toalha. — O que prepara meu ajuda de camara e melhor que este. Depois lhe pedirei que me traga um pouco. — Obrigado — respondeu Evie, e sentiu um quente aperto no peito. Sebastian a olhou e o que viu em sua expressao pareceu fascina-lo. — Tera que lhe muda os lencois — comentou. — Te ajudarei. Evie negou com a cabeca. Nao queria que visse seu pai tao consumido. Isso faria que seu pai se

sentisse em uma clara situacao de desvantagem com respeito a seu genro. — Obrigado, mas nao — disse. — Chamarei a criada. — Muito bem. — Olhou o Jenner e acrescentou: — Com sua permissao, senhor, virei a ve-lo mais tarde, quando tiver descansado. — tudo bem— concordou seu pai com o olhar perdido. Fechou os olhos e suspirou. Evie arrumou rapidamente a quarto enquanto Sebastian limpava a navalha, afiava-a outra vez e a deixava em seu estojo de pele. A seguir levou a seu marido para a porta da quarto e se deteve para olha-lo com as costas apoiada contra a ombreira. — Despediste ja ao Egan? — perguntou lhe com preocupacao. Sebastian assentiu, pos uma mao na ombreira, por cima de sua cabeca, e se inclinou para ela. Embora era uma postura relaxada e natural, Evie teve a sensacao de ser sutilmente dominada. Desconcertou-a precaver-se de que nao era uma sensacao desagradavel de tudo. — Ao principio se mostrou hostil — explicou Sebastian— , ate que lhe disse que tinha repassado alguns livros. Isso o amansou como um cordeiro, porque sabe a sorte que tem de que nao o denunciemos. Rohan lhe esta ajudando a fazer a bagagem para assegurar-se de que se vai imediatamente. — Por que nao quer denuncia-lo? — Seria publicidade negativa. Qualquer insinuacao de problemas financeiros poe nervosa a clientela de um clube como este. E melhor assumir as perdas e comecar dai. — Observou seus rasgos tensos e a deixou aniquilada ao dizer em voz baixa: — te Gire. — O que? Por que? — perguntou com os olhos como pratos. — Te gire — repetiu Sebastian, e esperou ate que ela obedeceu devagar. O coracao lhe deu um tombo quando seu marido lhe levantou as maos para as apoiar na ombreira. — Segure se ai, carinho. Esperou, desconcertada e nervosa, sem saber o que se propunha Sebastian. Fechou os olhos e se esticou ao notar suas maos nos ombros. Lhe acariciou as costas, como se procurasse algo, e depois comecou a massagea-la com movimentos suaves e seguros para lhe aliviar os musculos doloridos. Buscou lhe pontos tensos, o que a fez inspirar com forca. A pressao das maos aumentou, deslizando as Palmas pelas costas de uma vez que afundava os polegares a cada lado da coluna. Para seu rubor, Evie se encontrou arqueando as costas como um gato. Sebastian foi subindo devagar ate lhe alcancar os duros ombros e pescoco, e concentrou neles ate que ela emitiu um suave gemido. Uma mulher podia converter-se em pulseira dessas maos peritas. Tocava-a com uma sensualidade perfeita, lhe produzindo um enorme prazer. Apoiada contra a ombreira, Evie sentiu que sua respiracao se voltava lenta e profunda. A massagem lhe relaxou todas as costas e ela desejou que nao terminasse nunca. Quando Sebastian apartou por fim as maos, ela se surpreendeu de nao desmoronar-se. Voltou-se para olha-lo, convencida de que receberia um sorriso zombador ou um comentario ironico. Em troca, ele se tinha ruborizado e mantinha uma expressao impassivel. — Tenho que te dizer algo — resmungou. — Em privado. Tirou-a do braco, tirou-a o corredor e a meteu na primeira quarto disponivel, que resultou ser a que Evie tinha ocupado a noite anterior. Sebastian fechou a porta e se inclinou para ela com rosto imperturbavel. — Rohan tinha razao — lhe disse sem rodeios. — A seu pai nao fica muito tempo. Sera um milagre se chegar a manha. — Sim. Qualquer pode ve-lo. — Hoje falei com o Rohan comprido e tendido sobre o estado de seu pai, e me mostrou um

folheto que deixou o medico ao fazer o diagnostico. — Sebastian se tirou da jaqueta um papel dobrado e o deu. Evie leu Uma nova teoria sobre a tuberculose no cabecalho. Como a unica luz da quarto procedia da janela e tinha os olhos cansados, sacudiu a cabeca. — Posso le-lo depois? — perguntou. — Sim. Mas te farei um resumo: a tuberculose e causada por uns minusculos organismos vivos invisiveis a simples vista. Encontram-se nos pulmoes afetados. E a enfermidade se transmite quando uma pessoa sa respira o ar que uma pessoa doente exala. — Seres pequeninhos nos pulmoes? — disse Evie sem compreender. — Isso e absurdo. A tuberculose se deve a uma predisposicao natural a doenca, ou por estar muito tempo exposto ao frio e a umidade.. — Como nenhum dos dois e medico ou cientifico, nao tem sentido discutir. Entretanto, por precaucao terei que limitar o tempo que passa com seu pai. O papel lhe caiu da mao. Depois de tudo o que tinha passado para estar com seu pai, aquele desalmado tratava de lhe negar os ultimos dias que poderia estar com ele. E tudo por uma teoria medica ainda nao demonstrada que tinha lido num simples folheto? — Nem pensar! — exclamou com um no na garganta— , Nem… nem o sonhe. P.. passarei todo o tempo que queira com ele. Eu te importo um co… cominho, e ele menos. So quer ser cruel para de… me demonstrar que apodreci… pode… — Vi os lencois — replicou Sebastian com brutalidade. — Esta tossindo sangue, mucosidade e sabe o que mais. Quanto mais tempo passe com ele, mais probabilidades tem que inale o que seja que o esta matando. — Nao acredito nessa sua estupida teoria. Poderia encontrar dezenas de me… Medicos que a desvirtuariam num mi… minuto. — Nao pode correr o risco. Maldita seja, quer jazer nessa mesma Cama com os pulmoes apodrecendo-se dentro de seis meses? — Se isso ac… acontece, nao e assunto seu. Houve um tenso silencio, e Evie teve a sensacao de que suas amargas palavras tinham causado mais danifico do procurado. — Tem razao — replicou Sebastian com rudeza. — Se quer ser uma tuberculose, adiante. Mas nao sinta saudades se recuso me sentar junto a sua Cama me retorcendo as maos. Nao farei nada por te ajudar. E quando estiver expulsando os pulmoes pela boca, agradarei-me em te recordar que e tua culpa por ser tao idiota e teimosa — concluiu com um movimento irritado das maos. Evie, muito condicionada por suas muitas topadas, com o tio Peregrine para distinguir entre um gesto zangado e o inicio de uma agressao fisica, estremeceu-se instintivamente e levantou os bracos para cobri-la cabeca. Mas como o golpe esperado nao chegou, soltou o ar, baixou hesitante os bracos e viu que Sebastian a observava com assombro. A expressao de seu marido se escureceu. — Evie…, acreditava que ia te b…? meu deus. Alguem te pegou no passado. Quem foi o mal nascido? — Alargou a mao para ela muito depressa, e Evie recuou bruscamente, chocando-se contra a parede. Sebastian se deteve. — Maldita seja— resmungou, e a olhou com intensidade. Depois de um comprido instante, disse em voz baixa— Jamais bateria em uma mulher. Jamais te machucaria. Sabe, verdade?

Paralisada por aqueles olhos claros e brilhantes que a observavam, Evie nao podia mover-se nem dizer nada. sobressaltou-se quando ele se aproximou devagar. — Tranquila— murmurou Sebastian. — Deixa que me aproxime. Nao acontece nada. Tranquila. — Rodeou-a com um braco e com a mao livre lhe acariciou o cabelo. Ela suspirou de alivio. Sebastian a aproximou mais a ele e lhe rocou a tempora com os labios. — Quem te machucou? — quis saber. — Me… meu tio — conseguiu responder. A mao do Sebastian em suas costas se deteve. — Stubbins? — perguntou. — Nao, o outro. — Maybrick. — Sim. — Evie fechou os olhos ao notar como ele a estreitava entre seus bracos. Aconchegada contra o firme peito de seu marido, com a bochecha em seu ombro, inalou sua poda fragrancia e o sutil aroma de colonia de sandalo. — Com que frequencia? — perguntou lhe. — mais de uma vez? — Isso ja nao impo… conta. — Com que frequencia, Evie? — se obstinou Sebastian. — Nao muito a fre… frequentemente. Mas, as vezes, quando desgostava a ele ou a tia Flo… Florence, perdia os estribos. A ultima vez que tentei escapar, apodreci-me… pos um olho ma… arroxeado e me partiu o labio. — Ah, sim? — Sebastian fez uma larga pausa e depois disse com arrepiante suavidade: — vou despedaca-lo vivo. — Nao! — exclamou Evie. — So quero estar a salvo dele De to… todos eles. Sebastian apartou a cabeca para lhe olhar as faccoes acesas. — Esta a salvo — assegurou em voz baixa, e lhe acaricio o maca do rosto antes de seguir a fileira de sardas douradas com a ponta de um dedo ate o nariz. Quando ela fechou os olhos, percorreu lhe com suavidade as sobrancelhas com o dedo e lhe esfregou a bochecha com a palma. — Evie… — murmurou— , juro-te por minha vida que nunca te causaria uma dor assim. Posso ser um marido terrivel em qualquer outro sentido, mas nao te machucaria desse modo vil. Acredite em mim. A delicada pele de Evie absorveu as sensacoes com avidez. Seu contato, seu sensual folego nos labios. Temia abrir os olhos ou fazer algo que interrompesse aquele momento magico. — Sim, acredito em voce — conseguiu sussurrar. — Sim. Eu… Entao recebeu um suave beijo nos labios, e outro. Entregou-se a ele com a respiracao entrecortada. A boca do Sebastian era apaixonada e tenra, e lhe invadia a sua com uma pressao comedida. Quando Sebastian notou que ela se balancava e que podia perder o equilibrio, tomou uma mao e a pos com cuidado na nuca. Evie levantou tambem a outra e se aferrou a ele sem deixar de corresponder a seus doces beijos. Sebastian respirava depressa e seu torax lhe rocava o peito ao mover-se. De repente seus beijos se voltaram mais intensos, e imprimiu a paixao uma urgencia que a levou a esfregar-se contra ele, ardente de excitacao. Sebastian gemeu, e apartou os labios. — Nao… — sussurrou. — Espera, carinho. Nao queria comecar isto. So queria… Maldita seja — soprou.

Evie lhe aferrou a jaqueta e ocultou a cara contra sua gravata de seda cinza. Lhe sustentou a parte posterior da cabeca com a mao, ambos os corpos trementes. — Nao mudei de ideia — lhe disse contra o cabelo. — Se quer cuidar de seu pai, tera que seguir minhas normas. Mantem a quarto ventilada; a porta e a janela tem que estar sempre abertas. E nao se sente muito perto dele. Alem disso, quando estiver com o te atara um lenco sobre o nariz e a boca — Que diz! — soltou-se dele e lhe dirigiu um olhar incredulo. — Para que nao me entrem uns pequenos seres invisiveis nos pulmoes? — Nao me ponha a prova, Evie. Estou muito perto de te proibir totalmente que o veja. — Sentiria ridicula com um lenco na cara — protesto ela. — E ofenderia a meu pai. — Importa-me um nada. Tenha claro que se nao me obedecer, nao o vera. Evie se separou dele zangada. — E igual aos Maybrick — soltou com amargura. — Me casei contigo para obter minha liberdade. E em lugar disso, solo mudei que carcereiro. — Ninguem goza de total liberdade, ceu. Nem sequer eu. Evie o olhou carrancuda. — Voce pelo menos tem direito a decidir por ti mesmo. — E por ti — zombou ele, que parecia desfrutar com a raiva que lhe tinha despertado. — Caramba, miuda demonstracao. Tanta rebeldia apaixonada me excita exageradamente. — Nao volte a me tocar — espetou Evie. — Nunca! De modo desesperador, Sebastian soltou um risinho e saiu ao corredor.

Capitulo 10 Quando Evie voltou para a quarto de seu pai de noite, soube que lhe tinha chegado a hora. Estava palido como a cera, tinha os labios azulados e seus atormentados pulmoes ja nao podiam inspirar ar suficiente. Quem dera pudesse respirar por ele. Agarrou lhe uma mao geada e lhe esfregou os dedos para faze-los entrar em calor. — Papai — murmurou olhando-o com um triste sorriso e lhe acariciando o cabelo condensado. — me Diga o que fazer. Me diga o que quer. O lhe dirigiu um olhar tenro e carinhoso, enquanto seus labios, apenas visiveis em sua enrugada cara, esbocavam um sorriso. — Cam… — sussurrou. — Sim, o chamarei. — E acrescentou em voz baixa: — Papai, Cam e meu irmao? Ele suspirou, fazendo que lhe marcassem as rugas ao redor dos olhos. — Nao, ceu. Embora me teria gostado. E um bom menino… Evie se agachou para lhe beijar uma mao e logo se incorporou. Aproximou-se depressa ao atirador e chamou varias vezes. — Sim, milady? — disse a criada que apareceu com incomum prontidao. — Chame o senhor Rohan — ordenou Evie, e pensou em avisar tambem a Sebastian, mas seu pai nao tinha perguntado por ele. E a ideia da presenca fria e cerebral do Sebastian, tao discordante com as emocoes que ela sentia… Nao. Havia algumas coisas para as que podia apoiar-se nele, mas essa nao era uma delas. — Depressa — murmurou a criada, e retornou junto ao leito do moribundo.

Apesar de seus esforcos por oferecer uma aparencia tranquila, seu medo devia transparecer, porque seu pai tomou a mao e puxou fracamente para que se aproximasse mais. — Evie — sussurrou. — vou reunir me com sua mae, sabe? vai deixar me aberta a porta de atras para que possa penetrar no ceu. Evie riu apesar das lagrimas que lhe enchiam os olhos. Cam entrou no quarto. Ia despenteado e, coisa estranha nele, desalinhado, como se tivesse vestido depressa. Embora parecia tranquilo e sereno, tinha os olhos umidos quando olhou a Evie. Esta se levantou e se afastou da Cama. — Tem que te inclinar para ouvi-lo — disse com voz rouca depois de tragar saliva para poder falar. Cam o fez e tomou as maos, como Evie fazia. — Pai de meu coracao — disse em voz baixa— , fica em paz com todas as almas que deixa atras. E sabe que Deus te recebera em sua nova vida. Jenner lhe sussurrou algo e o moco agachou a cabeca, esfregando as maos do anciao para tranquiliza-lo. — Sim— respondeu Cam, embora pela tensao que Evie captou em seus ombros, nao lhe tinha gostado do que seu pai lhe tinha pedido. — Me ocuparei de que se faca. Jenner se relaxou e fechou os olhos. Cam se separou da Cama e se aproximou de Evie. — Tranquila — murmurou o jovem cigano ao notar que ela tremia. — Minha avo sempre dizia que nao deve te negar a iniciar um novo Caminho, ja que nao sabe que venturas lhe esperam nele. Evie tentou consolar-se com estas palavras, mas lhe empanaram os olhos e lhe fez um no na garganta. Sentou-se junto a seu pai, rodeou-o com um braco e lhe pos uma mao no peito. Sua respiracao agitada se acalmou e emitiu um som tenue, como se agradecesse seu contato. Quando Evie notou como a vida ia escapando a seu progenitor, sentiu a confortante emano do Cam no braco. Na quarto reinava um doloroso silencio. Evie quase podia ouvir os batimentos do coracao de seu coracao. Nunca tinha visto a morte de perto e ter que perder a unica pessoa que a tinha querido de verdade, provocava lhe espanto. Dirigiu os olhos chorosos para a porta e viu Sebastian, com expressao impenetravel, e de repente foi consciente de que, em que apesar de tudo, necessitava que estivesse ai. Observava-a fixamente, e algo em seu olhar a tranquilizou. Um suave suspiro saiu dos labios do Ivo Jenner, e ja nao houve nada mais. Evie compreendeu que tudo tinha terminado. Apertou uma bochecha contra sua cabeca e lhe fechou os olhos. — Adeus — sussurrou enquanto suas lagrimas caiam sobre o cabelo de seu pai. Passado um momento, Cam a ajudou a incorporar-se. — Evie — murmurou o jovem. — Agora tenho que… tenho que arrumar o cadaver. Ve com seu marido. Evie assentiu e tentou mover-se, mas tinha as pernas paralisadas. Cam lhe apartou o cabelo da cara e lhe deu um beijo doce e casto na fronte. Afastou-se dele e avancou a tropicoes para seu marido, que se adiantou e lhe tendeu um lenco. Evie o aceitou agradecida. Muito consternada para ver ou lhe importar onde foram, secou-se os olhos e se soou o nariz enquanto Sebastian a tirava o corredor. Rodeou-a com um braco e a segurou pela cintura com a outra mao. — Nao deixava de sofrer — lhe sussurrou com naturalidade. — foi o melhor para ele. — Sim— conseguiu responder ela, aturdida. — Sim, claro. — Dissete algo?

— Mencionou a minha mae. — A ideia lhe fez aflorar novas lagrimas, mas seus labios esbocaram um sorriso torcido. — Disse que ela ia ajudar lhe a penetrar pela porta de atras do ceu. Sebastian a levou a sua quarto. Evie se deixou cair na Cama e, depois de soar-se com o lenco, se aconchegou de costas. Nao tinha chorado nunca assim, sem solucar. A tristeza lhe saia pela garganta e a pressao da pena no peito nao se reduzia. Foi vagamente consciente de que alguem corria as cortinas e de que Sebastian pedia a uma criada que levasse uma jarra de vinho e outra de agua fria a quarto. Embora Sebastian permaneceu no quarto, nao se aproximou dela, mas sim se passeou de um lado para outro, ate que ao final se sentou em uma cadeira junto a Cama. Era evidente que nao queria embalar a Evie enquanto chorava, que fugia essa intimidade emocional. Podia compartilhar com ele sua paixao, mas nao sua dor. Mesmo assim, nao tinha nenhuma intencao de ir-se. Depois de que a criada levasse o vinho e a agua, Sebastian apoiou a Evie nos travesseiros e lhe deu uma taca enche. Enquanto ela bebia, tomou um pano molhado em agua fria e o pos com cuidado sobre os olhos inchados. Sua atitude era carinhosa e deliciosamente solicita, como se atendesse a um menino pequeno. — Os empregados — balbuciou Evie ao cabo. — O clube. O enterro… — Eu me encarregarei de tudo — disse Sebastian com calma. — Fecharemos o clube e disporei os preparativos do enterro. Quer que avise a alguma amiga tua? Evie sacudiu a cabeca. — Poria-as num compromisso. E nao gosta de falar com ninguem. — Compreendo. Sebastian ficou com ela ate que teve tomado uma segunda taca de vinho. Ao compreender que estava esperando que lhe desse pe para ir-se, deixou a taca vazia na mesinha de noite e disse com voz rouca: — Agora descansarei um pouco. Nao faz falta que fique comigo, quando ha tantas coisas que fazer. Depois de avalia-la com o olhar, Sebastian se levantou da cadeira. — me chame quando despertar — pediu. Tombada na Cama, meio bebado e dormitada, perguntou-se por que a gente dizia sempre que a morte de um ser querido era mais facil quando tinha tempo para te preparar. Nao lhe parecia nada facil. E essas mesmas pessoas podiam ter acrescentado que sua dor deveria ser menor ja que logo que tinha conhecido a seu pai. Mas isso o aumentava. Tinha tao poucas lembrancas para consolar-se, tao pouco tempo passado juntos. Junto com a tristeza, tinha uma lugubre sensacao de privacao, e debaixo de todo isso, inclusive uma leve raiva. Era tao pouco digna de amor que por isso tinha tido tao pouco na vida? Carecia de algum dom essencial para atrair a outros? Consciente de que seus pensamentos estavam derivando para a autocompaixao, fechou os olhos e soltou um suspiro tremente. Quando Cam saiu da quarto do Ivo Jenner, encontrou-se com o St. Vincent no corredor. — Se a minha esposa consola os descerebrados sermoes ciganos, nao tenho inconveniente em que os recite — lhe soltou este, carrancudo e com uma nota de arrogancia na voz. — Agora bem, se voltar a beija-la outra vez, por muito platonica que seja a maneira em que o faca, te converterei num eunuco. O fato de que St. Vincent pudesse mostrar um ciumes ridiculos quando o cadaver do Ivo Jenner ainda estava quente poderia ter indignado a muitas pessoas. Cam, entretanto, observou ao autocratico visconde com um interesse especulativo. — Se a tivesse querido desse modo — disse Cam, medindo deliberadamente sua resposta para po-lo a prova— , ja a teria tido. Um brilho de advertencia nos olhos azuis do St. Vincent revelou

fugazmente um escuro sentimento que nao admitiria jamais. Cam nunca tinha visto nada parecido ao desejo que St. Vincent sentia por sua mulher. Ante ela, St. Vincent virtualmente vibrava como um diapasao. — E possivel querer a uma mulher sem desejar deitar-se com ela — assinalou Cam para tranquiliza-lo. — Mas parece que voce nao acredite assim. Ou acaso esta tao obcecado com ela que nao entende que possa haver alguem que nao sinta quao mesmo voce? — Nao estou obcecado com ela— lhe espetou St. Vincent. Cam apoiou um ombro contra a parede e o olhou aos olhos. — Claro que o esta. Qualquer um o ve. — Outra palavra e seguira os passos do Egan— grunhiu St. Vincent enrugando o cenho. Cam levantou as maos em gesto de desculpa. — Entendido. Por certo, as ultimas palavras do Jenner foram sobre Bullard. Existe um legado economico para ele no testamento e Jenner queria que o recebesse. — por que deixaria dinheiro ao Bullard? — perguntou St. Vincent entreabrindo os olhos. Cam se encolheu de ombros. — Nao sei. Mas eu, de voce, cumpriria a ultima vontade do Jenner. — Se nao o fizesse, nem ele nem ninguem poderia fazer nada a respeito. — Mas correria o risco de que seu fantasma atormentado rondasse o clube para sempre. — Fantasma? — St. Vincent lhe lancou um olhar incredulo. — Nao fala a serio, verdade? — Sou cigano — respondeu Cam com naturalidade. — Claro que falo a serio. — So meio cigano. O que me leva a supor que a outra metade tera um pingo de prudencia e sensatez. — A outra metade e irlandesa — indicou Cam. — Deus nos ampare — soprou St. Vincent, e partiu sacudindo a cabeca. Com os preparativos do funeral, a confusao no clube e a necessidade de restaurar o edificio, Sebastian deveria ter estado muito ocupado para interessar-se por sua mulher. Entretanto, Evie logo soube que perguntava com frequencia as criadas quanto tinha dormido, se tinha comido, e por suas atividades em geral. Ao inteirar-se de que nao tinha tomado o cafe da manha nem almocado, ordenou que lhe levassem uma bandeja a sua quarto com uma direta nota anexa. M ilady: D aqui a uma hora devolverao esta bandeja para que a examine. Se houver algo que nao tenha comido, eu mesmo me encarregarei de lhe administrar isso pela forca. Q ue aproveite, S. Para satisfacao do Sebastian, Evie acatou a ordem. Entretanto, perguntou-se a nota estava motivada pela preocupacao ou por simples ganha de intimida-la. Nao obstante, pouco depois Sebastian nao pos reparos em pagar a uma costureira o dobro do normal para que lhe confeccionasse tres vestidos de luto a uma velocidade elogiavel. Por desgraca, a selecao de tecidos foi de tudo inadequada. No primeiro ano de luto, as mulheres estavam obrigadas a levar so bracadeira de luto, um tecido apagado, rigido e de linho retorcida. A ninguem gostava, porque o bracadeira de luto era, por uma parte, perigosamente inflamavel e, pela outra, tendia a enrugar-se e desfiar-se com a chuva. Sebastian, entretanto, tinha encarregado um vestido de veludo, outro de Cambraia e um terceiro de caxemira.

— Nao posso por me disse isso uma carrancuda Evie enquanto alisava os vestidos com as maos. Tinha-os estendido sobre a Cama. Sebastian lhe tinha subido os vestidos em pessoa logo que foram entregues no clube. Agora estava em uma esquina da Cama, apoiado com indiferenca contra o pilar esculpido. Salvo a Camisa branca, vestia completamente de negro. Naturalmente, via-se muito bonito, ja que a escuridao dos objetos proporcionava um contraste exotico com o brilho dourado de sua pele e seus cabelos. Nao pela primeira vez, Evie pensou com ironia se seria possivel que um homem tao atrativo tivesse um carater decente; sem duvida o tinham mimado da infancia. — O que tem de mau os vestidos? — perguntou Sebastian olhando-os. — Sao negros, nao? — Pois sim, mas nao sao de bracadeira de luto. — Quer levar bracadeira de luto? — E obvio que nao. Ninguem quer. Mas se a gente me ve levar qualquer outra coisa, havera muitos falatorios. — Evie — replicou Sebastian com uma sobrancelha arqueada— , fugiu de sua casa para te casar com um conhecido libertino e esta vivendo num clube de jogo. A quantas falatorios mais acredite que pode dar pe? Evie dirigiu um olhar duvidoso ao vestido que usava, um dos tres que tinha levado consigo a noite que fugiu de casa dos Maybrick. Embora as criadas e ela se esmeraram por limpa-lo, a la marrom estava manchada e se encolheu naqueles pontos em que se molhou e enlodado. E arranhava. Queria ficar algo limpo e suave. Alargou a mao para o veludo negro e o acariciou com os dedos, de modo que deixou nele um rastro brilhante. — Deve aprender a ignorar o que disser a gente — murmuro Sebastian, e se aproximou. Situado atras dela, po lhe as maos nos ombros, o que a sobressaltou um pouco. — Assim sera mais feliz. Os falatorios sobre outros revistam ser certas, mas nunca o sao se referem a gente mesmo — acrescentou divertido. Quando notou que Sebastian lhe percorria a fileira de colchetes das costas do vestido, Evie ficou tensa. — O que esta fazendo? — Te ajudando a muda de vestido. — Nao quero. Agora nao. Eu… OH, nao, por favor! Mas lhe pos uma mao no ventre para que nao se movesse enquanto a seguia desabotoando com a outra. Em lugar de apresentar uma batalha pouco digna, Evie se ruborizou e ficou quieta. — De… desejaria que nao me tratasse de maneira tao displicente — comentou, e notou que lhe arrepiavam as zonas que foram ficando ao descoberto. — Displicente implica indiferenca — replicou Sebastian, e lhe passou o vestido pelos quadris ate deixa-lo no chao. — E nao e esse meu caso, carinho. Evie se estremeceu ao ficar em roupa interior. — Nao estaria de mais certo respeito — disse. — Sobretudo depois de… depois de… — Nao necessita respeito. Necessita consolo e apoio, e pode que um bom tempo na Cama comigo. Mas como nega a isso, darei-te uma massagem nos ombros e alguns conselhos. Dito isto, po lhe as maos nos ombros, nus salvo pelos suspensorios da regata, e comecou a lhe massagear os tensos musculos com amplos arcos descritos com os polegares na parte superior das costas. Evie gemeu e tentou soltar-se, mas seu marido a fez calar e seguiu massageando-a com

pericia. — Nao e a mesma de faz uns dias — murmurou. — Ja nao e a solteirona do baile, uma virgem, e tampouco a menina indefesa que vivia sob o jugo dos Maybrick. E uma viscondessa com uma fortuna consideravel e um marido descarado. Nao te basta? Evie sacudiu a cabeca, cansada e confundida. A medida que Sebastian lhe aliviava a tensao das costas, o controle de suas emocoes parecia desvanecer-se. Temia romper a chorar, assim guardou silencio, fechou os olhos e se concentrou em manter uma respiracao regular. — ate agora te aconteceste a vida tentando agradar a outros — prosseguiu Sebastian. — Com muito pouco exito, por certo. Por que nao tenta te agradar a ti mesma, para variar? por que nao vive segundo suas proprias normas? Onde te levou seguir as convencoes sociais? Evie se expos as perguntas, e vaiou de prazer quando Sebastian encontrou um ponto particularmente dolorido. — Eu gosto das convencoes — disse ao cabo. — Nao tem nada de mau ser uma pessoa normal. — Nao. Mas voce nao e corrente, ou nunca teria recorrido a mim em lugar de te casar com seu primo Eustace. — Estava desesperada. — Essa nao foi a unica razao — objetou Sebastian com apenas um sussurro. — Tambem gostava de fazer uma maldade. — Nao e verdade! — Desfrutou encurralando a um libertino infame em sua propria casa com uma oferta irrecusavel. Nao trate de nega-lo; agora te conheco o suficiente para sabe-lo. Apesar de sua dor e preocupacao, Evie nao pode evitar sorrir. — Pode que o desfrutasse por um momento — admitiu. — E certamente desfrutei pensando no furiosa que ficaria minha familia quando se inteirasse. — Seu sorriso se desvaneceu quando acrescentou com ar taciturno: — Como detestava viver com eles! Quem dera meu pai me tivesse tido aqui, com ele. Podia ter pago a alguem para que me cuidasse… — Pelas barbas de Netuno! — exclamou Sebastian. — por que ia querer seu pai a uma menina em seu mundo amoral? — Porque era familia dele. Porque era quao unico tinha! Sebastian negou com a cabeca. — Os homens nao pensam assim, carinho. Seu pai supos corretamente que seria melhor para ti viver longe dele. Sabia que nao te casaria nunca se nao te criava de um modo respeitavel. — Mas se tivesse sabido como me tratariam os Maybrick, quanto me maltratavam… — por que supoe que seu pai nao teria feito o mesmo? — repos Sebastian. — Era boxeador, caramba. Nao e que fora famoso por seu dominio de si mesmo. Poderia ter conhecido com todo detalhe o mapa de sua palma se o tivesse visto mais frequentemente. — Equivoca-te completamente! — exclamou Evie com veemencia. — Te acalme — murmurou Sebastian, e agarrou o vestido de veludo. — Como te disse, eu jamais aprovaria bater em uma mulher por nenhum motivo. Mas o mundo esta cheio de homens que nao tem este escrupulo concreto, e e provavel que seu pai fora um deles. Discute-o, se quiser, mas nao seja tao ingenua para por ao Jenner num pedestal, carinho. No contexto deste mundinho (jogadores, patifes, trapaceiros, delinquentes e vigaristas) era um homem bastante decente. Estou seguro de que esse lhe teria parecido um panegirico adequado. Levanta os bracos. Passou lhe com habilidade o vestido pela cabeca e puxou o objeto ate que lhe caiu elegantemente sobre os quadris. Depois a ajudou a passar os bracos pelas mangas.

— Esta vida nao e para ti — prosseguiu. — Deveria estar em alguma imovel de Campo, sentada em uma manta tendida na grama e comendo morangos com nata. Dando passeios em carruagem. Visitando amizades. Algum dia deveria me deixar que te desse um filho. Seria algo no que te ocupar. E assim teria algo em comum com suas amigas, quem sem duvida ja haveria comecado a procriar. Surpreendida pela tranquilidade com que o fazia a sugestao, Evie dirigiu o olhar para seu atrativo rosto, tao proximo ao dela. Era como se acabasse de lhe propor comprar uma boneca. Era realmente tao insensivel como parecia? — Interessaria-te por seu filho? — conseguiu lhe perguntar depois lhe tragar saliva varias vezes. — Nao, encanto. Estou tao pouco feito para ter uma esposa e uma familia como seu pai. Mas me encarregaria de que tivessem de tudo. — Um brilho picaro apareceu nos olhos. — Isso sim, dedicaria-me com entusiasmo a engendrar filhos, embora nao a cria-los — comentou enquanto lhe grampeava o vestido. E acrescentou: — Pensa o que quer. Ha poucas coisas que nao possa ter, sempre e quando te atrever as alcancar.

Capitulo 11 Se Evie sentia algo agradavel por seu marido, desapareceu rapidamente a manha seguinte, quando Sebastian saiu do clube antes do meio-dia em direcao ao local de madame Bradshaw. Uma vez terminados os preparativos do funeral do Ivo Jenner, que se celebraria ao dia seguinte, Sebastian tinha concentrado sua atencao nas questoes profissionais relativas ao clube. O Jenner’s estaria fechado quinze dias, durante os quais um batalhao de carpinteiros, pedreiros e pintores se ocupariam de reformar o edificio. Ja tinha comecado a fazer mudancas importantes nos procedimentos do clube, incluido a ascensao do Cam ao posto de factotum. Em vista da linhagem mista do jovem, era seguro que a decisao seria polemica. Todo mundo acreditava que os ciganos eram umas pessoas enganosas e de maos largas. Que Cam fora o responsavel por cobrar e pagar grandes somas de dinheiro, e de arbitrar sobre a legalidade de uma jogada, seria considerado como lhe pedir a um gato que vigiasse um ninho de pintinhos. O poder do cargo era tal que ninguem, nem sequer Sebastian, poderia questionar suas falhas sobre o jogo. Entretanto, Cam era uma figura conhecida e querida, e Sebastian estava disposto a apostar que sua popularidade induziria aos membros do clube a aceita-lo em sua nova posicao. Alem disso, nenhum dos outros trinta empregados estava remotamente qualificado para dirigir a sala de jogos. Agora que as prostitutas da casa se foram, era imprescindivel fazer algo para que, quando o clube voltasse a abrir, os membros tivessem acesso a companhia feminina. Para desgosto de Evie, Cam tinha coincidido com o Sebastian em que um acordo com madame Bradshaw seria uma solucao excelente. Naturalmente, Sebastian seria o encarregado de fazer uma oferta a famosa madame. Conhecendo o infame apetite sexual de seu marido, Evie temia que sua visita a madame Bradshaw incluiria muito mais que uma mera negociacao empresarial. Sebastian nao tinha jazido com ninguem desde sua breve estadia em Gretna Green. Sem duvida, estaria ansioso de satisfazer seus desejos com uma mulher servical. Evie se disse repetidas vezes que lhe dava igual. Sebastian podia jazer com dez mulheres, com

cem, com mil, e lhe daria igual. Em caso contrario, seria uma idiota. Sebastian era tao fiel como um gato de ruas que vaga por ai e se cruza com todas as gatas que lhe cruzam. Furiosa mas sob uma aparencia estoica, escovou-se e recolheu o cabelo trancado num intrincado coque ante o espelinho que havia sobre o penteadeira. Ao deixar a escova, sua alianca de ouro cintilou e a lenda gravada em gaelico pareceu zombar dela. — Meu amor e teu — sussurrou com amargura, e se tirou o anel. Nao tinha sentido levar alianca nessa farsa de matrimonio. Ia deixar o no penteadeira mas o pensou melhor e o meteu no bolso, decidida a lhe pedir ao Cam que o guardasse na caixa forte do clube. Quando ia sair da quarto, alguem bateu na porta. Nao podia tratar-se do Sebastian, porque este nunca se tomava a molestia de chamar. Ao abrir a porta, encontrou-se com os rasgos fortes do Joss Bullard. Embora nao podia dizer-se que Bullard caisse mal entre outros empregados, nao gozava nem muito menos da popularidade do Cam. Era uma lastima para o Bullard, ja que, como ele e Cam Rohan tinham idades parecidas, estavam acostumados a compara-los. E era injusto comparar a maioria de homens com o atrativo Cam, cujo encanto picaro e humor mordaz lhe valiam o favor dos empregados e os clientes do clube. Para piorar as coisas, Bullard era um homem arisco, insatisfeito com sua vida e invejoso de todos os que tinham mais que ele. Como lhe custava ser cortes inclusive com ela, Evie o tratava com uma mescla de educacao e cautela. Os olhos duros e inexpressivos do Bullard se cravaram nos seus. — Uma visita pergunta por voce na entrada de atras, milady. — Uma visita? — Evie franziu o cenho e lhe fez um no no estomago. Seus tios teriam averiguado por fim seu paradeiro? A noticia da morte do Jenner, o fechamento temporario do clube v sua presenca ai deviam ter deslocado depressa por Londres. — Quem? Que nome lhe deu? — Senhora Hunt, milady. Annabelle. Ouvir o nome de sua querida amiga fez que o coracao lhe acelerasse de alivio e ilusao, embora logo que dava credito a que Annabelle se atreveu a ir a um clube de jogo. — Muito bem — disse. — Por favor, leve a a sala de visitas de meu pai. — Pediu que voce baixasse a porta de atras, milady. — OH. Que estranho. Uma garota com a educacao entre algodoes de Annabelle nao podia querer reunirse com ela na parte traseira do clube. Preocupada, dirigiu-se depressa ao encontro de Annabelle. Com Bullard lhe pisando os taloes, baixou os dois largos lances de escada a toda velocidade sujeitando o corrimao a intervalos. Quando chegou abaixo, o coracao lhe palpitava devido a agitacao. Abriu a pesada porta… … e retrocedeu sobressaltada quando, em lugar da figura esbelta de Annabelle Hunt, encontrouse com a fornida de tio Peregrine. Evie ficou em branco. Dirigiu lhe um olhar assombrado que durou uma fracao de segundo e deu um passo atras, presa do terror. Peregrine tinha estado sempre mais que disposto a usar os punhos para faze-la obedecer. Nao importava que agora fora lady St. Vincent e, portanto, estivesse legalmente fora de seu alcance. Seu tio se vingaria de todas formas, comecando por lhe dar uma surra. Evie se voltou para fugir, mas, para seu assombro, Bullard se moveu para lhe impedir o passo. — Paga-me um soberano — se justificou. — E o que ganho num mes. — Nao! — exclamou Evie, de uma vez que o empurrava. — Lhe pagarei o que queira, mas nao deixe que me apanhe.

— Jenner quis que vivesse com seus tios — soltou com desdem o matreiro jovem. — Nao a queria aqui. Ninguem a quer. Evie protestou a gritos, mas Bullard a empurrou para seu tio que sorria triunfalmente. — Ja esta. Tal como me pediram— disse com brutalidade Bullard ao homem que estava detras de Peregrine e que Evie reconheceu como seu tio Brook. — E agora, me paguem o combinado. Algo incomodo e envergonhado pelo vil transacao, Brook lhe entregou o soberano. Peregrine segurou a Evie com tanta forca que a deixou indefesa como um coelho pego pelo cangote. Seu rosto corado mostrava uma enorme raiva. — Nao vale nada, sou estupida! — espetou lhe de uma vez que a sacudia. — Se nao fora porque ainda nos serve de algo, desfaria-me de ti como o lixo que e. Quanto tempo acreditava que poderia te esconder de nos? Custara-te muito cara sua rebeldia, prometo lhe isso. — Bullard, detenha-o, por favor — gemeu Evie, que lutava e se retorcia enquanto Peregrine a arrastava para uma carruagem que esperava no meio-fio. — Nao! Mas Bullard nao moveu um dedo. Limitou-se a observa-lo tudo da soleira com olhar ressentido. Evie nao entendia o que tinha feito para que a desprezasse tanto. Por que nao havia ninguem que a ajudasse? por que nao acudia ninguem a seus gritos? Defendia sua vida a arranhoes e cotoveladas, embora o vestido lhe limitava a luta. Estava perdida. — te renda, maldito demonio! — exclamou Peregrine, furioso por sua resistencia. Com a extremidade do olho, Evie viu chegar a um menino das quadras e deter-se vacilante. — va procurar ao Cam! — gritou lhe Evie. Peregrine lhe cobriu a boca e o nariz com a mao mas ela a mordeu com tanta forca que a retirou com um alarido enfurecido. — Cam! — chiou de novo, antes de que a silenciassem com um violento bofetao na orelha. Peregrine a empurrou para o Brook, cuja cara magra dava voltas ante seus olhos. — Coloca-a na carruagem — ordenou que Peregrine enquanto se envolvia a mao ensanguentada com um lenco. Evie se revolvia contra Brook, que a empurrava sem olhares para o veiculo. Conseguiu lhe dar um golpe de soslaio na noz do Adao, fazendo que se Cambaleasse e a soltasse. Peregrine a segurou rapidamente e a lancou contra o flanco da carruagem. Evie se golpeou a cabeca contra os paineis laqueados e viu um estalo de estrelinhas e uma dor aguda lhe atravessou o cranio. Aturdida, logo que pode lutar fracamente enquanto a metiam no veiculo. Para seu assombro, seu primo Eustace estava esperando dentro, como um filhote de baleia ao que tivessem depositado no assento. Reteve-a contra seu gordurento corpo e lhe rodeou o pescoco com um rolico e forte antebraco. — Ja te tenho, maldita bruxa — ofegou. — Rompeu sua promessa de te casar comigo. Mas meus pais me disseram que vou ter sua fortuna, e vao conseguir, nao duvide. — Ja estou casada — resfolegou Evie, asfixiada na montanha de carne humana que parecia envolve-la como se um exotico animal marinho a estivesse engolindo. — Isso nao importa. Seu matrimonio se anulara. Assim, ja ve, seu plano para me chatear nao funcionou — assegurou Eustace com tom de menino caprichoso. — Nao teria que haver me contrariado desta maneira, sabe? Meu pai disse que poderei fazer o que quiser contigo depois de casados. O que te pareceria uma semana encerrada num armario? Evie nao pode reunir ar suficiente para responder. Eustace a oprimia com seus pesados bracos contra seu peito e sua fofa barriga. Enquanto se debatia, os olhos lhe encheram de lagrimas de dor e

desespero. O zumbido que lhe alagava os ouvidos lhe impediu de escutar os gritos e maldicoes procedentes do exterior. De repente, a porta da carruagem se abriu e alguem apareceu dentro. Evie se retorceu para ver quem era. O pouco ar que ficava abandonou o corpo num tenue soluco ao perceber o conhecido brilho de uma cabeleira dourada. Era Sebastian, mas esta vez nada indiferente nem sereno, a nao ser feito uma furia. Fixou uns olhos colericos no Eustace, a quem a respiracao comecou a lhe estralar sob a papada. — Solta-a — ordenou Sebastian com voz rouca de raiva. — Agora mesmo, rato de esgoto, se nao querer que te fatie o pescoco. Eustace pareceu advertir que Sebastian morria de vontades de cumprir a ameaca e soltou a Evie, que se arrastou para seu marido enquanto tomava folego desesperadamente. — Se… Sebastian — balbuciou. — A.. me ajude, nao p… permita que M… levem-me. — Nao o farei — lhe assegurou enquanto a rodeava com um braco e lhe aproximava brevemente os labios ao cabelo para acrescentar: — Tranquila, carinho. Ja esta a salvo. — A pesar do tom suave, Evie sentiu os tremores de raiva que lhe percorriam o corpo. Sebastian dirigiu um olhar assassino ao Eustace, que tentava deslocar seu corpo de cetaceo para o outro extremo do assento. — A proxima vez que te veja — lhe advertiu com uma serenidade arrepiante— , sejam quais sejam as circunstancias, matarei-te. Nao havera lei, nem arma, nem o mesmo Deus, que possa impedi-lo. Assim se valorar sua vida, nao volte a te cruzar em meu Caminho. Enquanto Eustace se estremecia de medo, Sebastian tirou o Evie do veiculo. A moca, que seguia esforcando-se por respirar, aferrou-se a ele e jogou uma olhada ao redor. Ao parecer, Cam tinha sido advertido da briga, pois mantinha a seus dois tios a raia. Brook estava no chao e Peregrine se Cambaleava para tras com uma expressao de surpresa. Evie, Cambaleante uma vez no chao, ocultou a cara no ombro de seu marido. Sebastian estava que jogava fumaca literalmente, ja que o ar frio se convertia em vapor ao tocar sua pele acalorada. Submeteu-a a uma inspecao breve mas minuciosa lhe passando as maos com suavidade pelos bracos e lhe escrutinando a cara. — Esta bem, Evie? me olhe, carinho. Machucaram lhe? — Nao. — Olhou-o aturdida. — Meu tio P… Peregrine e muito forte — sussurrou. — Eu me encarregarei de — lhe assegurou e, ato seguido, chamou o Cam. — Rohan! Veem e te ocupe de minha mulher. O jovem se aproximou de Evie com passos largos e rapidos. Evie dirigiu um olhar inquieto a Sebastian. — Nao passa nada — a tranquilizou seu marido sem olha-la, ja que tinha os olhos postos no corpachon de Peregrine. — Ve com o Rohan. Evie se mordeu o labio, tomou o braco do jovem e permitiu que este a levasse a um lado. — Muito amavel de sua parte que nos visite, tio — ironizou Sebastian. — Suponho que veio a nos felicitar, verdade? — Vim para procurar a minha sobrinha — grunhiu Peregrine. — E a prometida de meu filho. Seu matrimonio ilicito e papel molhado! — E minha esposa — espetou Sebastian. — Farei que anulem o matrimonio — replicou Peregrine. — Isso so seria possivel se o matrimonio nao se consumou. E lhe asseguro que… — Contamos com um medico que certificara que segue sendo virgem. — Ja — exclamou Sebastian com perigosa afabilidade. — Sabe que imagem daria isso de mim?

Esforcei-me por cultivar minha fama de sedutor. Que me crucifiquem se permitir que uma falsa declaracao de impotencia a estrague. — tirou-se a jaqueta e a lancou ao Cam, que a apanhou ao voo. O olhar mortifero do Sebastian nao se desviou em nenhum momento dos rasgos lividos de Peregrine. — Lhe ocorreu que agora mesmo sua sobrinha poderia estar gravida? — Isso teria facil remedio. Sem compreender de tudo a que se referia seu tio, Evie se aconchegou mais entre os bracos protetores do Cam e sentiu como estes se esticavam. — Nao se preocupe — lhe sussurrou o jovem enquanto olhava carrancudo a Peregrine. Sebastian se instigou ainda mais para ouvir as palavras de Peregrine, mas se conteve. — Que bonito — disse, e seus olhos pareciam cristal fragmentado. — A mataria antes de deixala ir com voces. Peregrine pareceu perder todo vestigio de autocontrole e arremeteu contra ele com um rugido. — Acabarei contigo se for necessario, filho de puta jactancioso! Evie inspirou fundo quando no ultimo instante Sebastian se aparto agilmente e seu tio passou como um touro enfurecido. — Estupido — murmurou Cam. — Tinha que lhe haver posto a rasteira. A seguir Sebastian obteve com muita dificuldade bloquear o punho imenso de Peregrine e lhe lancar um violento muito direito a mandibula. Apesar do forte que foi o golpe, nao pareceu afetar muito ao corpulento homem. Horrorizada, Evie presenciou como ambos intercambiavam uma serie de murros e golpes rapidos. Embora Sebastian era muito mais agil, Peregrine conseguiu lhe atirar uns golpes fortissimos que o fizeram Cambalear para tras. Os empregados do clube comecaram a sair e a respirar a Sebastian, enquanto os transeuntes corriam para o inusitado espetaculo. Ao redor dos opositores se formou um circulo de gente que animava e animava. Evie apertou o braco do Rohan. — Cam, faz algo — suplicou. — Nao posso. — Sabe brigar. Meu pai sempre disse que… — Nao — repos Cam com gravidade. — Esta briga e dele. Se interviesse agora, pareceria que seu marido nao e capaz de tombar a seu tio. — E que nao o e! — Evie se estremeceu ao ver como Sebastian se Cambaleava detras encaixar outra combinacao brutal de Peregrine. — Subestima-o — assegurou Cam enquanto Sebastian se recuperava. — Assim, isso. Excelente gancho de direita. E bom jogo de pes, tambem. Os homens de seu tamanho nao revistam mover-se tao rapido. Deveria tentar… — De repente Sebastian tombou a Peregrine com um subito muito esquerdo direto a mandibula. — Bravo! — exclamou Cam. — Tem potencia e precisao, so lhe falta um pouco de instrucao. Reduzido a uma figura que gemia no chao, Peregrine ja nao teve forcas para levantar-se. Os empregados do clube compreenderam que a briga tinha terminado e se aproximaram do Sebastian para felicita-lo e lhe aplaudir as costas, surpreendidos da gordura de seu novo patrao. Sebastian recebeu os duvidosos elogios com uma expressao ironica enquanto fiscalizava como carregavam a seu oponente na carruagem. Cam fez que Evie se voltasse para ele. — me diga como comecou todo — lhe pediu com urgencia. — Agora, antes de que venha seu

marido. Evie lhe explicou rapidamente como Bullard a tinha enganado e entregue a seus tios em troca de um soberano. Contou-o tudo misturado, gaguejando, mas Cam o entendeu. — Muito bem — murmurou inexpressivamente. — Eu me ocuparei do Bullard. Voce cuida do St. Vincent. Necessitara-te. Os homens ficam do mais bobo depois de uma boa briga. Evie, confundida, sacudiu a cabeca. — Tolo? Como? Nao entendo. — Ja o entendera — assegurou o cigano com um brilho divertido nos olhos. Nesse momento Sebastian chegou a seu lado, nada contente de ver o Evie em bracos do Cam. — Quero saber que diabos passou — soltou furioso de uma vez que recuperava a sua mulher com maos possessivas. — Vou duas horas uma tranquila manha de domingo e, quando volto, encontro-me o maldito clube patas acima… — Ela o explicara — disse Cam, ja que alguem tinha captado sua atencao no patio da quadra. — me Desculpem, tenho que atender um assunto. E sem mais, afastou-se com presteza.

Capitulo 12 Cam encontrou a Joss Bullard junto a quadra. Bullard respirava com dificuldade e tinha os olhos exagerados. Jamais tinham sido amigos. Sua relacao tinha sido a de irmaos enfrentados que viviam sob o mesmo teto, com o Jenner como figura paternal. De meninos, tinham jogado e se brigaram juntos. De adultos, tinham trabalhado o um ao lado do outro. Depois das muitas amostras de afeto que Jenner lhe tinha dispensado ao Bullard, Cam nao teria esperado uma traicao tao baixa. Sentia uma mescla de confusao e raiva, e sacudiu devagar a cabeca enquanto o olhava fixamente. — Nao sei por que o fez — comecou. — O que acreditava que foste ganhar com isso? — Ganhei um soberano — replicou Bullard. — E valia a pena para livrar-se dessa idiota gaga. — Esta louco? — repos Cam com raiva. — O que te passa? trata-se da filha do Jenner. Nao deveria have-lo feito nem em troca de mil libras! — Ela nunca fez nada pelo Jenner — replicou Bullard com dureza. — E tampouco pelo clube. Mas vem ao final para ver como morre e fica tudo. Maldita seja essa cadela e tambem o bode de seu marido! Cam o escutou, mas nao conseguiu entender o motivo de seu ciumes. A um cigano custava compreender que alguem sentisse ressentimento por questoes materiais. O dinheiro so dava o prazer passageiro de gasta-lo. Na tribo nomade a que Cam tinha pertencido ate os doze anos, a ninguem lhe ocorria sequer desejar mais do que necessitava. Um homem so podia levar um traje ou montar um cavalo cada vez. — E a unica filha do Jenner — disse. — O que lhe tenha dado ou nao, nao e nosso assunto. Mas nao ha nada pior que trair a confianca de alguem que depende de seu amparo. Ajudar a que alguem a leve contra sua vontade… — Voltaria a faze-lo! — assegurou Bullard, e cuspiu no chao entre ambos. Cam o observou e se precaveu de seu mau aspecto. Estava palido e tinha os olhos apagados. — Esta doente? — perguntou lhe. — Se for assim, diga-me isso Falarei com o St. Vincent por ti. Possivelmente consiga que…

— Maldito seja! Estarei melhor sem ti, lixo cigana. Estarei melhor sem nenhum de vos. Aquele odio violento nao deixava lugar a duvidas. Nao tinha acerto. A unica duvida era se levalo a clube ou deixar que fugisse. Ao recordar o brilho desumano nos olhos do St. Vincent, Cam pensou que o visconde poderia matar ao Bullard, o que suportaria sofrimento a todo mundo, sobretudo a Evie. Nao; seria melhor deixa-lo ir. Com os olhos cravados na cara chupada daquele homem ao que conhecia desde fazia tantos anos, Cam sacudiu a cabeca, perplexo e zangado. Sua gente o chamava perda da alma: a essencia de um homem roucava apanhada em algum reino sombrio de outro mundo. Mas como lhe tinha passado ao Bullard? E quando? — Sera melhor que te mantenha afastado do clube — murmurou. — Se St. Vincent te ve… — St. Vincent pode apodrecer-se no inferno — grunhiu Bullard, e lhe lancou um golpe rapido. Cam esquivou o punho e saltou para um lado. Entreabriu os olhos ao ver como o outro se voltava e fugia. O relincho nervoso de um cavalo baio pacote a um pau proximo o distraiu. Pensativo, aproximouse e acariciou o suave pescoco do animal. Seus aneis de ouro brilharam a luz da tarde. — Era um insensato — disse ao cavalo em voz baixa para tranquiliza-lo. Lhe escapou um suspiro ao pensar em algo mais: Jenner lhe deixou um legado, e eu prometi me certificar de que o recebesse. O que devo fazer agora? Sebastian levou a Evie ao clube, cujo silencio ressaltava depois do incidente do beco. Evie custou seguir as largas pernadas de seu marido e, para quando chegaram a sala de leitura da planta baixa, ofegava. As prateleiras embutidas de mogno estavam cheios de tomos encadernados em pele. Tambem havia jornais e revistas dispostos em suportes especiais. Sebastian a fez entrar e fechou a porta atras deles. — Machucaram lhe? — perguntou com brutalidade. — Nao. — Evie tentou conter-se, mas as palavras lhe sairam num arranque de ressentimento: — por que esteve tanto momento fora? Necessitava-te e nao estava aqui! — Havia trinta empregados para te proteger. Por que baixou? Deveria haver ficado acima ate comprovar quem te chamava. — Bullard me disse que era Annabelle Hunt. E entao, quando vi que eram meus tios, Bullard nao me deixou voltar a entrar no clube. Empurrou-me para eles. — meu deus — soltou Sebastian com os olhos exagerados. — vou despedacar a esse verme. — E enquanto tudo isto passava — prosseguiu Evie, colerica— , voce estava na Cama com uma prostituta. — Assim que o disse, precaveu-se de que, para ela, este era a essencia da questao, mais importante ainda que a traicao do Bullard ou a tentativa de seus tios. O que em realidade a indignava era que Sebastian a tivesse enganado tao logo. — Nao e assim — replicou ele. — Nao me minta — lhe espetou Evie, e a raiva mutua carregava o ar. — Sei que sim. — por que esta tao segura? — Porque esteve no local de madame Bradshaw mais de duas horas! — Estava falando de negocios. Falando, Evie! Se nao o acredite, dane-se voce. Se me tivesse deitado com alguem, garanto-te que estaria muito mais depravado do que estou. Ao ver os olhos do Sebastian, tao duros como um lago gelado, Evie comecou a serenar-se. Nao ficava mais remedeio que acredita-lo: era evidente que sua acusacao o tinha ofendido. — Ta — murmurou. — Ta? E o unico que vais dizer?

— Suponho que nao deveria ter tirado conclusoes precipitadas. Mas conhecendo seu passado, pensei que… Suas mas desculpas pareceram acabar com o escasso dominio que conservava Sebastian. — Pois te equivocou! Se por acaso nao te deu conta, estou tao ocupado que nao tenho um so minuto de descanso em todo o dia. Nao tenho tempo para nenhum sexo. E se o tivesse… — deteve-se de repente. Qualquer parecido com o elegante visconde que ela tinha visto de longe no salao de lorde Westcliff tinha desaparecido. Estava despenteado, machucado e furioso. Respirava com dificuldade. — Se o tivesse… — interrompeu-se de novo, o rosto aceso. Ela viu o instante exato em que perdia o controle. Alarmada, tentou dirigir-se para a porta, mas a ponto ele a segurou e imobilizou contra a parede. O aroma de linho umido de suor e a homem excitado alagou as fossas nasais de Evie. Sebastian lhe apoiou os labios na tempora. O coracao de sua mulher se saltou um batimento do coracao. Outro instante de quietude. Evie sentiu o excitante roce de sua lingua em uma sobrancelha. E a respiracao sobre esse ponto molhado lhe provocou calafrios. Sebastian lhe aproximou a boca a orelha e seguiu seus intrincados contornos. Os sussurros do Sebastian pareceram lhe chegar dos cantos mais escuros de sua propria mente. — Se o tivesse, Evie, ja teria arrancado a roupa com as maos e os dentes. Ja teria te deitado no tapete, teria pego seus peitos para lambe-los e beija-los ate te deixar os mamilos eretos, e entao os morderia com suavidade… Evie se sentiu desvanecer enquanto ele seguia murmurando Com voz rouca. — Beijaria-te o corpo ate as coxas, centimetro a centimetro. E quando chegasse ao pelo avermelhado, lamberia-te cada vez mais fundo, ate encontrar a perola de seus clitoris, onde deixaria a lingua ate que o sentisse palpitar. Rodearia-o, acariciaria-o, lamberia-o ate te ouvir suplicar. E entao te chuparia, tao suave e meigamente que comecaria a gritar de desejo. Introduziria a lingua em sua vagina e te saborearia, comeria-te. Nao me deteria ate que todo seu corpo estivesse empapado e tremente. E quando te tivesse torturado o bastante, separaria-te as pernas, penetraria-te e te amaria… amaria-te… Sebastian se deteve e ambos permaneceram imoveis, excitados e ofegantes. — Esta molhada, verdade? — perguntou por fim com voz quase inaudivel. Se tivesse sido fisicamente possivel ruborizar-se mais, Evie o teria feito. O pudor vulnerado lhe abrasou a pele. Moveu a cabeca levemente para assentir. — Desejo-te mais que a nada neste mundo — murmurou Sebastian antes de inspirar entrecortadamente. — me Diga o que devo fazer para te ter. me diga como posso conseguir que durma comigo. Evie o empurrou em vao, incapaz de escapar daquele corpo estimulante. — Nao o conseguira — sussurrou. — Porque o que queria e quao unico nao poderia me dar: que fosse fiel. — Poderia — respondeu ele com muita rapidez. Cheirava a falsidade. — Nao acredito — sussurrou Evie. O lhe agarrou a cara entre as maos e lhe acariciou as bochechas com os polegares, as bocas quase tocando-se. — Evie, nao poderei cumprir nosso acordo. Nao posso viver contigo, verte todos os dias, e nao

te ter. Nao posso… Notou que sua esposa tremia e agachou a cabeca para lhe beijar o pescoco. Ela reagiu ao calor persuasivo de seus labios, e ao contato de seus dedos, que lhe acariciavam os peitos. Para ouvir seu gemido apagado, ele a beijou apaixonadamente. Ela voltou a cabeca quase por inercia, com um formigamento de prazer nos labios. — Nao, Sebastian… Lhe passou a bochecha pelos cabelos, e de repente soltou uma gargalhada suave e ironica. — Tera que pensar em uma forma de solucionar isto, Evie. Pensa em algo depressa porque se nao… — deteve-se para lhe mordiscar a orelha. — Se nao, vou a fuderte ate te deixar sem sentido. — Essa palavra nao… — indignou-se ela com os olhos exagerados, mas ele a sossegou com um beijo. Sebastian retrocedeu e a observou com uma exasperacao divertida. — Voce nao gosta da palavra em si, ou o sentimento que expressa? Evie se escorreu entre seu corpo e a parede. — Eu nao gosto que so me deseje porque nao pode me ter — lhe disse. — Nao quero ser uma novidade… — Essa nao e a unica razao — repos ele com rapidez. Lhe lancou um olhar cetico. — Alem disso, nunca serei p… parte de um harem de mulheres as que visitas ao azar. De repente, Sebastian desviou o olhar, como meio doido num ponto vital. Evie esperou a que ele aceitasse a verdade de suas palavras. Seu marido elevou devagar os olhos e os fixou nos seus. — Tudo bem— disse com voz rouca. — Aceito suas condicoes. Serei… monogamo. — Custou lhe pronunciar esta palavra, como se pertencesse a outro idioma. — Nao acredito. — Porra, Evie! Sabe quantas mulheres tentaram me arrancar esta promessa? E agora, a primeira vez que estou disposto a faze-la, nao me acredite. Admito que tenho um historico agitado… — Promiscuo — o corrigiu ela. — Ok, promiscuo, libertino, como prefere — soltou ele com um bufo de impaciencia. — Me passei isso muito bem, e nao vou pedir perdao por isso. Jamais me deitei com uma mulher que nao o desejasse. Nem, que eu saiba, deixei a nenhuma insatisfeita. — Nao e isso — comentou Evie, carrancuda. — Nao te culpo por seu passado nem tentou te castigar por ele. — Nao fez caso de seu bufo cetico e prosseguiu: — Mas tem que admitir que nao te faz especialmente idoneo para a fidelidade, nao acredite? — O que quer de mim? O que me desculpe por ser homem? Um voto de celibato ate que tenha decidido que mereco seus favores? Pergunta-a surpreendeu a Evie. As mulheres estavam acostumadas entregar-se com facilidade a Sebastian. Se o fazia esperar, perderia o interesse por ela? Ou possivelmente poderiam chegar a conhecerse e compreender-se de um modo distinto? Poderia chegar ele a valora-la por aspectos alem dos carnais? Queria ser para ele algo mais que alguem com quem compartilhar a Cama. — Sebastian — perguntou com prudencia— , alguma vez tem feito algum sacrificio por uma mulher? O apoiou um ombro contra a parede com aspecto de anjo triste. — Que classe de sacrificio?

— Qualquer. — Pois… nao. — Qual e o periodo mais comprido que estiveste sem… sem… — procurou uma expressao aceitavel— sem fazer o amor? — Eu nao o chamo assim— soltou Sebastian. — O amor nao tem nada que ver nisso. — Quanto tempo? — insistiu. — Um mes, possivelmente. — Muito bem — disse Evie detras refletir um instante— , a nao ser tem relacoes com nenhuma mulher em seis meses, deitarei-me contigo. — Seis meses? — exclamou Sebastian abrindo uns olhos como pratos. — carinho, o que te faz pensar que vale meio ano de celibato? — Talvez nao o valha. Voce tem a resposta. A Sebastian teria encantado lhe informar de que nao o valia. Entretanto, enquanto a repassava com o olhar, Evie viu o inconfundivel brilho da luxuria em seus olhos. Desejava-a com loucura. — Impossivel — sentenciou. — Porque? — Porque sou Sebastian, lorde St. Vincent. Nao posso ser celibatario. Todo mundo sabe. Era tao arrogante e estava tao indignado, que Evie teve que morder o labio para evitar rir. Finalmente, conseguiu falar com calma. — Seguro que nao te passaria nada se o provasse. — E claro que sim. — a contradisse, e tratou de explicar -E muito inexperiente para entende-lo, mas alguns homens possuem um apetite sexual maior que outros. Resulta que eu sou um deles. Nao posso passar largos periodos de tempo sem… — interrompeu-se com impaciencia ao ver sua expressao. — Maldita seja, Evie, nao e sao que um homem nao libere regularmente sua semente. — Tres meses — cedeu ela. — E e minha ultima oferta. — Nao! — Pois vai buscar outra mulher — repos Evie com tom inexpressivo. — Desejo a ti. Somente a ti. Vai saber por que. — Sebastian a fulminou com o olhar, com os olhos como fendas brilhantes. — Deveria te forcar. Nao tem direito legal a me rechacar. Evie deu um tombo o coracao e empalideceu. Mas nao ia ceder. Algo em seu interior a compelia a lhe fazer frente como a um igual. — Adiante, pois — o desafiou com serenidade. — me force. Viu a piscada de surpresa de seu marido, o movimento de sua garganta ao tragar saliva, e entao soube. — Nao pode. Jamais teria violado a Lillian. Era so uma isca. E incapaz de forcar a uma mulher — sentenciou com um sorriso, assombrada de seu descobrimento. — Lillian nao correu o menor perigo, verdade? Nao e o patife que finge ser, Sebastian St. Vincent. — Sim que o sou! — Segurou-a e a beijou com raiva. Mas Evie nao resistiu. Fechou os olhos e o deixou fazer. Pouco depois, Sebastian gemia e a beijava com uma excitante paixao cheia de ternura. Quando Sebastian por fim apartou a cabeca, ambos estavam tremendo. — Evie… — grasnou. — Nao me peca isto. — Tres meses — insistiu ela. — Se o conseguir, vou deitar-me co… contigo sempre que o

deseje. — Durante quanto tempo? — Todo o tempo de vida que nos conceda o Senhor. Mas se nao o obtem… — deteve-se para pensar a pior consequencia possivel, algo que o revoltasse profundamente. — Se nao o obtiver, vai ver seu antigo amigo lorde Westcliff para te desculpar por raptar a Lillian Bowman. — Merda! — Esse e meu preco. — Muito alto. Eu jamais me desculpo. — Pois entao rechaca meu desafio. Ou se o aceita, te esmere por consegui-lo. — Como sabera que nao faco armadilha? — Saberei. Houve um comprido momento de silencio. — Onde esta sua alianca? — perguntou de repente Sebastian. O sorriso de Evie se desvaneceu. — Me tirei — resmungou isso sem mais explicacoes, ja que lhe dava vergonha admitir que o tinha feito por despeito. — O que fez com ela? — Eu… Esta aqui— disse, e rebuscou desajeitadamente no bolso. — Voltarei a me por isso se quiser. — Me de isso — Aceito a aposta — disse com gravidade. — vou ganha-la. E daqui a tres meses, voltarei a te por esta alianca no dedo, levarei-te a Cama e te farei coisas proibidas no mundo civilizado. Evie supos que queria tirar lhe para sempre e fechou com forca a mao. De repente, descobriu que lhe tinha tomado muito apego ao maldito anel. Mesmo assim, o orgulho lhe impediu de lhe pedir que a deixasse conserva-lo. A contra gosto, tirou-se a alianca de ouro do bolso e tocou com a ponta do dedo por ultima vez aquelas palavras gravadas: Tha Gad Agam Ort… Sebastian tomou o anel e tentou coloca-lo, mas como tinha as maos muito maiores, so lhe cabia na ponta do dedo mindinho. Entao lhe segurou o queixo e a olhou com dureza. — Aceito a aposta — disse com gravidade. — vou ganha-la. E daqui a tres meses, voltarei a te por esta alianca no dedo, levarei-te a Cama e te farei coisas proibidas no mundo civilizado. A determinacao de Evie nao a protegeu do alarme que qualquer mulher tivesse sentido ante uma afirmacao tao inquietante. E tampouco impediu que os joelhos lhe falhassem quando ele a atraiu bruscamente para beija-la. Levou as maos para a cabeca de seu marido com um movimento tremente. Era impossivel resistir a textura de seu cabelo, os cachos tao frescos e densos na superficie, e tao quentes e umidos na raiz. Deslizou os dedos entre aqueles reluzentes cabelos dourados e o atraiu mais para ela, gozando com a pressao ardorosa de seus labios. Suas linguas se encontraram, deslizaram-se, rocaram-se, e com cada caricia Evie notou uma quebra de onda de calor na virilha. Nao, num lugar mais profundo ainda: em sua vagina tensa e umida. Assombrou-a precaver-se do muito que desejava voltar ao ter ai. Quando se separaram, a frustracao se apoderou de ambos. — Nao disse que nao pudesse te beijar — comentou Sebastian com olhos ardorosos. — vou beijar te tudo o que queira e tao frequentemente como quero, e voce nao pigarreara. E a concessao que fara em troca de meu celibato. Maldita seja. Sem lhe dar tempo a aceitar ou negar-se, soltou-a e se dirigiu rapidamente para a porta. — E agora, se me desculpa — acrescentou da soleira— , tenho que ir matar ao Joss Bullard.

Capitulo 13 Sebastian se encontrou com o Cam no corredor, diante da sala de leitura. — Onde esta? — perguntou. — foi-se — respondeu o romani com cara inexpressiva. — Nao consegui apanha-lo. — por que nao o perseguiu? — Uma furia devastadora cintilou nos olhos do Sebastian. Cam, que tinha estado exposto ao carater explosivo do Ivo Jenner durante anos, nao se alterou. — Era desnecessario, no meu entender. Nao voltara. — Nao te pago para que atue segundo seu julgamento. Pago-te para que atue segundo o meu. Deveria have-lo miseravel ate aqui pelo pescoco e deixar que eu decidisse o que fazer com esse bode. Cam permaneceu calado e dirigiu um olhar rapido e sutil a Evie, que se sentiu aliviada pelo giro que tinham dado as coisas. Ambos eram conscientes de que se Cam tivesse levado ao Bullard de volta ao clube, Sebastian o teria estrangulado, e o ultimo que queria Evie era que seu marido fosse acusado de assassinato. — Quero encontra-lo — disse Sebastian enquanto se passeava como uma fera enjaulada. — Empreitada a dois homens para que o busquem dia e noite. Juro que servira de exemplo para qualquer que pense sequer em lhe levantar um dedo a minha esposa. Me traga uma lista de nomes antes de uma hora. Os melhores detetives privados disponiveis. Nao quero a nenhum idiota desse novo corpo de policia que o danifique tudo como sempre. Venha, te mova. Embora sem duvida Cam tenia sua opiniao sobre o assunto, a guardou para o. — Muito bem, Milorde. — disse, e parto. — Nao tem por que desafogar sua raiva no Cam — disse Evie para acalmar a seu furioso marido enquanto retornavam a sala de leitura. — O… — Nao te ocorra tentar defende-lo-a interrompeu Sebastian. — Voce e eu sabemos que teria apanhado a esse rato de esgoto se tivesse querido. E que me crucifiquem se tolerar que lhe chame por seu nome de pilha; nao e seu irmao, e tampouco um amigo. E um empregado, e a partir de agora referira ao como senhor Rohan. — E meu amigo — replico Evie, indignada. — Faz anos que o e! — As mulheres casadas nao tem amizade com jovens solteiros. — Como te atreve a insultar minha honra insinuando que…? — A multidao de protestos que se amontoaram em seu interior a confundiram. — Nao tenho feito na… nada para merecer semelhante falta de confianca. — Confio em ti. De quem suspeito e de todos outros. Evie franziu o cenho, ja que imaginou que se estava zombando dela. — Falas como se me perseguisse uma matilha de homens. Mas no Stony Cross Park os homens se desviavam de seu Caminho para evitar encontrar-se comigo, e voce foi um deles. A acusacao, embora certa, pareceu surpreender ao Sebastian. Lhe esticou o rosto e a olhou com um silencio glacial. — Nao o punha nada facil para que alguem te aproximasse— soltou acontecido um instante. — A vaidade de um homem e mais fragil do que imagina. Confundimos com facilidade o acanhamento com a frieza, e o silencio com a indiferenca. Poderia te haver esforcado um pouco, sabe? Um breve

encontro, um sorriso teu… Era todo o estimulo que teria necessitado para me equilibrar sobre ti como um urogallo sobre o louro. Evie jamais o tinha te planejado este modo. A caso ela era em parte responsavel por seu escasso exito com os homens? — Suponho que poderia me esforcar um pouco por superar o acanhamento— admitiu. — Faz o que queira. Mas quando estiver com o Rohan ou qualquer outro homem, sera melhor que tenha presente que me pertence por completo. — Mas bom…— se surpreendeu Evie detras interpretar o comentario. — sera possivel que esteja ciumento? Os rasgos do Sebastian refletiram raiva mesclada com perplexidade. — Sim— admitiu com Isso brutalidade parece. E depois de um olhar de advertencia, saiu da quarto. O funeral se celebrou a manha seguinte. Sebastian tinha acertado nos preparativos, conseguindo equilibrar uma austera dignidade com uma ligeira pompa. Era a classe de cortejo que tinha encantado ao Ivo Jenner, tao numerosos que ocupou toda a largura do St. James. Havia uma limusine funebre negra e dourada, tirada por quatro cavalos, e duas carruagens para a comitiva, tirados tambem por quatro cavalos, com as bridas adornadas com penugens de avestruz tintas. O bonito ataude de carvalho, adornado com pregos de latao e uma placa reluzente com uma inscricao, estava forrado de chumbo e soldado para frustrar aos profanadores de tumbas, uma marca habitual nos cemiterios londrinos. Antes de que fechassem a tampa, Evie tinha visto um dos aneis de ouro do Cam no dedo de seu pai; um presente de despedida que a tinha emocionado. Quao mesmo quando tinha visto o Sebastian lhe arrumar o cabelo ao finado com um pente quando pensou que ninguem o olhava. Fazia muito frio e o vento transpassava a grosa capa de la de Evie em seu percurso a lombos de um cavalo cujas redeas sujeitava Sebastian, que Caminhava a seu lado. Duas duzias de homens que faziam as vezes de pajens e choferes fechavam o cortejo principal, e seu folego formava baforadas de bafo. Foram seguidos de uma grande quantidade de enfermos, uma curiosa mescla de pessoas enriquecidas, comerciantes, cavalheiros ostentosos e patifes declarados. Havia tanto amigos como inimigos. Mas dava igual a ocupacao ou a disposicao de alguem, terei que respeitar a tradicao do duelo. Esperava-se que Evie nao assistisse ao funeral, ja que se considerava que a natureza de uma dama era muito delicada para suportar uma realidade tao dura. Mas ela tinha insistido em participar. Encontrava consolo no ritual. Sebastian se havia oposto ate que Cam tinha intervindo. — Tera que liberar o Jenner das cadeias da dor de sua filha — havia dito a Sebastian quando a discussao subia de tom. — Os romanis acreditam que se alguem chorar muito a morte de um ser querido, o defunto se ve obrigado a voltar para consolar ao aflito. Se assistir ao funeral lhe permite deixa-lo partir… — E se encolheu de ombros prosaicamente. Sebastian o fulminou com o olhar.

— Fantasmas outra vez — resmungou com aborrecimento, mas nao voltou a mencionar o tema. Como tinha chorado ate ficar sem lagrimas, Evie conseguiu seguir estoicamente o funeral, inclusive quando comecaram a jogar terra sobre o ataude ja depositado na fossa. Entretanto, umas lagrimas lhe escorregaram pelas bochechas quando esteve totalmente abafado. Nesse momento Cam se adiantou com uma cigarreira chapeada e, segundo a tradicao romani, verteu solenemente um pouquinho de brandy sobre a tumba. O gesto zangou ao anciao pastor, que repreendeu ao Cam. — Detenha-se! Nao queremos nenhuma de seus costumes pagaos! Manchar um lugar santo com alcool barato… — Pai — o interrompeu Sebastian lhe pondo uma mao no ombro— , nao acredito que a nosso amigo Jenner tivesse importado. — Deixou que um sorriso conspirador lhe ilumina-a o rosto antes de acrescentar: — E conhaque frances, e de uma colheita excelente. Possivelmente poderia lhe enviar umas garrafas a sua residencia para degusta-lo…. O encanto do visconde acalmou ao pastor, que lhe devolveu o sorriso. — Muito amavel, Milorde. Obrigado — disse. Embora a maioria de enfermos ja se foi, ainda ficavam umas quantas pessoas pulverizadas pelo cemiterio. Enquanto Sebastian falava com o pastor e Cam terminava o ritual do brandy, Evie percorreu com o olhar as fachadas das lojas, as casas e a fabrica que rodeavam a praca. A cara de um homem de pe junto a uma luz ao outro lado da praca captou sua atencao. Ia vestido com uma jaqueta escura e uma boina cinza, e nao o reconheceu ate que esbocou um sorriso. Era Joss Bullard. Ao parecer, tinha querido apresentar seus respeitos ao Ivo Jenner, embora de longe. Entretanto, nao parecia um homem triste, mas sim tinha um aspecto malevolo, com uma careta de maldade. Sem deixar de olha-la, passou-se um dedo pelo pescoco num gesto que a Evie fez dar um involuntario passo atras. Sebastian o advertiu e se voltou para sujeita-la pelos ombros com as maos enluvadas. — Evie — murmurou, olhando-a com preocupacao. — Esta bem? Ela assentiu com a cabeca e dirigiu de novo o olhar para a luz. Bullard ja nao estava. — So tenho algo de frio — respondeu, e os dentes lhe tocaram castanholas quando um golpe de vento lhe tirou o capuz da cabeca. Sebastian voltou a colocar lhe e lhe rodeou mais a capa. — Levarei-te a clube — disse. — Darei umas moedas aos pajens e choferes e vamos. Tirou uma bolsinha de pele do sobretudo e se dirigiu para o grupo de homens que esperava respeitosamente perto da tumba. Ao captar o olhar de ansiedade de Evie, Cam se aproximou. — Acabo de ver Bullard — informou ela em voz baixa. — Ai, junto a luz. O jovem romani pareceu surpreender-se, e assentiu em silencio. Nao tiveram ocasiao de falar mais, pois Sebastian retornou e rodeou os ombros de Evie. — A carruagem esta esperando — anunciou. — Nao era necessario que ordenasse uma carruagem — protestou ela. — Poderia ter ido andando. — pedi que preparem o esquenta-pe — repos ele. E ao Cam: — Veem na carruagem conosco. — Obrigado, mas prefiro Caminhar.

— Veremo-nos no clube entao. — Muito bem, Milorde. Enquanto se dirigiam para o carro, Evie se obrigou a nao voltar-se para olhar ao Cam. Conseguiria encontrar ao Bullard, e o que passaria se o fazia? Pisou no degrau para subir ao veiculo e, uma vez em seu interior, apressou-se a arrumar o vestido sobre o esquenta-pe e se estremeceu de agrado quando o calor lhe subiu para os joelhos. Sebastian se sentou a seu lado e lhe sorriu levemente. Recordou sua disparatada viagem a Gretna Green e lhe pareceu que tinha passado uma eternidade. Se aconchegou contra seu marido, que nao tentou aparta-la. — aguentaste bastante bem — comentou ele quando a carruagem arrancou. — foi o cortejo funebre mais elaborado que vi. A papai teria encantado. Sebastian soprou, divertido. — Decidi pecar por excesso, com a esperanca de que lhe teria gostado de — explicou, e acrescentou: — amanha farei que esvaziem os aposentos de seu pai. Do contrario, nunca nos liberaremos do aroma de enfermidade. — Boa ideia. — O clube reabrira suas portas a semana que vem. Para entao deveria estar comodamente instalada em minha casa da cidade. — Como? — Surpreendida, Evie se incorporou para olha-lo. — a do Mayfair? — Esta bem equipada e dotada de pessoal eficiente. Se voce nao gostar, encontraremos outra coisa. Mas ate entao tera que ficar ai. — Pensa viver comigo? — Nao. Seguirei no clube. Assim me sera mais comodo dirigi-lo tudo. Evie se esforcou por desentranhar sua aparente indiferenca. Qual era a razao dessa repentina frieza? Nao lhe tinha causado nenhum problema, tinha lhe pedido poucas coisas, inclusive em sua dor. Desconcertada e zangada, olhou-se as maos e entrelacou os dedos enluvados. — Quero ficar — afirmou em voz baixa. — Nao ha nenhuma razao para isso — replicou Sebastian de uma vez que sacudia a cabeca. — Nao e necessaria. Sera melhor para todos que viva num lar como Deus manda, onde possa receber a suas amigas e de noite nao despertem as atividades da planta baixa. — Durmo profundamente. Isso nao me incomoda. E posso receber a minhas amigas no clube. — Nao abertamente. Dava igual a tivesse razao. Evie guardou silencio enquanto as palavras nao e necessaria lhe retumbavam desagradavelmente na cabeca. — Quero que viva num entorno seguro e respeitavel — prosseguiu Sebastian. — O clube nao e lugar para uma dama. — Nao sou nenhuma dama — objetou Evie, e tentou adotar um tom ironico. — Sou a filha de um jogador e a mulher de um libertino. — Razao de mais para te afastar de minha influencia. — De todos os modos, nao irei. Talvez poderiamos discuti-lo ao chegar a primavera, mas ate entao… — Evie — disse Sebastian em voz baixa. — Nao te estou dando a escolher. Ficou rigida e se separou dele. Nenhuma quarto inteira cheia de esquenta-pe teria acabado frio que lhe percorria as veias. Procurou ansiosamente argumentos para dissuadi-lo, mas ele tinha razao,

nao havia nenhum motivo para que ficasse no clube. Lhe fez um no na garganta e pensou que ja deveria estar acostumada a que nao a quisessem, a estar sozinha. Por que lhe seguia doendo? OH, como gostaria de ser como Sebastian e ter uma capa de gelo protetor ao redor do coracao! — E nosso trato? — perguntou cabisbaixa. — vais ignorar o O…? — Disso nada. Vou levar uma vida de monge ate que chegue o momento de cobrar meu premio. Inclusive me resultara mais facil resistir a tentacao se nao te tiver perto. — Talvez sou eu quem nao resiste a tentacao — murmurou Evie. — Possivelmente encontre um cavalheiro complacente que me faca companhia. Nao te importaria, verdade? Ate que as palavras lhe sairam dos labios, jamais se teria acreditado capaz de dizer algo assim. Entretanto, em meio de seu desespero sentia um impulso irresistivel de machuca-lo e faze-lo raiva r. Mas nao o obteve. Depois de um breve silencio, ouviu sua resposta aveludada. — Absolutamente, encanto. Seria egoista por minha parte te negar semelhante diversao em suas horas de ocio. Faz o que queira, sempre e quando estiver disponivel quando eu te necessite. Detras das ruas de moda e dos lugares respeitaveis das zonas enriquecidas de Londres, havia um mundo oculto de becos e edificios ruinosos, onde a gente vivia em uma miseria atroz. O crime e a prostituicao eram as unicas formas de sobrevivencia nessas zonas. O ar estava carregado de aroma de desperdicios e aguas residuais, e os edificios estavam tao apertados que em alguns pontos um homem so podia passar entre eles andando de lado. Cam se aventurou nesse complexo labirinto de ruas, consciente dos multiplos perigos e armadilhas que esperavam ao visitante despreparado. Entrou num patio atraves de um Caminho arvoredo de uns trinta metros de comprimento e tres de largura. Estava talher de estruturas altas de madeira, cujos contrafortes superiores tampavam o ceu invernal. Os edificios eram albergues ou casas de beneficencia onde os indigentes, amontoados, dormiam amontoados como os cadaveres de uma fossa comum. Uns retalhos de tecido putrido pendiam dos contrafortes. Os ratos percorriam as paredes e desapareciam nas gretas dos alicerces. O patio estava vazio salvo por um par de garotas sentadas em uma soleira, e varios meninos esqualidos que procuravam trastes, ossos ou farrapos. Depois de dirigir um olhar receoso ao Cam, os meninos desapareceram pelo fundo do patio. Uma das jovens prostitutas de cabelo encaracolado sorriu, deixando ao descoberto uma dentadura irregular. — O que faz um moco tao atrativo como voce no Angman’s Court? — Estou procurando um homem moreno, assim de alto. — Cam fez um gesto para indicar um metro setenta. — Passou por aqui faz um momento? As garotas riram. — Olhe o que quer — exclamou uma delas com regozijo. — E um estranho — disse a outra. — Vamos, carinho, nao necessita a nenhum homem quando poderia estar com o Lushing Lou. — Se baixou a blusa para mostrar um torax esqueletico e uns peitos escassos e cansados. — Veem mover a Cama comigo. Seguro que o faz muito bem, verdade? Cam se tirou uma moeda de prata do bolso. — me diga por onde se foi — pediu enquanto as mocas olhavam a moeda com avidez. — Direi lhe isso por outra moeda — disse uma. — Tem uns olhos preciosos. Nunca estive com um menino que… Uma gargalhada aspera retumbou no patio e se ouviu a voz zombadora do Joss Bullard. — Nao me encontrara, cigano asqueroso! Cam se voltou e escrutinou os edificios, onde apareciam varias caras manchadas de fuligem pelas

portas e janelas, e por cima dos telhados sem telhas. Nenhuma delas era reconhecivel. — Bullard — disse com cautela, girando o corpo a medida que percorria a cena com o olhar. — O que quer da filha do Jenner?-ouviu-se outra gargalhada desagradavel, ao parecer de outra direcao esta vez. Cam avancou pelo patio, incapaz de discernir onde estava Bullard. — quero das conta disso. — Que o diabo leve essa putinha! — Por que? — Porque essa sanguessuga me tirou isso tudo. Quero ve-la morta. Lancarei-a aos ratos para que so deixem os ossos. — Por que? — insistiu Cam, atonito. — Me pediu que te ajude, Joss, em que apesar a sua traicao. Quer te entregar o legado que te deixou seu pai para que tenha dinheiro e… — Que o diabo se leve a essa putinha! Cam sacudiu a cabeca, incapaz de entender de onde saia tanto ressentimento. Para ouvir um roce detras dele, agachou-se justo para que um pau arrojado violentamente passasse pelo lugar que tinha ocupado sua cabeca. O agressor nao era Bullard, a nao ser um homem que rebuscava nos lixos e que tinha decidido provar sorte como ladrao de becos. Tinha o caracteristico aspecto jovem e velho de uma vez de alguem que viveu na rua sempre. Cam o derrubou com um par de murros que deram com ele por terra. Uns quantos homens mais apareceram no outro lado do patio, ao parecer decididos a atacar em grupo. Em clara desvantagem numerica, Cam retrocedeu para a passagem arvorejado, seguido pela voz do Bullard. — Acabarei com ela! Farei-o! — Jamais a tocara! — replicou Cam com colera impotente enquanto dirigia um ultimo olhar ao Hangman’s Court. — Te mandarei ao inferno antes de que consiga lhe por um dedo em cima! — Pois voce me acompanhara! — desfrutou-se Bullard, e voltou a rir quando Cam ja se afastava. Mais tarde, Cam procurou o Evie. Sebastian estava atarefado com os carpinteiros encarregados de reparar as colunas da sala de jantar principal. Encontrou-a na sala de jogo vazia, revisando fichas e as separando em montoes. Aproximou-se dela sem fazer ruido. Evie se sobressaltou levemente quando lhe tocou o ombro, e sorriu aliviada ao ver que era ele. Era estranho que Cam parecesse preocupado, pois nao era nada dado a angustia ou a ansiedade. Entretanto, os acontecimentos do dia tinham deixado seu rastro e lhe tinham irradiado uma visivel tensao. — Nao consegui apanha-lo-se lamentou em voz baixa. — Se ocultou num edificio dos bairros baixos e me falou das sombras. Nada do que disse tinha sentido. Guarda-te muito rancor, gadji, embora nao entendo por que. Nunca foi um homem afavel, mas isto e distinto. E uma especie de loucura. Tenho que contar lhe ao St. Vincent. — Nao o faca, por favor. So serviria para po-lo furioso. Ja tem muitos coisas entre maos neste momento. — Mas se Bullard tratar de te machucar… — Aqui estou segura, nao? Nao se atrevera a vir ao clube. — Ha Caminhos secretos para entrar no edificio. — Pois fecha-os. Pode, nao? Cam enrugou o sobrecenho. — A maioria. Mas nao e questao de ir acima e abaixo com meu jogo de chaves… — Compreendo. Faz o que possa. — Passou os dedos por um montao de fichas desprezadas e acrescentou com ar taciturno: — Em realidade nao importa, porque irei logo. Meu marido quer que

me instale em sua casa daqui a quinze dias. Acredita que nao devo viver no clube agora que meu pai… — A voz lhe apagou com desconsolo. — Pode que tenha razao — disse Cam num tom habilmente desprovido de pena. — Nao e o lugar mais seguro para ti. — Nao o faz por minha seguranca. — Fez girar uma ficha negra como uma peonza no toalha de mesa verde. — O faz para que guardemos as distancias. O leve sorriso que apareceu nos labios do Cam a frustrou e a animou de uma vez. — Paciencia — lhe aconselhou Cam. E a deixou observando como a ficha girava ate que lhe acabava o impulso.

Capitulo 14 Evie se alegrou da atividade constante que houve no clube os seguintes quinze dias, ja que lhe permitiu distrair-se de sua dor. Quando disse ao Sebastian que queria ser util, ele a enviou ao escritorio a organizar e classificar a correspondencia e os documentos de contabilidade. Tambem teve que fiscalizar aos pintores, decoradores, carpinteiros e pedreiros em suas distintas tarefas, uma responsabilidade que a teria apavorado pouco tempo atras. Falar com tantos desconhecidos lhe supos um esforco lhe angustiem ao principio, e se passou uns dias tentando controlar sua gagueira. Entretanto, quanto mais frequentemente o fazia, mais facil lhe resultava. Ajudou-a que os trabalhadores a escutassem com um respeito que ninguem antes lhe tinha mostrado. O primeiro que fez Sebastian depois do funeral do Ivo Jenner foi consertar uma reuniao com o chefe de policia para comentar o recente endurecimento da legislacao sobre o jogo. Com encanto e persuasao, argumentou que o Jenner’s era um clube social e nao unicamente um clube de jogo. Portanto, devia ficar isento das jogadas a rede policiais, ja que seus membros eram, como Sebastian afirmou com solenidade, homens de notavel integridade. Convencido por sua engenhosa logica, o chefe de policia prometeu que nao teria jogadas a rede no Jenner’s sempre e quando mantivera uma aparencia de respeitabilidade. — Estou comecando a acreditar em sua capacidade de persuadir a qualquer de fazer quase algo — lhe comentou Cam Rohan com admiracao ao inteirar-se de seu exito. — Parece-me que lady St. Vincent e prova disso — comentou Sebastian sorrindo lhe a Evie, sentada perto dele. Sebastian e Cam pareciam ter estabelecido uma alianca provisoria a efeitos de recuperar o bom funcionamento do clube. Suas relacoes nao eram o que se diz amistosas, mas tampouco hostis. Cam tinha tomado nota da capacidade de lideranca do Sebastian, que resultou providencial os dias posteriores ao falecimento do Ivo Jenner. Sebastian, por sua parte, tinha abandonado seu ar de indolencia aristocratica e assumido a dava reccion do clube com determinacao e autoridade. Como cabia esperar, Sebastian era a classe de homem que os empregados do clube desprezavam e, ao principio, consideraram-no um mais dos pardais ou frangos que foram ao clube. Acreditavam que era um aristocrata mimado e autocomplacente que nao tinha ideia de trabalhar. Era provavel que todos supor, como Evie fazia, que Sebastian se cansaria logo da responsabilidade de dirigir o local. Entretanto, ninguem se atreveu a desafia-lo quando foi evidente que me despediria de qualquer que nao obedecesse suas ordens. Mostra-a mais efetiva de sua autoridade foi a forma em que tinha jogado sumariamente ao Clive

Egan. Alem disso, nao podia nega-la entrega sincera do Sebastian. Interessava-se por tudo, da cozinha ate os custos recortados da sala de jogos. Como ainda tinha muito que aprender de seu funcionamento, propos-se compreender as matematica do jogo. Evie se aproximou uma noite a sala de jogos e encontrou ali a Sebastian e Cam na mesa central enquanto este ultimo lhe explicava como efetuar o calculo de probabilidades. — So ha trinta e seis combinacoes possiveis de dois jogo de dados, e cada dado tem seis caras. Quando se lancam dois jogo de dados de uma vez, a combinacao resultante recebe o nome de probabilidade acumulada, e as probabilidades de que saia sao de trinta e cinco a um. — deteve-se e dirigiu um olhar inquisitivo a Sebastian. — Continua — pediu este. — Como qualquer jogador sabe, a soma das duas caras de barriga para cima se chama ponto. Dois uns somam um ponto de dois. Dois e seis somam um ponto de doze. Mas as probabilidades de tirar um numero concreto variam, ja que so ha uma forma de obter um dois, mas ha seis formas de obter um ponto de sete. — Sete e um numero natural — murmurou Sebastian com cenho de concentracao. — E como o maior numero de combinacoes dara um natural, a probabilidade de tirar um sete em uma tiragem e de… — De dezesseis por cento — apontou Cam de uma vez que recolhia os jogo de dados. Seus aneis de ouro captaram a luz quando fez a tiragem para o outro lado da mesa. Depois de ricochetear no bordo negro, os jogo de dados de marfim se detiveram no toalha de mesa verde. As duas caras mostravam um seis. — Por outro lado, a probabilidade de tirar um doze e so do duas virgula sete por cento. E, e obvio, quantas mais vezes lancas os jogo de dados, mais aumenta a probabilidade. Assim para quando os atiraste cento e sessenta e seis vezes, a probabilidade de tirar um ponto de doze e do noventa e nove por cento. Nesse caso, a probabilidade sera distinta para outros pontos, claro. Posso acostumar lhe sobre um papel; desse modo e mais facil de entender. Dispoe-se de uma grande vantagem quando se sabe calcular as probabilidades. Poucos jogadores o fazem, e isso e o que distingue aos trapaceiros dos pardais. O jogo de azar nao e equitativo, nem sequer quando se joga honestamente, e a vantagem esta acostumada ser dos bancos em… — interrompeu-se ao ver chegar a Evie. Um sorriso lhe brilhou nos olhos. — boa noite, milady. Sebastian torceu o gesto ao ver o ar de familiaridade que havia entre ambos. — boa noite — murmurou Evie, e se sentou junto a Sebastian. Olhou-o sorridente. — Lhe dao bem os numeros? — Sempre tinha acreditado que sim— respondeu ele. — ate agora. Rohan, outros crupiers sao peritos no calculo de probabilidades? — O suficiente, Milorde. Todos eles sabem como induzir a um jogador a apostar de forma vantajosa para a casa, como distinguir a um bom jogador de um mau… — Quem lhes ensinou? — perguntou Evie. O sorriso do Cam mostrou um surpreendente brilho branco em seu rosto de tez morena. — Eu, e obvio. Ninguem conhece o jogo tao bem como eu. — Ao menino so lhe falta confianca em si mesmo — observou Evie a seu marido com um sorriso. Mas Sebastian nao reagiu a brincadeira. Em lugar disso, disse com brutalidade ao Cam: — Quero uma lista, em ordem descendente, de todos os emprestimos pendentes de pago com suas datas de vencimento. O livro contavel esta na prateleira de acima do escritorio. Comeca agora mesmo. — Sim, Milorde.

E, com uma pequena reverencia a Evie, partiu com sua graca e agilidade habituais. Ao ficar com seu marido na sala de jogo meio as escuras, Evie sentiu um aperto no ventre. Os dias anteriores, seus encontros tinham sido frequentes mas impessoais, e estranha vez tinham estado a sos. Inclinou-se para a mesa e recolheu os jogo de dados para guarda-los num estojo de pele. Ao endireitar-se, a mao do Sebastian lhe acariciou as costas. Seu contato lhe arrepiou o pelo da nuca. — E tarde — murmurou ele. — Deveria descansar. Tem que estar exausta depois de tudo o que tem feito hoje. — Tampouco tenho feito tanto. — encolheu-se de ombros, inquieta, e Sebastian voltou a lhe passar a mao devagar pelas costas. — E claro que sim. Esta-te excedendo, carinho. Evie sacudiu a cabeca. — Alegra-me ter a oportunidade de trabalhar — conseguiu dizer face ao dificil que lhe resultava pensar com claridade quando seu marido a tocava. — Me impede de pensar muito em… em… — Sim, sei. Por isso o permiti. — Rodeou lhe a nuca com os dedos e a Evie faltou o folego. — Precisa te deitar — acrescentou ele, e a aproximou para ele. Dirigiu lhe devagar o olhar para os peitos, voltou a subi-la para a cara e soltou um risinho amarga— E eu preciso me deitar contigo, maldita seja. Mas como nao posso… Veem aqui. — Para que? — perguntou Evie enquanto ele a sujeitava contra a borda da mesa e encaixava as pernas entre as dobras do vestido. — Quero te torturar um pouco. Evie deu um pulo. — Me… — esclareceu-se garganta— imagino que diz tortura em sentido figurado. — Literal, temo-me. — Como? — Meu amor — disse ele com docura. — Suponho que nao esperara que durante estes tres meses o sofrimento seja so meu. Te apoie em mim. — Onde? — Onde queira. — Esperou ate que, indecisa, lhe pos as maos na jaqueta de la fina. Entao a olhou fixamente aos olhos. — vou avivar em ti o mesmo fogo que me consome, Evie. — Sebastian… — Tentou escapar, mas ele a imobilizou com mais forca contra a mesa. — Tenho direito a lhe beijar — lhe recordou. — Tudo o que queira e tao frequentemente como quero. Esse foi nosso trato. Ela dirigiu um olhar nervoso ao redor. — Importa-me um cominho que alguem nos veja — lhe disse ele. — E minha esposa. — E se inclinou para lhe acariciar a bochecha. — Meu premio. Meu prazer e minha dor. Meu desejo infinito. Nunca conheci a alguem como voce, Evie. — Rocou lhe a ponte do nariz com os labios. — Te atreve a me exigir coisas que nenhuma outra mulher ousaria. De momento pagarei esse preco, carinho. Mas depois voce pagara o meu, multiplicado por mil. Tomou os trementes labios com os seus enquanto lhe sujeitava a nuca com uma mao. Era um homem ao que gostava de beijar quase tanto como o proprio ato sexual. O beijo comecou sendo o roce suave e seco de uns labios fechados e foi aumentando de pressao ate lhe abrir devagar a boca. Evie notou a invasao sutil de sua lingua. Jogou atras a cabeca para apoia-la, impotente, na palma de sua mao enquanto a repentina batida de seu coracao lhe bombeava o sangue a toda velocidade. Sebastian a beijou com ardor. Acariciou lhe brandamente os peitos enquanto com o polegar lhe buscava o mamilo atraves do

grosso espartilho. Ansioso, separou os labios de sua boca e os deslizou pelo pescoco ate lhe encontrar o pulso. Evie lhe esticaram as pernas e o aferrou pelos ombros para nao perder o equilibrio. Sebastian suspirou e a atraiu com mais forca para seu corpo. Quando voltou a beija-la, ela ja nao pode conter os gemidos de suplica enquanto se excitava mais e mais. Para ouvir um pigarro incomodo, Evie interrompeu o beijo e soltou um gritinho afogado. Sebastian, compreendendo que tinha entrado alguem na sala, recostou lhe a cabeca em seu peito e lhe acariciou a bochecha ruborizada com um dedo. Falou com frieza enquanto Evie ouvia como o coracao lhe pulsava com forca. — O que ocorre, Gully? — Perdoe, Milorde — respondeu sem folego Jim Gully, um dos membros do pessoal da sala de jogo— , temos problemas. Os carpinteiros encontraram uma garrafa de rum e estao os tres como cubas. Comecaram a brigar na cafeteria. Dois deles se ataram a murros e o outro esta rompendo os pratos do aparador. — lhe diga ao Rohan que se ocupe disso — ordenou Sebastian. — O senhor Rohan diz que esta ocupado. — Ha uma briga de bebados e esta muito ocupado para tomar cartas no assunto? — perguntou Sebastian incredulo. — Sim, Milorde. — Pois voce encarregue-se. — Nao posso, Milorde. — Levantou um dedo enfaixado. — Ontem pela tarde me rompi o nodulo em uma briga no beco. — Onde esta Hayes? — Nao sei, Milorde. — Esta-me dizendo que, de trinta empregados que trabalham aqui, nao ha nenhum disponivel para impedir que os carpinteiros destrocem a cafeteria quando deveriam estar reformando-a? — exclamou Sebastian. — Sim, Milorde. Na pausa furiosa que seguiu a resposta do Gully, os ruidos de porcelana rompendo-se e de moveis estrelados contra as paredes fizeram tilintar levemente as aranhas do teto. Uns gritos incompreensiveis acompanhavam o estrondo a medida que a rixa se intensificava. Sebastian apertou os dentes. — Que diabos lhe estao fazendo a meu clube? — disse Evie. Confundida, sacudiu a cabeca e olhou o rosto colerico de seu marido e logo o cuidadosamente inexpressivo do Gully. — Chama-o rito de iniciacao— disse Sebastian, e partiu a passo rapido. Evie se recolheu o vestido e correu atras dele. Rito de iniciacao? A que se referia? E por que nao intervinha Cam? Seguiu Sebastian procurando nao tropecar com o vestido. O ruido ressonou mais forte quando se aproximava do reduzido grupo de homens reunidos na cafeteria, cujos gritos e exclamacoes enchiam o ar. Sebastian se tirou a jaqueta e a deu a alguem antes de abrir acontecer com empurroes para a briga. No centro da carriola, tres homens se davam murros e se empurravam enquanto os espectadores os animavam entusiasmados. Sebastian se aproximou estrategicamente ao opositor que tinha mais dificuldades para manter-se de pe, fez-o girar e lhe atirou um par golpes que o tombaram sobre o tapete. O par restante se voltou contra Sebastian. Um deles tentou lhe sujeitar os bracos enquanto o outro o ameacava com os punhos. Evie soltou um grito de alarme, que, de algum modo, chegou para ouvidos do Sebastian por cima

do estrepito geral. Dirigiu a vista para ela e nesse instante um dos carpinteiros o segurou brutalmente pelo pescoco. Desta guisa, o outro comecou a lhe aticar na cabeca. — Nao! — gritou Evie, e tentou avancar para seu marido, mas um braco ferreo a reteve pela cintura. — Espera — lhe disse uma voz conhecida ouvido. — lhe De uma oportunidade. — Cam! — voltou-se como uma possessa e o olhou com olhos cheios de panico. — Lhe farao mal — disse com desespero. — va ajuda-lo, Cam. Tem que faze-lo… — Ja se soltou — observou o jovem romani brandamente. Olhe, nao o esta fazendo mal. Um dos opositores lhe lancou um potente muito direito, mas Sebastian se agachou e lhe respondeu com um murro rapido. — Cam, por que diabos nao vai ao A… lhe ajudar? — Nao posso. — Sim que pode! Voce esta acostumado a brigar, muito mais qu… que ele. — Tem que faze-lo ele — explicou Cam com calma. — Em caso contrario, nao tera nenhuma autoridade. Os empregados do clube tem uma ideia da lideranca que exige acao alem de palavras. St. Vincent nao pode lhes pedir que facam algo que nao esteja disposto a fazer ele mesmo. E ele sabe. Do contrario, nao estaria encetado com esses tipos. Evie se tampou os olhos quando um carpinteiro se aproximou de seu marido por detras enquanto o outro lhe soltava uma serie de golpes ao peito e a cara. — So lhe serao leais se sabe usar os punhos em uma ridicula exibicao de forca bruta? — Basicamente, sim. Querem ver de que massa parece. Tranquila, tudo ira bem — comentou com voz divertida. Ela nao o suportava. Estremecia-se e se retorcia com cada impacto, com cada grunhido de dor. — Isto e insuportavel — gemeu. — Cam, por favor… — Ninguem o obrigou a se despedir do Egan e dirigir o clube ele mesmo — assinalou. — Forma parte do trabalho, ceu. Ela o entendia. Seu pai tinha participado de numerosas brigas a maior parte de sua vida. Mas Sebastian nao tinha nascido para isso; nao possuia a brutalidade necessaria nem o gosto pela violencia que distinguiam ao Ivo Jenner. Entretanto, quando teve deitado a outro carpinteiro e se encarou com cautela ao ultimo adversario em pe, foi evidente que, tanto se formava parte de seu carater como se nao, estava disposto a demonstrar sua valia. O bebado se precipitou para ele, e Sebastian o derrubou com uma combinacao rapida: dois gancho de esquerda e um de direito. O tipo caiu no chao com um gemido, e o publico celebrou a vitoria de seu chefe com gritos de aprovacao e aplausos. Sebastian, que recebeu a aclamacao com um gesto serio da cabeca, viu que o braco protetor do Cam rodeava a Evie e seu semblante se escureceu. Alguns dos entusiastas espectadores ajudaram a sair aos aturdidos carpinteiros. Outros foram procurar vassouras e cubos para limpar o lugar. Todos dirigiam olhadas muito mais simpaticas que antes a Sebastian. Enquanto se secava um hilillo de sangue da comissura dos labios com a manga da Camisa, este se agachou para recolher uma cadeira queda. Cam se aproximou de felicita-lo. — Briga como um cavalheiro, Milorde.

— Devo toma-lo como um completo? — ironizou Sebastian. — Faz-o bastante bem contra um par de bebados — observou Cam, imaculavel. — Havia tres ao comecar — grunhiu Sebastian. — Tres bebados, entao. Mas pode que a proxima vez nao tenha tanta sorte. — A proxima vez? Se acredite que vou tomar me isto por costume… — Jenner o fazia — replicou Cam. — Egan tambem. Quase cada noite ha alguma confusao no beco, na quadra ou nas salas de jogo. E normal, ja que os clientes dedicam horas ao jogo, o alcool e as mulheres. Encarregamo-nos disso por turnos. Se nao querer que lhe deixem maltratado uma vez a semana, tera que aprender alguns truques para acabar rapidamente com uma briga. Saem menos machucados voce e os clientes, e mantem afastada a policia. — Se referir as artimanhas que se usam nas brigas do suburbio e nas rixas de becos… — Pensa praticar meia hora diaria num clube pugilissimo? — repos Cam, mordaz. Sebastian foi replicar, mas ao ver que Evie se aproximava ansiosa, algo lhe trocou na cara. Por alguma razao, a preocupacao de sua mulher o sossegou. — Machucaram lhe? — perguntou ela, nervosa. Sebastian estava desalinhado e irritado, mas nao parecia ferido. Ele negou com a cabeca e deixou que lhe apartasse umas mechas suadas que quase lhe tampavam os olhos. — Estou bem — murmurou. — Em comparacao com a surra que me deu Westcliff, isto nao foi nada. — Esperam lhe mais surras se nao aceitar algumas sugestoes sobre como brigar — atravessou Cam. E sem mais se dirigiu para a porta e chamou: — Dawson! Veem aqui um momento. Nao, nao para trabalhar. Necessitamos que lhe de uns quantos golpes ao St. Vincent. — voltou-se para o Sebastian e comentou com inocencia. — Va, nao se tem feito de rogar. Vem correndo. Evie conteve um sorriso e se retirou para o canto, ja que compreendeu que a intencao do Cam era ajudar a seu marido. Se Sebastian insistia em brigar cavalheirescamente, nao teria nada que fazer no clube. Dawson, um empregado jovem e fornido, entrou na cafeteria. — Dawson e nosso melhor lutador — observou Cam. — Lhe ensinara algumas manobra basicas para tombar a um homem. Dawson, lhe faca um cruzado especial. Mas suave, nao vas romper lhe as costas. Dawson, que parecia encantadissimo de ter aquela oportunidade, atacou-o com decisao, segurou lhe o pescoco com um braco rolico, tomou o braco livre e o passou por cima do ombro, o que fez que Sebastian se girasse violentamente e aterrissasse de costas com um grunhido de dor. Dawson ia saltar lhe sobre o abdomen, mas Cam intercedeu para refrear seu impeto. — Ja esta bem, Dawson. E suficiente por agora. Obrigado por sua colaboracao. Evie o observou tudo com um punho fechado sobre a boca. Cam se inclinou para ajudar Sebastian a levantar-se, mas este rechacou a mao que lhe tendia e ficou de pe por seus proprios meios. Logo olhou ao Cam com uma expressao tao seria que teria intimidado a qualquer homem. Cam, entretanto, falou com naturalidade: — E um movimento bastante simples. Quando estiverem de lado, rodeie o pescoco do outro com o braco, lhe sujeite o braco, mova o corpo assim e seu oponente caira sem jeito. Segundo a forca com que o golpeie contra o chao, nao podera mover-se durante varios segundos. Vamos, prove comigo. Ao praticar a manobra no Cam, Sebastian se conteve cavalheirescamente. Aprendeu depressa, e

tombou ao jovem cigano com uma estranha mescla de eficiencia e relutancia. — Nao posso lutar desta forma — resmungou. — Se o sujeitarem por detras — disse Cam, que ignorou seu comentario— , normalmente podera soltar-se com um cabacada para tras. Comece com a cabeca agachada, com o queixo para o peito. Aperte os dentes, mantenha a boca fechada e lance a cabeca para tras com forca, para a cara de seu adversario. Nao faz falta que apontamento. E para o cabacada para diante… Tem-no feito alguma vez? Nao? Bom, o truque consiste em olhar fixamente aos olhos do competidor ao faze-lo. Aponte a uma parte branda da cara; nao o dirija nunca contra a fronte ou o cranio. Use o peso de seu corpo e procure golpear com a parte baixa da fronte. Sebastian suportou a licao a contra gosto, enquanto os dois homens mais jovens lhe ensinavam golpes no pescoco, patadas e outras tecnicas para atacar os pontos vulneraveis da anatomia humana. Participou quando o pediram e mostrou umas aptidoes fisicas que pareceram agradar ao Cam. Entretanto, quando o romani comecou a lhe explicar diversas maneiras de dar chutes na virilha, Sebastian ja nao aguento mais. — Basta — grunhiu. — Se acabou, Rohan. — Mas ainda ha algumas coisas… — Nao importa. Cam intercambiou um olhar com o Evie, que se encolheu de ombros e sacudiu ligeiramente a cabeca. Nenhum dos dois entendia o que tinha provocado sua irritacao. Passado um momento, Cam despediu de Dawson com umas palavras de elogio. Voltou-se depois para o Sebastian, que se alisava a jaqueta com raiva logo que contida. — Qual e o problema, Milorde? — perguntou com calma. — Nunca pretendi ser um modelo de virtudes — respondeu Sebastian detras soprar. — E no passado tenho feito coisas que ruborizariam ao muito mesmo diabo. Mas ha certas coisas as que nem sequer eu poderia me rebaixar. Os homens de minha posicao nao dao patadas, joelhadas na virilha nem cabacadas quando brigam. E tampouco golpeiam o pescoco, fazem a rasteira ou, Deus me libere, atiram do cabelo. Embora Evie teria acreditado impossivel que os olhos do Cam tivessem um aspecto frio, de repente pareceram de ambar. — Qual e exatamente sua posicao, se nao lhe incomodar que o pergunte? — soltou o jovem cigano com certa mordacidade. — E nobre? Nao vive como tal. Dorme num clube de jogo, em um quarto que recentemente ocupavam um par de prostitutas. E um homem delicado? Acaba de brigar com um par de idiotas bebados. E um pouco tarde para ficar exigente, nao acredite? — Critica-me porque tenho principios? — replicou Sebastian com frieza. — Absolutamente. Critico-o pelos ter dobre. Os romanis tem um dito: Nao pode montar dois cavalos com um so traseiro. Se quer sobreviver aqui, tera que muda. Nao pode fazer-se passar por um aristocrata diletante que esta por cima destas coisas. Esta tentando assumir um cargo que nem sequer eu poderia ocupar, caramba. Tera que tratar com jogadores, bebados, ladroes, mentirosos, chefes de turmas, advogados, policiais, e mais de trinta empregados que estao convencidos de que vai cavar a asa num mes. Agora que Jenner esta morto, ocupou seu lugar como um dos grandes de Londres. Todo mundo lhe pedira favores ou tentara aproveitar-se de voce, ou querera demonstrar que e superior a voce. E ninguem lhe dira toda a verdade. Sobre nada. Tera que agucar seus instintos e obter que a gente tema contraria-lo. Se nao, suas probabilidades de exito serao tao poucas que… — Era evidente que lhe teria gostado de prosseguir, mas a expressao do Sebastian pareceu lhe indicar

que era melhor calar-se. Passou-se a mao pelo despenteado cabelo azeviche e partiu. Passou comprido momento antes que Evie se atrevesse a aproximar-se de seu marido, que estava olhando fixamente a parede, absorto em seus pensamentos. Ela advertiu que, embora a maioria de gente estava acostumada parecer maior quando estava cansada e tensa, Sebastian tendia a parecer mais jovem. — Por que te obstinas? — murmurou olhando-o. — Nao e so pelo dinheiro. Que esperas encontrar neste lugar? As perguntas de Evie acenderam um brilho ironico nos olhos de seu marido. — Quando o souber, lhe comunicarei — resmungou isso.

Capitulo 15 A tarde seguinte, Sebastian entrou no escritorio para ver o Evie, que estava somando recibos e anotando quantidades num livro contavel. — Tem uma visita — lhe disse sem preambulo algum. Seus olhares se cruzaram por cima do montao de papeis. — A senhora Hunt. Evie o observou assombrada enquanto o coracao lhe dava um tombo. Tinha estado pensando se deveria escrever ou nao a Annabelle. Desejava ver suas amigas, mas tinha medo de que a tivessem condenado por haver-se fugido com o St. Vincent. Levantou-se devagar da cadeira. — Esta seguro de que nao se trata de outro engano? — Estou seguro — respondeu Sebastian com ironia. — Ainda me ressonam nos ouvidos suas acusacoes e improperios. Nem a senhora Hunt nem a senhorita Bowman concebem que nao te raptasse, violasse-te e te obrigasse a te casar comigo a ponta de navalha. — A senhorita Bowman? — repetiu Evie, e pensou que nao podia tratar-se de Lillian, ja que seguia de viagem de noivos com lorde Wescliff. — Tambem esta aqui Daisy? — E esta que remoi. Deveria lhes assegurar que atuou por vontade propria, porque ao parecer querem me denunciar a policia. — Nao posso me acreditar que tenham ousado vir aqui — comentou Evie, emocionada. — Estou segura de que o senhor Hunt nao sabe que Annabelle esta aqui. — Certamente — disse Sebastian. — Hunt nao permitiria que sua esposa me aproximasse de menos de dez quilometros. E os Bowman nao aprovariam que sua filha menor pusesse um pe num clube de jogo. Entretanto, conhecendo suas amigas, nao me cabe duvida de que terao planejado um perfido estratagema para ocultar seus atos. — Onde estao? Nao me diga que as deixaste na entrada de atras. — Estao na sala de leitura. Evie tinha tantas vontades de ver suas amigas que teve que conter-se para nao por-se a correr assim que saiu do escritorio. Dirigiu-se a passo rapido para a sala de leitura seguida do Sebastian. Cruzou a soleira e se deteve, insegura. Ai estava Annabelle, com seu cabelo dourado penteado em saca-rolhas e uma tez tao fresca como a das leiteiras idealizadas que apareciam nas latas de doces. Quando a conheceu, a tipica beleza inglesa de Annabelle a tinha intimidado tanto que nao se atreveu a falar com ela, convencida de que a desprezaria. Mas mais adiante tinha descoberto que Annabelle era carinhosa e amavel, com um senso de humor que lhe permitia rir ate de si mesmo.

Daisy Bowman, a irma menor de Lillian, possuia um carater decidido que contrastava com sua fragil e miuda figura. Idealista e fantasiosa, devorava novelas romanticas povoadas de patifes e vadios. Mas a aparencia delicada de Daisy ocultava uma inteligencia perspicaz que a maioria de gente estava acostumada passar por cima. De pele leitosa, tinha cabelo escuro e olhos cor gengibre… Uns olhos lhes picar de pestanas largas e grosas. Ao ver o Evie, suas amigas se precipitaram para ela com chiados improprios de umas damas. Evie soltou uma gargalhada enquanto se abracavam e se beijavam as bochechas, exultantes. As tres jovens seguiram exclamando e chiando emocionadas ate que alguem irrompeu no quarto. Era Cam, com os olhos exagerados e a respiracao rapida, como se o perseguissem. Percorreu toda a quarto com olhar alerta e logo se relaxou um pouco. — Maldita seja — resmungou. — Acreditei que passava algo. — Nao passa nada, Cam — disse Evie, a quem Annabelle seguia rodeando os ombros com um braco. — Sao minhas amigas que vieram para ver-me. — ouvi fazer menos ruido aos porcos no matadouro— observou Cam acidamente a Sebastian. A mandibula de este mostrou uma subita tensao, como se esforcasse por conter a risada. — Senhora Hunt, senhorita Bowman, apresento lhes ao senhor Rohan. Rogo lhes desculpem sua falta de tato, mas e que e… — Um rufiao? — sugeriu Daisy com inocencia. Esta vez Sebastian nao pode evitar sorrir. — ia dizer que e estranho que nos visitem damas. — E isso o que sao? — Cam dirigiu um olhar de duvida e fixou sua atencao no pequeno rosto de Daisy. — Tinha ouvido que os ciganos eram famosos por seu encanto — comentou Daisy a Annabelle, ignorando deliberadamente ao Cam. — Ao parecer, e uma crenca infundada. — Tambem somos famosos por nos levar donzelas gaji— replico Cam com os olhos entreabertos. Evie interveio antes de que o intercambio subisse de tom. — Se nao ter inconveniente — disse a seu marido— , eu gostaria de falar em privado com minhas amigas. — E obvio — acessou ele com impecavel cortesia. — Peco que lhes tragam cha, carinho? — Sim, por favor. Uma vez a sos, Daisy explorou: — Como pode falar cordialmente com o St. Vincent depois do que fez? — Daisy — repos Evie com tom contrito— , lamento tanto o que o p… passou ao Lillian, mas e… — Nao refiro a isso — a interrompeu acaloradamente Daisy. — Refiro ao que te tem feito a ti. Aproveitar-se de ti, te obrigar a te casar com ele e depois… — Nao me obrigou. — Evie dirigiu o olhar da cara indignada de Daisy a preocupada de Annabelle. — Lhes juro isso! Fui eu quem fui a ele. Nos sentemos e lhes contarei isso tudo. Como conseguistes ve… vir ao clube? — Meu marido esta de viagem de negocios — explicou Annabelle com um sorriso picasse. — E aos Bowman os pingente que levava a Daisy comigo de compras ao St. James’ Street. Sou seu acompanhante, sabe? — E fomos as compras — acrescentou Daisy com picardia. — So que depois demos este rodeio. Annabelle e Evie se sentaram no sofa, e Daisy em uma poltrona. Com alguns gagueiras, Evie lhes

contou o ocorrido desde que tinha abandonado o lar dos Maybrick. Para seu alivio, suas amigas nao a condenaram por seus atos. Em lugar disso, mostraram-se solicitas e pormenorizadas, inclusive apesar de que era evidente que nao estavam tudo bem com seu proceder. — Sinto-o — disse Evie num momento dado, ao ver como Annabelle franzia o cenho. — Sei que nao aprova meu matrimonio com lorde St. Vincent. — Da igual se o aprovar ou nao — comentou Annabelle com docura. — Seguirei sendo sua amiga faca o que faca. Nao me importaria embora te tivesse casado com o muito mesmo diabo. — por que falas em condicional? — perguntou Daisy. — A questao e que agora ja parece e queremos te ajudar — prosseguiu Annabelle detras dirigir um rapido olhar de advertencia a Daisy. — So necessito sua amizade — sorriu Evie agradecida. — Me dava muito medo perde-la. — Isso nunca. — Annabelle alargou a mao para lhe acariciar os cachos ruivos. — Espero nao ser impertinente, mas como deixou a casa de sua familia de um modo tao apressado, estou segura de que nao tera podido te levar muitos vestidos. Assim que te trouxe algumas coisas. Sei que esta de luto, e so inclui objetos marrons, negras e cinzas. E e obvio Camisolas, luvas e coisas assim. Pedirei que os entrem da carruagem. Temos quase a mesma estatura, e acredito que com uns poucos retoques… — OH, Annabelle — exclamou Evie de uma vez que rodeava a sua amiga com os bracos. — Que amavel e! Mas nao quero que seja… sacrifique parte de seu enxoval de noiva por mim. — Nao e nenhum sacrificio — disse Annabelle com um sorriso. — Em pouco tempo ja nao poderei leva-los. Evie recordou que no mes anterior Annabelle lhe tinha credulo suas suspeitas de que podia estar gravida. — Entendo… OH, Annabelle, estive tao pre… preocupada com meus problemas que nem sequer te perguntei como esta. E certo, pois? Confirmou-o o medico? — Sim— interveio Daisy, e se levantou para executar uma pequena danca da vitoria, como se lhe resultasse impossivel seguir quieta um segundo mais. — As solteironas vao ser tias! Evie tambem ficou de pe e ambas se menearam com regozijo infantil, enquanto Annabelle as olhava divertida. — Mas as olhe, Meu deus — disse. — Quem dera Lillian estivesse aqui. Seguro que faria algum comentario sobre sua amalucada celebracao. A mencao de Lillian bastou para empanar a euforia de Evie. Deixou-se cair de novo no sofa e olhou a Annabelle com preocupacao. — Perdoara-me por me haver casado com o St. Vincent depois do que lhe fez? — E obvio — respondeu Annabelle com docura. — Ja sabe quao leal e. Perdoaria-te algo, menos um assassinato. Pode que inclusive isso. Mas me temo que perdoar ao St. Vincent e outra coisa. Daisy franziu o cenho e se puxou do vestido para alisa-lo. — St. Vincent se inimizou com lorde Westcliff. O que nos complica as coisas. A conversacao se interrompeu enquanto uma criada servia o cha. Evie serve duas tacas para o Annabelle e para ela. Daisy declinou tomar cha e preferiu passear-se pela quarto para jogar uma olhada aos livros das prateleiras. Leu com atencao os titulos gravados nos lombos. — A maioria destes livros tem uma capa de po em cima — exclamou. — Se diria que faz anos que ninguem os le. Annabelle elevou os olhos com um sorriso gracioso. — Apostaria-me algo a que ninguem os tem lido. Nao e provavel que os cavalheiros que frequentam este clube se dediquem a leitura quando dispoem de tantas outras atividades mais

estimulantes. — Mas por que ter uma sala de leitura, se ninguem ler alguma vez? — disse Daisy. — Nao me ocorre nenhuma atividade mais estimulante que a leitura. Mas se as vezes, com alguma historia particularmente interessante, inclusive noto que o coracao me acelera. — Pois sim ha uma… — murmurou Annabelle com um sorriso malicioso. Mas Daisy, que seguia repassando as fileiras de livros, nao entendeu o significado de suas palavras. Com um olhar a Evie, Annabelle acrescentou em voz baixa: — E agora que tratamos o tema, Evie, preocupa-me que nao pudesse falar com ninguem antes da noite da lua-de-mel. Foi St. Vincent considerado contigo? Evie se ruborizou e assentiu com rapidez. — Como era de esperar, e muito perito — disse. — Mas foi atento? — Sim, acredito que sim. — E um tema incomodo, verdade? — perguntou Annabelle, sorridente, em voz baixa. — Mas se tiver alguma pergunta a respeito, aqui me tem. Sinto-me como se fora sua irma maior, sabe? — Eu sinto o mesmo — assegurou Evie, e lhe apertou a mao. — Suponho que ha um par de coisas que eu gostaria de perguntar, mas sao tao… — Nossa! — exclamou Daisy do outro lado da quarto. Ambas elevaram os olhos e a viram atirando de uma secao de estantes de mogno. — Quando me apoiei nesta prateleira, ouvi uma especie de clique e comecou a abrir-se. — E uma porta secreta — explicou Evie. — No clube ha varias portas que dao a Caminhos secretos, para esconder coisas se houver uma jogada a rede policial, ou se alguem tem que ir-se apressadamente… — Aonde leva este? — OH, a nenhum sitio ao que queira ir— disse vagamente Evie ante o temor de que explicar algo mais animaria a audaz Daisy. — E provavel que a um armario da limpeza. Sera melhor que o feche. — Mmm… Enquanto Daisy seguia examinando as prateleiras, Evie e Annabelle reataram seu bate-papo sussurrado. — O certo e que lorde St. Vincent aceitou p… passar um periodo de celibato por mim — anunciou Evie. — Se o conseguir, entao reiniciaremos nossas relacoes conjugais. — Como diz? — sussurrou Annabelle com os olhos exagerados. — meu Deus. Nao me acredito que St. Vincent e celibato tenham sido mencionados antes na mesma frase. Como diabos conseguiu convence-lo? — Disse… que me deseja o suficiente para tenta-lo. Annabelle sacudiu a cabeca, desconcertada. — Nao e proprio dele. Absolutamente. Trapaceara, e obvio. — Sim. Mas acredito que suas intencoes sao sinceras. — St. Vincent nunca e sincero — assegurou Annabelle ironicamente. Evie nao pode evitar recordar a urgencia se desesperada para o abraco do St. Vincent nessa mesma quarto. A forma em que seu folego lhe tinha acariciado o pescoco. A ternura apaixonada de seus beijos. E sua voz ao murmurar: Desejo-te mais que a nada neste mundo.. Como podia explicar lhe a Annabelle? Como podiam as palavras justificar que seu instinto lhe dizia que acreditasse? Era ridiculo pensar que ela, a desajeitada Evie Jenner, converteu-se de

repente no objeto mais desejado de um homem como Sebastian, que tinha estado com as mulheres mais formosas da Inglaterra. Entretanto, Sebastian nao era exatamente o mesmo homem que se passeou com tanta arrogancia pela mansao do Westcliff no Hampshire. Algo nele tinha trocado, e seguia trocando. Devia-se ao rapto fracassado de Lillian? Ou tinha comecado depois, durante a deprimente viagem a Gretna Green? Possivelmente o clube tinha algo que ver nisso. Comportava-se de um modo estranho do momento em que tinham posto os pes nele. Procurava algo que nao parecia poder explicar-se nem sequer a si mesmo. — OH, nao — disse Annabelle com tristeza, olhando alem de Evie. — O que acontece? — Evie se voltou. No quarto so estavam elas duas, e uma secao da estante estava aberta. Daisy, de maneira previsivel, tinha seguido os impulsos de sua curiosidade insaciavel e tinha cruzado a porta secreta. — Aonde conduz? — perguntou Annabelle com um suspiro, reacia a deixar o cha ao meio terminar. — Depende da direcao em que tenha ido — respondeu Evie com cenho. — E uma especie de Caminho labirintico que se bifurca, e ha escadas secretas que conduzem ao primeiro piso. Gracas a Deus o clube esta fechado; isso reduz os problemas em que poderia meter-se. — Recorda que se trata de Daisy Bowman — disse Annabelle com secura. — Se existir a menor possibilidade de meter-se em problemas, encontrara-a. Ao percorrer o escuro Caminho, Daisy sentia a mesma emocao que de menina, quando Lillian e ela jogavam a piratas em sua mansao da Quinta Avenida do Manhattanville. Uma vez concluidas suas licoes diarias, saiam ao jardim: um par de fantasias de diabo com trancas largas e vestidos rasgados que jogavam com aros e cavavam buracos nos canteiros de flores. Um dia lhes ocorreu criar uma cova pirata secreta, e se passaram todo o verao abrindo um tunel no sebe que bordeava a fachada e os lados da casa. Tinham-no talhado e podado diligentemente ate que tiveram um comprido canal, onde entravam e saiam como um par de ratinhos. Tinham celebrado reunioes secretas em sua cova pirata, e tinham guardado uma caixa de madeira cheia de tesouros num buraco cavado junto a casa. Quando o irado jardineiro descobriu sua maldade, horrorizado pela profanacao de seu sebe, Daisy e Lillian estiveram castigadas umas quantas semanas. Com um sorriso nostalgico ao recordar a sua querida irma maior, Daisy sentiu uma quebra de onda de solidao. Lillian e ela sempre tinham estado juntas, brigando, rendo, se metendo em confusoes e resgatando uma a outra. Naturalmente, alegrava-se de que Lillian tivesse encontrado a sua meia laranja no teimoso Westcliff, mas isso nao impedia que jogasse muitissimo de menos. E agora que as demais solteironas, incluida Evie, casaram-se, formavam parte do misterioso mundo conjugal do que ela seguia excluida. Logo encontraria um marido. Algum cavalheiro bom e sincero que compartilhasse sua paixao pelos livros. Um homem que levasse oculos, e a quem gostasse dos caes e os meninos. Avancava a provas pelo Caminho ate que quase caiu por um pequeno lance de escadas que se encontrou de repente. Um tenue brilho ao pe dos degraus a impulsionou a baixar. A medida que se aproximava da luz, viu que saia de uma porta entreaberta. Perguntando-se o que haveria ao outro lado, deteve-se e ouviu uns golpezinhos repetidos. Uma pausa, e mais golpezinho s. A curiosidade pode mais que ela. Empurrou a porta com decisao e esta cedeu. A luz encheu o Caminho enquanto ela entrava em um quarto que continha varias mesas e cadeiras, e um aparador com duas grandes bules de prata. Depois de rodear a porta viu a origem dos golpezinhos. Um homem em cocoras estava reparando uma moldura da parede e cravava pregos na madeira com marteladas

peritas. Ergueu-se de um salto e trocou a forma de sujeitar o martelo, para utiliza-lo como arma. Era o cigano, o jovem com olhos de pantera faminta. Tirou-se a jaqueta, o colete e a gravata, de modo que, de cintura para acima, so levava uma fina e folgada Camisa branca, remetida em umas calcas ajustadas. Ve-lo provocou no Daisy a mesma reacao que acima: uma pontada no peito seguida de uma aceleracao do coracao. Paralisada ao dar-se conta de que estava sozinha no quarto com ele, observou sem pestanejar como lhe aproximava devagar. Nunca tinha visto um homem de uma beleza tao exotica. Tinha a pele da cor do mel, uns olhos avela claro emoldurados por espessas pestanas negras, e um cabelo que lhe cobria parte da frente. Era muito magro, quase ossudo, mas sua compleicao larga e de ombros largos anunciava uma esplendida maturidade fisica quando alcancasse a idade adulta. — O que faz aqui? — quis saber Rohan, que nao se deteve ate estar tao perto que a fez retroceder instintivamente ate a parede. Na limitada experiencia de Daisy, nenhum homem se dirigiu a ela com tanta confianca. Era evidente que nao sabia nada sobre maneiras de salao. — So estou dando um passeio — balbuciou. — Ensinou lhe alguem o Caminho? Daisy viu como Rohan apoiava as maos na parede, uma a cada lado dela, Era um pouco mais alto que a media, mas nao em excesso, de modo que seu pescoco moreno ficava a altura dos olhos dela. — Nao; encontrei-o eu sozinha — explicou detras inspirar para ocultar seu nervosismo. — Tem um acento estranho. — E voce tambem. E americana? Assentiu com a cabeca, ja que se tinha ficado sem fala com ver o brilho de um diamante no lobulo da orelha do moco. Notou uma especie de no no estomago, quase como se sentisse repulsao, e se precaveu, consternada, de que se estava ruborizando. Ele estava tao perto que ela notava seu limpo aroma a sabao misturado com aroma de quadra e couro. Era um aroma agradavel, uma fragrancia masculina muito distinta da de seu pai, que sempre cheirava a colonia e betume, e a bilhetes de banco novos. Seu olhar inquieto percorreu os bracos do Rohan, que a Camisa arregacada deixava ao descoberto, e se deteve fascinada na figura que tinha desenhada com tinta no antebraco direito: um cavalinho alado de cor negra. Ao precaver-se, Rohan baixou o braco para que o visse melhor. — Um simbolo irlandes — explicou. — Um cavalo de pesadelo chamado Pooka. O som absurdo da palavra fez sorrir a Daisy. — dilui-se ao lava-lo? — perguntou com vacilacao. Rohan negou com a cabeca. — E parecido ao Pegasos dos mitos gregos? — quis saber Daisy, e se pegou ainda mais a parede. Rohan lhe olhou o corpo em uma especie de repasse lento que nenhum homem lhe tinha feito antes. — Nao. E mais perigoso. Tem os olhos amarelos como o fogo, da uns saltos que lhe permitem salvar montanhas e fala com uma voz humana profunda como uma gruta. A meia-noite, pode parar-se diante de sua casa e te chamar por seu nome se quer te levar a passear. Se for com ele, levara-te voando pela terra e pelo mar, e se alguma vez retorna, sua vida ja nao voltara a ser igual. Daisy lhe pos carne de galinha em todo o corpo. Todos seus sentidos lhe advertiam que pusesse fim a essa desconcertante conversacao e fugisse daquele homem a toda pressa. — Que interessante — resmungou, e se voltou em busca da porta. Para sua consternacao, Rohan a tinha fechado. A porta estava muito bem escondida nos paineis da parede. Assustada, pressionou

distintos pontos procurando o mecanismo de abertura. Tinha as Palmas suadas apoiadas num painel quando notou que Rohan se inclinava para ela por detras para lhe falar com ouvido. — Nao a encontrara. So ha um ponto que a abre. Seu folego quente lhe acariciava o lado do pescoco, e a ligeira pressao de seu corpo lhe dava calor onde a tocava. — Entao por que nao me diz qual e? — repos Daisy em sua melhor imitacao do sarcasmo de Lillian, embora lhe consternou ouvir que so soava insegura e perplexa. — O que me dara em troca? Daisy tratou de mostrar-se indignada, apesar de que seu coracao lhe palpitava desbocado. Voltou-se para olha-lo e lhe lancou um ataque verbal que esperava o fizesse retroceder. — Senhor Rohan, se esta insinuando que deveria… Bom, evidentemente nao e voce um cavalheiro. Ele nao se moveu nem um centimetro e esbocou um sorriso que deixou ao descoberto sua branca dentadura. — Quer dinheiro? — perguntou Daisy com desdem. — Nao. — Uma liberdade, entao? — sugeriu detras tragar saliva. Ao ver que nao a entendia, esclareceu com as bochechas ruborizadas: — Tomar-se liberdades e dar um abraco, ou um beijo… Algo perigoso brilhou nos olhos dourados do Rohan. — Sim — murmurou. — Tomarei liberdades. Daisy logo que podia acredita-lo. Seu primeiro beijo. Sempre o tinha imaginado como um momento romantico num jardim ingles ao claro de lua, e obvio. E um cavalheiro loiro de cara intelectual lhe diria algo bonito como um poema justo antes de que seus labios se juntassem. Nao se supunha que ia ocorrer num porao de um clube de jogos com um crupier cigano. Por outro lado, tinha vinte anos, e talvez ja ia sendo hora de que comecasse a acumular um pouco de experiencia. Tragou saliva de novo, lutou por dominar sua respiracao e contemplou a parte do pescoco e o torax que deixava ao descoberto a Camisa meio desabotoada do Rohan. A pele lhe brilhava como se fora de cetim ambar. Quando se aproximou mais a ela, seu aroma lhe alagou o nariz como se tratasse da fragrancia de uma especiaria. Rohan elevou uma mao para sua cara e, ao faze-lo, com os nodulos lhe rocou involuntariamente o peito. Aturdida, ela pensou que tinha que ter sido sem querer, enquanto o mamilo lhe contraia sob o corpete de veludo. A mao do Rohan lhe segurou com suavidade o rosto e o inclinou para cima. Enquanto lhe olhava as pupilas dilatadas, levou a ponta dos dedos aos labios e os acariciou ate que estiveram separados e trementes. Po lhe a outra emano depois da nuca para acariciar lhe e logo lhe apoiar nela a cabeca, o que foi muito oportuno, ja que toda sua coluna vertebral pareceu dissolver-se como acucar. Po lhe os labios sobre a boca com uma pressao tenra para explora-la com suavidade. Ela sentiu um prazer quente por todo o corpo, ate que ja nao pode resistir o anseia de apertar seu corpo contra o do moco. Ficou nas pontas dos pes, tomou os ombros com as maos e lhe cortou a respiracao quando lhe deslizou as maos pelo corpo. Quando por fim Rohan levantou a cabeca, Daisy descobriu, envergonhada, que estava obstinada a ele como um naufrago. Apartou com rapidez as maos e retrocedeu tudo o que lhe permitia a parede. Confusa e morta de calor por seu proprio comportamento, olhou-o carrancuda. — Nao hei sentido nada — disse com frieza. — Embora suponha que tera que lhe reconhecer o merito de have-lo tentado. E agora, se me disser onde esta a… — Soltou um gritinho de surpresa quando Rohan voltou a aproximar-se dela e se precaveu, muito tarde, de que se tomou seu comentario

desdenhoso como uma provocacao. Esta vez, depois de sujeita-la pela nuca, beijou-a com labios mais exigentes. Com inocente assombro, notou o contato sedoso de sua lingua, uma sensacao que a fez estremecer de prazer. Rohan terminou o beijo com uma caricia com os labios, olhou-a aos olhos e a desafiou em silencio a negar que estava excitada. — Nada — disse ela com voz debil detras reunir o pouco orgulho que ficava. Esta vez ele a estreitou totalmente contra seu corpo e a beijou com um ardor inusitado. Daisy nao se imaginou que um beijo pudesse ser tao apaixonado. A boca do Rohan se apoderou da suas enquanto com as maos lhe sovava o corpo. Notou como lhe separava os pes com os seus e aumentava o contato de seus corpos. Incitou-a e a acariciou com seus beijos ate que ela tremeu como um bichinho desamparado entre seus bracos. Para quando seus labios se separaram, Daisy estava exausta, com toda a consciencia concentrada nas sensacoes que a conduziam para um fim desconhecido. Abriu os olhos e o Miro aturdida. — Agora esteve melhor — conseguiu dizer com tremente dignidade. — Me alegro de have-lo conhecido. — voltou-se, mas nao sem ver como ele sorria. Rohan alargou a mao para pulsar o mecanismo oculto e abrir a porta. Para confusao de Daisy, entrou com ela no Caminho escuro e a acompanhou escada acima guiando-a como se tivesse olhos de gato na escuridao. Quando chegaram acima, onde era visivel o contorno da porta da sala de leitura, detiveram-se. — Adeus, senhor Rohan — murmurou Daisy, necessitada de dizer algo. — E provavel que nao voltemos a nos ver nunca. — Quem dera fosse assim, porque estava claro que nao poderia voltar a olha-lo a cara. — Talvez uma noite me apareca em sua janela — lhe sussurrou ao ouvido Rohan. — Para te tentar a dar um passeio pela terra e pelo mar. E se deixar que te leve, nao voltara a ser a mesma. E, dito isto, abriu a porta, empurrou com suavidade a Daisy para a sala de leitura e a fechou de novo. Daisy piscou confundida ao ver suas amigas. — Deveria haver imaginado que seria incapaz de resistir a uma porta secreta. Aonde leva o Caminho? — perguntou Annabelle. — Evie tinha razao — respondeu Daisy, ruborizada. — Nao leva a nenhum sitio ao que queria ir.

Capitulo 16 Embora a roupa que Annabelle Hunt lhe tinha levado era mais adequada para um meio luto que para um luto rigoroso, Evie decidiu ficar a Entendeu que, como ja tinha ido contra os ditados da correcao ao levar tecidos distintos a bracadeira de luto, e como logo que havia ja ninguem no clube que se atrevesse a critica-la, daria o mesmo se ia de negro, marrom ou cinza. Alem disso, a seu pai nao teria importado. Recolheu a nota que Annabelle tinha posto entre os objetos e leu com um sorriso o que sua amiga lhe tinha escrito com picardia: Confeccionaram-me esta roupa em Paris sem ter em conta as

consequencias da virilidade do senhor Hunt. Para quando puder voltar a me por isso estara passada de moda. Aceita-a como presente, amiga minha. Provou-se o vestido de suave la cinza, forrado de seda, e descobriu que ia muito bem. Entretanto, o prazer do vestido ficou um pouco diminuido pela nostalgia de recordar a seu pai. Ao percorrer com tristeza a sala de jogo principal, viu que Sebastian falava com um par de pedreiros talheres de po. Como era muito mais alto que os dois, agachava a cabeca ao falar, e disse alguma ocorrencia que lhes fez rir. Uma nota de humor permaneceu nos olhos do Sebastian quando viu o Evie. Seu olhar se suavizou e se despediu dos pedreiros para dirigir-se para ela. Evie se esforcou por conter um repentino desejo, temerosa de parecer bobamente apaixonada de seu proprio marido. Entretanto, por muito que tentasse ocultar seus sentimentos sob a superficie, pareciam aflorar e cintilar de modo visivel como se fossem po de diamante. O estranho era que Sebastian parecia igual de contente de ve-la, e se desembaracou por uma vez do aspecto de libertino enfastiado para lhe sorrir com verdadeiro carinho. — Evie, esta bem? — Sim, eu… Nao. — esfregou-se as temporas. — Estou cansada e aborrecida. E tenho fome. A risada do Sebastian pareceu rachar sua melancolia. — Posso fazer algo a respeito. — Nao quero interromper seu trabalho — disse ela timidamente. — Rohan se encarregara de tudo por um momento. Veem, vamos ver se a sala de bilhar esta vazia. — Bilhar? Para que quer ir ai? — Para jogar, e obvio. — Sebastian lhe dirigiu um olhar lhe sugiram. — Mas as mulheres nao jogam a bilhar. — Na Franca sim. — Por isso Annabelle disse que, na Franca as mulheres fazem muitas coisas que aqui nao fazemos. — Sim — assentiu Sebastian. — Sao muito avancados, os franceses. Em troca, os ingleses tem tendencia a recear muito do prazer. A sala de bilhar estava desocupada. Sebastian pediu que lhes levassem uma bandeja com um pouco de comida, sentaram-se em uma mesinha e conversaram enquanto tomavam bocados. Evie nao entendia muito bem por que dedicava tempo a entrete-la, quando havia tantos assuntos que requeriam sua atencao. Depois de anos de ver o aborrecimento estampado no rosto dos homens quando falava com eles, a confianca em si mesmo lhe tinha ficado reduzida ao minimo. Entretanto, Sebastian escutava com atencao tudo o que dizia, como se a encontrasse do mais interessante. Animava-a a dizer coisas atrevidas, e parecia que seus tentativas de discutir com lhe deleitavam. Quando Evie terminou de comer, Sebastian a levou a mesa de bilhar e lhe entregou um taco. A seguir procedeu a lhe ensinar os aspectos basicos do jogo. — Nao me diga que e muito escandaloso para ti — lhe disse com zombadora severidade. — depois de te fugir comigo a Gretna Green, pode fazer algo. Te incline sobre a mesa. Evie obedeceu com estupidez e se ruborizou ao notar como ele se inclinava sobre ela e a cobria de modo excitante com seu corpo para lhe ensinar a sujeitar bem o taco. — Agora passa o indicador e o polegar ao redor do taco, como uma embocadura — ouviu que lhe dizia. — Assim. Nao o sujeite com tanta forca, carinho. Relaxa a mao. Perfeito. — Tinha a cabeca tao

perto da sua que lhe chegava a fragrancia a colonia de sandalo que emanava sua pele calida. — Trata de imaginar uma rota entre a bola branca e a bola de cor. Tem que golpear justo aqui para enviar a bola de cor ao buraco. E um tiro direto, ve-o? — disse enquanto assinalava um ponto sobre o centro da bola branca. — Agacha um pouco a cabeca. Tira para tras do taco e golpeia a bola branca com um movimento suave. Ao tenta-lo, a ponta do taco nao acertou naquele ponto da bola branca, que saiu rodando para o flanco da mesa. — Isso se chama pifia — observou Sebastian, e agarrou a bola para voltar a po-la em seu lugar inicial. — Quando acontecer isto, passa o giz na ponta do taco e adota uma expressao carrancuda. Isso da a entender que a culpa e do taco e nao de suas aptidoes. Evie notou que um sorriso aparecia nos labios, e se inclinou outra vez sobre a mesa. Pode que estivesse mal, dado que a morte de seu pai era tao recente, mas se estava divertindo pela primeira vez desde fazia muito tempo. Sebastian voltou a inclinar-se sobre ela por detras e lhe pos as maos sobre as suas. — Deixa que te mostre o movimento adequado do taco. Mantem reto, assim. — concentraram-se juntos no deslizamento regular e constante do taco pelo pequeno circulo que Evie formava com o indicador e o polegar. Era virtualmente impossivel que o significado sexual daquele movimento lhe passasse por cima, e Evie se ruborizou a seu pesar. — Deveria te dar vergonha — lhe murmurou ele. — Nenhuma moca recatada pensaria algo assim. Evie riu nervosa, e Sebastian se apartou para observa-la com um sorriso. — Volta a tenta-lo — disse. Ela se concentrou na bola branca, retrocedeu o taco e golpeou com forca. Esta vez a bola de cor caiu limpamente no buraco. — Consegui-o! — exclamou emocionada. Sebastian sorriu e a preparou para varias tacadas mais. Situava lhe o corpo, ajustava lhe as maos, e punha qualquer desculpa para rodea-la com os bracos. Evie, que o estava passando muito bem, fingia nao dar-se conta de suas caricias descaradas. Entretanto, quando lhe fez falhar um tiro pela quarta vez, voltou-se para ele, acusadora. — Como quer que uma mulher atire como e devido se lhe poe ai a mao? — Tentava te ajustar a postura — replicou Sebastian com picardia. Ao ver o olhar zombador de sua mulher, sorriu e se apoiou na mesa de bilhar. — E culpa tua que me veja obrigado a me levar assim. Asseguro-te que ate a mim mesmo parece horroroso que o unico prazer de que desfruto destes dias seja te perseguir como um adolescente que vai detras de uma criada. — Perseguia as criadas quando foi um moco? — Por Deus, claro que nao. Como te ocorre? — Sebastian pareceu indignar-se. Evie foi desculpar se, mas entao ele acrescentou com petulancia: — Elas me perseguiam. Evie soltou uma gargalhada e o ameacou com o taco. — Tranquila, geniozinho — lhe disse ele, rendo, e lhe tirou o taco. — gastara a pouca inteligencia que te e, entao, de que te serviria um marido assim? — Seria puramente decorativo. — Ah, bom, suponho que isso tem certo valor. Que Deus me ajude se alguma vez perco o atrativo. — Nao me importaria.

— Seriamente? — perguntou Sebastian com um sorriso zombador. — Se… — deteve-se, violenta de repente. — Se algo acontecesse com seu atrativo, nao me importaria seu aspecto. Seguiria… — Vacilou— seguiria querendo que fosse meu marido. O sorriso do Sebastian se foi desvanecendo pouco a pouco. Dirigiu lhe um olhar largo e intensa e seu rosto refletiu algo estranho, uma especie de paixao e vulnerabilidade. — E a primeira que me diz tal coisa — comentou com voz grave. — Espero que nao seja tao iludida para me atribuir dotes que nao possuo. — Nao; ja esta o bastante dotado sem necessidade disso — replicou Evie antes de dar-se conta do dobro sentido da frase. Ruborizou-se. — Quer dizer… nao me referia A… Mas Sebastian riu em voz baixa, a tensao desapareceu e puxou ela para ele. Evie reagiu ansiosamente, e a diversao de seu marido se dissolveu como acucar em brandy quente. Beijou-a mais, com mais paixao. — Evie, carinho… — sussurrou. — Te desejo tanto. Meu Deus…, ainda faltam dois meses, treze dias e seis horas para poder me deitar contigo. Diabinha. Me vais matar. Ela, afligida pelo trato infame que lhe tinha imposto, aproximou lhe os labios aos seus. Sebastian gemeu e a beijou enquanto alargava a mao para fechar a porta da sala de bilhar. Procurou provas a fechadura, girou a chave e se ajoelhou ante ela. Evie apoiou os ombros contra a parede. Estava tao confusa e excitada que a cabeca lhe dava voltas. Sebastian lhe levantou o vestido e procurou com as maos sob as capas de tecido para atirar das fitas da anagua. — Nao, Sebastian — sussurrou tremente, consciente de que nao estavam num lugar privado. — Por favor, aqui nao pode… O ignorou seus protestos, seguiu rebuscando sob o vestido e lhe baixou o culote ate os joelhos. — Voltarei-me louco se ao menos nao te tenho assim. — Nao, nao… — suplicou Evie fracamente, mas ele nao podia ouvi-la. Tinha lhe posto a mao no tornozelo e lhe mordiscava e lambia um joelho atraves da media de seda. Evie sentiu um subito e abrasador desejo, e o coracao lhe desbocou. Sebastian lhe subiu a parte dianteira do vestido ate a cintura e lhe pediu que o sujeitasse. — Aguenta isto — resmungou. Ela nao deveria ter obedecido, mas suas maos pareciam ter vida propria e sustentaram a confusao de veludo a altura de seu estomago. Sebastian lhe baixou o culote ate os tornozelos e lhe percorreu a coxa com a boca, de modo que seu folego quente lhe excitava a sensivel pele dessa zona. Quando lhe rocou o pubis, Evie gemeu de prazer. Os dois dedos que Sebastian lhe introduziu foram imediatamente apertados e absorvidos, ja que a umida vagina se contraia ansiosamente. — OH, Sebastian… — murmurou com os olhos meio fechados enquanto a paixao lhe ruborizava o corpo e o cobria de irregulares zonas rosadas. — Silencio. Introduziu lhe mais os dedos enquanto com a boca lhe chupava a torcida vulva. Evie apertou os dentes e arqueou as costas. Sebastian nao se deteve nem lhe concedeu um instante para recuperar o folego, mas sim seguiu acariciando-a e atormentando-a, o que fez que suas sensacoes aumentassem, ate que conteve um grito e se estremeceu. Mas ele nao apartou a boca, lhe provocando assim quebras de onda de prazer ate que ficou finalmente imovel, esgotada e desprovida de sensacao. Sebastian ficou de pe, pressionou seu corpo excitado contra o de Evie, que lhe rodeou a cintura com os bracos e, com os olhos fechados, apoiou a bochecha em seu ombro. — Nosso trato… — balbuciou.

— Disse que podia lhe beijar — lhe sussurrou ele junto ao ouvido. — Mas nao especificou onde, meu amor.

Capitulo 17 — Chamaste-me, marido meu? — Evie se aproximou da mesa do pequeno escritorio, onde Sebastian estava sentado. Um dos criados a tinha conduzido abaixo a pedido dela, acompanhando-a atraves do caos logo que controlado do clube abarrotado de gente. Era a noite da reabertura do Jenner’s e parecia que todos quem era ou desejavam ser membros estavam decididos a entrar. Sebastian tinha na mesa um montao de solicitudes enquanto uma duzia de homens esperava com impaciencia a aprovacao no vestibulo. Ouvia-se rumor de vozes e tinido de tacas, e uma orquestra tocava no balcao do primeiro piso. Para honrar a memoria do Ivo Jenner se servia champanha sem cessar, o que acrescentava um toque desinibido ao ambiente. O Jenner’s voltava a funcionar, e os cavalheiros de Londres estavam contentes. — Sim— respondeu Sebastian. — por que diabos segue aqui? Deveria haver ido faz umas oito horas. Evie nao se alterou. — Ainda estou fazendo a bagagem. — Leva fazendo-o tres dias. So tem meia duzia de vestidos. Seus escassas pertences caberiam em uma bolsa de viagem. Esta-te entretendo de proposito, Evie. — E a ti que mais te da? — replicou. — Os ultimos dois dias me trataste como se nao existisse. Custa-me acreditar que tenha reparado em minha presenca. Sebastian a fulminou com o olhar enquanto se esforcava por controlar suas emocoes. Nao reparar em sua presenca? Maldita seja, teria dado algo por que isso fora certo. Tinha sido dolorosamente consciente de todas suas palavras, de todos seus gestos, e ansiado constantemente ve-la em privado embora so fora um momento. Te-la diante agora, com suas formosas curvas bem definidas por um vestido de veludo negro, bastava para volta-lo louco. Supunha-se que a roupa do luto afeiava e desabrilhantava a uma mulher mas, em seu caso, o negro fazia que sua pele parecesse nata fresca e que seu cabelo brilhasse como o fogo. Queria levar lhe a Cama e ama-la ate que a misteriosa atracao que o dominava se consumisse em suas proprias chamas. Invadia-o uma especie de desassossego apaixonado, que parecia uma enfermidade, algo que o fazia ir de um quarto a outra e esquecer o que queria. Nunca tinha estado assim: distraido, impaciente, angustiosamente ansioso. Nao obstante, tinha que proteger a Evie dos perigos e as depravacoes do clube, assim como dele mesmo. Devia mante-la a salvo e arrumar lhe para ver a de tanto em tanto… Era a unica solucao. — Quero que va agora — disse. — Tudo esta preparado para te receber na casa. Estara muito mais comoda que aqui. E eu nao terei que me preocupar de que te meta em problemas. — levantou-se e se dirigiu para a porta procurando guardar a distancia fisica de seguranca entre ambos. — vou pedir uma carruagem. Tem que estar nele num quarto de hora. — Ainda nao jantei. Seria muito pedir uma ultima comida? Embora Sebastian nao a olhava, captou seu tom de desafio infantil e sentiu uma pontada no

coracao, ao que sempre tinha considerado tao somente um musculo eficiente. Nao chegou a decidir o do jantar porque nesse momento viu que Cam se aproximava do escritorio acompanhado da figura inconfundivel do conde de Westcliff. — Maldita seja! — resmungou detras voltar a cabeca e mexer o cabelo. — O que acontece? — perguntou Evie. — Sera melhor que va — repos ele em tom grave e rosto inexpressivo. — Westcliff esta aqui. — Nao vou a nenhuma parte — replicou Evie. — Westcliff e muito cavalheiro para organizar uma briga diante de uma dama. — Nao preciso me esconder detras de suas saias, carinho — indicou Sebastian com um sorriso desdenhoso. — E duvido muito que venha em busca de briga, ja que todo isso ficou arrumado a mesma noite em que me levei a senhorita Bowman. — O que quer entao? — Ou me advertir ou comprovar se necessitar que lhe resgatem. Ou ambas as coisas. Evie seguia a seu lado quando Westcliff entrou no escritorio. — Milorde — disse Cam a Sebastian — , roguei ao conde que esperasse, mas… — Ninguem pode dizer ao Westcliff o que fazer — comentou Sebastian com secura. — Esta bem, Cam. Volta para as mesas ou sera um caos. E te leve a lady St. Vincent contigo. — Nao — replicou Evie de uma vez que dirigia um olhar preocupado da cara zombadora do Sebastian a petrea do Westcliff— Fico — anunciou antes de dirigir-se a lorde Westcliff— Pensei muito frequentemente no Lillian, Milorde. Espero que se encontre bem. Westcliff lhe deu um beija-mao e falou com sua caracteristica voz grave. — Muito bem, obrigado. Gostaria de lhes receber em casa, se o necessitarem. Sebastian ficou furioso. Se esse bode arrogante acreditava que podia ir ai e lhe arrebatar a sua esposa diante de seus narizes, estava muito equivocado. — Obrigado, Milorde — respondeu Evie em voz baixa enquanto contemplava os marcados rasgos do Westcliff. Tinha o cabelo negro e os olhos tao escuros que era impossivel distinguir a iris da pupila. — eu adorarei lhes visitar logo. Mas sua hospitalidade nao e necessaria neste momento. — Muito bem. A oferta segue em pe. Me permitam lhes dar meus mais sentido pesames por sua recente perda. — Obrigado. — Sebastian enrugou o sobrecenho ao ver como sua mulher sorria ao Westcliff. Como possuidor do titulo de conde mais antigo e mais capitalista da Inglaterra, Marcus, lorde Westcliff, possuia o aura de um homem acostumado a que suas opinioes fossem ouvidas e tidas em conta. Embora nao era atrativo num sentido classico, possuia uma vitalidade sombria e um vigor masculino que lhe faziam destacar em qualquer reuniao. Era um bom esportista e um cavaleiro perito, conhecido por chegar ao limite de suas forcas fisicas e as superar. De fato, Westcliff o expor tudo assim na vida: tinha que destacar sempre em algo que fizesse. Westcliff e Sebastian tinham sido amigos dos dez anos, e tinham acontecido a maior parte de seus anos de formacao no mesmo internado. Ja entao tinha parecido uma amizade insolita porque, por natureza, Westcliff acreditava em imperativos morais e nao tinha nenhuma dificuldade em distinguir o bem do mal. A Sebastian, por sua parte, adorava converter as questoes mais singelas em algo complexo, simplesmente como uma forma de exercitar sua inteligencia. Westcliff escolhia sempre o Caminho mais eficiente e claro, enquanto que Sebastian preferia o mais sinuoso e pior tracado, que causava a um toda classe de problemas antes de chegar finalmente a seu destino. Entretanto, havia muitas coisas que os dois amigos compreendiam um de outro, ja que ambos

tinham crescido sob a influencia de um pai indiferente e manipulador. Ambos compartilhavam uma visao pouco romantica do mundo, conhecedores de que podiam confiar em muito pouca gente. E, como refletiu entao Sebastian com tristeza, ele tinha traido a confianca do Westcliff de um modo irreparavel. Pela primeira vez em sua vida, sentia uma pontada nauseabunda que so podia identificar como arrependimento. Por que diabos tinha posto seu olhe no Lillian Bowman? Quando se tinha precavido de que Westcliff estava interessado nela, por que nao se procurou outra herdeira? Tinha sido um imbecil em nao pensar no Evie. Agora sabia muito bem que nao havia valido a pena arruinar uma amizade por Lillian. A ausencia do Westcliff em sua vida era como uma chaga no pe que nao acaba de curar-se. Sebastian esperou a que Cam tivesse fechado a porta ao partir. Depois, rodeou com um braco possessivo os estreitos ombros de Evie e se dirigiu a seu antigo amigo: — Como foi a lua de mel? — perguntou. Westcliff ignorou a pergunta. — Dadas as circunstancias — disse a Evie — , parece-me necessario lhes perguntar se lhes casaram sob coacao. — Nao, e obvio que nao — assegurou Evie, e se aproximou mais de Sebastian, como se quisesse protege-lo. — Em realidade foi minha ideia, Milorde. Fui a casa de lorde St. Vincent a lhe pedir ajuda e ele me emprestou isso. — Seguro que tinham outras possibilidades — comentou secamente Westcliff, ao parecer nada convencido. — Nenhuma que visse naquele momento. — E deslizou o braco pela cintura do Sebastian, assombrando-o. — Nao lamento minha decisao — acrescentou Evie. — Voltaria a faze-lo sem vacilar. Lorde St. Vincent foi muito bom comigo. — Minha esposa falta a verdade, claro — soltou Sebastian com uma risada cinica, enquanto o pulso lhe acelerava. Tinha o corpo suave de Evie pego a um flanco e sentia seu calidez. Nao entendia por que se erguia em seu mais entusiasta defensora. — fui um bode com ela — disse ao Westcliff inexpressivamente— , Por sorte para mim, sua familia a maltratou tanto tempo que a pobre nao sabe o que e ser bem tratada. — Isso nao e certo — comentou Evie ao Westcliff. Nenhum dos dois dirigiu um sozinho olhar a Sebastian, que teve a lhe exasperem sensacao de estar excluido da conversacao. — foi um periodo dificil, como poderao imaginar. Nao o teria superado sem o apoio de meu marido. Cuidou que minha saude e me protegeu todo o possivel. Trabalhou muito para conservar o negocio de meu pai. E me defendeu quando meus tios tentaram me levar contra minha vontade… — Passaste-te, encanto — atravessou Sebastian com um sorriso malevola. — Westcliff me conhece o bastante bem para saber que eu jamais trabalharia. Nem defenderia a ninguem. So me preocupam meus proprios interesses. — Para seu chateio, nenhum dos dois emprestou atencao a seus comentarios. — Estou convencida de que meu marido nao teria atuado como o fez se tivesse sabido que estavam realmente apaixonado por Lillian, Milorde — explicou Evie. — Isto nao desculpa sua conduta, mas… — Nao a ama — observou Sebastian, e se apartou um passo de Evie. De repente, era como se a quarto se reduzira, como se as paredes ameacassem esmagando. Maldita fora por tratar de desculparse por ele. E maldita fora por fingir que se tinham carinho. — Acredita no amor tao pouco como eu — assegurou, e olhou desafiante ao Westcliff. — Quantas vezes me ha dito que o amor e uma falsa ilusao dos homens para converter a desagradavel realidade do matrimonio num pouco medianamente

suportavel? — Estava equivocado — comentou Westcliff com frieza. — por que esta tao furioso? — Nao estou… — Sebastian se deteve o dar-se conta de que ia perder os papeis. Olhou a Evie e viu o assombroso investimento de suas posicoes. Ela, a gaga solteira do baile, agora serena e firme, e ele, sempre tao dono de si mesmo, reduzido a um idiota exaltado. E tudo diante do Westcliff, que os observava com curiosidade. — O que devo fazer para me liberar de ti? — espetou Sebastian a Evie com brutalidade. — Parte com o Westcliff se nao querer ir a casa da cidade. Me da no mesmo com tal de te perder de vista. A Evie lhe exageraram os olhos e se estremeceu. Mas conservou a compostura, inspirou fundo e exalou com mesura. Ao observa-la, Sebastian quase sucumbiu ao impulso de ajoelhar-se para lhe pedir perdao. Mas permaneceu imovel enquanto ela se dirigia para a porta. — Evie… — resmungou. Sua esposa o ignorou e saiu muito erguida do escritorio. Sebastian apertou os punhos enquanto a seguia com o olhar. Passados uns segundos, obrigou-se a voltar-se para o Westcliff. Seu velho amigo nao o olhava com odio, a nao ser com um pouco parecido a uma moderada compaixao. — Nao me esperava encontrar este panorama — disse em voz baixa. — E outra pessoa, Sebastian. Fazia anos que Westcliff nao se dirigia a ele por seu nome de pilha. Os homens, inclusive os irmaos ou os amigos intimos, chamavam-se quase sempre pelo sobrenome. — Vai ao inferno — resmungou Sebastian. — Imagino que vieste so para zombar de mim. Se for assim, chega um mes tarde. — Essa era minha intencao. Agora, entretanto, decidi ficar para tomar uma taca de brandy enquanto me conta que demonios pretende. Para comecar, poderia me explicar por que assumiste a direcao de um clube de jogo. Era o pior momento para sentar-se a conversar, ja que o clube estava cheio de gente, mas de repente lhe importou um cominho. Fazia muitissimo tempo que nao conversava com alguem que o conhecesse tao bem. Embora nao se fazia iluda com respeito a sua antiga amizade, a perspectiva de comentar coisas com o Westcliff, embora nao fora o pormenorizado Westcliff de antigamente, supunha lhe um grande alivio. — Muito bem, falemos — resmungou. — Nao va. Voltarei em seguida. Nao posso permitir que minha esposa cruze o clube sozinha. Saiu a pernadas em direcao ao vestibulo. Ao nao ver nem rastro da figura vestida de negro de Evie, deduziu que tinha seguido uma rota alternativa, possivelmente atraves da sala central. Detevese em uma das entradas com forma de arco e percorreu a multidao de cabecas com o olhar. Em seguida localizou o brilhante cabelo de sua esposa. Dirigia-se para a esquina onde Cam estava sentado. Varios membros do clube se apartaram a seu passo. Sebastian a seguiu, devagar ao principio para ir acelerando o passo depois. Estava em uma situacao estranha e se esforcava por entender-se. Sempre lhe tinha dado muito bem dirigir as mulheres. Por que, entao, resultava lhe impossivel manter-se indiferente respeito a Evie? Estava separado do que mais queria, nao por uma distancia real, mas sim por um passado manchado pela libertinagem. Devia permitir-se ter uma verdadeira relacao com ela… Nao, impossivel. Seus excessos a manchariam como a tinta negra que se estende sobre um pergaminho branco. Voltaria se cinica, amargurada, e quando o conhecesse melhor, desprezaria o.

Cam, sentado num tamborete alto para fiscalizar as mesas de jogo, viu aproximar-se de Evie. Pos um pe no chao. Elevou a cabeca morena e percorreu a sala rapidamente com a vista, atento como sempre a tudo o que ocorria. Ao ver o Sebastian, assentiu com a cabeca para lhe indicar que a reteria a seu lado ate que ele chegasse. Fiscalizou a sala outra vez e franziu o cenho. Encolheu um pouco os ombros como se algo o arrepiasse, e olhou para tras. Ao nao ver nada estranho, comecou a levantar-se de novo no tamborete. Entretanto, foi como se um sexto sentido lhe fizesse esquadrinhar a multidao, como se um ima atraira seu olhar. Elevou os olhos para as galerias do primeiro piso e Sebastian viu como se concentrava em algo. Depois de separar-se da gente, Sebastian seguiu o olhar atonito do Cam e viu um homem fornido, moreno, de pe num balcao. Ia sujo e despenteado, e sua cabeca tinha uma inconfundivel forma de bala. Joss Bullard. Mas como se penetrou no clube sem que ninguem o visse? Certamente atraves de uma entrada secreta. O clube tinha mais aberturas e Caminhos que uma toca de coelhos. E ninguem os conhecia melhor que Bullard ou Cam, que tinham vivido ali desde meninos. Sebastian deu um pulo ao ver o brilho do canhao de uma pistola. Inclusive desde esse angulo, era evidente aonde apontava Bullard. O branco era Evie, que estava ainda a uns cinco metros do Cam. Instintivamente, Sebastian se precipitou como um raio, presa do panico. A figura de Evie se voltou tao definida e detalhada que pode distinguir ate o cabelo do veludo de seu vestido. Todos seus nervos e musculos se esticaram para alcanca-la, todos os batimentos do coracao de seu coracao se dedicaram a subministrar sangue a suas extremidades. Lancou-se sobre ela, protegendo-a com seu corpo e derrubando-a ao chao com o mesmo impulso. Um disparo ressonou na grande sala. Sebastian notou um violento impacto no flanco e sentiu uma especie de queimacao. A queda ao chao o deixou momentaneamente aturdido. Estava meio deitado sobre o Evie e procurava lhe cobrir a cabeca com os bracos enquanto ela lutava debaixo de seu corpo. — Fique quieta — ofegou de uma vez que a mantinha no chao, temeroso de que Bullard voltasse a disparar. — Espera, Evie. Esta obedeceu enquanto a confusao se desatava a seu redor: gritos, imprecacoes, trancos, passos fortes… Sebastian levantou um pouco a cabeca e se arriscou a olhar para aquele balcao. Bullard ja nao estava. Com um grunhido de dor, rodou para um lado e comprovou se sua mulher estava ferida, pois a bala podia have-la alcancado tambem a ela. — Evie, carinho, esta bem? — por que me empurrou assim? — perguntou ela com voz apagada. — Sim, estou bem. O que passou? O que foi esse ruido? Sebastian lhe apartou uma mecha de cabelo que lhe caia sobre os olhos. Desconcertada, Evie saiu de debaixo de seu corpo e se incorporou. Sebastian seguia deitado de flanco, ofegante, enquanto o torax e a cintura lhe empapavam de sangue. A gente se formava redemoinhos para sair do edificio e ameacava pisoteando ao casal no chao. De repente, um homem se inclinou sobre eles detras abrir-se passo entre a multidao desenquadrada e pos seu corpo como um baluarte para impedir que os esmagassem. Sebastian piscou ao ver que era Westcliff. Meio aturdido, levantou uma mao para sujeita-lo pela jaqueta. — Esse bode apontava a Evie — disse com voz rouca. Lhe tinham intumescido os labios, e os umedeceu com a lingua. — Mantem a salvo. Mantem A… Evie soltou um grito ao ver a ensanguentado peitilho do Sebastian e compreender que estava ferido.

Comecou a lhe desabotoar a jaqueta e o colete com desespero. Westcliff se tirou rapidamente a jaqueta e a pos como travesseiro ao ferido. Evie abriu a Camisa empapada de sangue e viu a lhe sangrem ferida no flanco. Empalideceu e lhe encheram os olhos de lagrimas, mas conseguiu dominarse para agarrar a almofada que Westcliff tinha improvisado com seu colete e aperta-lo contra a ferida para reduzir a hemorragia. Sebastian gemeu de dor. Seguia com a mao levantada e os dedos meio fechados. O aroma de sangue impregnava o ar. Westcliff se inclinou para ele e examinou o orificio de saida. — Atravessou-o — disse a Evie. — Mas nao parece ter afetado nenhum orgao. Enquanto Westcliff mantinha a pressao sobre a ferida, Evie se moveu para descansar a cabeca do Sebastian em seu regaco e que o veludo negro lhe servisse de almofada. Tomou uma mao e a segurou com forca. Isto pareceu rebater a dor lacerante da parte inferior do torso. Sebastian lhe olhou o rosto inclinado para ele, incapaz de interpretar sua expressao. Tinha um brilho estranho nos olhos, uma especie de carinho ou pesar… Nao sabia o que era. Ninguem o tinha cuidadoso nunca desse modo. Esforcou-se por dizer algo para tranquilizar a sua esposa. — Isto e o que me passa por… — a dor o deixou sem folego— por tentar me fazer o heroi. A partir de agora seguirei sendo um galinha. E mais… seguro. — O disparo veio da galeria superior — disse Westcliff. — Um antigo empregado. Bullard. Despedido recentemente. — Esta seguro de que apontava a sua esposa? — Sim. — Talvez dessa maneira tentava vingar-se de ti. — Nao — resmungou Sebastian. — So poderia ser assim se… acreditasse que a quero…, mas todo mundo sabe… que e um matrimonio de conveniencia. Westcliff lhe dirigiu um olhar de estranheza mas se absteve de responder. Sebastian nao podia saber a imagem que davam Evie e ele nesse momento: ele obstinado a sua mao e ela lhe acariciando a cabeca em seu regaco com o mesmo carinho de uma mae. Quao unico sabia era que a ferida lhe doia horrores. Uns tremores incessantes se apoderaram dele e os dentes comecaram a lhe tocar castanholas. Foi vagamente consciente de que Westcliff se afastava para dar ordens a gritos e que voltava com um montao de jaquetas. Tampou-o com elas e seguiu aplicando pressao a ferida. Sebastian perdeu o conhecimento um momento. Quando voltou em si, notou como a mao calida de Evie lhe acariciava a cara fria e suada. — O medico esta de Caminho — murmurou ela. — Quando a hemorragia se reduza, levaremos lhe acima. — Onde esta Rohan? — conseguiu dizer entre dentes. — Depois do disparo o vi sair em perseguicao do Bullard— respondeu Westcliff. — De fato, Rohan subiu por uma coluna para chegar ao primeiro piso. — Se nao apanhar a esse bode o farei eu — resmungou Sebastian. — E entao… — Silencio — lhe disse Evie, e deslizou a mao livre por debaixo do montao de jaquetas para ficar a sobre o peito nu. Descansou a palma sobre seu debil coracao e notou uma cadeia de ouro que tinha pendurada do pescoco. Seguiu-a e descobriu a alianca escocesa que havia nela. Sebastian nao tinha querido que soubesse que levava o anel sob a roupa. — Nao significa nada — sussurrou inquieto. — So queria que estivesse a boa cobranca. — Ja — murmurou Evie. Sebastian sentiu o roce dos labios de sua esposa na fronte e a suave caricia de seu folego. Viu como lhe sorria.

— Deste-me a desculpa perfeita para ficar — lhe disse. — vou cuidar te ate que esteja o bastante recuperado para me jogar. Sebastian nao pode lhe devolver o sorriso. A ansiedade o invadiu ao compreender que Evie nao estaria segura ai nem em nenhuma parte ate que apanhassem ao Bullard. — Westcliff… — disse. — Alguem tem que proteger a minha esposa… — Nao lhe acontecera nada — lhe assegurou o conde. Quando Sebastian observou a seu velho amigo, o unico homem honoravel que tinha conhecido, viu-o cuidadosamente impassivel. Ambos sabiam o que Evie era muito inexperiente para imaginar: que embora a bala nao havia meio doido nenhum orgao vital, era provavel que a ferida se infectasse. Nao morreria da hemorragia, mas provavelmente sim de uma febre mortal. E, em e te caso, nao haveria ninguem que se responsabilizasse de Evie. Estaria sozinha e desprotegida num mundo cheio de depredadores. De homens como ele. Tremendo devido ao frio e o choque, Sebastian conseguiu pronunciar umas palavras se desesperadas entre inspiracoes entrecortadas. — Westcliff… O que fiz… Sinto muito. Perdoa… Perdoa… — A vista lhe nublava e se esforcou por nao perder o conhecimento. — Evie… Protege-a, por favor. Por favor… Viu dancar um montao de luzes brilhantes, ate que estas se apagaram e todo se voltou negro. — Sebastian — sussurrou Evie de uma vez que se aproximava a mao flacida de seu marido a bochecha para beija-la com os olhos cheios de lagrimas. — Nao passa nada — a tranquilizou Westcliff. — So se deprimiu. Voltara em si num momento. Evie solucou antes de recuperar o controle. — ficou de proposito entre Bullard e eu — comentou entao. — Recebeu o disparo por mim. — Isso parece. — Westcliff a observava enquanto pensava, entre outras coisas, que se tinham produzido algumas mudancas interessantes tanto no Sebastian como em sua insolita esposa desde que se fugiram juntos. Ao inteirar-se de que St. Vincent se casou com o Evangeline Jenner, Lillian se havia posto furiosa, presa de angustia por seu amiga. — Esse monstro! — tinha exclamado quando voltaram para Londres da Italia. — Abusar precisamente de Evie. OH, nao imagina quao fragil e! Tera sido cruel com ela. E uma moca indefesa e muito inocente… meu deus, matarei a esse bastardo! — Sua irma disse que nao parecia uma mulher precisamente maltratada — assinalou Westcliff com sensatez, embora tambem lhe preocupava que uma mulher tao indefesa como Evangeline Jenner estivesse a merce do St. Vincent. — E provavel que estivesse muito assustada para admiti-lo — replicou Lillian, que se passeava com o olhar inquieto. — E provavel que a tenha violado e ameacado. Possivelmente inclusive golpeado… — Nao, nao — tentou acalma-la Westcliff de uma vez que a rodeava com os bracos. — Segundo Daisy e Annabelle, teve muitas oportunidades de lhes dizer se tinha sofrido algum abuso. Mas nao o fez. Olhe, se isso te tranquilizar, irei ao clube e lhe oferecerei refugio. Pode ficar conosco no Hampshire se o desejar. — Quanto tempo? — balbuciou Lillian, aconchegada entre seus bracos. — Indefinidamente, e obvio. — OH, Marcus… — exclamou ela com os olhos umedecidos. — Fariam isso por mim? — Algo, minha vida. Algo que te faca feliz. De modo que Westcliff tinha ido ao Jenner’s essa noite para averiguar se Evangeline estava cativa contra sua vontade. Contrariamente ao que esperava, encontrou-se com uma mulher que

parecia ansiosa por ficar e que manifestava um carinho evidente pelo St. Vincent. Quanto a este, sempre tao distante e indiferente… Resultava dificil acreditar que o homem que tratava as mulheres com tanto desdem pudesse ser o mesmo que acabava de arriscar a vida por sua esposa. Que um homem que jamais se mostrou arrependido de nada lhe pedisse perdao e que, ato seguido, virtualmente lhe suplicasse que protegesse a sua esposa, o fazia chegar a uma conclusao inevitavel: St. Vincent, contra todo prognostico, tinha chegado a querer mais a outra pessoa que a si mesmo. Uma situacao certamente extraordinaria. Era dificil entender como alguem como Evangeline Jenner podia ter provocada semelhante mudanca no St. Vincent, um homem com tanto mundo. Entretanto, Westcliff tinha aprendido que os misterios da atracao nao sempre podiam explicar-se mediante a logica. As vezes, as fissuras de duas almas separadas podem ser o que as une. — Milady… — disse em voz baixa. — Evie — pediu esta, que seguia com a mao inerte de seu marido apoiada na cara. — Evie, tenho que te perguntar algo. Por que St. Vincent? — Precisava escapar de minha familia, de forma legal e para sempre — explicou ela com um sorriso triste enquanto deixava com suavidade a mao do St. Vincent. — me Casar era a unica forma de obte-lo. E, como sabera, nao e que tivesse uma cauda de pretendentes no Hampshire. Quando me inteirei do que St. Vincent fazia ao Lillian, horrorizei-me. Mas tambem me ocorreu que era a unica pessoa que parecia tao se desesperada como eu. O bastante para aceitar algo. — Formava parte de seu plano que dirigisse o clube de seu pai? — Nao, isso o decidiu ele, para minha surpresa. De fato, surpreendeu-me em todo momento desde que nos casamos. — Gesso? — Fez todo o possivel por me cuidar, ao tempo que proclama sua indiferenca. — Contemplou a cara de seu marido. — Tem coracao, apesar do muito que tenta convencer do contrario. — Ja. Tem-no, embora ate esta noite albergava minhas duvidas.

Capitulo 18 Embora Cam e Westcliff tiveram muito cuidado de leva-lo acima, o traslado debilitou a Sebastian. Evie os acompanhou todo o momento. Angustiava lhe ver a palidez de seu marido. Cam estava igual de consternado, embora continha suas emocoes para centrar-se no que a situacao requeria. — Nao sei como entrou Bullard — resmungou o moco enquanto carregavam o corpo necessitado por um lance comprido de escadas. — Conheco todas as formas de entrar e sair deste lugar. Acreditava que nao… — Nao e tua culpa, Cam — o interrompeu Evie em voz baixa. — Alguem lhe franqueou a entrada, em que apesar a que adverti aos empregados. — Nao e tua culpa — repetiu Evie, e o jovem se calou, mal-humorado. Westcliff guardou silencio, salvo quando murmurou umas indicacoes ao girar num canto. Carregava a Sebastian pelas axilas, enquanto Cam o sujeitava pelas pernas. Embora Sebastian era corpulento, ambos eram fortes e o levavam sem problemas. Evie os conduziu ate a quarto principal, que acabavam de renovar e tinha as paredes pintadas de nata. Tinham substituido a velha Cama por

outra grande e bonita, procedente da casa do Sebastian na cidade. Quem se teria imaginado que ia converter se no quarto de um doente tao pouco tempo depois da morte do Ivo Jenner. Um par de criadas, que seguiam as instrucoes de Evie, trouxeram toalhas e agua, e rasgaram uns lencois para obter tiras largas de tecido. Westcliff e Cam deixaram o corpo flacido na Cama, e Evie lhe tirou as botas enquanto eles o despiam. Deixaram lhe os calcoes por uma questao de pudor. Evie molhou uma tira limpa na agua quente e lavou as manchas de sangue do corpo de seu marido. Via-se prodigioso e indefeso de uma vez, com seu elegante corpo mais magro devido a atividade fisica constante e a varias refregas de beco que lhe tinham fortalecido os musculos. Westcliff tomou uma tira de tecido e secou com cuidado a ferida de bala para examina-la melhor. — Pelo tamanho do orificio, diria que Bullard usou uma pistola do calibre cinquenta. — Tenho a arma — disse Cam bruscamente. — Bullard a abandonou na galeria do primeiro piso detras ter disparado. — me deixe ve-la — pediu Westcliff. O moco a entregou pela culatra. Westcliff a examinou com o olhar perito de um atirador acostumado. — Uma pistola de duelo — observou. — Canhao octogonal de nove polegadas com olhe, seguro de platina e antecamara gravada. Uma arma custosa, e certamente parte de um jogo. A inscricao reza: Fabricada por Manson e Filho do Dover Street. — Examinou-a mais atentamente. — Aqui ha um te defenda de prata que tem gravado o nome do proprietario, acredito. Embora esteja muito deslustrado para distinguir as letras — indicou, e se meteu a pistola num bolso enquanto dizia ao Cam com uma sobrancelha arqueada: — se nao lhe importa, me ficarei. — E obvio, Milorde — respondeu secamente Cam, sabendo que em realidade sua permissao nao era necessaria. A chegada do doutor Hammond, um homem bondoso e de excelente reputacao que tinha atendido ao Ivo Jenner no passado, impediu que seguissem falando. Cam e Westcliff sairam da quarto enquanto o medico examinava ao paciente, limpava lhe a ferida e a cobria com uma vendagem ligeira. — Embora nao lesou nenhum orgao importante, a ferida e grave — explicou a Evie com expressao seria. — A recuperacao dependera de sua resistencia, dos cuidados que receba e, como sempre, da graca divina. E quase seguro que tera febre, que tera que seguir seu curso. Nestes casos, considero necessario sangrar ao paciente para lhe extrair tudo o sangue doente possivel. Visitarei-o cada dia para decidir quando deveriamos proceder a isso. Enquanto isso, mantenha-o limpo e descansado, lhe de agua e caldo de carne, e lhe administre este medicamento para lhe aliviar o mal-estar. Evie murmurou um obrigado quando entregou um frasco de xarope opiaceo. Depois de que o medico se fora, tampou a Sebastian com um edredom, ja que os efeitos do choque e a perda de sangue lhe provocavam tremores. Ele abriu os olhos e os enfocou nela com dificuldade. — Se necessitar a graca divina, tenho-o mal — sussurrou. — Salvo que possamos subornar a algum anjo corrupto. — Nao blasfeme — lhe advertiu Evie com um risinho sobressaltada. Abriu o xarope, serve uma colherada e passou um braco por detras do pescoco de seu marido. — Tome isto. Sebastian o fez com uma careta. Sem lhe tirar o braco do pescoco, Evie alargou a mao livre para uma taca de agua e a pos nos

labios. — Carinho — murmurou. — Bullard… — disse Sebastian detras ter obedecido, ja recostado de novo no travesseiro. — Cam nao conseguiu apanha-lo — respondeu Evie de uma vez que tomava um bote de balsamo e lhe lubrificava um pouco nos labios ressecados. — Cam e lorde Westcliff estao abaixo, falando com o policial que enviaram a investigar. — Resultou ferido alguem mais? — quis saber Sebastian, que tentava incorporar-se. Uma pontada de dor lhe fez empalidecer e se deixou cair com um grito afogado. — Nao te mova ou voltara a sangrar — disse Evie com brutalidade. Po lhe uma mao no peito e passou os dedos na magra correia que lhe percorria o torax ate chegar a alianca, antes de responder a sua pergunta: — Ninguem mais resultou ferido. E assim que se informou aos membros do clube de que o agressor tinha fugido, voltaram em turba, ao parecer bastante divertidos com o ocorrido. Os labios do Sebastian esbocaram uma ameaca de sorriso. — Mais diversao da que tinha previsto oferecer — comentou. — Cam diz que nao afetara ao negocio. — Medidas de seguranca — sussurrou Sebastian, exausto pelo esforco de falar. — lhe Diga ao Cam… — Sim, vai contratar a mais homens. Nao pense em nada disto agora. Preocupe-se so de te recuperar. — Evie… — Procurou provas a mao de sua esposa e a segurou fracamente sobre seu torax nu. Notou a alianca contra os batimentos do coracao irregulares de seu coracao. — Ve com o Westcliff — murmurou, e fechou os olhos. — Depois. Depois do que? Evie ficou olhando e compreendeu que se estava referindo a sua propria morte. Ao sentir que apartava a mao da sua, a reteve com forca. Ja nao era suave nem cuidada, a nao ser mais dura, calejada, com as unhas cortadas inexoravelmente curtas. — Nao — lhe contradisse. — Nao vai haver nenhum depois. Estarei contigo em todo momento. Ficara comigo. Nao te deixarei ir. — De repente, custou lhe respirar e sentiu a pressao do panico em seu peito. Ainda inclinada para ele, voltou a mao para que sua Palmas se tocassem e seus pulsos estivessem em contato, Um debil e o outro forte. — Nao te deixarei ir, meu amor — sussurrou, e entrelacou seus dedos com os do Sebastian. Sebastian despertou aturdido de dor, nao so na ferida, mas tambem na cabeca, os ossos e as articulacoes. O corpo lhe abrasava, como se tivesse fogo sob a pele, e se retorceu em uma tentativa inutil de evitar o calor. De repente, umas maos delicadas descenderam para ele e lhe aconteceram um pano molhado pela cara. Vaiou de alivio e alargou a mao para a origem do frescor. — Nao, Sebastian, nao. Fique quieto. Deixa que te ajude. Era a voz de Evie que lhe chegava atraves de uma dor insofrivel. Ofegante, soltou-a e se deixou cair de novo no colchao. O pano frio lhe percorreu o corpo com movimentos amplos e aliviou sua tortura temporalmente. Com cada passada, ia acalmando ate que pode jazer tranquilo sob seus cuidados. — Evie — disse com voz rouca. — Sim, carinho. — Ela se deteve antes de lhe por uns pedacinhos de gelo nos labios gretados. —

Estou aqui. Sebastian abriu os olhos. Perplexo por sua expressao de carinho, observou como se inclinava para ele. O gelo lhe desfez em seguida na boca. Antes de que pudesse lhe pedir mais, ja o tinha dado. Com um pano fresco, lavou lhe o peito e os flancos, e tambem as axilas. A quarto estava as escuras salvo pela luz que entrava por uma janela meio coberta, e uma brisa fria penetrava pela abertura. — O medico ordenou ter a janela fechada — comentou Evie ao ver seu olhar. — Mas parece descansar melhor quando esta aberta. Sebastian sentiu uma enorme gratidao quando ela seguiu refrescando-o com o pano molhado. Seu vestido branco e sua pele palida lhe conferiam o aspecto de um espirito imaculado e benevolo. — Quanto tempo? — sussurrou. — Hoje e o terceiro dia, carinho. Se pudesse te voltar um pouco para o lado sao… Espera, que te porei um travesseiro. Assim. Com parte das costas assim ao descoberto, Evie lhe refrescou os ombros doloridos e a coluna vertebral. Sebastian gemeu em voz baixa e recordou vagamente as demais vezes que lhe tinha feito isso, suas maos suaves, seu rosto sereno a luz do abajur. Em meio da confusao e a dor, tinha sido consciente de que ela o cuidava e estava pendente de suas necessidades com uma intuicao assombrosa. Quando tiritava devido a febre, tampava-o com mantas e estreitava seu corpo tremente entre seus bracos. Sempre estava ai antes de que ele tivesse que chama-la. Compreendia-o tudo, como se pudesse lhe ler o pensamento. O pior temor do Sebastian tinha sido sempre depender assim de alguem. E a cada hora que passava estava mais debil, tinha a ferida mais inflamada e a febre mais alta. Pressentia que a morte lhe rondava como um espectro impaciente, preparada para levar lhe quando suas defesas fraquejassem. Mas quando Evie estava com ele, remetia; a morte seguia a espreita, mas de longe. Ate entao nao tinha compreendido a fortaleza de sua mulher. Nem sequer ao ve-la cuidar com carinho a seu pai tinha suspeitado como seria depender dela, necessita-la. Mas nada lhe repugnava, nada era muito para ela. Era seu apoio, seu amparo, e ao mesmo tempo o debilitava com um carinho e uma ternura que tinha comecado a ansiar apesar de que o abrandavam. Os bracos largos e esbeltos de Evie o ajudaram a recostar-se no travesseiro. — Uns golinhos de agua — lhe disse enquanto lhe levantava a cabeca. Sebastian negou levemente com a cabeca porque, embora sentia a boca seca, uma so gota de agua lhe bastaria para ter nauseas. — Faz-o por mim — insistiu ela, e lhe levou a taca aos labios. Sebastian lhe dirigiu um olhar turvo mas obedeceu. E lhe incomodou que suas seguintes palavras de elogio lhe produziram uma sensacao de prazer. — E um anjo — murmurou Evie com um sorriso. — Muito bem. Agora descansa e te refrescarei um pouco mais. Ao notar como lhe acontecia o pano umido pelo pescoco e a cara, suspirou aliviado e fechou os olhos, mas os sonhos nao lhe permitiram descansar. Depois do que podiam ter sido minutos, horas ou dias, despertou afligido de uma dor terrivel. Tratou de tocar o flanco, que lhe ardia e doia como se lhe tivessem parecido uma lanca envenenada. — Sebastian, por favor. — A voz de Evie acalmou seu desassossego. — te Recoste. O doutor Hammond veio a te examinar. Sebastian descobriu que estava muito fraco para mover-se. Era como se lhe tivessem pacote chumbo aos bracos e as pernas. — me ajude — sussurrou com voz aspera, ja que nao desejava seguir totalmente horizontal. Evie se apressou a lhe levantar a cabeca e lhe por um travesseiro debaixo. — Boa tarde, Milorde — disse uma voz de baritono. O corpulento medico apareceu ante ele,

com um sorriso que lhe separava a barba cinza e lhe iluminava o rosto corado. — Esperava encontrar alguma melhoria — observou a Evie. — Baixou a febre? Ela sacudiu a cabeca. — Algum indicio de fome ou sede? — As vezes toma uns sorvos de agua — murmurou Evie, e deslizou os dedos ao redor dos do Sebastian. — Mas nao pode reter nada de caldo. — Darei uma olhada a ferida. Sebastian notou que lhe baixavam os lencois ate os quadris e lhe tiravam a vendagem. Quando tentou protestar contra a humilhacao de que o deixassem ao descoberto de uma forma tao displicente, Evie lhe pos uma mao no peito. — Tranquilo — lhe sussurrou. — E por seu bem. Muito fraco para levantar a cabeca, concentrou-se na cara de sua esposa enquanto ela e o medico observavam a ferida. A expressao de Evie nao trocou, mas pelo pestanejo rapido de seus olhos, soube que as coisas nao tinham melhorado — Como temia — disse Hammond em voz baixa— , esta-se inflamando. Ve essas raias vermelhas que se dirigem para o coracao? Terei que lhe extrair um pouco de sangue doente. Espero que isso reduza a inflamacao. — Mas ja perdeu muita sangue… — disse Evie, insegura. — Nao chegara a dois litros — replicou Hammond de modo tranquilizador. — Nao vou machucar o, milady, mas sim mas bem a lhe permitir liberar a constricao dos copos sanguineos devida a acumulacao de veneno. Sebastian sempre tinha tido duvidas sobre o processo da sangria, mas nunca tanto como agora que a foram praticar. O pulso lhe acelerou ate converter-se em golpezinhos debeis mas freneticos nas temporas. — Nao — sussurrou com a respiracao agitada. Sentiu um enjoo e se esforcou por ver atraves das luzes que lhe dancavam ante os olhos. Nao foi consciente de haver-se desacordado, mas quando voltou a abrir os olhos tinha o braco esquerdo pacote ao respaldo de uma cadeira junto a Cama com uma terrina no assento. Ainda nao havia sangre na terrina, mas Hammond se aproximava com um utensilio parecido a uma caixinha. — O que e isso? — perguntou Evie. Sebastian reuniu todas suas forcas para voltar a cabeca em direcao a sua mulher. — chama-se escarificador — respondeu Hammond. — E o metodo mais eficiente de sangrar, frente a antiquada lanceta. — Evie — sussurrou Sebastian. Ela nao pareceu ouvi-lo, ja que seu olhar cansado nao se desviou do medico, que seguia explicando-se. — A caixa contem doze folhas unidas a um dispositivo giratorio impulsionado por uma mola. Se se pulsar o mecanismo disparador, as folhas infligem uma serie de cortes superficiais que provocam a saida do sangue. — Evie. Ela o olhou e tentou tranquiliza-lo. — Isto te ajudara, carinho. — Nao. Mataria-o. Ja era bastante dificil combater a febre e a dor. Se uma larga sangria o debilitava

ainda mais, nao poderia aguenta-lo. Desesperadamente, puxou do braco que tinha estendido mas estava bem pacote e a cadeira nem sequer se moveu. Com uma maldicao silenciosa, elevou os olhos para sua esposa enquanto lutava contra um enjoo. — Nao — repetiu com rudeza. — Nao lhe deixe… — Carinho — sussurrou Evie e se agachou para lhe beijar os labios trementes. De repente lhe brilhavam os olhos de lagrimas Pode que seja sua oportunidade, sua unica oportunidade… — Morrerei, Evie… — Um medo crescente lhe nublou a vista, mas se obrigou a manter os olhos abertos. A cara de sua esposa se voltou imprecisa. — Morrerei… — sussurrou de novo. — Lady St. Vincent — disse a voz amavel e firme do doutor— , a ansiedade de seu marido e bastante compreensivel. Entretanto, seu julgamento se ve afetado por sua enfermidade. Neste momento, e voce quem esta mais capacitada para tomar decisoes por ele. Nao lhe recomendaria este procedimento se nao acreditasse em sua eficacia. Deve me permitir proceder. Duvido que lorde St. Vincent chegue a recordar alguma vez esta conversacao. Sebastian fechou os olhos e soltou um gemido de desespero. Quem dera Hammond fora o tipico louco com uma risada maniaca, alguem de quem Evie desconfiaria instintivamente. Mas Hammond era um homem respeitavel, com toda a conviccao de quem cria estar fazendo o correto. Ao parecer, um verdugo podia adotar muitas formas. Evie era sua unica esperanca, sua unica defensora. Sebastian jamais se teria imaginado que ocorreria isto, que sua vida dependeria da decisao de uma jovem ingenua que se deixaria convencer pela autoridade do Hammond. Nao havia ninguem mais a quem recorrer. Sentiu os dedos carinhosos de sua esposa em sua bochecha quente e elevou os olhos para ela com desespero, incapaz de pronunciar uma palavra. Meu deus, Evie, nao deixe que o faca. — Tudo bem— disse esta olhando-o. Ao Sebastian lhe parou o coracao ja que acreditou que o dizia ao medico. Mas Evie se dirigiu a cadeira, desatou lhe a boneca e comecou a lhe massagear a pele avermelhada. — Doutor Ha… Hammond— disse entao. — Lorde St. Vincent nao quer submeter-se a este procedimento. Devo respeitar seus desejos. Para sua eterna humilhacao, Sebastian soltou um soluco de alivio. — Milady, rogo lhe que repense — repos o medico, ansioso. — Respeitar os desejos de um homem que nao sabe o que diz devido a febre pode resultar mortal para ele. Me permita ajuda-lo. Confie em meu julgamento, sou medico. Evie se sentou na Cama enquanto acariciava a mao do Sebastian em seu regaco. — Respeito seu ju… ju… — deteve-se e sacudiu a cabeca. — Meu marido tem direito a tomar ele mesmo esta decisao. Sebastian fechou os dedos ao redor das dobras de seu vestido. O gagueira era um signo evidente de sua ansiedade interior, mas nao cederia. Podia ser tao obstinada como uma mula; ele sabia melhor que ninguem. Suspirou vacilante e se relaxou, com a sensacao de que sua manchada alma estava bem cuidada. Hammond sacudiu a cabeca e comecou a guardar seus instrumentos. — Se nao me permite utilizar minhas tecnicas e se nega a seguir minha opiniao profissional — anunciou com dignidade— , temo-me que nao poderei fazer nada pelo doente. Se nao se proporcionar o tratamento adequado, esta situacao tera um final desafortunado. Que Deus lhes ajude. O medico saiu da quarto deixando atras dele uma esteira dou profunda desaprovacao. Imensamente aliviado, Sebastian estendeu os dedos sobre a coxa de Evie.

— Que se va com vento fresco — conseguiu resmungar quando a porta se fechou. Era evidente que Evie se debatia entre rir ou chorar. — Olhe que e cabezota — lhe disse olhando-o com os olhos umidos de lagrimas. — Acabamos de jogar a um dos medicos mais reputados de Londres. Qualquer outro que venha querera tambem te sangrar. A quem chamaremos agora? A um bruxo? A um adivinho? Com as poucas forcas que ficavam, Sebastian conseguiu aproxima-la mao de Evie aos labios. — A ti — sussurrou. — So necessito a ti.

Capitulo 19 Evie teve muitas duvidas sobre sua decisao de nao permitir ao doutor Hammond proceder como acreditasse oportuno. Depois da marcha do medico, o estado de saude do Sebastian foi piorando: a ferida lhe inflamava e a febre lhe seguia subindo. A meia-noite ja nao estava lucido. Os olhos lhe brilhavam de modo inquietante na cara avermelhada pela febre. Olhava a Evie sem reconhece-la enquanto balbuciava incoerencias e fazia revelacoes sombrias que despertavam sua compaixao. — Silencio — sussurrava as vezes. — Silencio. Nao e assim, Sebastian. Mas ele insistia com um desespero terrivel. Sua mente atormentada tirava reluzir mais e mais coisas ate que finalmente Evie desistiu de tentar sossega-lo e lhe apertou as maos entre as suas enquanto ouvia com paciencia sua amarga letargia. Estando lucido ele jamais teria permitido que ninguem vislumbrasse seu eu interior desprotegido, mas Evie sabia talvez melhor que ninguem o que era viver em uma solidao se desesperada, desejando uma relacao, uma sensacao de plenitude. E tambem sabia ate que ponto se teria fundo Sebastian nessa solidao. Passado um momento, quando sua voz rouca logo que era um sussurro entrecortado, Evie lhe troco o pano da fronte e lhe aplicou balsamo aos labios gretados. Po lhe a mao na bochecha e sentiu como sua barba lhe arranhava os dedos. Em seu delirio, Sebastian voltou a cara para a suavidade de sua palma com um suspiro mudo. Seu marido era um ser formoso, pecador, atormentado. Haveria quem diria que estava mal querer a um homem assim, mas ao olhar seu corpo necessitado Evie soube que nenhum homem significaria para ela quao mesmo Sebastian porque, apesar de tudo, ele tinha estado disposto a dar sua vida por ela. Tombou-se a seu lado na Cama, encontrou a cadeia entre o cabelo de seu peito e cobriu a alianca com sua mao para dormir junto a ele umas horas. Pela manha, Sebastian estava totalmente imovel, sumido num estupor profundo. — Sebastian? — Tocou lhe a cara e o pescoco. Ardia em febre. Parecia impossivel que a pele humana pudesse estar tao quente. Levantou-se correndo e acionou com forca o atirador da Campainha. Com a ajuda do Cam e as criadas, tentaram lhe baixar a febre lhe colocando bolsas de musselina cheias de gelo ao redor do corpo. Sebastian permaneceu quieto e silencioso todo o momento. Evie teve certas esperancas quando a febre pareceu remeter, mas logo reatou sua ascensao imparavel. Cam, que tinha assumido as tarefas do Sebastian no clube alem das suas, parecia quase tao exausto como ela. Vestido ainda com a roupa da noite e a gravata cinza lhe pendurando desenredada do pescoco, aproximou-se aonde Evie estava sentada. Ela nunca tinha estado tao desesperada. Nao tinha perdido a esperanca nem sequer nos piores momentos passados com os Maybrick. Mas tinha a impressao de que se seu marido nao sobrevivia,

jamais voltaria a sorrir. Sebastian tinha sido o primeiro homem que tinha cruzado a barreira de seu acanhamento. E desde o comeco a tinha cuidado como ninguem. Sorriu com tristeza ao recordar o primeiro lava-pes quente que lhe tinha posto nos pes durante aquela viagem infernal a Escocia. Falou com o Cam sem deixar de observar a cara palida de seu marido. — Nao sei o que posso fazer — sussurrou. — Qualquer medico que chame querera sangra-lo, e lhe prometi que nao o permitiria. Cam lhe apartou umas mechas da cara e disse: — Minha avo era curandeira. Lembro que estava acostumado a me cobrir as criadas com agua salgada e lhes por uma compressa de musgo seco e pantano. E quando tinha febre, me fazia mastigar tuberculos de dondiego da noite. — Dondiego da noite — repetiu Evie sem compreender. — O que e?

— Cresce nos bosques — lhe explicou de uma vez que lhe acontecia o cabelo solto por detras da orelha. Evie apartou a cabeca, envergonhada porque nao se lavou e sabia da importancia que os ciganos dao a higiene pessoal. Contra o que a gente acredite, havia infinidade de rituais romanis relacionados com a lavagem e a limpeza. — Crie que poderia encontrar um pouco? — De dondiego da noite? — E de musgo de pantano. — Suponho que sim, com um pouco de tempo. — Nao acredito que fique muito — indicou Evie, e lhe quebrou a voz. Temendo perder o controle de suas emocoes, endireitou-se na cadeira e fugiu o contato que Cam oferecia a modo de consolo. — Nao; estou bem. Encontra o que cria que possa ir bem. — Voltarei logo — disse em voz baixa, e partiu. Evie seguiu sentada junto a Cama num estado de indecisao exausta, consciente de que possivelmente deveria fazer alguma concessao a sua falta de sonho, comida e algum que outro cuidado minimo, mas lhe dava medo deixar a Sebastian sequer uns minutos. Nao queria voltar e encontrar-se com que tudo tinha terminado em sua ausencia. Tentou esclarece-los pensamentos para tomar uma decisao, mas parecia ter os mecanismos cerebrais danificados. Encurvada na cadeira, contemplava a seu marido agonizante. Pesavam lhe tanto o corpo e a alma que lhe resultava impossivel atuar ou pensar. Nao foi consciente de que alguem entrava no quarto, nem de nenhum outro movimento que nao fora o minimo, quase imperceptivel, do peito do Sebastian ao respirar. Mas pouco a pouco se deu conta de que havia um homem de pe junto a sua cadeira. Sua presenca emanava uma vitalidade e uma forca contida que contrastava com o ambiente sonolento da quarto do doente. Ao elevar os olhos, viu o rosto preocupado de lorde Westcliff. Sem mediar palavra, Westcliff se agachou para levanta-la e a segurou para que nao perdesse o equilibrio. — Trouxe-te para alguem — lhe disse em voz baixa. O olhar de Evie percorreu a quarto ate que conseguiu concentra-la na outra visita. Era Lillian Bowman, agora lady Westcliff, elegante e radiante com um vestido granada. Sua tez branca mostrava um pouco de cor do sol da Italia, e levava o cabelo negro recolhido na nuca com uma rede para cabelo chapeada bordada com contas. Lillian era uma jovem indomita, alta e esbelta, a que cabia imaginar-se capitaneando seu proprio navio pirata; uma jovem feita para atividades perigosas e nada convencionais. Embora nao possuia a beleza romantica de Annabelle Hunt, tinha um atrativo impressionante, de rasgos bem definidos, que proclamavam que era americana antes de ouvir sequer seu acento novaiorquino. De seu circulo de amigas, Lillian era a que sentia mais proxima. Lillian nao possuia a suavidade maternal de Annabelle, nem o otimismo radiante de Daisy. Sempre tinha intimidado a Evie com sua lingua afiada e sua impaciencia. Entretanto, podia lhe contar com ela nos maus momentos. Ao ver o rosto gasto de Evie, aproximou-se sem duvida-lo e a estreitou entre seus bracos. — Evie — murmurou com carinho. — Em que confusao te colocaste? A surpresa e o alivio de sentir-se tao agasalhada por uma amiga a que nao esperava ver a afligiram por completo. Sentiu como se agucava a dor nos olhos e a garganta ate que nao pode conter mais o pranto.

— Teria que ter visto como reagi quando Annabelle e Daisy me contaram o que tinha feito — disse Lillian, e a abracou com mais forca lhe aplaudindo as costas. — Quase me caio redonda, e depois lancei toda classe de imprecacoes contra St. Vincent por aproveitar-se de ti. Estive tentada de vir aqui e lhe disparar. Mas parece que alguem me evitou a molestia. — Amo-o — sussurrou Evie entre solucos. — Nao e possivel — soltou Lillian inexpressivamente. — Sim, amo-o, e vou perder o como perdi a meu pai. Nao o suporto… — So voce poderia amar a um homem tao vil e egoista — murmurou Lillian detras suspirar. — Admito que tem seu atrativo, mas seria melhor que desse seu carinho a alguem que pudesse te corresponder. — Lillian! — protestou Evie. — De acordo. Suponho que nao esta bem insultar a um homem prostrado. De momento me calarei. — separou-se e observou as gastas faccoes de Evie com preocupacao As demais queriam vir, claro. Mas Daisy nao esta casada e, portanto, nao pode nem espirrar sem acompanhante, e Annabelle se cansar com facilidade devido a seu estado. Mas Westcliff e eu estamos aqui, e vamos solucionar o tudo. — Nao poderao — choramingou Evie. — Sua ferida… Esta muito grave. Entrou no co… virgula, acredito. Lillian a rodeou com um braco e se voltou para o conde para lhe perguntar com voz de sargento de cavalaria: — Esta em virgula, Westcliff? O conde, que estava inclinado para o corpo de barriga para baixo do Sebastian, dirigiu lhe um olhar ironico. — Duvido que ninguem pudesse esta-lo com o alvoroco que armas. Nao, se estivesse em virgula nao despertaria. E nao ha duvida de que se moveu quando gritou. — Eu nao gritei — o corrigiu Lillian. — So falei em voz alta. E distinto. — Seriamente? — repos Westcliff com suavidade, de uma vez que destampava Sebastian ate os quadris. — Levanta a voz tao frequentemente que nao vejo a diferenca. Lillian soltou a Evie com uma risinho mordaz. — Como estou casada contigo, me… meu deus, e horrivel! — exclamou ao ver a ferida do Sebastian, que ficou ao descoberto quando Westcliff lhe tirou a vendagem. — Sim— disse o conde em tom grave enquanto observava a ferida purulenta, com as linhas vermelhas que se dirigiam para cima. Evie se secou as bochechas e se aproximou da Cama. Westcliff, competente como sempre, tirou um lenco da jaqueta e o deu. — esteve insensivel desde ontem pela tarde — explicou Evie detras seca-los olhos e soa-la nariz. — Nao permiti que o doutor Hammond lhe sangrasse. Sebastian nao queria. Mas agora eu gostaria de have-lo feito. Poderia haver melhorado. Mas e que nao podia deixar que lhe fizessem algo contra sua vontade. A forma em que me olhou… — Duvido muito que lhe tivesse melhorado — disse Westcliff. — Poderia ter acabado com ele. Lillian se aproximou mais e se estremeceu ao ver a asquerosa ferida e a palidez amarelada do Sebastian. — O que podemos fazer, entao?

— O senhor Rohan sugeriu cobrir a ferida com uma solucao salina — indicou Evie de uma vez que cobria com cuidado o orificio de bala e tampava a Sebastian ate os ombros. — Conhece uma planta que poderia lhe baixar a febre. Agora mesmo foi para busca-lo tudo. — Poderiamos lavar lhe com suco de alho — sugeriu Lillian. — Minha baba estava acostumada faze-lo com os cortes e arranhoes, e se curavam muito mais rapido. — Minha velha ama de chaves, a senhora Faircloth, utilizava vinagre — murmurou Westcliff. — Ardia muitissimo, mas ia bem. Acredito que poderiamos provar uma combinacao das tres coisas e lhe acrescentar essencia de terebintina. — Resina de pinheiro? — Lillian o olhou indecisa. — Destilada — respondeu Westcliff. — Vi como curava gangrenas. — Voltou para o Lillian para ele e lhe deu um beijo carinhoso na fronte. — Conseguirei todo o necessario e calcularei as proporcoes — disse. Sua expressao era grave, mas seus olhos sombrios refletiram um brilho carinhoso quando se fixaram nos de sua mulher. — Enquanto isso, deixarei a situacao em suas maos. — Sera melhor que te de pressa. — Lillian seguiu a borda do pescoco da Camisa do Westcliff com o dedo deixando que a ponta tocasse sua pele morena. — Se St. Vincent se acordada e ve que esta a minha merce, e provavel que se mora do susto. — Nao morrera — assegurou Westcliff. — Se voce o diz — repos Lillian— , assim sera. Nem o muito mesmo diabo se atreveria a te contradizer uma vez que decidiste algo. Intercambiaram um breve sorriso antes de que Westcliff partisse. — Que arrogante e presuncoso e — comentou Lillian sem deixar de sorrir enquanto observava como o conde se ia. — meu Deus, adoro-o. — Como foi que…? — Evie se Cambaleou. — Temos muitas coisas de que falar, ceu — a interrompeu energicamente Lillian. — Pelo que teremos que deixa-lo para depois. Esta meio morta de cansaco. E, francamente, nao iria mal um banho. — Procurou o atirador com o olhar e, assim que o localizou no canto, chamou. — Agora estou aqui para cuidar de ti. Vamos pedir que encham uma banheira para que te lave, e depois tomara umas torradas com um pouco de cha. Evie sacudiu a cabeca e abriu a boca para protestar, mas Lillian desprezou suas objecoes com firmeza. — Eu me encarregarei do St. Vincent. Sem entender por que sua amiga se oferecia a cuidar de seu raptor, Evie a olhou com receio. Sua amiga nao destacava por ser compassiva e, embora jamais machucaria a um homem indefeso prostrado em uma Cama, deixar Sebastian a sua merce nao a tranquilizava de tudo. — Nao posso acreditar que queira… depois do que te fez. — Nao o faco por ele, ceu — sorriu Lillian com ironia. — O faco por ti. E pelo Westcliff, que por alguma razao se nega a considera-lo uma causa perdida. — Ao ver que Evie seguia duvidando, entreabriu os olhos com impaciencia. — Pelo amor de Deus, va banhar te. E te faca algo no cabelo. Nao se preocupe pelo St. Vincent. Serei tao amavel com ele como o seria com meu proprio marido. — Obrigado — sussurrou Evie, e notou que os olhos voltavam a encher-se o de lagrimas. — OH, ceu… — Lillian adotou uma expressao de compaixao que Evie nunca lhe tinha visto e a abracou de novo. — Nao se preocupe. Nao vai se morrer. So a gente boa morre prematuramente — comentou, e acrescentou com uma risinho: — Os casulos egoistas como St. Vincent vivem decadas

para atormentar a outros. Evie se banhou e se trocou com a ajuda de uma criada. Ficou um vestido folgado sem espartilho, fez-se uma tranca no cabelo e se calcou umas sapatilhas de ponto. Ao voltar para a quarto do Sebastian, viu que Lillian a tinha ordenado e tinha aberto as cortinas. Levava um trapo pacote a cintura a modo de avental improvisado, que estava manchado, quao mesmo seu corpete. — Fiz lhe tomar um pouco de caldo — explicou Lillian. — Me custou conseguir que o tragasse, ja que nao estava o que se diz consciente, mas insisti ate que tomou quase meio tigela. Acredito que transigiu com a esperanca de que eu fosse um pesadelo que desapareceria se me seguia a corrente. Evie tinha sido incapaz de conseguir que Sebastian bebesse nada desde na manha anterior. — E fantastica. — Sim, ja sei. — Lillian fez um gesto de impaciencia, incomoda como sempre que a elogiavam. — Acabam de subir uma bandeja; esta ai, na mesa junto a janela. Ovos escaldados com torradas. Comete-o tudo, ceu. Eu nao gostaria de ter que usar a forca tambem contigo. Enquanto Evie se sentava e atacava obedientemente uma torrada lubrificada de manteiga, Lillian trocou o pano da fronte do Sebastian. — Devo admitir que costa aborrece-lo vendo-o tao mal. E diz muito a seu favor que esteja ferido por te proteger. — sentou-se na cadeira situada junto a Cama e olhou a Evie. — Pergunto por que o faria. E egoista ate a medula. Nao e absolutamente a classe de homem que se sacrificaria por ninguem. — Nao e tao egoista — balbuciou Evie, e acompanhou a torrada com um sorvo de cha quente. — Westcliff acredita que St. Vincent esta apaixonado por ti. Evie se engasgou um pouco e nao se atreveu a levantar os olhos do prato. — por que acredite isso? — Como o conhece desde pequeno, entende-o bastante bem. E considera que tem sua logica que tenha sido voce quem finalmente o conquistou. Diz que uma garota como voce seria… mmm… Como o disse? Nao recordo as palavras exatas, mas era algo como que seria a fantasia mais intima e secreta do St. Vincent.

Evie se ruborizou e procurou — Ao contrario, sua fantasia e ter relacoes com todas as mulheres que lhe cruzem por diante. — Essa nao e a fantasia do St. Vincent, ceu, e sua realidade — a contradisse Lillian com um sorriso. — E voce pode que seja, em comparacao, a primeira moca doce e decente com a que se relaciona. Nunca tinha conhecido a alguem como voce. — Passou muito tempo contigo e com o Daisy no Hampshire. — Eu nao sou nada doce, ceu — esclareceu Lillian, divertida com o comentario de seu amiga. — E tampouco o e minha irma. Nao me diga que te enganaste pensando isso todo este tempo. Justo quando Evie terminou o prato de ovos com torradas, lorde Westcliff e Cam entraram no quarto carregados de potes, garrafas, pocoes e diversos artigos. Acompanhavam-nos um par de criadas com vasilhas de metal fumegantes e montoes de toalhas dobradas. Embora Evie queria ajudar, pediram lhe que se apartasse enquanto dispunham os objetos junto a Cama e cobriam ao doente com toalhas ate deixar ao descoberto so a ferida. — Seria conveniente que antes tomasse um pouco de morfina — assinalou Westcliff, e com um palito e uma parte de linho formou uma especie de bastaozinho de algodao. — E provavel que este procedimento o aduela mais que o proprio disparo. — Lhe pode obrigar a tragar — assegurou Lillian. — Quer que me eu encarregue, Evie? — Nao, ja o farei eu. — Evie se aproximou da Cama e verteu uma dose de xarope de morfina num copo. Cam se situou a seu lado e lhe deu um envelope de papel que continha o que parecia cinza verde escuro. — O dondiego da noite — esclareceu. — O encontrei no primeiro farmaceutico ao que fui. O musgo de pantano foi algo mais dificil de encontrar, mas tambem o consegui. Evie lhe deu as obrigado com um gesto. — Quanto po devo lhe dar? — Para um homem do tamanho do St. Vincent, eu diria que dois colheradas pelo menos. Evie removeu o po no copo com o medicamento cor ambar, que se voltou negro. Sem duvida saberia pior do que parecia. So esperava que se Sebastian aceitava tragar lhe pudesse reter de algum modo essa beberagem tao repugnante. Sentou-se na Cama e lhe acariciou o cabelo e a bochecha ressecada e ardente. — Sebastian — sussurrou. — Acordada. Tem que tomar um medicamento. Nao despertou, nem sequer quando lhe passou um braco por detras do pescoco e tratou de lhe levantar a cabeca. — Nao, assim nao — disse Lillian. — E muito delicada. Eu tive que sacudi-lo com forca para que despertasse e tomasse o caldo. Deixa que te ensine. Sentou-se na Cama a seu lado e sacudiu ao paciente varias vezes sem contemplacoes, ate que este gemeu e entreabriu os olhos. Olhou-as sem as reconhecer. — Sebastian — disse Evie com ternura. — Tenho que te dar um medicamento. Tentou voltar-se para o flanco ferido e a dor lhe provocou uma reacao violenta: com um brusco movimento do braco jogou no Evie e Lillian fora da Cama, as fazendo cair ao chao. — Maldicao! — exclamou Lillian. Evie com muita dificuldade conseguiu evitar que o conteudo do copo se derramasse. Sebastian, delirante, ofegou e grunhiu, e se deixou cair na Cama tremendo como um farrapo.

Embora sua resistencia consternou a Evie, tambem lhe alegrou comprovar que conservava parte de suas forcas, o que era preferivel a sua anterior quietude cadaverica. Lillian, entretanto, nao opinava o mesmo. — Teremos que ata-lo — sentenciou. — Nao poderemos lhe sujeitar enquanto lhe tratamos a ferida. — Nao quero que… — comecou Evie mas, para seu assombro, Cam estava de acodo com o Lillian. — Lady Westcliff tem razao. Evie guardou silencio e contemplou o corpo tremente de seu marido. Voltava a ter os olhos fechados e retorcia os dedos convulsivamente, como se queria apanhar algo no ar. Era incrivel que um homem tao vital pudesse ver-se reduzido a uma figura tao enxuta e sem vida. Faria o que fora necessario para lhe ajudar. Tomou com resolucao uns trapos limpos e os entregou ao Cam, que foi de uma esquina a outra da Cama para atar com firmeza os dois bracos e uma perna do Sebastian a armacao de ferro. — Dou lhe o medicamento? — perguntou a Evie. — Posso faze-lo eu — respondeu esta, e voltou a sentar-se na Cama. Depois de lhe por outro travesseiro debaixo da cabeca, tampou lhe o nariz com os dedos. Assim que Sebastian abriu a boca para aspirar, verteu lhe dentro a espessa beberagem. O pobre se engasgou mas tragou o medicamento com o minimo alvoroco possivel. Cam arqueou as sobrancelhas, impressionado pela eficiencia de Evie, enquanto Sebastian amaldicoava e atirava em vao de suas ataduras. Evie se inclinou para ele, acariciou-o e o acalmou lhe sussurrando palavras carinhosas. Quando por fim se tranquilizou, Evie elevou os olhos e viu que Lillian os contemplava com os olhos entreabertos e sacudindo ligeiramente a cabeca, como assombrada. Evie supos que como so tinha conhecido a Sebastian em seu papel de arrogante libertino que rondava pelo imovel do Westcliff, ve-lo em semelhantes circunstancias devia lhe resultar incrivel. Enquanto isso, Westcliff se tinha tirado a jaqueta e arregacado a camisa, e estava removendo uma mescla que propagou um fedor caustico pela quarto. Lillian, cujo olfato era especialmente sensivel, fez uma careta e se estremeceu. — E a combinacao de aromas mais espantosa que cheirei em minha vida. — Essencia de terebintina, alho e outros ingredientes que o farmaceutico sugeriu — explicou Cam. — Tambem disse que depois lhe aplicassemos um cataplasma de mel, ja que isso evita que as feridas se infectem. E a seguir extraiu de uma caixa de madeira um funil de latao e um objeto cilindrico com uma manga num extremo e uma especie de agulha no outro. — O que e isso? — exclamou Evie, assustada. — Tambem do farmaceutico — explicou Cam, e elevou o artefato para observa-lo com os olhos entreabertos. — Uma seringa. Quando lhe descrevemos o que pensavamos fazer, disse que se a ferida era tao profunda, a unica forma de irriga-la bem era usando isto. Depois de dispor uma serie de instrumentos, recipientes de produtos quimicos e um montao de toalhas e trapos dobrados, Westcliff se dirigiu as duas mulheres. — Isto sera bastante desagradavel — anunciou. — portanto, se houver alguem apreensivo… — Olhou de modo significativo ao Lillian, que fez uma careta. — Eu sou apreensiva, como muito bem sabe — admitiu. — Mas posso me dominar se for necessario. Um sorriso carinhoso iluminou o rosto impassivel do conde.

— Evitaremos lhe o mau gole, carinho. Quer sair da quarto? — Sentarei me junto a janela — disse Lillian, e se afastou agradecida da Cama. Westcliff olhou a Evie com uma pergunta silenciosa nos olhos. — Onde me ponho? — disse esta. — A minha esquerda. Necessitaremos muitas toalhas, assim ira substituindo as sujas quando for necessario. — Muito bem. Ocupou seu lugar enquanto Cam se colocava a direita do conde. Quando Evie elevou os olhos para o perfil decidido do Westcliff, de repente lhe custou acreditar que esse homem poderoso, que sempre a tinha intimidado tanto, estivesse disposto a tudo isso por ajudar a um amigo que o tinha traido. Sentiu uma enorme gratidao, e nao pode evitar lhe atirar um pouco da manga. — Tenho que te dizer algo antes de comecar… — Sim? — Westcliff inclinou a cabeca para ela. Como nao era tao alto como Sebastian, lhe foi facil ficar nas pontas dos pes para lhe beijar a bochecha. — Obrigado por ajuda-lo — disse olhando-o aos olhos, que mostravam uma expressao de surpresa. — E o homem mais honoravel que conheci. Suas palavras fizeram ruborizar aquela cara bronzeada pelo sol, e pela primeira vez desde que se conheciam, parecia que o conde nao sabia o que dizer. — Seus motivos nao sao tao honoraveis — assegurou Lillian, que os observava do outro lado da quarto com um sorriso. — Estou segura de que lhe entusiasma a ideia de verter literalmente sal nas feridas do St. Vincent. Apesar de sua ironia, Lillian empalideceu e se aferrou aos bracos da cadeira quando Westcliff tomou uma lanceta magra e reluzente, e procedeu a abrir e drenar com cuidado a ferida. Inclusive depois da dose abundante de morfina, a dor fez que Sebastian arqueasse as costas e se retorcesse com o rosto contraido, enquanto soltava protestos incoerentes. Cam o imobilizou para evitar qualquer movimento. O mais dificil foi, entretanto, quando Westcliff comecou a verter agua salgada na ferida. Sebastian gritou com rudeza e lutou enquanto seu amigo utilizava a seringa repetidamente ate que a solucao salina que empapava as toalhas que tinha sob o corpo adquiriu um tom rosado devido ao sangue. Westcliff se trabalhou em excesso de modo firme e preciso, com uma eficiencia e energia que qualquer cirurgiao teria admirado. De algum modo, Evie foi capaz de superar sua angustia, que sepultou sob capas de atordoamento enquanto se trabalhava em excesso com a mesma indiferenca que mostravam Westcliff e Cam. Metodicamente, retirava as toalhas sujas punha outras novas no flanco de seu marido. Para seu imenso alivio, Sebastian se deprimiu em seguida, de modo que permaneceu alheio ao resto do doloroso tratamento. Uma vez a carne viva esteve poda, Westcliff embebeu um algodao na mescla de terebintina e empapou a ferida a consciencia. Depois se apartou e deixou atuar ao Cam, que envolveu um pouco de musgo de pantano num pano de musselina, lubrificou-o de mel e o aplicou com cuidado na zona. — Ja esta - anunciou o romani, e desatou por fim as extremidades do Sebastian. — A cura comecara de dentro. Seguiremos com os cataplasmas uns quantos dias e depois prescindiremos do musgo e deixaremos que cresca pele nova.

Logo, todos uniram esforcos para rodear totalmente a cintura esbelta do Sebastian com uma atadura de linho e para muda os lencois molhados a efeitos de deixar a Cama limpa e seca. Quando tiveram terminado, Evie comecou a tremer devido a tensao. Viu com surpresa que ate o Westcliff parecia cansado, e que soltava um comprido suspiro enquanto com um trapo se enxugava a suarenta cara. Lillian se aproximou dele para abraca-lo e lhe murmurar palavras carinhosas. — Acredito que deveriamos muda a cataplasma e a vendagem umas duas vezes ao dia - comentou Cam enquanto se lavava as maos com agua e sabao. — Se ao anoitecer nao lhe baixou a febre, dobraremos a dose de dondiego. — Fez gestos a Evie para que se aproximasse e lhe lavou tambem as maos e os bracos. — Todo ira bem, princesa. Quando o conde drenava a ferida, nao se via tao mal como me temia. Evie meneou a cabeca com desalento enquanto esperava com passividade infantil a que lhe secasse as maos. — Nao posso me permitir nenhuma esperanca… Foi apagando a voz. Notou como se o chao se inclinasse sob seus pes, e se moveu com estupidez para tratar de conservar o equilibrio. Cam a segurou e a aproximou do peito. — A Cama - ordenou enquanto a levava para a porta. — Sebastian… — balbuciou ela. — Nos ocuparemos dele enquanto voce descansa. Nao pode escolher, ja que seu corpo, privado de sonho e exausto, negou-se a seguir sustentandoa. Quao ultimo soube foi que Cam a deitava na Cama e a agasalhava como se fora uma menina pequena. Assim que seu calor corporal comecou a esquentar os lencois frite, sumiu-se num sonho tranquilo. Ao despertar, Evie viu a alegre chama de uma vela na mesinha de noite. Havia alguem sentado aos pes da Cama. Era Lillian, com aspecto desalinhado e cansado e o cabelo recolhido na nuca. Evie se incorporou devagar e se esfregou os olhos. — E de noite? — perguntou com voz rouca. — Devo ter dormido toda a tarde. — dormiste dia e meio, ceu — replico sua amiga com um sorriso. — Westcliff e eu cuidamos que seu principe azul enquanto Rohan dirigia o clube. Evie se passou a lingua pela boca pastosa e terminou de incorporar-se, assustada. — Sebastian… — esforcou-se por perguntar enquanto o coracao lhe pulsava com forca. — Esta…? — O que quer ouvir primeiro, a boa noticia ou a ma? — repos Lillian com docura detras tomar a mao entre as suas. Evie sacudiu a cabeca, incapaz de falar. Olhou a sua amiga com labios trementes, sem pestanejar. — A boa e que lhe baixou a febre e que a ferida ja nao esta infectada - explicou Lillian, e sorriu para acrescentar: — A ma e que talvez tenha que suportar a esse patife o resto de sua vida. Evie se pos a chorar de alivio. — OH, Meu deus! Tampou-se os olhos com a mao livre enquanto os solucos lhe sacudiam os ombros. Lillian lhe oprimiu a mao com forca. — Sim— comentou Lillian com voz seca. — Eu tambem choraria se fosse meu marido, embora por razoes muito distintas. Isso fez sorrir a Evie, que sacudiu a cabeca sem desentupir-se ainda os olhos chorosos. — Esta consciente? Pode falar?

— Sim, perguntou varias vezes por ti, e se zangou quando me neguei a despertar antes. Evie baixou a mao e a observou atraves das lagrimas. — Estou segura de que nao queria ser ingrato — comentou. — depois de to… tudo o que tem feito… — Nao trate de lhe justificar — indicou Lillian, divertida. — O conheco bastante bem. E certamente nao me acredito que queira a ninguem que nao ele seja mesmo, bom, acaso um pouco a ti. Mas se te faz feliz, suponho que terei que suporta-lo. Lillian enrugou o nariz e pareceu procurar de onde procedia um aroma desagradavel antes de detecta-lo nas mangas de seu vestido. — OH, menos mal que minha familia possui uma fabrica de sabao. Porque necessitarei cem pastilhas para me tirar a peste desse maldito cataplasma. — Nunca poderei te agradecer quao suficiente o tenha cuidado — disse Evie. — Nao ha de que — respondeu alegremente Lillian detras levantar-se da Cama e encolher-se de ombros. — Valeu a pena, embora so seja para que St. Vincent esteja em divida comigo. Nao podera voltar a me olhar na cara sem a humilhacao de recordar que lhe vi nu e inconsciente em uma Cama. — Viu-o nu? — perguntou Evie arqueando as sobrancelhas. — Ora — disse sua amiga com afetado desdem, ja de Caminho para a porta. — O vi um par de vezes, dada a situacao da ferida. — Ao chegar a porta dirigiu a Evie um olhar safadinho. — Sobre esse rumor que circula sobre ele, tenho que admitir que fica curto. — Que rumor? — perguntou Evie sem compreender, e Lillian se foi da quarto soltando um risinho.

Capitulo 20 Antes que tivesse passado uma semana, Sebastian se tinha convertido no pior paciente imaginavel. Curava-se a um ritmo consideravel, embora nao o bastante depressa para seu gosto, e se frustrava ele mesmo e a todos outros ao exceder todos os limites. Queria fica-la roupa de costume e comer como sempre. Insistiu obstinadamente em levantar-se e percorrer capengante os aposentos e a galeria superior, sem fazer caso dos protestos exasperados de Evie. Sabia que nao podia forcar sua recuperacao, que exigiria tempo e paciencia, mas nao podia controlar-se. Jamais tinha dependido de ninguem, e agora que devia sua vida ao Westcliff, Lillian, Cam e, sobretudo, a Evie, embargavam-no umas sensacoes desconhecidas: a gratidao e a vergonha. Nao suportava olha-los aos olhos, de modo que se refugiava em uma aspera arrogancia. Os piores momentos eram quando estava a sos com o Evie. Cada vez que ela entrava no quarto, sentia uma conexao aterradora, uma sensacao desconhecida, e a combatia ate ficar exausto, tivesse lhe ido bem provocar uma discussao com ela, algo para estabelecer a distancia necessaria, mas isso era impossivel ja que Evie satisfazia todas suas peticoes com paciencia e preocupacao infinita. Nao podia acusar a de esperar gratidao, ja que ela nao dava a entender que a devesse. Nao podia acusar a de envenena-lo, ja que cuidava dele com uma eficiencia delicada, e tinha o tato de deixa-lo solo salvo que ele a chamasse.

Ele, que nunca tinha temido nada, estava apavorado do poder que Evie tinha sobre ele. E lhe dava medo seu desejo de estar com ela todos os minutos do dia, de ve-la, de ouvir sua voz. Desejava seu contato. Sua pele parecia estar pendente das caricias de sua esposa, como se essa sensacao formasse parte de seu corpo. Era algo distinto a mera necessidade sexual, era uma especie de vicio patetico e irremediavel. Saber que Joss Bullard tinha atentado contra Evie lhe atormentava ainda mais. Tinha que averiguar por que Bullard tinha chegado a tal extremo, por que demonios queria matar a pessoa mais doce do mundo. Sebastian queria o sangue do Bullard. Queria faze-lo picadinho. O fato de que jazesse indefeso na Cama enquanto Bullard perambulava livremente por Londres bastava para po-lo furioso. Nao o tranquilizava absolutamente que o inspetor de policia atribuido ao caso lhe assegurasse que se estava fazendo todo o possivel por encontrar ao Bullard. Assim, Sebastian tinha ordenado ao Cam que contratasse a mais investigadores privados, incluido um ex-policiais, para que levassem a cabo uma busca intensiva. Enquanto isso, nao podia fazer nada mais e se consumia em sua inatividade forcosa. Cinco dias depois de que a febre remetesse, Evie fez subir a sua quarto uma banheira. Sebastian, encantado, relaxou-se na agua fumegante enquanto ela o barbeava e lhe ajudava a lavar o cabelo. Quando esteve limpo, seco e debilitado, voltou para a Cama recem feita e deixou que sua esposa lhe enfaixasse a ferida. O orificio de bala estava cicatrizando tao rapido que ja nao lhe punham musgo, e o levava agora simplesmente talher com uma capa ligeira de linho. Seguia lhe provocando ferroadas frequentes e uma ligeira dor, mas sabia que num par de dias mais poderia reatar a maioria de suas atividades normais. Salvo seu favorita, a que, segundo aquele nefasto trato com o Evie, seguia estando proibida. Como a parte dianteira do vestido lhe tinha empapado durante o banho de seu marido, Evie tinha ido muda se. Por pura perversao, Sebastian fez soar a Campainha de prata que tinha na mesinha de noite uns dois minutos depois de que ela se foi. Evie retornou em seguida em bata. — O que quer? — perguntou com preocupacao. — aconteceu algo? — Nao. — E a ferida? Doi-te? — Nao. Ela suspirou de alivio e se aproximou da Cama. Tomou com delicadeza a Campainha da mao do Sebastian e a deixou na mesinha. — Sabe o que? — comentou. — Se nao usar a campainha de forma mais judiciosa, tiraremos o sino. — Chamei porque precisava de voce. — soltou Sebastian. — Ah, sim? — replicou Evie com paciencia. — As cortinas. Quero-as mais abertas. — Nao podia ter esperado um momento? — Esta muito escuro. Necessito mais luz. Evie separou as cortinas de veludo e ficou ai, recortada com a palida luz do sol invernal. Com os cabelos soltos e os suaves cachos ruivos que lhe chegavam ate a cintura, parecia tirada de um quadro do Tiziano. — Algo mais, excelencia? — Ha uma poeira na agua. Evie se aproximou da Cama e levantou o copo meio cheio para examina-lo com olho critico.

— Eu nao vejo nenhuma — disse. — Esta ai— grunhiu Sebastian. — Temos que discutir a questao ou vai me trazer agua nova? Com infinito autodominio, Evie foi ate o lavabo, esvaziou o copo na bacia de ceramica e o encheu com agua fresca. Levou-o a mesinha de noite e olhou a seu marido arqueando uma sobrancelha. — E tudo, Milorde? — Pois nao. A vendagem me aperta muito. E o extremo solto fica nas costas. Nao chego. Quanto mais tolo se mostrava ele, mais irritantemente paciente se voltava ela. Inclinou-se para ele, murmurou lhe que se voltasse um pouco, afrouxou lhe a vendagem e lhe arrumou de novo os extremos. O roce de seus dedos nas costas, tao frios e delicados, aceleraram o pulso do Sebastian. Deitado de barriga para cima de novo, lutou contra a excitacao que sua proximidade lhe produzia. Elevou os olhos com desespero para o Evie e viu seus formosos labios em forma de arco, sua pele suave e cremosa, a irresistivel distribuicao de suas sardas. Lhe pos uma mao no peito, sobre o coracao desbocado, e brincou com a alianca que estava no pescoco. — Tire me resmungou ele. — E um problema. Estorva-me. — Para que te estorva? Sebastian cheirou sua pele, a fragrancia de mulher limpa e calida, e se removeu na Cama. — Tire-me isso e deixa-a na penteadeira — conseguiu balbuciar. Evie ignorou a ordem, sentou-se na Cama e se inclinou para ele ate que seus cabelos soltos lhe rocaram o torax. Sebastian permaneceu imovel, mas tremeu por dentro quando lhe passou um dedo pela mandibula. — Barbeei-te bem — observou Evie, satisfeita. — Pode que tenha passado por cima um ou dois pontos, mas pelo menos nao te destrocei a cara. Ajudou muito que te estivesse quieto. — Estava muito assustado para me mover — respondeu ele, e Evie sorriu divertida. Incapaz de seguir sem olha-la, Sebastian contemplou os olhos sorridentes de Evie, tao redondos e incrivelmente azuis. — Por que me chamas tao frequentemente com a Campainha? — sussurro ela. — Se sente sozinho? So tem que dize-lo. — Nao me sinto sozinho — respondeu como um menino obcecado. — Quer que eu va entao? — repos ela com docura maliciosa. Sebastian notou um calor traicoeiro na virilha. — Sim, vai — respondeu, e fechou os olhos enquanto absorvia com avidez a fragrancia de sua proximidade. Mas Evie ficou, e o silencio se prolongou ate que Sebastian teve a impressao de que os batimentos do coracao de seu coracao deviam ouvir-se. — Quer saber o que acredito, carinho? — perguntou Evie por fim. — Nao especialmente. — Apertou os labios e fechou os olhos. — Acredito que se for desta quarto, vais usar outra vez a Campainha. Mas nao importa as vezes que me chame nem as que eu acuda, nunca podera me dizer o que realmente quer. Sebastian entreabriu os olhos, o que foi um engano. Tinha a cara de Evie muito perto e seus suaves labios a escassos centimetros. — Neste momento so quero um pouco de tranquilidade — resmungou. — Assim se nao te importar… Evie lhe beijou os labios brandamente para sossega-lo. Sebastian se excitou fulminantemente e

levantou as maos para lhe apartar a cabeca, mas em troca seus dedos trementes a sujeitaram para aprofundar e prolongar o beijo com uma urgencia voraz. Envergonhou-se ao tirar o chapeu ofegando como um moco inexperiente quando Evie terminou o beijo. Ela tinha os labios rosados e umidos, e as sardas lhe brilhavam como ouro em po sobre as bochechas. — Tambem acredito que vais perder nossa aposta — sussurrou Evie com voz agitada. — Parece-te que estou em condicoes de ir detras de outras mulheres? — queixou-se Sebastian, a quem a frustracao lhe escureceu o rosto. — A menos que me traga uma mulher a Cama, nao estou como para… — Nao me refiro a que a perca por te deitar com outra mulher — assegurou Evie com um brilho picaro nos olhos, e comecou a desabotoa-la bata. As maos lhe tremiam levemente. — A perdera comigo. Sebastian observou incredulo como se levantava para tira-la bata. Ficou nua ante ele, com os mamilos eretos e rosados. Tinha emagrecido, mas seus peitos seguiam redondos e firmes, e os quadris lhe marcavam com generosidade as curvas de sua rodeada cintura. Sebastian olhou o triangulo ruivo daquele desejavel pubis e sua propria virilha deu um pulo. — Nao pode me fazer perder a aposta — grasnou. — Isso e trapacear. — Nao prometi nao fazer trapaca — replicou Evie com desenvoltura, e se estremeceu ao meterse na Cama com ele. — Maldita seja, nao penso colaborar. Eu… — Vaiou ao notar a suavidade do corpo de Evie, o roce de seu pelo pubico no quadril quando ela deslizou uma perna entre as suas. Apartou a cabeca quando ela tentou lhe beijar. — Nao posso… — balbuciou para dissuadi-la. — Estou muito fraco. Fogosa e resolvida, fez lhe voltar a cabeca para ela. — Coitadinho — murmurou sorridente. — Nao se preocupe. Irei com cuidado. — Evie — suplicou Sebastian, excitado e furioso, com voz rouca. — Tenho que demonstrar que posso passar tres meses sem… Nao, nao faca isso. Maldita seja, Evie… Sua esposa tinha desaparecido sob os lencois e ia plantando beijos pelo torax para o abdomen, com cuidado de nao deslocar a vendagem. Sebastian tratou de incorporar-se, mas uma pontada na ferida ainda nao sanada do todo o tombou de novo com um grunhido de dor. Depois grunhiu por uma razao muito distinta: Evie tinha alcancado seu penis, rigido e dolorido, e lhe lambia delicadamente o glande. Era evidente que nao tinha nenhuma experiencia nesses misteres. Nao sabia nada da tecnica, e muito pouco da anatomia masculina. Mas isso nao lhe impediu de aplicar-se com um ardor inocente, lhe dando beijos breves na zona sensivel e prolongando-os quando lhe ouvia gemer. Brincou com escassa habilidade com os testiculo, e logo mediu com os labios e a lingua ate chegar de novo a ponta vibrante do turgente membro. Entao tentou averiguar quanto lhe cabia na boca. Sebastian se aferrou ao edredom com o corpo ligeiramente arqueado, como pacote a um potro de tortura. Uma excitacao desbocada lhe percorria os nervos e lhe nublava a mente. Todas as lembrancas de outras mulheres desapareceram para sempre de sua memoria. So estava Evie, sua cabeleira ruiva que lhe acariciava o estomago e as coxas, seus dedos brincalhoes e sua boca travessa que lhe produziam um prazer indescritivel. Quando ja nao pode conter mais seus gemidos, Evie se situou escarranchado sobre ele, e ascendeu devagar por seu corpo como uma leoa. Buscou lhe a boca com beijos provocadores, enquanto os mamilos lhe acariciavam o peito e ela se esfregava contra ele ronronando de satisfacao ao absorver a calidez do corpo masculino.

Ele soltou um grito afogado quando Evie deslizou uma mao entre ambos. Estava tao excitado que teve que lhe manipular com cuidado o sexo antes de conseguir encaixar lhe entre as coxas. Seu pelo pubico lhe fez cocegas na pele sensivel enquanto o guiava entre as dobras de seu corpo. — Nao — conseguiu dizer Sebastian ao recordar a aposta. — Agora nao. Evie, nao… — OH, deixa de protestar. Eu nao armei tanto animacao em nossa noite de lua-de-mel, e isso que era virgem. — Mas nao quero. OH, Meu deus. Minha mae… Evie lhe tinha situado a ponta do sexo em sua abertura, tao ajustada e suave que o deixou sem folego. Evie se estremeceu enquanto seguia lhe guiando o membro com a mao para introduzir lhe de tudo. Ver as dificuldades que ela tinha para situa-lo bem o excitou ainda mais, lhe provocando um formigamento em todo o corpo. E entao se produziu o deslizamento lento e milagroso da dureza na suavidade. Sebastian recostou a cabeca no travesseiro com as faccoes desencaixadas de desejo enquanto se olhavam aos olhos. Evie emitiu um murmurio de satisfacao e fechou os olhos enquanto se concentrava em aumentar a penetracao. Moveu-se com cuidado, muito inexperiente para estabelecer ou seguir um ritmo. Sebastian tinha sido sempre bastante silencioso em suas relacoes intimas, mas enquanto o corpo exuberante de Evie ascendia e descendia, e seu sexo molhado lhe esfregava e acariciava o penis, ouviu-se si mesmo resmungar suplicas e conseguiu inclina-la mais para ele e faze-la apoiar mais em seu corpo para ajustar o angulo entre ambos. Evie resistiu um pouco porque temia machuca-lo, mas tomou a cabeca entre as maos. — Sim, meu amor… — sussurrou lhe, tremente. — Assim, carinho… Sim, move assim…. A ela lhe exageraram os olhos quando notou a diferenca na postura, a maior friccao na zona mais sensivel de seu sexo. Sebastian estabeleceu um ritmo para aumentar a profundidade e penetra-la com movimentos regulares. O mundo se reduziu ao lugar onde ambos se uniam literalmente. Evie fechou os olhos e suas palpebras ocultaram seu olhar perdido. Sebastian viu como se ruborizava. Adorava-a e, sem deixar de lhe provocar agradar com suas investidas, embargou-o uma ternura imensa. — Me beije — pediu com voz gutural, e aproximou os labios aos seus para lhe saborear devagar a boca com a lingua. Evie solucou e se estremecia de agradar com os quadris pegos as suas cada vez que ele a penetrava por completo. Sebastian se entregou a ela para que chegasse ao extase em grandes quebras de onda voluptuosas. Quando se relaxou sobre ele e tentou recuperar o folego, Sebastian lhe acariciou as costas suada e lhe deslizou os dedos com suavidade para o arredondado monticulo das nadegas. Para seu prazer, Evie se retorceu e se esticou sem poder evita-lo. Se estivesse cheio de forcas… OH, as coisas que lhe ataria. Em lugar disso, desabou-se na Cama exausto com a cabeca lhe dando voltas. Evie se separou dele com estupidez e se aconchegou a seu lado. — Esta tentando me matar — balbuciou Sebastian, e notou que lhe dava um beijo no ombro. — Agora que perdeste a aposta, teremos que pensar em outro pagamento, posto que ja pediu desculpas a lorde Westcliff — sussurrou Evie. Embora lhe havia flanco horrores, Sebastian tinha pedido perdao tanto ao Westcliff como a Lillian antes de que partissem do clube. Tinha descoberto assim que o unico pior que pedir desculpas e que lhe perdoem.

Tinha-o feito sem que Evie estivesse presente, para nao aumentar sua propria vergonha. — Lillian me disse — esclareceu isso ela, como se lhe lesse o pensamento. Levantou a cabeca com um sorriso languido. — Supunha-se que ia manter a boca fechada — resmungou Sebastian, e voltou a lhe baixar a cabeca para seu ombro. — As solteironas nos contamos isso tudo. — Deus me ampare — balbuciou Sebastian uns segundos depois de fechar os olhos e sumir-se num sonho profundo e reparador. A noite seguinte Westcliff foi ao clube e se surpreendeu ao saber que Sebastian tinha baixado a sala principal de jogo pela primeira vez do tiroteio. — Um pouco cedo, nao? — perguntou quando Evie entrou com ele nos aposentos privados do primeiro piso. Observava-os atentamente um empregado ao que Cam tinha apostado na galeria, uma das novas medidas de seguranca. Ate que apanhassem ao Bullard, controlava-se discretamente a todos os clientes. — Esta indo muito depressa — respondeu ela. — Nao suporta a ideia de parecer inutil, e acredita que nada pode fazer-se bem sem sua supervisao. — O interesse do St. Vincent por este lugar parece bastante autentico — comentou Westcliff com um sorriso. — Admito que nunca teria imaginado que assumisse uma responsabilidade assim por vontade propria. Durante anos levou uma vida ociosa, sem objetivos, em que desperdicava sua consideravel inteligencia. Mas ao parecer quao unico precisava era uma saida adequada para seu talento. Aproximaram-se do balcao para aparecer a sala principal, que estava abarrotada. Evie distinguiu o cabelo dourado do Sebastian, meio sentado no escritorio do canto, depravado e sorridente enquanto conversava com um grupo de homens. Sua atuacao dez dias atras, quando tinha salvado a vida a sua esposa, tinha lhe granjeado a admiracao e simpatia publicas, em especial depois de que um artigo do Teme o pontuasse de heroi. Isso, e a percepcao de que tinha renovado sua amizade com o capitalista Westcliff, tinha bastado para que Sebastian gozasse de uma imediata popularidade. Diariamente chegavam ao clube montoes de convites que solicitavam a assistencia de lorde e lady St. Vincent a algum baile, velada ou outro evento social, e que eles declinavam devido ao luto. Tambem recebiam cartas perfumadas e escritas por maos femininas. Evie nao se atreveu a abrir nenhuma, nem tinha perguntado pelas remetentes. As cartas se acumularam no escritorio, fechadas e intactas, ate que essa mesma manha Evie se decidiu a comenta-lo enquanto tomavam o cafe da manha no quarto do Sebastian. — Tem um montao de correspondencia sem abrir que ocupa a metade do escritorio. O que quer que facamos com todas essas cartas? — Um sorriso picasse apareceu nos labios ao acrescentar: — Quer que as leias enquanto descansa? — Desfaz delas — soltou Sebastian com brutalidade. — Ou melhor ainda, as devolva sem abrir. Sua resposta lhe provocou uma profunda satisfacao, embora procurou oculta-lo. — Nao me oporia a que mantivera correspondencia com outras mulheres — comentou. — Muitos homens o fazem sem que isso implique nenhuma falta de decoro. — Eu nao. — Sebastian a olhou aos olhos para assegurar-se de que o entendia. — Agora nao. Agora, de pe junto a Westcliff, Evie observou a seu marido com um prazer possessivo. Sebastian seguia muito magro, embora tinha recuperado o apetite, e seu elegante traje ficava um pouco grande. Mas tinha os ombros largos e uma cor saudavel, e a perda de peso lhe realcava a bela estrutura ossea

de sua cara. Apesar de que se movia com dificuldade, seguia possuindo a graca depredadora que as mulheres admiravam e que os homens tratavam, em vao, de emular. — Obrigado por salva-lo. — Voce o salvou, Evie, a noite que lhe propos te casar com ele — respondeu o conde, e a olhou de esguelha. — O que demonstra que os momentos de loucura podem ter as vezes resultados positivos. Se nao te importar, baixarei para informar ao St. Vincent das novidades sobre o Bullard. — Encontraram-no? — Ainda nao. Mas logo o farao. Levei a pistola do Bullard ao Manson e Filho e lhes pedi informacao sobre o encargo original, visto que nao consegui decifrar o nome gravado no te defenda. Resulta que a pistola tem dez anos, o que suportou uma larga busca em muitas caixas de documentos antigos. Hoje me confirmaram que a tinham feito para lorde Belworth, que volta para Londres esta noite para atender assuntos parlamentarios. Pela manha irei ve-lo para lhe perguntar sobre esta questao. Se averiguarmos como Bullard se fez com a pistola, possivelmente nos ajude a localiza-lo. — Custara muito encontrar a um homem que se esconde em uma cidade que tem mais de um milhao de habitantes — comentou Evie com cenho. — Quase dois milhoes — precisou Westcliff. — Entretanto, nao tenho nenhuma duvida de que o encontraremos. Temos os recursos necessarios e o obteremos. Evie nao pode evitar sorrir ao pensar que o conde falava como Lillian, que nunca aceitava uma derrota. — Estava pensando que e o casal ideal para uma mulher tao tenaz como Lillian — disse ao ver que Westcliff arqueava as sobrancelhas ao detectar seu sorriso. — Parece-me que nao e mais resolvida nem tenaz que voce — replicou ele com um sorriso. E acrescentou: — Simplesmente, ela o exterioriza mais que voce.

Capitulo 21 Quando Westcliff se foi falar com o Sebastian, Evie se retirou a quarto de seu marido para tomar um banho relaxante. Como acrescentou bastante azeite perfumado a agua, depois de um bom momento em encharcamento, teve a pele umedecida e fragrante com aroma de rosas. Ficou uma bata de seda forrada de veludo do Sebastian e se arregacou. Feita um novelo em uma cadeira diante da chamine, escovou-se o cabelo enquanto as criadas retiravam a banheira. Uma delas, uma morena chamada Gertie, ficou para arrumar o quarto. Abriu os lencois e passou um aquecedor de Cama entre elas. — Quer que lhe prepare sua quarto, milady? — perguntou com cautela. Evie se pensou a resposta. Os criados sabiam que Sebastian e ela dormiam em habitacoes distintas, desde antes inclusive de sua enfermidade. Ainda nao tinham compartilhado Cama toda uma noite. Embora nao sabia como tirar o tema com o Sebastian, depois de todo o acontecido ja nao queria andar-se com mais jogozinhos com ele. A vida era muito curta para perder o tempo. Nao havia nenhuma garantia de que Sebastian fora a lhe ser fiel. So tinha a esperanca e a intuicao de que, embora o homem com quem se casou nao se merecia semelhante fe, o homem em que se estava convertendo possivelmente sim. — Acredito que nao — respondeu a criada, e seguiu escovando o cabelo. — Esta noite ficarei nesta quarto, Gertie. — Muito bem, milady. Se quiser lhe…

Gertie nao chegou a terminar a frase ja que ambas foram conscientes de que Sebastian entrava no quarto. Apoiou-se contra a parede e ficou contemplando em silencio a sua esposa. A pesar do calor do fogo, a Evie lhe pos carne de galinha e um calafrio de excitacao lhe percorreu as costas. A postura do Sebastian era relaxada, com o pescoco desabotoado e a gravata desenredada. A luz do lar projetava um brilho dourado a seus rasgos, de modo que recordava a algum deus mitologico. Apesar de que ainda nao tinha recuperado todo seu vigor, irradiava uma perigosa potencia viril que fazia tremer as pernas a Evie. Nao lhe facilitou as coisas que se mantivera completamente calado enquanto a repassava com um olhar lenta e perturbante. Nao pode evitar ruborizar-se ao recordar seus contatos intimos. Gertie recolheu o vestido que Evie se tirou e se apressou a sair da quarto. Sebastian seguiu contemplando a sua mulher ate que esta deixou a escova e se levantou com cautela. Entao se aproximou dela e lhe acariciou os antebracos com suavidade. Evie comecou a lhe pulsar com forca o coracao e sentiu um aperto de antecipacao. Quando a aproximou para ele, fechou os olhos e notou seus labios na sobrancelha, a tempora e a bochecha. O fazia essas caricias tao suaves enquanto a grande excitacao de ambos parecia envolve-los num ambiente abrasador. Estiveram assim comprido momento, sem logo que tocar-se, sentindo simplesmente a proximidade do outro, ate que ele sussurrou: — Evie…, quero fazer o amor contigo. — Acreditava que nunca ia… chamaria assim — gaguejou ela enquanto se derretia por dentro. Sebastian lhe pos as maos na cara para acaricia-la delicadamente com os dedos, enquanto a fresca fragrancia da pele de seu marido a encantava como um incenso embriagador. Sebastian rebuscou sob sua Camisa e extraiu a alianca na fina cadeia. Tiro desta, rompendo seus frageis elos, e encaixou o anel de ouro no dedo anelar de sua esposa. Juntaram as maos pelas Palmas e os pulsos, repetindo aquela cerimonia escocesa. — Quero te satisfazer por completo — disse ele detras agachar a frente ate apoia-la na sua. — Deixar meu rastro em sua alma. Quero te dar mais agradar de que possa imaginar. Quero fazer o amor contigo, Evie, como nunca o tenho feito com nenhuma mulher. — Mas sua ferida… — balbuciou Evie, que tremia tanto que logo que podia manter o equilibrio. — Temos que tomar cuidado. — Deixa que eu me preocupe por isso. E lhe deu um beijo suave e apaixonado. Soltou lhe a mao, aproximou-a mais e exerceu pressao em seus ombros, costas e quadris ate amolda-la completamente a seu corpo. Evie o desejava com uma avidez desmedida. Tentou beija-lo com urgencia, e puxou e sua roupa com um frenesi que fez sorrir a Sebastian. — Devagar — murmurou. — A noite acaba de comecar e vou amar te um bom momento. — Nao poderei seguir de pe mu… muito mais — se queixou Evie com as pernas trementes. Seu marido se tirou a jaqueta e disse com voz rouca: — te jogue na Cama, carinho. Ela se tombou meio recostada para ver como acabava de despir-se. A vendagem branca que lhe cruzava o ventre lhe recordou o perto que tinha estado de perde-lo. Isso a emocionou. Sebastian significava tanto para ela… A perspectiva de passar essa noite com ele a enchia de uma felicidade que parecia angustia. A cobriu delicadamente com seu corpo e lhe acariciou o cabelo dourado do peito. Sebastian lhe

acariciou a cara com os labios, e seu folego fez estremecer a Evie. — Carinho, estes ultimos dias nao tive nada que fazer salvo jazer nesta Cama e pensar nas coisas que procurei evitar toda minha vida. Uma vez te disse que nao estava feito para ter uma esposa e uma familia. Que nao me interessaria absolutamente por um filho, se voce… — Vacilou. — Mas o certo e que quero que tenha meu filho. Nao sabia quanto ate que a morte me rondou. Acreditei… — Sorriu. — Maldita seja. Nao sei ser um bom marido nem um bom pai. Mas como em ambos os sentidos parece te conformar com relativamente pouco, talvez possa te agradar. — Alargou o sorriso ao ver como Evie franzia o cenho com ironia e prosseguiu, serio de novo. — Conheco muitas formas de evitar uma gravidez. Mas quando ditas que esta preparada, se o decidir, quero que me diga… Evie lhe deteve com a boca. Nos minutos apaixonados que seguiram, foi impossivel dizer mais palavras. Sumiram-se num desconcerto de prazer e alcancaram uma confluencia de emocao e desejo que parecia agucar lhe os sentidos dolorosamente. Sebastian lhe abriu a bata para deixar ao descoberto seus peitos e os acariciou com tanta suavidade como as asas de uma mariposa. Os mamilos, eretos, ansiavam seu contato e quando por fim ele rodeou um com a boca, Evie gemeu de alivio. Ao principio so o tocou repetidamente com a ponta da lingua com uma delicadeza que a fez arquear o corpo com uma suplica incoerente. Pouco a pouco, Sebastian foi aumentando as caricias, lhe lambendo e lhe chupando os peitos ate que a excitacao percorreu as visceras de sua mulher como uma onda de fogo. De repente, a bata de veludo lhe oprimia a pele hipersensibilizada, e Evie tratou de tirar lhe desajeitadamente. Sebastian se dispos a ajuda-la lhe baixando as mangas pelos bracos e lhe separando o objeto das costas e os quadris. Evie suspirou de aliviou e arqueou o corpo de uma vez que rodeava os ombros nus de seu marido. As maos suaves do Sebastian lhe percorriam o corpo e lhe provocavam quebras de onda de prazer. Nao podia falar nem pensar, so reagir as caricias do Sebastian enquanto este lhe colocava as extremidades em posturas cada vez mais excitantes e lhe deslizava a boca devagar por todo o corpo. Uns inquisitivos dedos masculinos lhe deslizaram entre as coxas para encontrar o elixir de seu umido pubis. Evie se ruborizou e gemeu quando Sebastian estendeu a umidade em circulos sensuais detras acariciar com brincadeiras a abertura de seu sexo. — Sebastian, por favor. Ja nao posso esperar mais. Eu… — calou-se ao notar que ele a colocava de flanco e se encaixava contra suas nadegas. Rodeou-a com os bracos, o que a fez sentir segura e protegida inclusive quando ele alargou uma mao para lhe separar as coxas. Evie se moveu confusa ao sentir a pressao do rigido membro e precaver-se de que a estava penetrando por atras. Soltou um grito afogado e girou a cara para o braco musculoso que lhe rodeava o pescoco. — Tranquila — sussurrou Sebastian, de uma vez que lhe apartava o cabelo da orelha e o pescoco para lhe beijar esses sensiveis pontos. — Deixa que te ame deste modo, carinho. Seguiu-a acariciando e massageando ate que se relaxou. Provocou-a com a ponta de seu sexo penetrando-a apenas; quando ela acreditava que o faria por completo, retirava-se. Evie comecou a balancar-se contra ele e a pressionar com os quadris para tras. Quando por fim a penetrou por completo, ela gemeu com frenesi. Sua postura nao oferecia muita margem de movimentos, mas Sebastian a investia profundamente enquanto ela recuava para respira-lo com lascivia. — E muito impaciente, carinho — lhe sussurrou. — Nao te esforce, deixa que o prazer te chegue pouco a pouco. Veem, te apoie em mim.

Segurou lhe a coxa e o passou pelos joelhos, de modo que ficaram as pernas muito separadas com os quadris apoiados parcialmente nas suas. Evie choramingou ao notar como a penetrava ainda mais fundo enquanto com os dedos lhe acariciava ritmicamente o sexo. Cegada pela paixao, Evie esticou todos os musculos enquanto esperava que Sebastian fora aumentando seu prazer sem pressas. Levou-a a limite e se retirou, aproximou-a de novo e a fez esperar e esperar, ate que ao final a deixou chegar ao orgasmo em uma serie de convulsoes que sacudiram a Cama. Sebastian seguia ereto quando se retirou. Seus cabelos umedecidos reluziram como ouro pagao enquanto a deixava de barriga para cima e lhe percorria o ventre com os labios. Evie sacudiu a cabeca para negar-se, aturdida, inclusive quando lhe dobrou os joelhos e as levantou. — Estou exausta… — gemeu. — Espera, Sebastian. Lhe buscou a pele umida com lambidas prazenteiras e insistiu ate que ela deixou de protestar. As delicadas caricias do Sebastian tranquilizaram a Evie, e os batimentos do coracao de seu coracao se voltaram compassados. Passados uns compridos e pacientes minutos, ele comecou a chupar e mordiscar o clitoris inchado de Evie, que suspirou e gemeu novamente. Seu marido seguiu aumentando seu prazer movendo a lingua com destreza enquanto lhe sujeitava as coxas com os bracos. Parecia que o corpo de Evie ja nao era dele, que so existia para receber esse tortura enlouquecedor. Quis pronunciar o nome de seu marido, mas nao pode. Entretanto, ele pareceu ouvir sua suplica silenciosa e, como resposta, fez algo com a boca que lhe provocou uma serie de climax incandescentes. Cada vez que acreditava que tudo tinha terminado, percorria-a outra quebra de onda de sensacoes, ate que esteve tao exausta que lhe rogou que parasse. Sebastian se elevou ante ela com os olhos brilhantes e Evie separou as pernas para recebe-lo de uma vez que lhe rodeava as costas com os bracos. Sebastian lhe introduziu o membro ate penetra-la por completo. Quando lhe aproximou os labios a orelha, ela logo que pode ouvir o que lhe sussurrava por cima dos batimentos do coracao de seu coracao. — Evie… — ouviu lhe dizer— , quero que chegue uma vez mais ao orgasmo. — Nao posso… — negou fracamente. — Sim pode. Preciso senti-lo dentro de ti. — Nao posso mais — assegurou ela enquanto negava debilmente. — De verdade que nao… — Sim pode. Eu te ajudarei. — Deslizou lhe uma mao pelo ventre ate o ponto onde seus corpos estavam unidos. — me Deixe te penetrar mais profundamente… mais profundamente… Evie gemeu e solucou enquanto os dedos do Sebastian manipulavam com destreza seu sexo. De repente, notou que a penetrava ainda mais, e seu corpo excitado se abriu para recebe-lo. — Mmm… — murmurou ele. — Sim, assim…. OH, carinho, e tao doce… Movia-se entre os joelhos dobrados de Evie, sobre seus quadris, e a investia com inusitado brio. Lhe rodeava com os bracos e as pernas, com a cara oculta em seu calida garganta, e gritou e gritou enquanto seu corpo palpitava e se esticava para proporcionar a Sebastian uma satisfacao incrivel. Ele se estremeceu entre seus bracos e lhe aferrou mechas de sua formosa cabeleira enquanto se entregava totalmente a ela e a adorava em corpo e alma. Quando Evie despertou sozinha na Cama, o primeiro que viu foi umas pintinhas rosa pulverizadas pelos lencois brancos, como se alguem tivesse derramado vinho rosado nelas. Piscou meio dormida e se apoiou num cotovelo para tocar uma mancha com um dedo. Era uma petala de rosa, arrancado da flor e deixado com cuidado na Cama. Ao jogar uma olhada ao redor, descobriu que tinham espalhado as petalas sobre ela.

Esbocou um sorriso e se recostou de novo na Cama fragrante. A noite de embriagadora sensualidade parecia ter formado parte de um comprido sonho erotico. Logo que podia acredita-las coisas que tinha permitido fazer a Sebastian, intimidades que jamais tinha imaginado possiveis. E no dormitado periodo posterior a seu ato apaixonado, ele a tinha recostado em seu peito e tinham falado durante o que pareciam horas. Evie incluso lhe tinha contado a historia da noite em que ela, Annabelle e as irmas Bowman se feito amigas, sentadas em uma fileira de cadeiras durante um baile. — Fizemos uma lista de possiveis pretendentes e a anotamos em nossas carteiras de baile vazios — lhe explicou. — Lorde Westcliff estava o primeiro da lista, e obvio. E voce estava o ultimo, porque nao foi dos que se casam. Sebastian riu com voz rouca de uma vez que entrelacava intimamente as pernas nuas com as suas. — Estava esperando que voce me pedisse isso. — Nem sequer me olhava — evidenciou Evie. — Nao foi a classe de homem que danca com as solteironas do baile. Sebastian lhe acariciou o cabelo e guardou silencio um momento. — Nao, nao o era — admitiu ao fim. — Fui um imbecil por nao me haver fixado em ti. Se me tivesse incomodado em passar so cinco minutos contigo, nao lhe teria escapado isso. E a teria seduzido como se fora ainda a virginal donzela, a teria enrolado para que lhe deixasse lhe fazer o amor outra vez, tal como tinham feito. Evie efetuou suas ablucoes matinais recordando as horas de ternura apaixonada como se fossem um sonho. Ficou um vestido de la forrado de seda e baixou para reunir-se com o Sebastian, quem certamente estaria no escritorio do clube olhando os recibos da noite anterior. No clube so havia os empregados que limpavam o local para a proxima noite, e os empreiteiros, que estavam instalando um carpete novo e pintando o madeiramento. O entrar no escritorio, viu o Sebastian e Cam em lados opostos da mesa. Ambos examinavam livros contaveis, tachavam algumas entradas com uma pluma e efetuavam notas nos margens. Os dois elevaram os olhos quando ela cruzou a soleira. Evie so sustentou brevemente o olhar do Sebastian, pois lhe resultou dificil conservar a compostura diante dele depois da intimidade da noite anterior. Sebastian se deteve em seco ao ve-la, como se tivesse esquecido o que estava dizendo a ve-la. Ao parecer, nenhum dos dois se sentia ainda comodo com uns sentimentos que eram muito novos e fortes. Depois de lhes dar os bom dia, pediu lhes que nao se levantassem e se situou junto a cadeira do Sebastian. — tomaste o cafe da manha ja? — perguntou lhe. Ele sacudiu a cabeca com os olhos brilhantes ao olha-la. — Ainda nao. — Irei a cozinha a ver o que ha. — Espera um momento — lhe pediu Sebastian. — Ja quase terminamos. Enquanto os dois homens comentavam uns ultimos aspectos do negocio, referidos a um possivel investimento na construcao de uma galeria comercial no St. James’ Street, Sebastian tomou a mao que Evie tinha apoiado na mesa. Distraidamente, aproximou-se o dorso dos dedos a mandibula e a orelha enquanto contemplava a proposta por escrito. Embora ele nao era consciente do que revelava esse despreocupado gesto de familiaridade, Evie se ruborizou quando seu olhar se cruzou com a do Cam por cima da cabeca de seu marido. O jovem lhe dedicou uma expressao de repreensao simulado, como uma baba que pegasse dois meninos jogando a beijar-se, e sorriu ao ver como Evie sou ruborizava ainda mais. Alheio ao intercambio, Sebastian entregou a proposta ao Cam que ficou serio imediatamente.

— Nao acaba de me gostar de — comentou Sebastian. — Nao esta claro que haja negocio suficiente na zona para sustentar uma galeria comercial, especialmente com estes alugueis. Suspeito que num ano se converteu num elefante branco. — Um elefante branco? — perguntou Evie. Da porta lhes chegou outra voz: lorde Westcliff. — Um elefante branco e um animal pouco comum — explicou o conde com um sorriso. — Nao so e caro mas tambem dificil de manter. Historicamente, quando um rei queria arruinar a alguem, lhe dava de presente um elefante branco. — Westcliff entrou, deu um beija-mao a Evie e se dirigiu a Sebastian. — Em minha opiniao, sua valoracao da futura galeria comercial e correta. Nao faz muito me propuseram investir neste projeto e o rechacarei pelos mesmos motivos. — Seguro que resultara que os dois estamos equivocados — repos Sebastian. — Ninguem deveria tentar predizer nada relacionado com as mulheres e suas compras. — levantou-se para estreitar a mao ao conde. — Evie e eu iamos tomar o cafe da manha. Acompanha-nos? — Tomarei um cafe — assentiu Westcliff. — Perdoa que tenha vindo sem avisar, mas tenho noticias. Finalmente pude me reunir com lorde Belworth esta manha — prosseguiu sob o atento olhar do Sebastian, Evie e Cam. — Admitiu ter sido o proprietario original da pistola. Contou-me em confianca que, fara uns tres anos, tinha dado o jogo de pistolas de duelo ao senhor Clive Egan, junto com algumas joias da familia e outras bagatelas, para conseguir um novo prazo para saldar suas dividas com o clube. — Esta escondendo Egan ao Bullard? — Evie tinha piscado de surpresa para ouvir mencionar ao antigo diretor do clube. — E provavel. — Mas por que? Significa isso que Egan pode ter contratado ao Bullard para que atentasse contra minha vida? — Averiguarmo-lo — assegurou Sebastian. — irei ver o Egan hoje mesmo. — Acompanhar-te-ei — disse Westcliff. — Minhas fontes me conseguiram sua direcao. De fato, nao esta longe daqui. — Obrigado por sua ajuda, mas nao quero te causar mais molestias com este assunto — replicou Sebastian. — Duvido que a sua esposa gostasse que te fizesse correr algum risco. Rohan me acompanhara. Evie se dispos a objetar porque sabia que Sebastian estaria mais seguro se o acompanhava Westcliff. Seu marido apenas se estava recuperando de sua ferida. E se lhe ocorria fazer algo insensato ou desacertado, ao Cam nao seria facil dissuadi-lo. Ao fim e ao cabo, Cam era empregado dele, e pelo menos oito anos mais jovem. Westcliff conhecia perfeitamente Sebastian e podia influir nele. Mas antes de que Evie pudesse dizer uma palavra, Westcliff disse: — Seguro que Rohan e um jovem muito capaz. Por isso deveria encarregar-se da seguranca de Evie e ficar com ela. Sebastian entreabriu os olhos para discutir, mas as palavras lhe sairam da boca ja que Evie tomou um braco e se apoio nele com uma pressao ligeira e confiada. — Eu o preferiria assim — indicou. Sebastian a olhou e sua expressao se suavizou. Evie teve a emocionante impressao de que faria tudo o que estivesse a seu alcance para agrada-la. — Se a presenca do Rohan te tranquiliza, assim se fara — disse ele.

A objecao do Sebastian a que Westcliff o acompanhasse obedecia a quao violenta ainda era a relacao entre ambos. Nao era precisamente comodo passar o momento em companhia de um homem cuja mulher tinha raptado tempo atras. A surra que Westcliff lhe tinha dado depois tinha depravado um pouco as coisas, e a posterior desculpa do Sebastian tambem tinha ido bem. E parecia que seu matrimonio com o Evie e o fato de que tivesse arriscado sua vida por ela, tinha predisposto ao conde a ve-lo com certa aprovacao que poderia, com o tempo, recompor a velha amizade. Entretanto, sua relacao tinha adotado uma nova forma que talvez nunca alcancaria a fluidez de antigamente. Para ser um homem que se dedicou a viver sem arrependimentos, Sebastian estava tendo muitas duvidas sobre seu comportamento no passado. Em particular, sua atitude para o Lillian Bowman tinha constituido um engano garrafal. Tinha sido um idiota ao estar disposto a sacrificar uma solida amizade por uma mulher a que em realidade nao desejava. Se se tivesse exposto as alternativas, poderia ter descoberto a Evie, que tinha estado ai, diante de seus narizes. Para alivio do Sebastian, Westcliff conversou afavelmente na carruagem que os conduzia aos suburbios de Londres, onde estavam urbanizando Campos para construir moradias de classe media. A direcao do Clive Egan era a de um homem de uma boa posicao economica. Enquanto refletia com amargura sobre quanto dinheiro teria obtido Egan durante os anos que tinha desfalcado ao clube, Sebastian contou ao Westcliff tudo o que sabia sobre o antigo diretor. O tema voltava uma e outra vez a situacao das financas do clube nesse momento e a necessaria reestruturacao dos investimentos. Para o Sebastian foi um presente do ceu poder confiar-se ao Westcliff, uma das pessoas com melhores aptidoes financeiras do pais e que lhe ofereceu a opiniao de alguem entendido em tais assuntos. E a nenhum dos dois lhe escapou que a discussao supunha uma ruptura drastica com o passado, quando Sebastian tagarelava sobre escandalos e aventuras, o que sempre provocava um sermao condescendente do Westcliff. Esta conversacao discorreu em maior igualdade de condicoes, entre dois homens que de repente tinham mais em comum que antes. A carruagem se parou em uma nova praca residencial. Todas as casas eram de tres pisos e estreitas, ja que nao chegavam aos cinco metros de largura. Uma cozinheira velha de aspecto cansado abriu a porta e se fez a um lado quando entraram em empurroes. A casa parecia ser uma das que estavam acostumados a alugar-se mobiliadas a profissionais solteiros de classe media. Dado que toda a residencia consistia em tres habitacoes e um desculpado, nao foi dificil localizar ao Egan. O antigo diretor do clube estava sentado em uma poltrona frente a chamine de um salao que emprestava a alcool. Os batentes de ambas as janelas estavam talheres de garrafas, e tambem havia junto ao lar. Egan olhou a seus inoportunos visitantes com os olhos frageis do bebado habitual. Tinha o mesmo aspecto que quando Sebastian o tinha despedido dois meses atras, inchado e descuidado, com os dentes cariados, o nariz vermelho e a cara corada cheia de veias. Levou-se um copo a boca, bebeu um bom gole, sorriu e os olhou com olhos umidos. — Haviam-me dito que lhe tinham furado as tripas — disse a Sebastian. — Mas como nao parece um fantasma, suponho que era um falso rumor. — Em realidade, e certo — respondeu Sebastian com frieza. — Mas o diabo nao me quis. A ideia de que Egan pudesse ser responsavel pela tentativa de assassinato de sua esposa o fazia dificil conter-se. So o fato de que tinha a informacao que necessitavam o refreava. Egan riu entre dentes e assinalou as garrafas. — voces sirvam-se mesmos se quiserem. Nao revistam me visitar cavalheiros tao distinguidos. — E muito amavel, mas nao, obrigado — disse Westcliff. — viemos a lhe perguntar por uma

anterior visita dela. O honoravel senhor Joss Bullard. Sabe onde esta? — Como demonios vou, ou seja, o? — respondeu Egan, imperturbavel, depois de tomar outro gole. Westcliff tirou do bolso a pistola feita de encargo e a mostrou. — Onde a conseguiu? — resfolegou o bebado com os olhos exagerados e uma tonalidade purpura na cara. — Bullard a usou a noite do tiroteio — informou Sebastian, esforcando-se por controlar a colera. —E embora duvide que o vulto maltratado que leva sobre os ombros contenha um cerebro operativo, ate voce deveria poder deduzir as consequencias de sua implicacao numa tentativa de assassinato. Gosta de uma larga estadia no carcere do Fleet Ditch? Poderiamos arruma-lo em questao de… — St. Vincent — advertiu Westcliff em voz baixa enquanto Egan resfolegava e se engasgava. — Deveu me roubar isso gritou Egan, e derramou parte da bebida no chao. — O muito patife. Nao sabia que a tinha ele. Nao e minha culpa, o asseguro! Eu so quero que me deixem em paz. Maldito bode! — Quando foi a ultima vez que o viu? — Fara tres semanas. — Uma vez terminada a bebida, Egan recolheu a garrafa do chao e bebeu dela como um menino da mamadeira. — ficava aqui de vez em quando depois de ir do Jenner’s. Nao tinha aonde ir. Nem sequer lhe deixavam dormir num asilo pois ja lhe nota a sifilis. — Sifilis? — Sebastian e Westcliff intercambiaram um olhar rapido — Sim, o mal frances. — Egan olhou a Sebastian com desdem. — Uma enfermidade que suporta a loucura. Antes de deixar o Jenner’s ja mostrava sintomas: fala lenta, tremores faciais, gretas no nariz. Terei que estar cego para nao ve-lo. — Nao estou acostumado a examinar o aspecto de meus empregados com tanta atencao — disse Sebastian, enquanto as ideias lhe amontoavam na cabeca. A sifilis era uma desagradavel enfermidade de transmissao sexual que desembocava no que os medicos chamavam paresis do demente. Provocava loucura, algumas vezes paralisia parcial e uma perda horripilante das partes carnudas do corpo, incluido a malha branda do nariz. Se Bullard a tinha em estado tao avancado, nao havia esperanca para ele. Mas por que, em sua demencia, obcecou-se com o Evie? — E provavel que ja tenha perdido a cabeca — disse Egan com amargura antes de levantar a garrafa para jogar outro gole. Fechou os olhos ao notar o ardor do alcool e apoiou o queixo no peito. — Veio aqui a noite do tiroteio vociferando que o tinha matado a voce. Tremia de pes a cabeca, o homem, e se queixava de dor de cabeca. Tinha um montao de ideias estranhas. Assim paguei a um homem para que o levasse a uma casa para incuraveis, a que esta no Caminho do Knightsbridge. Agora Bullard esta ai, ou morto ou num estado que faria que a morte parecesse uma bencao. — Por que tratou de matar a minha esposa? — perguntou Sebastian. — Sabe Deus que nunca lhe fez mal. — O pobre bode sempre a desprezou — respondeu Egan com ar taciturno. — Inclusive da infancia. Depois de cada visita do Evangeline ao clube, quando Bullard via o que desfrutava do Jenner com ela, passava-se dias antissocial e irritavel. Zombava dela… — deteve-se com um sorriso nostalgico. — Era uma menina muito divertida. Sardenta, timida e redonda como uma toninha. Disseram-me que agora e uma beleza, embora me custa imaginar. — Era Jenner o pai do Bullard? — perguntou Westcliff com um gesto imperturbavel. Pergunta sobressaltou Sebastian.

— Poderia — disse Egan. — Sua mae Mary jurava que o era. — Deixou a garrafa a um lado e entrelacou os dedos sobre sua proeminente barriga. — Era prostituta num bordel. A noite mais afortunada de sua vida foi a que emprestou seus servicos ao Ivo Jenner. Este tomou simpatia e pagou a madama para que fora de seu uso exclusivo. Um dia, Mary lhe disse que estava prenhe e que o filho era dele. E Jenner, que era facil de convencer, concedeu lhe o beneficio da duvida. Manteve-a o resto de sua vida e deixou que o moco trabalhasse no clube quando foi o bastante maior. Mary morreu faz muitos anos. Justo antes de falecer, contou ao Bullard que Jenner era seu pai. Quando o moco se enfrentou ao Jenner, este lhe disse que, tanto se era certo como se nao, seria um segredo. Nao queria reconhecer ao Bullard como filho dele. Por um lado, o menino nao foi nunca o que se diz idoneo, e por outro, ao Jenner jamais importou um cominho ninguem que nao fora sua filha. Queria que Evie ficasse tudo quando ele estirasse a pata. Bullard culpava disso a Evie, e obvio. Acreditava que, de nao ser por ela, Jenner o teria reconhecido e feito mais por ele. E provavel que tivesse razao nisso. — Franziu o cenho com tristeza. — Quando Evie o levou a voce ao clube, Milorde, Bullard ja tinha a sifilis, e foi entao quando comecou a loucura. Um triste final para uma vida triste. Egan se deteve e dirigiu um olhar de lugubre satisfacao a ambos os homens. — Se querem vingar-se de um pobre louco, encontrarao-o no hospital Tottenham — acrescentou. — Obtenham a reparacao que possam, senhores, mas se formos a isso, o Criador ja impos ao Bullard o pior castigo que pode suportar um corpo.

Capitulo 22 As horas que Sebastian esteve fora, Evie se dedicou a efetuar pequenas tarefas no clube: ordenar dinheiro e recibos, responder correspondencia e, por ultimo, ocupar do montao de cartas sem abrir dirigidas a Sebastian. Naturalmente, nao pode resistir a abrir umas quantas. Estavam cheias de insinuacoes e indiretas, e dois davam a entender inclusive que, para entao, Sebastian estaria cansado ja de sua nova esposa. A intencao das remetentes era tao evidente que Evie sentiu vergonha alheia. Tambem serviram para lhe recordar o passado promiscuo do Sebastian, quando sua ocupacao principal consistia em colecionar aventuras amorosas. Nao era facil depositar a confianca num homem assim sem sentir-se como uma tonta. Especialmente tendo em conta que as mulheres sempre admirariam e desejariam Sebastian. Mas Evie acreditava que seu marido merecia a oportunidade de demonstrar sua valia. Se estava em suas maos lhe oferecer comecar de novo, e se sua aposta saia bem, as recompensas para ambos seriam infinitas. Ela era o bastante forte para correr o risco de ama-lo, para lhe exigir coisas, para ter confianca nele. E dava a impressao de que Sebastian desejava ser tratado como um homem corrente, ter a alguem que nao se fixasse so na beleza perecivel de sua aparencia e que lhe interessasse algo mais que suas tecnicas amorosas. Depois de observar, com uma pontada de satisfacao, como as cartas ardiam na chamine, entrou lhe sonho e foi a quarto principal a tornar uma sesta. Apesar de seu cansaco, custou lhe relaxar-se ja que estava preocupada com o Sebastian. Vinham lhe a cabeca toda classe de pensamentos ate que seu esgotado cerebro pos fim a esta inquietacao inutil e conseguiu dormir. Quando despertou uma hora depois, Sebastian estava sentado na Cama junto a ela. Observava-a atentamente, com os olhos da cor do alvorada. Evie se incorporou e lhe sorriu com acanhamento.

— Quando dorme, parece uma menina pequena — comentou Sebastian de uma vez que lhe acariciava o cabelo alvorocado. — Encontraram ao senhor Bullard? — Sim e nao. Primeiro me conte o que fez em minha ausencia. — Ajudei ao Cam com as coisas do escritorio. E queimei todas as cartas dessas mulheres perdidamente apaixonadas por ti. Chama-a era tao grande que me surpreende que ninguem chamasse os bombeiros. — Leste alguma? — perguntou Sebastian com um sorriso. — Umas quantas — admitiu Evie de uma vez que elevava um ombro com indiferenca. — Lhe perguntavam se te tinha cansado ja de sua mulher. — Pois nao. — Deslizou lhe uma mao pela coxa. — Estou cansado de incontaveis noites de fofoca repetitiva e morna paquera. Estou cansado de encontros sem sentido com mulheres aborrecidas. Todas sao iguais para mim, sabe? A unica que me importou alguma vez e voce. — Compreendo que lhe desejem — disse Evie, e lhe rodeou o pescoco com os bracos. — Mas nao estou disposta a te compartilhar. — Nao tera que faze-lo. — Tomou a cara entre as maos e lhe deu um beijo rapido nos labios. — me conte o do Bullard — pediu Evie, e deslizou as maos para acariciar os pulsos de seu marido. Guardou silencio enquanto Sebastian descrevia o encontro com o Clive Egan e suas revelacoes sobre o Joss Bullard e sua mae. Surpreendeu-se e sentiu uma enorme lastima por ele. O pobre Joss nao tinha a culpa de sua origem, nem da indiferenca com que tinha sido criado e que o tinha cheio de tanto ressentimento. — Que estranho — murmurou. — Sempre acreditei e inclusive desejei que Cam fora meu irmao, mas jamais me ocorreu que fosse Joss. Bullard tinha sido sempre tao inacessivel e agressivo… Entretanto, ate que ponto foi isso consequencia do rechaco do Ivo Jenner? Sem duvida nao te sentir querido pelo homem que pode ser seu pai, ser um segredo vergonhoso para ele, amarguraria a qualquer. — Fomos ao hospital Tottenham, onde esta ingressado na sala de incuraveis — prosseguiu Sebastian. — E um lugar imundo, que necessita recursos desesperadamente. Ha mulheres e meninos que… — deteve-se com uma careta ao recorda-lo. — Prefiro nao descreve-lo. Um administrador do hospital nos disse que Bullard foi ingressado com sifilis terminal. — Quero ajuda-lo — disse Evie com decisao. — Ao menos podemos envia-lo a um hospital melhor… — Nao sera possivel, carinho. — Sebastian lhe percorreu a mao com a ponta dos dedos. — Morreu faz dois dias. Mostraram-nos a tumba onde esta enterrado junto com outros dois pacientes. Evie apartou o olhar para assimilar esta informacao. Surpreendeu lhe que os olhos lhe enchessem de lagrimas e lhe fizesse um no na garganta. — Pobre homem — disse com voz rouca. — O compadeco. — Eu nao — repos Sebastian. — Embora tenha crescido sem o carinho de seu pai, isso nao o diferencia de muitissima outra gente que abriu passo no mundo sozinha. Teve-o melhor que Rohan, cuja sangre cigana o converte em vitima de prejuizos. Nao chore, Evie. Bullard nao se merecia nenhuma lagrima. — Sinto-o — se desculpou ela detras suspirar. — Nao estou acostumado a ser tao emotiva, mas e que estas semanas foram muito dificeis. Tenho os sentimentos a flor de pele e nao consigo controla-

los como e devido. Sebastian a aproximou e a estreitou entre seus bracos musculosos. — Carinho, nao te desculpe por ser emotiva. Passaste as do Cain. E so um desalmado como eu poderia apreciar a coragem que se necessita para ser sincero com os sentimentos da gente mesmo. Ela suspirou tremente. — Talvez esteja mal por minha parte, mas apesar de que compadeco ao Bullard, sinto-me aliviada de que tenha morrido. Por sua culpa, quase te perco. Sebastian procurou entre os cachos de sua esposa ate encontrar o delicado contorno da orelha. — Nao tera tanta sorte. — Nao o diga nem em brincadeira — replicou Evie. Jogou a cabeca atras parar olha-lo, ainda entre seus bracos. — Eu… — a voz lhe tremeu— acredito que nao poderia viver sem ti. Sebastian lhe deslizou a mao pela nuca, aproximou-a de novo a seu ombro e apoiou um momento a cabeca no cabelo de sua esposa. — Por certo, Evie — murmurou— , devo ter coracao depois de tudo, porque agora mesmo me doi muitissimo. — So o coracao? — sugeriu com engenho Evie, o que lhe fez rir. — Tambem outras coisas — concedeu enquanto a tendia na Cama com um brilho picaro nos olhos. — E como e minha esposa, e seu dever aliviar todos minhas dores. Evie levantou os bracos e o atraiu para ela. Alheios aos assuntos pessoais dos proprietarios ou os empregados do Jenner’s, os clientes do clube seguiram enchendo o local todas as noites, especialmente quando se soube que ja nao havia possibilidade de fazer-se membro dado que o limite se estabeleceu em dois mil e quinhentos. Quem desejava ser membros, tinham que inscrever-se em uma lista de espera com a esperanca de que se produzira uma vacante. O estranho emparelhamento de um visconde sem dinheiro e um clube de jogo em decadencia tinham produzido uma alquimia surpreendente. Os empregados se contagiavam da dinamica energia do Sebastian ou eram despedidos. O local era dirigido com uma eficiencia implacavel, inedita ate entao no Jenner’s. Nem sequer Ivo Jenner em seus bons tempos tinha dirigido seu pequeno imperio com semelhante emano de ferro. No passado, o ressentimento oculto do Ivo Jenner para a aristocracia lhe tinha levado a tratar a muitos membros do clube com uma submissao servil que os incomodava vagamente. Sebastian, em troca, era um dos seus. Era tranquilo e, mesmo assim, tao galhardo que sua presenca parecia infundir emocao ao ambiente. Quando estava perto, os membros do clube riam mais, gastavam mais, falavam mais, comiam mais. Enquanto que em outros clubes serviam o bife e o bolo de maca habituais, o variado bufei do Jenner’s se repunha sem cessar com pratos espetaculares: salada quente de lagosta, faisao a panela, Camaroes-rosa com pure de aipo, codorna cheia de uva e queijo, servida com molho de nata. E o favorito de Evie: um bolo de amendoa recoberto de framboesas e uma grosa capa de merengue. A comida e o entretenimento melhoraram tao depressa no Jenner’s que as mulheres comecavam a queixar-se de que seus maridos passavam muitas noites no clube. O carater manipulador do Sebastian tinha encontrado uma saida perfeita no Jenner’s. Sabia como criar um ambiente no que os homens pudessem relaxar-se e passar lhe bem, e enquanto o faziam, despojava lhes de seu dinheiro quase inadvertidamente. Jogava-se com uma honestidade escrupulosa,

dado que o jogo era, em teoria, ilegal, embora se praticava abertamente em todo Londres. Dirigir um clube respeitavel era a melhor forma de evitar acoes judiciais. Embora ao principio Sebastian teve que suportar alguns comentarios zombadores de seus conhecidos, sua atitude trocava quando tinham que lhe pedir credito ou que postergasse o pagamento de suas dividas. Para ser um homem que nunca tinha tido muito dinheiro, possuia uma habilidade surpreendente para dirigi-lo. Como Cam havia dito com admiracao, Sebastian tinha a habilidade de um terrier para descobrir um duvidoso saldo bancario ou algo que afetasse a capacidade de pagamento de um membro. Uma noite, enquanto Evie estava junto a mesa do Cam na sala principal vendo como Sebastian presidia uma partida de jogo de dados particularmente forte, foi consciente de que havia um homem maior a seu lado. Era lorde Haldane, um cavalheiro que Sebastian lhe tinha apresentado na semana anterior. — Milorde — murmurou Evie quando lhe deu um beija-mao. — Me alegra voltar a ve-lo. — O prazer e meu, lady St. Vincent — repos lorde Haldane com um sorriso em seu rosto bochechudo. Ambos dirigiram um olhar a mesa de jogo onde Sebastian acabava de dizer uma ocorrencia para diminuir a tensao da partida. Uma gargalhada percorreu o grupo, e Evie se maravilhou da naturalidade com que seu marido desempenhava seu papel, como se tivesse nascido para ele. Embora resultasse estranho, parecia sentir-se mais em casa do que se havia sentido nunca seu pai. Ao Ivo Jenner, dado seu carater nervoso, sempre lhe havia flanco ocultar sua preocupacao quando algum membro do clube tinha uma rajada extraordinaria que ameacava fazendo saltar os bancos. Sebastian, em troca, permanecia sereno e imutavel em qualquer circunstancia. Lorde Haldane deveu ter pensamentos parecidos, porque observou Sebastian e disse distraidamente: — Nao acreditei que voltaria a ver outro assim. — Milorde? — perguntou Evie com uma meio sorriso, porque nesse momento Sebastian detectou sua presenca e se dirigiu para ela. — So vi a outro homem fiscalizar um clube de jogo deste modo — declarou Haldane, como ensimesmado na lembranca de tempos longinquos. — Como se fora sua reserva de caca pessoal, e ele, o depredador mais encantado do mundo. — Refere-se a meu pai? — disse Evie. — Nao, Por Deus — sorriu Haldane de uma vez que sacudia a cabeca. — Nao era seu pai. — Quem…? — comecou Evie, mas sua pergunta ficou sem terminar ja que seu marido chegou junto a eles. — Milady — murmurou Sebastian, e pos uma mao nas costas de sua mulher. E enquanto dirigia um sorriso ao Haldane acrescentou: — Tenho que te advertir, meu amor, que este cavalheiro e um lobo disfarcado de cordeiro. Embora ela acreditou que o comentario incomodaria ao homem maior, Haldane riu encantado, adulado em sua vaidade. — Se tivesse vinte anos menos, jovem, a tiraria. Apesar de seu tao cacarejado encanto, nao pode comparar-se ao meu de entao. — A idade nao o trocou nada — comentou Sebastian com um sorriso. — Desculpe-me, Milorde, se levar a minha esposa a um lugar mais seguro. — E evidente que este homem tao escorregadio ficou apanhado em seus irresistiveis jogue a rede, lady — disse Haldane a Evie. — Va, pois, e aplaque seu ciumes.

— Tentarei-o — repos Evie com acanhamento, sem saber como responder a semelhante afirmacao. Por alguma razao, ambos os homens riram, e Sebastian se levou a Evie da sala principal sem lhe retirar a mao das costas. — Vai tudo bem, carinho? — perguntou lhe enquanto andavam. — Sim. Eu… — Sorriu e acrescentou de forma pouco convincente: — So queria verte. Pararamse junto a uma coluna e ele se inclinou para lhe roubar um beijo. — Jogamos uma partida de bilhar? — sussurrou com os olhos brilhantes, e sorriu ao ver como ela se ruborizava. A popularidade do clube aumentou ainda mais quando os periodicos comecaram a recomenda-lo com comentarios maravilhosos: Finalmente, o Jenner’s ocupa um lugar entre os clubes mais frequentados pelos cavalheiros da elite londrino, distinguindo-se como um local do que todos os membros da aristocracia aspiram a formar parte. A cozinha satisfaz os paladares mais exigentes, e a selecao de vinhos resulta atrativa para os gostos mais refinados… E em outro editorial: Nunca podera elogia-lo suficiente a qualidade do local recentemente reformado, que proporciona um cenario esplendido a uma clientela caracterizada por sua superioridade pessoal e intelectual. Nao e estranho que a quantidade de solicitudes para converter-se em membro do clube supere com muito o numero de vacantes… E um mais: Muitos sugeriram que o renascimento do Jenner’s so podia ser obra de um cavalheiro dotado de um extraordinario encanto, versado em moda, politica e literatura, e familiarizado com a aristocracia. Trata-se, e obvio, do conhecido lorde St. Vincent, atual proprietario de um clube que augura converter-se em toda uma instituicao da vida social do West End londrino. Sentada uma noite no escritorio, Evie lia os editoriais com assombro. Nao tinha esperado a atencao publica que se estava emprestando a Sebastian e o clube. Embora estava contente de que seu marido triunfasse, nao podia evitar perguntar-se o que ocorreria quando ela se tirasse o luto e comecassem a frequentar a alta sociedade de Londres. Nao lhe cabia duvida de que os convidariam a muitos lugares. E o caso era que, como era uma das solteironas, nao tinha tido muitas oportunidades para aprender a tratar com a gente. Teria que superar sua estupidez e acanhamento e aprender a ser engenhosa, encantadora e segura de si mesmo. — Por que franze o cenho, querida? — Sebastian se sentou a mesa e a olhou com um sorriso. — Tem lido algo desagradavel? — Ao contrario — disse Evie com tristeza. — Todo mundo esta entusiasmado com o clube. — Compreendo — assegurou enquanto lhe acariciava a mandibula com o indicador. — E isso se preocupa porque… A explicacao lhe saiu impulsivamente: — Porque te esta fazendo fa… famoso, por algo distinto a ir detras de todos os rabos de saias, refiro-me. E portanto estara muito solicitado, e algum dia eu… eu me tirarei o luto, o que significa que iremos a bailes e veladas, e nao acredito que possa evitar me esconder pelos cantos porque to… ainda sou a tipica solteirona insegura. Tenho que aprender a ser ocorrente e serena, e a falar com o g… gente. Se nao te zangara ou, pior ainda, envergonhara-te de mim, e eu… — Evie, Por Deus… — Aproximou uma cadeira e se sentou nela com os joelhos por fora das de sua mulher. Tomou ambas as maos e lhe sorriu. — Nao pode estar vinte minutos sem preocupar-se por algo, verdade? So tera que ser como e.

Agachou-se para lhe beijar as maos e, quando levantou a cabeca, tinha deixado de sorrir e tinha um olhar sensual. Po lhe um polegar sobre a alianca e esfregou brandamente as palavras gravadas. — Como ia envergonhar me de ti? — prosseguiu. — Sou eu quem foi um completo mulherengo. Voce nao tem feito nada censuravel em toda sua vida. E quanto a afetacao de salao, espero que jamais te volte como essas tontas superficiais que conversam sem cessar sem chegar a dizer nada interessante. — Aproximou-a mais para ele e lhe acariciou o pescoco com os labios justo onde terminava o vestido. Logo suspirou sobre o ponto que tinha umedecido, o que fez estremecer a Evie. — Nao e a tipica solteira insegura. Mas tem minha permissao para te esconder pelos cantos, carinho, sempre e quando me levar contigo. De fato, insistirei nisso. Advirto-te que me Porto muito mal nessas situacoes. E provavel que te perverta em pracinhas e balcoes, sob escadas e detras de vasos de barro com novelo variadas. E se te queixa, recordarei-te que nao deveria te haver casado com um libertino incorrigivel. — Nao me queixarei — assegurou Evie, arqueando um pouco o pescoco enquanto Sebastian o acariciava com os dedos. — Vejo que conhece seus deveres — sussurrou com um sorriso, e lhe mordiscou o lado do pescoco. — vou ser uma influencia terrivel para ti. Me de um beijo e sobe a tomar um banho. Quando tiver terminado, estarei ai contigo. A banheira estava ao meio encher quando Evie entrou no quarto. Gertie e outra criada recolhiam unas vasilhas para efetuar uma viagem mais a planta baixa. Acalorada e distraida depois dos beijos do Sebastian, Evie comecou a desabotoa-las mangas do vestido. — Ajudarei a despir-se quando voltar com a agua que falta, milady — se ofereceu Gertie. — Obrigado — sorriu Evie. Aproximou-se do penteadeira e agarrou um frasco de perfume, um presente que lhe tinha enviado Lillian fazia pouco. A sua amiga adorava entreter-se com perfumes e fragrancias, e recentemente tinha comecado a experimentar suas proprias combinacoes. Este aroma era exuberante e equilibrado, com rosas e especiarias acres mescladas com ambar. Evie verteu com cuidado umas gotas na agua da banheira e inalou com prazer o vapor fragrante que se elevou. Sentou-se em uma cadeira, agachou-se para tira-los sapatos e as medias, para o que procurou por debaixo do vestido a fim de desabotoa-las ligas. De repente um calafrio lhe percorreu a coluna e uns passos suaves no carpete lhe arrepiaram a nuca. Viu como uma sombra avancava depressa pelo chao. Voltou-se e soltou um grito afogado ao ver uma figura andrajosa. Levantou-se de um salto, derrubando a cadeira. O intruso falou com voz aspera: — Nenhuma palavra. Ou a racho do pescoco a virilha. Empunhava uma faca comprido. Estava tao perto dela que poderia alcanca-la com um so movimento. Nenhum pesadelo ou temor infantil poderia comparar-se com aquele horripilante homem. Evie se moveu devagar para tentar colocar-se ao outro lado da banheira. O louco ia vestido com pouco mais que farrapos e mostrava seu perfil esquerdo de um modo estranho, como se fora uma marionete desfocada. Em cada centimetro de pele visivel (maos, pescoco, cara) tinha chagas purulentas. Mas o mais horroroso eram os repulsivos restos do que tempo atras tinha sido um nariz. Aquele homem parecia uma quimera, uma confusao de carne, extremidades e rasgos que nao pertenciam a um mesmo corpo. Entao Evie o reconheceu apesar da sujeira, as chagas e a destrocada cara. Custou lhe muito

conservar a calma no meio do panico que a atendia. — Senhor Bullard… — disse com assombro. — No hospital dava… disseram que tinha morrido… — Partime desse maldito buraco — resmungou com a cabeca inclinada de um modo estranho. — Rompi uma janela e me escapei de noite. Ja estava farto de que esses imbecis me fizessem tragar suas malditas beberagens. — Avancou para ela com passos descompassados. Evie rodeou a banheira devagar enquanto o coracao lhe desbocava. — Mas nao ia a fazer mal nesse esgoto de merda sem manda-la antes ao inferno. — por que? — perguntou Evie procurando nao dirigir a vista para a porta, onde tinha visto movimento com a extremidade do olho. Pensou que devia ser Gertie. A forma imprecisa desapareceu sem fazer ruido, e Evie rogou que a criada tivesse deslocado por ajuda. Enquanto isso, quao unico podia fazer era manter-se afastada do Joss Bullard. — Voce me tirou isso tudo — grunhiu ele. — O deu tudo, o muito bode. O so queria a uma gaga feia, mas eu era seu filho. Seu filho! Entretanto, escondeu-me como se fora um urinol sujo. — Lhe crispou a cara. — Fiz tudo o que me pediu. Teria matado para agrada-lo, mas dava igual. So a queria a voce, cadela asquerosa! — Sinto-o — disse Evie, e sua pena sincera pareceu desconcerta-lo. deteve-se e a olhou com um gesto estranho. — Senhor Bullard… Joss… Meu pai sim lhe queria. Sua ultima vontade foi que o ajudassemos e o cuidassemos. — E muito tarde para isso! — exclamou ele, e se levou as maos a cabeca como se lhe doesse insuportavelmente. — Maldita seja… Que se apodreca no inferno… Evie viu uma possibilidade de fugir e saiu disparada para a porta. Mas Bullard a apanhou e a lancou de brucos contra a parede. O golpe na cabeca lhe reduziu a visao a uma lhe titilem nuvem negra. Piscou e gemeu enquanto tentava enfocar os olhos. Sentiu uma opressao no peito e o pescoco. Pouco a pouco compreendeu que tinha o braco do Bullard ao redor do pescoco, com a faca a uns centimetros da garganta. Notava a pressao da folha afiada cada vez que inspirava. Bullard respirava com dificuldade e seu folego emprestava a decomposicao. Evie percebeu os tremores de seu corpo e seus esforcos por controlar - se. — iremos ver o juntos — lhe disse perto da orelha. — A quem? — resmungou Evie, aturdida. — A nosso querido pai. Iremos ver o inferno… voce e eu. — Soltou uma gargalhada. — Estara jogando poquer com o muito mesmo diabo. — Apertou lhe a faca no pescoco e pareceu desfrutar de ve-la estremecer. — A matarei… E depois me suicidarei. O que lhe parecera com o Jenner nos ver chegar do braco ao inferno? Enquanto Evie procurava com desespero uma resposta que o acalmasse um pouco, ouviu-se uma voz tranquila da porta: — Bullard. Era Sebastian, com um aspecto frio e sereno. Embora o perigo nao diminuiu, Evie sentiu um enorme alivio ao ve-lo. Seu marido entrou no quarto devagar. — Ao parecer, os registros do Tottenham deixam muito que desejar — comentou sem olhar a Evie. Tinha a vista posta no Bullard, ao que observava com olhos brilhantes e hipnotizadores. — Acreditei que lhe tinha metido uma bala no corpo — soltou Bullard com brutalidade. — Nao foi mais que um leve arranhao — replicou Sebastian e se encolheu de ombros. — me

Diga, como conseguiu entrar no clube? Temos homens em todas as portas. — Pela carvoeira. Ha um deposito que da ao Rogue’s Lane. Ninguem o conhece. Nem sequer esse cigano. — Ao ver que Sebastian se aproximava, acrescentou: — Retroceda ou a atravesso como a uma pomba num assador. O olhar do Sebastian se centrou na faca, que Bullard tinha colocado como se fora a cravar lhe no peito. — Tudo bem— concedeu Sebastian, e retrocedeu. — Tranquilo. Farei tudo o que me peca. — Sua voz soou suave e cordial, e sua expressao, acalmada, embora umas gotas reluzentes de suor lhe escorregavam pela cara. — Joss…, me escute. Nao tem nada que temer. Esta entre amigos. Quao unico pretendemos sua irma e eu e te ajudar como pediu seu pai. Me diga o que quer. Posso conseguir morfina para aliviar a dor. Pode ficar aqui todo o tempo que queira, dispora de uma Cama limpa e de gente que te cuide. Tudo o que queira. — Tenta me enganar, maldito engomadinho — espetou Bullard. — Nao. Darei-te o que queira… salvo que machuque a Evie, porque entao nao poderei fazer nada por ti. — Enquanto falava, Sebastian se dirigiu devagar para a janela, o que obrigou ao Bullard a voltar-se. — Solta-a e falemos de homem a homem… — Nem um passo mais! — advertiu lhe Bullard, e sacudiu a cabeca com impaciencia. Um tremor lhe sacudiu o corpo e soltou um grunhido. — Este maldito ruido nos ouvidos… — Posso te ajudar — insistiu Sebastian. — Necessita remedios. E descanso. Baixa a faca, Joss. Nao e necessario que machuque a ninguem. Baixa o braco e poderei te ajudar. Evie notou com incredulidade como o braco do Bullard comecava a relaxar-se ao influxo daquela voz tranquilizadora, ao mesmo tempo que ia voltando-se para o Sebastian. De repente, uma detonacao ensurdecedora rasgou o ar. Evie ficou livre com uma forca que a fez Cambalear-se para tras. Em seu atordoamento, so alcancou a ver como Cam, na porta, baixava uma pistola fumegante. Sebastian tinha entrado no quarto para situar deliberadamente ao Bullard de modo que Cam pudesse lhe disparar. Antes de que Evie pudesse dirigir a vista para o farrapo do chao, Sebastian a voltou e a estreitou contra seu peito. Liberou entao toda a tensao contida e se estremeceu enquanto a abracava e lhe apalpava as costas, os bracos e as mechas de cabelo saidos das forquilhas. Ela, sem folego, nao conseguiu articular palavra. So podia estar de pe, entre seus bracos, enquanto ele amaldicoava e gemia. — Gertie foi A… para te buscar — conseguiu balbuciar Evie por fim. Sebastian assentiu e a estreitou mais com maos trementes. — Disseme que havia um homem em sua quarto — explicou. Inclinou lhe a cabeca para tras e viu o pequeno corte que a faca lhe tinha feito no pescoco. Ao precaver-se do perto que Bullard tinha estado de seccionarei a garganta, empalideceu. Inclinou-se para lhe beijar a ferida. — meu Deus, Evie… — sussurrou. Ela se voltou entre seus bracos para olhar ao Cam, que acabava de tampar a cabeca e os ombros do Bullard com sua jaqueta. — Cam, nao tinha que lhe disparar — disse contendo um soluco. — ia soltar me. Estava baixando o braco… — Nao podia estar seguro — observou o jovem com voz inexpressiva. — Tinha que disparar apenas o tivesse a tiro.

Seu rosto nao refletia nenhum sentimento, mas seus olhos estavam arrasados em lagrimas. Evie compreendeu que se viu obrigado a matar a um homem ao que tinha conhecido desde menino. — Cam… — comecou compassivamente, mas ele sacudiu a cabeca lhe dando a entender que nao era necessario que seguisse. — foi o melhor para ele — soltou sem sequer olha-la. — Nenhum ser vivo deveria sofrer deste modo. — Sim, mas voce… — Estou bem — afirmou Cam com a mandibula tensa. Nao era verdade. Estava palido e agitado. Evie nao pode evitar aproximar-se dele e rodea-lo com os bracos para lhe oferecer consolo. O moco a deixou fazer, embora nao lhe devolveu o abraco, e pouco a pouco seus tremores remeteram. Evie pressionou brevemente os labios contra o cabelo do romani. Ao parecer, isso foi tudo o que Sebastian estava disposto a permitir. Avancou para eles, recuperou a Evie e ordenou com brutalidade ao Cam: — Va procurar ao da funeraria. — Sim— respondeu o jovem mecanicamente. Vacilou um momento. — Na sala de jogo terao ouvido o disparo. Teremos que lhes dar alguma explicacao… — Dava que alguem estava limpando uma arma que se disparou acidentalmente — disse Sebastian. — lhes diga que ninguem resultou ferido. Quando chegar o da funeraria, faz-o subir pela parte de atras. Lhe pague para que guarde silencio. — Sim, Milorde. E se o policial faz perguntas? — manda-me isso ao escritorio. Eu me encarregarei dele. Cam assentiu e partiu. Sebastian tirou o Evie ao corredor, fechou a porta com chave e a levou a outra quarto. Ela o acompanhou aturdida, tentando assimilar o que acabava de ocorrer. Sebastian estava calado e mantinha uma expressao dura enquanto tentava recuperar a calma. — Enviarei a uma criada para que te atenda. Te beba uma taca de vinho. — Vira depois? — quis saber, ansiosa. — Primeiro tenho que me encarregar de algumas coisas. Nao voltou em toda a noite. Evie o esperou em vao e, finalmente, deitou-se sozinha. Despertou com frequencia, e cada vez apalpou as escuras o lado vazio da Cama procurando em vao o corpo quente de seu marido. Pela manha estava preocupada e exausta, e olhou com olhos empanados a criada que tinha ido acender a chamine. — Viu hoje a lorde St. Vincent? — perguntou com voz rouca. — Sim, milady. O senhor e o senhor Rohan estiveram levantados quase toda a noite, falando. — Lhe diga que eu gostaria de ve-lo, por favor. — Muito bem, milady. — A criada deixou a vasilha com agua quente no lavabo e saiu da quarto. Evie se levantou, efetuou suas ablucoes matinais e tentou alisar-se seu indomito cabelo. Tinha a escova, os pentes e as forquilhas na outra quarto, onde… Ao recordar o acontecido a noite anterior, estremeceu-se de pena. Alegrava-se de que seu pai nao tivesse vivido para ver o triste final do Joss Bullard. perguntou-se quais teriam sido seus verdadeiros sentimentos por aquele desventurado, se realmente tinha acreditado que era filho dele. — Papai — murmurou enquanto se observava os olhos azuis no espelho. Os mesmos do Ivo Jenner. Levou-se tantos secretos a tumba com ele, e tinha deixado tantas coisas sem explicar. Sempre lamentaria nao ter podido conhece-lo melhor. Mas se consolou pensando que

ao Ivo teria agradado saber que o Jenner’s alcancaria por fim o lugar que ele considerava que se merecia. Sebastian entrou no quarto, ainda com a mesma roupa da noite anterior. Tinha o cabelo alvorocado e os olhos escurecidos. Parecia cansado mas resolvido, com o ar de um homem que teve que tomar decisoes desagradaveis. — Como esta? — perguntou lhe ele. Evie teria deslocado a seu encontro, mas algo em sua expressao a refreou. Ficou junto ao lavabo, olhando-o. — um pouco cansada. Mas parece que nao tanto como voce. A criada me disse que tinha estado acordado quase toda a noite. Do que falaram com o Cam? — De varios assuntos. — massageou-se a nuca. — Lhe custa assimilar o acontecido. Mas o superara. Evie o observou indecisa. Nao entendia por que se esforcava por mostrar-se distante. Nao obstante, tranquilizou-a comprovar que ve-la com a Camisola posta acendia a chama do desejo em seus olhos. — Veem, que quero lhe abracar — lhe pediu em voz baixa. Entretanto, Sebastian se afastou em direcao a janela. Observou o transito matinal de pedestres, vendedores ambulantes e varredores. Evie contemplou suas costas larga e magra e sua postura tensa ate que ele, finalmente, voltou-se para olha-la com gesto cuidadosamente inexpressivo. — Ja estou farto — soltou Sebastian. — tomei uma decisao irrevogavel. Partira do clube hoje mesmo. Vou enviar te ao Campo, a viver um tempo no imovel de minha familia. Meu pai quer te conhecer. Sera uma companhia agradavel para ti, e ha umas quantas familias locais que lhe proporcionarao certa distracao… — E voce? vais ficar te aqui? — perguntou Evie com cenho. — Sim. Te visitarei de vez em quando. Evie ficou surpresa, incapaz de acreditar que lhe estava propondo uma separacao. — Por qu… o que? — perguntou fracamente. — Nao pode estar num antro como este — disse Sebastian com expressao seria. — Aqui nao esta segura; disse-o desde o comeco, e se demonstrou com acrescimo que tinha razao. — No ca… Campo tambem lhe acontecem coisas as pessoas. — Nao vou discutir — disse Sebastian com brutalidade. — Ira onde eu diga e ponto. A antiga Evie se teria acovardado, doida, e pode que tivesse obedecido a contra gosto. Mas a nova Evie era muito mais forte e, alem disso, estava localmente apaixonada. — Nao poderei viver longe de ti — disse. — Mais quando nao entendo por que deveria faze-lo. Isto minou a firmeza do Sebastian, que se tocou o cabelo despenteando-se ainda mais os reluzentes cachos. — Ultimamente estive tao ocupado que nao pude tomar nenhuma decisao. Nao posso pensar com claridade. Me faz um no no estomago e me doi o peito. Preocupo-me com ti. As vezes… — deteve-se e a olhou com incredulidade. — Maldita seja, Evie, por que sorri? — Por nada — respondeu, e apagou rapidamente o sorriso de seus labios. — E so que… e como se tentasse me dizer que me ama. — Nao — assegurou Sebastian ao ponto. A ideia pareceu horroriza-lo. — Nao e assim. Nao posso. Nao estou falando disso. So necessito… — deteve-se e inspirou fundo ao ver que ela se

aproximava dele. — Nao, Evie — disse quando sua esposa tentou lhe tocar a cara com os dedos. — Nao e o que pensa. Evie captou o medo em sua voz. O medo que um menino deveu sentir quando todas as mulheres as que queria desapareceram de sua vida. Nao sabia como tranquiliza-lo ou aliviar essa dor visceral. Ficou nas pontas dos pes e procurou seus labios. O lhe pos as maos nos cotovelos para aparta-la, mas nao pode faze-lo. Em lugar disso voltou a cara com a respiracao acelerada. Sem alterar-se, lhe beijou a bochecha, a mandibula, o pescoco… — Maldita seja — resmungou Sebastian em voz baixa. — Tenho que te enviar longe. — Nao tenta me proteger a mim, a nao ser a ti mesmo. — Abracou-o. — Mas deve assumir o risco de amar a alguem. So isso te curara. — Nao posso, eu… — Sim pode. Tem que faze-lo — replicou Evie, e fechou os olhos apertando a bochecha contra a de seu marido. — Porque te amo, Sebastian. E necessito que me corresponda. E nao pela metade. O lhe pos as maos nos ombros mas ao ponto as apartou. — Tera que deixar que estabeleca meus proprios limites O… — disse. Evie aproximou os labios e o beijou devagar, pausadamente, ate que ele sucumbiu com um gemido e a rodeou com os bracos para responder a seu beijo com ardor. — Pela metade — disse Sebastian detras separar-se dela ofegando. — meu Deus, amo-te tanto que me estou afogando. Nao posso evita-lo. Ja nao sei quem sou. Quao unico sei e que se me entregar por completo… — Tentou controlar sua respiracao para concluir: — Significa muito para mim. Evie lhe passou a mao pelo peito para tranquiliza-lo. Compreendia seu desespero, aquelas emocoes tao fortes que o afligiam. Recordou algo que Annabelle lhe tinha credulo: ao principio de seu matrimonio, a intensidade do que sentia por ela turvava ao senhor Hunt, que tinha demorado certo tempo em adaptar-se. — Sebastian, nao sera sempre assim, sabe? — disse entao. — Passado um tempo te resultara mais natural, mais comodo. — Nao acredito. Soou tao seguro que Evie teve que ocultar um sorriso em seu ombro. — Amo-te — repetiu, e notou que seu marido se estremecia de desejo. — Pode MA… me mandar longe, mas nao pode impedir que volte para seu encontro. Quero passar todos os dias de minha vida contigo. Quero ver como te barbeia pela manha. Quero beber champanha e dancar contigo. Quero te cerzir os meias tres-quartos. Quero dormir contigo todas as noites e ter teus filhos. — Fez uma pausa. — acredite que eu nao tenho medo tambem? Talvez uma manha desperte e diga que te cansaste que mim. Talvez todas as coisas que agora aguenta tao bem acabem te resultando inag.. Inaguantaveis: minha gagueira, minhas sardas… — Nao seja tonta — a interrompeu com brutalidade. — Sua gagueira nao me incomodaria nunca. E eu adoro suas sardas. Me… — Lhe quebrou a voz. Estreitou-a entre seus bracos. — Merda — resmungou. E depois de uma pausa acrescentou com amargura: — Eu gostaria de ser outra pessoa. — Por que? — Que por que? Meu passado e um esgoto, Evie. — Grande novidade. — Nunca poderei expiar todas minhas maldades. Meu deus, quem dera pudesse voltar a comecar! Trataria de ser melhor homem para ti. Trataria de…

— So tem que ser como e. — Evie levantou a cabeca para olha-lo atraves das lagrimas. — Nao e isso o que voce mesmo me disse? Se voce pode me amar sem condicoes, Sebastian, por que nao posso te amar eu do mesmo modo? Sei quem e. Acredito que nos conhecemos o um ao outro melhor do que nos conhecemos nos mesmos. Nao te atreva a me enviar longe de ti, nao seja co… covarde. A quem mais foram encantar lhe minhas sardas? A quem mais lhe preocuparia se tiver os pes frios? A quem mais lhe ocorreria me seduzir em uma sala de bilhar? A resistencia do Sebastian comecava a rachar-se. Evie notou como seu corpo se relaxava, como se inclinava para ela como se quisesse que seus corpos se fundissem em um. Sebastian murmurou seu nome de uma vez que lhe agarrava uma mao para lhe acariciar a palma com os labios. — Meu amor e teu — sussurrou detras lhe rocar com os labios a alianca de ouro, e Evie soube que tinha ganho. Aquele homem apaixonado, extraordinario e imperfeito era dele; tinha lhe entregue o coracao para que o guardasse a boa cobranca. Era uma confianca que ela nao trairia jamais. Com alivio e ternura, aferrou-se a ele enquanto uma lagrima escorregava pela bochecha. Sebastian a secou com um dedo e a olhou aos olhos. E o que ela viu no brilho de seu olhar a deixou sem folego. — Bom — comentou Sebastian, vacilante. — Pode ser que tenha razao nisso da sala de bilhar. E, quando a carregou em bracos para leva-la ate a Cama, Evie sorriu.

Epilogo Era quase o final do inverno. Como o luto de Evie tinha coincidido com a reclusao para o parto de Annabelle, as duas tinham passado muito tempo juntas. Nenhuma das duas podia assistir a eventos sociais como danca ou grandes jantares, mas isso lhes tinha parecido bem ja que fazia muitissimo frio dos Natais e a primavera nao acabava de chegar. Assim, em lugar de ir e vir pela cidade, sentavam-se junto a chamine da luxuosa suite de hotel do Hunt, ou se reuniam com o Lillian e Daisy num dos acolhedores saloes do Marsden Terrace, a casa do Westcliff. Liam, conversavam e faziam artesanatos enquanto tomavam inumeraveis tacas de cha. Uma tarde, Lillian estava sentada a um secreter redigindo uma carta para uma de suas cunhadas, enquanto Daisy lia uma novela recostada num sofa com uma manta de cachemira no regaco. Annabelle tinha ocupado uma poltrona junto ao fogo e descansava uma mao na curva crescente de sua barriga. Evie estava sentada diante dela num tamborete e lhe massageava os pes doloridos. — OH, que agradavel! — murmurou Annabelle detras suspirar. — Ninguem me advertiu que os pes doiam tanto durante a gravidez. Embora deveria haver-me imaginado, com todo o peso acrescentado que tenho que carregar. Obrigado, Evie, e a melhor amiga do mundo. O sarcasmo de Lillian lhes chegou do hall: — me disse o mesmo a ultima vez que lhe massageei os pes. Sua devocao so dura durante a massagem. Admite-o, Annabelle, e uma exploradora. — Espera a que conceba, querida — sorriu Annabelle preguicosamente. — Suplicara massagens nos pes a qualquer que lhe possa dar isso — A menos que seja menininha — argumentou Daisy. Lillian foi replicar, mas o pensou melhor e se limitou a tomar um sorvo de sua taca de vinho. — OH, diga lhe vamos — soltou Daisy sem apartar os olhos da novela. — nos dizer o que? — perguntaram ao unissono Annabelle e Evie, que haviam se tornado para o Lillian. Lillian, incomoda, encolheu-se de ombros e disse: — Em meados do verao darei finalmente um herdeiro ao Westcliff. — A menos que seja menina — precisou Daisy. — Felicidades! — exclamou Evie, e foi abracar ao Lillian. — E uma noticia maravilhosa! — Westcliff esta louco de contente, embora trate de dissimula-lo — comentou Lillian enquanto lhe devolvia o abraco. — Certamente o esta contando ao St. Vincent e ao Hunt neste momento. Parece acreditar que o consigo e totalmente seu — acrescentou com ironia. — Bom, sua contribuicao foi essencial, nao? — assinalou Annabelle, divertida. — Ja — respondeu Lillian. — Mas o trabalho duro me toca. — Fara-o muito bem, querida — lhe sorriu Annabelle. — me Perdoe se nao dar saltos, mas te asseguro que estou muito contente. Espero que tenha o contrario do que eu tenha; assim poderemos consertar um bom matrimonio. — E com tom lamentoso e melodioso pediu: — Evie, volta. Nao pode me deixar com apenas um pe massageado. Evie sacudiu a cabeca e retornou sorridente ao tamborete situado junto ao lar. Fixou os olhos no Daisy e observou o olhar carinhoso e pensativo que dirigia a sua irma maior. Precaveu-se entao da nostalgia da moca. — Em meio de tanta conversa sobre maridos e filhos, nao devemos nos esquecer de encontrar um cavalheiro para o Daisy — disse ao voltar a ocupar-se dos pes de Annabelle.

— E um ceu, Evie. — A jovem lhe dirigiu um sorriso afetuoso. — Nao me importa ter que esperar meu turno. Depois de tudo, alguem tinha que ser a ultima solteirona. Mas comeco a duvidar que encontre um homem adequado para me casar. — claro que sim— assegurou Annabelle. — Nao prevejo nenhuma dificuldade, Daisy. Ampliamos bastante nosso circulo de amizades, e faremos o que seja necessario para te encontrar o marido perfeito. — Tenha em conta que nao quero me casar com um homem como lorde Westcliff— indicou Daisy. — E muito autoritario. E tampouco como lorde St. Vincent, muito imprevisivel. — E que tal como o senhor Hunt? — quis saber Annabelle. — Muito alto — objetou Daisy. — Esta-te voltando bastante suscetivel, nao acredite? — assinalou Annabelle com olhos divertidos. — Absolutamente! Minhas expectativas sao razoaveis. Quero um homem bom ao que goste dos passeios largos, os livros e que adore os caes, os meninos e…. — E todas as formas de vida vegetal e aquatica — ironizou Lillian. — me Diga, ceu, onde pescara a semelhante modelo de virtudes? — Pois, de momento, em nenhum dos bailes aos que assisti ate agora — respondeu Daisy, cabisbaixa. — Embora pareca impossivel, este ano a oferta e pior ainda que o anterior. Comeco a acreditar que os homens que valem a pena nao se encontram neste tipo de eventos. — Ummm. Tem razao — disse Lillian. — Ha muita competencia e as melhores presas ja desapareceram. Chegou a hora de cacar em outro terreno. — O escritorio do clube tem fichas de todos seus clientes — ofereceu Evie. — Dois mil e quinhentos cavalheiros de boa posicao economica. Muitos deles estao casados, claro, mas poderia conseguir os gestos de muitas boas partidas. — Permitiria te lorde St. Vincent farejar em uma informacao tao privada? — repos Daisy, cetica. — Nega lhe alguma vez algo? — replicou Lillian em tom divertido. Evie, que tinha suportado com frequencia suas brincadeiras sobre a devocao do Sebastian, sorriu e baixou os olhos para a alianca que brilhava a luz do fogo. — Quase nunca — admitiu. — Certamente, alguem teria que lhe dizer ao St. Vincent que se converteu num topico ambulante — indicou Lillian detras soltar uma risinho zombadora. — Se converteu verdadeiramente na personificacao de tudo o que se diz sobre os libertinos reformados. — reformou-se, ceu? — perguntou Annabelle a Evie detras recostar-se na poltrona. Ao pensar no marido carinhoso, ardente e tenro que a esperava na planta baixa, Evie sorriu de brinca a orelha. — O suficiente — respondeu em voz baixa, e nao acrescentou nada mais. Fim A Serie - As Solteironas As solteironas sao quatro garotas com serios problemas na hora de conseguir um bom marido. Sao aquelas que passam os bailes e reunioes apartadas de um lado como meras espectadoras. Seus nomes sao Annabelle Peyton, Lillian e Daisy Bowman e Evie Jenner. Ante a dificuldade por cacar

um bom partido, decidem unir seus esforcos para ajuda-las umas a outras neste tao complicado trabalho. …

Livro 1 - Segredos de uma Noite de Verao Quatro jovens da sociedade elegante de Londres partilham um objetivo comum: usar os seus encantos femininos para arranjarem marido. E assim nasce um ousado esquema de seducao e conquista. A delicada aristocrata Annabelle Peyton, determinada a salvar a familia da desgraca, decide usar a sua beleza e inteligencia para seduzir um nobre endinheirado. Mas o admirador mais intrigante e persistente de Annabelle - o plebeu arrogante e ambicioso Simon Hunt - deixa bem claro que tenciona arrimar-lhe os planos, iniciando-a nos mais escandalosos prazeres da carne. Annabelle esta decidida a resistir, mas a tarefa parece impossivel perante uma seducao tao implacavel… e o desejo

descontrolado que desde logo a incendeia. Por fim, numa noite escaldante de verao, Annabelle sucumbe aos beijos tentadores de Simon, descobrindo que, afinal, o amor e o jogo mais perigoso de todos. Simon Hunt provem de uma familia de classe media, de fato e o filho de um humilde acougueiro, mas e um homem ambicioso que lutou e escalou socialmente. Simon e o unico que mostra interesse por Annabelle, mas ele tampouco pensa em matrimonio, ele nao e dos que se casam, e acredita que esperando pacientemente que finalize a temporada e ela volte a fracassar em seus intentos de cacar um marido da nobreza, podera faze-la sua amante…

Livro 2 - Aconteceu no Outono Quatro jovens damas se introduzem na sociedade londrina com um objetivo prioritario: utilizar todos os ardis e artimanhas femininos a seu alcance para encontrar marido. Assim, formam uma

equipe: as solteironas Esta e a historia de uma delas… Aconteceu em um baile… Inteligente, desrespeitosa e impulsiva, Lillian Bowman compreendeu rapidamente que seus costumes americanos nao eram recebidos com simpatia pela sociedade londrina. E o que mais as desaprovava era Marcus, Lorde Westcliff, um insofrivel e arrogante aristocrata que, por desgraca, tambem era o solteiro mais cobicado da cidade. Aconteceu em um jardim… Ali Marcus a estreitou entre seus bracos e Lillian se sentiu consumida pela paixao por um homem que nem sequer lhe caia bem. O tempo se deteve; era como se existissem somente eles dois… E quase os apanham nessa atitude tao escandalosa. Aconteceu em outono…Marcus era um homem que controlava suas emocoes, um paradigma de aprumo. Com Lillian, entretanto, cada caricia supunha uma deliciosa tortura, cada beijo um convite a procurar mais-Mas como poderia considerar sequer tomar como sua prometida a uma mulher tao obviamente inapropriada?

Livro 3 - O Diabo do Inverno Quatro jovens damas da sociedade londrina procuram um bom partido. Chega a vez de Evangeline Jenner, a mais timida, mas tambem a mais rica, logo que cobre a sua heranca. Para escapar as garras da familia, Evie pede ajuda a Sebastian, Lorde St. Vincent, um conhecido libertino, fazendo-lhe uma proposta irrecusavel: que se case com ela, trocando riqueza por protecao. Mas a proposta impoe uma condicao: depois da noite de nupcias, os dois nao voltarao a encontrar-se na intimidade, pois Evie nao quer ser mais um coracao partido na longa lista de conquistas de Sebastian. A Sebastian resta esforcar-se mais para a seduzir… ou entregar finalmente o coracao, em nome do verdadeiro amor.

Livro 4 - Escandalo da Primavera Daisy a mais nova e romantica das solteironas ha finalmente sido intimada por seu pai, depois do casamento de sua filha maior com um conde Tho, mas Bowman nao quer que sua cacula se case com Joao ninguem, para isso lhe da um ultimato. Ou arruma um marido em 2 meses ou ele se casara com um homem que ele quer. Mathew Swift. O pior pesadelo da infancia de Daisy, o jovem magricelo que tanto havia irritado a ela e a Lillian, ela nao quer ouvir nem falar no assunto. E junto com suas amigas, e seus maridos, resolvem uma nova empreitada a caminho de achar a um lorde ha altura de Daisy, porem Daisy nao contava com o fato de Mathew ter se tornado um homem extremamente atrativo e muito menos com a atracao eu sente por ele. E agora?

Sobre a Autora Lisa Kleypas, vencedora do premio RITA, ja escreveu 34 romances. Seus livros foram publicados em 28 idiomas, em diversos paises. Ela mora em Washington com o marido e os dois filhos. Sendo os livros da serie Os Hathaways, e As Solteironas (The Wallflowers), os mais famosos Em sua pagina na web, a autora conta: “Comecei a escrever romances porque sempre amei le-los. Indiscutivelmente, fui uma nerd durante toda a escola primaria e, mesmo “florescendo” na secundaria, acredite, a nerd interior ainda estava aqui. Nunca pude imaginar um tempo melhor aproveitado do que lendo um livro, e este amor pela leitura, com o tempo, se traduziu num profundo desejo de escrever um.” www.lisakleypas.com

Star Books Digital
Pecados no Inverno vol. 3 - Lisa Kleypas

Related documents

157 Pages • 83,029 Words • PDF • 1.5 MB

112 Pages • 95,520 Words • PDF • 646.3 KB

271 Pages • 99,791 Words • PDF • 1.3 MB

188 Pages • 96,695 Words • PDF • 820.4 KB

210 Pages • 90,225 Words • PDF • 1 MB

157 Pages • 91,191 Words • PDF • 1.4 MB

496 Pages • 169,644 Words • PDF • 2.6 MB

233 Pages • 112,309 Words • PDF • 1.2 MB

47 Pages • 10,789 Words • PDF • 2.8 MB

25 Pages • 1,446 Words • PDF • 2.6 MB

206 Pages • 45,036 Words • PDF • 1.7 MB

138 Pages • 62,446 Words • PDF • 1.4 MB